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CONTEMPORÂNEA II
CURSOS DE GRADUAÇÃO – EAD
História da Filosofia Contemporâea II – Prof. Ms. Alexis Daniel Rosim, Prof. Ms. Luís
Fernando Crespo e Prof. Dr. Stefan Vasilev Krastanov
HISTÓRIA DA FILOSOFIA
CONTEMPORÂNEA II
Caderno de Referência de Conteúdo
Batatais
Claretiano
2013
© Ação Educacional Claretiana, 2010 – Batatais (SP)
Versão: dez./2013
190 R73h
ISBN: 978-85-67425-68-9
CDD 190
Preparação Revisão
Aline de Fátima Guedes Cecília Beatriz Alves Teixeira
Camila Maria Nardi Matos Felipe Aleixo
Carolina de Andrade Baviera Filipi Andrade de Deus Silveira
Cátia Aparecida Ribeiro Paulo Roberto F. M. Sposati Ortiz
Dandara Louise Vieira Matavelli Rodrigo Ferreira Daverni
Elaine Aparecida de Lima Moraes Sônia Galindo Melo
Josiane Marchiori Martins
Talita Cristina Bartolomeu
Lidiane Maria Magalini
Vanessa Vergani Machado
Luciana A. Mani Adami
Luciana dos Santos Sançana de Melo
Luis Henrique de Souza Projeto gráfico, diagramação e capa
Patrícia Alves Veronez Montera Eduardo de Oliveira Azevedo
Rita Cristina Bartolomeu Joice Cristina Micai
Rosemeire Cristina Astolphi Buzzelli Lúcia Maria de Sousa Ferrão
Simone Rodrigues de Oliveira Luis Antônio Guimarães Toloi
Raphael Fantacini de Oliveira
Bibliotecária Tamires Botta Murakami de Souza
Ana Carolina Guimarães – CRB7: 64/11 Wagner Segato dos Santos
Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução, a transmissão total ou parcial por qualquer
forma e/ou qualquer meio (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação e distribuição na
web), ou o arquivamento em qualquer sistema de banco de dados sem a permissão por escrito do
autor e da Ação Educacional Claretiana.
CRC
Ementa––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Arthur Schopenhauer. Sören Kierkegaard. Friedrich Nietzsche. Henri Bergson.
Edmund Husserl. Jean-Paul Sartre. Maurice Merleau-Ponty. Martin Heidegger. A
Escola de Frankfurt.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
1. INTRODUÇÃO
O Caderno de Referência de Conteúdo História da Filoso-
fia Contemporânea II dá continuidade à reflexão iniciada no CRC
anterior, apresentamos o contexto histórico e quais as principais
questões e discussões que a Filosofia proporcionou ao mundo, es-
pecialmente, na França e na Alemanha. Com isso, a razão passa
a ser a mãe de todo o saber filosófico e crítico, o que ocasiona
grandes discussões e críticas do pensamento contemporâneo. Esta
fase pode ser considerada a de maior desenvolvimento crítico.
No Caderno de referência de conteúdo, você encontrará um
texto mais denso, que exigirá de você uma leitura mais atenciosa
e reflexiva. Contudo, trata-se de um esforço recompensador, pois
lhe ampliará a visão e a compreensão acerca da filosofia alemã nos
séculos 19 e 20, e da francesa no século 20, à esteira de seus prin-
cipais representantes, como Kierkegaard, Schopenhauer, Nietzsche,
8 © História da Filosofia Contemporânea II
Abordagem Geral
Prof. Dr. Stefan Vasilev Krastanov
Doutor em Filosofia pela UFSCAR com a tese "Nietzsche:
pathos artístico versus consciência ética"
Glossário de conceitos
O Glossário de Conceitos permite a você uma consulta rá-
pida e precisa das definições conceituais, possibilitando-lhe um
bom domínio dos termos técnico-científicos utilizados na área
de conhecimento dos temas tratados no CRC História da Filosofia
Contemporânea II. Por uma opção pedagógica do autor, os termos
do glossário não seguem uma ordem alfabética, mas uma ordem
cronológica da importância que cada um dos conceitos adquire
ao longo do estudo desse material. Veja, a seguir, a definição dos
principais conceitos:
1) Dialética subjetiva: noção utilizada por Kierkegaard
como contraponto à dialética objetiva de Hegel. No in-
terior da filosofia de Kierkegaard, a dialética subjetiva
deve ser entendida como existência. Ela passa por três
etapas: estética, ética e religiosa, que postula a tríade da
vivência pessoal.
2) Princípio da razão: expressão utilizada por Schopenhauer
para designar a categoria causalidade como uma das for-
mas puras do sujeito cognoscente.
3) Princípio da individuação: no interior da filosofia scho-
penahueriana, essa noção é utilizada para designar o
© Caderno de Referência de Conteúdo 23
Questões Autoavaliativas
No final de cada unidade, você encontrará algumas questões
autoavaliativas sobre os conteúdos ali tratados. Responder, discu-
tir e comentar essas questões, bem como relacioná-las à prática
do ensino de Filosofia, pode ser uma forma de medir seu conheci-
mento, de ter contato com questões pertinentes aos assuntos tra-
tados e de ajudar em sua preparação para a prova final, que será
dissertativa. Mais ainda: é uma maneira privilegiada de adquirir
uma formação sólida para sua prática profissional.
Bibliografia Básica
É fundamental que você use a Bibliografia Básica em seus
estudos, mas não se prenda só a ela. Consulte, também, as biblio-
grafias complementares.
Dicas (motivacionais)
O estudo deste CRC convida você a olhar, de forma mais apu-
rada, a Educação como processo de emancipação do ser humano.
É importante que você se atente às explicações teóricas, práticas
e científicas presentes nos meios de comunicação, bem como par-
tilhe suas descobertas com seus colegas de curso, pois, ao com-
partilhar com outras pessoas aquilo que você observa, permite-se
descobrir algo que ainda não se conhece, aprendendo, assim, a
ver e a notar o que não havia sido percebido antes. Observar é,
portanto, uma capacidade que nos impele à maturidade.
Você, como aluno dos Curso de Graduação na modalidade
EAD como e futuro profissional da educação, necessita de uma for-
mação conceitual sólida e consistente. Para isso, você contará com
a ajuda do tutor a distância, do tutor presencial e, sobretudo, da
interação com seus colegas. Sugerimos, pois, que organize bem o
seu tempo e realize as atividades nas datas estipuladas.
É importante, ainda, que você anote suas reflexões em um
caderno ou no Bloco de Anotações, pois, no futuro, elas poderão
ser utilizadas na elaboração de sua monografia ou de produções
científicas.
Leia os livros da bibliografia indicada, para que você amplie
seus horizontes teóricos. Coteje-os com o material didático, discu-
ta as unidades com seus colegas de curso e com o tutor e assista
às videoaulas.
