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Veja: de acordo com Paolo Grossi no artigo O Direito entre Poder e Ordenamento, um traço
fundamental da simplicidade do direito na modernidade era a redução do público ao Estado e o
privado em sujeitos individuais. Ou seja, negava-se o eu social e o eu coletivo, assim como se negava
a produção do direito por formações sociais e coletivas (p.105). Imaginem vocês que Romano ver
florescer o capitalismo industrial e, com ele, os conglomerados de indústrias e as lutas da classe
trabalhadora. Romano vê o florescimento de coletividades que, por vezes, se contrapunham ao
próprio Estado.
no momento de emanação de uma norma pelo poder estatal, mas em um momento anterior.
Como bem argumenta, a essência do direito não está no plano da validade, mas na dimensão
da efetividade. Romano olha para a sociedade e nela enxerga o fundamento do direito. Sobre
isso, ele diz: “É a sociedade que se move mais sobre os trilhos da efetividade do que da
validade” (p. 16). Assim sendo, ele vê o direito de modo objetivo, a partir daquilo que tem
efetividade no meio social. A sociedade passa a ser referência primária para o direito na teoria
de Romano.
Qual o conceito de Estado para Romano? O Estado para Romano não assume ares
arrogantes. O Estado é apenas uma projeção parcial do direito. Ele não concentra em si toda a
juridicidade da vida. Ele é mais uma das instituições existentes no mundo da vida e que foi
formado em um contexto histórico bem específico. Como conversamos em sala, o Estado é
uma estrutura patriarcal burguesa formada por um ordenamento que contém também as
mesmas características. “O Estado é sempre e sobretudo um regime, um ordenamento
jurídico, uma instituição em que o monarca, os súditos, o território, as leis são somente
elementos” (p.110)
Quando Romano elabora a ideia de que o Estado é apenas mais uma das instituições e
ordenamentos que podem existir em uma sociedade, ele está dizendo que em um mesmo
território pode existir uma pluralidade de ordenamentos jurídicos que, mesmo não sendo
reconhecidos pelo Estado, ainda continuam válidos. A partir dessa ideia, Romano põe outras
instituições e ordenamentos em pé de igualdade com o Estado. Nesse sentido, é possível
pensar em uma comunidade indígena, um quilombo2, etc.
Passemos, então, a alguns pontos destacados por Romano ao longo da obra. É muito
importante que os conceitos de instituição, ordenamento, direito e norma estejam claros.
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Nesse sentido, vale a pena ler o artigo “Por uma história do conceito jurídico do quilombo no Brasil
entre os séculos XVIII e XX, escrito por Vanilda Honória dos Santos e Diego Nunes. A conclusão a
que os autores chegam é que o quilombo, visto como um espaço sem direito, é sim um espaço
jurídico que acaba por projetar seus direitos para outras instâncias jurídicas. Além desse artigo
específico, Vanilda Honória dos Santos tem uma ampla pesquisa na temática.
Romano inicia o livro tratando da insuficiência da teoria que enxerga o direito
somente como norma jurídica e limitado ao Estado. Ele entende que a norma jurídica também
é direito, mas o direito não é só isso. Na visão dele, é necessário, portanto, adicionar outros
elementos. Elementos que por vezes são vistos como não jurídicos.
Alguns indícios gerais desta insuficiência; em particular aqueles que têm a sua provável
origem nas definições correntes do direito.
Antes exemplos de elementos considerados não jurídicos que para ele são, sim,
jurídicos, Romano prova a insuficiência da teoria que enxerga o direito somente como norma.
Para ele, existem indícios diretos e indiretos que provam o seu ponto de vista.
O primeiro indício é uma observação feita por Romano de que todos falam e
confessam não saber conceituar de maneira clara o que é o direito (p.62). Em relação a esse
ponto, lembro de dois episódios: Jeanine sempre perguntava no processo seletivo o
significado de direito para o candidato e muitos respondiam que o direito se confundia com
norma ou nem sabiam responder; segundo, a primeira pergunta que o Diego fez a minha
turma quando começou a lecionar Teoria do Direito foi “o que era direito?” e quase todos os
alunos ficaram confusos e sem saber muito bem como defini-lo.
→ Se eu perguntasse hoje nessa sala de aula, o que é o direito, o que vocês me responderiam?
