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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

FACULDADE DE MEDICINA

PSICOPATOLOGIA

PROFa. ALINE PIFANO NETO QUINTAL


PROFa. ANGELA CRISTINA CESAR TERZIAN
PROFa. MARIA FERNNANDA COSTA MARQUES CARVALHO

Revisada em outubro/2018
PSICOPATOLOGIA

Definição:
“Estudo dos fenômenos patológicos”. 1
“Psicopatologia quer dizer, literalmente, “falar sobre alma que sofre”2.

Conjunto de conhecimentos referentes ao adoecimento mental do ser humano.

1. CONCEITOS BÁSICOS
Normal versus patológico
Campo controverso, extensivamente estudado por Canguilhem na medicina, podendo-se
considerar que fenômenos patológicos são apenas variações de intensidade de seus
“correlatos” fisiológicos ou normais. Normalidade pode ser ausência de doença, uma utopia a
ser alcançada, normalidade estatística (estar na média e não nos extremos das frequências),
sinônimo de bem estar, pode ser considerada de maneira subjetiva (uma percepção), sensação
de liberdade existencial (humanismo).
Critérios de normalidade e doença em psicopatologia variam em função dos fenômenos que se
observa e da postura e filosofia do observador.

Fenomenologia (psicopatologia ateórica):


É a descrição da aparência, pura, descritiva, mas compreensiva. Baseia-se na apreensão dos
fenômenos psíquicos observáveis. O instrumento é a mente do observador, sua experiência
emocional e cognitiva. Tem por foco a vivencia subjetiva do paciente, descrita por ele mesmo
associada à observação do entrevistador.

Diagnóstico sindrômico
Síndrome é a associação de sinais e sintomas que se agrupam de forma recorrente e são
observados na prática clínica. Ela é provocada por diversos mecanismos e dependente de
múltiplas causas. Diagnóstico sindrômico é fundamental e diferencia-se do diagnóstico
nosológico porque o ultimo apresenta causa definida, ou seja, baseia-se na etiologia.
Exemplo: Diagnóstico sindrômico – síndrome psicótica. Pode ser devido a esquizofrenia,
transtorno delirante persistente, entre outros diagnósticos.

2. DADOS VISÍVEIS NA OBSERVAÇÃO


• aparência
•fáscies e expressão
•atitude

APARÊNCIA
Só é possível observar o que está aparente. Aparência reflete cultura, cuidados higiênicos e
com o corpo, roupas, maquiagem, adereços. Pode apresentar-se cuidada ou descuidada. Pode
estar cuidada/descuidada, adequada/inadequada, bizarra, exibicionista.

FÁSCIES E EXPRESSÃO/MÍMICA FACIAL


Conjunto de características faciais que podem remeter a condições clínicas ou genéticas
especificas. A expressividade e a mímica facial acontecem através de movimentos faciais com
objetivo de comunicação interpessoal, os quais podem estar presentes, ausentes, reduzidos.

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ATITUDE
A atitude refere-se ao comportamento em sentido amplo e à maneira como se porta o
paciente em relação ao examinador. Pode ser cooperativa, amistosa, de confiança,
interessada ou atitude não cooperativa, hostil, agressiva, arrogante, evasiva,
desconfiada, querelante, pueril para a idade.

3. FUNÇÕES PSÍQUICAS ELEMENTARES


Apesar de ser absolutamente necessário o estudo analítico das funções psíquicas isoladas e
suas alterações, nunca é demais ressaltar que a separação da vida e da atividade mental em
distintas áreas ou funções psíquicas é um procedimento essencialmente artificial, com fins
didáticos.

• CONSCIÊNCIA • AFETIVIDADE
• ATENÇÃO • PENSAMENTO
• ORIENTAÇÃO • VONTADE E PSICOMOTRICIDADE
• MEMÓRIA • LINGUAGEM
• SENSOPERCEPÇÃO • INTELIGÊNCIA

CONSCIÊNCIA

“Todo momentâneo das atividades mentais ou o conjunto dos rendimentos psíquicos num
dado instante”.1
“Capacidade neurológica de captar o ambiente e de se orientar de forma adequada. Estar
consciente é estar lúcido, com o sensório claro”.
“Definição neuropsicológica: estado de estar esperto, acordado, vígil, lúcido. É o grau de
clareza do sensório.
Definição psicológica: na relação do eu com o ambiente é a capacidade do indivíduo de entrar
em contato com a realidade.
Definição ético-filosófica: capacidade de tomar ciência dos deveres éticos e assumir as
responsabilidades, os direitos e deveres.

