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iou-se e desenvolveu-se um conjunto de normas jurídicas que

configuram, hoje, regimes próprios, diferentes de direito comum e de outros ramos do direito público.

Estas normas regulam a actividade do Estado em dois planos:

a) Plano de organização e funcionamento do aparelho financeiro;

b) Plano das relações entre o Estado e os particulares.

É neste segundo plano, em que reside a preocupação de dar garantias aos particulares, aspecto

essencial para a defesa dos seus direitos e interesses contra eventuais abusos do Estado.

7. O poder e a economia

23

Por poder deve entender-se o poder político, que é a forma de organização do Estado ou, melhor,

a capacidade de influenciar comportamentos. Ligado a este aspecto temos a actividade económica,

entanto que processo orgânico de satisfação de necessidades humanas mediante afectação de bens

materiais raros a fins alternativos individuais ou sociais, privados, comunitários ou públicos.

Daqui resultam relações, como atrás se disse, de três tipos que se seguem:

7.1. Ordenação Económica

A Ordenação Económica ou domínio da ordenação económica 24 corresponde à função da

máquina política à qual compete a definição do quadro geral de natureza jurídica e social em que se

desenvolve a actividade económica, que inclui a constituição económica, a legislação económica, as

directivas e decisões concretas da administração económica, isto é, o aspecto jurídico fundamental como

forma de normar a actividade económica.

Teremos, neste caso, a política financeira de redistribuição pela qual se transfere parte dos

rendimentos dos que se encontram acima da nédia para os que se encontram abaixo da linha dos

rendimentos médios, isto é, dá-se dos ricos aos pobres.

Os argumentos para esta redistribuição são vários:

a) Injustos desníveis de rendimentos que, julga-se, não dependem do esforço ou do


mérito;

b) O carácter desumano da carência de bens essenciais e do negar-se a dignidade

das pessoas;

c) O inconveniente das consequências nocivas das situações de pobreza;

d) A incorrecção das diferenças dos pontos de partida, comprometendo e agredindo

uma competição leal.

24 SOUSA FRANCO, A., ob. cit., p. 8.

24

Já se vê que por mais liberal que seja a filosofia económica e social de um Estado, daqui resulta

a necessidade de se definir a doutrina ou a política económica e social que deverá ser por ele seguida,

por exemplo, se de inspiração abstencionista, se liberal, se socialista ou se intervencionista.

Na política económica e social há, sem dúvida, um comportamento, uma actuação interligada do

Estado e dos sujeitos privados.

É o Estado, o agente regulador da economia, que deve garantir o cumprimento da actividade

económica, fazendo valer a norma jurídica económica.

Este conjunto de normas fundamentais que subordinam a doutrina ou filosofia social é a

constituição económica a partir da qual podem emergir normas que constituem a legislação ou

regulamentação económica e institucional geral ou periférica, nomeadamente sectorial (ex.: agricultura,

indústria ...).

Como forma de ordenação temos, ainda, a administração e a jurisdição exercida pela

Administração activa ou pelos Tribunais, respectivamente. Sem interferir, directamente, coordena-se e

ordena-se o comportamento dos sujeitos económicos, definindo e exercitando padrões e quadros em

cujo âmbito deve livremente desenvolverem-se.

7.2. Intervenção económica


A intervenção do Estado na economia poderá ser directa ou indirecta, consoante os casos em

que o interesse se mostrar evidente obrigando o Estado a tomar posição.

Com a sua intervenção na economia o Estado modifica o comportamento dos restantes agentes

económicos.

25

A forma mais racionalizada de intervenção é a política económica. Pela intervenção o Estado

altera o comportamento dos produtores e consumidores sem tomar decisões sobre a utilização de bens
e

satisfação das necessidades sociais.

A intervenção económica estadual pode, entre outras, ser através de:

- Taxas de juro para influenciar o investimento;

- Taxas cambiais para intervir na área das exportações e importações;

- Benefícios fiscais para incentivar o investimento;

- Limites prudenciais, como elementos de persuasão;

- Tabelamento de preços, como medida anti-inflacionista;

- Agravamento ou desagravamento tributário;

- Fixação de quotas de produção.

Como se vê, na intervenção o Estado não é ele próprio sujeito económico25

7.3. Actuação Económica do Estado

O Estado pode actuar como agente económico. A extensão dessa actividade é, porém, variável.

Há serviços que pode entender-se que só o Estado poderá garantir aos cidadãos tais como o

de abastecimento de água, energia, saúde, administração de justiça, defesa e segurança. Na

actividade económica directa do Estado, o Estado, ele próprio, actua como agente ou sujeito

económico, formulando escolhas ou opções económicas no interesse da comunidade.


25 SOUSA FRANCO, A., ob. cit., p. 11.

26

Não há fronteiras estanques entre ordenação, intervenção e actuação nem mutuamente se

excluem, existindo nos Estados modernos cumulativamente, com graus diferentes, conforme as razões,

objectivos e tempo.

8. Decisão política e decisão financeira

As decisões tomadas no âmbito do poder político levantam sempre dúvidas quanto à sua

validade ou eficiência, na prossecução dos objectivos do Estado.

