Você está na página 1de 3

PROJETO, CONSULTORIA, ASSESSORIA ALHOS E BUGALHOS

Quais são os produtos disponíveis em um escritório de Engenharia ou de Arquitetura? Qual é a
natureza desses produtos? Por que é importante, para o profissional entender isso? O que
acontece quando um engenheiro (ou arquiteto) não sabe a diferença entre uma consultoria e
uma assessoria?

TRÊS MINUTOS ­ Ano 18 ­ Número 398 (Ênio Padilha, 19/01/2017)

Nas  minhas  aulas  de  Administração  de  Escritórios  (especialmente  no


tópico  de  Gestão  do  Processo  Produtivo)  essas  perguntas  são  colocadas
para os participantes. E, por incrível que pareça, em turmas de 25 ou 30
profissionais  é  raro  ter  mais  de  dois  ou  três  que  saibam  as  respostas
corretas. Pior: mais de 75% da turma, geralmente, não fazem a menor
ideia de como responder a essas questões.

Então, a primeira coisa que eu faço, antes mesmo de dar as explicações
devidas, é chamar a atenção deles (dar­lhes um pito) sobre a gravidade dessa ignorância. Se você não
sabe  qual  é  a  natureza  do  seu  produto  você  não  é  capaz  de  estabelecer  estratégias  corretas  de
produção, distribuição, negociação e, principalmente, precificação. Acho terrível que as faculdades não
ensinem ao aluno o mínimo necessário para que ele possa identificar o tipo de produto que produzirá e
entregará  ao  mercado.  Nesse  campo,  confundir  alhos  com  bugalhos  (*)  vai  resultar,  certamente,  em
um pão mal feito.

Começamos  pelo  mais  simples.  Pergunto  para  a  turma,  "Todo  mundo  aqui  sabe  o  que  é  um  Projeto,
não sabe?". Todo mundo sabe.
"Alguém é capaz de dar a definição de Projeto de Engenharia ou de Arquitetura?" Começa a confusão.
Aparecem as definições mais simplórias e absurdas.
Eu falo "Gente! vocês não sabem nem definir/descrever o produto que vocês vendem! Como esperam
fazer bons negócios com ele?"

Então, vamos lá: um PROJETO DE ENGENHARIA pode ser definido como uma PREVISÃO,
baseada em
• Normas Técnicas
• Conceitos Tecnológicos Básicos
• Conhecimentos e experiência do projetista
• Definições do Cliente
• Condicionamentos
apresentada sob a forma de
• Desenhos (principais, auxiliares e detalhes construtivos)
• Diagramas
• Gráficos
• Textos
• Memória de Cálculo
• Memória Descritiva
• Especificação de Material
• Quantificação de Material
com o objetivo de
• Garantir a correta e completa execução de uma obra ou serviço.

A  CONSULTORIA  por  sua  vez  é  um  serviço  prestado  por  um  profissional,  geralmente  com  muito
conhecimento  e  experiência,  e  que,  essencialmente,  consiste  em  análise  e  diagnóstico.  Simples
assim.
Todo serviço prestado por um engenheiro ou arquiteto é, em última análise, a solução de um problema
do cliente. No caso específico da Consultoria, o problema consiste em uma DÚVIDA. Alguma coisa que
o cliente não sabe ou não consegue identificar corretamente. Por isso, o profissional precisa ter muito
conhecimento, muita competência técnica e muita experiência, pois precisará ter um olhar qualificado,
deverá fazer as perguntas certas e ser capaz de ligar os pontos em busca do melhor diagnóstico para
o caso.
Observe que, numa consultoria não é necessário resolver completamente o problema. O importante é
o  diagnóstico.  A  solução  do  problema  poderá  ser  através  de  um  PROJETO  ou  de  uma  ASSESSORIA.  O
artigo  CONSULTORIA ­ O QUE É E O QUE NÃO É,  do  competente  consultor  Alberto Costa  traz  uma
explicação bem interessante e algumas analogias muito boas que ajudarão o leitor a entender melhor
o conceito.