No final de cada unidade, você encontrará algumas questões
autoavaliativas, que são importantes para a sua análise sobre os
conteúdos desenvolvidos e para saber se estes foram significativos
para sua formação. Indague, reflita, conteste e construa resenhas,
pois esses procedimentos serão importantes para o seu amadure-
cimento intelectual.
© Caderno de Referência de Conteúdo 31
2. CONTEÚDOS
• C
ontexto social, histórico, político e econômico; as for-
mas de existência do homem: ética, estética e religiosa;
o conceito de angústia; contexto social, histórico, políti-
co e econômico; o conceito de representação; o conceito
de vontade; relação entre vontade e intelecto; estética;
a tragédia como arte suprema; o Santo e a Ética da com-
paixão; contexto social, histórico, político e econômico;
o nascimento da Tragédia; as contribuições de Wagner
e Schopenhauer para a formação do pensamento de
Nietzsche; o desenvolvimento do pensamento de Nietzche;
a vontade de Poder; o apolíneo e o dionisíaco; a crítica
ao nihilismo; a superação do nihilismo; o Eterno retorno;
opconceito de "além-do-homem".
© U1 - Kierkegaard, Schopenhauer e Nietzsche 35
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
O percurso histórico filosófico proposto neste material di-
dático abrange o período posterior ao fim do idealismo alemão,
isto é, o período em que o reinado da razão, por assim dizer, sede
lugar às correntes irracionalistas e voluntaristas (Schopenhauer e
Nietzsche) e à tendência existencialista iniciada por Kierkegaard.
Veremos, portanto, uma nova proposta filosófica que sai das por-
tas do academismo para filiar-se à vida. Essa ruptura com a filoso-
fia acadêmica causa impacto devastador sobre a concepção teóri-
ca inaugurada desde Sócrates e Platão e põe definitivamente em
prova a noção da verdade. Como consequência dessa implosão da
verdade operada pela filosofia de vida e o existencialismo, põem-
se em dúvida, também, os valores tradicionais. Levantam-se novos
problemas diante da especulação filosófica e novas tarefas diante
os filósofos.
5. KIERKEGAARD
Kierkegaard é dos pensadores que não foram compreendi-
dos durante a sua vida, pois as suas ideias transcenderam o tempo
e, justamente por isso, permaneceram distantes e incompreendi-
dos por seus contemporâneos. Diferentemente de pensadores
© U1 - Kierkegaard, Schopenhauer e Nietzsche 37
Estético
A primeira forma da existência humana é a forma estética
da existência. Temos de frisar que o filósofo não fala do estético
como fenômeno objetivo ou como realidade ou parte da realida-
de, mas como modo de existência e relação para com o mundo.
Como modo de existência, o estético é oposto ao ético, homem
estético versus homem ético. Apesar de o estético ser assinalado
como inferior em relação ao ético, Kierkegaard tem argumentos
em prol do estético: "Abaixo do céu do estético tudo é leve, bonito
e fugaz. Quando a ética vem à tona tudo se torna duro, quadrado
e infinitamente fastio" (KIERKEGAARD, s/d.,p.26).
A principal característica do estético, conforme o filósofo, é
a existência imediata. E isso quer dizer que a forma estética da
existência se encontra na parte física e não na parte espiritual do
homem, na sua sensibilidade, que é inimiga mortal do espírito. O
homem estético permanece na esfera do imediato, ao passo que
o homem ético tende na esfera da consciência e da reflexão. O
homem estético não escolhe a si mesmo, como faz o homem éti-
co, ele se apaixona por si mesmo, como Narciso. No entanto, o
homem estético não é do tipo hedonista – caçador de prazeres. O
verdadeiro esteta não encontra os prazeres no exterior, nos obje-
tos, mas dentro de si mesmo. As condições do prazer permanecem
fora dele, mas o próprio prazer encontra-se nele, na sua própria
existência em que sempre há algo do narcisismo.
O esteta não gosta de ação, não gosta de fazer nada. O im-
portante, para ele, é a contemplação e o prazer que esta suscita.
O seu destino é o erótico e sua forma suprema – a sedução. Nesta
empreitada ele é incomparável.
Ético
O primeiro volume de Ou ético ou estético é escrito sob o
prisma do esteta, o segundo – sob o prisma do homem ético, que
deve mostrar a superioridade do seu foco sobre a sensibilidade
imediata do estético. Justamente esse dilema origina o próprio
título e a problemática do escrito. Semelhante ao príncipe dina-
marquês Hamlet, que coloca o dilema: ser ou não ser, o pensador
dinamarquês retoma tal dilema sob o mesmo registro – Ou – ou.
Mas a semelhança vai até certo ponto, visto que Hamlet não sabia
o que é melhor – ser ou não ser, ao passo que Kierkegaard dá o(s)
seu(s) pró(s) em prol do ético. Temos que frisar que o segundo vo-
lume (sobre ético) é escrito primeiro, mas na composição do livro
é colocado após o volume dedicado ao estético. Tudo isso para
mostrar os argumentos válidos contra a forma estética da existên-
cia. No entanto, Kierkegaard escreve tão bem sobre o estético que
deixa dúvidas a respeito das suas preferências existenciais.
No primeiro volume, sobre o estético, a análise do filósofo é
voltada ao amor em geral, desvinculado de normas e obrigações,
assim como ele se manifesta na vida do sedutor. No segundo volu-
me, sobre o ético, a análise do filósofo se dirige ao amor no casa-
mento amparado pela legislação institucional. E aí que o filósofo
vai mostrar a metamorfose do amor estético ao amor ético.
A apologia do casamento na filosofia de Kierkegaard tem um
significado rigoroso e destino certo. O amor no casamento é com-
parado com o amor estético, porém, o primeiro é privilegiado por
Kierkegaard por conter em si, componentes éticos e religiosos. O
casamento é a expressão suprema do estético, pois nele o estético
se realiza plenamente metamorfoseando em ético.
A diferenciação entre o homem ético e estético é, segundo
Kierkegaard, essencial. O esteta vê em todo lugar possibilidades,
ao passo que o homem ético – deveres. O traço marcante da exis-
tência ética é a escolha. A escolha é o elemento da vivência que
alicerça toda filosofia kierkegaardiana. O ato supremo do homem
© U1 - Kierkegaard, Schopenhauer e Nietzsche 45
6. SCHOPENHAUER
Schopenhauer é um dos mais célebres pensadores do século
19 que traçam caminho novo no itinerário filosófico. Partindo da
tradição filosófica reinante, herdeiro da filosofia clássica alemã e
seu caráter sistemático, Schopenhauer cria um sistema, rigorosa-
mente dividido em quatro partes tradicionais, a saber: ontologia,
gnosiologia, ética e estética.
