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Luís Roberto Mello

Consultor Sênior do Instituto MVC,


Autor do livro Certificação Comercial, Professor dos MBAs executivos da FGV
 
 
 
DECIDINDO COM A RAZÃO E A EMOÇÃO
 
 
Tomamos decisões continuamente: que roupa vestir, o que comer no café da manhã, como
deslocar-se de casa ao trabalho, entre outras, só para citar algumas opções que
cotidianamente escolhemos. Essas decisões são tão costumeiras que, por vezes, nem
atentamos para o fato de estarmos decidindo.
 
Para os gestores, tomar decisões é provavelmente a principal atividade que executam.
Planejar, organizar, coordenar, comandar e controlar – as famosas atividades de gestão
listadas por Henri Fayol no início do século XX – envolvem necessariamente a tomada de
decisão. Contudo, quando as decisões envolvem situações não-costumeiras ou grandes
implicações em seus resultados é que percebemos a complexidade do processo.
 
Não raro vemos decisores cometerem erros que poderiam facilmente ser evitados. Listamos
alguns desses a seguir, visando brevemente discutir formas de superá-los.
 
Erro 1: Acreditar demasiadamente na intuição.
 
Diversos tomadores de decisão superestimam sua capacidade intuitiva, seu feeling no
momento da decisão, em detrimento da análise racional da situação ou do problema. Tomam
decisões que levam a situações de arrependimento que são caracterizadas por frases do tipo:
“Algo estava me dizendo para fazer assim” ou “Tinha tudo para dar certo”. Não reconhecem –
ou pouco valorizam – o fato de que o processo de tomada de decisão envolve determinadas
etapas que devem ser cumpridas na busca da melhor alternativa.
 
Essas etapas envolvem: (a) identificação do problema a ser resolvido ou da oportunidade a ser
aproveitada; (b) diagnóstico do problema ou oportunidade; (c) identificação e análise das
alternativas de decisão e (d) decisão propriamente dita e implementação. Essas etapas são
primordialmente analíticas; afinal, a qualidade da decisão a ser tomada é diretamente
proporcional à qualidade das informações disponíveis e da análise destas.
 
Acerto 1: Acreditar na intuição, mas acreditar primordialmente na razão.
 
É claro que há impeditivos para a análise completamente racional durante o processo de
tomada de decisão. Há restrições de tempo e de informação que limitam a racionalidade do
processo. E, nesses casos, a intuição pode contribuir para a decisão. Mas, somente após um
adequado processo analítico da situação e das alternativas.
 
Parodiando Thomas Edson: “O sucesso na tomada de decisão é 99% razão e 1% intuição”.
 
Erro 2: Valorizar demasiadamente o passado e acreditar por demais na experiência.
 
Um dos erros mais comuns no processo de tomada de decisão é acreditar que o futuro será
uma mera repetição do passado e que o que deu certo no passado continuará dando certo no
futuro. Por vezes, nos apegamos a situações e decisões que, no passado, deram certo e
acreditamos que basta repeti-las que o sucesso estará garantido. Diante de possíveis
inovações, essas pessoas costumam usar frases do tipo: “Mas isso nunca foi usado aqui” ou o
velho: “Em time que está ganhando não se mexe”.
 
Ocorre, nesses casos, o chamado paradoxo da experiência: quanto mais experiência
possuímos, menos ousados e audaciosos somos em nossas decisões. Isto porque adotar novas
práticas e medidas significa necessariamente sair da “zona de conforto” e “dar a cara à tapa”.
E assim, evitando situações onde se pode ouvir: “Está vendo, era melhor manter como sempre
fizemos”, diante de uma decisão nova que não atinja os resultados esperados.
 
Vale lembrar que, na década de 1980, a Intel tinha a maior parte de sua receita oriunda de
dispositivos de memória e pequena parcela originada de processadores. A empresa, então,
decidiu que focaria o mercado de processadores e “abriria mão” da sua “galinha dos ovos de
ouro”, que eram os dispositivos de memória. Hoje, já sabemos o final dessa história, mas
reflita: você decidiria por deixar de atuar em um mercado responsável por mais de 80% da
sua receita para investir em outro responsável por menos de 20%?
 
Acerto 2: Reconhecer a importância do passado para compreender a situação atual,
mas ter a consciência de que o que deu certo no passado pode não dar certo no
futuro.
 
Os tomadores de decisão devem usar técnicas de análise prospectiva que os auxiliem a
identificar as descontinuidades do mercado e os cenários que se mostram à frente. E,
principalmente, devem estar dispostos a deixar a “zona de conforto” e a lidar com o risco.
 
Erro 3: Pensar principalmente na decisão em detrimento da implementação.
 
Muitas vezes, encontramos alternativas que, na teoria, parecem ótimas. Contudo, durante a
implementação da decisão, percebemos as dificuldades de colocá-las em prática. Isto, na
maioria das vezes, acontece pela falta de envolvimento dos responsáveis pela implementação
no processo de tomada de decisão. E, se não conseguimos envolver essas pessoas no processo
e convencê-los da adequação da alternativa, provavelmente haverá boicote à decisão.
 