O segundo indício é o fato de que o direito definido tão somente como norma não
serve muito para disciplinas jurídicas particulares já que na prática muitas delas extrapolam
esse conceito, como por exemplo o direito administrativo, constitucional, processual, etc.
→ Aqueles que aqui advogam conseguem sustentar a ideia de que o direito seja somente
norma?
Para solucionar esse problema, Romano vai buscar as respostas no direito público. Ele
não parte do direito privado por dois motivos: primeiro por conta da formação dele,
concentrada no direito público, e também porque ele considera que o direito privado é uma
ramificação do direito público, estando sob a sua tutela e sendo dominado por ele (p.64). A
partir disso, Romano busca construir uma definição do direito que seja verdadeira e completa.
Uma definição que não seja a-histórica e cheia de abstrações e que também sirva a todos os
ramos especiais do direito (p.65).
Devemos ter cuidado para não confundir instituição com o conceito de direito subjetivo
Direito subjetivo é uma relação jurídica simples e, por vezes, transitória (p.108). A
instituição é posição estável de um ente (p.108) um direito objetivo na medida que em é uma
entidade, um corpo social, que possui, no mundo jurídico uma existência efetiva e concreta.
A consequência disso é que uma relação simples entre pessoas não forma uma
instituição. Uma instituição é uma organização complexa. Ex dado por Romano: relação
conjugal e família.
“[...] Isso, note-se bem, não exclui o fato de que possam existir instituições cujo elemento
pessoal seja representado por somente duas pessoas. Em tal caso, é necessário que tal
elemento seja integrado por algum outro que tenha a eficácia coesiva e unificadora que de
outro modo faltaria. É o que acontece com a sociedade conjugal, que, considerada em si e por
si, seria uma simples relação, podendo assumir, e geralmente assume, a figura jurídica da
família, ou seja, de uma instituição (p.107)
Se uma simples relação jurídica ou uma simples relação entre pessoas físicas não é o
suficiente para caracterizar uma instituição, uma pessoa jurídica sempre será uma instituição
(p.112). Isso acontece porque uma pessoa jurídica sempre terá um ordenamento de direito
objetivo. Ela terá sempre um ordenamento interno que a rege e a estrutura.
Como tais elementos sejam implicitamente postulados pela maior parte das pesquisas
sobre as características específicas do direito.
Considerando essa argumentação, para o autor, a norma jurídica representa mais o
objeto e o meio de atividade do ordenamento jurídico estatal do que um elemento de sua
estrutura (p.69)
As teorias que enxergam o direito como norma jurídica geralmente atribuem algumas
características às normas jurídicas com o objetivo de diferenciar daquilo considerado “não
jurídico”. Ao fazerem isso, geralmente se apropriam de elementos que são estranhos à ideia
de norma, ou seja, se apropriam de “elementos não jurídicos” e caem, portanto, em uma
grande contradição (p.70).
Exemplo 1: Alguns afirmam que a norma jurídica só é norma devido às suas características
formais. A formalidade de uma norma é algo que é extrínseco a ela. Dois aspectos “formais”
extrínsecos à norma podem ser analisados nesse sentido: objetividade da norma e sanção
jurídica.
- Objetividade do direito: tendo por base essa característica alguns afirmam que o
direito nasce da consciência dos indivíduos. Surgindo divergência entre eles, é preciso
que uma força maior que media as relações. Essa consciência maior é expressada pelo
direito imposta por alguma entendida. Disto advém para o autor a objetividade do
direito. Ou seja, a partir desse raciocínio, Romano prova que o direito não é só a
norma posta e escrita. Direito pode ser essa entidade que, em um momento anterior a
criação da norma, a pensou (p.72). Assim diz:
[...] “A chamada ‘objetividade’ do ordenamento jurídico não pode ser reduzida e limitada às
normas jurídicas. Refere-se e se reflete também sobre essas, mas parte sempre de um
momento lógica e materialmente anterior às normas e, algumas vezes, ou melhor,
frequentemente, alcança momentos que não podem ser identificados e confundidos com
aqueles que caracterizam as normas. O que equivale a dizer que as normas são podem ser uma
parte do ordenamento jurídico, mas estão bem longe de esgotá-lo” (p.74)
- Sanção: a sanção é considerada como um elemento formal do direito, mas ela pode
existir sem necessariamente ser objeto de uma norma jurídica.