Alterações normais da consciência


• Sono normal de acordo com registros polissonográficos é dividido em duas fases:
o Sono Não-REM: elementos eletroencefalográficos próprios, sem movimentos
oculares rápidos. Apresenta 4 estágios e perfaz cerca de 80% do período de sono.
o Sono REM: registro encefalográfico semelhante ao de vigília, com presença de
movimentos oculares rápidos, completo relaxamento muscular com esporádicas
contrações de grupos musculares, instabilidade do SNA simpático e presença de
ereções penianas. É o período relacionado aos sonhos.
• Sonhos: atividade mental que surge durante a fase REM do sono. Seu conteúdo pode ser
interpretado de diferentes formas.

Alterações patológicas
• Quantitativas: rebaixamento do nível de consciência
o Turvação ou obnubilação da consciência: rebaixamento da consciência em grau
leve a moderado. Letargia, sonolência, diminuição global da atenção, com ou sem
confusão mental.

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o Estupor, torpor, sopor, coma superficial: aprofundamento da turvação da
consciência no qual o paciente só pode ser despertado por estímulos muito
intensos e constantes, sobretudo dolorosos. A psicomotricidade encontra-se
inibida.
o Coma: profundo rebaixamento da consciência com ausência de reação a estímulos
internos e externos.
o Delirium: síndrome associada ao rebaixamento de consciência e é o termo atual
que designa a maior parte das síndromes confusionais agudas. Cursa com
rebaixamento leve/moderado do nível de consciência, desorientação
temporoespacial, dificuldade de concentração, perplexidade, ansiedade, agitação
ou lentificação psicomotora, ilusões e/ou alucinações visuais. Há flutuação do
quadro ao longo do dia, com piora ao anoitecer. Ex.: abstinência alcoólica, uremia,
intoxicações, insuficiência hepática, estados febris, encefalites, traumatismos
cranianos, etc.
• Qualitativas: estreitamentos de consciência
o Estados crepusculares: estreitamento transitório do campo da consciência, com
afunilamento da consciência e conservação de atividade psicomotora global mais
ou menos coordenada com a ocorrência de atos automáticos. Ex.: quadros
histéricos, epilepsia, intoxicações.
o Dissociação da consciência: fragmentação ou divisão do campo da consciência,
ocorrendo perda da unidade psíquica comum do ser humano. Ex.: quadros
histéricos (crise histérica do tipo dissociativo, psicose histérica, personalidade
múltipla, amnésia histérica) e quadros de ansiedade intensa.
o Transe: estado de dissociação, com presença de atividade motora automática e
estereotipada, induzido voluntariamente por rituais sugestivos. Ex.: hipnose,
transe religioso.

ATENÇÃO

Direção da consciência, estado de concentração da atividade mental sobre determinado


objeto. É o processo psíquico pelo qual o indivíduo examina o mundo externo, concentrando-
se em determinados estímulos.

Natureza da atenção
• Voluntária: exprime a concentração ativa e intencional da consciência sobre um objeto. A
capacidade do indivíduo de manter esta concentração ativa denomina-se tenacidade.
• Espontânea: atenção desencadeada pelo interesse momentâneo em um determinado
objeto. O estado de alerta que permite o indivíduo mudar seu foco de atenção é
denominado vigilância.

Alterações patológicas
• Hipoprosexia: diminuição global da atenção. Perda da capacidade de concentração, com
fatigabilidade aumentada, o que prejudica a percepção dos estímulos e sua compreensão.
• Aprosexia: total abolição da atenção, independente da natureza dos estímulos.
• Hiperprosexia: atenção exarcebada.
• Distração: superconcentração ativa da atenção de um determinado objeto
(hipertenacidade) com diminuição da vigilância.
• Distraibilidade: dificuldade ou incapacidade de fixas ou manter a atenção em um
determinado objeto (hipotenacidade) permitindo que a atenção seja facilmente desviada
de um estímulo a outro.

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ORIENTAÇÃO

“A capacidade de situar-se quanto a si mesmo e ao ambiente é um elemento básico da


atividade mental”.
A orientação é uma função integrativa que envolve os processos cognitivos, afetivos, da
memória e da consciência.

