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Foi o santo recebido no Convento de Nápoles, aos dezoito anos de idade; e logo
desde os primeiros dias do noviciado era modelo de perfeição religiosa. Fez
pasmar o mundo, pouco acostumado então a semelhantes exemplos, o retiro de
um jovem daquela qualidade e daquelas esperanças. Seus pais ficaram
admirados.
Sabendo o noviço que sua mãe se encaminhava para Nápoles com o intuito de o
tirar da religião, pediu ao Prior que o enviasse para Roma. Ali o seguiu a aflita
senhora, e não o encontrando, porque os Superiores o tinham mandado para
Paris, a fim de concluir os seus estudos, não desanimou nem desistiu do
empenho. Escreveu imediatamente aos seus dois filhos mais velhos, Landulfo e
Reinaldo, que serviam nos exércitos do imperador Frederico, e que então se
achavam na Toscana, para que por todos os modos diligenciassem prender seu
irmão Tomás, e lho remetessem com boa escolta. Assim o cumpriram os dois
irmãos.
A Condessa, que não queria que seu filho abraçasse o estado religioso, tendo-o
agora à sua disposição, valeu-se de todos os artifícios para o abrigar a despir o
hábito: rogos, razões, lágrimas, lisonjas, ameaças, tudo empregou, mas tudo sem
proveito. O santo jovem respondeu-lhe sempre muito respeitosa e modestamente,
mas com toda a firmeza, que Deus era o seu primeiro e soberano Senhor, e que a
sua voz era mais forte que a da carne e do sangue; e visto que Ele o chamava
para a religião, pedia aos seus pais que não lhe pusessem obstáculos.
Vendo que nada adiantava, a Condessa encomendou a empresa a uma filha sua,
dama de singularíssimo respeito, fiando da sua discrição, da sua arte e das suas
lágrimas o triunfo sobre a resistência de Tomás; mas este, como adquiria todos os
dias novas forças, recorrendo à oração, sustentou o rude ataque com tanto êxito,
que longe de entibiar no fervoroso empenho de se manter no estado que
escolhera, persuadiu sua irmã a fazer-se também religiosa, – o que ela realizou
pouco depois no Convento de Santa Maria de Cápua, onde foi Abadessa e veio a
morrer santamente.
A vitória que o santo conseguiu de seus irmãos, não foi tão vantajosa nos efeitos,
mas muito mais custosa. Tendo voltado do exército, Landulfo e Reinaldo,
deixando-se levar unicamente pelo orgulho e pelo espírito de soldados, quiseram
realizar a empresa à viva força. Encerraram Tomás na torre do castelo,
arracaram-lhe o hábito, fazendo-o em mil pedaços, e tentaram cansar a sua
perseverança com o rigor de cruéis tratamentos.
Sob a direção de tal mestre, fez Tomás assombrosos progressos; porém, tão
ocultos no véu da modéstia, que os seus condiscípulos chamavam-lhe o boi
mudo. Mas, por maior cuidado que tivesse de confirmar pelo silêncio a opinião
menos vantajosa que corria da sua capacidade, a penetração do seu espírito
traduzia através da profunda humildade, e aquele pretenso boi mudo, tornou-se
dentro de pouco tempo o oráculo de todo o universo e o Anjo das Escolas.
Dava sempre princípio ao estudo pela oração; e ele mesmo confessou que as
dúvidas que se lhe ofereciam, o seu principal oráculo era o Crucifixo. Ensinou em
Bolonha, em Fondi, em Pisa e em Orvietto, com a mesma reputação que em Paris;
e em todas as partes deixou provas da sua santidade e sabedoria.
Posto que houvesse recebido por especial privilégio o dom da pureza, nada
poupou que pudesse servir à conservação de tão delicada virtude. Nunca fitou o
rosto de mulher alguma, e toda a vida evitou escrupulosamente todas as
conversações que pôde desculpar com este sexo.
A ternura de São Tomás para com a Santíssima Virgem, constituiu desde o berço
parte do seu caráter. Muitas vezes lhe apareceu esta Soberana Rainha durante a
vida; e poucos dias antes de morrer assegurou-lhe, que ele nada tinha pedido ao
Filho por intercessão da Mãe, que não tivesse conseguido.
Seria interminável a relação das virtudes e das maravilhas deste grande gênio.
Nunca deixava de pregar a Palavra de Deus; e estando a exercer este ministério
pela Oitava da Páscoa na Basílica de São Pedro, curou de um fluxo de sangue
uma mulher, que tocou a fímbria das suas vestes.