A Representação
A vontade
A vontade, conforme a concepção filosófica de Schope-
nhauer, é a essência mais primeva do mundo, causa de todos os
fenômenos. Ela é caracterizada como eterna, atemporal, não en-
velhece, nem se destrói. Ela não tem conotação física, mas, sim,
metafísica. Ela é sempre igual a si mesma e apesar das suas ma-
nifestações diversas, ela não conhece diferenciação interna. Essas
reflexões do filósofo são baseadas no fato de que, se a toda di-
ferença pressupõe algo dado, isto é, algo real, e visto que tudo
no mundo fenomênico é representação e, esta, por sua vez, não
passa de ilusão, tudo seria vontade.
Para resolver a contradição que se desenha entre a vonta-
de una e suas manifestações diversas, Schopenhauer se utiliza de
uma noção advinda do pensamento oriental – o conceito de Maya
– a capacidade das personagens divinas de se transformarem e
encarnarem em formas diferentes – que expressa, grosso modo, o
símbolo da ilusão do ser. Diz Schopenhauer:
E Maya é o véu da ilusão, que, ao cobrir os olhos dos mortais, lhes
faz ver um mundo que não se pode dizer se existe ou não existe, um
mundo que se assemelha ao sonho, à radiação do sol sobre a areia,
onde, de longe, o viajante acredita ver uma toalha de água, ou ain-
da a uma corda atirada por terra, que ele toma por uma serpente
(SCHOPENHAUER, 2001, p. 14).
7. NIETZSCHE
Para os pensadores e artistas, a vida de Nietzsche é tão inte-
ressante quanto a suas ideias. Essas
ideias influenciaram várias gerações
da intelectualidade europeia do final
do século 19 e início do século 20,
tornando-se fonte inesgotável que
alimenta as ideias dos futuros pen-
sadores, escritores e artistas. A vida
de Nietzsche também não passa
omissa. Thomas Mann chama seu
Doutor Fausto – sua obra prima – ro-
mance de Nietzsche. A ideia de
Nietzsche sobre vida vista como Figura 3 – Nietzsche
obra de arte, é enunciada como se
tivesse sido inspirada em sua própria
vida.
Nascido num pequeno vilarejo na Alemanha, Röcken, em
1844, numa família de pastores protestantes, Nietzsche, em 1864,
termina o célebre colégio de Pforta, onde, antes dele, estudaram
celebridades como Fichte, Schlegel, Novalis e outros. Em seus es-
tudos posteriores Nietzsche se divide entre a teologia e a música,
mas, por fim, escolhe filologia clássica para permanecer fiel, para
sempre, à antiguidade. Após alguns anos de estudo nas Univer-
© U1 - Kierkegaard, Schopenhauer e Nietzsche 61
Períodos
Grosso modo, podemos assinalar três períodos da evolução
intelectual do pensamento nietzschiano, a saber:
• Escritos sobre os gregos – incluindo obras como O Nasci-
mento da tragédia, A filosofia da época trágica dos gre-
gos, o Drama musical grego, até Considerações contem-
porâneas, todos datados do período juvenil de Nietzsche
– um período de transição de filologia para a filosofia.
Neste período brotam ideias importantes que permeiam
os escritos posteriores do filósofo, como por exemplo, o
conceito de trágico, o dionisíaco, a transvaloração dos va-
lores, o conceito de eterno retorno, entre outros.
• O segundo período da gênese do pensamento nietzschia-
no ocupa-se com a crítica radical do niilismo. Este período
destaca o espírito crítico do filósofo. Eis algumas obras
deste período: Humano, demasiado humano, Aurora,
Gaia Ciência, O andarilho e a sua sombra, Aurora.
• Terceiro período, isto é, o período da maturidade, anuncia
a tentativa da superação do niilismo postulado pela tradi-
ção a partir dos conceitos do eterno retorno, vontade de
potência e além do homem. As obras que estão de acordo
com esse período são: Assim falou Zaratustra, Para além
do bem e mal, Para a Genealogia da moral, Crepúsculo
dos ídolos, O anticristo, Ecce Homo etc.
A questão da periodização das obras de Nietzsche é bastante
complicada e envolve diversas controvérsias sobre o assunto, visto
que existem muitas obras que envolvem partes e capítulos escritos
em diferentes períodos. Além disso, existe uma quantidade consi-
derável de escritos não publicados durante a sua vida, conhecidos
como póstumos. De qualquer maneira, nossa abordagem será nor-
teada à periodização citada anteriormente, como sendo conside-
ravelmente aceita.
© U1 - Kierkegaard, Schopenhauer e Nietzsche 63
O nascimento do trágico
O primeiro período dos escritos nietzschianos revela um for-
te interesse a uma retomada ao modelo grego suscitado, sobretu-
do dos seus estudos filológicos sobre antiguidade. A obra em des-
taque deste período é O Nascimento da tragédia. Porém, temos
que frisar que O Nascimento da Tragédia não é um escrito estrita-
mente filológico, mesmo que se associe com período filológico de
Nietzsche. Encontra-se, nesta obra, o abandono do rigor filológico
que o filósofo pouco prezava, em nome da liberdade de voar so-
bre os mistérios da vida e resgatar seu sentido perdido. Esta obra
claramente aponta para uma transmutação do pensamento anun-
ciando uma tempestade inevitável. Mas sob que condições isto
ocorreu? Para que possamos explicar essa mudança radical, será
imprescindível recorrer um pouco à biografia do filósofo, principal-
mente da juventude, em que brotam, grosso modo, algumas ideias
que vão se delineando ao longo da sua história intelectual.
A época em que Nietzsche vive na Alemanha é dominada
pelo espírito protestante, que estava dilacerado pelo movimen-
to pietista, que pretendia retornar para as teses originais da re-
forma protestante, negando teologia, cultos e ritos de qualquer
organização eclesiástica, contudo, voltando atenção à vida civil e
sua dimensão prática e utilitária. Esta repulsa contra a metafísi-
ca entendida como organon, para alcance da transcendência re-
ligiosa, talvez possa elucidar o ponto de partida de Nietzsche. Ele
demonstra que os sistemas metafísicos colocam a vida individual
entre parentes em função da "verdade eterna" e concebem o indi-
viduo como sendo predeterminado. Por volta de 1862, no seu arti-
go escrito para "Germânia", intitulado Sobre a infância dos povos,
Nietzsche lança a ideia de que a religião, em sua origem, nada mais
é do que a manifestação da criatividade dos povos, que subtrai
qualquer divindade do mundo, depositando-a no reino da trans-
cendência. De acordo com isso, Nietzsche escreve:
O fato de que Deus é transformado em homem, não deve conduzir
o homem ao infinito, mas deve levá-lo a fundar sobre a terra seu
Crítica do niilismo
Na sua obra mais sistemática – "Genealogia da Moral" –
Nietzsche se impõe a tarefa de denunciar, não só a origem da
moral, mas também, a sua transformação ao longo da história. O
problema genealógico é introduzido ainda no prólogo da obra, no
qual Nietzsche resumidamente coloca seus objetivos: "meus pen-
© U1 - Kierkegaard, Schopenhauer e Nietzsche 73
INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR
Lebrun prefere usar "suspeita" em vez de "crítica". Diz ele: "Dize-
mos de propósito suspeita, e não crítica – pois trata-se de ope-
rações bem distintas. O crítico é aquele que aborda o texto de
frente, que se prende às incoerências do autor, às liberdades que
toma ele com a documentação, à leviandade com a qual constitui
seus conceitos, etc. Já o que suspeita não vai tão longe. É diante
das palavras que ele se detém – procurando aquilo que quem as
emprega sequer sentiu necessidade de esclarecer, a tal ponto lhe
parecia inútil a precisão" – (LEBRUN, s/d., p. 118)
INFORMAÇÃO:
Amor fati expressa o dizer sim a toda sua vida independente dos
seus acontecimentos.