Orientação alopsíquica: capacidade de orientar-se em relação ao mundo.


• Orientação temporal: capacidade de identificação do momento cronológico (dia, mês e
ano, hora ou período do dia).
• Orientação espacial: local em que se está.

Alterações patológicas
• Desorientação alopsíquica: relativa ao tempo e espaço.
• Desorientação cronopsíquica: desorientação somente em relação ao tempo.

Causas de desorientação alopsíquica


• Desorientação torporosa ou confusa: por redução do nível de consciência.
• Desorientação amnéstica: por déficit de memória de fixação.
• Desorientação apática ou abúlica: por apatia ou desinteresse profundo.
• Desorientação delirante: ocorre em indivíduos imersos em estados delirantes.
o Dupla orientação: vivência simultânea dos dois mundos, o real e o psicótico. A
orientação falsa, delirante, coexiste com orientação correta.
• Desorientação oligofrênica: por déficit intelectual.

Orientação autopsíquica: capacidade de orientar-se em relação a si mesmo. Identifica se o


indivíduo sabe quem é (nome, idade, profissão, etc.), mas também se refere à consciência do
eu corporal psíquico e social (consciência do eu). Alguns autores consideram a consciência do
eu como uma função diferenciada da orientação autopsíquica por ser, a primeira, o resultado
de um complexo somatório de atividades e capacidades mentais.

Alterações patológicas
• Desorientação autopsíquica pela alteração de base (ver acima: causas de desorientação
alopsíquica).
• Alterações da consciência do Eu
• Despersonalização: sentimento de perda ou de transformação do eu. Vivência de
estranhamento e perda da familiaridade consigo mesmo.
• Desrealização: sentimento de perde ou transformação da relação de familiaridade com o
mundo comum. As pessoas e lugares parecem estranhos, os sons são percebidos com
timbres novos, as cores têm características diferentes.
• Alterações do esquema corporal: percepção inadequada de partes corporais ou da imagem
corporal como um todo. Dismorfofobia: percepção distorcida de partes do corpo (nariz,
orelhas, etc.) ou de pequenos defeitos físicos, com a sensação de que estas partes são
enormes, vergonhosas.

MEMÓRIA

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Recurso que garante a integração de cada momento da consciência, “é o elo temporal da vida
psíquica”1.
É a capacidade de fixas, conservar, evocar e reconhecer um estímulo (engrama).

Fatores psicológicos do processo de memorização


• Fixação: capacidade de gravar engramas. É influenciada por: nível de consciência, estado
geral do organismo, interesse, atenção, conhecimento anterior, compreensão, volume,
organização, canais sensoriais envolvidos, tempo de fixação.
• Conservação: retenção dos elementos mnêmicos. Depende da repetição e da associação
com outros elementos.
• Evocação: capacidade de recuperar e atualizar os dados fixados. O esquecimento é evento
fisiológico e pode ocorrer por desinteresse ou desuso.

Fases da memória (em relação ao tempo de aquisição e evocação)


• Memória imediata: capacidade de reter o material imediatamente após ser percebido.
Confunde-se com a atenção, tem capacidade limitada e depende da concentração,
fatigabilidade e treino.
• Memória recente: capacidade de reter a informação por um período de alguns minutos à
uma hora. Também apresenta capacidade limitada.
• Memória remota: capacidade de evocar informações e acontecimentos ocorridos no
passado, em geral meses ou anos após o evento.

Alterações patológicas
• Quantitativas: por alteração da fixação e evocação.
o Hipermnésia: as representações afluem rapidamente e em grande número.
Traduza aceleração geral do ritmo psíquico.
o Hipomnésia: diminuição da memória.
▪ Anterógrada: diminuição da fixação. Ocorre prejuízo na memória imediata
e recente.
▪ Retrógrada: diminuição da evocação.
o Amnésia: perda da memória, perda da capacidade de fixar ou de manter ou de
evocar antigos conteúdos mnêmicos.
▪ Psicogênica: perda de elementos mnêmicos focais, que tem forte valor
psicológico.
▪ Orgânica: não seletiva. Perda inicial da capacidade de fixação e posterior
da capacidade de evocação.
▪ Anterógrada: perda da capacidade de fixação a partir do momento em que
ocorreu o dano cerebral.
▪ Retrógrada: perde a memória para fatos ocorridos antes do início da
doença ou trauma.
▪ Retroanterógrada: déficit de fixação para o que ocorreu dias, semanas ou
meses antes e depois do evento ou dano cerebral.
• Qualitativas: por alteração do reconhecimento.
o Ilusões mnêmicas: acréscimo de elementos falsos a um núcleo verdadeiro de
memória.
o Alucinações mnêmicas: são criações imaginativas com aparência de lembranças,
que não correspondem a um conteúdo mnêmico.
o Fabulações: falsas recordações para preencher vazios de memória.
o Agnosias: déficit do reconhecimento de estímulos sensoriais por transtornos da
linguagem ou perdas cognitivas globais.

