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EI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO – DECRETO 4.657/42


1. MOTIVO DE HAVER UMA LEI DE INTRODUÇÃO
 Lei de introdução ao Código Civil Francês de 1808: quando se editou o Código Civil da França de 1808
iniciou-se uma novidade ao ordenamento jurídico, na verdade a novidade foi na cultura geral jurídica
como um todo, tendo em vista ter dado início à “era das codificações”. Chegou-se a conclusão que, para
ajustar tamanho impacto, seria necessária a edição de uma nova norma para fazer tal compatibilização do
ordenamento jurídico francês vigente até o momento como o novo diploma normativo

1.1. LEI DE INTRODUÇÃO NO BRASIL


 Brasil: a noção de lei de introdução é distinta. Mais uma vez houve importação incorreta de idéias
estrangeiras.
 Cumpre aqui a lei de introdução uma função multidisciplinar. Não há sequer um ponto de interseção
entre os dois diplomas legais. É um diploma legal multidisciplinar de sobredireito, ou seja, de como
devem ser elaboradas e aplicadas as leis
 Lei 12.376/10: corrigindo tal distorção histórica, adveio tal lei mudando o nome da lei de introdução ao
código civil para lei de introdução às normas do direito brasileiro.

1.1.1. Natureza da lei de introdução às normas do direito brasileiro


 Norma de sobredireito; superdireito; lex legum (lei sobre leis)
 Não tem por objetivo regular os fatos sociais, o comportamento do indivíduo na sociedade, mas sim as
próprias leis.

2. ESTRUTURA DA LEI DE INTRODUÇÃO


a) Art. 1º e 2º: vigência da norma legal
b) Art. 3º: obrigatoriedade da norma e erro de direito
c) Art. 4º: integração da norma (trata da anomia, lacuna, colmatação)
d) Art. 5º: interpretação da norma
e) Art. 6º: conflito de normas no tempo
f) Art. 7º a 19: conflito normativo no espaço

3. VIGÊNCIA DA NORMA LEGAL


Art. 1o Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de oficialmente
publicada.
§ 1o Nos Estados estrangeiros, a obrigatoriedade da lei brasileira, quando admitida, se inicia três meses depois de
oficialmente publicada. (Vide Lei 2.145, de 1953)

3.1. VACATIO LEGIS


3.1.1. Conceito
 É o período em que a lei, embora publicada, aguarda a data de início de sua vigência, em função de três
hipóteses possíveis: (a) ter sido fixada uma data posterior para o início de seus efeitos, (b) dever entrar
em vigor quarenta e cinco dias após publicada, em face de omissão de norma explícita, (c) estar pendente
de regulamento, explícita ou implicitamente (normas de eficácia limitada)

3.1.2. Sistema da obrigatoriedade simultânea ou sincrônica (adotado)


 A lei entra em vigor simultaneamente em todo o país em prazo único; assim como, decorrido o também
único prazo da vacatio legis, em todos os países do exterior simultaneamente.

3.1.3. Sistema da obrigatoriedade progressiva


 Segundo esse sistema a lei entraria em vigor progressivamente em todo o território nacional.
 Assim, por exemplo, enquanto em Brasília entrasse em vigor imediatamente, em Mato Grosso seria 4 dias
após e no Amazonas 7.

3.1.4. Prazos
 Leis: 45 dias, salvo disposição em contrário
 Estados estrangeiros: 3 meses (não há menção à “salvo disposição em contrário”)
 Atos administrativo-normativos: vigência imediata
 Decreto 572: decretos têm vacatio legis de 30 dias depois de oficialmente publicados

3.1.3. Termo inicial


 Os prazos de vacatio legis iniciam-se da publicação do ato normativo e não da “promulgação”
 Cuidado: em provas de concursos, há frequente tentativa de substituição da palavra “publicação”

Falha na norma?
Imaginando norma cuja vacatio legis seja de 1 ano. Quando começará a vigorar no exterior tendo em vista que
não há a ressalva “salvo disposição em contrário”? Será que a norma começará a vigorar em 3 meses no exterior
e em 1 ano no Brasil, ou seja, vigorará antes fora do que dentro do país?