encontrar razões suficientes para afirmar a vida, uma vez que esta
escapa do eixo norteador sentido–segurança (o eixo que vigora na
cultura ocidental desde a época de Sócrates), dirige-se implaca-
velmente à renúncia. Ao contrário, Nietzsche dá um passo para
frente, para além da consciência ética, além dos valores morais,
transcendendo-os com pathos artístico.
Para Schopenhauer, o fluxo eterno da vida revela um pesa-
delo, que poderia terminar com a negação do eu. Para Nietzsche,
ao contrário, essa móvel, colorida e passageira imagem de frag-
mentos fugazes de vida apresenta uma perfeita e viva obra de arte
em que resplandece o sentido trágico, diante do palco do criador
trágico.
Sem sombra de dúvida, Nietzsche deve muito a Schopenhauer,
especialmente no que se refere ao conceito da vontade – uma
eterna guerra, um conflito perpétuo entre seus fenômenos, que
desvela o caráter trágico da existência. Apesar de descobrir esse
caráter, Schopenhauer não o quer tal como ele é e, por conseguin-
te, nega-o.
Nietzsche, por sua vez, aceita e afirma justamente aquilo
que seu precursor rejeita – a vontade e a vida em sua efetividade
ininterrupta, com todos os seus terríveis aspectos e sofrimentos.
Pode-se, sem dúvida, reconhecer na dor, no sofrimento, na alegria
e no sentimento de poder, a encarnação do princípio dionisíaco, o
princípio que atribui ao mundo e à vida uma compreensão estéti-
ca.
Caso seja possível resumir em poucas palavras as diferenças
entre ambos, teríamos de fazer isso baseados na oposição: cons-
ciência ética – pathos artístico. No trecho a seguir, extraído de Pa-
rerga e Paralipomena, podemos identificar a tendência moral de
Schopenhauer:
que o mundo possui apenas uma significação física, e nenhuma
moral, constitui o maior, o mais condenável, e o mais fundamen-
tal erro, a própria perversidade da mentalidade, e provavelmente
forma no fundo aquilo que a fé personificou como o anticristo
(SCHOPENHAUER, 2004, p. 243).
9. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
As questões autoavaliativas têm como propósito a autoveri-
ficação do processo de aprendizagem durante o estudo da unida-
de. Por isso não deixe de responder às questões colocadas no final
de cada unidade para conferir a sua aprendizagem!
© U1 - Kierkegaard, Schopenhauer e Nietzsche 107
6) Uma das formas que o homem na sua existência escolhe é a forma estética.
No que ela consiste?
a) A forma estética da existência apresenta uma existência imediata cujo
enfoque cai sobre a parte física. A forma estética da existência dispensa a
ação em prol da contemplação. O representante desta forma é o sedutor.
b) A forma estética da existência é vinculada à vida do artista, aquele que
aprecia e cria obras de arte.
c) A forma estética da existência revela-se como contemplação mediata da
vontade por meio das obras artísticas.
d) A forma estética da existência revela-se como contemplação desinteres-
sada e imediata da realidade profunda das coisas.
Gabarito
1) b.
2) a.
3) a.
© U1 - Kierkegaard, Schopenhauer e Nietzsche 109
4) c.
5) d.
6) a.
7) b.
10. CONSIDERAÇÕES
Você pôde acompanhar, nesta apostila, a filosofia de
Kierkegaard, Schopenhauer e Nietzsche, um período da filosofia que
trouxe valiosos frutos para todo o pensamento ocidental posterior.
Esses pensadores não só irão exercer influência no domínio da
filosofia, mas, também, em poetas, pintores, compositores etc.
Suas filosofias visavam contemplar os problemas da existência em
seu âmbito mais íntimo. Os conceitos de angustia, vontade, eterno
retorno, estão sempre ligados a um pensamento profundo sobre
a vida que ganha um caráter ilógico e funda uma tragicidade no
pensamento ocidental. Suas visões de mundo são, ainda hoje, um
espelho claro de nossa existência e da nossa dor primordial. Não
deixe de conhecer mais sobre esses pensadores, aprofundando os
conhecimentos adquiridos com o auxílio deste material. Pois esses
filósofos são importantes para todo o futuro desenvolvimento da
filosofia.
Na próxima unidade, você tomará contato com a filosofia
alemã do século 20, por isso não deixe de tirar suas dúvidas sobre
os filósofos contemplados nesta primeira unidade, pois isso pode
facilitar seu aprofundamento nas questões que serão tratadas a
seguir.
Bons estudos!
11. E-REFERÊNCIAS
Figura 1 Kierkegaard. Disponível em: <http://www.marxists.org/glossary/people/k/pics/
kierkega.jpg>. Acesso em: 08 maio 2010.
2
1. OBJETIVOS
• C
ompreender o contexto histórico, político, social e cultu-
ral dos pensadores contemporâneos apresentados nesta
unidade.
• Compreender em que consiste a fundamentação fenome-
nológica.
• Examinar e entender o conceito de epoché.
• Compreender o conceito de ser.
• Examinar a importância da obra Ser e tempo.
• Compreender o conceito de Da-sein e ente.
• Compreender a função da linguagem para a filosofia hei-
deggeriana.
• Compreender o que significa indústria cultural.
• Compreender o conceito de dialética negativa.
• Reconhecer a importância das obras de Marcuse e
Habermas para a filosofia no cenário contemporâneo.
112 © História da Filosofia Contemporânea II
2. CONTEÚDOS
• H usserl: Fundamentação fenomenológica; Epoché = re-
dução eidética ou redução fenomenológica.
• A antropologia filosófica de Max Scheller
• Heidegger: Ser e tempo; ser; dasein; ente; linguagem;
physis; Escola de Frankfurt; teoria crítica.
• M. Horkheimer: razão instrumental.
• T.W. Adorno: dialética negativa; indústria cultural.
• H. Marcuse: ideologia e sociedade industrial.
• J. Habermas: a teoria da ação comunicativa.
