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CESTA DOS TESOUROS: uma experiência com crianças do berçário.

Renata Aparecida Dezo Singulani 1


Adriane Pereira Borges Scudeler2

Palavras-chave: Cesta dos tesouros. Bebês. Creche.

Introdução e objetivos

O atendimento às crianças de zero a cinco anos, nas escolas de


Educação Infantil, vem passando por algumas modificações, que nos obrigam
a repensarmos sobre a concepção de criança que orienta o nosso trabalho e o
quanto somos responsáveis pelo seu desenvolvimento.
A concepção assistencialista, voltada apenas para o cuidado das
necessidades físicas e biológicas das crianças foi substituída por uma
educação mais abrangente, que envolve o cuidar e o educar. Assim o
conhecimento que tínhamos em “cuidar” das crianças passou a ser insuficiente
diante da necessidade de um trabalho que buscava também o caráter
educativo.
Desta forma, as instituições de Educação Infantil, principalmente as
creches que atendem crianças de zero a três anos, deixaram de ser
consideradas como um local de cuidado e “acolhida às crianças pobres” para
se tornarem um espaço de cuidado educativo.
Segundo (ROSSETI-FERREIRA, 2003, p.9):

Não há um conteúdo “educativo” na creche desvinculado


dos gestos de cuidar. Não há um “ensino”, seja um
conhecimento ou um hábito, que utilize uma via diferente
da atenção afetuosa, alegre, disponível e promotora da
progressiva autonomia da criança.

Diante desse novo olhar para a educação das crianças pequenas e


pequenininhas, sentimos a necessidade em iniciarmos um trabalho de
formação continuada com os educadores das creches municipais de Santa
Cruz do Rio Pardo, SP. Os estudos com os profissionais aconteceram em 2011

1
Doutoranda em Educação (UNESP – Marília), Gestora do Fórum Paulista de Educação
Infantil, resingulani@gmail.com.
2
Mestranda em Educação (UNESP-Marília), Gestora do Fórum Paulista de Educação Infantil,
adrianescudeler@yahoo.com.br.

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e 2012, teve como embasamento teórico a teoria histórico-cultural, com o foco
para o desenvolvimento infantil, o papel do educador, a organização dos
espaços e as implicações pedagógicas dessas questões no dia a dia com as
crianças.
Este artigo tem como objetivo relatar e discutir uma das atividades que,
após os estudos, passou a fazer parte da rotina das salas do berçário: a cesta
dos tesouros.

Metodologia

A metodologia utilizada envolveu encontros mensais de estudo e


formação com as educadoras do município, reuniões entre diretora e
educadora de cada instituição e acompanhamento das práticas pedagógicas.
Os encontros mensais eram direcionados às monitoras, de acordo com
a faixa etária em que estavam trabalhando, de modo a aprofundarmos e
discutirmos as questões referentes ao desenvolvimento das crianças da sua
turma. Nesses encontros estudávamos quais atividades mais contribuíam para
o desenvolvimento das crianças em cada etapa do seu desenvolvimento.
Embasadas em Mukhina (1996), as atividades abrangidas foram: a
comunição emocional estabelecida entre adulto/criança no primeiro ano, a
atividade objetal na primeira infância e a brincadeira de papeis na idade pré-
escolar. Em seguida o foco era para as práticas pedagógicas consideradas
mais adequadas ao desenvolvimento das crianças. Nesse momento,
apresentamos às educadoras das crianças de zero a um ano, a atividade da
cesta dos tesouros (MAJEM E ÓDENA, 2010), como sugestão de uma
atividade promotora do desenvolvimento dos bebês.
De volta à creche, cada diretora se reunia com as educadoras de sua
instituição, para discutirem as possibilidades de alterações na prática das
educadoras, diante dos enfoques abordados na formação, a fim de garantir um
atendimento de qualidade às crianças.
Levantados os pontos a serem transformados, a diretora acompanhava
seu grupo, dando suporte teórico e prático para que as mudanças, de fato,
acontecessem.

Discussão e considerações finais

De acordo com a teoria histórico-cultural, base teórica da formação, a


criança pequenininha desenvolve suas características humanas ao se
relacionar com as pessoas e com os objetos culturais existentes em seu meio.
Para Vigotski (1983), as qualidades humanas não são dadas ao
homem biologicamente, mas fazem parte de um processo que é histórico e
cultural. Sendo assim, o processo de humanização está relacionado às
experiências de vida e educação vivenciadas pelo sujeito.

