Você está na página 1de 8

A etica em Emmanuel Kant

A preocupação de Kant, na construção de sua ética puramente formal, é uma etica da


libertação do homem das amarras das realidades empíricas e colocá-lo somente sob a
guarda racional da lei. Por isso para a melhor compreensao da ética Kantiana, deve-se
primeiramente perceber a questao da boa vontade na ação moral, e dai perceber a primazia
do dever.

Em Kant, para encontrar as condições de possibilidade da lei moral em relação à qual que
se julga a moralidade do agir humano, procura estabelecer o que permite a possibilidade do
imperativo categórico que é uma lei moral universal, mas baseada segundo o uso da razão.

A ética formal que Kant elaborou constitui uma vasta reflexão, contudo, nós aqui, dedicar-
nosemos à analise do Dever kantiano, tendo para isto que realizar uma pequena exposição
da boa vontade como pressuposto e os princípios práticos como execução de seu rigorismo
ético.

Segundo Kant (2005) a ação humana deve basear-se na boa vontade. Deve-se salientar que
Kant propõe quase todos os elementos essenciais da sua moral e coloca a possibilidade de
se inventar uma nova moral, mas tão-somente de deslindar pela análise o princípio supremo
da moralidade”, (Kant, 2005, p. 118).

Os talentos do espírito, os propósitos, a inteligência, a faculdade de julgar, a coragem, que


são qualidades do temperamento, etc., são bons e desejáveis absolutamente, porém, podem
chegar a ser máus e perniciosos, caso a vontade não seja boa; porque na verdade, seu valor
depende do uso que delas se faça. O mesmo ocorre com o poder, dinheiro, honra e a própria
felicidade que podem acobertar arrogância se não há uma boa vontade.

Em Kant (2005) a boa vontade é a condição indispensável para a consecução da felicidade.


Contudo, há qualidades favoráveis a essa boa vontade as quais podem facilitar a sua obra,
porém não há um critério absoluto, mas sim um valor interior da pessoa, subjetivo. Esta
vontade não é boa pelo que realiza (mesma que nada realize), mas sim pelo querer, é boa
em si mesma. Ela é a base do bom uso de todas as tradicionais características da virtude,
como mostra que “não, é certamente, os seus êxitos, nem a aptidão para levar a bom termo
os seus propósitos; é a própria natureza do querer do homem”, (Kant, 2005, p. 330).
Kant concorda que apenas e somente com a razão pura não é suficiente para dirigir a
vontade humana para a realização de nossas necessidades, as quais seriam melhor
conduzidas por um instinto natural. Desta feita, a razão deve influir sobre a vontade, sendo
que o destino verdadeiro da razão deve ser produzir uma vontade boa, sendo boa em si
mesmo

Em termos de poder compreender o conteúdo desta boa vontade que seria boa em si mesma
deve-se estudar o conceito de dever em Kant, onde afirma que “a boa vontade é a vontade
de agir por dever” (idem). Assim como afirma “ a boa vontade é o ponto de partida de toda
reflexão ética, pois sem a boa vontade, que é tal em si, sem nenhuma limitação, nada mais
pode ser dito bom moralmente” (Kant, 1999, p. 337).

Segundo Paton (2005), A boa vontade é boa sem limites. Mas em nós, seres finitos: “ela
não representa uma vontade santa ou inteiramente perfeita como a de Deus, por estar sujeita
às influencias das paixões e inclinações sensíveis” (Paton (2005), apud Maritain, 1973, p.
121).

Para Maritian (1973), em Kant, a boa vontade só é boa quando se submete a uma educação
e lei que coage essas inclinações dos sentidos e da nossa natureza empírica. Kant, com esta
teoria, “se glorifica de ter fundado uma moral autônoma” (Maritian, 1973, p. 118).
Contudo, esta teoria da boa vontade se torna muito mais compreensível quando leva em
consideração suas convicções e inspiração pietistas, onde há uma supremacia desta boa
vontade absolutamente dependente dos atributos morais, sendo até mesmo revestida de um
caráter sagrado.

Para Silveira (2004), em Kant, só a vontade humana é boa ou má, e afirma que “toda
matéria, conteúdo das ações em si não podem ser consideradas nem boas e nem más, pois
só os princípios podem ser considerados dessa maneira” (Silveira, 2004, p.57).