4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Na unidade anterior, discutimos sobre as principais temáticas
de Sören Kiekegaard, Arthur Schopenhauer e Friedrich Nietzsche.
Nesta unidade, vamos conhecer as principais características
do pensamento alemão do século 20, além de assimilar as prin-
cipais discussões de Edmund Husserl e Martin Heidegger, como
representantes da fenomenologia, e a Escola de Frankfurt, como
proposta para o pensamento alemão do século 20.
Fundamentos fenomenológicos
Até aqui, foram apresentadas a biografia e as influências,
além do caminho inicial de Franz Brentano, fonte de pesquisa que
a Filosofia necessita para buscar o conhecimento exato. Você tem
ideia de onde o autor buscou tais dados e exatidão? Acertou se
respondeu "na lógica"; a lógica, para Husserl, não é um conheci-
mento estático, mas dinâmico e vivo que oferece fundamentos
para um raciocínio correto e verdadeira apreensão das coisas – a
lógica não é normativa, mesmo oferecendo bases para as ciências
normativas.
INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR
Neste caminhar, o autor tecerá críticas ao pensamento empírico-
psicologista que tenta demonstrar serem as regras lógicas apenas
atos psíquicos aos quais se chega por análise psíquica, empírica.
INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR
Atemporal – diz-se da forma verbal que não indica tempo, isto é,
não localiza a ação ou estado em algum momento, definido com
relação a um ponto de referência, ger. o momento da elocução.
(Dicionário eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa).
Para Husserl, a única coisa que não pode ser posta entre pa-
rênteses, por ser, então, justamente indubitável, realidade eviden-
te e absoluta, é a consciência.
No momento, concluímos as orientações para o pensamento
de Edmund Husserl e o fato fenomenológico. Para dar continuida-
de aos nossos estudos, vamos conhecer o pensamento de Martin
Heidegger e Max Scheler, considerados os grandes expoentes da
fenomenologia.
6. MAX SCHELER
Max Scheler destaca-se como um dos influentes pensadores
do século 20. Partindo da investigação
fenomenológica em sua versão teórica,
Scheler a põem em prática. Dotado de
um gênio enciclopédico, o filósofo mos-
trava-se apto a explorar diversas áreas
do conhecimento humano, como biolo-
gia, psicologia, teoria do conhecimento,
ética, sociologia, religião etc., a partir
das quais enriquece a especulação filo-
Figura 2 – Max Scheler
sófica. As ideias de Scheler exercem
uma notável contribuição sobre o exis-
tencialismo, o personalismo, e, antes de tudo, sobre a antropolo-
gia filosófica que ele mesmo inaugurou e traçou como novo cami-
nho da interrogação filosófica.
Vida e obras
Max Scheler nasceu em 1874, em Munique. Estudou, ini-
cialmente, medicina e filosofia na Universidade de Munique. Pos-
teriormente, terminou a sua livre-docência pela Universidade de
Iena e começou participar, efetivamente, das investigações feno-
menológicas. Nesse período, ele se encontra com Husserl e a sua
fenomenologia. Todavia, não reconhece a influência deste na sua
filosofia. Após alguns anos em Berlin, dedicados ao trabalho inte-
lectual e à publicação de diversas obras, Scheler assume a cátedra
de professor de filosofia na Universidade de Colônia (1919-1928).
Em 1928, o filósofo transfere-se para a Universidade de Frankfurt
e, alguns meses depois, no mesmo ano, morre.
Entre as obras de Scheler, cabem destaque às seguintes:
• O formalismo da ética e ética material dos valores (1913-
1916).
• Fenomenologia e teoria do conhecimento (1913).
• P
ara a idéia do homem (1918).
• A posição do homem no cosmos (1928).
A teoria fenomenológica do conhecimento
Assim como para Husserl, para Scheler a filosofia resume-se
em um modo peculiar da intuição sobre as essências. Com esse
seu caráter eidético, a investigação filosófica difere-se das outras
ciências. A partir dessa perspectiva, digamos puramente fenome-
nológica, Scheler define a fenomenologia como aquela "atitude do
olhar do espírito em que se vê ou se vive algo que, sem tal atitu-
de, permaneceria oculto: ou seja, descobre-se um reino de 'fatos'
de natureza peculiar" (1933, p. 266). A atitude fenomenológica,
assim entendida, difere-se das outras atitudes praticas, técnicas
e até científicas pelo seu caráter desinteressado. A intuição pura-
mente filosófica é a atitude de contemplação desinteressada em
que as coisas são refletidas como são em si mesmas e não em fun-
ção do homem. Ao contrário, a atitude natural, técnica e científica
enfoca as coisas de acordo com os interesses, isto é, de acordo
com as suas utilidades. A contemplação desinteressada que move
o filósofo, só pode ser, segundo Scheler, expressão do espírito. Jus-
tamente essa aptidão espiritual é capaz de ler e de compreender
as coisas em seu caráter essencial.
Vimos, até agora, que o método fenomenológico de Scheler
não difere muito do de Husserl. Todavia, a redução fenomenológica
operada por Husserl, recebe em Scheler uma correção, ou melhor,
um complemento. Segundo Scheler, a suspensão entre parentes
do aspecto existencial das coisas ainda não é capaz de abrir a in-
tuição às essências. Para a realização da contemplação desinteres-
sada, segundo o filósofo, será necessária a inclusão de mais uma
suspensão – a suspensão do emocional, que é, simultaneamente,
expressão da vontade. Portanto, trata-se de suspender-se entre
parentes, também, a vontade. A esse respeito, Scheler afirma: "A
colocação entre parentes da realidade só poderá ocorrer median-
te uma repressão de todas as funções da vontade [...]" (1933, p.
© U2 - Filosofia Alemã do Século 20 121
Vamos conhecê-lo?
Dados Biográficos
Possivelmente você já estudou o pensamento de Martin
Heidegger em outro CRC, seja direta-
mente ou por meio de autores que so-
freram sua influência.
De um modo geral, este autor in-
fluenciou várias linhas de pensamento,
e, saindo mesmo do âmbito filosófico,
ele não tratou em específico de, por
exemplo, ética ou educação, mas nos-
sa proposta com esta unidade é pensar
sobre estes temas a partir de sua obra,
simplesmente porque ele pensou aquilo
Figura 3 – Martin Heidegger
que é base de toda a existência: o Ser.
Martin Heidegger, já em sua época, teve grande repercus-
são pelo seu filosofar singular e pensamento original, já que sua
reflexão causava impacto. Segundo Safranski (2000, p. 134) "o 'pe-
queno bruxo de Messkirch', como breve o chamarão, conseguia
filosofar sobre a vivência de uma cátedra de maneira tal que os es-
tudantes, embora habituados aos fatos bem mais crus da guerra,
ficavam de respiração suspensa".
Qual o marco histórico que corresponde ao período heideg-
geriano? Quais são suas principais influências? Quais são os dados
biográficos do pensador alemão?