A sua vida foi uma perpétua cadeia de milagres, o mais visível dos quais, como
notaram os próprios Sumos Pontífices, é que um só homem em menos de vinte
anos, pudesse ensinar com inaudito aplauso em quase todas as Universidades
mais célebres da Europa; combater e dissipar com os seus escritos os maiores
inimigos da Igreja; converter com os seus Sermões grande número de pecadores e
de hereges; compor aquela prodigiosa multidão de sapientíssimas obras, que
podem chamar-se o Tesouro da Religião; explicar com tanta precisão e com tanta
solidez os Mistérios mais obscuros da Teologia; ensinar com tanta unção e nitidez
as verdades da Moral; expor com tanta clareza nos seus sábios Comentários os
Livros da Sagrada Escritura; satisfazer tão plenamente a quantas dúvidas que
incessantemente e de todas as partes lhe propunham como a Oráculo; e apesar
disto, dar todos os dias muitas horas à oração; não se dispensar quase nunca
dos mais ordinários exercícios da Comunidade; mascerar a sua carne com
austeríssima penitência, apesar de ter uma saúde fraca. Tal foi a vida de São
Tomás de Aquino.
Mas não se deve admirar, diz Santo Antonino, falando do nosso grande Santo,
que um homem que nunca perdia a Deus de vista e tinha frequente conversação
com as celestiais inteligências; que um homem, a quem tantas vezes se viu
arrebatado em êxtases maravilhosos, durando alguns por espaço de três dias
inteiros; um homem a quem os Apóstolos São Pedro e São Paulo ditavam a
exposição de suas Epístolas; não se deve admirar, que um homem assim
possuísse uma ciência tão profunda e operasse tantas maravilhas em favor da
Religião.
Foi isto o que armou a indignação de todos os hereges contra ele. Como é a este
admirável Doutor que se deve aquele método regular, que reina nas Escolas, com
o qual se resolvem as dúvidas, se arranca a máscara do erro e se explicam os
Dogmas da Fé, segundo a verdadeira inteligência da Igreja e dos Santos Padres; a
heresia não conheceu maior inimigo que São Tomás, porque nenhum heresiarca
tem podido defender-se contra a solidez, e, se é lícito falar assim, contra a
infalibilidade da sua doutrina.
E esta doutrina angélica, que tantas vezes e por tantos Papas tem sido elogiada, é
esta doutrina que o grande São Pio V reconheceu por uma das Regras mais certas
e infalíveis da Fé, tendo-se muitos Sagrados Concílios valido das próprias
palavras de Tomás, para a disposição dos seus Cânones.
Que heresia, diz o mesmo ilustre Pontífice, não tem sido desarmada pela doutrina
deste Santo Doutor? Que erro poderá levantar-se, cujo contra-veneno não se ache
na sua portentosa Summa? Cada artigo desta obra admirável, diz o Papa João
XXII, é um milagre. O que segue a doutrina de São Tomás, diz Inocêncio V, não
poderá transviar-se; e o que dela se afasta, expõe-se a errar.
Comparado aos Espírito Angélicos, não menos pela inocência do que pelo
engenho, mereceu o nome de Doutor Angélico, título que lhe foi confirmado por
São Pio V. Porém, o maior elogio deste grande Doutor e da sua assombrosa
doutrina, é o que lhe sucedeu, achando-se em Nápoles, quando compunha a
Terceira Parte da sua Summa.
Achava-se em Nápoles, dando fim às suas últimas obras, quando recebeu ordem
do Papa Gregório X para se apresentar no Concílio Geral, que acabava de
convocar em Lião; e não obstante estar ainda mal convalescido de uma espécie de
apoplexia, cuja violência o tinha privado dos sentidos, por espaço de três dias,
logo se pôs à caminho.
Chegado ao Mosteiro de Fossa-Nova, da Ordem de Cister, foi de novo assaltado
pela doença de que tinha sido atacado. Em virtude dos remédios que lhe
aplicaram e do caritativo desvelo com que os Monges acudiram a conservar
aquela preciosa vida, sentiu o Santo algum alívio. Aproveitando-se deste
intervalo, os referidos Monges pediram-lhe que lhes fizesse uma exposição do
Livro dos Cantares. Tomás começou a trabalhar nela, mas não a pode concluir,
porque o mal voltou a assaltá-lo com maior e mais perigoso ataque.
Tanto pelos milagres que tinha feito em vida, como pelos que continuaram depois
da sua morte, juntos à santidade da sua vida, o Papa João XXII canonizou-o no
ano de 13323, aos quarenta e nove anos depois de falecido; e no ano de 1567
mandou São Pio V, que em todo o mundo católico se rezasse o Ofício de São
Tomás, como de Doutor da Igreja.
Paris possui um osso do braço direito, e Nápoles outro. Esta segunda cidade
venera e honra São Tomás, como um dos seus Patronos e Protetores.