No âmbito das finanças idênticas dúvidas sobre a eficiência das opções do Estado seja qual for a

sua concepção26 ou a sua forma doutrinária27

A decisão financeira é tomada em função de interesses dos governantes que buscam simpatias e

suporte político e, como decisão económica, que também é, não está isenta das disputas do poder por

pessoas ou grupos destas.

O cidadão deposita o voto para maximizar o seu interesse individual ou dos partidos que apoiam.

Os partidos comportam-se como que num mercado; disputam o monopólio do poder “como

concorrentes de oferta relativamente a uma procura expressa no voto dos eleitores”28, predispondo-se
a

praticar políticas populistas, antes das eleições, para ganhar a preferência dos eleitores e políticas

impopulares depois das eleições, em clara confirmação da existência de ciclos político-económicos. A

determinação da função de preferência dos eleitores e da função de popularidade dos governos,

componente idealista, cria incapacidades e irracionalidades do Estado.

26 Estado soberano, Estado República, Estado de Classe, Estado conglomerado – ver SOUSA FRANCO, ob.
cit., p.

75.
27 Sem querermos ser exaustivos, podemos ter o Estado patrimonial, Estado-polícia, Estado guarda
nocturno, Estado

de serviços, Estado providência, Estado de bem-estar, Estado de desenvolvimento, Estado de Direito


Democrático ou

autocrático, Estado social, Estado Tecnológico, Estado de cultura, Estado autoritário e Estado totalitário.

28 SOUSA FRANCO, A., ob. cit., p. 85.

27

Os tecnoburocratas condicionam a decisão financeira, pelo seu saber, pelo “poder de agenda”29 e

pela sub-regulamentação burocrática.

O Estado, na sua missão de prosseguir o bem-estar social, tem tomado decisões cujo objectivo é

fortalecer o seu poder político independentemente do resultado de tal decisão.

Noutros momentos, as decisões que o Estado toma no âmbito das finanças têm a ver com a

análise dos processos e objectivos na actividade financeira.

No primeiro caso, a decisão política é tomada por consenso mínimo social30, livre31, implícito ou

explícito, no exercício da democracia.

No segundo caso (decisão financeira) obedece a princípios da actividade financeira do Estado,

das opções tendentes à satisfação pública das necessidades e ao nível do sector público, em confronto

com o privado, tendo em atenção a base do financiamento disponível.

A decisão financeira, tendencialmente bipolar, abrange a provisão de bens e o financiamento,

sabido que os bens mercantes (provisionados) são produzidos para o mercado e nele são avaliados e que

os bens colectivos ou públicos são produzidos fora do mercado e, a maior parte, avaliados através de

critérios próprios do poder político.

Qual é o consenso mínimo social, de que atrás falámos?

29 Levantam problemas, traçam alternativas, comandam a execução e ganham influência.

30 Um consenso social, segundo o Professor Sousa Franco (ob. cit., p. 88) tem três características
essenciais: (1) incide
sobre aspectos fundamentais da sociedade, (2) deriva da situação de incerteza (pois caso ela não exista
dificulta-se,

impossibilita-se o acordo por sobrevalorização da sua posição) quanto ao futuro; (3) voluntário,
espontâneo, livre e

esmagadoramente unânime.

31 Designa-se de livre o consenso que decorre de um entendimento (voluntário e unânime) implícito


entre a

generalidade dos cidadãos, individualmente ou organizados em grupo sobre instituições e modos de


organização, como por

exemplo sobre o processo de tomada de decisões, isto é, sobre a regra de definição de regras.

28

É o que abrange as regras fundamentais e instituições da sociedade, tais como a liberdade

económica e a propriedade privada, a estruturação do Estado limitada aos direitos individuais e à

participação dos cidadãos, através da democracia económica e financeira, da democracia directa,


semidirecta e da co-decisão.

Capitulo III

Os sistemas económicos: doutrinas e regimes

1. Aspectos gerais e conceitos

A intervenção do Estado, utilizando medidas de compensação e utilizando medidas de

compensação e correcção, justifica-se pelas limitações, incapacidades ou falhas 32 do mercado que,

apesar de poder fazer uma eficiente gestão de recursos, não está em condições de fazer a melhor

redistribuição de rendimentos.

Por regime económico entendem-se todas as formas de articulação estrutural do poder político

com a actividade económica.

Ora, antes interessa, falar do conceito de sistema económico que cobre realidades diversas.

Partindo de noção fundamental de sistema como sendo o conjunto de elementos unidos por um

conjunto de relações, teremos que o sistema económico integra formas típicas e globais de organização
e funcionamento da sociedade em geral e da sua actividade económica em especial33

32 SOUSA FRANCO, A., ob. cit., p. 17.

33 Para aprofundamento, veja-se SOUSA FRANCO, A., ob. cit., p. 48 e PEREIRA DE SOUSA, Domingos,
Finanças

Públicas, Universidade Técnica, ISCSP, Lisboa, 1992, p. 59.