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o Falso reconhecimento: identificação de uma pessoa desconhecida como se fosse
um parente ou amigo.
o Falso reconhecimento: não reconhecimento de pessoas familiares.
o Fenômeno do já visto (dejà-vú): nítida impressão de que o que se está vendo,
ouvindo pensando ou vivenciando já foi experimentado no passado.
o Fenômeno do jamais visto (jamais-vú): impressão de não ter visto, ouvido,
pensado ou vivido uma experiência familiar.

SENSOPERCEPÇÃO

Sensação + percepção
Sensação: fenômeno resultante da ação de um estímulo sobre os órgãos sensoriais.
Percepção: identificação, reconhecimento e discriminação de um objeto com base na
impressão por ele provocada.

Tipos de imagem
Perceptiva: caracteriza-se pelas qualidades de nitidez, corporeidade, estabilidade, extrojeção,
ininfluenciabilidade voluntária e completude.
Representativa ou mnêmica: pouca nitidez, pouca corporeidade, instabilidade, introjeção e
incompletude.

Alterações patológicas
• Quantitativas: imagens perceptivas com intensidade anormal.
o Hiperestesia: estímulos captados de forma aumentada: sons amplificados, imagens
visuais com cores mais vivas e intensas.
o Hipoestesia: estímulos captados de forma inibida percebendo as cores mais
pálidas, os odores com menos intensidade.
o Anestesia: ausência de percepção: Analgesia, anosmia, amaurose.
• Qualitativas
o Troca de qualidade sensorial: mudança de uma sensação comum por outra, em
geral desagradável. Cacosmia: odor fétido para perfumes. Acantesia: dor para
estímulos banais. Sinestesia: troca da qualidade sensorial: ver sons, ouvir cores.
o Ilusões: percepção deformada, alterada, de um objeto real e presente. Há sempre
um objeto externo gerador do processo de sensopercepção, sendo que este é
percebido de forma alterada por rebaixamento do nível de consciência, fadiga
grave ou intenso estado afetivo.
o Alucinações: é a percepção sem objeto. É a vivência de percepção clara e definida
de um objeto (voz, ruído ou imagem) sem a presença do objeto estimulante real.
Apresentam todas as características da imagem perceptiva (nitidez, corporeidade,
projeção no espaço externo e constância).
▪ Auditivas: vozes imperativas (ou de comando), vozes que comentam a
ação, sonorização do pensamento, eco do pensamento, publicação do
pensamento.
▪ Visuais: fotopsias (pontos, cores), complexas (pessoas, figuras),
cenográficas, liliputiana (personagens diminutos), zoopsias (animais).
▪ Táteis: espetadas, choques, sensação de insetos correndo pela pele ou
penetrando no corpo. Toques ou penetração em genitais.
▪ Olfativas e gustativas: são raras e ocorrem em conjunto.
▪ Cenestésicas: sensações viscerais. Cinestésicas: em relação ao movimento.

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▪ Funcionais: alucinações desencadeadas por estímulos sensoriais. “Ouvir
vozes quando liga o chuveiro”.
o Pseudo-alucinações ou alucinose: apresenta as características das alucinações com
exceção da projeção no espaço externo, ou seja, o individuo percebe o fenômeno
como estranho a si.

AFETIVIDADE

É a manifestação de ligação com o meio, a reação ao que nos cerca.


A vida afetiva é a dimensão psíquica que dá cor, brilho e calor a todas as vivências humanas. O
termo afetividade compreende várias modalidades de vivências afetivas como o humor, as
emoções e os sentimentos.