É a definição de uma ética formal e da recusa a todas as éticas materiais, dependendo


sempre da vontade do sujeito o valor da ação; e a intenção do sujeito moral é determinante
para o valor da ação moral. A boa vontade neste caso é considerada em si mesma, como
fim próprio, sendo a vontade boa é feita pelo querer. Desta forma, Kant afirma, nos
Fundamentos da Metafísica dos Costumes, que:
“A boa vontade não é boa pelo que efetivamente realize, não é boa pela sua adequação para
alcançar determinado fim a que nos propusemos; é boa somente pelo querer; digamos, é boa
em si mesma. Considerada em si própria, é, sem comparação, muito mais valiosa do que
tudo o que por meio dela pudéssemos verificar em proveito ou referência de alguma
inclinação e, se quisermos, da suma de todas as inclinações”, (Kant, 1981, p. 38).

Em resumo, deve-se perceber a etica kantiana como uma ética formal, onde a vontade é
boa em si mesma, independendo do conteúdo, apenas valorizando a norma pela norma, que
se percebe como o dever ou imperativo e diferindo de uma ética material, que privilegiaria
a finalidade e conteúdo da ação meramente material.

A ética em Aristotélica

O estudo do pensamento de Aristóteles é fundamental ao es tudo da ética, focada na


felicidade como o fim ultimo da existencia humana e de grupos sociais. Ninguém consegue
escrever e falar de ética sem falar e tratar de Aristóteles, seja para inspirar-se, seguir ou
criticar sua concepção. Aristóteles foi o grande sistematizador da ciência ocidental . O
ponto de partida de Aristóteles é a reflexão acerca da ciência. Divide o saber em teórico,
prático e poiético. Na sistematização aristotélica do saber as ciências práticas vêm em
segundo lugar. Estas são hierarquicamente inferiores às ciências teóricas, enquanto nas
ciências práticas o saber não é mais fim para si mesmo em sentido absoluto, mas
subordinado e, em certo sentido, servo da atividade prática.

“Estas ciências práticas, de fato, dizem respeito à conduta dos homens, bem como ao fim
que através dessa conduta eles querem alcançar, seja enquanto indivíduos, seja enquanto
fazendo parte de uma sociedade, sobretudo da sociedade política” .

Neste sentido, Aristóteles é o fundador da ética como “ciência prática”, em contraposição à


ética como “ciência teórica” intentada por Platão3 . O pensamento ético de Aristóteles,
pode-se dizer, é desenvolvido, sobretudo, nas obras: Ética a Eudemo, Ética a Nicômacos,
Política e Grande Ética.
A Ética a Nicômacos é a obra ética mais importante de Aristóteles e uma das obras que
mais fortemente inspirou o pensamento ocidental. Para melhor entendê-la, urge situá-la na
evolução do pensamento de Aristóteles.

