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A DOUTRINA MAÇÔNICA E A ÉTICA DO OBREIRO

Ir. Leon Grinbery. Argentina. Traduzido da Revista Símbolo, órgão da Grande Loja
da Argentina, pelo Ir∴Eduardo Escalante. Verdade mai/jun 1996.

O processo formativo do maçom encaminha-o, desde o primeiro grau, a uma


coerência entre pensamento, palavra e ação. Guia-o a alcançar afirmativamente a
unidade da vida em todos os campos: uma única resposta, uma única
responsabilidade, um único compromisso. Ajusta-o a uma única tabela de valores,
evitando a multiplicidade de "morais". Não há uma ética para o Templo e outra
para o mercado.

O fundamento doutrinário maçônico é gnóstico, porque no homem interior habita a


Verdade. Por isso a instituição Maçônica propicia a busca e realização do homem
interior, em todo homem e em todos os homens.

Ortega y Grasset disse: "Eu sou eu e minha circunstância", mas também o profeta
Natan disse ao Rei David: "Tu és o homem. De ti depende o destino da
humanidade".

Focalizar especificamente o homem é contemplá-lo como um lento processo


(produto) evolutivo de um princípio de consciência. Princípio de consciência ou
“substância primordial" que se manifestou como matéria inerte na primeira etapa.
Logo surgiu o fenômeno da vida, aparecendo nas formas vegetativas e instintivas
do reino vegetal e animal.

No reino animal (coincidindo talvez com a linha do pensamento de Telhard de


Chardin) foi ocorrendo o processo de aparecimento e formação do sistema nervoso
central, culminando na configuração do cérebro humano. Cérebro este que
possibilitou, ao nível da mente humana, a faculdade da reflexão e da consciência
de se fazer auto-consciente.

Todo este breve relato, em síntese, é expressão do movimento natural da


consciência humana rumo a uma expansão e liberdade. A experiência central do
mundo moderno é a busca da liberdade.

Claramente, ao sair da Idade Média, vislumbrou-se que o homem buscou a


liberdade, para dar forma ao seu próprio destino como pessoa humana. Para
muitos, a procura e o encontro dessa liberdade (qualquer que seja a acepção
tomada, e ainda melhor: o conjunto de todas) é um fim em si próprio. Erich
Fromm, na sua clássica obra O medo da liberdade diferenciou o conceito de
liberdade de e de liberdade para.

Para outros, a liberdade não é um fim em si própria: é um meio para se atingir


um fim superior ou mais "transcendente".

E este fim não poderá ser outro que o da Vida. Vida plena e real, com um
autêntico sentido integrado. Viver é outorgar tira sentido à existência.

Acreditemos ou não, sejamos ou não conscientes, nós, os homens, somos os únicos


gestores e realizadores da História, através da nossa concepção da vida.

A dialética do porvir humano de todos os tempos aparenta surgir de duas


concepções divergentes: a materialista e a idealista. Concepções que se
manifestam na luta ou no defrontar do que poderíamos chamar: poder político e
poder espiritual. A verdade da realidade vital contra os interesses criados.
Verdades absolutas contra Verdades relativas, acomodadas. Liberdade individual
contra autoritarismo limitante. Liberdade versus dogmatismo.

O primeiro intento ocidental de unir ambas as concepções, ou seja, os dois


poderes, foi o dos pensadores gregos. Entre eles, Platão, no seu livro A
República, tratou de espiritualizar a realidade, de onde surgiu a utopia de que
os governantes deveriam ser filósofos, homens do espírito. Atenas ordena a
Sócrates beber cicuta. Fracasso do espírito ante o poder político.

Mas o espírito, segundo Martin Buber, é o encontro entre o homem e o


transcendente. Daí ser necessária inevitavelmente a integração. As idéias têm
valor contanto e enquanto se transformem em vida palpável, concreta. Não é
possível permutar a vida pelo espírito, a idéia abstrata. Nem emancipar o
transcendente o espiritual, da vida cotidiana.

