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PREFÁCIO
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As páginas seguintes abordam um assunto que cu queria ini.
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cialmente apresentar apenas eomo um capItulo que se insere num


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". trabalho mais vasto sobre a história social da Inglaterral; mas em
I. :: breve sua importância me obrigou a dedicar-lhe um estudo particular.
',' A situaçâo da classe operária é a base real de onde salram to.
i
, dos os movimentos atuais porque ela é, ao mesmo tempo, o ponto
I,.
máximo e a manifestação mais vislvel da miserável situação social
..::
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atual. Ela produziu, por via direta, o comunismo dos operários fran.
ceses e alemães e, por via indireta, o fourierismo e o socialismo in.
,

glês, bem eomo o eomunismo da eulta burguesia alemã. O conheci­


,'1
mento das condições de vida do proletariado é uma necessidade ab­
-,
soluta se quisermos assegurar uma base s6lida às teorias socialistas
i
f bem como aos juIzos sobre a sua legitimidade, acabar com todos os
,

! sonhos e fantasias prd e contra. Mas as condições de vida do prole­


tarilido só existem na sua forma cldssica, na sua perfeição, no Impé­
li;i rio Britânico, e mais particularmente na Inglaterra propriamente di.
" ta; e, ao mesmo tempo, s6 na Inglaterra é que os dados necessários
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estão reunidos de uma forma tão completa, e verificados por peso
i;
quisas oficiais, como exige qualquer estudo sobre este assunto, por
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pouco exaustivo que seja.
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Durante vinte e um meses, tive ocasião de conhecer o proleta­
j'1 riado inglês, estudar de perto os seus esforços, os seus sofrimentos
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\1;; e alegrias, convivendo com ele ao mesmo tempo que completava es­
tas observações utilizan'do as fontes autênticas indispensáveis. Utili.
.'.

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zei nesta obra o que vi, ouvi e li. Espero ver atacados de vários lados
não só o meu pont de vista, mas também os fatos citados, sobretu­
j: do se meu livro cair nas mãos de lcitores ingleses. 1àmbém sei que
, aqui e ali poderá ser registrada alguma inexatidão insignificante (que
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mesmo um inglês, dada a amplitude deste assunto c tudo o que ele

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implica, não tcria podido evitar). Isto sc dará com maior facilidadc ;,'': Para terminar, tenho ainda duas observações a fazer. Primei­
porque  certo que não existe, na própria Inglalerra, uma obra que :1:' ro. utilizei constantemente a expressão classe média no sentido in­
se refira, como a minha, a todos os trabalhadores; mas não hesito A glês. middle c1ass (ou como se diz quase sempre: middle-c1asses); es.
um só momento cm desafiar a burguesia inglesa a dcmonslrar-me r',1 ta expressão designa. como o termo francês bourgeoisie, a classe pos­
.,,"
a incxatidão de um único falo com alguma importãncia do ponto suidora, e, particularmente, a classe possuidora distinta da chamada
de vista geral, c demonstrá-lo com a ajuda de documenlos autênti­ I'!'
H aristocracia - classe que, na França c na Inglalerra, detém o poder
cos como os que cu próprio apresentei. "1
, 
polltico direlamcnte, c na Alemanha indiretamente, como opinião
É principalmente para a Alemanha que a exposição das condi­ 1"," pública. Utilizei tambm, constantemente, como sinônimos, as ex­
ções de vida do proletariado do lmprio Britãnico - sobretudo no
")j, pressões "trabalhadores" (workirlg men), proletários, classe operá­
atual momento - tem uma grande importãncia. O socialismo c o ,
ria, classe não proprietária c proletariado. Em segundo lugar, na
comunismo a:lcmãcs tiveram a sua origem, mais do que quaisquer
outros, cm hipóteses teóricas; nós, os teóricos alemães. ainda conhe­
 maior parte das citações. indiquei o partido ao qual pertencem os
autores citados, porque quase semprc os liberais procuram ressaltar
cemos muito pouco o mundo real para que as condições sociais reais
nos pudessem incitar diretamente à reforma dessa "triste realidade".
Pelo menos entre os partidários confessos destas reformas quase ne­
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a miséria das regiões agrícolas. ao passo que, pelo contrário, os con­
servadores reconhecem a misria nas regiões industriais c fingem ig­
norar as regiões agrlcolas. É por esta razão que, quando me falta­
I.
nhum chegou ao comunismo senão atravs da filosofia de Feuerbach. .'i ram os documentos oficiais, preferi, para descrever a situação dos
que destruiu a especulação hegeliana. As verdadeiras condições de
vida do proletariado são tão pouco conhecidas por nós, que mesmo t1
I
trabalhadores de fábrica, um documento Iibetal, c geralmente recor­
ri somente aos tories ou aos cartistas; assim reconhecia a exatidão
as filantrópicas "Associações para o Benefício das Classes 1l'abalha­
íl1i
do fato seja por observação dircla ou poderia ser convencido da ve­
doras", nas quais a nossa burguesia aluai despreza a questão social, racidade do documento pelo caráter pessoal ou literário das autori­
tomam sempre como pontos de partida as opiniões mais ridículas
ll!
;1. dadcs por mim evocadas.
c mais inslpidas sobre a situação dos trabalhadores. É sobretudo pa­
ra nós. alemães, que o conhecimento destes fatos'; neste caso, uma
ilí
Barmen, 15 de março de 1845
necessidade imperiosa. E se as condições de vida do proletariado na L:I
F. ENGELS
,

Alemanha não chegaram a este grau de classicismo que conhecem


na Inglaterra, deparamos. no fundo, com essa mesma ordem social,
I' .,' NOTAS
a qual chegará, necessariamente, mais ccdo ou mais tarde, ao ponto /J.
crItico atingido do outro lado do Mancha - a menos que a perspi- "'I
I £nKt/s rl40 tscrrvtu Q hisldr;a social da Intfattrra qllt projtlava. Contudo, pub/Jrou. '''1fT JJ
. cácia da nação tome medidas a tempo para dar ao conjunto do sis­
tema social uma base nova. As causas fundamentais que provoca­ I
111:
dt tllosto t /9 dt outubro dt /844, vJrios tlrl;IOS Jobrr tS't CWUrlto no Vorwarts (Oe••mllu"
'Ibe I, vai. 4, Derlim 1932, pp. 292.334).
J Enacls rdere.se ls revoltas dos lecelõcs em 1844. NI Silhil, IS tropu Intervieram. principal.
ram na Inglaterra a misria c a opressão do proletariado existem igual­ : .....

mente em Langenbielau, e esmagaram a rnoUa com sangue. Na Bmia, no mesmo ano. nos
"(
mente na Alemanha, c devem provocar, necessariamente, com o tem­ 1'. dislritos de Leitmeritl e de Praga, os trabalhadores tomaram de assallo as rAbrie... lbotei. c

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destrulrllll as mâquinn. .
po, os mesmos resultados. Mas, entretanto. a misria inglesa, devi­
damente constatada. nos dará a oportunidade de conslatarmos a nos­
sa própria misria alemã, c fornecerá um critrio para avaliar a im­
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portãncia do perigo que se manifestou nos incidentes da Uoêmia c !:,

da Silsia2 que ameaçam a tranqüilidade da Alemanha.


