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ELEIÇÕES 2022: FEDERALISMO, PARADIPLOMACIA E DESAFIOS

EM PERNAMBUCO E NO BRASIL

Autor: [nome do autor]

RESUMO

A conjuntura internacional contemporânea delineada pelo paradigma da globalização,


apresenta como característica a aceitação de novos atores autônomos, que se inserem em
um amplo espectro que enquadram Governos locais e regionais e modelos de relações
internacionais conhecidos como Paradiplomacia. Dentre os objetivos que nortearam a
presente pesquisa buscou-se compreender o fenômeno da paradiplomacia a partir dos
impactos provocados por atores locais, localizados temporalmente no processo eleitoral
brasileiro de 2022. Delineamos a paradiplomacia como um instrumento viável para o
desenvolvimento das unidades federativas do Brasil. Foi observado o Estado de
Pernambuco, especificamente o Complexo Industrial de Suape e usado como referencial
teórico a pesquisa de Soldatos (1990) e Marques (2022). Assim, a partir dessa pesquisa é
possível compreender a importância da paradiplomacia em níveis estadual e municipal por
meio das ações autônomas desses entes federativos.

Palavras-chave: Paradiplomacia. Complexo Industrial de Suape. Eleições 2022.

1. INTRODUÇÃO

O avanço internacional dos entes federados brasileiros evidencia a


necessidade de uma melhor compreensão desse fenômeno. Embora nas décadas
de 1990 e 2000 a internacionalização das cidades tenha se consolidado e se
tornado uma prática mais comum, os estados federados também têm recebido
atenção por suas incursões no mundo exterior.
Nesse sentido, a literatura vem desenvolvendo métodos para entender em
que medida tais atividades afetam os processos decisórios, inclusive a própria
política externa brasileira.
A política externa pode ser entendida como uma série de ações e decisões
tomadas por um determinado ator (não necessariamente um estado) em relação
com outros estados ou atores externos influenciados por influências domésticas e/ou
internacionais. Tradicionalmente, tem sido entendido como uma "política nacional"
atuar em áreas sensíveis como a integridade territorial e a soberania nacional.
No entanto, a política externa de um país deve representar uma síntese de
interesses diferentes e muitas vezes conflitantes. Esse caráter constitutivo da
política externa a torna propensa a mudar de acordo com o governo da época e a
estar vinculada a outras esferas de governo e até mesmo à sociedade.
No Brasil, o Itamaraty considera que a política externa tem uma tradição
histórica relativamente contínua, que remonta à época do Barão Rio Blanco. No
entanto, a presidência de Jair Bolsonaro abandonou essa tradição. Em 2019, várias
declarações polêmicas do governo federal foram alarmantes e responsáveis pela
erosão da imagem internacional do Brasil.
As ações diplomáticas realizadas por Ernesto Araújo parecem seguir o que
Lima e Albuquerque (2019) chamam de “estratégia do caos”. O objetivo das
atividades de política externa é manter a lealdade e a agitação do eleitorado do atual
presidente.
No entanto, em um contexto de questionamento da validade da agenda de
política externa proposta pelo governo Bolsonaro, as ações e atividades
internacionais de entes federativos sugerem caminhos para atingir determinados
objetivos. Destaca-se, assim, um possível ponto de virada na paradiplomacia do
Brasil, que em particular tem se mostrado complementar à política externa do país,
pelo menos desde a redemocratização.
Partimos da hipótese de que um tom menos conciliador e progressivamente
radical adicionado à agenda utilizada na chamada “nova política externa brasileira”
entre janeiro de 2019 e março de 2021 exacerbaria os desequilíbrios federais e
prejudicaria os governos locais, portanto, as eleições de 2022 são de fundamental
importância para a futura formulação da política externa do país.