Tipos de vivências afetivas:


• Humor ou estado de ânimo: tônus afetivo do indivíduo, estado duradouro e basal do afeto.
• Emoções: estado afetivo intenso, de curta duração, desencadeado por estímulos
significativos.
• Acompanham-se freqüentemente de reações somáticas (neurovegetativas, motoras,
viscerais, vasomotoras).
• Sentimentos: estados e configurações afetivas estáveis, geralmente associadas a
conteúdos intelectuais, valores, representações e não implicam concomitantes somáticos.
o Da esfera da tristeza: melancolia, saudade, nostalgia, vergonha, aflição, tédio, etc.
o Da esfera da alegria: euforia, júbilo, satisfação, confiança, gratificação, esperança,
etc.
o Da esfera da agressividade: raiva, revolta, rancor, ciúme, ódio, desprezo, inveja,
etc.
o Relacionados a atração pelo outro: amor, estima, atração, carinho, amizade,
respeito, etc.
o Associados ao perigo: temor, receio, desamparo, abandono, rejeição, etc.
• Paixões: estado afetivo extremamente intenso, que domina a atividade psíquica como um
todo, captando e dirigindo a atenção do indivíduo em uma só direção, inibindo os outros
interesses.

Alterações patológicas
• Alterações do humor
o Distimia: alteração básica do humor, tanto no sentido da inibição quanto da
exaltação.
o Disforia: tonalidade afetiva desagradável, mal-humorada, com forte componente
de irritação, amargura, desgosto ou agressividade. Depressão/mania disfórica.
o Hipotimia, humor depressivo, depressão: tristeza patológica, desesperança.
o Hipertimia, euforia ou alegria patológica: humor exagerado, com alegria intensa e
desproporcional às circunstâncias.
o Elação: além da alegria patológica há uma expansão do eu, com sensação subjetiva
de grandeza e poder.
o Puerilidade: caracteriza-se por seu aspecto infantil, simplório, regredido. Riso ou
choro por motivos banais, vida afetiva superficial.
o Estado de êxtase: experiência de beatitude, com sensação de dissolução do eu no
todo, com compartilhamento íntimo do estado afetivo interior com o mundo
exterior. Quando associado a contexto religioso ou místico é considerado um
fenômeno cultural.

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o Irritabilidade patológica: hiperatividade desagradável, hostil, com eventual reação
agressiva à estímulos exteriores.
o Ansiedade: estado de humor desconfortável, com apreensão negativa em relação
ao futuro e inquietação interna. Inclui manifestações somáticas e fisiológicas.
o Angústia: assemelha-se à ansiedade, mas relaciona-se diretamente à sensação de
aperto no peito e na garganta.
• Alterações das emoções dos sentimentos
o Apatia: diminuição da excitabilidade emotiva e afetiva. Incapacidade de sentir
alegria, tristeza, raiva, etc.
o Paratimia ou inadequação do afeto: inadequação do sentimento ao estímulo. Ao
invés de reagir positivamente a um estímulo agradável, o paciente reage com ódio.
o Distanciamento afetivo: pobreza de sentimentos
o Embotamento afetivo: perda profunda de todo o tipo de vivência afetiva.
o Anedonia: incapacidade total ou parcial de obter e sentir prazer com determinadas
atividades e experiências da vida.
o Labilidade afetiva: mudança súbita e imotivada do humor, sentimentos ou
emoções.
o Ambivalência afetiva ou ambitimia: sentimentos opostos e concomitantes em
relação a um mesmo estímulo ou objeto. Amor e ódio; rancor e carinho, etc.
o Neotimia: aparecimento de um sentimento novo em relação a um objeto já
conhecido.
o Fobia: medo desproporcional incompatível com as possibilidades de perigo real do
objeto. Agorafobia: medo de espaços amplos e aglomerações. Claustrofobia: medo
de lugares fechados.
o Pânico: reação de medo intenso, de pavor, relacionada geralmente ao perigo
imaginário da morte iminente, descontrole ou desintegração.