A época na qual surge o pensamento heideggeriano é mar-
cada por grande instabilidade sócio-intelecto-moral por conta da
Primeira Guerra Mundial, que abalou o ser humano em todas as
instâncias. Assim, tal pensamento tem o intuito de reestruturar a
Filosofia, re-pensando-a a partir de seu fundamento ordenador: a
questão do Ser.
• Q
uais são as possíveis consequências desta nova visão de
ser?
Ser e Tempo
Após conhecer alguns dados biográficos de Martin Heidegger
e suas maiores influências, perguntamos: qual foi a sua obra de
maior relevância? Que contribuição ela apresenta para a Filosofia
do século 20?
Heidegger deixou uma obra que ultrapassou sessenta volu-
mes, mas o livro mais importante, talvez do pensamento ociden-
tal no século 20, é o Sein und Zeit ("Ser e Tempo"), publicado em
1927. A obra ficou inacabada, pois foram redigidas somente a pri-
meira e segunda seção da primeira parte; a terceira seção da pri-
meira parte e as três seções da segunda parte ficaram somente no
programa. (Cf. HEIDEGGER, 2001a, p. 71). As ideias presentes em
Ser e Tempo inauguram um novo modo de pensar que vem abrir
novos horizontes na questão do Ser e de seu sentido, orientado
pelo tempo.
Qual a proposta de Martin Heidegger com esta obra e a nova
visão de Ser?
Segundo o autor, é preciso resgatar a questão do Ser, pois
ela caiu no esquecimento (aos poucos, o homem foi afastando-se
do Ser e acabou se esquecendo de seu próprio ser).
Mas, pense: o que fazer com toda a metafísica até então,
já que o Ser havia sido esquecido? Destruir; o pensador propõe
a destruição da metafísica tradicional, que significa uma des-
construção3, com o intuito de realizar uma experiência que os
gregos realizaram com o Ser, pois a ideia do Ser teria sido apenas
"transmitida, de geração em geração, como um pressuposto
evidente, natural [...]" (MACDOWELL, 1993, p. 167). Para isso, é
preciso uma nova metafísica, a que o autor chamou de ontologia
fundamental; por conta desta nova ontologia, surgiu a consideração
de Heidegger como um existencialista – ideia que vai ser combatida
por ele, principalmente no texto Sobre o humanismo.
Ser
É interessante notarmos que o pensamento heideggeriano
tem duas fases (Primeiro e Segundo Heidegger):
• Na primeira, a revelação do Ser se dá pelo Da-sein, logo
a analítica existencial é feita daquele ente que possui a
característica de Da-sein – o homem;
• Na segunda, a revelação do Ser se dá pela linguagem
(mais especificamente a poética). Mas a preocupação de
Heidegger em toda a trajetória de seu pensar foi o Ser, a
questão do sentido do Ser.
Vamos conhecer melhor cada um desses pensamentos?
Primeira fase: Revelação pelo Da-sein
Vimos anteriormente como o Ser age nas duas fases do pen-
samento heideggeriano. Mas, o que é o Ser? Para responder a esta
© U2 - Filosofia Alemã do Século 20 133
Horkheimer
Horkheimer (1885-1973) era de as-
cendência judaica, nascido em Stuttgart.
Estudou literatura, passando para a psico-
logia e, desta, para a Filosofia – estudou
em München, Freiburg e Frankfurt. Em
1923 o autor se associou ao Instituto de
Pesquisa Social, do qual passou a ser di-
retor a partir de 1931, quando assumiu o
cargo de professor titular na Universidade
de Frankfurt. Quando o Instituto foi fecha- Figura 4 - Max Horkheimer
do em 1933, Horkheimer estava na Suíça,
em um anexo do Instituto, passando a dirigi-lo – já exilado; pas-
sou a publicar sob o pseudônimo de "Heinrich Regius" até se fixar
nos EUA, em 1934. Apenas em 1948 o autor voltou para Frankfurt,
9. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
Os principais assuntos tratados neste material são a fenome-
nologia de Husserl, Scheler e Heidegger e o pensamento da escola
de Frankfurt. Refletir sobre as questões propostas a seguir pode
ser importante para o seu aprendizado, pois elas abordam temas
específicos dos conteúdos tratados nesta unidade. Portanto, não
deixe de os tentar resolver, isso poderá ser de grande valia para o
seu aprendizado.
1) A fenomenologia como ciência rigorosa investiga:
a) Os fenômenos e as coisas em si.
b) A representação e o noumeno.
c) As aparências e as essências.
d) As essências
2) A filosofia de Heidegger, em geral, podemos definir como:
a) Como ontologia fundamental que se interroga pelo sentido do ser.
b) Como ontologia fenomenológica que interroga pelo sentido dos entes.
c) Como ontologia voluntarista que interroga sobre a liberdade.
d) Como fenomenologia ontológica que interroga sobre a condição huma-
na.
Gabarito
1) d.
2) a.
3) a.
4) d.
5) b.
6) a.
7) c.
© U2 - Filosofia Alemã do Século 20 151
10. CONSIDERAÇÕES
Com o estudo desta unidade, você pôde acompanhar o
desenvolvimento da fenomenologia de Husserl, Scheler e, espe-
cialmente, de Martin Heidegger. Mas, além de ter acompanhado
a nova direção filosófica proposta por esses pensadores, pôde
acompanhar outro importante período da filosofia: o da famosa
escola de Frankfurt e seus principais pensadores.
As questões aqui tratadas foram importantíssimas para a
compreensão do pensamento humano em nossos dias.
Não deixe de vasculhar, na bibliografia indicada, aqueles te-
mas que chamaram sua atenção para a pesquisa. As críticas dos
pensadores aqui estudados podem o auxiliar na compreensão de
assuntos importantes do mundo contemporâneo.
Na próxima unidade, você entrará em contato com a filosofia
do século 20 desenvolvida na França. Neste país, outros impor-
tantes filósofos questionaram e trataram temas essenciais para o
pensamento filosófico. Portanto, não deixe de se empenhar em
seus estudos. Esperamos que esta unidade tenha lhe proporciona-
do interessantes questionamentos e um ótimo aproveitamento na
construção de seu conhecimento!
Bons estudos!
11. E-REFERÊNCIAS
Figura 1 Edmund Gustav Albrecht Husserl. Disponível em: <http://www.educa.madrid.
org/web/ies.tirsodemolina.madrid/contenidos/departamentos/Filosofia/imagenes/
Husserl.jpg>. Acesso em: 4 maio 2010.
Figura 2 Max Scheler. Disponível em: <http://www.personalismo.org/wp-content/
themes/libra/imagenes/max-scheler.jpg>. Acesso em: 22 jul. 2007.
Figura 3 Martin Heidegger. Disponível em: <http://www.ibiblio.org/hhalpin/homepage/
presentations/programmingtalk/heidegger.jpg>. Acesso em: 4 maio 2010.
