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“Liberdade”- Fernando Pessoa

Bom dia a todos, hoje venho falar do poema “Liberdade” de Fernando Pessoa.
Começarei por falar da estrutura externa do poema, prosseguindo, depois, para a análise
do seu conteúdo.
Quanto à estrutura externa, o poema é composto por 6 estrofes, não apresentando
regularidade quer métrica, quer estrófica. No entanto apresenta o seguinte esquema
rimático: AAAABBCC/DDEDE/FG/GHH/IIJJ/LLIJ. Esta irregularidade formal
permite estabelecer uma ponte entre a estrutura externa do poema e a sua temática, a
liberdade. Deste modo, o sujeito lírico apresenta-se livre de escrever na forma que
preferir.
Passarei agora à análise do conteúdo do poema. Este poema inicia-se com a seguinte
frase “(Falta uma citação de Séneca)”, mas quem era Séneca e qual seria a citação.
Séneca foi um filósofo estoico, orador e trágico romano do séc.I que se ocupava da
forma correta de viver a vida (ou seja, da ética), da física e da lógica, e via no
cumprimento do dever um serviço à humanidade, como se comprova pela seguinte
frase, por ele escrita: "Eu elogio a vida, não a que levo, mas aquela que sei dever ser
vivida.". Deste modo Séneca acreditava que o destino era uma realidade que o homem
podia aceitar ou rejeitar e que, no caso de aceitar de livre vontade viveria a liberdade.
Assim, este poema pode ser analisado de acordo com o estoicismo de Séneca ou sem o
conhecer. No caso de o analisarmos sem ter o conhecimento de quem foi Séneca e da
sua ideologia, “Liberdade” é um poema leve, que nos fala da beleza de não ter deveres e
de quando os ter não os cumprir, abordando as crianças que não têm deveres e são
livres. Mas se analisarmos o poema “Liberdade” com a ideologia de Séneca em mente,
este deixa de ser leve e torna-se mais complexo. Tudo o que diz ao longo do poema
torna-se extremamente irónico, ou seja, o sujeito poético pensa o contrário do que diz.
Quer isto dizer que quando diz “Ai que prazer/Não cumprir um dever, /Ter um livro
para ler/E não o fazer!” o “eu” lírico pensa totalmente o contrário, ou seja, que o que é
bom é ter deveres para cumprir e cumpri-los, porque se o homem deseja a liberdade o
dever é essencial. Assim, na 1ª estrofe defende a sua tese, e dá um exemplo, e apresenta
um argumento para a tese defendida. O sujeito poético acredita que ter algo para fazer e
não o fazer é prazeroso e apresenta como argumento o facto de “Ler é maçada, / Estudar
é nada. / O sol doira / Sem literatura.”. Para o “eu” lírico a natureza não precisa de ação
humana para agir, deste modo esta natureza pode simbolizar os sentimentos, que não
precisam da razão, e a “brisa” representa o facto de os sentimentos agirem livremente.
Na 2ª estrofe o sujeito poético apresenta um pensamento muito parecido a Alberto
Caeiro ao dizer “Livros são papéis pintados com tinta.”, isto porque renega qualquer
tipo de pensamento. Nesta estrofe é também posto em causa o estudo, dizendo que leva
à distinção entre nada e coisa nenhuma, demonstrando que o sujeito lírico nega qualquer
tipo de pensamento, criticando aqueles que tentam perceber as coisas. Passando agora à
3ª estrofe temos a alusão a uma figura muito conhecida, D.Sebastião. De acordo com o
mito do Quinto Império D.Sebastião virá, num dia de nevoeiro, e salvar-nos-á. O sujeito
poético faz alusão a este mito como forma de dizer que o melhor é esperar que as coisas
aconteçam, não fazendo nada para que estas venham a acontecer, porque é melhor do
que cumprir o que nos é pedido. Na 4ªestrofe o sujeito lírico louva as crianças, que não
têm obrigações nem pensamento, em detrimento daqueles que têm obrigações e pensam
em demasia. Assim, esta estrofe o sujeito lírico reafirma que seríamos mais felizes sem
deveres, e se, assim como as crianças não pensássemos nas situações, nem tentássemos
entender o mundo.
O poema termina com uma referência a Jesus Cristo que mesmo sem qualquer tipo de
formação educativa foi sábio. Na última estrofe podemos também encontrar uma crítica
a todos aqueles que exageram no cumprimento dos seus deveres, quando Jesus Cristo,
sem nada, os conseguiu cumprir.
Falando agora das figuras de estilo, podemos encontrar:
 Pleonasmo em “A distinção entre nada e coisa nenhuma.”, usado para reforçar a
ideia de que o estudo não traz sabedoria;
 Ironia em “Esperar por D. Sebastião, / Quer venha ou não!” para ironizar a
esperança de algo que nunca chegará;
 Personificação em “o sol, que peca” porque quem peca são as pessoas, não o sol.
Para concluir, dizer que ao longo de todo o poema podemos encontrar alguns aspetos
semelhantes aos da poesia de Alberto Caeiro, como a ironia e escrita, e ainda a
renegação do dever. E que há ainda uma critica implícita a Salazar em versos como
"Flores, música, o luar, e o sol que peca / Só quando, em vez de criar, seca." e na
referência às finanças, pois, como se sabe, Salazar foi ministro das finanças.
Obrigado pela vossa atenção.

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