A Ética a Nicômacos, para Aristóteles, o primado é da práxis e não da teoria. O


pensamento deve contribuir para a própria atividade da vida humana. Aqui o pensamento
não tem no próprio pensamento o seu fim, mas ele é prefácio à praxis. O fim da teoria é
contribuir para a bondade da práxis humana. Para Aristóteles, o existir e o ser éticos
supõem a vida na pólis. É a condição da vida racional. Assim, o engajamento político é
pressuposição de teoria política. Para Aristóteles, ética neutra é contra-senso. Pretendê-la
significa desconhecer a estrutura específica da ciência em questão. A reflexão ética é o ato
através do qual o homem rompe o caráter opressor de todo “ethos” e transforma sua vida,
até então realizada ingenuamente no seio de determinado “ethos”, numa vida racional,
produzida pela razão consciente de si. Da reflexão ética não resulta necessariamente a
destruição do “ethos” vigente, mas, antes, a legitimação racional da ação humana, ou seja, a
compreensão das razões que justificam tal modo de agir. Trata-se, em Aristóteles, da
unidade originária entre um fato e uma exigência moral, isto é, uma síntese entre o
incondicionado e o condicionado. Ver a respeito, MANFREDO ARAÚJO DE OLIVERIA,
op. cit., pp. 55-77. Síntese Nova Fase, Belo Horizonte, v. 24, n. 78, 1997 385 trumental-
mecanicista” do pensamento aristotélico4 . Esta fase começa, em 347, quando Aristóteles
deixa Atenas, após a morte de Platão, e vai, provavelmente, até 335/334, quando Aristóteles
rompe com certos aspectos da doutrina platônica. Nesta fase, Aristóteles renunciara a
doutrina das idéias e rejeita o pessimismo platônico. A concepção aristotélica do homem,
neste período de transição, situa a alma hierarquicamente acima do corpo, mas sem dar-lhe
qualquer transcendência. O corpo é um instrumento da alma e deve colaborar com ela na
realização da sua tarefa enquanto homem. A alma comanda e o corpo obedece. O corpo é
subordinado como instrumento da alma5 . O corpo é, total e exclusivamente, feito para o
bem da alma6 Outro ponto importante a elucidar é o método aristotélico subjacente à Ética
a Nicômacos. Aristóteles não aceita o método matemático de Platão7 . Condena
absolutamente a exigência de um método geométrico exato. Deve-se tratar de ganhar com o
raciocínio, porém empregando os fenômenos como provas e como exemplos. Ademais, é
necessário pôr a norma filosófica em harmonia com as idéias éticas imperantes, colocando
de manifesto o núcleo de verdade encerrado nelas por meio de uma manipulação
conceptual das mesmas8 . Aristóteles, na Ética a Nicômacos, opõe-se, explicitamente, aos
que pedem um método exato9 . Este é incompatível com a natureza da ética. A ciência
aristotélica é a ética aplicada e não a ciência abstrata. A ética aristotélica é uma ética do 4 A
respeito das fases da evolução do pensamento aristotélico, ver MARCELO PERINE, Nas
origens da Ética Ocidental: Ética a Nicômaco, in Síntese 25 (1982): 21-38. Ver também
Giovanni Reale, op. cit., pp. 315-318. 5 Ética a Nicômacos, VIII, 11, 1161 a. 6 Ver a este
respeito, R. A. GAUTHIER, La morale d’Aristote, Paris, 1963, p. 18. 7

O procedimento metodológico, em Aristóteles, é bem diverso daquele de Platão. A reflexão


ética não pode partir do incondicionado. Deve partir da experiência éticoprática. Trata-se,
pois, não de partir da idéia do bem enquanto tal, mas de fazer emergir o bem a partir da
pólis e das suas instituições. Ver a respeito, Manfredo de Araújo de Oliveira, op. cit., pp.
55-71. Aristóteles foi o primeiro a oferecer uma apresentação consistente das disposições
da ação constitutivas para uma vida bemsucedida, ou seja, para uma práxis racional. Para
designá-la, o filósofo utilizou uma nova expressão ética, criada a partir da palavra grega
“ethos”. O termo grego designa o local de estada permanente e habitual, e, por conseguinte,
também a morada do costume e da moral. Essa morada contém e orienta nosso agir, mas é
também reproduzida e modificada por ele. Aristóteles refere-se à disciplina que criou como
a “filosofia das coisas humanas” (Ética a Nicômacos, X, 9, 1181 b), diferenciando-a da
filosofia teórica. Ver a respeito, ROBERT SPAEMANN, Felicidade e benevolência: ensaio
sobre ética, São Paulo, Loyola, 1996, p. 27. 8 Cf. WERNER JAEGER, Aristotes, México,
Fondo de Cultura Economica, 1946, pp. 267-269. 9 Para bem compreender esta oposição
de Aristóteles ao método matemático, é imprescindível ter clareza da diferença entre as
ciências exatas e a ciência ética. A ciência exata é uma ciência demonstrativa, tem um
raciocínio exato, parte dos primeiros princípios — sendo estes adquiridos por abstração dos
dados sensíveis. Já a ciência ética não consiste em partir dos primeiros princípios, mas
remontar aos princípios, parte não da inteligência em si, mas disso que nos é familiar, dos
fatos e remonta à razão subjacente, resgata os princípios da conduta. Além disso, a ciência
ética, deve: — aceitar, aprovar sobre questões morais, as opiniões gerais que repre- 386
Síntese Nova Fase, Belo Horizonte, v. 24, n. 78, 1997 bom senso, fundada nos juízos
morais do homem que possa considerar-se, em geral, bom e virtuoso. Aristóteles procurou
fundar sua ética referindo-se à natureza humana como tal.

A Etica em John Locke

A etica em Locke, deve ser percebida como uma ciencia baseada em direitos naturais
(humanos).

John Locke (1632-1707), além de ser um dos principais fundadores do empirismo inglês e
autor de importantes tratados de fi losofi a política, geralmente é considerado um dos
primeiros fi lósofos utilitaristas, embora, como diria Sidgwick (1892, p. 178), seu
utilitarismo permanecesse “latente e inconsciente”. Para o autor de Outlines of the History
of Ethics, isso significa que Locke não justifi ca sempre as regras morais por sua tendência
geral de produzir a felicidade, mas também sustenta que são “intuições” no sentido de
serem proposições que qualquer ser racional verá que são auto-evidentes ao contemplá-las.

Assim como Hobbes, Locke não escreveu obras de caráter eminentemente ético, mas seus
trabalhos sobre o governo e suas discussões políticas sobre o problema da tolerância entre
sistemas de crenças divergentes etc. possuem muitos pressupostos morais que contribuíram
para a formação de uma ética moderna. A principal contribuição de Locke nesse domínio,
como veremos, são seus estudos sobre direitos naturais. Por conseguinte, enquanto Hobbes
fundava eticamente seu contratualismo em leis naturais, Locke fundamenta o
contratualismo político nos direitos naturais. Não trataremos aqui, todavia, das idéias
políticas de Locke. Os direitos naturais são o padrão de correção das regras. Em outros
termos, podemos julgar se uma lei de um determinado país é justa (ou não) referindo-a aos
direitos naturais. Direitos naturais são, enfim, direitos morais, e não direitos legais. Para
começar, é importante salientar que, para Locke, há três tipos principais de ciência: 1.
aquelas que tratam da natureza das coisas como são em si mesmas, suas relações e suas
maneiras de operação; 2. aquelas que tratam do que o próprio homem deve fazer, como
agente racional e voluntário, para a obtenção de algum objetivo, principalmente a
felicidade; e 3. aquelas que tratam dos meios pelos quais o conhecimento das duas
primeiras pode ser apreendido e comunicado. Entre as do segundo grupo, segundo Locke,
está a ética, que “consiste na procura de regras e medidas das ações humanas que levam à
felicidade e os meios para praticá-las. O fim disso não é simples especulação e
conhecimento da verdade, mas o correto e a conduta que lhe é adequada” (LOCKE, 1980,
p. 343). Desse modo, a ética poderia derivar regras de conduta a partir de proposições auto-
evidentes por suas conseqüências necessárias, “tanto incontestáveis quanto aquelas da
matemática”. Geralmente, os intuicionistas consideram as verdades éticas, tais como “não
torture uma pessoa inocente desnecessariamente”, como verdades tão exatas quanto as da
aritmética. Locke critica, no Ensaio sobre o entendimento humano, a doutrina das idéias
inatas de Descartes e defende que todo conhecimento está fundado na experiência, por isso,
também não há poder inato e de origem divina, como mostra no Primeiro tratado, o que
conduz a uma posição política diferente do absolutismo hobbesiano. Todavia, a ética, tal
como foi definida acima, é uma ciência dedutiva sobre regras de conduta. Como isso pode
ser o caso? Não há contradição aqui, pois o fim de todas as ações, o prazer ou a É
necessário mencionar, contudo, que Locke esteve diretamente envolvido em vários
acontecimentos políticos da Inglaterra, tendo inclusive que se refugiar na Holanda.
Somente voltou à Inglaterra em 1649, após a Revolução Gloriosa que marcou o início do
domínio burguês no país. Lembremos, também, que, em 1649, o Rei Carlos I fora
condenado pelo Parlamento e executado.

felicidade, é descrito por conceitos que são derivados da experiência, mas cujas relações
lógicas são encontradas por análise reflexiva. Desse modo, não existem princípios práticos
inatos (LOCKE, 1980, p. 148). Locke sustenta, então, que a virtude moral é uma
conformidade aos costumes e à lei e que esses podem ser valorados por padrões mais
fundamentais, principalmente por sua utilidade (ou não) e a partir dos direitos naturais.
Vamos aprofundar aqui, então, sua concepção de direitos naturais.

____. Fundamento da Metafísica dos Costumes. (Trad. Lourival de Queiroz Henkel). São
Paulo: Ediouro, 1981. (Col. Universidade de Bolso)
Cf. MANFREDO ARAÚJO DE OLIVEIRA, Ética e sociabilidade, São Paulo, Loyola,
1993, p. 55. 2 GIOVANNI REALE, História da Filosofia Antiga, V II, São Paulo, Loyola,
1994, p. 405. 3

Você também pode gostar