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A jurisprudência atual nada tem que ver com a jurisprudência romana, esta é a prudência

iuris, isto é, a ponderação das melhores soluções por parte de quem desenvolve e pratica a
jurisprudência.

A jurisprudência é o conhecimento das coisas divinas e humanas e a ciência do justo e do


injusto. Esta é também o conjunto de respostas dadas pelos jurisprudentes para solucionar
litígios entre a população romana.

Os jurisprudentes eram pessoas conhecedoras, honestas, de prestigio social, competentes


tecnicamente e rigorosas, não era qualquer um que chegava a jurisprudente, este podia
resolver casos concretos, pois estava revestido de sapientia iuris, era considerado um perito
e era detentor de auctoritas, sendo este uma característica central dos jurisprudentes, pois
era o que os distinguia, esta auctoritas era o seu saber socialmente reconhecido, resultante
da sabedoria, por isso é que as suas escolhas era consideradas. A auctoritas é um poder
identificador de jurisprudentes e as jurisprudências são o elemento identitário do direito
romano.

O inicio da jurisprudência foi com os sacerdotes pontífices, estes respondiam apenas a


perguntas que lhe eram colocadas em relação ao caso concreto. O jurisprudente respondia
ao que lhe perguntavam, sendo esta a sua função, a de Respondere.

O facto dos sacerdotes pontífices só responderem a questões relacionadas ao caso concreto


é o que distingue a jurisprudência pontifícia da jurisprudência secularizada, uma vez que na
jurisprudência secularizada, através de consultas públicas, partiam de um caso concreto
com o objetivo de exporem questões mais vastas, respondendo às perguntas do caso
concreto e aos problemas análogos colocados pelos auditores.

A jurisprudência passou por três períodos de secularização, a Lei das XII Tábuas, o Ius
Flavianum e o ensino público do direito.

A Lei das XII Tábuas teve uma grande influência na medida que, a promulgação da Lei das
XII Tábuas corresponde à aceitação de que um direito consuetudinário não-escrito
permitia aos intérpretes, sendo estes detentores dos segredos do sagrado, um imenso
arbítrio e amplitude na resolução dos litígios invocando o ius, e por consequência um maior
favorecimento dos patrícios. Com a Lei das XII Tábuas as normas a aplicar passaram a ser
do conhecimento de todos, esta continha disposições com conteúdos inscritos nos direitos
público, privado e processual servindo assim de base para o exercício da jurisprudência.
O Ius Flavianum veio publicitar uma coleção de fórmulas processuais das legis actiones,
estas eram construções transmitidas dos pontífices aos particulares para repetirem em
tribunal, para além das fórmulas processuais o Ius Flavianum também revelou o calendário
com os dias fastos e nefastos, considera-se ser esta uma das etapas mais importantes do fim
da interpretação religiosa do Direito em Roma.

Já o ensino público do Direito teve o seu contributo para a secularização da jurisprudência,


no momento em que Tibério Coruncâneo acedeu ao cargo de pontífice máximo, abriram o
colégio pontifício aos plebeus, começando, Tibério, a responder às questões publicamente.
Todo aquele que quisesse aprender Direito tinha acesso livre às consultas de Tibério. Foi
aqui que os pontífices deixaram de ser únicos consultados para a resolução de litígios.

Com a secularização da jurisprudência, os sacerdotes foram substituídos pelos


jurisprudentes, passando a interpretatio legis a interpretatio prudentium, isto é,
jurisprudência.

No entanto a jurisprudência continuou a ser uma atividade de interpretação de regras para


resolver o caso concreto recorrendo à exceção e à criação de conceitos, mas sempre com a
principal preocupação da justiça do caso concreto. A evolução da jurisprudência não foi
obtida de uma mudança brusca da substituição formal do modelo antigo, mas sim de uma
substituição lenta e parcial de procedimentos, esta permitiu a mudança. A primeira
preocupação da jurisprudência é a solução do caso concreto, se ao final de alguns casos se
desse sempre a mesma sentença podia criar-se uma regra, no entanto esta não é criada de
forma abstrata, podemos dizer assim que a metodologia casualística é a forma dos
jurisprudentes atuarem.

A atividade da jurisprudência passava por três momentos:

Respondere: este momento era o mais importante, tendo por base dar uma
resposta, conselhos sobre a possibilidade de intentarem uma ação ou de darem pareceres às
pessoas que os procuravam.

Cavere: atividade cautelar, o jurista aconselhava os particulares sobre a forma mais


correta de atuarem nos seus atos jurídicos.

Agere: atividade desenvolvida na assistência às pessoas que procuravam o


jurisprudente na escolha da via processual mais adequada para prosseguirem com êxito os
seus interesses, esta era depois utilizada na defesa do interessado perante o juiz na fase
processual seguinte.
No inicio do principado a jurisprudência enfrentou uma grave crise de objetivos, a criação
do ius novum, enunciando regras jurídicas por interpretativo das velhas regras do ius civile e
dos mores maiorum, para responder a novos caso. Pedia-se agora que os jurisprudentes
elaborassem um conjunto de regras, principios e modos de concretização do Ius Romanum.

Todas as regras jurídicas passaram a depender, na sua execução, da vontade do prínceps e


os mecanismos de equilibrio e controlo da república tinham sido entregues àquele que
exercia todos os poderes, o prínceps. Foi Augusto que garantiu a aceitação pelos romanos
de um controlo indireto da jurisprudência com a explicação de que a dispersão de soluções
dadas no fórum colocava em risco a segurança e o acerto de sentenças.

Criou então o Ius Publice Respondendi, como uma concessão dada por ele a alguns
jurisprudentes, esta servia como condição de acesso da solução do jurisprudente à sentença
a proferir pelo juiz com utilidade para a parte que o consultava.

Como existiam muitos jurisprudentes e cada um dava uma solução diferente para cada
caso, Augusto deu a alguns o direito de responder em público às questões colocadas pelas
partes como se fossem o próprio prínceps. Mais tarde, Augusto ordenou que os pareceres e
as respostas dos jurisprudentes fossem enviados em tábuas fechadas, de forma a não haver
a possibilidade de deturpações, no entanto ao tornar a atividade da jurisprudência secreta,
permite a adulteração de sentenças.

Não é apenas o secretismo agora instaurado, mas também o regresso da interpretatio


jurídica por um conjunto limitado de jurisprudentes que leva a uma degradação da
jurisprudência romana. A responsa dos jurisprudentes dotados de ius publice respondendi
não eram fonte imediata de direito, nem tinham caracteristicas de generalidade e abstração.

O fim da jurisprudência deu-se com o ius publice respondendi, pois este atraiu os
jurisprudentes para área politica e o circulo do poder, tornando a jurisprudencia sujeita a
fiscalização e subordinada à vontade do prínceps.

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