Quando a decisão é unilateral, os demais envolvidos não assumem a responsabilidade pelo seu
sucesso, muitas vezes porque não acreditam na solução proposta, outras tantas por que pouco
ou nenhum mérito do sucesso lhes será concedido – simplesmente porque não a tomaram.
Acaba por surgir a situação em que o decisor adota a postura: “Eu venci, nós empatamos, eles
perderam”.
 
Acerto 3: Pensar na decisão e na sua implementação.
 
Envolver as pessoas envolvidas na implementação da decisão em seu processo de tomada não
significa imiscuir-se da responsabilidade de decidir. Há diversos modelos de tomada de decisão
desde os mais autocráticos até os mais democráticos que implicam a responsabilidade do
decisor e a participação dos demais envolvidos. Como dissemos, o modelo autocrático tende a
gerar boicote em relação aos resultados. O modelo democrático, por sua vez, tende a enfatizar
as pessoas envolvidas e não o problema a ser resolvido. Há, porém, sempre o caminho do
meio, onde a responsabilidade de decidir continua nas mãos do gestor, mas os demais
envolvidos podem influenciar essa decisão com sua participação.
 
Erro 4: Não reconhecer seu estilo de decidir.
 
As pessoas decidem de forma diferente, isso é óbvio. Se observarmos o modelo desenvolvido
pela consultoria americana Integro baseado no LIFO – Life Orientations – perceberemos que
existem quatro estilos básicos de personalidade: catalisador; controlador; apoiador e analítico.
 
O catalisador é voltado para a geração de idéias e costuma ser bastante criativo. Consegue
obter o apoio das pessoas ao redor às suas idéias, sendo bastante entusiasmado e persuasivo
em relação às suas decisões. Contudo, tende a ser pouco detalhista, observando apenas os
aspectos macros da decisão. Ou seja, tem dificuldade em vislumbrar os aspectos relativos à
implementação da decisão e pode gerar uma certa descrença em relação às decisões que
toma.
 
O controlador costuma ser objetivo e rápido em suas decisões, onde se volta primordialmente
para os resultados a serem alcançados. Dessa forma, sabe assumir riscos e é visto como um
profissional eficiente. Contudo, ressalta demasiadamente os resultados em detrimento das
pessoas envolvidas no processo. E isso pode gerar uma certa resistência às suas decisões,
como também um clima organizacional “pesado”.
 
Já o apoiador comporta-se quase que de forma oposta ao controlador, ou seja, valoriza por
demais as pessoas em detrimento das tarefas a serem cumpridas. Costuma ser um profissional
que envolve as demais pessoas no processo de tomada de decisão, mas, em sua busca de
evitar situações conflituosas, pode tomar decisões equivocadas.
 
O quarto estilo é o analítico, para quem a segurança é fator crucial na tomada de decisão.
Tende a ser muito detalhista, valorizando os aspectos micros da decisão. Mas, com isso,
muitas vezes, tende a ser procrastinador na tomada de decisão. Está sempre em busca da
“melhor” decisão, mas esse perfeccionismo pode fazê-lo perder o timing da decisão.
 
Acerto 4: Reconhecer seu estilo de decidir, utilizando seus pontos fortes e dirimindo
seus pontos fracos.
 
Nos dias atuais, é notória a valorização do autoconhecimento para uma carreira profissional
bem-sucedida. Não seria diferente em relação ao decisor. Cabe, então, procurar reconhecer
seu estilo e sanar os pontos negativos de sua forma de decidir. O catalisador deve atentar para
os aspectos da implementação além da geração e escolha de alternativas; o controlador deve
reconhecer a importância do impacto de suas decisões sobre as pessoas e o moral da equipe;
o apoiador deve definir metas de resultados e reconhecer que nem sempre é possível tomar
decisões que agradem a todos e o analítico, assumir uma postura de maior familiaridade com o
risco inerente às decisões.
 
Há outros erros que ocorrem na tomada de decisão que não abordamos com mais detalhe,
como o foco no curto prazo e no imediatismo, a dificuldade em diferenciar o problema de seus
sintomas, a dificuldade de definir prioridades, a falta de vontade de decidir, entre outros.
Decidimos – e isto nem sempre é fácil – abordar os quatro apresentados acima pela relevância
que acreditamos ter.
 
Finalmente, temos de reconhecer que, decidir além de ser a escolha de uma alternativa, é
também o abandono das demais. E isso causa um tremendo desconforto – pergunte a uma
mulher que tinha de escolher apenas um vestido frente a dez modelos de cores lindíssimas ou
a um homem frente a diversos modelos de carros, mas que deveria optar por um somente.
 
Como disse o economista John Nash – retratado no filme Uma Mente Brilhante – as decisões
de investimento são tomadas não visando maximizar o ganho, mas sim minimizar o
arrependimento. E o maior arrependimento do decisor não é tomar uma decisão errada... É
não decidir

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