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Evolução Psicológica em

prontuário único do paciente


no hospital geral.
Carolina Malcher – CRP10/ 02975
Mestre em Psicologia Clínica e Social.
Especialização em Psicologia da Saúde e Hospitalar
e em Teoria Psicanalítica.
O PRONTUÁRIO

A palavra prontuário deriva do latim


promptuariu que significa lugar onde se
guarda aquilo que deve estar à mão, o
que pode ser necessário a qualquer
momento.
BREVE HISTÓRICO

Hipócrates, no século 5 A.C., dizia que o registro


médico deveria refletir exatamente o curso da
doença e indicar as suas possíveis causas. Seu
registro era sempre feito em ordem cronológica, ou
seja, era um registro médico orientado ao tempo =
time oriented medical record.
DEFINIÇÃO

A resolução CFM 1638/ 2002 define o


prontuário como:

“documento único constituído de um conjunto de


informações, sinais e imagens registradas, geradas
a partir de fatos, acontecimentos e situações sobre
a saúde do paciente e a assistência a ele prestada,
de caráter legal, sigiloso e científico, que
possibilita a comunicação entre membros da
equipe multiprofissional e a continuidade da
assistência prestada ao indivíduo”.
O PRONTUÁRIO TRANSDISCIPLINAR

O Prontuário Transdisciplinar tem como


objetivo:

padronizar a maneira de fazer o registro e


organizá-lo a partir de problemas e necessidades
relevantes do usuário, identificado por equipe
multiprofissional, de modo objetivo nos campos
de ação: biológico, psicológico Cartilha da PNH 8
Prontuário Transdisciplinar e Projeto
Terapêutico e sociocultural;
A EVOLUÇÃO DA PSICÓLOGA/PSICÓLOGO EM
PRONTUÁRIO

Segundo o nosso Código de Ética Profissional, no


relacionamento com profissionais não psicólogos:

“compartilhará somente informações


relevantes para qualificar o serviço prestado,
resguardando o caráter confidencial das
comunicações, assinalando a responsabilidade
de quem as receber, de preservar o sigilo”
(art. 6°, / CFP, 2005).
A EVOLUÇÃO DA PSICÓLOGA/PSICÓLOGO EM PRONTUÁRIO

Efetuar registros em prontuário único e


multiprofissional do paciente de acordo com os artigos
12 e 14 do código de ética:

Art.12 – nos documentos que embasam as atividades em equipe


multiprofissional, o psicólogo registrará apenas a informação necessária
para o cumprimento dos objetivos do trabalho. Aplicam-se as
considerações do artigo 6°, sendo que a definição dos objetivos de
seu trabalho constitui um item que deve estar claro para o
profissional, a despeito do mesmo registrar inadvertidamente
informações irrelevantes para a atividade em questão. [...].

Art.14 – A utilização de quaisquer meios de registro e observação da


prática psicológica obedecerá às normas deste código e a legislação
vigente, devendo o usuário ou beneficiário, desde o início, ser informado
(CFP, 2005).
A EVOLUÇÃO DA PSICÓLOGA/ PSICÓLOGO EM
PRONTUÁRIO

Objetivo:

“registrar o estado emocional do paciente para que


o mesmo possa ser percebido e avaliado na sua
totalidade” (HOLANDA E FERNANDES).
ASPECTOS IMPORTANTES E QUE DEVEM SER
OBSERVADOS

- Linguagem formal;
- Rigor ortográfico (grafia, pontuação, concordância);
- Técnica (Diferente de tecnicista);
- Com informações pertinentes à equipe de saúde;
- Sigilo;
- Registrar SEMPRE a data e o horário do atendimento;
- Evitar registrar falas. Se extremamente necessário,
colocar entre aspas e acrescentar “(SIC)”;
- Conduta que será adotada pelo psicólogo. Seu Plano
Terapêutico Singular.
É PRECISO ATENTAR PARA:

Uso da linguagem formal:

Não utilizar: Poderá utilizar:

“Paciente agoniado, triste, “Paciente mobilizado,


Com raiva, raivoso...” demonstrando humor deprimido, irri
tabilidade...”

“Paciente tomando medicação “Paciente fazendo uso de


muito forte, tarja preta” etc... Psicotrópico (ansiolítico,
antidepressivo, antipsicótico)” etc...

“Paciente com estado emocional “Paciente sem alterações de humor


Normal...” ou queixas emocionais significativas...”
É PRECISO ATENTAR PARA:

- Revise seu texto antes de transcrevê-lo ao prontuário. Se ainda não


estiver seguro, faça um rascunho antes. É expressamente proibido o
uso de corretivos, borrachas, lápis, canetas coloridas, excesso de
rasuras;

- O texto deverá ser escrito de forma contínua utilizando-se apenas o


ponto em seguida. Ao concluir carimbe e assine de modo legível, o nome e
seu sobrenome. O uso do carimbo com sua identificação e número
profissional é obrigatório.

- Identifique o seu texto: antes de começar a evoluir, coloque a data e


título da evolução. Exemplo: #Atendimento Psicológico# ou
#Psicologia#

- Observe na folha de evolução se há o nome do paciente. Não evolua


em folhas não identificadas. Escreva o texto todo em uma única folha.
Não quebre o texto para outra página.

- Letra SEMPRE legível.


É PRECISO ATENTAR PARA:

Use a linguagem técnica que é diferente da tecnicista médica,


puramente científica e da Psicologia em que somente você será
capaz de entender

Exemplos que NÃO devem ser utilizados:

- Paciente demonstrando “pulsão de morte”, “com questões relativas


ao seu Complexo de Édipo”, “com Deflexão”, etc...
É PRECISO ATENTAR PARA:
Utilize SOMENTE informações que ajudarão a equipe de saúde:

Exemplos:
1. “O paciente refere que está apresentando recursos de enfrentamento
frente à experiência de adoecimento e hospitalização. Bom relacionamento
familiar e rede de apoio. No momento não apresenta demanda para
acompanhamento psicológico.”

Obs: Esta informação orienta a equipe quanto à necessidade ou


não de acompanhamento psicológico, diz que a psicologia já o
avaliou e se o paciente está com boa tolerância à hospitalização e
rede de apoio.

2. “Paciente está mobilizado, choroso e queixoso em razão de situação


De abuso sexual sofrido na infância...”

Obs: esta informação NÃO irá auxiliar a equipe na forma de


cuidado. Expõe o paciente. Só serve para a escuta psicológica. Não
deve ser evoluída.
ASPECTOS IMPORTANTES PARA A EVOLUÇÃO
Realizar o Exame Psíquico (funções cognitivas):

Consciência: observar se o paciente está desperto (nível de Cs), se


respondendo às solicitações com coerência do discurso. Se as funções
cognitivas estão preservadas: atenção, concentração, memória,
linguagem, pensamento, humor, volição.

EX1: “No momento da avaliação, o paciente está consciente...”


EX2:“Paciente apresentando rebaixamento do nível de consciência.
Será realizado retorno em outro momento para atendimento.”

Orientação: Observe se o paciente está orientado no tempo e espaço. Em


caso de dúvida, questione “que dia é hoje, mês, ano, se sabe em que local
está e se sabe que está hospitalizado?
Obs: existem situações em que o paciente pode estar parcialmente
orientado. Na dúvida, sempre converse com a equipe.

Humor: se está apresentando humor deprimido, ou eutímico, (sem


alterações de humor significativas). Receptividade e estado emocional geral.
ASPECTOS IMPORTANTES PARA A EVOLUÇÃO

Resumo com informações relevantes para a


construção do registro:

Observe se o paciente possui conhecimento sobre a


doença e sobre o tratamento. Qual o significado que
atribui ao seu adoecimento e hospitalização, quais
possíveis mecanismos de defesa atuantes, rede
de suporte familiar, hospitalizações anteriores,
medos, fantasias, psicopatologias presentes ou não e
quais recursos de enfrentamento.
EXEMPLOS PRÁTICOS DE EVOLUÇÃO PSICOLÓGICA
Situação 1: O psicólogo atendeu o paciente pela primeira vez
através de visita ao leito para verificação de demanda de
atendimento (busca ativa).

#Atendimento Psicológico#

03.03.2020
10h
Realizada visita para atendimento psicológico inicial. No
momento o paciente está consciente e orientado no tempo e no espaço, e
receptivo à abordagem. Demonstra humor estável ao relatar histórico de
adoecimento e hospitalização. Refere sono e apetite preservados. Não há
queixas emocionais significativas. Relata um bom relacionamento familiar
e rede de apoio. Apresenta boa tolerância ao tempo de hospitalização (22
dias). Em avaliação inicial, não foi identificada demanda para
acompanhamento psicológico. O serviço de psicologia foi colocado à
disposição do paciente e de seus familiares, enquanto durar a internação.
Segue para conhecimento da equipe.

Carolina Malcher
Psicóloga – CRP10/02975
EXEMPLOS PRÁTICOS DE EVOLUÇÃO PSICOLÓGICA
Situação 2: O psicólogo atendeu o paciente pela primeira vez
através de visita ao leito para verificação de demanda de
atendimento.

#Atendimento Psicológico#

03.03.2020
10h
Realizada visita para atendimento psicológico inicial. No momento
o paciente está consciente, orientado e pouco receptivo à abordagem. Pouco
comunicativo ao responder somente ao que lhe foi solicitado. Demonstra
humor deprimido ao relatar histórico de adoecimento e hospitalização.
Refere insônia e associa esta dificuldade às preocupações com a saúde e ao
ambiente hospitalar. Inapetência. Chora ao mencionar a ausência da
família. Feita escuta inicial para avaliação e acolhimento. O serviço social
será acionado para que a família seja contactada. O paciente permanecerá
em acompanhamento psicológico para suporte das queixas trazidas.

Carolina Malcher
Psicóloga – CRP10/02975
Situação 3: O psicólogo foi solicitado pela equipe de saúde para
atender o paciente em questão:

#Atendimento Psicológico#

03.03.2020
10h
Realizado atendimento psicológico por solicitação da equipe de
saúde, que referiu que o paciente “pode estar deprimido” (SIC). Feita escuta
inicial para avaliação. No momento o paciente está consciente, orientado e
receptivo. Chora ao falar do tempo prolongado de hospitalização e por estar
sem previsão de alta. Dificuldade para adaptar-se ao ambiente hospitalar.
Sono e apetite preservados. Contudo afirma não sentir tristeza constante,
alegando que não está deprimido. Não houve no decorrer de sua vida,
histórico de psicopatologias. Feita escuta em que as possibilidades de um
melhor enfrentamento foram discutidas. O paciente permanecerá em
acompanhamento para suporte de suas questões, pois apresenta momentos de
tristeza, alternados com uma postura mais positiva frente às situações.
Segue para conhecimento da equipe.

Carolina Malcher
Psicóloga – CRP10/02975
Situação 4: O paciente estava dormindo no leito. Não acordar.

#Atendimento Psicológico#

03.03.2020
10h
Realizado atendimento psicológico. No momento, o paciente
demonstra sonolência e impossibilidade de responder satisfatoriamente
ao lhe foi solicitado. Diante do quadro, foi feita escuta com a familiar
presente, Sra. Maria (genitora). A mesma forneceu informações acerca
do quadro clínico do paciente demonstrando estar ciente das
informações prestadas pela equipe. Refere que nos momentos em que o
paciente está desperto, segundo a sua percepção: “está bem
emocionalmente e lida bem com o curso do tratamento” (SIC). Será
realizado retorno para avaliação do paciente. Segue para conhecimento
da equipe.

Carolina Malcher
Psicóloga – CRP10/02975
Situação 5: O paciente está sem prescrição adequada. Necessita
de avaliação.

#Atendimento Psicológico#

03.03.2020
10h
Realizado atendimento psicológico. No momento, o paciente está
consciente e parcialmente orientado no tempo e espaço, em estado confusional.
Apresenta agitação psicomotora e irritabilidade ao responder às perguntas.
Observa-se a presença de delírios místicos de conteúdo religioso,
acompanhado de alucinações visuais e auditivas relatadas pelo paciente. A
familiar presente Sra. Vera, irmã do paciente, relata que o mesmo realiza
acompanhamento psiquiátrico sistemático e que em razão da recente
hospitalização, está sem tomar a medicação de rotina (antipsicótico). Feita
escuta com orientações para que a familiar informe ao médico responsável. O
paciente permanecerá em atendimento. A equipe foi informada também
através de devolutiva verbal, sobre a necessidade de avaliação especializada
para prescrição adequada.

Carolina Malcher
Psicóloga – CRP10/02975
Situação 6: O paciente recusa procedimento.

#Atendimento Psicológico#

03.03.2020
10h
Realizado atendimento psicológico por solicitação médica. O
profissional médico responsável informou, que o paciente recusa-se a realizar
procedimento cirúrgico de amputação do pé esquerdo. No momento do
atendimento, o paciente estava consciente, orientado e receptivo. Encontra-se
mobilizado e choroso com a notícia recente da necessidade de realização do
procedimento. Encontra-se reativo em processo de luto, apresentando a
negação da necessidade do procedimento de amputação, como mecanismo de
defesa. Refere o desejo de reunião com o médico para sanar dúvidas sobre os
riscos da cirurgia. Feita escuta inicial em que foram discutidas as
possibilidades de enfrentamento e elaboração da recente notícia. Ao final do
atendimento, o paciente referiu estar mais “calmo” (SIC). Feita devolutiva
para o médico. O paciente permanecerá em acompanhamento para suporte à
etapa pré e pós cirúrgica.

Carolina Malcher
Psicóloga – CRP10/02975
CONSIDERAÇÕES FINAIS

- Este material objetivou constituir-se em fonte de consulta e


discussão sobre a evolução psicológica em prontuário;

- Os exemplos que foram utilizados neste material são fruto de


experiências na prática hospitalar.