Espírito sem compromisso do dever é um dos sintomas da nossa atualidade, e


também a sua contraparte: o materialismo desconhece a essência da vida. O
material e o vital devem se fundir para que o espírito seja vida.

Responsabilidade, base da ética.

Ser significa ser totalmente. Sermos nós mesmos, assumir. É nos comprometermos
com cada hora de nossos dias, é sermos um homem em plenitude. Reiteramos: viver
é dar sentido à vida. Cada momento da existência põe à prova o homem. Assumirá
ele a responsabilidade de responder com todo seu ser à invocação do momento? É
livre. Pode escolher e decidir. Nesta eleição ele joga o sentido de sua
existência. E ao eleger para si mesmo, estará elegendo para a humanidade.

A responsabilidade é a única insofismável base de toda ética. É precisamente a


responsabilidade que possibilita o exercício da ética e a pratica da moral.

O que é conflitante? O que cria a crise do homem e no homem? A cisão da


existência em tabelas valorativas distintas. Pode ser que individualmente
estabeleçamos a nossa própria escala de valores, nossa própria mensuração com
prioridades diferentes. O importante é o ajustamento da nossa conduta à nossa
tabela valorativa, evitando a multiplicidade de morais. Não há uma ética para o
Templo e outra para o mercado.

O processo formativo maçônico nos encaminha, desde o primeiro grau, rumo a uma
coerência entre pensamento, palavra e ação. Guia-nos para alcançar
afirmativamente a unidade da vida do homem em todos os campos. Uma única vida,
uma única resposta, uma única responsabilidade, um único compromisso, uma única
ética.

Sempre há no recôndito do homem uma voz interior que o chama. que pergunta, que
indaga, que reclama. Às vezes a chamamos de consciência. Perante ela, alguns
fogem, se calam. Outros respondem. Alguns se ocultam entre palavras, entre
idéias, entre ações. Outros revelam, se manifestam tal como são. Alguns
argumentam tranqüilizando-a, se justificando. Outros se realizam se ajustam.
Lutam contra a fragmentação, a divisão da vida em categorias distintas e em
recintos temáticos, qual compartimentos estanques, que nenhuma relação
estabelecem entre si. O ético o estético, o religioso, o metafísico, o
sociológico, o econômico, o psicológico etc. que em definitivo refletem aspecto
do homem, nunca do homem total.

Karl Jasper disse: "O modo como vejo a grandeza e como me comporto perante ela,
me faz chegar ao meu próprio ser".

Ante um ideal de perfeição alguns expressam: são utopias; negam-no e reduzem tal
ideal ao comodismo do nível em que se encontram. Outros, pelo contrário, e entre
eles estão os maçons, tentam se elevar, se realizar nesta meta de perfeição.
Essa meta de perfeição logicamente leva implícita a efetivação dos nossos
princípios básicos.

Liberdade, igualdade, Fraternidade. Amor à Justiça; procura da verdade. Respeito


à sabedoria; reconhecimento da harmonia e da justiça. Tolerância no seu legítimo
limite.

Rejeição, superação ou controle da hipocrisia, ambição, inveja, egoísmo etc.


Mas, acima de tudo, a pedra básica, o fundamento da nossa Instituição: a
Fraternidade. E ela depende da compreensão.

Ambas, fraternidade e compreensão, determinam e descansam na responsabilidade,


forjada, no nosso caso, como maçons, na real interiorização do que os nossos
símbolos dinamizam.

Nossa formação maçônica implica ao menos estarmos a coberto de intenções e


idéias espúrias, vigilantes de que a sabedoria, harmonizada pela beleza e pelo
amor seja a potência das nossas ações, e por onde a nossa conduta esteja nas
vinte e quatro horas do dia, a prumo, no transcurso do reto caminho a transitar
pela vida.

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