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INTRODUÇÃO I

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A história da classe trabalhadora na Inglaterra começa na se­
ii;'. lunda metade do século passado, com a invenção da máquina a va­
"
::} por e das máquinas destinadas a trabalhar o algodão. Estas inven­
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ções desencadearam, como é sabido, uma revoiução illdustrial2 que,
.' 'silnultaneamente, transformou a sociedade burguesa no seu conjun­
1
to e cuja importãncia só agora se começa a reconhecer na história
& do mundo.
::t A Inglaterra é o pals clássico desta revolução que foi tanto mais
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poderosa quanto mais silenciosamente se fez. É por isso que a In­
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&1aterra é também o país clássico para o desenvolvimento do prinei­
i{1 pal produto desta revolução: o proletariado. É só na Inglaterra que
'../.õ;. o proletariado pode ser estudado em todos os seus aspectos e relações.
:..: " Entretanto, não temos que nos preocupar com a história desta
;;f revolução, nem com a sua imensa importância para o presente e pa­
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::4 ra o futuro. É preciso reservar este estudo para um trabalho poste­
S rior, mais vasto. Provisoriamente, devemo-nos limitar a algumas in­
 formações necessárias para a compreensão dos fatos que se seguem,
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para a compreensão da situação atual dos proletários ingleses.
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". Antes da introdução das máquinas, a fiação e a tecelagem das
'", matérias-primas efetuavam-se na própria casa do trabalhador. Mu­
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lheres e crianças fiavam o fio que o homem tecia ou que elas ven­
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diam, quando o chefe de fam!lia não o trabalhava. Estas famllias
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de tecelões viviam, geralmente, no campo, próximo das cidades, e
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o que ganhavam assegurava perfeitamente a sua existência, porque
/ o mercado interm1 constituía ainda o fator decisivo da procura de
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tecidos - era quase o único mercado - e o poder esmagador da
I' concorrência que devia aparecer mais tarde, com a conquista de mer­
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'. cados estrangeiros e com a extensão do comércio, não pesavam ain­


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da sensivelmente no salário. A isto juntava-se um permanente cres.
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cimento da procura do mercado interno, paralelamente ao lento cres­ ,"
suas pequenas terras. Respeitavam o seu Squire - o proprietário ru­
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cimento da população, o que permitia ocupar a totalidade dos tra­ ral mais importante da região - como seu superior natural, J)Cdiam­
balhadores; é preciso mencionar, por outro lado, a impossibilidade l lhe conselho, submetiam-lhe as suas pequenas querelas e prestavam­
'.r lhe as honras que essas relações patriarcais comportavam. Eram pes­
de uma concorrência brutal entre os trabalhadores, devida ao isola­ . ,.

mento rural. Assim, o tecelão podia fazer, muitas vezes, economias 1Jl soas "respeitáveis" e bons pais de família; viviam segundo a moral,


e arrendar um pedaço de terra que cultivava nas horas livres, que
eram determinadas segundo sua vontade porque podia tecer quan­
't porque não tinham oeasião de viver na imoralidade, pois não havia
nas proximidades bordéis ou prostlbulos e o dono da estalagem na
:

I do e durante quanto tempo desejasse. É certo que era um pobre cam­ . qual, de tempos em tempos, acalmavam a sede, era igualmente um
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homem respeitável, e, na maior parte das vezes, um grande arrenda­
ponês e que se dedicava à agricultura com certa negligência, sem ti­ l" ,.

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rar dela um proveito real; mas, pelo menos, não era um proletário ,­
tArio que fazia questão de ter boa cerveja, boa ordem e que não gos­
.'
e tinha plantado - como dizem os ingleses - uma estaca no solo '\
I,
tava de se deitar tarde. Tinham os filhos durante todo o dia em casa
da sua pátria, tinha uma habitação e na escala social situava-se no e inculcavam-lhes a obediência e o temor de Deus; estas relações fa­
I i?
I escalão acima do trabalhador inglês de hoje. J miliares patriarcais subsistiam até os filhos casarem; os jovens cres­
I!li
,

I Assim, os trabalhadores viviam uma existência em geral supor­ ciam com os seus amigos de infância numa intimidade e numa sim­

I tável e levavam uma vida honesta e tranqüila, em tudo piedosa e hon­ plicidade idílicas até o casamento, e mesmo que as relações sexuais
,.

rada; a sua situação material era bem melhor que a dos seus suces­ " antes do casamento fossem algo quase corrente, s6 se estabeleciam
sores; não tinham necessidade de se matarem de trabalhar, não fa­ quando a obrigação moral do casamento era reconhecida pelos dois
ziam mais do que desejavam e, no entanto, ganhavam para as suas
necessidades e tinham tempo livre para um trabalho são no jardim


lados e núpcias subseqüentes restabeleciam a ordem. Em resumo, os
trabalhadores industriais ingleses desta época viviam e pensavam co­
,I
ou no campo, trabalho que era para eles uma forma de descanso,
'II mo se vive ainda em certas regiões da Alemanha; contando apenas
e podiam, por outro lado, participar nas distrações e jogos dos seus "I eonsigo mesmos, à margem, sem atividade intelectual e levando uma
vizinhos; e todos esses jogos, malha, bola, ete., eontribufam para a existência sem sobressaltos. Raramente sabiam ler e muito menos es­