2. A PARADIPLOMACIA NO BRASIL (texto1)

A paradiplomacia, também conhecida como diplomacia paralela, é um termo


que teve sua origem e desenvolvimento através do acadêmico Panayotis Soldatos
(1990) para designar a relação de entes subnacionais – no caso brasileiro, estados e
municípios – no ambiente internacional, visando a promoção de seus interesses.
Originalmente, a paradiplomacia foi estudada em países norte-americanos e
europeus, a partir de uma perspectiva fenomenológica (KUZNETSOV, 2015). Os
estudos nos países norte-americanos estavam fortemente influenciados pelo
“neofederalismo”, que marcou o processo de internacionalização dos Estados
canadenses e norte-americanos, consequentemente, isso levou a maiores
aprofundamentos sobre a organização federal e, bem como, aos mecanismos
institucionais desenvolvidos para lidar com a nova complexidade das relações
internacionais. De forma semelhante, o processo de integração europeia produziu
um maior protagonismo nas regiões e cidades, que passaram a procurar por
representações a partir de uma estrutura supranacional, ou seja, sem a ação direta
de um primeiro-ministro.
No Brasil, tal proposta de uma política externa descentralizada apenas surgiu
na década de 1990, com a Análise da Política Externa do Brasil (APE). Nesse
sentido, em meio ao debate sobre a descentralização da política externa, o modelo
de segregação democrática passou a ser questionado, tal modelo havia, em outros
momentos, caracterizado o processo decisório das relações exteriores do Brasil.
Cabe destacar o importante papel de autores como Mónica Salomón (2011), Tullo
Vigevani (2006) e Manoela Miklos (2010), dentre outros, nos estudos de APE, que
contribuíram para a definição dos campos de atuação dos estados e municípios, na
política externa do país.
Ao nos aprofundar na temática da paradiplomacia é importante perceber o
debate central que emerge da literatura, tanto brasileira, quanto estrangeira, em
torno da dualidade risco-oportunidade na política externa de uma nação. De acordo
com Duchacek (1990) e Soldatos (1990), um dos maiores riscos desse processo
está na fragmentação da voz externa de uma nação e, consequentemente, os danos
que isso pode trazer às ações estratégicas. Esse fenômeno marcaria o debate em
torno do fenômeno da paradiplomacia e caracterizaria a tensão permanente na
relação entre os governos centrais e os governos locais nas relações exteriores.
Para Álvaro Branco (2011), o Brasil tem observado a paradiplomacia nas
questões estruturais do próprio sistema federativo, visto que, a concentração de
recursos federais tem levado a “guerras fiscais” de estados e municípios em busca
de receitas. Por sua vez, o que Ironildes Bueno (2010) chamou de “ativismo
internacional dos governadores” tornou-se uma prática institucionalizada no Brasil a
partir da década de 1980, primeiro no Rio de Janeiro (1983) e no Rio Grande do Sul
(1987) e, posteriormente, estendida a outros estados.
Em seu início a paradiplomacia foi vista como um desafio ao então vigente
modelo de segregação burocrática que deu os fundamentos da política externa,
especialmente no âmbito federal, pois era responsabilidade da União realizar todas
as atividades diplomáticas. Isso se refletiu na criação da Secretaria Especial de
Assuntos Internacionais do Estado do Rio Grande do Sul (1987), que trouxe um forte
foco institucional ao Ministério das Relações Exteriores e marcou a agenda
internacional (NUNES, 2005).
Nesse cenário, a apreensão do Itamaraty marcou os primeiros anos da
paradiplomacia no Brasil, em decorrência dos riscos de contradições nas relações
internacionais do país. A partir da criação da Assessoria de Relações Federais
(1997) a postura de apreensão deu lugar a valorização e aceitação das ações