Figura 4 Max Horkheimer. Disponível em: <http://www.dec.ufcg.edu.br/biografias/
maxhorkh.jpg>. Acesso em: 23 jul. 2007.
12. BIBLIOGRAFIA
ABBAGNANO, N. Dicionário da filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
GILES, T. História do existencialismo e da Fenomenologia. São Paulo: EPU, 2003.
KANT, I. A metafísica do costumes. In: Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1973.
ROVIGHI, S. V. História da Filosofia Contemporânea. São Paulo: Loyola, 1999.
SCHELER, M. L'eterno nell'uomo. Milão: Fabbri, 1972.
______. Scriften aus derm Nachlass, (Nachlass I) Berlim: Der Neue Geist Verlag, 1933.
STEGMÜLLER, W. A filosofia contemporânea. São Paulo: EPU, 1977.
EAD
A Filosofia
Francesa do Século
3
20
1. OBJETIVOS
• E xaminar e entender a importância da influência da gera-
ção 3 H no pensamento de Jean-Paul Sartre.
• Compreender a definição dada pelo autor à situação hu-
mana
• Compreender a importância do método analítico existen-
cial para a filosofia sartreana.
• Compreender o conceito de "angústia".
• Analisar a questão do cogito e a complexificação da noção
de sujeito e subjetividade.
• Examinar e entender o contexto da psicanálise sob a ótica
da filosofia francesa.
• Examinar e entender o contexto do estruturalismo nesta
época.
154 © História da Filosofia Contemporânea II
2. CONTEÚDOS
• F ilosofia Francesa: Bérgson
• O conceito de Instinto; o conceito de Intuição; o conceito
de Inteligência.
• Sartre.
• Influências da geração 3 "H" (Husserl, Heidegger e Hegel);
a situação humana; o método analítico existencial; a
questão do cogito e da questão da subjetividade; o Ser e
o Nada; os primeiros escritos; a Transcendência do Ego; o
conceito de Angústia; a psicanálise; o estruturalismo.
sim a entender que ela deve cuidar de um tipo específico, mas não
de todo o conhecimento.
Na consciência temos a memória, a recordação e a percep-
ção. A memória é a consciência propriamente dita, na qual o pas-
sado está todo no presente. A recordação é a parte da memória
que a vida cobra do passado; ou seja, é a parte do passado que a
vida requer como presente. E a percepção é o direcionamento que
a consciência dá no conhecimento de algo; ou seja, é a ação possí-
vel do nosso corpo sobre outros corpos – a percepção seleciona.
A atualidade de nossa percepção consiste, portanto, em sua ativi-
dade, nos movimentos que a prolongam, e não em sua maior in-
tensidade: o passado não é senão idéia, o presente é ídeo-motor
(BERGSON, 1999, p. 72).
sua total liberdade, pois deve respeitar as regras sociais, ele não se
vê como um todo criador do novo: ele é apenas uma parte de um
todo social. Nesta sociedade vemos que o homem se acostumou
com o "hábito de contrair hábitos" (REALE, 1991, p. 722).
Já o impulso de amor é uma característica da sociedade
aberta, ou seja, da realidade de uma moral absoluta. Nesse caso,
há uma preocupação diretamente relacionada aos valores univer-
sais, não se restringindo a determinada sociedade no tempo e no
espaço; é algo que se vive, mas não se ensina, pois faz parte do
que o ser humano tem de mais íntimo em sua humanidade. Aqui
o homem entende a si próprio como dono de si, na liberdade de
realizar a sua existência de maneira relacional com a humanidade.
Ainda é importante observar que encontramos uma reflexão
bergsoniana sobre a questão religiosa: temos a religião estática
e a religião dinâmica. Enquanto a primeira é vista em sua função
fabuladora, visando reforçar os laços existentes entre os homens
(pois a inteligência espacializadora ameaça a própria vida), a se-
gunda identifica propriamente com a experiência mística, enten-
dida como sendo o contato com o esforço criador – o misticismo
coincide com este esforço. Para Bérgson, a ação no mundo recebe
seu impulso do êxtase místico e o amor a Deus é o amor à própria
humanidade.
INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR
"As primeiras publicações de Sartre foram A Imaginação,
L'imaginaire, Esquisse d'une théorie des emotions (sem tradução
para o português).
Transcendência do Ego
Como vimos, Sartre incorporou a definição husserliana de
consciência como estrutura intencional. Lembra? O caráter in-
tencional da consciência consiste em ser "consciência de alguma
coisa". Por outro lado, Sartre estendeu a mesma espontaneidade
constituinte da consciência transcendental ou pura à investigação
da dimensão "psicofísica" da consciência: "a imagem é um ato,
não uma coisa".
Em A transcendência do ego, Sartre se propõe a fazer uma
descrição fenomenológica da maneira como a consciência cons-
titui seu Ego (o "eu psíquico"). Contudo, ele pretende atingir um
plano anterior ao momento de sua visada reflexiva.
Parece contraditório, não acha? Se Sartre quer fazer uma
descrição sobre um modo intencional da consciência, como po-
deria fazê-lo dispensando a reflexão?!? Acontece que, segundo
Sartre, a consciência, mesmo não sendo reflexiva, num modo de
ser "irrefletido", já age de maneira intencional.
Como isto é possível? Comecemos com uma certa lembran-
ça da leitura intensa de um romance. A lembrança em questão é
aquela que pode ser intuída de modo a apresentar a vivência da
O cogito em questão
Como vimos, Sartre adota uma concepção intencional da
consciência. Vimos também que apenas por meio de uma "refle-
xão impura", a consciência pode visar-se a si mesma como objeto
Ego.
Contudo, para além desse falso espelho "mundano" no qual
a consciência se projeta, individualizando sua existência e, desse
INFORMAÇÃO
Solipsismo: Doutrina segundo a qual só existem, efetivamente,
o eu e suas sensações, sendo os outros entes (seres humanos
e objetos), como partícipes da única mente pensante, meras im-
pressões sem existência própria [Embora freq. considerado uma
possibilidade intelectual (caso limite da filosofia idealista), jamais
foi endossado integralmente por algum pensador.] (cf. Houaiss).
Ela nasce tendo por objeto um ser que ela não é e, assim,
mantém-se como condição estrutural de seu modo de ser.
Sartre chama essa estrutura de dimensão "transfenome-
nal" da relação da consciência ao Mundo. Esta estrutura é tomada
como "prova ontológica" de uma existência que escapa à "atitude
teórica" da consciência reflexiva. O termo filosófico "fenômeno"
é "o que aparece" a uma consciência transcendental como seu
correspondente empírico, objetivo, no sentido de que sobre este
correspondente dizemos que seu esse est percipi ("seu ser é ser
percebido") por uma consciência reflexiva, que o põe como objeto
de suas determinações conceituais, de suas representações.