PENSAMENTO

É o resultado da capacidade de organizar as idéias de forma, curso e conteúdos harmônicos


com as necessidades individuais e circunstanciais.
Os elementos constitutivos do pensamento são o conceito, o juízo e o raciocínio e as
dimensões do processo de pensar são delimitadas pelo curso, forma e conteúdo do
pensamento.
• Conceito: formado a partir das representações é o elemento estrutural básico do
pensamento e nele se exprimem os caracteres essenciais dos objetos e fenômenos da
natureza.
• Juízo: processo que conduz o estabelecimento de relações significativas entre conceitos
básicos. P.ex.: juntando-se os conceitos “livro” e “necessidade” pode-se formar o juízo de
que determinado livro é necessário à formação médica.
• Raciocínio: função que articula os juízos permitindo a expressão de pensamentos.
• Curso: modo como o pensamento flui, sua velocidade e ritmo.
• Forma: estrutura básica por diversos conteúdos.
• Conteúdo: temas predominantes, assuntos.

Alterações patológicas
1. Da forma do pensamento:
o Mágico: tipo de pensamento que fere os princípios da lógica formal e não respeita
os indicativos e imperativos da realidade.

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o Concreto: pensamento no qual não há distinção entre a dimensão abstrata e
simbólica e a dimensão concreta e imediata dos fatos. Há impossibilidade de
utilizar e entender metáforas ou ironias.
o Prolixo: pensamento com utilização de sinonímias e rodeios, com dificuldade de
conclusão e marcada pela incapacidade de síntese;
o Deficitário: pensamento de estrutura pobre e rudimentar, com utilização de
conceitos escassos e pouco flexíveis e raciocínio concreto.
o Fuga de idéias: alteração da estrutura do pensamento secundária a acentuada
aceleração do pensamento, onde as associações entre as palavras deixam de
seguir uma lógica ou finalidade.
o Descarrilhamento: mudança súbita e inexplicável de uma linha de idéias para outra
com retornos esporádicos ao curso original.
o Desagregação: total perda dos enlaces associativos do pensamento resultando em
completa incoerência. O pensamento é formado por conceitos e idéias
fragmentadas, sem articulação lógica ou finalidade.
2. Do curso do pensamento:
o Aceleração: pensamento flui de forma acelerada, com sucessão de idéias rápidas.
o Lentificação: pensamento com progressão lenta, apresentando latência acentuada
entre as respostas.
o Bloqueio ou interceptação: interrupção brusca e repentina do pensamento, sem
motivo aparente. O paciente refere que nestes momentos o seu pensamento pára,
sem que ele tenha controle ou explicação.
o Roubo: vivência freqüentemente associada ao bloqueio do pensamento, na qual o
paciente tem a sensação de que seu pensamento foi roubado de sua mente.
3. Do conteúdo do pensamento:
o Idéias prevalentes: idéias com intensa conotação afetiva que predominam sobre
os demais pensamentos. Em geral são passionais, mas permanece a noção de
realidade e crítica.
o Idéias deliróides ou delírio secundário alteração do juízo crítico do pensamento
ocasionado ou sintônico com alterações profundas de outras áreas da atividade
mental. P.ex.: paciente deprimido com idéias de ruína.
o Delírio: são juízos patologicamente falseados. São pensamentos com juízos falsos,
com certeza inabalável, não influenciado pela experiência objetiva ou provas da
realidade e de conteúdo impossível. Em relação à temática principal os delírios
podem ser: persecutórios (de perseguição), de referência, de relação, de
influência, de reivindicação, de invenção ou descoberta, de reforma, místico ou
religioso, de ciúmes e de infidelidade, erótico, de ruína (niilista), de culpa e
autoacusação, de negação de órgãos, hipocondríaco, de infestação, mitomaníaco.
• Alguns estudiosos da Psicopatologia não classificam os delírios como alterações do
conteúdo do pensamento, mas sim alterações do juízo de realidade ou do juízo crítico.
Dalgalarrondo esclarece esta opção afirmando que: “O conteúdo do pensamento é aquilo
que preenche a estrutura do processo de pensar. Neste sentido, o conteúdo corresponde à
temática do pensamento. Assim, não se pode falar propriamente em alterações
patológicas do conteúdo do pensamento. Há tantos conteúdos quanto são os temas de
interesse ao ser humano3”. O juízo critico pode estar preservado ou

VONTADE E PSICOMOTRICIDADE

Vontade ou volição: é a capacidade de cada indivíduo de determinar-se frente às suas


tendências instintivas e seus hábitos. A atividade voluntária (ato volitivo) normal compõe-se de
quatro fases: desejo, intenção, deliberação e execução.