[...] Acreditamos, de fato, que a sanção possa não ser objeto de uma norma específica. Pode,
ao contrário, ser imanente e latente nas engrenagens do aparelho orgânico que constitui o
ordenamento jurídico considerado no seu todo; também pode ser força que atua de modo
indireto, uma garantia efetiva que não dá lugar a algum direito subjetivo estabelecido por
qualquer norma; freio inato e necessário do poder social. Pode-se então dizer que apresentar a
sanção como um elemento do direito é afirmar, mesmo não querendo, que o direito não
consiste unicamente em normas jurídicas, e que estas são ligadas, ou melhor, suspensas, por
outros elementos de onde advém toda a sua força. Deste modo a sanção, ou seja, estes outros
elementos, bem longe de serem algo complementar, acessórias às normas, as precedem,
formando a base na qual fundamentam as suas raízes (p.75)
Ainda sobre as diferenças que tentam criar entre normas jurídicas de outros fenômenos
vistos como extrajurídicos, Romano diz:
“É perfeitamente vão, por consequência, propor, como acontece de modo frequente, que
sejam estabelecidas as características diferenciais do fenômeno jurídico a respeito daquelas da
religião, da moral, do costume, das convenções, da economia, das regras técnicas, etc. Cada
uma destas manifestações do espírito humano pode ser tomada totalmente ou em parte no
mundo jurídico, vindo a formar o conteúdo dele, todas as vezes que venha a entrar na órbita
de uma instituição [...]” (p.91)
Casos em que a primeira posição do direito não é determinada por normas, mas pelo
surgimento de uma instituição, e impossibilidade de reduzir a instituição a normas.
Ex: “[...] Isso é evidente, por exemplo, para o Estado, mas não somente para o Estado. Este
existe porque existe, é entidade jurídica porque existe e do momento em que tem vida. A sua
origem não é um procedimento regulado por normas jurídicas; é, como repetidamente
evidenciamos, um fato. Ora, basta que este fato seja consumado para que tenhamos direito,
basta que tenhamos um Estado efetivo, vivo e vital; a norma, ao contrário, pode ser instituída
a seguir. A primeira posição do direito não é, deste modo, determinada pela última, que é uma
manifestação mais tardia e subsidiária daquela [...]” (p.95)
As tarefas são divididas de acordo com o gênero. Os homens caçam animais, como
queixadas, antas, veados e macacos, e muitas vezes usam o curare (um extrato de planta) para
envenenar suas presas. Nenhum caçador come a carne que matou. Em vez disso, ele a
compartilha entre amigos e familiares. Em troca, ele receberá a carne de outro caçador.
O mundo espiritual é uma parte fundamental da vida dos Yanomami. Toda criatura,
pedra, árvore e montanha tem um espírito. Às vezes estes são malevolentes; eles atacam os
Yanomami e acredita-se que causam doenças. Os xamãs controlam esses espíritos inalando
um rapé alucinógeno chamado yakoana. Através de suas visões e em um estado de transe, eles
encontram os espíritos ou xapiripë.
Perguntas finais:
● O que é o direito? "[...] o direito antes de ser norma, antes de se referir a uma simples
relação ou a uma série de relações sociais, é organização, estrutura, atitude de uma
sociedade em que é vigente e que para ele se constitui como uma unidade, como um
ser existente por si mesmo”. (p. 78)
● O que é o Estado? O Estado é apenas uma projeção parcial do direito. Ele é mais uma
das instituições existentes no mundo da vida, formado em um contexto histórico bem
específico. Como conversamos em sala, o Estado é uma estrutura branca, patriarcal e
burguesa. “O Estado é sempre e sobretudo um regime, um ordenamento jurídico, uma
instituição em que o monarca, os súditos, o território, as leis são somente elementos”
(p.110)
● O que é a lei/norma? Para o Estado, a norma jurídica é o objeto e o meio de atividade
do ordenamento jurídico estatal.
● Quais são as relações entre direito e Estado para o autor? Para o autor, o Estado é uma
instituição. Como argumenta em sua teoria, a instituição tem uma relação de
equivalência com o seu ordenamento/direito. Assim sendo, o direito como
ordenamento jurídico é uma instituição e, vice-versa, toda instituição é um
ordenamento jurídico (p.78). Essa também é a relação existente entre
direito/ordenamento e Estado.
● Como direito e história se relacionam na obra do autor? O direito não é abstração. A
sua origem está na efetividade dos fatos sociais.