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Visto que as crianças pequenininhas dependem dos adultos para
satisfazer todas as suas necessidades (VIGOTSKI, 1996), na escola da
infância, os educadores que serão os responsáveis por apresentar o mundo a
elas.
Nesse período, além das crianças estabelecerem uma relação
emocional bastante intensa com os adultos (MUKHINA, 1996), elas também
são curiosas por conhecer as coisas que estão a sua volta. Gostam de ver
objetos coloridos, de pegar, manusear, jogar, bater, morder, lamber...e por
meio dessas experiências vão ampliando seu conhecimento de mundo e se
desenvolvendo. Assim, quanto mais amplo for o contato da criança com a
cultura, maiores possibilidades elas terão de desenvolverem suas qualidades
humanas.
Nesse contexto, o espaço da instituição de educação infantil, pode se
tornar um aliado do educador nesse trabalho, quando estiver organizado de
forma a disponibilizar às crianças uma grande quantidade e variedade de
objetos, o tempo todo, quando despertar nelas o desejo e a curiosidade em
conhecer as coisas, quando possibilitar a exploração dos movimentos corporais
e oferecer também a cultura mais elaborada (FARIAS E MELLO, 2010),
representada pela forma final e ideal de toda produção humana (VIGOTSKI,
2011).
Para Leontiev (1978), o processo de desenvolvimento humano se
completa quando a criança ao se relacionar com as pessoas e a cultura, seja
colocada como sujeito ativo da atividade, pois segundo o autor, a criança
precisa estar em atividade para se apropriar das características humanas.
Considerando a necessidade das crianças de até um ano se
relacionarem emocionalmente com as pessoas e ampliarem seu conhecimento
de mundo, a atividade com a cesta do tesouro, se apresenta como uma
alternativa de atividade adequada e eficiente para o desenvolvimento das
crianças que frequentam a creche.
As crianças do berçário, sobretudo os bebês de 4 meses, também
precisam de movimento e não podem ficar deitadas por muito tempo. É
importante que sejam colocadas no chão, em tapetes e almofadas com total
segurança, mas que também consigam visualizar as outras crianças. Elas
gostam de ver e observar o que tem ao redor.
[...] Os olhares, as mímicas, as atitudes e as posturas
corporais, as vocalizações e a maneira de se deslocar
estão carregadas de significado. Alegrias e satisfações, às
vezes decepções, mas também sugestões, aprovações,
aceitações, rejeições, etc. são claramente percebidas:
mensagens cognitivas e afetivas são amplamente
solidárias. (MAISONNET, 2011, p. 39).

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As crianças são capazes de interagirem. Brincam socialmente, se
comunicam e afetivamente se contagiam.
A Cesta do Tesouro é um importante recurso que pode ser trabalhado
desde o início do ano nas turmas de berçário. Na cesta são colocados diversos
objetos para as crianças que já estão sentando e começando a engatinhar,
explorarem. É uma experiência rica, pois segundo as autoras Elinor
Goldschmied e Sonia Jackson (2006, p. 115):
Ao observar proximamente um bebê com os objetos
contidos no Cesto de Tesouros, podemos perceber
quantas coisas diferentes ele faz com eles, olhando,
tocando, apanhando-os, colocando-os na boca,
lambendo-os, balançando-os, batendo com eles no chão,
juntando-os, deixando-os cair, selecionando e
descartando o que o atrai ou não.

As crianças são curiosas, atentas e querem conhecer e descobrir


coisas novas. A cesta dos tesouros é um atrativo que permite aos bebês
realizarem, com os objetos, novas experiências.
Para Goldschmied (2006, p. 116):
A concentração de um bebê nos conteúdos de um Cesto
de Tesouros é algo que assombra os observadores que a
notam pela primeira vez. A atenção concentrada dos
bebês pode durar até uma hora ou mais.

Nesse contexto, as observações do adulto que está junto das crianças


são extremamente importantes, pois, por meio delas “poderão conhecer os
interesses, preferências e progresso de cada uma.” (MAJEM, ÒDENA, 2010, p.
27).
A presença do adulto próximo aos bebês, enquanto estão brincando
com a cesta é fundamental para transmitir segurança a eles, além de ser
também um “ponto estável de referência.” (MAJEM, ÒDENA, 2010, p. 27).
Enquanto a criança brinca com a cesta desenvolve a percepção, a
atenção, a memória, o pensamento e descobre coisas como: o paladar, tato e
olfato.
Brincando com os objetos da cesta o bebê não deixa de se comunicar
com quem está a sua volta. Quando ele pega um objeto e sorri para o adulto
que está próximo dele, como que contando que está com algo que o faz feliz, é
uma forma de comunicação que ele estabelece com o educador.
Conforme Majem e Òdena (2010, p. 25), a comunicação também
ocorre entre as crianças:
Ainda que a brincadeira seja individual, a manipulação
dos objetos, as expressões das crianças e as satisfações

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pessoais suscitam as relações entre elas: interesse pelas
atividades de cada uma, sorrisos, gritinhos etc.

Dessa forma a criança também descobre e faz pesquisa. Sente a


textura dos objetos, descobre que alguns fazem barulhos, tenta alcançar outros
que estão longe de suas mãos e estende seu corpo cada vez mais, até que
consiga alcançá-los.
Muitos materiais podem compor a cesta e quanto mais diversificados
forem mais enriquecedora é a experiência da criança.
É adequado que a cesta não seja de material plástico, mas feita,
preferencialmente, com um material resistente, com as laterais retas para os
bebês se apoiarem para pegar os objetos. Também é interessante que não
tenha alça, pois elas podem atrapalhar a brincadeira das crianças.
A variedade de materiais na cesta possibilita aos bebês fazerem
algumas escolhas. Os objetos devem ser de materiais naturais e não de
plástico, como por exemplo, cones, pedaços de esponja, rolhas grande, alças
de sacolas feitas de bambu, anel de osso, escova de dente, escova de
sapatos, pincel para barba, aro de cortina, cubos, sino, bolas diversas,
saquinhos cheios de feijão e outros que a educadora achar interessante.
O adulto tem papel essencial ao oferecer a cesta para as crianças, pois
ele deve estar atento, observando e garantindo a segurança dos pequenos,
porém não deve intervir, pois as crianças são capazes de buscar os objetos e
bem se relacionar na brincadeira.
Essa atividade contribuiu para o enriquecimento das experiências dos
bebês na creche e para a ampliação do seu conhecimento de mundo, além de
uma relação prazerosa com a educadora e seus pares. Ela passou a fazer
parte da rotina da turma do berçário e possibilitou aos bebês se desenvolverem
num espaço de cuidado educativo.

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