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Abstract
Key words:
Resumo
Palavras-chave:
1
Advogado, Professor Universitário, Mestre em Relações Internacionais e Doutor em Ciência Política
com ênfase em Política Internacional pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
I- Considerações gerais
Introdução
As últimas semanas foram de muita movimentação nas mídias escrita,
falada e nas redes sociais em torno de um temor de irromper um conflito
armado entre as forças armadas russas e dos países ocidentais, em torno da
aliança atlântica (OTAN) em razão de boatos de que a Rússia poderia agir
militarmente contra a vizinha Ucrânia. As mídias no Ocidente em geral
enfatizam o temor que uma eventual guerra localizada possa eclodir e escalar
em um conflito de escala regional e global, em virtude de envolver, de um lado,
as forças da aliança ocidental, entre elas a mais importante – os Estados
Unidos - e, de outro, as forças militares russas. Ambas as nações possuem as
duas mais poderosas forças militares do planeta e os maiores arsenais
nucleares e termonucleares, sendo, respectivamente a primeira e a segunda
força militar mundiais.
Mas quais as raízes profundas desta crise? A quem aproveita uma crise
de natureza multidimensional como essa, com repercussões na segurança, na
geopolítica e na economia internacionais em escala global? A fim de buscar
responder a estas difíceis perguntas, é preciso, em primeiro lugar, refletir sobre
o peso da história russa e sobre as características básicas do sistema
internacional contemporâneo. Destarte, é na confluência da história, com a
ciência política e as relações internacionais, que se podem colher as
ferramentas interpretativas fundamentais para compreender a natureza desta
mais recente crise internacional.
O peso da história
A Federação Russa, um dos pivôs da atual crise que envolve a
República da Ucrânia e o Ocidente, teve suas origens em dois processos
históricos distintos, mas que são mutuamente dependentes entre si e que já
contam mais de mil anos. Em primeiro lugar no final do século X ( anos 900 a
1000 depois de Cristo), se consolida na Idade Média, a formação social
conhecida como Rússia de Kiev, que foram um conjunto de cidades tanto
militares quanto comerciais, que centradas na fundação de Kiev, na atual
Ucrânia, congregou as tribos eslavas dos territórios que hoje formam a Rússia
Europeia, a Bielorrússia, a Lituânia, Estônia, Letônia e a Ucrânia, entre o norte
ao sul, do mar Báltico ao mar Negro, um poderoso reino eslavo que pela
primeira vez criara um estado territorial no extremo leste da Europa mas que
também fazia fronteira no extremo leste com as populações guerreiras
nômades turco-mongóis e ao sul com o Império Romano (do Oriente ou
Bizantino) e os califados e sultanatos islâmicos.
Dessa forma, percebe-se que desde muitos séculos as histórias dos
atuais estados nações da Rússia e da Ucrânia estão fortemente conectados e
guardam uma história comum. No remoto passado a Rússia de Kiev foi tanto a
origem política do atual estado da Ucrânia como também e, talvez isso seja o
mais relevante, da Rússia. Cultural e etnicamente são os dois povos
praticamente o mesmo, do ponto de vista da etnografia e da antropologia, além
de possuírem história comum desde os tempos medievais até o final da União
Soviética em 1991. Possuem língua muito próxima, irmãs, características etno-
raciais muito próximas, são os povos eslavos do leste, cujas características
compartilham também com os bielorussos.
Aproximadamente num espaço de alguns séculos entre a Idade Média e
o começo da Idade Moderna, ocorreram dois fatos políticos importantes para o
futuro desenvolvimento da Rússia: as invasões mongóis, a partir dos anos
1200 e, como consequência do enfraquecimento do domínio mongol sobre a
Rússia, do nascimento e desenvolvimento da Rússia como a conhecemos hoje
– um estado de características imperiais e de imenso território centrado
politicamente em Moscou, a partir dos anos 1400.
Assim, se as invasões mongóis destruíram o primeiro estado russo-
ucraniano, a Rússia de Kiev, o gradual enfraquecimento e a final expulsão dos
mongóis pelo núcleo sobrevivente russo que se formou em torno do Principado
de Moscou, foi a raiz da do império da Rússia czarista que iria entre os anos de
1500 a 1800 se expandir por toda a região eurasiana setentrional, formando o
gigantesco estado russo como o conhecemos hoje. Desta forma, as diversas
etnias eslavas antes sob a suserania do antigo e medieval principado russo de
Kiev agora passavam a ter como entidade soberana o Estado territorial da
Rússia moscovita, um poderoso império territorial que adquiriu suas fronteiras e
manteve sua unidade territorial e fortaleceu o sentimento de nacionalidade a
partir de constantes guerras externas com estados europeus mais ao ocidente
assim como com os reinos tártaro-mongóis e o império turco-otomano à
oriente. Fora nesse período que a região da atual Ucrânia voltou a fazer parte
da Rússia - sendo recuperada aos tártaros da Criméia - como havia sido desde
a Idade Média no antigo reino russo de Kiev.