A  ASSESSORIA  é  o  terceiro  tipo  de  serviço  prestado  por  um  profissional  de  engenharia  ou  de
arquitetura.  É  uma  atividade  executiva.  Trata­se  da  disponibilização  de  seus  conhecimentos,
habilidades e capacidades para a realização de um trabalho para o cliente, demandando, basicamente,
dedicação de tempo. 
O  acompanhamento,  fiscalização  ou  gerenciamento  de  uma  obra  é  um  exemplo  típico  de  Assessoria.
Assumir  a  responsabilidade  técnica  pelo  funcionamento  de  uma  empresa  ou  pela  construção  de  uma
residência também são exemplos de assessoria.

É  preciso  entender  a  diferença  enorme  que  existe  na  natureza  dos  produtos  Projeto,  Consultoria  e
Assessoria.

O  projeto  é  um  produto  de  "linha  de  produção"  exige  uma  estrutura  própria  e,  eventualmente,  a
participação  de  uma  equipe  de  trabalho.  É  possível  prever  suas  etapas  e  o  tempo  de  duração  da
atividade.  É  claro  que,  para  isso,  o  escritório  precisa  ser  bem  organizado  e  bem  administrado.  Mas  é
perfeitamente possível, sim senhor.

A Consultoria  é  um  trabalho  cuja  duração  é  imprevisível.  Depende  da  competência  do  profissional  e
da  qualidade  da  sua  relação  com  o  cliente.  Quanto  melhor  forem  essas  duas  coisas,  mais  rápido  se
desenrolará o trabalho e melhores serão os resultados.

Já  a Assessoria,  como  foi  visto,  demanda  tempo.  Depende  do  tamanho  da  tarefa.  pode  durar  horas,
dias, semanas, meses e até anos.

Todas  as  estratégias  de  apresentação  desses  serviços  ao  mercado  bem  como  sua  negociação  com  os
clientes  dependem  de  o  profissional  estar  completamente  inteirado  da  natureza  diferente  deles.  Cada
produto  deve  ser  identificado,  apresentado,  precificado  e  negociado  de  maneira  diferente.  Não  é
demais repetir: confundir alhos com bugalhos resulta em problemas.

Um exemplo claro está justamente na precificação. O valor a ser cobrado pelos PROJETOS tem muita
relação  com  os  custos  diretos  de  produção,  com  os  custo  fixo  operacional  do  escritório  e  com  os
diferenciais competitivos do profissional.

A  precificação  das  CONSULTORIAS,  no  entanto,  não  deve  seguir  essa  lógica  ou  esses  parâmetros.
Deve  ser  estabelecido  um  preço  que  leve  em  conta  a  competência  do  profissional  e  o  custo  (para  o
cliente)  de  não  resolver  o  problema.  Uma  consultoria  nunca  deve  ter  seu  preço  determinado  pelo
tempo  que  o  profissional  leva  para  entregar  o  resultado.  Muito  pelo  contrário.  A  lógica  indica  que
quanto  mais  competente  e  capaz  for  o  profissional  menor  é  o  tempo  que  ele  leva  para  apresentar  o
diagnóstico.

As  ASSESSORIAS,  no  entanto,  podem,  perfeitamente,  serem  precificadas  tomando­se  o  tempo
dedicado à tarefa como principal parâmetro. Afinal de contas, na assessoria não se faz diagnósticos. O
trabalho consiste em operacionalizar a solução do problema.

Podemos  dizer,  de  uma  maneira  simplificada,  que,  no  Projeto  o  profissional  vende  estrutura  e
competência  técnica;  na  Consultoria  ele  vende  inteligência  e  experiência  profissional  e,
na Assessoria ele vende mão de obra qualificada.

Todo profissional deve organizar seu portfólio de produtos (serviços) usando esses parâmetros. Assim
terá  maior  clareza  sobre  quais  referências  devem  ser  utilizadas  e  como  devem  ser  conduzidas  as
negociações com os seus clientes.

ÊNIO PADILHA
www.eniopadilha.com.br | professor@eniopadilha.com.br

(*)  O  português  António  Pinto  de  Magalhães  explica  que  o  BUGALHO  —  cuja  imagem  aparece  na
ilustração,  no  topo  deste  artigo  —  é  uma  galha  arredondada  ou  coroada  de  tubérculos  que  se
forma  nos  carvalhos  e  que  é  usado  para  fazer  farinha  de  pão.  É  muito  comum  em  Portugal.
Quando  descascado  o  bugalho  fica  exatamente  da  cor  do  alho  o  que  pode  gerar  confusão  na
cozinha. Daí a expressão, dos antigos, "Não se deve confundir Alhos com Bugalhos".

Você também pode gostar