manutenção da sua saúde e para o seu desenvolvimento físico. crever, iam regularmente à igreja, não faziam polítiea, não conspira­
Eram, na sua maior parte, pessoas vigorosas e bem constituí­ vam, não pensavam, gostavam dos exercícios físicos, escutavam a lei..
das, cuja constituição física era muito pouco, ou nada diferente da tura da Blblia com um recolhimento tradicional, e estavam bem de
dos camponeses, seus vizinhos. As crianças cresciam no bom ar do acordo, humildes e sem nccessidades, com as classes sociais mais ele­
campo e, se tinham que ajudar os seus pais no trabalho, faziam-no vadas. Mas, por outro lado, estavam intelectualmente mortos; s6 vi­
ocasionalmente, e nunea durante um dia de trabalho de oito ou do­ viam para os seus interesses privados, mesquinhos, para o tear e pa­
ze horas. 'ra o jardim, e ignoravam tudo do forte movimento que, no exterior,
O caráter moral e intelectual desta elasse adivinha-se facilmente. sacudia a humnnidadc. Sentiam-se à vontade na sua pacl!ica exis­
Longe das cidades, onde nunca entravam, porque entregavam o fio tência vegctativa e, sem a revolução industrial, nunca teriam aban­
e O tecido a agentes itinerantes mediante pagamento de um salário, donado esta existência de um romantismo patriarcal, mas apesar de
de modo que velhos moradores das proximidades das cidades nunca tudo indigna de UW\ ser humano. "
tinham ido lá, até o momento em que as máquinas os despojaram  De fato, não eram homens mas simples máquinas, trabalhan­

,
do seu ganha-pão e em que foram coagidos a procurar trabalho na do ao serviço dos poucos aristocratas que tinham até então dirigido
cidade. O seu nível intelectual e moral era o da gente do campo, às u história; a revolução industrial levou simplesmente esta situação
quais, na maior parte das vezes, estavam diretamente ligados pelas até o seu fim hígico, reduzindo inteiramellte os trabalhadores ao pa-

12 13
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pel de simples máquinas, arrebatando-lhes os últimos vestígios de I
slvel, O fio era fiado c tecido sob o mesmo teta. Agora, visto que
atividade independente, mas incitando-os, precisamente por essa ra­ a Jenny, bem' como o tear, exigiam uma mão vigorosa, os homens
"
!
zão, a pensar cm exigir uma posição digna de seres humanos. Se na tambm se puseram a fiar e famllias inteiras passaram a viver disso,
França isso tinha sido fcito pela política, na Inglaterra foi a indús­ enquanto que outras, forçadas a porem de lado a arcaica e caduca
tria - c de uma mancira geral a evolução da sociedade burguesa ­ roda de fiar, tiveram que viver somente dos salários do chefe de fa­
que arrastou no turbilhão da história as últimas classes mergulha­ mma, quando não possuíam meios para comprar uma Jenny. Foi as­
das na apatia no que respeita aos interesses universais da humanidade. sím que começou a divisão do trabalho entre fiação e teeclagem, que
A primeira invenção que transformou profundamente a situa­ em seguida íria ser levada ao extremo na indústria.
ção dos trabalhadores ingleses de então foi a Jenny" inventada em \. Ao mesmo tempo que o proletariado industrial se desenvolvia
1764 por um tecelão, James Hargreaves, de StandhillS, perto de assim com esta primeira máquina, todavia muito imperfeita, ela deu
Blaekburn, no Lancashire do norte. Esta máquina foi o antepassado r:
I,
igualmente origem a um proletariado rural. At então havia um gran­
rudimentar da Mult!', que devia suceder-lhe mais tarde, funcionava i ; de número de pequenos proprietários rurais, a quem chamavam os
a mão, mas em vez de uma agulha - como na roda vulgar de fiar l: yeomen, os quais tinham vegetado na mesma tranqüilidade e na mes­
I.
a mão - possula dezesscis ou dezoito, movidas por um só trabalha­ l'
ma nulidade intelectual que os seus vizinhos, os cultivadores tece­
dor. Foi assim que foi possível fornecer mais fio que anteriormente; lões. Cultivavam o seu pequeno pedaço de terra exatamente com a
, enquanto antigamente um tecelão, que ocupava constantemente três
fiandeiras, não tinha nunca fio suficiente, c tinha muitas vezes que I;: mesma negligência com que o tinham feito os seus pais c opunham­
se a qualqucr inovação cam a teimosia peculiar a estes seres, escra­
esperar, agora havia mais fio do que os trabalhadores existentes po­ I,'
" vos do hábito, que não mudam absolutamente nada no decurso das
diam tecer. A procura de tecidos que, de resto, estava aumentando gerações. Entre eles, havia também muitos pequenos arrendatários,
desenvolveu-se ainda mais devido ao baixo preço destes produtos,
eonsequência da redução dos custos de produção graças à nova má­
li
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nào no scntido atual do termo, mas pessoas que tinham recebido dos
seus pais e av6s um pequeno pedaço de terra, fosse a titulo de renda
quina; houve necessidade de mais tecclões e o salário do tecelão au­ \
hereditária, fosse em virtude de um antigo costume, e que nele se
mentou. E, visto que desde então o tecelão podia ganhar mais tra­ tinham estabelecido tão solidamente como se se tratasse de proprie­
balhando no seu tear, ele abandonou lentamente as suas ocupações
agrícolas e consagrou-se totalmente à tecclagem. Nesta poea, uma
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dade sua. Ora, como os operários industriais da agricultura aban­
donavam a agrieultura, encontraram-se disponíveis grande número

famllia de 4 adultos e 2 crianças, no trabalho de bobinagem, chega­
va a ganhar, em 48 horas de trabalho cotidiano, 4 libras esterlinas
f de terrenos c foi ai que se instalou a nova classe de grandes arrenda­
tários, os quais possuíam cinqüenta, cem, duzentos e mesmo mais
por Semana - 28 talers na cotação prussiana atual -, e muitas ve­ I acres. Eram os tenallts-at-will, quer di:z;er, rendeiros cujo contrato po­
zes mais, quando os neg6cios corriam bem e o trabalho urgia; fre­
qüentemente acontecia de um único tecelão ganhar no seu ofício 2
t dia ser anulado todos os anos, e que souberam aumentar a produ­
ção das terras com melhores mtodos agríeolas e uma exploração
\
libras por semana. Foi assim que, pouco a pouco, a classe dos tece:  em maior escala. Podiam vender os seus produtos mais baratos do
Iões agrícolas desapareceu completamente, dissolvendo-se na nova 'i que o pequeno yeomen e este nào tinha outra solução - visto que
classe dos que eram exclusivamente tecelões, que s6 viviam do seu a sua terra já não alimentava - senão vendê-Ia e adquirir uma
salário c não possuíam propriedades, não tendo sequer a ilusão de , JenllY ou um tear, ou empregar-se como jardineiro, proletário agrí­
,

propriedade que O trabalho agrícola confere. Tornaram-se pois pro­ • cola, em casa de um grande arrendatário. A sua indolência hereditá­
letários (working men). A isto veio ainda juntar-se a destruição da  ria c a maneira negligente como valorizava a sua terra, defeitos que
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velha relação entre fiadores e tecelões. At então, na medida do pos- ;( tinha herdado dos antepassados, e que não linha podido ultrapas-
t;