Com o advento da Primeira Guerra Mundial (1914-18) e no final do
conflito, a eclosão da guerra civil e da subsequente revolução socialista na
Rússia, a partir de 1917 e com o término da guerra civil e da criação da União
das Repúblicas Socialistas Soviéticas em 1922, o estado imperial czarista
russo chegava ao fim e o seu principal núcleo – a Rússia – se tornava a mais
importante república soviética, secundada pela criação de uma nova república,
no contexto da União Soviética que substituíra o antigo Império Czarista.
Nascia, dessa forma, a república da Ucrânia, no contexto de pertencer, tanto
quanto a Rússia, à URSS. Todavia, o coração político, militar, estratégico,
cultural e econômico da União Soviética sempre foi a Rússia. Assim como o
Império russo era a própria Rússia, a Rússia era a própria União Soviética do
ponto de vista cultural, político e civilizatório, ainda que a autonomia dentro da
federação pudesse ser exercida por centenas de repúblicas, mas cujo poder
soberano residia basicamente na estrutura política, militar e econômica da
Rússia.
Passados todo o século vinte, a Segunda Guerra Mundial (1939-45) e a
Guerra Fria, que durou, grosso modo, de 1945, a partir da Conferência dos
aliados em Potsdam, até a dissolução final do império soviético, em 1991,
emergiram das antigas repúblicas soviéticas, novos estados nações soberanos,
reconhecidos pela Assembleia Geral das Nações Unidas.
Discussões e debates à parte sobre a historicidade e hipotética
continuidade entre o atual estado ucraniano e o antigo estado kieviano, não
fazem parte da abordagem presente neste texto. Contudo, tal argumentação
tem conteúdo ideológico e busca se utilizar da história com distorções de fatos
históricos para legitimar interesses políticos da extrema direita fascista
ucraniana e vai ao encontro das demandas geopolíticas dos Estados Unidos –
a principal superpotência global – de expandir a aliança atlântica para as
fronteiras russas e assim aprofundar a estratégia de contenção do atual estado
russo a partir não de considerações ideológicas, já que a Federação russa é
um estado capitalista, mas por razões geopolíticas, com fundo no interesse das
elites políticas, econômicas e da burocracia militar do complexo militar
industrial norte-americano em romper com a balança de poder nas relações
russo-americanas, tendo como pivô da crise a atual situação política instável da
Ucrânia.
Assim, ainda que a Rússia de Vladimir Putin tenha seguidamente
respeitado a soberania do estado vizinho e agindo dentro das normas do direito
internacional e seguindo as regras não escritas da política internacional,
fundada na manutenção do equilíbrio ou balanço de poder com as forças da
OTAN na Europa do leste, as provocações militares do estado ucraniano, em
uníssono com as tentativas de expansão de sistemas de mísseis para a
Polônia e principalmente para a Ucrânia, constituem provocações para testar o
comportamento político russo em sucessivas crises que são calculadamente
provocadas pelas inteligências militares dos estados ocidentais a fim de buscar
enfraquecer politicamente o polo russo-chinês por vias econômica, diplomática
e militar, eis que Rússia e China são o polo desafiador da ordem hegemônica
estadunidense dentro do atual sistema internacional.
Dessa forma, a tentativa de obstaculizar a cooperação russo –alemã em
torno da construção do gasoduto que escoará a produção de gás e óleo para a
principal economia europeia, a Alemanha, constitui a dimensão econômica que
se pretende atingir com a atual crise. Pois quaisquer atos defensivos de cunho
militar a um possível ato de agressão militar ucraniana à Rússia poderia
ocasionar pressão dos Estados Unidos para a Alemanha abandonar a
cooperação comercial com os russos por meio de suspensão dos tratados de
cooperação e aplicações de sanções econômicas visando enfraquecer
Moscou.
Por outro lado, no campo estritamente diplomático, as provocações da
OTAN e do belicoso estado ucraniano visam a provocar também uma não
resposta de Moscou, ou seja, ao não agir, os russos perderiam, no plano da
política internacional, prestígio simbólico enquanto uma grande potência, ao
não reagir seja diplomática seja, no limite, manu militari.
Por fim, uma hipótese de guerra, seria, em princípio, calculada pelos
países ocidentais como uma guerra localizada a fim de testar o emprego dos
sistemas de armas, o que sempre tem relação com os objetivos econômicos
das indústrias do campo da defesa, como também buscar arrancar concessões
diplomáticas, econômicas e militares dos russos em caso de confronto na
fronteira com a Ucrânia, além de estudar o alcance do poderio militar russo,
considerado hoje por importantes analistas militares como Andrei Marianov
como superior em muitos aspectos aos dos próprios norte-americanos. Por fim,
buscaria, numa guerra controlada, utilizar das estruturas das Nações Unidas e
principalmente do uso político dos direitos humanos e da mídia corporativa
como armas para enfraquecer a legitimidade ideológica do estado russo em
termos de soft power (poder brando).