internacionais perpetradas pelos estados e municípios, o que ampliou a legitimidade
política das práticas locais.
Desde então, foi desenvolvida uma política nacional de acompanhamento e
incentivo à diplomacia nos níveis estadual e municipal dentro da linha geral da
política externa nacional. No governo de Fernando Henrique Cardoso a premissa foi
a política externa federal; nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma
Rousseff, a premissa foi a cooperação internacional federal. As duas políticas, por
meio de instrumentos e arranjos institucionais distintos buscam maior controle sobre
as ações diplomáticas locais, evitam conflitos de interesse com a política externa
nacional e, por vezes, estimulam a atuação conjunta dentro das diretrizes da agenda
diplomática do país.
Observa-se que o período de maior incentivo do Governo Federal em relação
à paradiplomacia coincidiu com o processo de maior integração regional no
MERCOSUL, que inseriu as questões de cooperação em políticas públicas. Um dos
destaques desse movimento de cooperação foi a criação, em 2014, dos Fóruns
Consultivos Municipais, Federais, Provinciais e do Mercado Comum do Sul (FCCR),
primeira instância de representação local na estrutura do MERCOSUL, para
organizações não-governamentais. Assim, a participação paralela e conjunta dos
Fóruns Consultivos com as entidades centrais foi fundamental no que diz respeito às
questões de integração regional.
O Fórum foi resultado da influência e coordenação desempenhada pela,
então, Subchefia de Assuntos Federais da Presidência da República (SAF/PR), que
tem o objetivo de esclarecer as atribuições e ações das entidades locais brasileiras
na Política Federal de Cooperação Internacional. Percebe-se, assim, que a posição
de desconfiança, assumida inicialmente em relação ao Governo Federal Brasileiro
deu lugar ao incentivo na busca da harmonia na política externa do país. Outras
ações da diplomacia nacional incluíram parcerias descentralizadas com Itália e
França, bem como a instalação de um fórum para representantes locais do BRICS e
IBAS, além de reuniões visando a coordenação e supervisão das atividades
internacionais realizadas por estados e municípios.
Entretanto, desde o final do Governo Dilma Rousseff, a agenda de diálogo
federal na área de relações exteriores por meio do SAF perdeu espaço nas agendas
das relações internacionais.
Apesar da continuidade de ações que se consolidaram, como a coordenação
da posição do Brasil na FCCR, o diálogo entre o governo federal e os governos
estaduais e municipais no campo das relações exteriores perdeu força desde 2016.
Apesar da conturbada situação da política brasileira desde então, fica claro que
perder os mecanismos e práticas de engajamento local gera riscos para a política
externa do país. É sobre isso que alertaram os autores pioneiros da paradiplomacia,
enfatizando a necessidade de se pensar a política externa no contexto do diálogo
federal e da consulta mútua sobre questões internacionais. Apesar de abordar
diferentes agendas no cenário internacional, a politização de questões de política
internacional pode trazer choques e constrangimentos ao Estado brasileiro,
enfraquecendo as relações federativas no longo prazo. Diante disso, com os
interesses nacionais e locais coexistentes e desordenados na política internacional,
passa a ocorrer uma exposição do país a riscos de posicionamentos inconsistentes
e de interesses conflitantes.
Portanto, conforme aponta Gilberto Rodrigues (2011) e Tullo Vigevani (2006),
o governo brasileiro precisa não apenas reconhecer as características fragmentadas
que caracterizam as relações externas contemporâneas, mas também
institucionalizar esse reconhecimento na forma de políticas, práticas e instituições
que considerem o diálogo federal em termos de cooperação internacional.

3. DESAFIOS E PERSPECTIVAS DO ESTADO DE PERNAMBUCO (texto 2)

No que se refere à paradiplomacia em sua perspectiva local, direcionamos


nosso olhar para o Estado de Pernambuco, especificamente, ao complexo industrial
de Suape, destacando sua importância para o Estado e apontando para as vias de
integração desse com o cenário internacional.
O complexo industrial de Suape é um polo de desenvolvimento econômico,
com infraestrutura bem desenvolvida para atender às demandas de variados
empreendimentos. Suape aglutina três tipos de atividades econômicas: as atividades
industriais, que incluem investimentos privados na formação de parques industriais;
as atividades portuárias, onde se realizam negócios de importação e exportação
entre países; e as atividade logísticas, com a movimentação, centralização e
transporte, integralizando todo o complexo.
A estrutura do porto de Suape permite o recebimento de navios de grande
porte com a realização de operações de transbordo de cargas (transporte costeiro)
em toda a região. As transferências de carga são realizadas por embarcações de
pequeno porte, realocadas para outros portos brasileiros. Operações de transbordo
sã mais rentáveis do que as operações de carga e descarga.
Diante do crescimento que do Complexo Industrial de Suape, uma maior
competitividade no mercado marítimo foi conquistada, exigindo a adoção de políticas
de desenvolvimento que viessem a atender essa conjuntura de aceleração do
crescimento.
Dentre essas políticas é possível mencionar o Suape global, uma política que
visa a inovação e transformação do complexo em um polo de bens e serviços
direcionado pata as indústrias de petróleo, gás, offshore e naval. Esse caminho, a
partir do incentivo do Governo do Estado de Pernambuco objetiva a instalação de
novos empreendimentos industriais e de serviços, ampliando a competitividade e a
inovação regional.
Nesse cenário, o Complexo Industrial de Suape tem envolvimento em
missões internacionais, direcionando sua política administrativa a níveis de modelos
como o Porto de Cingapura, Houston (EUA), Noruega, e Calgary (Canadá).
Conforme menciona Ad Diper (2012), o desenvolvimento do comércio exterior
brasileiro nas últimas décadas tem mencionada como uma das principais
explicações para a evolução social, econômica e política do país,
consequentemente, há o aumento de investidores no país, inclusive estrangeiros.
Por ser um país com grande mercado consumidor, ampla oferta de terras, energia e
água, pode gerar inúmeras oportunidades em múltiplos campos e infraestrutura.
Pernambuco situa-se em uma região estratégica no coração da região
Nordeste, com equidistância da África, Europa, América do Norte, América Central e
América do Sul.
Assim, o Estado de Pernambuco fortaleceu sua capacidade de fabricação e
distribuição de mercadorias em nível nacional e internacional e, em consequência,
apresenta um impacto significativo na economia do Nordeste brasileiro, com
aumento da participação no mercado socioeconômico, culturais e de serviços de
outros estados da região.
Conforme aponta o IBGE (2009), o Estado de Pernambuco é considerado a
segunda base econômica mais importante da região Nordeste, com produto interno
(PIB) de US$ 21 bilhões e renda per capta de US$ 2.658.
Entretanto, conforme aponta Marques (2022), sob o Governo de Jair
Bolsonaro, o Brasil perdeu espaços nos diálogos e políticas internacionais, não
apenas no que diz respeito as discussões bilaterais, mas sobretudo, nos acordos
econômicos de cooperação técnica que poderiam ser benéficos ao país.
Diferentemente de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), Luiz Inácio Lula da
Silva (2003-2010), que praticaram a diplomacia presidencial, o atual presidente, Jair
Bolsonaro, tem como princípios na diplomacia internacional a ideologização das
relações do país com o exterior, além de um excesso de personalismo de seu poder
executivo.
Essa diplomacia personalista teve como expressão o afastamento de
importantes parceiros históricos, como a Argentina; a aproximação, controversa,
com Vladimir Putin, da Rússia, especificamente, em um momento de escalada da
tensão internacional pela iminência de uma guerra contra a Ucrânia; e um
alinhamento ideológico e, portanto, não estratégico com o ex-presidente não reeleito
Donald Trump. Nesse cenário, evidencia-se o afastamento do Brasil, não apenas de
importantes parceiros internacionais, mas sobretudo, sua exclusão de importantes
discussões globais.
Assim, a eleição de 2022 será fundamental na história do Brasil e, em certa
medida, definidora do papel do país e, especificamente do Estado de Pernambuco,
no que diz respeito a sua participação das discussões globais no fechamento de
acordos e parcerias internacionais.

REFERÊNCIAS

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SALOMÓN, M. A dimensão subnacional da política externa brasileira: determinantes,


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MIKLOS, M. S. A inserção internacional de unidades subnacionais percebida pelo estado


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Mestrado. Porto Alegre: UFRGS, 2005.

PORTAL IBGE. 2009. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/pa.html.


Acesso em: 10 out. 2022.

MARQUES, R. Eleições 2022: federalismo, paradiplomacia e desafios no Pará e no Brasil.


Observatório eleitoral, 29 jun. 2022. Disponível em:
https://internacionaldaamazonia.com/2022/06/29/eleicoes-2022-federalismo-paradiplomacia-
e-desafios-no-para-e-no-brasil/. Acesso em: 10 out. 2022.

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