14 15
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sar, não lhe deixavam outra solução, desde que se viu obrigado a en­ temente aperfeiçoadas, foram decisivas para a vitória do trabalho
trar cm concorrência com pessoas que cultivavam a propriedade se­ I
I.
mecânico sobre o trabalho manual nos principais setores da indus­
tria inglesa, e toda a hist6ria recente desta mostra-nos como os tra­
gundo princípios mais racionais c com todas as vantagens que con­
ferem a grande cultura c o investimento de capitais com vistas à me- balhadores manuais foram sucessivamente desalojados de todas as
lhoria da terra. .
".
suas posições pelas máquinas, As conseqüêneias disso foram, por
Entretanto, a evolução da industria não parou. Alguns capita­ m lado, uma queda rápida dos preços de todos os produtos manu­
listas começaram a instalar Jennys cm grandes edifícios c a acioná­ ,.
faturados, o desenvolvimento do comércio c da industria, a conquista
las por meio deforça hidráulica, o que lhes permitiu reduzir o nú­ í:, de quase todos os mercados estrangeiros não protegidos, o rápido
mero de operários e vender as fibras mais baratas que os fiandeiros crescimento dos capitais e da riqueza nacinal; por outro lado, o eres­
isolados, que somente acionavam as suas máquinas a mão. A Jenny cimenlo ainda mais rápido do proletariado, a destruição de toda a
foi sucessivamente aperfeiçoada, dc tal modo que as máquinas sc propriedade, de toda a segurança de emprego para a classe operária,
tornavam continuamente antiquadas c precisavam ser transforma­ .•
desmoralização, agitação política, c lodos estes fatos que tanto re­
das, ou mesmo abandonadas; c se o capitalista podia subsistir gra­ ": pugnam aos ingleses proprietários e que iremos examinar nas pági­
ças à utilização da força hidráulica, mesmo com máquinas bastante nas seguintes. Vimos anteriormente as modificações que uma s6 má­
antiquadas, a longo prazo, o fíandeiro isolado não podia. ;{
quina, tão primária como a Jenny, provocou nas relações sociais das
Estes fatos marcaram já o aparecimento do sistema de manu­ ,
classes inferiores; desde então, já não nos poderá espantar o que po­
:;
fatura; cste conheceu nova expansão graças à Spinning Throstle, in­ de fazer um sistema de maquinaria automática complexo c aperfei­
ventada por Richard Arkwright7, um barbeiro de Preston, no Lan­ çoado que recebe de n6s a matéria bruta e nos devolve as fazendas
eashire setentrional, cm 1767. Esta máquina, que cm alemão se eha­ totalmente tecidas.
ma vulgarmente Kettenstuhl' é, eom a máquina a vapor, a invenção \ Entretanto, sigamos mais de perto o desenvolvimento' da indus­
mais importante do séeulo XVIII. Foi concebida desde o inicio para t tria inglesa 10, começando pelo seu ramo principal: a indústria do 01­
.'•
ser ac/onada mecanicamente c baseava-se em princípios completa­ " godâo. De 1771 a 1775, importava-se cm média menos de cinco mi.
mente novos. Associando as particularidades da Jenny c do tear de lhões de libras de algodão bruto por ano; cm 1841, 528 milhões, e-a
corrente, Samuel Crompton de Firwood (Lancashire) criou a Mule, li: importação cm 1844 atingira pelo menos 600 milhões. Em 1834 a In­
" glaterra exportou 556 milhões de jardas de tecidos de algodão, 76,5
c como Arkwright inventou na mesma época as máquinas de cardar
e transfiar, a manufatura tornou-sc o unico sistema que existia para '. milhões de libras de fio de algodão e aproximadamente 1.200.000 li.
a fiação do algodão. Pouco a pouco estas máquinas foram sendo ;ti bras esterlinas de artigos de algodão.
adaptadas à fiação de lã e, mais tarde, à de linho (na 1  década deste ; Neste mesmo ano, a indústria algodoeira dispunha de mais de
século), graças a algumas modificações pouco importantes e, deslc (; 8 milhões de agulhas, 110.000 teares mecânicos c 250.000 teares ma­
modo, também nesles selores pôdc ser rcduzido o lrabalho manual.  nuais, sem contar com as agulhas dos teares de correntes, e, segundo
,
Mas, isto não foi tudo; nos ui limos anos do século passado, o Dr. os cálculos de MacCulloeh, este setor fazia viver direta ou indireta.
Cartwright, um pastor do campo, inventava o tear mecânico, c cm
1804 tinha-o aperfciçoado a tal ponlo quc podia concorrcr com su­
""• ,
mente cerca de um milhão c meio de seres humanos nos 3 reinos",
dos quais s6 220.000 trabalhavam cm fábricas; a força utilizada por
ccsso com os tecclões manuais; c a importãncia dc todas as máqui­ estas fábricas estiufava.se cm 33.000 CV de força motriz, acionadas
nas duplicou graças à máquina a vapor de James Watt, invenlada por vapor, c 11.000 CV de força hidráulica. Atualmente estes núme­

*
cm p64 c utilizada a partir de 1785 para acionar as máquinas de fiar. ros estão ultrapassados, c podemos admitir tranqüilamente que cm
\ Estas invcnções, que a partir de então ainda foram permancn- 1845 a potência c o numero de máquinas, bem como o numero de

16 17
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operários, ultrapassam em metade os de 1834. O centro principal desta prosperidade até então desconhecida.
indústria é o Lancashire, donde, de resto, é originária; ela revolucio­
r.
A mesma atividade manifestou-se na manufatura da lã. Este já
nou completamente este condado, transformando este pântano som­ [ era O ramo principal da indústria inglesa, mas as quantidades produ­
brio e mal cultivado numa região animada e laboriosa, duplicou a zidas no curso destes anos não são nada em comparação com o que
sua população em 80 anos e fez brotar do solo, como que por en­ se fabrica atualmentc. Em 1872, toda a produção de lã (tosquia) dos
canto, cidades gigantescas como Liverpool e Manchester que, jun­ três anos precedentes continuava em estado bruto, por falta de ope­
tas, contam 700.000 habitantes e as suas vizinhas Bolton (60.000 h.), rários, c assim tcria ficado necessariamente se as novas invenções me­
Rochdale (75.000 h.), Oldham (50.000 h.), Preston (60.000 h.), Ash­ cânicas não tivessem vindo em seu auxUio e não a tivessem fiado."
ton e Sla1ybridge (40.000 h.), bem como um grande número de ou­ A adaptação destas máquinas à fiação de lã fez-se com o maior êxito.
tras cidades industriais. O rápido desenvolvimento que constatamos nos distritos algodoci­
A história do Lancashire meridional conhece os maiores mila­ ros afetou dai por diante os distritos lanlgeros. Em 1738, no West Ri­
gres dos tempos modernos, embora ninguém os mencione, e todos ding de Yorkshire, fabricavam-se 75.000 peças. de pano, em 1817
estes milagres foram realizados pela indústria algodocira. Por outro 450.000ll, e o desenvolvimento da indústria lanlgera foi tal que em
lado, Glasgow constitui um segundo centro para o distrito algodoei­ 1834 se exportaram mais de 450.000 peças de pano que em 1825. Em
ro da Escócia, o Lanarkshire e o Refrcwshire, e também aqui a popu­ 1801, tratavam-se 108 milhões de libras dcIã (das quais 7 milhões im­
lação da cidade central passou, desde a instalação desta indústria, de portadas), em 1835, 180 milhões de libras (das quais 42 milhões imo
30.000 para 300.000 habitantes.12 A fabricação de artigos de algodão portadas). O principal distrito desta indústria é o West Riding de
em Nottingham e Derby também recebeu um novo impulso devido Yorkshire onde, principalmente em Bradford, a lã inglesa de fibras
à baixa do preço do fio e um segundo devido ao melhoramento da compridas é transformada em lã de tricotar, enquanto nas outras ci­
máquina de tricotar, que permite fabricar duas meias ao mesmo tem­ dades, Lceds, Halifax, Huddersfield, etc., a lã de fibras curtas é trans­
po com um só tear. O fabrico de rendas tornou-se igualmente, desde formada em fios retorcidos e utilizada na tecelagem. Vem depois a
1777, data em que foi inventada a máquina de fazer a malha aperta­ parte vizinha do Lancashire, a região de Rochdale, onde para além
da, um ramo industrial importante; pouco depois, Lindlcy inventou da preparação do algodão se produz muita flanela, e o Oeste da In­
a máquina de Point-net e em 1809 Heathcote inventou a máquina de glaterra que fabrica os mais finos tecidos. Thmbém aí O crescimento
Bobin-netlJ, que simplificaram infinitamente o fabrico de rendas e da população é notável:
aumentaram paralelamente o seu consumo, devido à diminuição dos
custos; de tal modo que pelo menos cerca de 200.000 pessoas vivem Em 1801 Em 1831
atualmente deste fabrico. Os seus centros mais importantes são Not­ ,29.000 hab. 77.000 hab.
Bradford
tingham, Lcicester e o oeste da Inglaterra (Wiltshirc, Devonshire, etc.). Halifax 63.000 " 110.000. "
Os ramos dependentes da indústria algodoeira conheceram uma H uddersfield 15.000 " 34.000 "
evolução análoga: o branqueamento, a tinturaria e a impressão. O 53.000 " 123.000 "
Leeds
branqueamento. graças à utilização do cloro em vez do. oxigénio no O conjunto do West Riding 564.000 " 980.000 "
branqueamento qulmico, a tinturaria e a impressão, graças ao rápido
desenvolvimento da química, e esta última graças ainda, a uma série •
população que, desde 1831, deve ter crescido pelo menos 20 a 25010.
de invenções mecânicas extremamente brilhantes, conheceram, aliás, A fiação de lã ocupava, em 1835, no Reino Unido, 1.313 fábricas
um incremento que - para além do desenvolvimento destes ramos com 71.300 operários, os quais, de resto, não representavam senão
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devido ao crescimento da indústria algodoeira - lhes assegurou uma i uma pequena parte da massa que vivia di reta ou indiretamente do
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trabalho de lã, excluindo a quase totalidade dos tecelões.  torcer a supremacia sobre as instalações desajeitadas dos seus con­
Os progressos da indústria do linho foram mais lentos, porque  correntes. Em 1835, o Império Britânico possuía 263 fábricas de tor­
a natureza da matéria bruta tornava muito diflcil a utilização da má­ ,
cer, com 30.000 operários, a maior parte dos quais instalados no Ches­
quina de fiar; é verdade que já no decurso dos últimos anos do sécu­ :\
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hire (Maeelesfiel, Congelton e arredores), em Manchester e no So­
lo passado tinham sido efetuadas na Escócia experiências neste sen­ mersetshire.18 Ném disso, existiam ainda muitas fábricas para o tra­
tido, mas só em 18100 francês Girard conseguiu aperfeiçoar um mé­ ;
tamento de resíduos de seda dos casulos, que serve para fazer um
todo prático de fiação do linho e só se atribuiu às suas máquinas a i artigo especial (spunsilk)19 com o qual os ingleses fornecem as tece­
importância que mereciam graças aos aperfeiçoamentos que lhe fo­ lagens de Paris e Lyon. A tecelagem da seda assim torcida e fiada
I
ram feitos na Inglaterra e ao seu emprego em grande escala, no solo '{ efetua-se principalmente na Escócia (Paisley, etc.) e em Londres (Spi­
inglês, em Leeds, Dundee e Belfast.lo Mas então a indústria de li­ talfields), mas também em Manchester e outros locais.
nho inglesa conheceu um rápido desenvolvimento. Em 1814,
importaram-se, em Dundee, 3.000 toneladas17 de linho, em 1835,
Ir. Contudo, o gigantesco desenvolvimento da indústria inglesa des­
de 1760 não se limitou à produção de tecidos para vestuário. Uma
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cerca de 19.000 toneladas de linho e 3.400 de cânhamo. A exporta­ vez dado o impulso inicial expandiu-se a todos os ramos da atividade
ção de linho irlandês para a Grã-Bretanha passou de 32 milhões de industrial, e uma série de invenções em conexão com os setores já
jardas (em 1800) para 53 milhões (em 1825), das quais grande parte mencionados, duplicaram de importância por serem contemporâneos
foi reexportada; a exportação de pano inglês e escocês passou de 24 do desenvolvimento geral. Mas, ao mesmo tempo, após ter sido de­
milhões de jardas (em 1820) para 51 milhões (em 1833). O número monstrada a importância incalculável da utilização da força mecâni­
de fiações de linho era, em 1835, de 347, empregando 33.000 operá­ ca na indústria, buscou-se meios para sua utilização em todos os se­
rios, metade das quais se situavam na Escócia meridional, mais de tores e para explorá-la2o em beneflcio dos diversos inventores e in­
60 no West Riding de Yorkshire (Leeds e arredores), 25 em Belfast, . dustriais; e, por outro lado, a procura de máquinas, combustíveis
na Irlanda, e o resto no Dorsetshire e no Laneashire. A tecelagem e material de transformação redobrou a atividade de uma multidão
pratica-se na Escócia meridional e em diversos pontos da Inglaterra,
de operários e de oflcios. Só com o emprego da máquina a vapor se
mas sobretudo na Irlanda. começa a dar importância às vastas jazidas de carvão da Inglaterra.
Os ingleses empreenderam com igual êxito a preparação da se­
Afabricação de máquinas se inicia nesta época, bem como um novo
da. Recebiam da Europa meridional e da Ásia matérias-primas já to­ interesse pelas minas de ferro, que forneeiam a matéria.
talmente fiadas, e o trabalho essencial consistia em dobar e tecer os
prima para as máquinas; o creseimento do consumo de lã desenvol­
fios finos (tramage). veu a criação de carneiros na Inglaterra, e o aumento da importação
Até 1824, as taxas alfandegárias que atingiam pesadamente a
da lã, do linho e da seda, teve coo efeito o crescimento da frota
seda bruta (4shillings por libra) prejudicaram seriamente a indústria comercial inglesa. Foi principalmente a produção do ferro que cres.
inglesa da seda, que SÓ dispunha, graças a direitos protetores, do mer­ ceu. As montanhas inglesas, ricas em ferro, tinham sido pouco ex­
cado inglês e do das suas colônias. Foi nesse momento que os direi­ ploradas até então; o mineral de ferro era sempre fundido com car­
tos de importação foram reduzidos a um penny e imediatamente o vão de madeira que - em virtude da melhoria daS culturas e da des.
número de fábricas aumentou notavelmente; num ano o número de truição das f1ores -:- se tornava cada vez mais caro e mais escasso;
dobadouras passou de 780.000 para 1.180.000 e se bem que a crise
foi só no século precedente que se começou a utilizar o carvão mine­
comercial de 1825 paralisasse por um momento este ramo industrial,
ral (coque) para este fim, e, a partir de 1780, descobriu-se um novo
em 1827 já se fabricava mais do que nunca, porque o talento mecâ­ método para transformar ferro fundido com o coque até então utili.
nico e a experiência dos ingleses asseguravam às suas máquinas de
zado somente sob a forma de ferro fundido, em ferro igualmente uti-

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li' curso dos últimos 60 anos. Atualmente, todas as jazidas carbonife­


lizável para a forja. A este método, que consiste em extrair o carvão :\J
misturado com ferro no decurso da fusão, os ingleses dão o nome '.e ras da Inglaterra e da Escócia são exploradas, e as minas de Northum­
de puddling e, graças a ele, abriu-se um campo intciramente novO
à produção siderúrgica inglesa. Construiram-sc altos-fornos 50 ve­
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berland c de Durham.produzem só por si mais de 5 milhões de tone.
!adas para exportação; ocupam 40 a 50 mil operários. Segundo a Dur­
zes maiores do que anteriormente, simplificou-se a fusão do mine­ ham ChroniC/e'-3, havia nestes dois condados:
ral com a ajuda de foles de ar quente, e assim foi possível produzir \
ferro a um preço tão vantajoso que uma grande quantidade de obje­
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" 1" em 1753 ..................... 14 minas de carvão16
tos, outrora fabricados em pedra ou madeira, passou a ser fcita em
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em 1800 ..................... 40
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em 1836 ..................... 70
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ferro.
Em 1788, Thomas Paine, o célebre democrata, construiu no ! em 1843 ..................... 130
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Yorkshire a primeira ponte de ferro2l, que foi seguida por grande '.
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<l; cm atividade. De resto, atualmente, todas as minas são exploradas
número de outras, de tal modo que atualmente quase todas as pon­
tes, principalmente sobre as vias férreas, são construídas em ferro W muito mais ativamente. Do mesmo modo, explorlilll-se mais ativa­
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fundido e em Londres até existe uma ponte sobre o Tãmisa, a ponte :J; mente as minas de eslanho, de cobre e de chumbo, e paralelamente
Southwark, fabricada com este material; também são de uso corren­ à extensão da fabrieação do vidro, surgiu um novo ramo da indús­
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te as colunas e os chassis para máquinas, geralmente de ferro; e des­  tria, a cerâmica, que, graças a Josiah Wedgewood, adquiriu impor­
de que se introduziram as vias férreas e a iluminação a gás novos .r".
tAncia. Este reduziu toda a fabricação de faiança a princfpios cient!­
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caminhos são abertos à produção siderúrgica na Inglaterra. Pouco "i
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ficos;melhorou o gosto do público e fundou as cerâmicas do Staf­
a pouco, os pregos e parafusos também foram sendo fabricados por '.,. , fordshire do Norte, região de oito milhas inglesas quadradas, outro­
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máquinas; Huntsman, de Sheffield, descobriu, em 1760, um méto­ .!;" ra deserto estéril, mas agora semeado de fábricas e de casas, onde
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do de fundir aço que tornava supérflua toda uma soma de trabalho vivem mais de 60,000 pessoas.
e que facilitou a fabricação de novos artigos a preços mais baixos; Tudo foi arrastado por este movimento, este turbilhão univer.
e foi só, então, graças à maior pureza de matérias disponíveis, gra­ w. A agricultura também foi atingida. E não s6 a propriedade da
ças também ao aperfeiçoamento da maquinaria, às novas máquinas, terra passou para as mãos de outros possuidores e cultivadores, tal
e a uma divisão maís minuciosa do trabalho, que a fabricação de como vimos aeima, como também foi tratada de modo diferente. Os
produtos metalúrgicos se tornou importante na Inglaterra. A popu­ grandes fazendeiros empregaram o capital para melhorar o solo, aba­
lação de Birmingham passou de 73.000 habitantes (em 1801) para leram pequenos muros de separações inúteis, drenaram, adubaram
200.000 (em 1844) e a de Sheffield de 46.000 (em 1801) para 110.000 I terra, utilizaram melhores instrumentos; introduziram uma alter.
(em 1844) e o consumo de carvão desta última cidade, só por si, atin­ nAncia sistemática nas culturas (croping by rolalion). Também eles
giu, em 1836,515.000 toneladas.ll Em 1805, exportaram-se 4.300 to­ IC beneficiaram do progresso das ciências. Sir Humphrey Davy apli.
neladas de produtos siderúrgicos e 4.600 toneladas de ferro bruto; cou a qulmica à agricultura com êxito, e o desenvolvimento da me.
em 1834, 16.200 toneladas de produtos metalúrgicos e 107.000 tone­ cAnica trouxe.lhes ul11pSem-número de vantagens. De resto, o cresci.
ladas de ferro bruto; e a extração de ferro que, em 1740, no total, mento da população provocou umd tal alta na procura de produtos
não passava de 17.000 toneladas, atingiu em 1834 cerca de 700.000 :$ .' agrícolas que, de 1760 a 1836, 6.840.540 jeiras inglesas' de terra es.
toneladas.lJ A fusão do ferro bruto consome só por si mais de 3 mi­ ,,"; '!éreis foram desbravadasl7; e apesar de tudo, a Inglaterra passou de
lhões de toneladas de carvão por anol-l, e é diflcil imaginar a im­ :x . pals exportador de trigo a pais importador.
portância que de um modo geral adquiriram as minas de carvão no de- A mesma atividade se verificou no estabelecimento de vias de

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comunicação. De 1818 a 1829, construíram-se na Inglatcrra e no Pals ,f }/-'''''. A construço de es.tradas de ferro é de dat recente. A primeira
de Galcs mil milhas inglcsas de cstradas, com uma largura legal dc I. ',";', YIa unportante fOl a de Liverpool a Manchester (maugurada em 1830);
60 pés., e quase todas as antigas foram renovadas segundo o novo , 'l:hlesde então, todas as grandes cidades foram ligadas por vias férreas.
princlpio de Mac Adam. Na Escócia, os serviços de obras públicas '.'f ".;;';. Londres a Southampton, Brighton, Dover, Colchester, Cambridge,
construíram, mais ou menos a partir de 1803, novccentas milhas de • ',""':.&eter (via Bristol) e Dirmingham; Birmingham a Gloucester, Liver­
estradas e mais de mil pontes, o que permitiu, de repente, põr as po­ :. ;'V pool, Lancastcr (via Newton e Wigan e via Manchester e Bolton) e,
pulações das montanhas em contato com a civilização. Até então os ;/fi.' ':'.:.' além disso, a Leeds (via Manchester e HaJifax e via Leicester, Derby
montanheses tinham sido, na sua maior parte, caçadores clandesti­  };. e Sheffield); Leeds a HuI! e Newcastle (via York). Acrescentem-se
nos e contrabandistas; tornaram-se agricultores e artesãos laborio­ ,P.;... ,' .. numerosas vias de menor importãncia, em construção e em projeto,
sos e, embora se tenham criado escolas gaélicas para conservar a IIn­ ;'. . que em breve permitirão ir de Edimburgo a Londres num só dia.
gua, os costumes e a IIngua galo-céltica estão em vias de rápido desa­ 'Jil' _'to. Tal como tinha revolucionado as comunicações em terra, tam-
parecimento em face da aproximação da civilização inglesa. O mes­ :'. . bém o vapor conferiu à navegação um novo prestígio. O primeiro
mo se passa eom a Irlanda. Entre os condados de Cork, Limerick I', I" barco a vapor navegou em 1807 sobre o Hudson, na América do Nor-
e Kerry, estendia-se uma região desértica, sem caminhos praticávcis,  le; no Império Britãnico, o primeiro foi lançado em 1811, no Clyde;
que em virtude da sua inacessibilidade era o refúgio de todos os cri­ . desde esta data, mais de 600 foram construídos na Inglaterra2', e
minosos e a principal cidadela da nacionalidade celto-irlandesa no ;si mais de 500 estavam, em 1836, em atividade nos portos britânicos.
sul da ilha. Sulcaram-na de estradas, permitindo assim que a civili­ .,{ . "I, Tal é, resumidamente, a história da indústria inglesa nos últi-
zação penetrasse mesmo nessa região selvagem. {f.' mos 60 anos, uma história que não tem equivaJente nos anais da hu-
O conjunto do Império Britãnico, mas sobretudo a Inglaterra, '}f manidade. Há 60 ou 80 anos, a Inglaterra era um país como todos
que, há 60 anos, possuía caminhos tão ruins como a França e a Ale­ fi. 05 outros, com pequenas cidades, uma indústria pouco importante
manha dessa época, está hoje coberta por uma rede de belas estra­ 1"i:{" e elementar, uma população rural dispersa, mas relativamente im- ,
das; e estas são também, como quase tudo na Inglaterra, obra da in­ ,'Ii . , . portante; agora, é um país ímpar, com uma capital de dois milhões
dústria privada, visto que o Estado pouco ou nada fez neste domínio. , e meio de habitantesl., colossais cidades industriais, uma indústria
Antes de 1755, a Inglaterra quase não possuía canais. Em 1755, '. '.' que alimenta o mundo inteiro e que fabrica quase tudo com a ajuda
no Laneashire, construiu-se o canal de Sankey Broock a St. ';:" das máquinas mais completas; com uma população densa,laboriosa
Helens28; e em 1759, James Brindley construiu o primeiro canal im­ :'(".::'e'IDteligente, da qual 213 trabalha na indústriall, e composta por
portante, o do Duque de Bridgewater que vai de Manehester e das ,L)i: c1wes completamente diferentes das de outrora; que constitui, de
minas desta região à foz do Mersey e que, em Barton, passa por meio ?..\i/ralo; uma nação completamente diferente, com outros costumes e
de um aqueduto por cima do rio Irwel!. A rede de canais ingleses, '.í?lICtCSsidades diferentes das do passado. A revolução industrial re­
à qual Brindley foi o primeiro a dar importãncia, data desta époea. ';:;vate, para a Inglaterra, o significado que tem para a França a revo­
Desde então, construlram-se canais em todas as direções e tornaram-se ;::l.Jução I1011tica c para a Alemanha a revolução filosófica; e a distância
navegáveis os rios. Só na Inglaterra contam-se 2.200 milhas de ca­ ;,\ique separa a Inglaterrde 1760 da de 1855 é pelo menos tão grande
nais e 1.800 milhas de rios navegáveis; na Escóeia construiu-se o ca­ ":jcomo a que separa a França do ancien régime32 da da revolução de
nal Caledõnio, que atravessa o pals de lado a lado, e também na Ir­ 'Ih;:juoho. Contudo, o fruto mais importante desta revolução industrial
landa se construfram diversos canais. Estas instalações também são, ';'}ol o proletariado inglês.
taJ como as vias férreas e as estradas, quase todas obra de particula- . ,,(Í' ..í'" Vimos, mais acima, que o proletariado nasceu da introdução
res e de companhias privadas. à:\. da maquinaria. A rápida expansão da indústria exigia braços; por