A operação militar russa na Ucrânia que iniciou em há dois meses tem sido
condenada como uma flagrante violação do direito internacional, com
condenações morais e denúncias por parte dos membros da Assembleia Geral
da ONU, o que reflete a postura da maioria dos países ocidentais, em especial
dos Estados Unidos, Canadá e países da Europa Ocidental, membros da
aliança militar da OTAN.
Juristas do mundo todo debatem e analisam a questão sob o prisma
eminentemente normativo, ou seja, do direito internacional público, entendendo
que a Federação Russa violou a integridade e soberania do Estado ucraniano
ao invadir com tropas terrestres seu território, assim como a violação do
espaço aéreo de Kiev por meio das forças aéreas, com bombardeios e ataques
com mísseis, incluindo o tão falado hipersônico que tanto atemoriza os militares
ocidentais.
As autoridades russas, por sua vez, alegam que não violaram o artigo 2,
incisos 3 e 4, da Carta da ONU, que é o principal tratado internacional e marco
regulador jurídico e político das relações internacionais contemporâneas. Estes
dispositivos falam da vedação a qualquer Estado membro das Nações Unidas
de tomar medidas que ameassem a paz e a segurança internacionais e que
impliquem em violação da soberania por meio da invasão militar a um território
de outro país ou que o uso da força comprometa a independência política da
nação agredida. Em suma, as nações devem se abster do recurso ao uso da
força, salvo casos de legítima defesa prevista no artigo 51 da mesma Carta e
resolver as disputas internacionais por meios pacíficos.
Para os russos não teria havido da parte de Moscou violação ao direito
internacional, mas um direito à legítima defesa assim como a aplicação da
resolução das Nações Unidas do princípio da responsabilidade de proteger em
nome dos princípios da autodeterminação dos povos e do respeito aos direitos
humanos internacionais.
A alegação russa da legítima defesa assim como da responsabilidade de
proteger a população de etnia russa do Donbass diz respeito a informações de
inteligência militar que davam como certa duas ações: 1- o forte indício de
instalação de mísseis em território ucraniano assim que Kiev decidisse entrar
na Otan, com prazo para a implementação destas medidas para começo de
março, o que poria em risco a própria existência da Rússia frente a uma
ameaça de ataque nuclear que em poucos minutos poderia destruir as
principais cidades do país e 2- que em torno de pelo menos quase cem mil
soldados do exército ucraniano iriam invadir as repúblicas autônomas da região
do Donbass – Donestk e Lugansk,- localizadas na fronteira leste ucraniana com
a Rússia e com quase cem por cento de população de fala e etnia russa, com a
grande maioria de cidadãos russos.
Estes, de acordo com comissões independentes de ONGs de direitos
humanos, Cruz Vermelha e o Comissariado de Direitos Humanos da ONU,
vinham sendo vítimas de bombardeios, assassinatos, tortura e ameaças por
parte dos militares ucranianos e de forças paramilitares nazistas desde 2014,
quando os Acordos de Minsk negociados entre Rússia e Ucrânia, para dar a
autonomia de gestão destas regiões, ainda que dentro do estado ucraniano,
fossem respeitadas pelo governo de Kiev. Todavia, o governo ucraniano violou
este acordo, que fora também respaldado por governos ocidentais, em clara e
flagrante violação do direito internacional e dos direitos humanos das
populações do Donbass, com históricas ligações políticas, culturais e
econômicas com a Rússia.
Neste contexto, ficamos, nós cidadãos comuns, aqui no Brasil, por meio
de noticiário de televisão, redes sociais e mesmo lives nos canais como you
tube, presas de narrativas tanto do Ocidente, quanto da Ucrânia como da
Rússia, que são pautadas pela parcialidade na sua versão dos fatos. O
importante neste conflito é que cada leitor, cada cidadão possa ter acesso a
todos os tipos de fontes de informação e, em nome da liberdade, ser o juiz das
suas próprias convicções na hora de compreender a complexidade dos fatos
internacionais ou nacionais.
Nesse sentido, a guerra na Ucrânia nos remete para a importância de
termos condições de separar o joio do trigo, no caso as fake news impostas
pelas respectivas mídias dos atores envolvidos no conflito e poder chegar mais
perto da verdade dos fatos.
A PERSPECTIVA REALISTA
A PERSPECTIVA MARXISTA
A HARMONIZAÇÃO ENTRE AS ESCOLAS DE PENSAMENTO
F- Conclusões
Crise e guerra da Ucrânia enfraquecem a economia da Europa e num
primeiro momento, afastam países europeus da cooperação com a
Rússia.
OBSERVAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS