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ÉTICA E CIDADANIA

Me. Clara Versiani dos Anjos

GUIA DA
DISCIPLINA
2022
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância

Objetivo:
Promover o conhecimento, a reflexão e o debate sobre a ética e a cidadania;
favorecer a formação de pensamento crítico por parte dos futuros profissionais acerca da
realidade social e das organizações; enfatizar a ética como ciência que oferece parâmetros
para avaliação das escolhas e ações; desenvolver o conhecimento da cidadania como
conceito e prática da modernidade, resultado de um processo histórico, político e social.

Introdução:
A disciplina relaciona dois diferentes conceitos, Ética e Cidadania. Colocando-os
lado a lado refletimos uma noção hoje em dia amplamente divulgada de que a Cidadania,
para ser exercida de fato, não pode prescindir da Ética.

No entanto, esta relação nem sempre existiu da maneira como a entendemos hoje,
o que significa dizer que ela foi historicamente construída. Demonstrar como ela surgiu e
suas implicações será um dos objetivos de nossas aulas.

Ética é uma palavra de origem grega, derivada de ethos que significa “costumes”.
Em latim corresponde à palavra moris que quer dizer “moral”. No entanto, ao longo do
tempo, a Ética passou a significar “ciência da moral”. Mas este é um dos significados que
podemos atribuir à palavra.

A moralidade é algo presente em todas as ações humanas, entendidas aqui como


ações concretas e resultantes de “escolhas conscientes”. A Ética enquanto ciência examina
estas ações que podem ser, a partir deste exame, condenadas ou aprovadas dependendo
dos parâmetros que utilizamos. Estes parâmetros variam ao longo do tempo, ou seja, uma
ação que poderia ser considerada moral e ética numa determinada época, altamente
recomendável, não necessariamente o é em outra.

Por exemplo, no Brasil escravocrata era muito pouco recomendável que pessoas de
um certo nível econômico e social se dedicassem a trabalhos braçais. Estes deveriam ser
realizados apenas pelos escravos ou pelos brancos pobres. As senhoras das classes mais
abastadas passavam a maior parte do seu tempo sentadas, rodeadas de mucamas que
executavam todo o serviço. Quando se deslocavam para alguma aparição pública, faziam-
no carregadas em liteiras pelos escravos. O sociólogo Gilberto Freyre relata em sua obra
“Casa Grande e Senzala” que não raro essas mulheres acabavam perdendo a mobilidade

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em razão do atrofiamento dos músculos. À época este comportamento era o esperado e,


por isto, aprovado, muito diferente do que consideraríamos hoje.

A Ética como “ciência da moral” surgiu na antiguidade grega. Os gregos foram os


primeiros a buscar o entendimento e avaliação racionais das ações humanas. Isto não quer
dizer que outras civilizações mais antigas não tivessem os seus próprios conceitos de
certo/errado, moral/imoral, justo/injusto. Todas as sociedades humanas conheceram e
conhecem tais sentidos embora os parâmetros possam variar de uma para outra. A
diferença é que os gregos pretenderam criar uma “ciência” para compreensão de tais
parâmetros, enquanto outras civilizações os estabeleceram a partir de um conjunto de
crenças e práticas baseadas nas tradições e religiões sem preocupação em produzir
conhecimento racional.

A Cidadania com o sentido que atribuímos a ela, um conjunto de direitos e deveres


que diz respeito a todos os indivíduos, surgiu na modernidade como resultado das
revoluções burguesas do ocidente nos séculos XVII e XVIII. A antiguidade grega e romana
conheceu sua própria noção de “cidadão”, mas que é diferente da que temos hoje altamente
influenciada pelos princípios liberais de igualdade e liberdade.

Ao longo do nosso curso trabalharemos a construção e evolução dos dois conceitos,


a relação entre eles e suas implicações para a nossa vida pessoal e profissional.

Estendendo tais conceitos para o âmbito profissional, nas últimas décadas do século
XX, tornou-se mais presente no contexto das organizações as práticas inicialmente
chamadas de Responsabilidade Social Empresarial que, mais tarde, assumiram o nome de
Responsabilidade Socioambiental nas Organizações. Tais práticas devem ser
compreendidas como resultado do desenvolvimento da Ética Empresarial e também do
conceito de Sustentabilidade. Atualmente, o que antes era chamado de Responsabilidade
Socioambiental passou a compor o que se chama ESG, a sigla em inglês para
Environmental Social Governance (meio ambiente, sociedade e governança) ,
considerados os três fatores chave para avaliar a sustentabilidade e os impactos éticos de
um investimento em um negócio ou empresa. Em nossa disciplina também trataremos
destes temas pretendendo promover uma percepção mais profunda do ambiente
organizacional.

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Este guia está organizado, portanto, em torno de três grandes eixos, um sobre Ética,
outro sobre Cidadania e o terceiro sobre ESG e Responsabilidade Socioambiental nas
Organizações, desenvolvidos em nove aulas-texto, seis videoaulas e três webs aulas. Além
da bibliografia básica e complementar apresentadas para o curso, você encontrará ao final
das aulas indicações de sites para estudo, vídeos e filmes referentes aos temas das aulas
e de obras sobre o assunto que constam da Biblioteca Virtual da UNISANTA e outras
indicações de leitura.

Durante o nosso curso você contará com o apoio do seu (sua) professor (a) -tutor
(a), que estarão a postos para esclarecimento de qualquer dúvida ou orientação que você
precise.

Para o seu melhor aproveitamento, lembramos que a participação no ambiente


virtual de aprendizagem, a realização das atividades, o estudo das aulas texto e das
videoaulas são muito importantes.

Dando-lhe as boas-vindas e desejando-lhe sucesso, damos início ao nosso curso.

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1. ÉTICA: AUTONOMIA MORAL DOS SUJEITOS E “REVOLUÇÕES


MORAIS”

Como colocado a Ética é a ciência que examina a ação concreta e livre dos sujeitos.
Isto quer dizer em primeiro lugar que a avaliação ética não incide sobre o pensamento ou
sentimento caso este não se expresse concretamente. Diferente das religiões que
estabelecem mandamentos aos quais os fiéis devem obedecer mesmo em pensamento, a
Ética julga apenas o que existe ou se manifesta na realidade concreta das coisas.

Em segundo lugar implica que a avaliação se dá para escolhas e ações que são
tomadas “livremente”, ou seja, conscientemente. Isto não quer dizer que tudo o que é
realizado pelos sujeitos após uma avaliação individual consciente seja lícito, moral ou justo.
Ou seja, é falsa a ideia de que “cada um é cada um e porque fulano/fulana acha que é bom,
certo e melhor para ele/ela” é necessariamente ético.

A autonomia moral dos sujeitos significa ainda o reconhecimento de que todos


somos racionais e livres para realizarmos nossas próprias escolhas, podendo aceitar
cumprir ou não a lei; definir o que achamos justo ou não.

Esta liberdade implica em assumir as consequências de nossa escolha e também


em perceber uma outra diferença importante, nem tudo que é ético é lei, nem tudo que é lei
é ético.

Por exemplo, durante a Segunda Grande Guerra, Anne Frank, adolescente de


origem judia, autora do famoso “Diário”, junto com sua família viveu escondida durante dois
anos na Amsterdam ocupada pelos nazistas. Antes de serem descobertos, a família viveu
no esconderijo graças ao apoio de funcionários do escritório do pai de Anne que,
conscientemente, desobedeceram leis que consideravam injustas. A ocupação nazista
implicava a obrigação de delação de “todos os inimigos do Reich” o que, como se sabe,
dizia respeito aos judeus e outras minorias.

Ao desobedecerem leis que consideravam injustas e moralmente reprováveis, e


agindo em torno de outros valores que julgavam mais importantes como a lealdade, a
solidariedade e a amizade, os funcionários do pai de Anne Frank infringiram a lei, mas

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agiram como sujeitos autônomos dentro dos padrões morais que levam em consideração
o outro, a diversidade e a tolerância.

Sujeito moral é aquele que age autonomamente, que não é só um súdito, alguém
que só obedece sem refletir. É aquele que segue leis e normas caso as considere
efetivamente justas. Isto significa dizer que todo aquele que age sem refletir é imoral ainda
que o resultado de sua ação esteja de acordo com normas, lei e/ou princípios morais aceitos
pelo conjunto da sociedade.

O sujeito moral submete cada escolha a uma avaliação. Como coloca Aristóteles,
filósofo grego da antiguidade,
As questões relativas à conduta e às dúvidas sobre o que seja bom para nós
não têm regras fixas, não mais que as questões de saúde (...) Os próprios
agentes devem considerar a cada caso o que é apropriado na ocasião tal
como acontece na prática da medicina ou na arte da
navegação.(ARISTOTELES apud SANDEL, 2012, p. 246.)

Mas como julgar, quais critérios usar? Os critérios surgem com a nossa “prática” e o
pertencimento a uma “opinião pública julgadora”. Implicam também em preparo, educação,
que não é só a formal, e tolerância porque a modernidade possibilitou o surgimento de
“várias formas de moralidade”.

As mudanças nos comportamentos morais são, como ensina Appiah (2012),


resultado das chamadas “Revoluções Morais”. Estas grandes transformações implicam
uma redefinição de valores como, por exemplo, o movimento que fez com que a escravidão
moderna, implantada pelos colonizadores europeus nas áreas dominadas nos séculos XVI
e XVII, deixasse de ser considerada legítima e passasse a ser considerada imoral.

A escravização de populações nativas da América e de negros africanos foi durante


muito tempo considerada legítima. No caso das populações nativas, sua escravização
ocorreu no primeiro século de domínio europeu no continente. Condenada pela Igreja, foi
legalmente proibida. Mas outras formas de trabalho compulsório e intenso foram impostas
aos chamados índios. No caso da escravização dos negros, esta permaneceu aceitável,
recomendável, esperada e praticada como atividade econômica altamente lucrativa para os
comerciantes e senhores de escravos até meados do século XVIII, quando então
transformações sociais, políticas e ideológicas foram mudando as “mentalidades”.

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O comportamento moral como mostra Appiah, remete à relação entre honra e


identidade. Esta última corresponde à nossa profunda necessidade de reconhecimento, ou
seja, que os outros correspondam apropriadamente ao que somos e ao que fazemos (2012,
p. 13.)

Já a honra, na mesma linha de argumentação, corresponde ao conceito de


Eudaimonia encontrado em Aristóteles e que pode ser entendido como “viver bem”. Honra
envolve o respeito dos outros e o próprio. Para vivermos melhor precisamos então da honra
e da identidade social para tratarmos os outros e sermos tratados como devemos.

No entanto, a honra não depende só da visão ou consideração dos outros, depende


da maneira como nós mesmos nos vemos. A vergonha, que é o contrário da honra, por
exemplo, é alguma coisa que podemos experimentar mesmo sozinhos. Ou seja, se fazemos
alguma coisa que nos pareça de fato condenável como mentir para um amigo, para um
familiar, podemos nos envergonhar desta ação mesmo que ninguém saiba que mentimos.

Sendo assim quando efetivamente estamos preocupados com a nossa honra, a


tendência é que ajamos de modo a corresponder àquilo que a sociedade como um todo
considera “honrado”. Se, de modo geral, a sociedade considera como um valor o respeito
ao patrimônio e bens públicos que envolvem recursos financeiros do Estado, tão mais
honrado será alguém que se comporta de modo a preservá-los e desonrado quem se
comporta de outro modo.

Estes valores e expectativas da sociedade com relação ao comportamento daqueles


que fazem parte dela são construídos historicamente. Voltando ao exemplo inicial deste
tópico, houve um tempo que a escravidão era considerada uma prática válida e possuir
escravos angariava respeito dos demais. Não havia nenhuma desonra em ter propriedade
sobre outros. No entanto, uma série de processos fez com que mudássemos a nossa visão
sobre o que é a “vida boa” e sobre a honra, o que nos leva ao sentido de Ética como um
modelo de felicidade ou como “estética da existência”.

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2. ÉTICA NA ANTIGUIDADE: ESTÉTICA DA EXISTÊNCIA E CAMINHO


PARA A FELICIDADE

Um outro significado para Ética é o de “estética da existência”, de um modelo para


basearmos nossa vida no mundo, de um “caminho de aperfeiçoamento” pessoal ou político.
Este é o significado que encontramos no filósofo francês Michel Foucault e referenciado
pelo professor José Américo Peçanha em entrevista para a série “Ética”, produzida e
exibida pela TV Cultura1.

Para os gregos antigos a “estética da existência” ou “estilização da vida” implicaria


na adoção de um modelo ordenado, equilibrado, belo, inspirado no equilíbrio, na harmonia
e na beleza observada no cosmos. Um modelo para orientar nosso aperfeiçoamento, nossa
busca pela excelência, pelo equilíbrio “, por um bem”.

Mas o que seria “o bem”? Este também é um conceito que vai variar de um filósofo
para outro, de uma época para outra e que remete à ideia de felicidade. A noção de “bem”,
do que é belo, do que é justo, do que nos torna melhores do que nos torna felizes porque
“nos realiza” pode ter um sentido estritamente pessoal ou estendido à vida pública,
exclusivamente material e/ou espiritual.

É considerando este significado da Ética como um modelo para alcançar a felicidade


que poderemos compreender melhor as diferenças entre a Ética antiga, neste caso, da
antiguidade grega, e a surgida na modernidade, ou seja, a partir do século XVIII.

Os gregos, como já ressaltado, foram os primeiros preocupados com a construção


de um conhecimento, ou melhor, de uma ciência da moral. A “motivação” grega para a
construção de tal conhecimento pode ser encontrada no que eles consideravam como uma
das nossas principais angústias, o fato de nós nos sabermos “mortais”.

Os seres humanos são os únicos seres vivos que têm consciência de que não
existirão para sempre. Esta seria a fonte de todos os nossos medos e aflições. Diminuir tal
angústia, pelo menos em parte, implicaria em buscar formas de que fôssemos lembrados

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Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=qTiqU580z1I . Acesso em: 24/06/22

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mesmo quando já não existíssemos. A felicidade para os gregos estaria nisso, no alcance
dessa “imortalidade”. Portanto, tudo o que dissesse respeito a isto era considerado justo,
belo, bom, moral, ético.

Mas como a “felicidade” descrita nestes termos poderia ser usufruída por nós? Como
poderíamos avaliar se estamos de fato nos “imortalizando” diminuindo nossa angústia
essencial? Buscando na vida presente a “excelência”, o aprimoramento pessoal,
orientando-nos pelo “soberano bem” compreendido como aquele que diz respeito ao que é
“comum”.

Temos então que a felicidade para os gregos antigos seria a busca consciente da
felicidade na vida presente, dependendo de um esforço próprio de aprimoramento, o que
implicaria em nos livrarmos do “fatalismo”, ou seja, de que estaríamos “destinados” a isto
ou aquilo. O nosso único “destino” seria o da “vida boa e feliz”. Para tanto, deveríamos viver
de acordo com as virtudes.

“Virtudes” muitas vezes são definidas como qualidades que alguém tem. Esta é uma
definição limitada e que conduz a equívocos. Virtude não é alguma coisa com a qual se
nasça, ou que alguém porte “naturalmente”. É bem verdade que numa visão aristocrática
de mundo os “nobres” são aqueles que possuem “virtudes naturais”, ou seja, que surgem
no mundo já “virtuosos”. No entanto, mesmo na antiguidade grega em que este sentido
também existiu, foi deixado de lado e suplantado por uma outra noção, a de que virtudes
são adquiridas e desenvolvidas através de um esforço próprio. De acordo com este
raciocínio, todos nós teríamos a possibilidade de nos tornarmos virtuosos se assim de fato
o quiséssemos.

A busca individual pela excelência, este esforço dos sujeitos morais porque
autônomos, remete a um outro princípio importante na compreensão do sentido da Ética na
antiguidade grega e que ainda permanece em perspectivas mais contemporâneas, o de
que todos nós trazemos, naturalmente, as condições para o desenvolvimento das virtudes,
assim como do seu oposto, os vícios.

Na visão grega antiga a natureza humana é essencialmente “titânica”, o que remete


ao mito dos “titãs”. Seres terríveis, filhos da união de Gaia, a terra, com Urano, o céu que,
por ciúmes do “pai”, foram encerrados de volta no ventre da “mãe”. Esta representação

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tanto servia para explicação de desastres naturais como terremotos, por exemplo, que
seriam resultado da fúria de um dos titãs aprisionados, mas também para explicar a
“paixões” tais como a ira, a inveja, o ciúme, o medo, a ganância, os desejos intensos que
carregamos dentro de nós.

Mas se as paixões podem desencadear “vícios”, por outro lado elas também podem
suportar “virtudes”. A nossa “inveja”, por exemplo, se controlada, pode nos levar a progredir.
Da mesma forma o nosso amor intenso à uma causa pode fazer com que desenvolvamos
a coragem.

Deste modo, o homem virtuoso ou bom, dentro da concepção grega antiga de


Felicidade e de Ética, seria aquele que num esforço pessoal se conduziria avaliando em
todas as circunstâncias “o quanto de paixão seus atos comportam”. Esta avaliação, na
perspectiva de um dos filósofos gregos, Aristóteles, corresponde à “Ética do Télos”, ou do
propósito e da adequação.

O autor Michael Sandel, referenciado ao final na Bibliografia usada para elaboração


deste Guia, ensina que para compreensão da Ética e da Política em Aristóteles devemos
raciocinar de forma “teleológica”.

Tal raciocínio parte do télos, palavra grega para “propósito”. Raciocinar deste modo
é então avaliar as concepções de justiça a partir do seu propósito. Em seu livro, “Justiça –
o que é fazer a coisa certa”, Sandel cita um exemplo (2012, p. 237-238). Ao colocar a
questão “quem tem o direito de ser admitido em uma universidade?”, que pode ser posta
na avaliação das políticas de ação afirmativa ou de “cotas”.

Ao fazermos esta pergunta,


Perguntamo-nos (pelo menos implicitamente): Qual o propósito, ou o télos, de uma
universidade?
(...), o télos não é o óbvio, mas contestável. Alguns dizem que as universidades
existem para promover a excelência acadêmica, e que a promessa acadêmica
deveria ser o único critério de admissão. Outros dizem que elas também existem
para atender a determinados propósitos cívicos e que a capacidade de ser um líder
em uma sociedade diversificada, por exemplo, deveria fazer parte dos critérios de
admissão. Definir o télos de uma universidade parece essencial para que se
determinem os critérios de admissão adequados. (...).
Intimamente relacionada à discussão sobre o propósito de uma universidade há
uma questão de mérito moral: que virtudes ou excelências as universidades
efetivamente valorizam e recompensam? Aqueles que acham que as universidades
existem para celebrar e recompensar apenas a excelência acadêmica
provavelmente rejeitarão a ação afirmativa; por outro lado, os que acreditam que as

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universidades também existem para promover determinados ideais cívicos talvez


abracem essa ideia.

E em que medida isto se relaciona com a Ética? A “ideia de Justiça” tal como
apresentada por Sandel pode ser também compreendida como aquilo que entendemos
num sentido genérico como ético ou a “coisa certa”. Sendo assim, a avaliação aristotélica
da justiça, ou moralidade das ações, o quanto estas seriam éticas ou não, depende de
raciocínio teleológico.

Falta esclarecer o termo Política e como ele se insere na compreensão da


perspectiva da Ética aristotélica. Em primeiro lugar, Política no pensamento grego antigo e
sobretudo em Aristóteles é definida como uma arte ou ciência. Política seria a “arte ou
ciência da convivência na pólis”.

Pólis é o termo grego para cidade. Vimos que uma das principais inquietações dos
pensadores gregos era buscar e oferecer respostas que pudessem diminuir nossa angústia
essencial, a percepção da mortalidade.

A pólis é o espaço público, o lugar de realização das ações que expressam nossa
excelência. Só assim, uma vez que tais ações sejam testemunhadas pelos demais, é que
poderemos ser lembrados mesmo quando não existirmos mais. A pólis é, portanto, dentro
desta perspectiva, o espaço para a nossa “plena realização”, o lugar para sermos felizes.

Sandel chama a atenção para o fato de que, em Aristóteles, “o propósito da política


não é criar uma estrutura de direitos neutra em relação às finalidades. É formar bons
cidadãos e cultivar o bom caráter.” (2012, p. 240.)

Citando Aristóteles diretamente, temos:


Qualquer pólis que mereça ser assim chamada deve dedicar-se ao propósito de
promover a bondade. Caso contrário, uma associação política reduzir-se-á a uma
mera aliança (...) Caso contrário, também, a lei será transformada em um mero
pacto (...) uma garantia dos direitos dos homens contra seus semelhantes” – em
vez de ser, como deveria, uma regra da vida para tornar seus membros bons e
justos. (ARISTOTELES apud SANDEL, 2012, p. 240.)

Em Aristóteles e em outros autores da antiguidade, encontramos uma forte ênfase


nas virtudes cívicas, ou seja, aquelas que desenvolvemos tendo em vista a “boa vida nas
cidades”. Este é um dos aspectos que podemos destacar das diferenças existentes entre a

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ideia de felicidade, de justiça, de ética e moralidade dos pensadores antigos e o que


encontramos na modernidade., tema do nosso próximo tópico.

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3. ÉTICA NA MODERNIDADE

3.1. Princípios em Adam Smith


Como colocado no início, chamamos aqui “modernidade” o período histórico que teve
início no Ocidente a partir do século XVIII. No entanto, há alguns autores fundadores do
pensamento dito moderno, como Nicolau Maquiavel, pensador florentino, de um período
anterior (séculos XV e XVI).

Mais importante do que estabelecer tal recorte histórico é enfatizar a distinção entre
antiguidade e modernidade. Uma das características que nos parece essencial do
pensamento dos autores ditos modernos é que estes não alimentavam muitas ilusões sobre
a natureza humana. Como bem sintetizou o economista e escritor Eduardo Giannetti da
Fonseca em sua obra “Vícios privados, benefícios públicos?”, enquanto os antigos
pensavam a realidade como “deveria ser”, os modernos buscaram refletir sobre o mundo
tal como ele é.

Uma outra diferença marca a modernidade, o individualismo. Enquanto na


antiguidade grega, tal como vimos, a possibilidade da “vida feliz” estava na nossa
experiência cívica, embora a modernidade não deixe de valorizar o espaço público, ela
coloca, principalmente entre os autores do século XVIII em diante, a importância da
realização individual para os sujeitos. A modernidade, em contraponto com o passado
medieval e sociedades de ordens do Antigo Regime, pôs como causa o “direito de o
indivíduo existir como tal”, o que significa o direito à nossa existência de acordo com as
nossa caraterísticas, anseios e crenças.

É possível então perceber que a ideia de Felicidade dos modernos é diferente da


dos antigos. A Felicidade para os primeiros dependerá da possibilidade do indivíduo
garantir a sua existência de acordo com aquilo que deseja e anseia. A Felicidade passa a
ser “medida” pela nossa eficiência em garantir esta realização. Um “indicador” de tal
sucesso será a riqueza material, alcançada pela tenacidade, esforço, pela entrega a certas
noções de dever e obediência a processos, normas, horários, regras que assegurem o
melhor desempenho para a maior recompensa. Tanto mais “virtuoso” será o mais
“eficiente”, ou seja, aquele que melhor obedece às orientações para o caminho do
“sucesso”

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Tais normas e regras não necessariamente foram estabelecidas por nós, a natureza
delas é “suprassensível”, ou seja, surgiram independente da nossa vontade ou opinião. No
entanto, o princípio moderno de que todos os homens são livres e iguais determina a nossa
“liberdade” em aceitar cumprir tais obrigações ou não.

Por outro lado, ainda que para o conjunto dos pensadores modernos o indivíduo
importe mais do que a comunidade, veremos que há diferenças entre eles no que tange à
avaliação moral das escolhas e ações humanas.

Adam Smith foi um filósofo da moral do século XVIII. Muito embora também seja
referenciado como um “economista”, sendo uma das suas obras mais conhecidas “A
História da Riqueza das Nações”, clássico que traz princípios importantes para
compreensão da economia capitalista, é em outra obra, “Teoria dos Sentimentos Morais”,
também essencial para compreensão do pensamento de Smith, que iremos encontrar
elementos para uma melhor compreensão do que é Ética na modernidade.

Em Smith o egoísmo surge como parte de nossa condição e é essencial para a nossa
sobrevivência. É porque naturalmente nós queremos mais a nós mesmos do que aos outros
que conseguimos sobreviver.

Para melhor compreender o que isto significa, tomemos um exemplo prático. Uma
pessoa que tenha um familiar, alguém próximo, muito doente sob seus cuidados. O que
muitas vezes ocorre é que o cuidador, tão envolvido que está com o outro, esquece-se de
si mesmo. Não raro o cuidador adoece, ou mesmo perece, e aquele ou aquela que recebeu
os cuidados sobrevive. Isto mostra o quanto o “egoísmo” pode ser importante para nossa
sobrevivência.

Mas Smith enxergava ainda no nosso “egoísmo natural” uma fonte de virtudes. O
fato de nos querermos mais que aos outros faz com que desejemos que os demais nos
amem e/ou admirem na medida em que consideramos que devemos ser
amados/admirados. Para tanto, é preciso mostrar aos outros que eles teriam razões de
sobra para isso. De modo geral, portanto, nos esforçaríamos o tempo todo em mostrar as
nossas melhores qualidades, evitando expor nossos defeitos e vícios, o que, ao final,
possibilitaria mais harmonia e civilidade na vida em sociedade.

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Outro resultado do nosso egoísmo e também da nossa vaidade é a ambição. A


princípio poderíamos considerá-la como um vício ou defeito, no entanto, de acordo com a
perspectiva de Smith e outros, é ela que nos move no sentido de alcançarmos mais fortuna,
projeção, sucesso, impulsionando o progresso e a “riqueza das nações”.

Voltando à maneira como gostamos de parecer aos olhos dos outros. O nosso
esforço em mostrar o melhor de nós só ocorre à medida que tememos o juízo dos outros.
Smith coloca a seguinte questão: “Quem continuaria agindo da maneira como age se
tivesse certeza absoluta da impunidade, ou de que não seria julgado pelos outros?”

Isto quer dizer que, se deixados à sua própria vontade, sem nenhum “juízo externo”,
os homens agiriam no sentido de apenas e tão somente atender aos seus desejos,
impossibilitando a vida em sociedade. Seria o cenário descrito por Thomas Hobbes,
pensador inglês dos séculos XVI e XVII, da “guerra de todos contra todos”.

Neste ponto Smith mostra a necessidade da existência de regras morais impessoais,


formais e/ou informais para controle de nossa parcialidade. Por exemplo, não existe
nenhuma lei que determine que devemos dar precedência na entrada de um elevador aos
idosos, ou às mulheres, ou àqueles que estão com as mãos ocupadas. No entanto, há um
código informal que considera adequado, moral, ético, que assim seja. De modo geral
obedecemos a esta norma e aqueles de nós que não o fazem são taxados de “mal-
educados”. Se não temêssemos este julgamento externo seria que ainda assim
seguiríamos tal orientação?

Mas Smith, dentro da tradição iluminista que toma o individualismo como causa,
aponta para o fato de que tais regras, formais ou não, devem existir, mas não a ponto de
tolher ou impedir o exercício da individualidade. Quer dizer, nenhuma regra deve
impossibilitar o meu direito de existir com as minhas liberdades e direitos. Um exemplo, a
minha liberdade de ir e vir deve ser preservada tanto quanto a liberdade do outro. Parar em
fila dupla impedindo a passagem de outros carros é tomar dos demais, ainda que “por um
minutinho”, um de seus direitos como indivíduos.

Neste sentido, o grande desafio da moral e da ética na modernidade estaria neste


equilíbrio entre a ética cívica, aquela que diz respeito ao espaço e vida em comum, e a ética
pessoal, o conjunto de normas que “eu” individualmente considero que devo seguir.

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Mais um exemplo para melhor esclarecer este desafio. Individualmente todos


acreditamos que temos o direito de apreciarmos o estilo musical que quisermos. No
entanto, ouvir música muito alto impede que os outros escutem a que gostariam, ou mesmo
que deixem de usufruir o seu direito ao silêncio. Como se pode ver, boa parte dos conflitos
nas grandes cidades se dá exatamente por este “desequilíbrio” que frequentemente ocorre
entre estes sistemas morais, o individual e o comum.

Tanto este conflito será maior quanto mais adverso for o ambiente externo. Num
ambiente de escassez de recursos, numa epidemia de fome, por exemplo, ou em
sociedades que sofrem com a guerra e a violência, o que se vê? Saques, assassinatos,
famílias que se dividem, vizinhos que se atacam. A adversidade dá lugar ao caos, à já
mencionada “guerra de todos contra todos”, em que cada um quer fazer valer a sua própria
vontade.

Mas mesmo em situações nem tão extremadas, em sociedades muito competitivas


ou marcadas por um sentimento disseminado de “injustiça” e de desigualdade, ou de falta
de oportunidades, podemos chegar a tal desequilíbrio.

De novo entra em cena o “egoísmo” que pode nos impedir de chegar a extremos. O
nosso “enorme e desmedido amor” por nós mesmos, de acordo com Adam Smith, dá
origem a uma nobre virtude, a solidariedade. Quando vemos alguém que consideramos
semelhante a nós numa situação de sofrimento, o nosso “egoísmo” faz com que, nem que
seja por alguns segundos, coloquemo-nos no lugar desse nosso semelhante. E, ainda que
por um breve momento, pensamos, “Se fosse eu, estaria sofrendo muito agora, nem sei se
suportaria”. Nesse instante, e por essa razão, nos solidarizamos.

No entanto, esta é uma empatia que estabelecemos com os que consideramos


“semelhantes”. Com os que percebemos “diferentes” pela razão que for não conseguimos
estabelecer tal laço. Por isso, radicalismos, situações que favoreçam a disseminação de
preconceitos, a consideração dos outros como “dessemelhantes”, estranhos a nós,
impedem a solidariedade e dão lugar ao desprezo e à insensibilidade com o sofrimento
alheio.
Importante aqui ressaltar que os fatores que permitem o surgimento de tais
situações, dessa cisão, separação entre “nós e eles”, podem ser não só sentimentos
nacionalistas ou teorias de superioridade racial. Estes se alimentam de outros fatores como

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as desigualdades sociais, políticas e econômicas. Portanto, em sociedades rigidamente


estratificadas, ou de forte desigualdade como a nossa, o “desprezo pelo outro” por
considerá-lo diferente, ou “menos cidadão”, com menos direito de existir como indivíduo,
pode florescer.

Para concluir, a modernidade inaugurada no século XVIII coloca-nos então, a


considerarmos a perspectiva de Smith, um enorme desafio, a busca do equilíbrio entre o
que penso como “melhor, justo, certo para mim”, e o “melhor, justo, certo” para que todos
possamos continuar buscando a felicidade. O “ético” em Smith será tudo o que colabora
para a busca de tal equilíbrio, e condenável tudo o que o impede.

3.2. O utilitarismo em Bentham e Stuart Mill.


O utilitarismo, perspectiva ética e filosófica que tem Jeremy Bentham, filósofo inglês
também do século XVIII, como um de seus fundadores, pode ser apresentado
resumidamente como o modelo que remete à felicidade calculada em termos do maior
benefício para o maior número.

Esta simplificação muitas vezes leva à interpretação equivocada de que a


perspectiva utilitária serviria exclusivamente ao interesse próprio o que retiraria dela a
“moralidade”, ou seja, seria uma “perspectiva do vale-tudo, ou de que o “importante é tirar
vantagem, sempre”.

No entanto, é preciso detalhar melhor o que quer dizer esta avaliação calculada do
“caminho para a felicidade”. Os pressupostos utilitaristas tal como extraídos de Sandel
(2012) são:
1- Moral consiste em pesar custos e benefícios e uma avaliação ampla das
consequências;
2- o mais elevado objetivo da moral é maximizar a felicidade (utilidade das coisas
está em quanto de prazer e felicidade elas produzem);
3- utilidade pensada em termos de benefícios para o maior número o que pode levar
a conflitos com os direitos dos indivíduos.
Para compreender melhor tais pressupostos e suas implicações, vejamos o que
apresenta Sandel sobre o pensamento de Bentham:

Ética e Cidadania 16
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Todos gostamos do prazer e não gostamos da dor. A filosofia utilitarista reconhece


esse fato e faz dele a base da vida moral e política. Maximizar a “utilidade” é um
princípio não apenas para o cidadão comum, mas também para os legisladores. Ao
determinar as leis ou diretrizes a serem seguidas, um governo deve fazer o possível
para maximizar a felicidade da comunidade em geral. O que, afinal, é uma
comunidade? Segundo Bentham, é um “corpo fictício”, formado pela soma dos
indivíduos que abrange. Cidadãos e legisladores devem, assim, fazer a si mesmos
a seguinte pergunta: Se somarmos todos os benefícios dessa diretriz e subtrairmos
todos os custos, ela produzirá mais felicidade do que uma decisão alternativa?
(SANDEL, 2012, p. 48.)

Como se pode ver, não é uma “ética do vale-tudo”, muito embora, como outras
perspectivas para avaliação moral das nossas escolhas e ações comporte algumas falhas.
No caso do utilitarismo estas diriam respeito, principalmente, ao desrespeito aos “direitos
individuais”.

O princípio do “maior benefício para o maior número” acabaria, no limite, impondo


uma “ditadura da maioria”. Para continuar com Sandel, “a lógica utilitarista, se aplicada de
forma consistente, poderia sancionar a violação do que consideramos as normas
fundamentais da decência e do respeito no trato humano.” (2012, p, 51.)

Para ilustrar isso, examinemos o exemplo destacado pelo mencionado autor:


(...). Consideremos uma situação na qual uma bomba-relógio está por explodir.
Imagine-se no comando de um escritório local da CIA. Você prende um terrorista
suspeito e acredita que ele tenha informações sobre o dispositivo preparado para
explodir em Manhattan dentro de algumas horas. Na verdade, você tem razões para
suspeitar que ele próprio tenha montado a bomba. O tempo vai passando e ele se
recusa a informar onde a bomba foi colocada. Seria certo torturá-lo até que ele diga
onde está a bomba e como fazer para desativá-la?
O argumento a favor da tortura nesse caso começa com um cálculo utilitarista. A
tortura inflige dor ao suspeito, reduzindo muito sua felicidade e utilidade. Mas
milhares de inocentes morrerão se a bomba explodir. Assim, você pode argumentar,
nos termos do utilitarismo, que é moralmente justificável infligir dor intensa a uma
pessoa se isso evitar morte e sofrimento. (SANDEL, 2012, pp 52-53.)

Embora seja possível encontrar quem defenda a tortura, de modo geral, e como um
princípio fundamental, a sociedade global a rejeita.

A revisão crítica da perspectiva inaugurada por Bentham, no sentido de aproximá-la


de outros princípios que ganharam força ao longo do século XIX, mais inclusivos surgidos
em razão das desigualdades extremas observadas no desenvolvimento da sociedade
industrial e urbana na Europa, influenciou o pensamento do também utilitarista Stuart Mill.

Ética e Cidadania 17
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O pai de Stuart, James Mill, era amigo, colega e discípulo de Bentham. Stuart,
educado na tradição utilitarista pelo próprio pai em casa, tornou-se um revisor crítico de
parte dos pressupostos utilitaristas.

Seu objetivo foi conciliar os princípios utilitaristas e os direitos e liberdades


individuais. A preocupação com estes revela-se de forma sincera na obra de Stuart Mill. Foi
um defensor de mais direitos para os trabalhadores, defendeu direitos e igualdade para as
mulheres, foi um intransigente porta voz da liberdade de imprensa.

Na sua revisão, o princípio do cálculo de quanto de benefícios as escolhas e ações


trazem permanece. Mas deve-se considerar que alguns prazeres são “mais elevados que
outros” e isto deve ser levado em conta. Além disso, a utilidade deve ser pensada a longo
prazo.

A título de ilustração tomemos o seguinte exemplo, uma unidade fabril se


instalada numa determinada região, a curto prazo, trará empregos e gerará riqueza. Mas
vamos supor que sua atividade a médio e longo prazos produza danos irreversíveis para o
meio ambiente a ponto de ameaçar a vida das pessoas no entorno. Se fizermos este cálculo
veremos então que o quanto de riqueza que a unidade gerar no curto prazo não
compensará os efeitos negativos no longo prazo. Além disso, considerando que para as
pessoas, de modo geral, a preservação da vida tem mais importância que a geração de
riqueza, esta última seria um “prazer menor” comparado com o gerado pela primeira. Nesta
perspectiva, a “utilidade” das escolhas e ações a longo prazo e o “maior benefício” que elas
proporcionam é a instância final para considerá-las éticas. (SANDEL, 2012, p. 64.)

Neste ponto é importante ressaltar que para Mill a avaliação das consequências só
pode ser feita por sujeitos livres de fato. Daí a insistência dele na defesa das liberdades,
incluindo a de pensamento e expressão. Ou seja, também para Mill só os sujeitos morais,
aqueles que refletem sobre escolhas e ações, é que são capazes de avaliar as suas
consequências.

Mas para que os sujeitos desenvolvam sua capacidade de julgar, necessitam de um


ambiente que favoreça a liberdade e estimule-os a pensar:

Ética e Cidadania 18
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As faculdades humanas de percepção, julgamento, sentimento, discriminativos,


atividade mental e até mesmo a preferência moral só são exercitadas quando se faz
uma escolha. Aquele que só faz alguma coisa porque é o costume não faz escolha
alguma. Ele não é capaz de discernir nem de desejar o que é melhor. As
capacidades mentais e morais, assim como as musculares, só se aperfeiçoam se
forem estimuladas (...). Quem abdica de tomar as próprias decisões não necessita
de outra faculdade, apenas da capacidade de imitar, como os macacos. Aquele que
decide por si emprega todas as suas faculdades. (MILL apud SANDEL, 2012, p. 66.)

Além de Smith e dos utilitaristas há muitos outros pensadores modernos nos quais
encontraremos reflexões sobre a Ética e moral. Mas não nos será possível tratar de todos
eles, e também fugiria aos objetivos de nosso curso. No entanto, para encerrar esta
introdução à questão da Ética na modernidade, trataremos no próximo tópico de mais uma
perspectiva.

3.3. “A coisa certa a fazer” em Kant


Kant foi um filósofo do século XVIII, prussiano, de região que hoje integra a
Alemanha. Para examinarmos e compreendermos a perspectiva ética neste pensador
começaremos explicando, um a um, três de seus pressupostos:

1- Somos seres racionais e, portanto, merecedores de dignidade e respeito


O que se pode depreender deste primeiro é que todos nós, uma vez que somos
racionais, merecemos respeito e devemos ser tratados com dignidade. Este pressuposto
fundamenta o “imperativo categórico” da dignidade humana no qual se baseiam os direitos
humanos universais. Se todos devemos ser tratados tal como determina o princípio
elencado tortura, maus tratos, desprezo, iniquidades não são admissíveis, em nenhuma
situação e para ninguém.

2- A moralidade não pode se basear em interesses, vontades, desejos e


preferências (agir com base em desejos é “obedecer” a eles, ser escravizado por
eles).
Se somos racionais, portanto capazes de pensar e avaliar, tanto mais moral será
nossa ação quanto mais racional ela for porquê de acordo com a nossa verdadeira
“natureza”. Agir de outra forma, seguindo um desejo, uma vontade, é contrariar este
princípio. A minha escolha e a ação decorrente dela só serão morais se de acordo com a
razão

Ética e Cidadania 19
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3- Moralidade é agir de acordo com a liberdade de se impor as suas próprias leis


(agir com autonomia e não com heteronomia).
Este pressuposto é uma consequência do segundo. Também para Kant o “sujeito
moral” é o que age de acordo com sua livre e própria determinação, ou seja, o que age com
“autonomia”. Quem age de outro modo, tendo em vista ordens ou vontades externas, ou
mesmo para atender seus desejos de recompensa, vaidade, prazer, age com heteronomia
ainda que faça a coisa certa.

Vejamos o seguinte exemplo. Uma criança de cinco anos que ainda não conhece as
operações matemáticas básicas vai à padaria com uma nota de R$20,00. Faz uma compra
de R$6,00. Vamos supor que o (a) proprietário (a) do estabelecimento esteja no caixa. Ele
(a) poderia dar o troco errado que a criança não notaria. No entanto, não o faz porque teme
que alguém veja, ou que os pais da criança percebam ameaçando sua reputação. O (a)
proprietário (a) ao dar o troco certo faz o que deveria ser feito, mas pela motivação “errada”,
ou seja, o resultado é certo, mas a ação, avaliada do ponto de vista da motivação, não é
moral.

Isto pode ser aplicado ainda a outras situações como a da Responsabilidade


Sociaambiental em empresas. Muitas vezes estas são questionadas, considera-se que as
que agem de forma socialmente responsável só o fazem para proteger sua reputação. Se
esta for de fato a motivação, também de acordo com a perspectiva de Kant, tais ações
podem ser classificadas como boas, mas não como morais porque são “heterônomas”, não
estão de acordo com a vontade “autônoma” dos indivíduos, no caso os dirigentes das
organizações, mas porque servem ao seu desejo de preservar a imagem ou a marca.

Na avaliação de nossas ações devemos, de acordo com Kant, orientar-nos pelo


imperativo categórico. Em termos práticos isto significa o seguinte, devemos “universalizar”
as nossas ações para ver quanto elas estão de acordo com os nossos desejos ou de acordo
com os nossos princípios.

Um exemplo, temos um compromisso previamente agendado. Mas conscientemente


e por vontade própria escolhemos que vamos nos atrasar porque, naquele dia, não estamos
muito dispostos. Para julgar se esta é uma “boa ação” no sentido kantiano devemos
proceder à seguinte avaliação: Ao me atrasar hoje, por um motivo fútil, apenas para atender
a minha própria disposição, eu sinalizo para o mundo e para mim mesmo (a) que acho

Ética e Cidadania 20
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correto que as pessoas se atrasem para seus compromissos porque não estão muito
dispostas. Se considerarmos que esta é uma razão justa, aplicável a todos e não só a nós,
então a tomaremos como moral. Mas se entendermos que universalmente ela não seria
aceitável, tampouco o será para nós.

Para terminar de ilustrar que a moral em Kant é “fazer a coisa certa, porque é o certo
a fazer”, tomemos um trecho do professor Renato Janine Ribeiro em palestra proferida no
Congresso de Educação para a Cidadania, organizado pelo Serviço Social do Comércio de
São Paulo.
Kant tem uma ideia muito boa, (…), que é a seguinte: quando eu ajo, eu devo agir de
modo tal, que a minha ação constitua uma máxima universal. Vamos tentar ver um pouco o
que isto quer dizer. Isto quer dizer que se eu passo no sinal vermelho estou fazendo que essa
minha ação constitua uma máxima universal, ou seja, eu estou declarando para toda
Humanidade que é bom, que é correto e até recomendável passar no sinal vermelho. Se eu
mato uma outra pessoa, eu estou proclamando que é recomendável matar outras pessoas,
idem furtar, roubar, etc. Não há ação então que eu possa caracterizar como sendo apenas
minha, como sendo meu privilégio. Toda ação que eu pratico, por ela eu autorizo outras
pessoas a praticarem iguais, é óbvio que, dito os exemplos que eu elenquei, já decorre que
é impossível convivência desse jeito. Se nós agirmos assim, então se eu passar no sinal
vermelho, autorizando todos outros a passarem no sinal vermelho, vou acabar sendo batido.

Encerramos aqui este pequeno panorama da Ética na modernidade. No próximo item


trataremos de um outro aspecto da sua compreensão a partir da análise da relação com a
Política.

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4. ÉTICA E POLÍTICA

Norberto Bobbio, pensador e teórico italiano, afirma em sua obr, “Elogio à


Serenidade” que as teorias que se dedicaram ao estudo da relação entre Ética e Política
podem ser divididas em dois grandes grupos: as teorias monísticas, que consideram que
Ética e Política fazem parte de um mesmo sistema moral; e as dualísticas que as julgam
como integrantes de sistemas morais distintos.

Mas dentro destes dois grupos, nos quais encontramos teóricos diversos, há outras
divisões. As teorias monísticas se dividem em monismo rígido e o flexível, as dualísticas
em dualismo aparente e o real.

Mas antes de proceder à explicação de tais teorias e relações, é preciso esclarecer


o uso dos termos “Ética” e “Política” em Bobbio. Na obra mencionada, Ética surge algumas
vezes significando “moral”, sendo que esta, ao longo do livro, pode ser a moral individual e
a pública. Política aparece em alguns pontos como dizendo respeito à arte ou “ciência da
convivência”, ou com o que tem lugar na vida pública.

“Monismo rígido” corresponde ao que encontramos em certos autores como Kant e


Hobbes. Para tais autores a Ética é uma só, a que rege a vida privada, rege também a vida
pública. Isto quer dizer que aquilo que consideramos como certo, moral, lícito, justo tanto
vale para a vida cotidiana quanto para a pública, seja como cidadãos, no espaço da casa,
ou como governantes. Este é o ponto em comum entre os dois autores citados, mas, por
outro lado, “monistas rígidos” podem divergir sobre um aspecto fundamental.

Para Kant, como vimos, o princípio que orienta minha ação, qualquer que ela seja, é
o mesmo que considero que deve orientar a de todos os outros. Então, se considero que
mentir é errado, assim considerarei para qualquer um e em qualquer situação. Por exemplo,
vamos supor que você seja um (a) dirigente do Banco Central do Brasil. Você sabe que nos
próximos dias deverá ocorrer intervenção na instituição financeira X. Numa coletiva de
imprensa alguém lança a pergunta: “Senhor (a) dirigente, é verdade que o Banco Central
intervirá na instituição X?” Se você se orientar pelo monismo rígido de Kant dirá a verdade
ainda que isto implique em consequências terríveis, como por exemplo uma corrida dos
correntistas daquela instituição para sacar o dinheiro, gerando inúmeros problemas. Esse
é um exemplo que implica consequências terríveis.

Ética e Cidadania 22
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Mas podemos citar um outro com consequências mais positivas. Se eu considero


que matar é errado, orientando-me pela perspectiva de Kant, considerarei que assim o é
tanto na vida pessoal, quanto na vida e espaço públicos. Desta forma, supondo que eu seja
um governante e me oriente deste modo, não determinarei nem autorizarei a morte de
ninguém, o que costuma ser considerado como bastante positivo, mas pode ser visto como
problema no enfrentamento dos inimigos de um país.

Já o monismo rígido em Hobbes e outros pode ser bem diferente. Neste caso o que
vale é o que determina o Estado. Então se a lei ou aquele que representa o Estado
considera que é lícito matar pessoas que atentem contra a propriedade privada, também
na dimensão individual e cotidiana assim será. No entanto, se o Estado considerar que
pessoas que atentam contra a propriedade privada devem ser condenadas à morte, mas
que a execução da pena cabe exclusivamente aos agentes do Estado, então na dimensão
pessoal consideraremos que a pena de morte deve ser aplicada nestes casos, mas que
nós, cidadãos comuns, não podemos de forma alguma executá-la. De acordo com esta
perspectiva, o cidadão só tem autonomia para fazer suas próprias escolhas e de acordo
com os seus próprios princípios sobre aquilo que o Estado cala.

O monismo flexível também implica o princípio de que há um único sistema moral e


ele será o mesmo para a vida comum e para a pública. Mas, em algumas situações muito
especiais podemos “flexibilizar” os princípios. Por exemplo, neste sistema podemos ter o
princípio de que “matar é errado” em qualquer situação. No entanto, o monismo flexível
considera que, em algumas situações, como a de uma ameaça externa contra o Estado, é
possível flexibilizar.

Uma outra situação para ilustrar melhor a questão. A tortura é nos dias de hoje, de
modo geral, uma atitude condenável tanto aos olhos dos indivíduos quanto também dos
sistemas que regem os Estados. Mas, de acordo com o monismo flexível, em certas
situações e em nome de um “bem maior”, como por exemplo proteger as pessoas de uma
ameaça terrorista, considera-se que por uma “razão de Estado” a tortura para extrair
informações com vistas a proteger os cidadãos possa ser praticada. Uma “lei especial”
derroga uma “lei mais geral”.

De acordo com Bobbio, esta “derrogação” é a base para as Éticas profissionais. Tais
códigos ou sistemas de normas por vezes dispõem condutas mais rigorosas ou mais

Ética e Cidadania 23
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flexíveis, especiais para os que exercem uma determinada atividade. Um exemplo é a


“mentira caridosa do médico”. Os códigos profissionais determinam que os sujeitos sempre
exerçam sua prática de acordo com os mais altos princípios de honestidade. No entanto,
vamos supor que um médico tenha um paciente em estado terminal. O profissional sabe
que o doente vai morrer, que não há chance alguma. Sofrendo, agonizando, o paciente
pergunta: “Doutor, eu vou morrer?” O médico sempre poderá dizer honestamente que sim.
Mas ele pode optar por responder de modo a oferecer alguma esperança ou alívio para o
paciente, dizendo algo como: “Enquanto há vida, há esperança.” Tal atitude não será
condenável, posto que agiu com o intuito de minimizar o sofrimento do seu paciente, o que
é mais importante e nobre do que dizer a absoluta verdade nesse caso.

Vejamos agora as implicações do “dualismo aparente”. Nesta linha estão os autores


e pensadores que consideram que há dois sistemas morais, um que diz respeito à ética
pública, e outro que se refere à vida privada. No entanto, como o próprio nome desta
vertente indica, esses sistemas são aparentemente “independentes”. Entre eles haveria
uma ordem hierárquica. Isto significa dizer que, para alguns dos autores que defendem tal
teoria, o “moral” no sentido do que se refere à vida comum seria superior ao “politico”, ou
seja, ao sistema que governa a vida pública. Mas há também aqueles autores que
consideram o contrário, ou seja, o “politico” seria superior ao “moral”.

Observemos um exemplo de como isto se processa na prática de acordo com Hegel,


filósofo alemão dos séculos XVIII – XIX. Para esse pensador o sistema político seria
superior ao moral. Isto é, os valores que governam a vida cotidiana seriam “inferiores” aos
da vida pública. A nossa vivência comum, privada, nos educa de alguma forma, mas a
educação verdadeira, o sentido superior de moral e o desenvolvimento pleno do nosso
“espírito” só se dá a partir da vivência como cidadãos que compartilham os valores mais
amplos. Deste modo, considerando que a moral privada julga errado matar alguém, se num
determinado momento nós, quando chamados a pegar em armas pelo poder que nos
governa contra um inimigo comum, aquela interdição, “não matar”, cede para atender a
“missão histórica que o Estado exige”.

Neste ponto você deve estar se perguntando em que isto seria diferente do “monismo
flexível”. A diferença está em que o dualismo aparente considera que existem dois
sistemas, embora um seja mais importante que o outro. O monismo flexível não reconhece
duas éticas, só uma. Mas leva em conta o fato de que no exercício de determinadas

Ética e Cidadania 24
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funções, exigências maiores, ou de outro lado, normas mais flexíveis podem ter lugar. Mas
só naquele momento, para aquela situação muito específica.

Por fim vejamos o dualismo real que, na perspectiva de Norberto Bobbio, parece ser
o que melhor descreve a natureza da relação entre Ética e Política.

O dualismo real, ou seja, a teoria que considera que há dois sistemas distintos, um
que diz respeito à vida cotidiana e privada dos homens, ou dos cidadãos comuns, e outro
que orienta os que governam, tem suas origens no pensamento de Nicolau Maquiavel.

Este pensador, como já mencionado, florentino dos séculos XV e XVI, viveu numa
das “cidades-república” da região que hoje compõe a Itália e é considerado um dos
fundadores do pensamento político moderno.

Maquiavel parte de uma constatação, os homens são egoístas, maus e toda


sociedade caminha para a desordem. A história, principalmente a vivida por Maquiavel na
sua Florença natal, mostra que há um ciclo permanente de ordem e caos. Portanto, a
grande inquietação de Maquiavel e de outros pensadores um pouco antes dele, já que o
florentino filia-se à tradição do pensamento humanista italiano anterior, era exatamente
como romper tal ciclo.

Maquiavel sofreu na própria pele as agruras da instabilidade política. Diplomata,


quando de uma das mudanças drásticas no comando da cidade, perdeu seu posto, posses
e honras. Foi preso, torturado e exilado. No ostracismo pretendeu se aproximar dos novos
governantes, mais especificamente de Lorenzo de Médici a quem dedicou sua obra mais
conhecida, “O Príncipe”. A despeito de seus esforços terminou a vida no ostracismo, muito
embora tenha escrito obras consideradas fundamentais para o entendimento do
pensamento moderno.

Alguns dos principais aspectos do pensamento de Maquiavel a respeito da relação


Ética e Política são os seguintes:
a) A natureza da vida privada é uma, a da vida política é outra. Enquanto cada um
de nós está preocupado com a própria segurança e dos que nos são mais caros,
o governante deve ocupar-se da “cidade”.

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b) Considerando-se o objetivo final da vida política, a garantia da ordem para todos,


as ações políticas terão uma natureza diferente das ações comuns e privadas.
Portanto o conjunto de virtudes que orientam tais ações também será diferente
do que pensamos como sendo “virtuoso” na vida cotidiana.

Alguns exemplos práticos. Cabe ao governante a defesa da cidade. Se ela for


atacada ele deverá rechaçar o ataque e revidá-lo. Isto implica em organizar forças, liderar
exércitos, dar ordens para matar. Algumas destas ações seriam recomendáveis na nossa
vida privada ou para o homem comum? Ainda que pensemos que “temos o direito de
defender nossa família e a nós mesmos”, devemos organizar forças, liderar grupos e sair
por aí caçando e matando quem julgamos que ameaça a nossa segurança em particular?

Uma outra situação. É consenso que mentir é errado e que devemos falar sempre a
verdade. Voltemos a um exemplo já dado, o que se refere à posição de um (a) dirigente do
Banco Central quando inquirido (a) sobre a possibilidade de intervenção numa instituição
financeira que ele (a) sabe que ocorrerá. Se falar a verdade certamente provocará uma
corrida aos bancos, não só ao que sofrerá a intervenção, pois a desconfiança pode
comprometer a sensação de segurança que os investidores todos precisam. Portanto, a
“virtude” da franqueza, da honestidade, de nunca faltar com a verdade que é adequada e
aprovada para o homem comum, não o seria para aqueles que ocupam uma posição no
comando de uma instituição que é parte da “ordem”.

Um outro pensador que se soma a Maquiavel na defesa da perspectiva de que


existem “duas Éticas” é Weber. Para este autor, no entanto, embora considere a existência
de dois sistemas, ele não aponta a exclusividade de um deles de servir à política ou à vida
privada.

Max Weber, pensador alemão dos séculos XIX e XX, identificou no agir humano
quatro tipos de ação:
1- A ação racional com relação a um valor (princípio);
2- A ação racional com relação a um fim (objetivo);
3- A ação orientada pelos afetos (instintos);
4- A ação orientada pela tradição.

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Note que as duas últimas não são consideradas racionais. Se considerarmos que as
ações éticas são próprias dos “sujeitos morais” que agem com autonomia e, portanto, de
acordo com a razão, veremos que só poderão ser consideradas “éticas” de acordo com
Weber as duas primeiras.

À orientação por princípios ou valores dá-se o nome de Ética da Convicção e seria


considerada por muitos como mais própria do cidadão comum. Os sujeitos quando agem
deste modo, independente das consequências de suas ações, não abrem mão de seus
princípios. Se eu tenho por princípio, estabelecido por mim racionalmente, de acordo com
a minha própria reflexão, não mentir em nenhuma situação e ajo sempre orientado (a) deste
modo, isto significa que mesmo em situações nas quais as consequências de falar a
verdade podem ser complicadas, independente delas agirei conforme o valor por mim
estabelecido.

Vamos supor que um amigo tenha se envolvido num acidente que testemunhei e a
responsabilidade seja de fato dele. Esse amigo pede que eu minta em juízo em seu favor
porque pode ser punido. Se eu tenho por princípio não mentir, orientado por esta minha
convicção, independente das consequências que isto possa ter para ele, direi a verdade.

Já à orientação por objetivo ou fim dá-se o nome de “Ética da Responsabilidade”.


Nesse caso o sujeito age racionalmente tendo em vista o objetivo final de suas ações e
avaliando as consequências de seus atos, quanto eles poderiam colaborar ou comprometer
o alcance do resultado. Essa avaliação pode implicar a “flexibilização” de um princípio.
Agir deste modo está associado ao espaço público, ou seja, seria uma “ética mais própria
dos governantes”. Por exemplo, voltemos ao valor de sempre falar a verdade que parece
de modo geral um bom princípio. Na situação hipotética já mencionada do (a) dirigente do
Banco Central, o sujeito pode considerar que, naquele caso, o melhor será orientar-se por
um “fim”, qual seja, o de preservação da confiança de investidores e correntistas já que
falar a verdade, naquela situação, colocará toda a ordem financeira e social em risco. Mas
isto se aplicaria também ao exemplo do amigo que pode ser condenado pelo meu
testemunho? Ou seja, seria ético neste caso mentir? Se mentir em favor do amigo significa,
no limite, como consequência final, colaborar para a impunidade geral, o que você faria?

Weber conclui a respeito das “duas Éticas” que o homem verdadeiramente sábio
e/ou grande político não age de acordo só com uma ou só com a outra. Segundo ele, como

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parte da conclusão de sua obra “Ética e Política, duas vocações”, os que se orientam
exclusivamente pelas convicções são os “fanáticos”, e os orientados exclusivamente pelos
fins são os cínicos”.

Mas, se assim for, como saber qual a melhor forma de agir? Caberá a cada um
avaliar o quanto a flexibilização de um princípio pode afastá-lo ou não de sua identidade,
ou de uma causa à qual esteja ligado. Da mesma forma julgar se o fim que pretendemos é
legítimo e quanto nossas ações de fato colaboram para que ele seja alcançado, ou se elas
o colocam em risco. Para concluirmos este tópico, imaginemos o seguinte: Quando alguém
adultera o balanço da empresa para evitar que ela perca mercado, poderíamos considerar
que o fim último, assegurar o valor da empresa é um objetivo legítimo. No entanto, mentir
sobre sua situação financeira, maquiá-la, pode, se a operação for descoberta, comprometer
para sempre sua imagem, portanto, uma ação que, no limite, ameaça o fim.

Analisando a mesma situação de acordo com a orientação da ética da convicção. A


preservação da situação momentânea da empresa justifica que eu me afaste de modo
irreparável de um princípio fundamental do exercício da atividade, qual seja, a honestidade?

Para concluirmos com Norberto Bobbio, a Ética política

É a ética de quem exerce a atividade política, mas a atividade política na concepção


de quem argumenta partindo da consideração da ética profissional não é o poder
em si, mas o poder como condição para o alcance de um fim que é o bem comum,
ou o interesse coletivo ou geral. (…) bom governo é aquele de quem persegue o
bem comum, mau governo é o de quem persegue o próprio bem. (2002, p. 80.)

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5. ÉTICA EMPRESARIAL

Há algum tempo, não pouco, constituiu-se consenso em torno da necessidade de as


empresas serem “éticas”. Como visto anteriormente isto requer que elas sejam mais do que
“obedientes à lei”, porque atuar de acordo com a legislação nem sempre garante
moralidade e ética a uma ação.

Para retomarmos esta noção, lembremos que “nem tudo que é ético é lei, nem tudo
que é lei é ético.” A Ética corresponde a normas formais ou informais e que dizem respeito
aos valores, princípios, a uma certa ideia de felicidade, de justiça aderidos e compartilhados
por indivíduos e sociedades.

As leis muitas vezes remetem a tais princípios e ideias, mas não necessariamente.
Há leis que podem determinar direitos que reproduzam ou levem a injustiças. Por exemplo,
uma legislação que seja tolerante ou flexível quanto ao uso da mão de obra infantil, ou no
que se refere ao estabelecimento dos limites para as jornadas de trabalho, pode levar a
situações de exploração do trabalho de crianças, ou à submissão de trabalhadores à
intensa exploração.

Existem ainda outras razões que fizeram com que, nos últimos anos, aumentasse a
cobrança a respeito da Ética nas organizações e muitas delas empenharam esforço e
tempo a fim de corresponder a tais expectativas. Não que esta nunca tenha sido uma
preocupação na maioria das organizações. Afinal, a preocupação com o “agir ético” como
vimos até aqui é uma constante nas sociedades.

Sob este aspecto, algumas coisas mudaram no âmbito das organizações nas últimas
décadas do século XX e na primeira deste. Com uma atuação mais global, num mundo em
que as informações são cada vez mais compartilhadas em tempo real, a ocorrência de um
escândalo numa empresa, ou o seu envolvimento em algum episódio que provoque
desgaste à imagem tem sempre uma rápida e grande repercussão, produzindo abalos não
só na confiança ou percepção que consumidores têm de suas marcas, mas, principalmente,
abalando a confiança de mercados e investidores.

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E por que a reputação de uma empresa é tão importante para investidores e


mercados? Porque escândalos, muitas vezes, implicam em punições que podem produzir
multas e prejuízos. E isto, sem dúvida, interfere diretamente na confiança de investidores.

No entanto, a despeito de grandes e, em alguns casos, terríveis consequências, os


escândalos nas empresas persistem. Por que isto ocorre?

Temos algumas respostas colhidas em diferentes autores. Para uma determinada


linha a persistência dos escândalos diz respeito ao fato de que as empresas enxergam e
praticam a ética empresarial como um instrumento para garantir a confiança de mercados
e investidores, além de satisfazer governos. Portanto não a enxergam como um objetivo
final. Isto é, a Ética seria no âmbito das organizações um instrumento para garantir mais
lucro ou evitar prejuízos, mas não por ser a “coisa certa a fazer”, ou para gerar o “maior
benefício para o maior número”.

Alguns autores, como Meira no artigo “A ética empresarial em movimento: as (de)


limitações de campo. “, disponível na web2, chamam a atenção para o fato de que esta
visão que predomina no ambiente empresarial se deve à crença na “perfectibilidade do
sistema”, ou seja, de que o Mercado funciona perfeitamente, e de que sobre seus agentes
e práticas não caberia um julgamento moral. Isto significa dizer que entre a maioria dos
responsáveis pelas organizações e agentes econômicos, existe um consenso em torno da
objetividade prevalecente nas suas ações. Todas seriam determinadas pela razão fria e
objetiva e, por isso, não sujeita a avaliações morais.

Mas nem todos compartilham de tal consenso. Autores como Solomon, Giannetti,
Sen e outros entendem que não nos movemos exclusivamente por critérios objetivos e que,
ainda que consideremos o auto interesse como principal motivação, este não é sempre e
todo o tempo o único. Um exemplo destacado na obra “Vícios privados, benefícios
públicos?”, de Eduardo Giannetti, está no depoimento de Akio Morita ex-presidente da
Sony.

Não existe um ingrediente secreto ou fórmula oculta responsável pelo sucesso das
melhores empresas japonesas. Nenhuma teoria ou plano ou política de governo fará
de um negócio um sucesso. Isso só pode ser feito pelas pessoas. A mais importante

2
Disponível em: https://revistas.unifacs.br/index.php/rgb/article/view/716 Acesso em: 24/06/22.

Ética e Cidadania 30
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missão para um administrador japonês é criar um relacionamento saudável com


seus funcionários, um sentimento de família dentro da corporação, um sentimento
de que funcionários e administradores compartilham do mesmo destino. […]. Se
você deseja uma eficiência e produtividade elevadas, uma relação próxima e cordial
com seus funcionários […] é necessária. Algumas vezes é mais importante gerar
um senso de afinidade do que qualquer outra coisa, e algumas vezes você precisa
tomar decisões que são tecnicamente irracionais. Você pode ser totalmente racional
com uma máquina. Mas, se você trabalha com gente, algumas vezes a lógica tem
que dar lugar à compreensão. […] Na Sony nós aprendemos que o problema com
um funcionário que está acostumado a trabalhar só pelo dinheiro é que ele com
frequência se esquece de que se espera que ele trabalhe para o grupo; essa atitude
auto-centrada de trabalhar só para si próprio e sua família, excluindo seus co-
trabalhadores e a empresa, não é saudável. (MORITA apud GIANNETTI, 1993, p.
162-163.)

A este depoimento devemos acrescentar um outro relato, este de Vabo Jr, sobre a
empresa Amazon em artigo para o site Endeavor:

A cultura organizacional da Amazon é a chave quando se pretende comparar o


sucesso dela com outras empresas. Desde o processo de contratação, procura-se
deixar muito claro que as pessoas e a cultura são prioridade, quais são as regras
do jogo e como as coisas são feitas.
Mesmo que a pessoa seja muito talentosa, não fica se não for “culture fit”. Fica clara
a diferença entre os missionários e os mercenários. Os missionários são aqueles
que entendem o propósito da companhia, acreditam no projeto e se comprometem.
Já os mercenários são aqueles apenas interessados no objetivo financeiro de curto
prazo.
Na Amazon, paixão continua sendo a força-motriz. Uma prática que possuem é
frequentemente oferecer dinheiro a funcionários para deixarem a companhia. Desta
forma, ficam apenas os “believers”.3

O que os trechos destacados demonstram é que a subjetividade importa. No entanto,


em muitas organizações tem prevalecido uma visão assentada em princípios neoliberais,
como os que se pode extrair da citação de Milton Friedman, economista norte-americano,
ganhador do prêmio Nobel:

Poucas tendências poderiam minar de forma tão completa as próprias fundações


de nossa sociedade livre do que a aceitação, por parte dos executivos, de uma outra
responsabilidade social que não seja a de ganhar o máximo possível de dinheiro
para seus acionistas. (FRIEDMAN apud NASH, 2003, p. 54.)

Friedman e outros representam o grupo que coloca a questão do lucro como sendo
a única responsabilidade das organizações. Deste modo, elas não estariam erradas em
considerar a Ética como um instrumento e não como um fim.

3
6 lições que aprendi na sede global da Amazon. Endeavor, 19/11/14. Disponível em:
https://blog.panrotas.com.br/b2btech/2014/12/03/6 -licoes-que-aprendi-na-sede-global-da-amazon/Acesso
em: 24/06/22

Ética e Cidadania 31
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No entanto, a medida em que cresce o consenso da sociedade global em torno da


sustentabilidade, desenvolvimento sustentável, todas as medidas que precisam ser
tomadas para que sejam alcançados como a preservação ambiental, redução da pobreza,
transparência das informações fornecidas pelas organizações para garantir a confiança de
mercados e consumidores, mais intolerantes pessoas e governos têm se mostrado com
práticas empresariais antiéticas.

Para ilustrar como isto tem se dado, em 21 de setembro de 2015 as ações da


empresa Volkswagen despencaram 20% no que foi considerada a “sua maior queda diária”,
em razão da empresa ter sido acusada, nos EUA, de usar um software, nos carros a diesel
e nos modelos Audi, que produzia dados falsos sobre a emissão de poluentes, burlando,
deste modo, a fiscalização. Descoberta a fraude, a empresa teve que arcar com multas
bilionárias.4

Acrescentamos a este exemplo o da Petrobras que, em abril de 2015, calculou em


R$ 6,194 bilhões as perdas por corrupção e reduziu o valor de seus ativos em R$ 44,3 bilhões.
Esta situação, somada à queda internacional dos preços do petróleo, fez com que a empresa,
nos nove primeiros meses do ano de 2015, tivesse uma queda no lucro líquido de 58% em
relação a 2014.

Para terminar este tópico, citemos um outro prêmio Nobel de economia, o indiano
Amartya Sen, sobre o quanto as liberdades que interessam ao desenvolvimento não são só as
de mercado, enfatizando desse modo que as reflexões morais devem incidir também sobre as
questões econômicas a fim de promover não só o lucro dos acionistas, mas a prosperidade de
todos.

As liberdades não são apenas os fins primordiais do desenvolvimento, mas também


os meios principais. Além de reconhecer, fundamentalmente, a importância
avaliatória da liberdade, precisamos reconhecer a notável relação empírica que
vincula, umas às outras, liberdades diferentes. Liberdades políticas (na forma de
liberdade de expressão e eleições livres) ajudam a promover a segurança
econômica. Oportunidades sociais (na forma de serviços de educação e saúde)
facilitam a participação econômica. Facilidades econômicas (na forma de
oportunidades de participação no comércio e na produção) podem ajudar a gerar a
abundância individual, além de recursos públicos para os serviços sociais.
Liberdades de diferentes tipos podem fortalecer umas às outras. (SEN, 2010, pp-
25-26)

4
A este respeito e sobre práticas antiéticas de outras empresas e investidores há uma série, “Dirty
Money”, de 2017, disponível para os assin antes de um serviço de streaming.

Ética e Cidadania 32
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Encerramos este tópico concluindo que a Ética tem hoje nas organizações
empresariais, seja pela razão que for, uma centralidade muito maior do que há décadas
atrás. Por isso, torna-se muito importante refletir sobre ela no contexto das empresas e das
ações dos profissionais que nelas atuam.

Além disso, aproveitando a citação de Sen, também as liberdades colaboram para o


desenvolvimento de sociedades, mercados e organizações. Tais liberdades estão na
essência da Cidadania, nosso próximo assunto.

Ética e Cidadania 33
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6. CIDADANIA

A noção de cidadania existiu mesmo em civilizações muito anteriores, como é o caso


das civilizações ditas clássicas, a grega e a romana. No entanto, do ponto de vista dos
nossos estudos, o que nos interessa é a noção moderna de cidadania, ou seja, a que vem
se desenvolvendo desde o século XVIII.

Tal noção remete, portanto, à modernidade ocidental da qual já tratamos em tópicos


anteriores. No entanto, é importante aqui relembrar e acrescentar alguns pontos:
1- A modernidade corresponde ao processo de ruptura com a antiga sociedade de
ordens que teve lugar no Ocidente, representada não só pela sociedade feudal,
como também pela rígida estratificação, manutenção de privilégios e forte
limitação das liberdades características do absolutismo.
2- A ruptura foi sendo construída a partir de importantes movimentos como o
Iluminismo, movimento intelectual do século XVIII de caráter humanista, racional
e progressista. Esse movimento deu origem a novas ideologias que
reproduziram suas características essenciais.
3- Dentre os princípios do Iluminismo, enfatizados por ideologias como o
Liberalismo, está a valorização do indivíduo entendido como portador de direitos
e liberdades fundamentais.
4- A modernidade rompe então com a ideia de “súdito” e a substitui pelo “cidadão”.
Diferentemente do primeiro, o segundo é livre e, ainda que submetido a um
Estado e governo, sua obediência se fundamenta no consentimento e não na
obrigação.
5- O consentimento se expressa na obediência e respeito à autoridade em troca da
proteção e segurança que o Estado e os governos que se revezam na sua gestão
devem aos indivíduos.
6- Estabelecem-se, portanto, compromissos mútuos. Ao Estado cabe garantir e
proteger os direitos e liberdades individuais, os cidadãos em troca obedecem. O
não compromisso de um dos lados pode implicar na “quebra do contrato” e aí
então estariam ambos sujeitos às consequências de tal ruptura.

Mas quais seriam exatamente os direitos e liberdades que o cidadão tem? A noção
moderna de Cidadania envolve direitos de três diferentes grupos, os civis ou individuais, os
políticos e os sociais. Tais direitos não surgiram todos de uma vez. Como ensina Norberto

Ética e Cidadania 34
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Bobbio em sua obra “A Era dos Direitos”, eles surgiram determinados por condições e
circunstâncias históricas ao longo do tempo.

O primeiro grupo de direitos que corresponde às liberdades fundamentais como a de


expressão, pensamento, religião, propriedade, vida, segurança, de ir e vir, surgiram no
processo de afirmação do indivíduo diante do Estado. Como vimos em tópicos anteriores,
esse é um princípio próprio da modernidade, ou seja, de que o indivíduo tem o direito de
existir de acordo com suas próprias vontades e características.

Portanto, os direitos civis ou individuais correspondem ao que garante a afirmação e


preservação do sujeito, de sua liberdade, de sua privacidade, diante deste poder, que
costuma ser muito maior que o de cada um de nós, o do Estado.

Numa argumentação típica dos filósofos modernos da tradição iluminista, embora


todos saibamos da necessidade da existência do Estado e da nossa submissão a ele para
que a vida em sociedade seja possível, isso não pode significar a perda da individualidade,
ou seja, o direito de existir e viver de acordo com os próprios valores e vontades.

O segundo grupo, o dos direitos políticos, historicamente surgiu junto com os


individuais. Mas eles mantêm uma outra relação com os fundamentos deste processo de
construção da cidadania. Os direitos como votar, ser votado, participar da vida cívica,
garantem o nosso controle sobre o Estado e suas ações. Eles também ajudam a garantir a
nossa autonomia à medida que, para usar uma expressão conhecida, nos “empoderam”.

Os direitos sociais correspondem a uma outra geração. Eles surgiram como


consequência do exercício de direitos individuais e políticos permitindo que grupos
inicialmente destituídos de força e representatividade, as minorias, fossem pouco a pouco
buscando sua afirmação e exigindo mais atenção para o tratamento das desigualdades
aprofundadas durante o desenvolvimento das sociedades industriais.

No entanto, como mostra Bobbio, se os direitos individuais garantem a nossa


liberdade, os direitos sociais as limitam já que reforçam o poder do Estado e a possibilidade
de sua intervenção na sociedade. Por exemplo, a educação é um direito social que por isso
deve ser garantido pelo Estado. Para tanto, o Estado deve não só garantir escola para
todos, mas exigir que toda a sociedade, o que inclui cada um em particular, fiscalize, exija

Ética e Cidadania 35
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o seu cumprimento e obedeça à obrigação de que todos em idade escolar frequentem


instituições de ensino. Vamos supor que alguém em razão dos seus próprios princípios e
valores não queira que seus filhos frequentem a escola? Nesse caso o indivíduo pode ser
processado e até mesmo perder a guarda dos filhos por impedi-los de exercerem o direito
de frequentar a escola.

É importante ainda ressaltar o seguinte, se os direitos que compõem a cidadania


surgiram ao longo do tempo como resultado de processos históricos, isto significa dizer que
novos direitos ainda podem surgir à medida que a história da humanidade continua. Por
exemplo, ressaltada por Dallari (2009, p. 203), há uma terceira geração de direitos que ele
situa a partir da década de 70 do século XX como o que corresponde ao direito a um meio
ambiente limpo e saudável. Esse direito, como o do consumidor por exemplo, o direito ao
desenvolvimento e outros, baseia-se no princípio de que o ser humano integra uma
coletividade e que por isso cada um de nós tem direito à solidariedade dos demais. Observe
que isto determina uma obrigação, a de que todos nós sejamos solidários uns aos outros.

Dallari, citando Bobbio, apresenta uma quarta geração de direitos afirmados no


documento da Conferência Mundial de Direitos Humanos, de 1993, em Viena, Áustria. Esta
geração assenta-se no princípio da “própria preservação, em sentido biológico da condição
humana.” (DALLARI, 2009, p. 211).

Citando o documento final da Conferência, Dallari destaca,

10. A Conferência Mundial sobre Direitos Humanos reafirma o direito ao


desenvolvimento, previsto na Declaração sobre Direito ao Desenvolvimento, como
um direito universal e inalienável e parte integral dos direitos humanos
fundamentais. Como afirma a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento, a
pessoa humana é o sujeito central do desenvolvimento.
Embora o desenvolvimento facilite a realização de todos os direitos humanos, a falta
de desenvolvimento não poderá ser invocada como justificativa para se limitar os
direitos humanos internacionalmente reconhecidos. (Apud DALLARI, 2009, p. 211.)

Considerando o que está posto no final da citação, note-se que todos os países
signatários do Documento, seus governos e cidadãos, estão comprometidos a não usar o
argumento da falta de desenvolvimento e do atraso para o não cumprimento e garantia dos
Direitos Humanos.

Ética e Cidadania 36
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No entanto, embora tal compromisso seja firmado, o próprio documento reconhece


que a falta de desenvolvimento dificulta o acesso dos cidadãos aos direitos.

O historiador e cientista político José Murilo de Carvalho em sua obra “Cidadania no


Brasil: o longo caminho” (2001), destaca que a “cidadania plena”, ou seja, o gozo de todos
os direitos pelos cidadãos, é ainda uma utopia. Mesmo nos países mais desenvolvidos
dificilmente se encontrará alguém que usufrua completamente de todos eles. Mas, como se
pode depreender das colocações de Bobbio (1992), a inexequibilidade dos direitos não
pode servir de fundamento para sua contestação. Além disso, os direitos humanos segundo
o autor, não precisam mais de justificativa, precisam de proteção. Ou seja, a questão não
é mais filosófica e sim política. (BOBBIO, 1992, p. 24).

As ações concretas e políticas que podem garantir a preservação dos direitos


dependerão, portanto, de condições objetivas que são postas pela história de cada
sociedade. Por isso, o exercício da Cidadania será mais garantido em alguns lugares que
outros, para algumas classes mais do que para outras. Nesse ponto cabe então citar as
desigualdades provocadas pelo maior ou menor acesso ao conjunto de direitos, que podem
ter como causas as relações étnico-raciais e as questões de gênero.

A compreensão da moderna noção de cidadania permite perceber que a


desigualdade não se limita às questões econômicas e sociais, implica também em
diferenças na fruição da Cidadania.

Ainda é importante destacar que mesmo em lugares em que desigualdades


econômicas e sociais tenham sido ou sejam muito menores, como o caso de países
socialistas ou que tiveram tal experiência, a diminuição de desigualdades econômicas e
diferenças de classe não conduziu à cidadania plena. Por exemplo, nas experiências
socialistas que se concretizaram, os direitos políticos e individuais foram fortemente
limitados e alguns deles chegaram mesmo a ser suprimidos.

Existem ainda outros fatores que comprometem a fruição da Cidadania como os que
dizem respeito à etnia. A moderna Ciência refletindo os resultados alcançados com o
avanço da Genética, rejeita o conceito de raça. Conforme revelaram as pesquisas acerca
do DNA, as diferenças entre os grupamentos humanos de fenotípica distinta são tão
pequenas que não cabe dizer que existem “raças humanas”. No entanto, o termo

Ética e Cidadania 37
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permanece nas Ciências Sociais e ainda é usado na administração e políticas públicas em


razão das pessoas se identificarem com este ou aquele grupo pelos seus traços ou cor da
pele.

Etnia é um conceito mais amplo, que não se limita a traços ou características


fenotípicas, e que envolve elementos como língua, religião, cultura. Alguns grupos étnicos
e/ou raciais sofrem muitas vezes com a opressão por uma maioria. Mas também aqui é
preciso definir os termos. Minoria em termos políticos e sociológicos não corresponde a
números absolutos e sim às menores alternativas de trabalho, oportunidades, expressão
cultural ou política que um determinado grupo tem. Por exemplo, quando se afirma que as
mulheres constituem uma minoria embora elas sejam em muitos casos mais da metade da
população, isto quer dizer que elas têm menos possibilidades e oportunidades de se
expressarem, afirmarem seus direitos e exercerem sua individualidade do que os homens.

As dificuldades encontradas pelas minorias devem-se à discriminação que muitas


vezes sofrem. De novo é necessário dar maior precisão aos termos. Discriminação e
preconceito são duas coisas diferentes.

Preconceito é, como coloca Norberto Bobbio, algo que todos temos, “não existe
preconceito pior que acreditarmos que não temos preconceito.” (2002, p. 122). No entanto,
nem todos os preconceitos têm natureza étnica ou racial e nem todos nós praticamos a
discriminação.

O preconceito é compreendido como um sentimento, algo que sentimos, mas que


talvez não expressemos. Enquanto não é expresso não pode ser julgado ou punido,
portanto dificilmente é controlável por meios legais e morais uma vez que seja um
sentimento e considerando que a Justiça, assim como a Ética, só pode julgar ações
concretas.

No entanto, à medida que os preconceitos são expressos transformam-se em


discriminação, o que se constitui numa ação deliberada e intencional de tratar um outro
grupo social de maneira injusta e desigual, ou de impedir pela censura e opressão que os
indivíduos que a eles pertencem “existam” com todas as suas características.

Ética e Cidadania 38
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Por exemplo, é possível que alguém tenha preconceito contra grupos que se
alimentam de carne de cachorro e por isso evite frequentar a mesma região ou restaurantes
que eles. Mas se escreve, ou dirige a eles frases ou palavras ofensivas, se não permite que
eles ingressem num lugar, ou limita suas oportunidades de trabalho em razão de seus
hábitos alimentares, então os discrimina.

Uma vez que a discriminação se traduz em ações concretas, pode ser sim julgada
tanto pelas leis quanto pela Ética, além de poder ser controlada por políticas públicas. Ao
conjunto das políticas públicas e privadas usadas para combater a discriminação e garantir
às minorias direitos historicamente negados e sua inclusão chama-se ação afirmativa.

No Brasil podemos identificar como mais recorrentes a discriminação racial e de


gênero. Mas podemos ainda ressaltar a discriminação das pessoas com deficiência o que
as coloca entre os grupos que dispõem de menos oportunidades tendo, portanto, sua
cidadania fortemente limitada.

Mas em que medida a Cidadania remete à Ética? Ao examinarmos os princípios que


fundamentam a noção moderna de Cidadania percebemos que tais elementos remetem a
princípios e valores que correspondem aos parâmetros Éticos da modernidade.

Retomando alguns aspectos já tratados, a modernidade implica a defesa dos


indivíduos existirem plenamente. A possibilidade de exercermos nossa individualidade leva
à diversidade, uma vez que cada um pode e deve fazer suas próprias escolhas e elas não
serão evidentemente sempre as mesmas dos demais. Nossos princípios e valores, os que
nos guiam em nossas decisões pessoais, podem ser diversos. Desse modo, como
estabelecer um “metro” comum? Ou seja, como possibilitar que exista uma moralidade
cívica à luz da qual possamos avaliar nossas decisões, ou mesmo, para retomar uma ideia
de Smith, controlar nossa “parcialidade moral”?

Os Direitos Humanos que fundamentam a noção moderna de Cidadania fornecem


tal parâmetro. Como coloca Bobbio,

Há três modos de fundar os valores: deduzi-los de um dado objetivo constante,


como por exemplo, a natureza humana; considerá-los como verdades evidentes em
si mesmas e, finalmente, a descoberta de que, num dado período histórico, eles são
geralmente aceitos (precisamente a prova do consenso). O primeiro modo nos

Ética e Cidadania 39
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ofereceria a maior garantia de sua validade universal, se verdadeiramente existisse


a natureza humana. (…).
O terceiro modo de justificar valores consiste em mostrar que são apoiados no
consenso, o que significa que um valor é tanto mais fundado quanto mais é aceito.
(…). Trata-se, certamente, de um fundamento histórico e, como tal, não absoluto:
mas esse fundamento histórico do consenso é o único que pode ser factualmente
comprovado. A Declaração Universal dos Direitos do Homem pode ser acolhida
como a maior prova histórica até hoje dada do consensus ominum gentium 5 sobre
um determinado sistema de valores. (…). Com essa declaração, um sistema de
valores é – pela primeira vez na história – universal, não em princípio, mas de fato,
na medida em que o consenso sobre sua validade e sua capacidade para reger os
destinos da comunidade futura de todos os homens foi explicitamente declarado.
(BOBBIO, 1992, pp 26-28.)

Pode-se dizer então que desde a proclamação da Declaração Universal dos Direitos
Humanos, em 1948, base para noção de Cidadania, a Ética contemporânea ganhou um
“metro”. Garantir a fruição dos direitos que compõem a Cidadania por todos, sem exceção,
é fundamento da Ética, parte da “estética da existência” e da ideia de felicidade
contemporâneas.

5 Consenso geral do direito das gentes

Ética e Cidadania 40
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7. RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL NAS ORGANIZAÇÕES

O desenvolvimento do capitalismo alcançou enorme velocidade com a Revolução


Industrial. Fenômeno localizado no final do século XVIII e XIX em parte da Europa e dos
Estados Unidos, a industrialização avançou ao longo do século XX. Pode-se dizer que, hoje
em dia, são muito poucas as nações que não sejam, ainda que em parte, industrializadas.
Pode-se afirmar ainda que todas as nações, de algum modo, seja como protagonistas ou
na periferia do sistema, mantêm relações com o mercado global.

É nesse contexto de avanço da industrialização, mundialização e/ou globalização da


economia, sobretudo a partir do fim da Segunda Grande Guerra, que devemos localizar o
desenvolvimento da Responsabilidade Socioambiental nas organizações.

Hoje em dia, há um certo consenso em torno da ideia de que as organizações têm


sim responsabilidades com a comunidade global. No entanto, nem sempre foi assim.

No início do século XX, considerava-se que a única responsabilidade das


organizações era com os seus acionistas. Ainda hoje, há muitos que defendem que essa
deveria ser a única responsabilidade das empresas e que qualquer outra além dessa
representa um aviltamento dos interesses dos seus proprietários. Esta é a posição adotada
pelos partidários do ideário neoliberal que encontra seu principal expoente no economista
norte americano, e também prêmio Nobel de Economia, Milton Friedman.

Mas tal posição foi perdendo espaço à medida que o próprio ideário liberal passou a
ser questionado quando, nos anos 20 do século XX, crises econômicas abalaram os
mercados, culminando com a quebra da Bolsa de Nova York em outubro de 1929 e a
depressão dos primeiros anos da década de 30. Nesse contexto foram ganhando espaço
ideias e políticas que defendiam uma participação maior do Estado nas questões sociais e
econômicas, colocando em xeque princípios do livre mercado, defendendo uma maior
regulação das atividades econômicas e financeiras.

Na sociedade, amadureceu a percepção de que se as questões sociais e


econômicas eram da alçada do Estado, caberia às empresas e instituições financeiras
também um certo papel ou, no mínimo, a adequação às normas e políticas. Além disso,
mesmo no início do século passado, muitas empresas já desenvolviam certas práticas

Ética e Cidadania 41
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6
filantrópicas. Desse modo passou-se a considerar que, se a filantropia empresarial não
era estranha ao universo das organizações, a responsabilidade social também não o seria.
Nessa perspectiva, a Responsabilidade Socioambiental das organizações se desenvolveu
a partir de uma evolução natural do que já ocorria nas empresas, ainda que influenciada
pelo ambiente externo.

No entanto, numa outra perspectiva considera-se que a evolução da


Responsabilidade Socioambiental nas organizações corresponde a um “modismo”, ainda
que, ao que parece, este tenha vindo para ficar.

Este modismo relaciona-se com o processo recente de globalização, aproximação


de mercados e pessoas graças às novas tecnologias, surgimento de protocolos,
parâmetros, normas e compromissos globais. Nessa linha de argumentação, a crescente
preocupação das empresas em parecerem, ou de fato se tornarem socialmente
responsáveis, diria respeito a uma “gestão da reputação”.

Ilustrando com Wooldridgde,

O que explica o sucesso extraordinário da RSE? Por que uma ideia anteriormente
associada a poucos excêntricos se tornou predominante? A resposta mais simples
é a gestão da reputação. As sociedades anônimas, sempre provocaram profundas
suspeitas com base no fato de que permitem todos os direitos dos indivíduos sem
qualquer das responsabilidades. (…).
(…). As pessoas comuns esperam padrões cada vez maiores de suas grandes
companhias. Uma pesquisa feita pela McKinsey, em 2007, descobriu que 95% das
empresas sentiam que a “sociedade” tinha expectativas maiores do que há cinco
anos. Acadêmicos, denunciantes, jornalistas, ONGs e profissionais descontentes,
todos têm prazer em expor os malfeitores da grande riqueza. (…).
A RSE é uma forma de contra-ataque, uma maneira de gerenciar sua reputação em
uma época em que se rasgam reputações. É uma campanha publicitária e uma
apólice de seguro em uma coisa só. (2012, pp 32-33.)

Modismo ou não, a Responsabilidade Socioambiental, se assumida como um real


compromisso, requer um “novo modelo de empresa”, no qual as dimensões econômica,

6
Tais práticas não devem ser confundidas com as de Responsabilidade Social. A chamada Filantropia Empresarial é muitas
vezes marcada por ações eventuais, sem relação com o planejamento estratégico da organização. É também filantropia empresarial a
que se caracteriza pela criação de fundações por parte dos empresários, mas que não mantêm relação com a corporação. As fundações
são entidades separadas que recebem aportes dos fundadores e de outros parceiros, sem fins lucrativos.

Ética e Cidadania 42
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ambiental, social e institucional7 não sejam colocadas hierarquicamente, mas consideradas


numa perspectiva circular.

Ambiental

Social Econômica

Institucional

Nesse novo modelo, devemos então entender que a responsabilidade das empresas
consiste em minimizar os aspectos negativos de suas ações e maximizar os positivos. Tal
Responsabilidade assim definida, nos aproxima do princípio utilitarista do cálculo da “maior
felicidade para o maior número”, um princípio moral.

O já citado Wooldrigdge, ilustrando o “modismo” ou avanço da Responsabilidade


Sócio Ambiental nas organizações em anos recentes, apresenta alguns passos e marcos
que devem ser destacados: 1999 - Pacto Global da ONU pela Responsabilidade Social
Empresarial: mais de 3 mil empresas apoiadoras; 2006 - Grã-Bretanha lei de Empresas
exige que estas informem sobre questões ambientais e sociais; EUA criaram o National
Corporate Philanthropy Day (25 de fevereiro); China criou uma Federação Chinesa pela
RSE; surgimento do Índice Dow Jones de Sustentabilidade. 8 (WOOLDRIGDGE, 2012.)

7
Esta perspectiva se refere à dimensão da preservação dos direitos e liberdades individuais. Isto
significa dizer que cabe às organizações atuarem no sentido de promover tais garantias, seja junto ao
público externo, como também internamente, adotando práticas, por exemplo, de promoção de diversidade
no ambiente da organização, combatendo a discriminação.
8
O índice Dow Jones de Sustentabilidade é o índice da bolsa de Nova York em que são negociados
ações e títulos de empresas consideradas sustentáveis, o que implica a responsabilidade socioambiental.
Para ter papéis negociados em tal mercado, as empresas devem apresentar certificados, relatórios e índices

Ética e Cidadania 43
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Muito menos crítico do que Wooldrigdge e considerando que a Responsabilidade


Socioambiental é não só ética como também uma boa maneira de ganhar dinheiro, temos
Kotler, Hesekiel e Lee. Em obra de 2012, os autores defendem o princípio do “valor
compartilhado”, ou seja, buscar criar valor econômico, mas gerando também valor para a
sociedade. O lema aqui seria “doing weel by doing good”, ou seja, fazer bem fazendo o que
é bom.

Nesta linha, Kotler et al. (2012), apresentam seis caminhos divididos em dois grupos:

• Grupo 1 – Iniciativas sociais de marketing


1- Promoção de causa: empresas oferecem fundos, contribuições em bens e/ou
serviços para promoções com o objetivo de aumentar a conscientização e o
interesse em relação a causas sociais. Ex: patrocínio da Amgen-Pfizer de uma
caminhada para levantamento de fundos promovida pela Arthritis Foundation.

2- Marketing associado a causas: a empresa liga as doações em dinheiro ou em


bens e/ou serviços às vendas de produtos ou a ações praticadas pelos
consumidores. Ex: Kraft Foods doa alimentos quando os consumidores
resgatam cupons.

3- Marketing social das empresas: a empresa apoia o desenvolvimento e/ou a


implementação de uma campanha de mudança de comportamento com o
objetivo de melhorar a saúde pública, a segurança, o meio-ambiente, ou o bem-
estar da comunidade. Ex: Home Depot e uma concessionária de serviços
públicos oferecem dicas para economia de água.

• Grupo 2 – Iniciativas sociais de empresas


4- Filantropia empresarial: a empresa faz contribuições diretas para instituições
filantrópicas ou para causas sociais, quase sempre na forma de concessões,
doações ou serviços. Hoje em dia muitas empresas adotam a estratégia de
convocar os consumidores para que indiquem as organizações sem fins

que atestem o seu compromisso e ações com as dimensões que compõem o novo conceito de organização.
O equivalente nacional é ISE B3.

Ética e Cidadania 44
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lucrativos a receberem contribuições. Ex: programa de doações comunitárias do


Chase.

5- Voluntariado da força de trabalho: a empresa apoia e estimula os empregados,


os parceiros do varejo e/ou franqueadas a trabalharem como voluntários nas
organizações e causas comunitárias locais.

6- Práticas de negócios socialmente responsáveis: a empresa adapta e conduz


práticas e investimentos em apoio a causas sociais para melhorar o bem-estar
da comunidade e proteger o meio-ambiente. A empresa pode conceber e
implementar as iniciativas ou pode formar parceria com terceiros. Ex: programa
da DuPont para redução do consumo de energia e emissão de gases do efeito
estufa; programa da Whole Foods Market em conjunto com o Departamento de
Meio-Ambiente para aumentar a compra de peixes sustentáveis. (KOTLER et al.
2012.)

Neste ponto, é preciso chamar a atenção para o quanto a Responsabilidade


Socioambiental nas organizações relaciona-se com a Ética na medida em que contempla
a alteridade, ou seja, o sentido do outro. A Ética significa essencialmente isso, um modelo
ou ideia de felicidade que leva em consideração a vida do homem em sociedade, não existe
uma “Ética do eu sozinho”.

Da mesma forma, a Responsabilidade Socioambiental existe a partir da


compreensão de que as organizações têm compromissos com a sociedade, têm uma
relação com ela. Como toda relação, essa também se baseia num conjunto de expectativas,
de um lado e de outro. A confiança entre as duas partes depende do quanto cada uma
delas corresponde ao que o outro lado espera. Do contrário, a confiança deixa de existir.

É para garantir que tal relação se mantenha que não só nas organizações como
também entre organismos globais, governos e nações, considera-se cada vez mais a ideia
da Governança construída em torno do objetivo da Sustentabilidade, nossos próximos
assuntos.

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8. GOVERNANÇA

Governança pode ser definida como conjunto de atividades apoiadas em objetivos


comuns e partilhados; que abrangem tanto as instituições governamentais quanto
mecanismos informais (não-governamentais); dependem da aprovação da maioria.
(CAMARGO, 2005, p. 307.). Tal definição serve à uma noção de “Governança Global” que
comporta, de acordo com mesma fonte, “definição de agenda, mecanismos e instituições
que deveriam compor uma nova ordem internacional”.

Essa pretensão pode ser observada mesmo em períodos anteriores ao século XXI.
Por exemplo, quando do fim da Primeira Grande Guerra a Liga das Nações foi formada
como uma organização para estabelecer princípios e compromissos compartilhados de
preservação da paz mundial. Como se sabe, tal organização foi incapaz de impedir a
Segunda Grande Guerra, tendo, portanto, fracassado nos seus intentos.

De todo modo, ao longo do século XX, principalmente através da Organização das


Nações Unidas – criada em 1946 e, se comparada à Liga das Nações, exitosa, a tentativa
de se estabelecer Governança em torno de certos temas e objetivos tornou-se constante,
continuando no século XXI. Nesse caso, os compromissos que se pretendeu e pretende
estabelecer dizem respeito a “assegurar desenvolvimento social com equidade, expansão
do emprego produtivo, erradicação da pobreza.” (CAMARGO, 2005, p. 308).

Ao lado desse conceito há um outro, o de Governança Corporativa. Esse também


diz respeito ao estabelecimento de práticas comuns e objetivos compartilhados, mas, nesse
caso, pelo conjunto da corporação para garantir mais uniformidade nos processos, tendo
em vista que as empresas atuam cada vez mais de forma global, e também transparência
das informações para os investidores. Mais recentemente, tal prática é conhecida nas
organizações por ESG, a sigla em inglês para Governança Socioambiental.

A Governança Global ganhou fôlego após o fim da Guerra Fria com o colapso do
chamado “bloco soviético”, o que possibilitou a ampliação do espaço nas relações
internacionais para o diálogo e práticas de fato globais.

Mas, além disso, o fim da ordem mundial, surgida no final da Segunda Grande
Guerra e que durou até os primeiros anos da década de 90 do século XX, permitiu também

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uma abertura muito maior de mercado, negócios e oportunidades, dando início ao processo
de globalização recente. As novas oportunidades geraram novas exigências para as
organizações como garantir a confiança, qualidade e produtividade em qualquer lugar e
setor que atuassem.

No entanto, foi principalmente na busca por novos investidores para permitir o seu
crescimento, que muitas organizações abriram o seu capital. A corrida por shareholders ou
acionistas implicou em garantias de fato da sustentabilidade econômica e capacidade da
organização. A confiança, também nos negócios, é a base de qualquer relação. Aliás, para
muitos, sem confiança não há negócio. Confiança exige transparência e fidedignidade das
informações. Investidores só se mostram dispostos a investir e correr riscos se tiverem
alguma base para tomada de decisões.

Naturalmente que isto não impediu e continua não impedindo que muitas
organizações tentassem/tentem ludibriar o mercado, apresentando dados que não refletem
de todo a realidade das organizações, fazendo uso da chamada contabilidade criativa9, ou
por vezes contrariando mesmo a lei.

A Governança Corporativa corresponde a quatro princípios:


1-Transparência na informação
2- Prestação de contas (Accountability)
3- Equidade no tratamento dos stakeholders
4-Responsabilidade corporativa –deve levar em conta todos os relacionamentos com
a comunidade. (ASHLEY, 2005.)

Observe que o item três remete aos stakeholders, o que nos leva a estabelecimento
de relação entre prática da Governança Corporativa e a teoria do tratamento a ser
dispensado aos “diversos públicos com os quais a empresa se relaciona” (ASHLEY, 2005.),
ou seja, stakeholders. Esta teoria parte da premissa de que: “as pessoas, a sociedade como

9
A contabilidade criativa é a utilização de normas contabilísticas aceitas de forma flexível, em
razão das omissões ou ambiguidades que podem estar presentes em tais normas. Esta prática não é,
portanto, necessariamente contra lei, não se constituindo, a princípio, em f raude. Mas pode levar a, já que,
a contabilidade criativa impede que o público tenha uma real visão da saúde financeira da organização,
maquiando a realidade.

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um todo, o meio ambiente com nossos descendentes, de múltiplas maneiras são atingidos
pelo agir de uma empresa. Quanto maior a empresa, mais longe se estendem seus efeitos.”
(ASHLEY, 2005.)

Observe que também esta teoria nos conduz ao novo conceito de empresa colocado
no item anterior e que considera que, nas suas ações, as empresas sociais e
ambientalmente responsáveis devem considerar quatro dimensões: a econômica, a social,
a ambiental e a institucional.

A importância de tais dimensões para as ações das empresas e dos governos


nasceu do desenvolvimento do conceito de Sustentabilidade, o que nos leva ao nosso
próximo tópico.

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9. SUSTENTABILIDADE

Sustentabilidade é um termo que, na sua atual acepção, surgiu de uma outra noção,
a do Desenvolvimento Sustentável. Muito embora tal conceito venha se desenvolvendo
desde os anos 70, como se pode depreender da leitura de Andrés Ribeiro (in PADUA, 2009,
pp. 64-116.), é no Relatório da Comissão Brundtland, relatório da ONU publicado em 1987,
que encontramos uma síntese mais amadurecida e que veio a conformar a nossa
compreensão do que é a Sustentabilidade.

O Desenvolvimento Sustentável foi assim definido no mencionado Relatório:


“Consiste na modificação da biosfera e na aplicação de seus recursos para atender
necessidades humanas e aumentar qualidade de vida.”. (PADUA, 2009.)

Observe que o conceito não determina o congelamento das ações humanas no que
se refere ao desenvolvimento, ou seja, Sustentabilidade não significa a preservação da
natureza em detrimento das necessidades humanas. Mas implica, isto sim, na consideração
e no compromisso com a “qualidade de vida”.

Mas o que afinal se entende por “qualidade de vida”? Para responder a esta questão,
observemos o que o Relatório, em 1987, considerou sobre as ações que os governos
deveriam tomar no sentido de promover o Desenvolvimento Sustentável:
a) Limitação do crescimento populacional;
b) Garantia de recursos básicos (água, alimentos, energia) a longo prazo;
c) Preservação da biodiversidade e dos ecossistemas;
d) Diminuição do consumo de energia e desenvolvimento de tecnologias com uso
de fontes energéticas renováveis;
e) Aumento da produção industrial nos países não-industrializados com base em
tecnologias ecologicamente adaptadas;
f) Controle da urbanização desordenada e integração entre campo e cidades
menores;
g) Atendimento das necessidades básicas (saúde, escola, moradia).

Pela interpretação dos itens elencados, é possível concluir que qualidade de vida
significa a garantia das necessidades, num ambiente equilibrado, limpo, que preserve a

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saúde e a dignidade das pessoas e, uma vez que é um relatório da ONU orientando o que
os governos devem fazer, podemos dizer que das pessoas do mundo todo.

Em 1999, partindo da compreensão mais atual do papel e responsabilidade das


empresas para a Sustentabilidade, no Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça, foi
anunciado pelo então secretário geral das Nações Unidas, Kofi Annan, o Pacto Global. Esse
implicava o compromisso das maiores organizações e dos seus investidores na defesa e
promoção do seguinte:

• Direitos Humanos
1. Apoiar e respeitar a proteção dos direitos humanos internacionais dentro de seu
âmbito de influência.
2. Certificar-se de que suas corporações não sejam cúmplices de abusos em
direitos humanos.

• Trabalho
1. Apoiar a liberdade de associação e o reconhecimento efetivo do direito à
negociação coletiva.
2. Apoiar a eliminação de todas as formas de trabalho forçado e compulsório;
3. Apoiar a erradicação efetiva do trabalho infantil.
4. Apoiar o fim da discriminação relacionada a emprego e cargo.

• Meio Ambiente
1. Adotar uma abordagem preventiva para os desafios ambientais.
2. Tomar iniciativas para promover maior responsabilidade ambiental.
3. Incentivar o desenvolvimento e a difusão de tecnologias ambientalmente
sustentáveis.

Percebe-se pela análise de que cada um dos pontos acima, o quanto, a partir do
mencionado pacto, espera-se que as empresas se comprometam, por exemplo, com o
combate ao trabalho escravo; a preservação dos direitos dos trabalhadores e das minorias;
o uso racional dos recursos naturais; a promoção de políticas de diversidade no âmbito da
organização.

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Como destacado por Barata (In PADUA, 2009, pp 271-95.), o Desenvolvimento


Sustentável determinou um novo conceito de desenvolvimento. Este implica pelos governos
a formulação de políticas e adoção de medidas sob a forma de programas, leis e
instrumentos para fiscalização do cumprimento de medidas que induzam e/ou obriguem o
setor empresarial a buscar as novas metas e objetivos. Para as empresas determinou a
“necessidade de novo foco para seu alcance.” (PADUA, 2009.)

No entanto, como mostra a autora citada, é preciso compreender que a


sustentabilidade empresarial, embora inserida no entendimento da Sustentabilidade como
um todo, significa, “habilidade da empresa de: manter-se competitiva e rentável ao longo
do tempo, por meio de ofertas de produtos e/ou serviços com qualidade e preços
compatíveis com o mercado, e da justa remuneração de sua força de trabalho, investidores
e/ou proprietários.” (PADUA, 2009, p. 272.)

Ainda que a Sustentabilidade Empresarial pareça ser menos abrangente que o


conceito geral de Sustentabilidade, ela acaba por determinar grandes desafios para as
organizações como o respeito com os trabalhadores e seus direitos e aos compromissos
com os investidores, o que implica, como vimos, transparência e informações fidedignas;
além do respeito com os consumidores dos seus produtos e serviços.

Isso coloca as organizações muito distantes da ideia que prevaleceu em parte do


século XX de que o seu “único compromisso” era gerar lucro para os seus acionistas. Mas
ainda que se considere que deva ser este o seu essencial compromisso, considerando as
expectativas da sociedade sobre o papel que as empresas devem assumir no mundo hoje,
caso elas deixem de lhes corresponder, podem ser atingidas por denúncias, boicotes e
punições legais que, no mais das vezes, implicam em multas e redução do seu valor de
mercado, ou seja, comprometendo os lucros daqueles que seriam os seus primeiros e
principais interessados.

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BIBLIOGRAFIA BÁSICA
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e responsabilidade corporativa. 2 ed. Curitiba: Intersaberes, 2016. (Biblioteca
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Virtual Pearson)
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CALDAS, Ricardo Melito (org.). Responsabilidade Socioambiental. 2 ed. São
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CARVALHO, Ana Paula C. de. Desigualdades de gênero, raça e etnia. Curitiba:
Intersaberes, 2012 (Série Temas Sociais e Contemporâneos). (Biblioteca
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FREITAS, Marcílio de; FREITAS, Marilene Corrêa da S. A Sustentabilidade como
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https://www.youtube.com/watch?v=Yc54ve2VYoU. Acesso em: 24/06/22
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