© U3 - A Filosofia Francesa do Século 20 179
O ser e o nada
O subtítulo desta obra, "ensaio de ontologia fenomenológi-
ca", esclarece o procedimento aplicado por Sartre em sua investi-
gação sobre condutas do "homem no mundo", partindo de uma
descrição fenomenológica regressiva que deverá atingir suas con-
dições ontológicas de manifestação.
Para além dos esquemas formais da "consciência pura",
existe uma relação anterior e concreta ao mundo. Esta dimensão
"transfenomenal" deve, então, ser pensada fora dos esquemas
conceituais do Entendimento. Categorias, como a de possibilida-
de, necessidade, causalidade etc. são sobrepostas a este plano
sem jamais atingi-lo no seu ser irredutível a um esquema teórico.
© U3 - A Filosofia Francesa do Século 20 183
deu a nossa existência, a escolha que fizemos de nós por nós mes-
mos. O projeto inicial, pelo qual somos o que somos, adquire um
caráter de inclinação psicológica, de exigência social, de obriga-
ção moral etc. Fazemos estes transcendentes se erguerem "como
perdizes" sob nossas cabeças "conduzindo" nossos atos, definindo
nosso ser e encobrindo o fato de que somos nós a nossa escolha
inicial por meio da qual demos sentido a este universo de ideali-
dades. Em outras palavras, para Sartre, a "realidade humana" é
sempre a liberdade constitutiva do ser-para-si naturalizada na for-
ma de um ser-em-si de exigências, valores, tabus e as cortinas se
abrem para dar lugar a títeres no palco da "realidade humana".
De fato, estamos comprometidos em um mundo de exigên-
cias e de valores. Mas são nossos atos irrefletidos que fazem os
possíveis e os valores flutuarem no ar, adiando a consciência an-
gustiada de que são sustentados no ser por nossa própria liber-
dade. Na angústia, ao contrário, nos captamos como totalmente
livres na medida em que não podemos evitar o sentimento de que
o mundo provenha de nós!
A qualquer momento, diz Sartre, poderemos ter um encon-
tro angustiante com esta liberdade autêntica e ele nos pergunta:
estaremos prontos? Estaremos à altura da tarefa de constituir um
novo universo de possíveis?
Texto complementar
Leia a seguir uma das passagens de O ser e o nada que me-
lhor retratam o desafio a que estamos submetidos pela definição
sartreana de uma liberdade autêntica:
'Descobrimo-nos, pois, em um mundo povoado de exigências, no
seio de projetos 'em curso de realização': escrevo, vou fumar, tenho
encontro com Pedro esta noite, não devo esquecer de responder a
Simão, não tenho direito de esconde a verdade de Cláudio por mais
tempo. Todas essas pequenas esperas passivas pelo real, todos es-
ses valores banais e cotidianos tiram seu sentido, na verdade, de
um projeto inicial meu, espécie de eleição que faço de mim mesmo
no mundo. Mas, precisamente, esse projeto meu para uma possibi-
lidade inicial, que faz com que haja valores, chamados, expectativas
e, em geral, um mundo, só me aparece para-além do mundo, como
© U3 - A Filosofia Francesa do Século 20 191
8. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
As questões a seguir podem ser importantes para a conso-
lidação do conteúdo apresentado nesta unidade. Elas focalizam
questões centrais do período da filosofia tratada nesta unidade,
bem como dos principais filósofos aqui apresentados. Não deixe
de enfrentar os desafios propostos a seguir, eles poderão contri-
buir com sua formação!
1) Como é possível, segundo Sartre, que a consciência se intuísse? Assinale a
alternativa correta!
a) Ela pode intuir-se só pela exterioridade, como relação à outra coisa.
b) Ela pode intuir-se a partir da sua autoconsciência.
c) Ela pode intuir-se a partir da sua reflexão abstrata.
d) Ela não pode intuir-se nem pela reflexão, nem pela intuição.
2) Como se dá, segundo Sartre a relação entre o ser e o nada? Assinale a alter-
nativa correta!
a) O ser brota no seio do nada.
b) O nada brota no seio do ser.
c) O nada e o ser se pressupõem e, portanto, os ambos são originários.
d) O ser e o nada se excluem conjuntamente.
3) O que é o homem, segundo Sartre? Assinale a alternativa correta!
a) O homem não é o que foi e é o que ainda não é.
b) O homem é o que foi e não é o que ainda não é.
c) O homem é o que Deus o criou.
d) O homem é o que o que fez de si.
4) O que expressa o conceito bergsoniano de Élã Vital?
a) Puro dinamismo vital composto por matéria e consciência, em que a
consciência tende a dominar a matéria e assim realizando a evolução
criadora.
b) Puro dinamismo instintivo em que os instintos criam o inconsciente.
c) Principio vital que contem as condições da razão.
d) Revitalização da metafísica para que esta se possa refundar.
5) A angustia segundo Sartre aparece quando:
a) O homem toma consciência da sua condição finita.
b) O homem se depara com a morte.
c) O homem se depara com o desespero.
d) O homem toma consciência da sua liberdade
6) Assinale a alternativa correta segundo Sartre:
a) As ações são transcendências do ego já constituído.
Gabarito
1) a.
2) b.
3) a.
4) a.
5) d.
6) c.
9. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com os estudos desenvolvidos nesta unidade sobre as prin-
cipais questões da filosofia desenvolvida no século 20 ou filosofia
do pós-guerra, chegamos ao fim de nosso estudo. Neste CRC você
pode entrar em contato com os principais filósofos da contempo-
raneidade. Na Unidade 1 você entrou em contato com as filosofias
do impulso com Schopenhauer e Nietzsche e com o existencialis-
mo de Kierkegaard. Depois na Unidade 2 pode acompanhar o de-
senvolvimento da filosofia com a fenomenologia de Husserl, Max
Scheler e Heidegger, bem como com a ilustre escola de Frankfurt.
Esperamos que você tenha atingido os objetivos durante o estudo
e que este CRC tenha contribuído na construção de seu conheci-
mento e na sua formação como futuro professor de filosofia, para
desenvolver seu trabalho a partir uma sólida base teórica da filo-
sofia.
Além de contribuir para o seu aprendizado esperamos, tam-
bém, que os questionamentos apresentados neste CRC tenha des-
pertado em você interesse pelas questões contemporâneas abrin-
do caminho para suas futuras pesquisas.
Boa sorte!
© U3 - A Filosofia Francesa do Século 20 201
10. E-REFERÊNCIAS
Figura 1 Henri-Louis Bérgson. Disponível em: <http://www.consciencia.org/imagens/
image003.jpg>. Acesso em: 11 de mai. 2010.
Figura 2 Jean-Paul Sartre. Disponível em: <http://www.marxists.org/glossary/people/b/
pics/bergson-henri1.jpg>. Acesso em: 11 de mai. 2010.
a)