29

Quanto ao sistema financeiro temos que ele exerce funções que podem constituir fins possíveis

da sua gestão, configurando grandes tipos e efeitos objectivos resultantes do respectivo financiamento,

com destaque para as funções sociais do Estado.

Os sistemas económicos remontam do período pré-industrial e industrial por excelência,

resultando em sistemas pré-industriais e em sistemas da sociedade industrial.

A revolução industrial aparece como elemento chave de delimitação do sistema económico no

tempo, faz a ruptura fundamental, constituindo um marco histórico importante.

Destaque para as alterações técnicas e formas de organização institucional e da actividade

económica.

De seguida enunciam-se os sistemas económicos dominantes e as instituições que lhes são

características.

2. Os sistemas económicos dominantes na actividade são:

Sistema económico capitalista

O sistema económico capitalista tem como base os ideais liberalistas, as regras de iniciativa

privada dos agentes económicos e a livre concorrência.

É o sistema mais antigo e emerge da revolução industrial e caracteriza-se por34:

a) Existência de um conjunto de instituições jurídico-sociais típicas;


34 SOUSA FRANCO, A., ob. Cit., p. 48.

30

b) Um conjunto de princípios, leis económicas fundamentais que regulam o funcionamento

da vida económica;

c) Um móbil específico das actividades económicas.

Quanto a instituições

No domínio da produção salientam-se o capital e a empresa. Para o funcionamento do sistema

capitalista integram-se no quadro organizacional:

a) A propriedade privada;

b) Iniciativa privada da qual destaca-se

. liberdade de contratar,

. liberdade de trabalho,

. liberdade de empresa.

Princípios económicos

Os princípios fundamentais deste sistema são os seguintes:

a) Princípio de mercado, onde se destacam as regras da oferta e da procura;

b) A propriedade privada e a liberdade económica como condições básicas para o progresso

e bem-estar social de todo o povo;

c) O lucro como motivação típica, ao contrário do que acontece no sistema colectivista.

Regimes

No sistema capitalista temos dois regimes económicos, a saber:

31

A. Liberalismo; e

B. Intervencionismo35

.
2.4.1. O liberalismo

No liberalismo temos como características as finanças clássicas ou neutrais, com um reduzido

peso do poder político na actividade económica, por entender-se que a economia privada, através do

mecanismo dos mercados, pode assegurar o máximo de produção e a recta distribuição do


rendimento36

No liberalismo as finanças públicas são dominadas pelas seguintes perspectivas:

a) Quanto ao seu lugar e função: dominam os princípios de privatização da economia, sector

público reduzido, mínimo quantitativo e qualitativo e simplicidade da actividade económica;

b) Quanto às suas relações com a economia privada: dominam as ideias de separação entre

finanças e economia, elasticidade dos fenómenos e abstracção económica do Estado;

c) Quanto à estrutura jurídica das finanças: os aspectos principais resumem-se na importância

da participação democrática parlamentar na actividade financeira, arbitragem entre o poder público e o

direito privado, em ordem a garantir os direitos do homem cidadão-proprietário e o princípio da

legalidade;

d) Quanto à configuração dos instrumentos financeiros: a importância primordial do imposto e

do equilíbrio orçamental.

2.4.2. O intervencionismo

35 Sobre estes dois regimes, para maiores desenvolvimentos, veja-se SOUSA FRANCO, ob. cit., pp. 50 a
66.

36 Teixeira Ribeiro, ob. Cit., p. 40.

32

No intervencionismo encontramos as finanças activas, modernas ou funcionais37, as quais

são dominadas pelo critério de intervenção do Estado sobre a actividade económico-social38 com vista a

modificar as condições da economia privada39


.

Seguindo o mesmo critério, vejamos os traços definidores das finanças públicas

intervencionistas:

a) Quanto ao seu lugar e função: autonomia do sector público (que passa a ter, para além da

supletiva satisfação das necessidades colectivas, realiza objectivos de política económica e social),

equilíbrio entre economias pública e privada, regra do óptimo (melhor satisfação das necessidades

públicas e o óptimo social), crescente dimensão, pluralidade e complexidade do sector público;

b) Quanto às relações entre actividade financeira e economia privada: o princípio é o da

integração entre economia e finanças, finanças funcionais (que visam realizar fins financeiros e
extrafinanceiros) e finanças activas e o Estado a abandonar a sua passividade e atitude abstencionista;

c) Quanto à evolução das instituições jurídico-políticas: os aspectos de garantia individual e

predomínio parlamentar alteram com o declínio da instituição parlamentar (tecnoburocratização das

decisões) e formas de participação diversificada da sociedade (civil), afirmação predominante dos

direitos económicos e sociais e limitações ao princípio de legalidade;

d) Em relação às instituições financeiras assiste-se ao ressurgimento do património (mobiliário

e imobiliário), à saturação fiscal (com o imposto a ter uma utilização extra-fiscal e subida contínua da

carga fiscal real e psicológica), limitações ao princípio do equilíbrio orçamental com recurso a receitas

não efectivas.

2.5. Intervencionismo stricto sensu e dirigismo

Antes de passar para o estudo de outros sistemas importa sublinhar

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