3.1.4. Contagem do prazo para a entrada em vigor


Lei Complementar 95/98 Art. 8º, § 1o A contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam período
de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia
subseqüente à sua consumação integral. (Parágrafo incluído pela Lei Complementar nº 107, de 26.4.2001)

 Incluem-se tanto a data da publicação, quanto a do último dia do prazo, entrando em vigor no dia
subsequente à sua consumação integral.

3.1.5. Correção do texto da lei


3.1.5.1. Publicação de correção, antes de entrar a lei em vigor
Art. 1º § 3o: Se, antes de a lei entrar em vigor, ocorrer nova publicação de seu texto, destinada a correção, o prazo
deste artigo e dos parágrafos anteriores começará a correr da nova publicação.
 O início da contagem da vacatio se inicia (a) com a nova publicação e (b) apenas quanto às novas
disposições.
 Cuidado: em provas de concursos, há frequente tentativa de substituição da expressão “nova publicação”
 MHD e Caio Mário (posição minoritária): (a) se a correção for de pequena parte da lei, o prazo de vacatio
legis só recomeça a correr para os artigos corrigidos; (b) se a correção for de parte substancial da lei, o
prazo de vacatio legis recomeça para toda a lei.

3.1.5.2. Correção a texto de lei já em vigor


Art.1º § 4o: As correções a texto de lei já em vigor consideram-se lei nova.
 Não importa se a lei nova altera conteúdo, é meramente interpretativa ou somente corrige texto de lei já
em vigor. Será, para todos os efeitos, considerada lei nova.

3.2. VIGÊNCIA DA LEI NO TEMPO


Art. 2o Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.
§ 1o, A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando
regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.

 Princípio da continuidade: em regra as leis terão vigor até serem revogadas, salvo as leis temporárias ou
excepcionais, que desde sua publicação possua termo final ou condição resolutiva delimitadas.
3.2.1. Revogação das leis
3.2.1.1. Revogação expressa e tácita
 Revogação expressa: ocorre quando lei posterior expressamente declara que está revogando a anterior
 Revogação tácita: ocorre quando (a) lei posterior for incompatível com a anterior, ou (b) a lei posterior
regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior

3.2.1.2. Revogação total ou parcial


 Revogação total ou ab-rogação: quando a nova lei nova revoga todo o regramento da lei anterior
 Revogação parcial ou derrogação: quando a lei nova revoga apenas parte do regramento da lei anterior

3.2.2. Antinomia
 É a situação de conflito entre duas ou mais normas jurídicas

3.2.2.1. Antinomias próprias X impróprias


 Própria (formal): o conflito se verifica, pois enquanto uma norma afirma, a outra nega.
 Imprópria (material): consiste numa antinomia de valores. Ex. normas que incentivam a indústria do
tabaco, versus normas que privilegiam a saúde, desestimulando o consumo de fumo.

3.2.2.2. Antinomias reais X antinomias aparentes


 Antinomias reais: quando não houver na lei critério para a solução do conflito; existe a solução, mas não
há critérios para se chegar a ela.
 Antinomias aparentes: quando a própria lei tiver critério para a solução do conflito (utiliza dos critérios
para a solução das antinomias de 1º grau.) (comumente se trata de antinomia própria ou formal)

3.2.2.3. Antinomias de 1º grau X Antinomias de 2º grau


 Antinomias de 1º grau: conflito entre duas ou mais normas jurídicas
 Antinomias de 2º grau: conflito entre dois ou mais critérios de solução de antinomias de 1º grau

3.2.2.4. Critérios para a solução das antinomias de 1º grau


a) Critério hierárquico: lei superior prevalece sobre a de hierarquia inferior
b) Critério cronológico ou temporal: lei posterior prevalece sobre a anterior
c) Critério da especialidade: lei especial prevalece sobre a geral “Art. 2º, § 2o A lei nova, que estabeleça
disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior”

3.2.2.5. Critérios para a solução das antinomias de 2º grau


 Conflito entre os critérios hierárquico X cronológico: prevalece o hierárquico (norma superior-anterior)
 Conflito entre os critérios da especialidade X cronológico: prevalece o da especialidade (norma especial-
anterior), admitindo-se exceções em face do princípio da igualdade
 Conflito entre o critério hierárquico X e da especialidade: não é possível estabelecer um metacritério de
antemão para resolver esse conflito. Há uma antinomia real. Tendem os doutrinadores a defender a
prevalência do critério hierárquico por envolver competência, mas cada vez mais o critério da
especialidade é instrumento do princípio da igualdade.

3.2.3. Repristinação
Art. 2º, § 3o Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência.

 Conceito: é o fenômeno de restauração da lei revogada pela revogação da lei revogadora.


 A repristinação não é proibida: embora no imaginário popular jurídico a repristinação seja vedada, na
verdade o art. 2º, §3º estabelece que ela não é regra. Assim, sua aplicação depende de manifestação
expressa na lei revogadora da lei revogadora.
 Cuidado: ainda que a lei revogadora seja temporária, o decurso de seu prazo não restaura a lei
revogada, salvo disposição em contrário.

4. OBRIGATORIEDADE DA LEI E PROIBIÇÃO DO ERRO DE DIREITO


Art. 3o Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece.

 O art. 3º é uma ficção legal, estabelecendo um postulado para a garantia do interesse público.
 Obrigatoriedade: consiste na vinculabilidade hipotética da lei, ou seja, é a força vinculante da lei. É o que
dá respaldo à efetividade.
 Momento a partir do qual é obrigatória a lei: publicação, que é a cientificação geral da lei

4.1. NÃO SE ADMITE, EM REGRA, O ERRO DE DIREITO


 O erro de direito não é perdoado em nenhuma de suas hipóteses: ignorância e não compreensão.
 Exceção I: Art. 139, III do CC, que trata de erro de direito substancial.
 Exceção II: o erro de direito na lei das contravenções penais pode gerar o perdão judicial

5. INTEGRAÇÃO DA NORMA
Art. 4o Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de
direito.

 Anomia: ocorre quando não há norma para determinado caso concreto. Isso, dogmaticamente, evidencia
a lacuna (incompletude do sistema).
 Colmatação: é exatamente o preenchimento de lacuna, através de métodos de preenchimento de lacuna.

Cuidado
O art. 4º aplica-se ao campo do Direito Privado, mas não a todos os campos do Direito Positivo tendo em vista o
Direito Penal e Tributário trazerem normas específicas

5.1. ESPÉCIES DE LACUNAS


 Próprias e impróprias: a lacuna própria é aquela que se verifica da análise do sistema jurídico
considerado em si mesmo e é colmatada pela atuação do intérprete. A lacuna imprópria é verificada
quando se confronta o sistema de normas com um ordenamento do tipo ideal, como aquele fornecido
pelo Direito Natural, e é resolvida com a edição de norma pelo legislativo
 Subjetivas e objetivas: a lacuna subjetiva dá-se por motivo atribuível ao legislador, ao passo que as
objetivas ocorrem em virtude da evolução da sociedade, das tecnologias ao longo do tempo, que não
poderiam ser previstas pelo legislador no momento de produção de normas
 Voluntárias e involuntárias: as lacunas subjetivas podem se dar por descuido do legislador
(involuntárias), ou por omissão deliberada, em virtude da complexidade do tema, optando o editor da lei
por entregar ao juiz a solução da lacuna ao aplicar a norma ao caso concreto (voluntárias)

5.2. HETEROINTEGRAÇÃO E AUTOINTEGRAÇÃO


 Heterointegração: ocorre quando o aplicador do direito socorre-se de mecanismos fora do sistema de
normas, v.g. Direito Natural, ou costume.
 Autointegração: ocorre quando o aplicador do direito socorre-se de mecanismos previstos no próprio
sistema, v.g. analogia e princípios gerais do direito.

5.1. ANALOGIA
 Stolze: trata-se, em verdade de uma “forma típica de raciocínio pelo qual se estende a facti species de
uma norma a situações semelhantes para as quais, em princípio, não havia sido estabelecida”
 Exemplo: o contrato de hospedagem é atípico, uma vez que não se encontra expressamente regulado por
nenhuma lei. Poderá o juiz invocar, por analogia, as regras dos contratos de depósito, locação de serviços
e compra e venda

5.1.1. Espécies de analogia


 Analogia legal (legis): aplicação de uma norma prevista para hipótese distinta, porém semelhante.
 Analogia jurídica (juris): utiliza-se um conjunto de normas para a extração de uma razão comum a elas e
dar uma solução justa para o caso concreto.

6. APLICAÇÃO DA LEI
Art. 5o Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

 Prevê o art. 5º da LICC o modo de interpretação teleológica ou sociológica da norma


 Para alguns é a previsão da equidade implícita no ordenamento desde 1942.
 PFN 2007.2: o art. 5º da LICC permite corrigir a inadequação da norma à realidade fático-social e aos
valores positivados, harmonizando o abstrato e rígido da norma com a realidade concreta, mitigando o
seu rigor, corrigindo-lhe os desacertos, ajustando-a do melhor modo possível ao caso emergente.
 PFN 2007: a interpretação teleológica é também axiológica e conduz o intérprete-aplicador à
configuração do sentido normativo em dado caso concreto, já que tem como critério o fim prático da
norma de satisfazer as exigências sociais e a realização dos ideais de justiça vigentes na sociedade atual.

7. CONLITO DE NORMAS NO TEMPO


Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa
julgada.
§ 1º Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou.
§ 2º Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles
cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo, ou condição pré-estabelecida inalterável, a arbítrio de outrem.
§ 3º Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba recurso.

 A lei civil, assim como toda lei em geral, é irretroativa, devendo ter efeitos prospectivos. A única ressalva
seria para aquela lei que não atinja o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada, o que nem
sempre é de se visualizar no caso em concreto.

8. CONFLITO DE NORMAS NO ESPAÇO


8.1. DIREITO DE FAMÍLIA
Art. 7o - A lei do país em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o
nome, a capacidade e os direitos de família.

 Cuidado: é a lei do país em que domiciliada a pessoa, e não de onde houver nascido

8.2. DIREITO PROCESSUAL


8.2.1. Prova dos fatos ocorridos no estrangeiro
Art.  13.  A prova dos fatos ocorridos em país estrangeiro rege-se pela lei que nele vigorar, quanto ao ônus e aos
meios de produzir-se, não admitindo os tribunais brasileiros provas que a lei brasileira desconheça.

8.2. DIREITOS REAIS


Art. 8o Para qualificar os bens e regular as relações a eles concernentes, aplicar-se-á a lei do país em que estiverem
situados.
§ 1o Aplicar-se-á a lei do país em que for domiciliado o proprietário, quanto aos bens moveis que ele trouxer ou se
destinarem a transporte para outros lugares.
 Bens imóveis: lei do país em que estiverem situados
 Bens móveis que ele trouxer: lei do país em que for domiciliado o proprietário

8.3. DIREITO DAS SUCESSÕES


Art.  10.  A sucessão por morte ou por ausência obedece à lei do país em que domiciliado o defunto ou o
desaparecido, qualquer que seja a natureza e a situação dos bens.
§ 1º A sucessão de bens de estrangeiros, situados no País, será regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge
ou dos filhos brasileiros, ou de quem os represente, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do de cujus.
§ 2o A lei do domicílio do herdeiro ou legatário regula a capacidade para suceder.

 Regra: a sucessão é regida pela lei do país do domicílio do autor da herança

8.3.1. Princípio do prèvalement (art. 10, §1º)


 Previsto na lei de introdução do Código Civil (é norma de direito internacional privado)
 Conceito: aplica-se em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros a norma que lhes seja mais
favorável, seja interna, seja externa.
 CF, art. 5º, XXXI – a sucessão de bens de estrangeiros situados no País será regulada pela lei brasileira em benefício
do cônjuge ou dos filhos brasileiros, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do "de cujus";

8.4. DIREITO DAS OBRIGAÇÕES


Art. 12.  É competente a autoridade judiciária brasileira, quando for o réu domiciliado no Brasil ou aqui tiver de ser
cumprida a obrigação.
§ 1o Só à autoridade judiciária brasileira compete conhecer das ações relativas a imóveis situados no Brasil.

9. PROVA DA LEI ESTRANGEIRA


Art. 14.  Não conhecendo a lei estrangeira, poderá o juiz exigir de quem a invoca prova do texto e da vigência.

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