- Cada profissional deverá desenvolver a sua forma própria de


evolução;

- Faça leituras sobre o assunto. Revisão bibliográfica sobre o tema.


Treino.

- Mantenha o rigor e a seriedade preconizado pelo nosso Código de


Ética Profissional da Psicóloga e do Psicólogo.
VAMOS TREINAR A SUA EVOLUÇÃO?

Caso clínico 1
Maria Gomes Santana, sexo feminino,56 anos.
Queixa no atendimento que está internada há muitos dias sem saber
quando ocorrerá sua cirurgia, que está internada há três meses (no
prontuário a data da internação indica somente duas semanas). Que não
aguenta mais a comida do hospital. Fala que veio de outro hospital onde
viu muitas pessoas morrerem e que tem medo de morrer no hospital
também. Estava com a filha que olha para a mãe e chora dizendo não
aguentar mais estar no hospital e vê-la assim estranha, que ela ficou
louca desde que chegou no hospital e que só piora, os médicos não
estão fazendo nada para ajudar nem lhe dizem nada.
VAMOS TREINAR A SUA EVOLUÇÃO?

Caso clínico 2
Patrícia Antunes Rodrigues, mulher, 36 anos
Paciente refere no atendimento que está em tratamento para HIV
há dois meses, que toma medicação psiquiátrica prescrita para
depressão e que não lembra o nome nem trouxe para o hospital a
referida medicação, diz também que usa crack e maconha desde seus
16 anos. Paciente chorou durante todo o atendimento queixando que
briga constantemente com seu marido. Paciente diz que toma a
medicação antirretroviral só às vezes porque não acredita mesmo que
está com hiv e Deus não faria isto com ela, pois ela sempre foi uma
boa filha, esposa e mãe.
VAMOS TREINAR A SUA EVOLUÇÃO?

CASO CLÍNICO 3

Dulce Carolina Castro, 24 anos


Paciente agitada e chorando durante todo o atendimento, diz que
não consegue se acalmar desde que lhe disseram que deveria fazer o
exame de ultrassonografia transvaginal, pois a perspectiva de fazer este
exame lhe remete a um episódio de violência sexual vivido por ela
recentemente e desconhecido por sua família.
VAMOS TREINAR A SUA EVOLUÇÃO?

CASO CLINICO 4
Diogo Dantas Antunes,16 anos.
Paciente é simpático e cordial ao atendimento psicológico, fica
andando no corredor fora da enfermaria durante todo o atendimento.
Refere estar muito feliz com a alta programada para hoje à tarde, que
se sentiu bem cuidado no hospital, mas quer muito ir embora hoje,
pergunta se a médica já chegou várias vezes durante o atendimento.
Relata ser hoje o aniversário de morte de seu pai e que quer muito ir ao
cemitério, chora quando fala do pai, dizendo que nunca se deram bem,
mas que a morte dele ainda é motivo de sofrimento, principalmente em
datas como hoje.
VAMOS TREINAR A SUA EVOLUÇÃO?

CASO CLÍNICO 5
Paulo Santos Domingues, 33 anos
Paciente dormindo no leito. Filha do paciente chorou durante todo o
atendimento. Diz que nunca imaginou que ele estaria com câncer, mas
o pai sempre foi muito calado e não dizia o que sentia. Não quer contar
ao pai a gravidade do diagnóstico e nem que ninguém conte, tem medo
de que ele não aceite o tratamento. Diz que não aguenta mais que
falem que o pai está muito grave e vai morrer no hospital, que entende
isso, mas prefere pensar que ele vai ficar bem de novo e voltar pra
casa. Diz que o pai é a única pessoa que a trata bem na família e que
não sabe como vai viver sem ele.
REFERÊNCIAS
Carvalho, L. F. (1977). Serviço de arquivo médico e estatística de um hospital. 2.ª ed.,
São Paulo: LTr Editora /MEC.
Conselho Federal de Medicina. (1988). Código de Ética Médica.
Conselho Federal de Medicina, Confederação Médica Brasileira, Federação Nacional dos
Médicos, Associação Médica Brasileira. Classificação Brasileira Hierarquizada de
Procedimentos Médicos – CBHPM. (2003). São Paulo: Associação Médica Brasileira.
Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal. (2006). Prontuário médico do
paciente: guia para uso prático. Brasília: Conselho Regional de Medicina do Distrito
Federal.
Houaiss A. (2001). Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. 1.ª ed., Rio de
Janeiro:Objetiva.
Miranda, E. M. F. (2003). O uso do Prontuário Médico e a Evolução Psicológica. Módulo
V – 2ª Unidade do Curso de especialização em Psicologia da Saúde e Hospitalar. (Texto
não publicado).

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