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Alterações patológicas
• Hipobulia/abulia: diminuição ou abolição da atividade volitiva, com alteração da atividade
espontânea, da iniciativa e da disposição voluntária.
• Hiperbulia: aumento da atividade volitiva com aumento dos desejos e excitação
inadequada.
• Negativismo: oposição do indivíduo às solicitações do ambiente. Pode ser ativo ou passivo.
• Obediência automática: realização imediata, passiva e automática das solicitações.
• Ecopraxia: repetição automática dos últimos atos interlocutor.
• Atos impulsivos: realizados sem as fases de intenção e deliberação e ocorrem em função
da intensidade do desejo ou de temores.
• Impulsos patológicos: atos impulsivos nos quais predominam ações psicomotoras
automáticas, sem reflexão, sem reflexão, instantâneos, explosivos e, em geral, com
conseqüências prejudiciais.
o Agressivos/destrutivos: automutilação, frangofilia (destruir objetos, rasgar
roupas), piromania (impulsos incendiários), impulso suicida, etc.
o Relacionados à ingestão de drogas ou alimentos: dipsomania (ingestão periódica
de grandes quantidades de álcool), bulimia (ingestão rápida de grande quantidade
de alimento), potomania (ingestão de grande quantidade de líquidos, sem sede
exagerada), sitiofobia (rejeição à alimentação), etc.
o Relacionados ao desejo e comportamento sexual: fetichismo, exibicionismo,
voyeurismo, pedofilia, pederastia, etc.
o Cleptomania: roubo patológico.
• Compulsão: difere do ato impulsivo por ser reconhecido como indesejável e inadequado e
por haver tentativa de resistência ou adiamento.

Psicomotricidade: expressão motora da vontade.

Alterações patológicas
• Hipercinesia: aumento da motricidade voluntária e involuntária. Conforme a gravidade
pode ser classificada como inquietação, agitação e furor.
• Hipocinesia ou lentificação psicomotora: diminuição acentuada e generalizada dos
movimentos espontâneos.
• Acinesia ou estupor: perda de toda a atividade espontânea.
• Discinesia: movimentos involuntários, repetitivos e anormais.
• Catalepsia: manutenção prolongada de uma atitude por acentuação do tônus postural e
redução da mobilidade passiva de segmentos corporais.
• Flexibilidade cérea: plasticidade da musculatura à movimentação passiva, fazendo com
que o paciente mantenha a postura em que foi colocado, mesmo que esta seja
desconfortável.
• Maneirismo: estereotipia motora caracterizada por movimentos bizarros e repetitivos.
• Tiques: atos coordenados, repetitivos, resultantes de contrações súbitas, breves e
intermitentes de um grupo muscular.
• Hiperpraxia: lentificação da capacidade de realizar atos intencionais, gestos complexos,
voluntários e conscientes.
• Apragmatismo/hipopragmatismo: incapacidade ou dificuldade de realizar condutas
volitivas e psicomotoras minimamente complexas, como cuidar da higiene pessoal,
participar de atividades domésticas ou envolver-se em atividades produtivas.

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LINGUAGEM

É o principal instrumento da comunicação dos seres humanos além de ser fundamental para a
elaboração e expressão do pensamento.
Apresenta duas dimensões básicas: uma individual (fala) e outra social, histórica e cultural
(língua ou linguagem). Com relação à língua ou idioma deve-se distinguir os seguintes
elementos: o fonético (sons), o semântico (significação) e o sintático (articulação lógica entre
as palavras).

Alterações patológicas
• Associadas à lesão neuronal ou alterações do aparelho fonador.
o Disfasia/afasia: dificuldade/perda da capacidade de compreender e utilizar os
símbolos verbais.
o Disartria/anartria: incapacidade parcial ou total de articular corretamente as
palavras por paresias, paralisias ou ataxias da musculatura do aparelho fonador.
o Disgrafia/agrafia: alteração ou perda da linguagem escrita sem déficit motor ou
perda cognitiva global.
o Dislexia: disfunção leve da capacidade de leitura, resultando em dificuldades
diversas no aprendizado da linguagem escrita.
o Alexia: perda da capacidade previamente adquirida para a leitura.
o Disfonia: alteração da fala produzida pela alteração da sonoridade das palavras.
o Dislalia: alteração da linguagem falada por deformação, omissão ou substituição
de fonemas.
• Associadas a transtornos psiquiátricos primários.
o Logorréia ou taquifasia: produção aumentada e acelerada da linguagem verbal
com fluxo incessante de palavras e fases. A graforréia é o correspondente na
linguagem escrita.
o Bradifasia: lentificação da linguagem verbal, com fala vagarosa e articulação lenta
e difícil. Mutismo: ausência de resposta verbal, mudez voluntária.
o Ecolalia: repetição da última palavra dita pelo entrevistador.
o Tiques verbais: produção de fonemas ou palavras de forma recorrente, imprópria
e irresistível, com emissão de sons guturais, abruptos e espamódicos.
o Coprolalia: emissão involuntária e repetitiva de palavras obscenas, vulgares ou
relacionadas a excrementos.
o Verbigeração/mussitação: repetição de palavras, sílabas ou trechos de frases, de
forma monótona, em voz baixa e sem significado comunicativo.
o Neologismos: criação de palavras novas ou atribuição a uma palavra já existente
de uma nova acepção.

INTELIGÊNCIA

Capacidade de utilizarmos um conjunto de instrumentos (atividade sensorial, memória,


habilidades psicomotora e verbal e resistência à fadiga) de modo a nos adaptarmos a qualquer
problema da vida1.
É a totalidade das habilidades cognitivas do indivíduo.

Desenvolvimento da inteligência

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Segundo Jean Piaget, o desenvolvimento da inteligência ocorre pela substituição de esquemas
cognitivos prévios e pela aquisição e integração de novos esquemas cognitivos, envolvendo
para isto as estruturas mentais inatas e a experiência sócio-cultural. Nesta visão, o
desenvolvimento da inteligência passa por quatro estágios: período sensório motor (do
nascimento aos dois anos de idade), período pré-operacional (2 a 7 anos), período operatório
concreto (7 a 11 anos) e período operatório formal (11 a 16 anos).

Alterações patológicas
• Déficit intelectual (Retardo mental): desenvolvimento interrompido ou incompleto das
capacidades mentais, manisfestando-se pelo comprometimento das habilidades cognitivas
que são adquiridas ao longo do desenvolvimento na infância e adolescência.
• Déficit intelectual leve (Retardo mental leve/oligofrenia leve/debilidade mental): QI na
faixa de 50 a 69, idade mental do adulto correspondente a uma criança de 9 a 12 anos. Uso
adequado da linguagem, independente aos cuidados próprios, habilidades práticas e
domésticas normais, problemas específicos de leitura e escrita, dificuldade com conceitos
abstratos e raciocínio lógico, imaturidade emocional.
• Déficit intelectual moderado (Retardo mental moderado/oligofrenia moderada): QI na
faixa de 35 a 49, idade mental correspondente a uma criança de 6 a 9 anos.
Desenvolvimento neuropsicomotor (linguagem e compreensão) lentificado e prejudicado,
aquisição escolar limitada. Realizam tarefas simples com supervisão, apresentam
dependência na vida adulta.
• Déficit intelectual grave (Retardo mental grave): QI na faixa de 20 a 34, idade mental
correspondente de 3 a 6 anos. Desenvolvimento neuropsicomotor prejudicado e
retardado, deficiência acentuada na comunicação, desenvolvem tarefas básicas da vida
cotidiana, mas necessitam de constante supervisão.
• Déficit intelectual profundo (Retardo mental profundo): QI abaixo dos 20. Gravemente
limitadas na capacidade de entendimento, freqüentes restrições motoras, sem capacidade
de fala e sem controle voluntário dos esfíncteres. Requerem supervisão e cuidados básicos
para sobrevivência.

OBS: desde a publicação do DSM-5 (APA, 2014), a nomenclatura mudou de retardo mental
para déficit intelectual. E, para o diagnóstico dos especificadores do Déficit Intelectual (leve,
moderado, grave e profundo), as alterações de QI não são mais consideradas necessárias, mas
colaboradoras, sendo fundamental a avaliação do grau de adaptação do paciente.

BIBLIOGRAFIA
1. JASPERS, K. Psicopatologia Geral. 1ª ed. Atheneu, Rio de Janeiro, 1973.
2. SÁ JR, L.S.M. Fundamentos de Psicopatologia: bases do exame psíquico. Atheneu, 1988.
3. DALGALARONDO, P. Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos Mentais 2ªed. Porto Alegre: Artes Médicas,
2008.
4. CHENIAUX, E. Manual de Psicopatologia. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008.

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