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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ


Comarca de Crato
2ª Vara Cível da Comarca de Crato
Rua Álvaro Peixoto, S/N, São Miguel - CEP 63100-000, Fone: (88) 3521-3326, Crato-CE - E-mail:
crato.4@tjce.jus.br

SENTENÇA

Processo nº: 0050322-65.2020.8.06.0071


Apensos: Processos Apensos << Informação indisponível >>
Classe: Procedimento Comum Cível
Assunto: Obrigação de Fazer / Não Fazer
Requerente: Andre de Oliveira Mendonça

Requerido: Estado do Ceará

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por JOSE FLAVIO BEZERRA MORAIS, liberado nos autos em 10/09/2020 às 17:01 .
Vistos etc.

Para conferir o original, acesse o site https://esaj.tjce.jus.br/esaj, informe o processo 0050322-65.2020.8.06.0071 e código 73A1658.
Trata-se de ação de obrigação de fazer c/c pedido de antecipação de tutela
proposto por ANDRÉ DE OLIVEIRA MENDONÇA contra o ESTADO DO CEARÁ. Alega
a parte autora, em síntese, é Policial Militar do Estado do Ceará desde 10 de setembro de
2010, contando, atualmente, com mais de 9 (nove) anos de serviços prestados à corporação.
Ocorre que, em 2017, não teria almejado sua promoção à Cabo da Policia Militar do Ceara em
virtude de "ter sido denunciado em processo crime, conforme estabelece o inciso II do art. 7º ,
da Lei nº 15.797/2015, ( Lei de Promoções dos Militares Estaduais do Ceara), conforme fez
público o BCG nº 203 de 30/10/2017.x Afirma, entretanto, que tal fato já foi superado, eis que
sua punibilidade foi extinta em decisão proferida no processo de nº
0036039.18.2012.8.06.0071, oriundo da 2ª Vara Criminal da Comarca do Crato/CE, na data
de 06.07.2019. Alega que não responde a nenhum outro processo, seja na via administrativa,
seja judicial. Informa que, tendo apresentado novo requerimento de promoção, o mesmo foi
indeferido, conforme Despacho Publicado no Boletim do Comando Geral n.º 181 de
25/09/2019. Por tal razão, e por entender que a recusa administrativa em conceder sua
promoção viola o princípio constitucional da presunção de inocência, requer o deferimento de
seu pedido liminar, inaudita altera pars, para que seja determinada sua IMEDIATA
PROMOÇÃO AO CARGO DE CABO DA POLÍCIA MILITAR, sob pena de multa diária a
ser arbitrada em desfavor do Acionado, bem assim a final procedência com a confirmação da
antecipação de tutela.
Indeferida a antecipação de tutela por impedimento legal (fls. 36/39).
Citado, o ESTADO DO CEARÁ contestou às fls. 44/55. Alega a
impossibilidade de promoção de militar, eis que o demandante encontrava-se respondendo ao
processo criminal nº 0036039-18.2002.8.06 .0071, que culminou na suspensão condicional do
processo, o que constitui impedimento para que o militar seja promovido, conforme dicção do
art. 7º, incisos II e IV, da Lei nº 15.797/2015. Defende a aplicação do princípio da legalidade,
expondo que o pedido encontra embargo no art. 22, III, da lei de promoções, que não garante
o benefício a quem teve a extinção da punibilidade reconhecida em razão do decurso do prazo
da suspensão condicional do processo. Pede a improcedência.
Réplica às fls. 61/62.
É O RELATÓRIO. DECIDO:
O caso deve ser resolvido à luz dos princípios da legalidade e da presunção de
inocência.
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ


Comarca de Crato
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crato.4@tjce.jus.br

Com efeito, dispõe a Lei Estadual nº 15.797/2015:


Art. 6º Para fins de promoção por antiguidade e merecimento, deve o militar figurar no
Quadro de Acesso Geral, cujo ingresso requer o preenchimento dos seguintes requisitos,
cumulativamente:
(…)
Art. 7º O oficial ou a praça não poderá constar no Quadro de Acesso Geral, ou deste será
excluído, quando:
(…)
II - for recebida a denúncia em processo-crime, enquanto a sentença final não transitar em
julgado, salvo quando o fato ocorrer no exercício de missão de natureza ou interesse militar
estadual, ainda que durante a folga do militar, e não envolver suposta prática de
improbidade administrativa ou crime hediondo;

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por JOSE FLAVIO BEZERRA MORAIS, liberado nos autos em 10/09/2020 às 17:01 .
(…)
IV - for condenado em processo-crime, enquanto durar o cumprimento da pena, inclusive
no caso de suspensão condicional da pena e de livramento condicional, não se computando
o tempo acrescido à pena original para fins de sua suspensão condicional;

Para conferir o original, acesse o site https://esaj.tjce.jus.br/esaj, informe o processo 0050322-65.2020.8.06.0071 e código 73A1658.
V - encontrar-se submetido à suspensão condicional do processo, até decisão judicial
definitiva de extinção do benefício; (grifo nosso)
Portanto, a lei é clara ao dispor que a exclusão da praça do quadro de acesso
geral à promoção cessará quando houver decisão judicial definitiva de extinção do benefício
da suspensão condicional do processo.
É o que está a ocorrer no caso dos autos.
O autor esteve impedido de obter promoção após ter sido denunciado pela
prática de crime de lesão de natureza grave (rt. 129, § 1º, do CP) e enquanto perdurou a
suspensão condicional do processo que lhe fora proposta. Tendo ele, contudo, cumprido a
contendo todo o período de prova, e sem a incidência de qualquer motivo de revogação, o
juízo criminal competente declarou extinta a punibilidade (fl. 26), e, por consequência, a
"extinção do benefício" na dicção do inciso V, do art. 7º supra transcrito.
Ora, se ao denunciado é concedida, por força do art. 89 da lei nº 9.099/95, a
opção de se submeter a um período de prova como forma de exclusão do processo, não pode
essa opção, legal, benéfica e que bem atende à política criminal ditada pela CF/88, prejudicá-
lo, ainda mais ad eternum, como pretende a Administração Pública.
O direito ao benefício decorre de critérios objetivos estabelecidos em lei, e a
submissão do interessado lhe garante a extinção da punibilidade penal caso cumpra as
condições, sem qualquer incursão a uma eventual culpa. Vale dizer, a suspensão condicional
do processo não é benefício para criminosos, mas, ao contrário, para quem não é afeto à
prática de crimes, possui bom comportamento social e simplesmente não pretende se
submeter às mazelas da instrução criminal.
Extinta a sua punibilidade pelo cumprimento das condições da suspensão
condicional do processo, o autor só pode ter sua pretensão à promoção impedida por outros
motivos previstos na lei, inclusive por processo administrativo relativo ao mesmo fato.
Jamais, repita-se, pelo processo criminal em si, que deixou de existir.
Por fim, a não inclusão dos militares que tenham sido beneficiados com a Lei
dos Juizados Especiais Criminais fere expressamente o princípio da inocência consagrado na
Constituição Federal de 1988 e os Tratados Internacionais que foram subscritos pelo Brasil,
como por exemplo, a Convenção Interamericana de Direitos Humanos.
Deve-se observar que não é apenas a Constituição Federal de 1988 que sofre
violação, mas também a mens legis da Lei Federal 9009/95 que tem por objetivo permitir a
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ


Comarca de Crato
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crato.4@tjce.jus.br

inclusão e não a exclusão daqueles que receberam qualquer benefício estabelecido na lei, que
não afasta a primariedade ou mesmo signifique confissão de culpa.
Precedente:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. DIREITO CONSTITUCIONAL E
ADMINISTRATIVO. PROMOÇÃO NA CARREIRA. CURSO ESPECIAL DE
FORMAÇÃO DE SARGENTO. CANDIDATO IMPEDIDO DE PARTICIPAR DA
FORMATURA E DE SER PROMOVIDO POR TER ACEITADO A SUSPENSÃO
CONDICIONAL DO PROCESSO CRIMINAL. PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. ART.
5º, INCISO LVII, DA CR/88. PROMOÇÃO NA CARREIRA CONDICIONADA À
EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. DEMONSTRAÇÃO. RECURSO PROVIDO. I. Na
dicção do inciso IX, alínea b, e dos parágrafos 1º. e 2º, do artigo 203, da lei 5.301/69, o
militar que estiver sub judice, denunciado por crime doloso, detém a faculdade de

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por JOSE FLAVIO BEZERRA MORAIS, liberado nos autos em 10/09/2020 às 17:01 .
concorrer à promoção na carreira, mas a efetivação do benefício ficará condicionada à
absolvição por sentença transitada em julgado. II. Concedendo a lei o direito à suspensão
condicional do processo, a mera existência do procedimento transacional, não pode ser
empecilho para o candidato participar de processo seletivo, formatura e promoção, caso

Para conferir o original, acesse o site https://esaj.tjce.jus.br/esaj, informe o processo 0050322-65.2020.8.06.0071 e código 73A1658.
vencidas as etapas respectivas, por inexistir condenação penal transitada em julgado, sob
pena de violação ao princípio da inocência, previsto no art. 5º, inciso LXII, da CR/88. (TJ-
MG - AC: 10024103122578001 MG, Relator: Washington Ferreira, Data de Julgamento:
28/01/2014, Câmaras Cíveis / 7ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 07/02/2014)
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial para, afastando o
impedimento relativo à existência do processo crime nº 0036039-18.2012.8.06.0071, posto
que ali restou extinta a punibilidade do autor, determinar que o ESTADO DO CEARÁ efetue
a PROMOÇÃO do autor ANDRÉ DE OLIVEIRA MENDONÇA para a gradação de CABO
da Polícia Militar do Estado do Ceará, uma vez preenchidos os demais requisitos legais.
Permanece, contudo, o impedimento legal à antecipação de tutela, conforme
decisão de fls. 36/39, devendo a sentença ser executada somente após o trânsito em julgado,
garantido ao autor, todavia, o direito à retroação do benefício à data da decisão administrativa
de fl. 30 (18/09/2019).
Sem custas.
Condeno o promovido em honorários advocatícios, que arbitro em R$ 2.000,00
(dois mil reais).
P. R. I.
Crato/CE, 10 de setembro de 2020.

José Flávio Bezerra Morais


Juiz de Direito

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