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9. Foi, pois, desta mancira que foi reunida a imensa massa de ope­
conseguinte, os salários subiram e exércitos compactos de trabalha­
dores vindos das regiões agrícolas emigraram para as cidades. A po­ 1
rários que ocupa'atualmente todo o Império Britânico, e cuja situa.
pulação cresceu rapidamente c quase todo o crescimento vcio da classe :í ção social se impõe cada vez mais à atenção do mundo civilizado.
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dos proletários. A situação da classe trabalhadora, isto é, a situação da imensa
Por outro lado, só no principio do séc. XVIII reinou uma certa maioria do povo, coloca a questão: o que vai acontecer a estes mi­
ordem na Irlanda; também ai a população, mais do que dizimada lhões de seres que nada possuem, que nada consomem hoje o que
pela barbárie inglesa devido às perturbações anteriores, cresceu ra­ ganharam ontem, cujas descobertas c trabalho fizeram a grandeza
pidamente, sobretudo desde que o desenvolvimento industrial come­ da Inglaterra, que cada dia se tornam mais conscientes da sua força
çou a atrair para a Inglaterra uma multidão de irlandeses. Foi assim e exigem mais imperiosamente a sua parte das vantagens que pro­
que nasceram as grandes cidades industriais c comerciais do Império porcionam às instituições sociais? - esta pergunta tornou-se desde
Britânico, onde pelo menos 3/4 da população fazem parte da classe o Reform Bi/PJ a questão nacional. Ela é o denominador comum de
operária e onde a pequena burguesia se compõe de comerciantes e todo os debates parlamentares com alguma importância c embora
de muito poucos artesãos. Ao adquirir importância, a grande indús­ a classe média inglesa ainda não queira confessá-lo, embora procure
tria transformou os utensílios cm máquinas, as oficinas cm fábricas iludir este importante problema c fazer passar os seus interesses par­
e, desse modo, a classe trabalhadora média em proletariado operá­ ticulares pelos verdadeiros interesses da nação, estes expedientes de
. rio, e os negociantes de outrora em industriais; assim como a classe nada lhe servem. Cada sessão parlamentar vê a classe operária ga•
média foi suplantada e a população reduzida à oposição única entre nhar terreno c os interesses da classe média perderem importância,
capitalistas e operários, o mesmo se passou fora do setor industrial, e se bem que a classe média seja a principal ou mesmo a única potên­
no sentido estrito do termo com os artesãos c mesmo com o comér­ cia no parlamento, a última sessão de 1844 não foi senão um longo
cio; aos mestres e companheiros de outrora sucederam os grandes debate sobre as condições de vida dos operários (bill dos pobres, bill
f:
capitalistas e operários sem perspectiva de se elevarem acima da sua \ " das fábricas, bill sobre as relações entre senhores e servidores)J<, e
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classe; o artesanato industrializou-se, a divisão do trabalho operou­ Thomaz Duncombe, representante da classe operária na Câmara dos
se com rigor, e os pequenos artesãos que não podiam concorrer com Comuns, foi o grande homem desta sessão, enquanto a classe média
os grandes estabelecimentos foram atirados para as fileiras da classe liberal com a sua moção sobre a supressão das leis sobre os cereais,
proletária. Mas, ao mesmo tempo, a supressão deste artesanato, o e a classe média radical com a sua proposta de recusar os impostos,
aniquilamento da pequena burguesia,retiraram ao operário qualquer tiveram um papel lamentável. Até as discussões sobre a Irlanda não
possibilidade de se transformar a si mesmo cm burguês. Até então foram a fundo senão nos debates sobre a situação do proletariado
ele tivera sempre a perspectiva de poder instalar-se como mestre cm lo."
Irlandês e sobre os meios de melhorá-la. Mas, já é tempo de a classe
qualquer parte, e talvez contratar companheiros; mas agora que os ,.
média inglesa fazer concessões aos trabalhadores que já não pedem,
. próprios mestres foram despojados pelos industriais, que o inicio de ( mas ameaçam c exigem, porque cm breve pode ser tarde demais.
uma exploração autônoma necessita de enormes eawtais, só agora Mas a classe média inglesa e, sobretudo, a classe industrial que
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é que o proletariado se tornou realmente uma classe estável da popu­ se enriquece diretamente com a miséria dos trabalhadores, não quer
lação enquanto antes não era muitas vezes senão uma transição para saber desta miséria. Elf, que se sente forte, representativa da nação,
um acesso à burguesia. Agora, quem quer que nasça operário não tem vergonha de desnudar, aos olhos do mundo, esta chaga da ln.
tem outra perspectiva senão ficar toda a vida um proletário. Agora, glaterra; ela não quer confessar que se os operários são miseráveis
portanto - pela primeira vez -, o proletariado estava cm condi­ é ela, a classe industrial possuidora, que deveria arcar com a respon­
ções de agir autonomamente. sabilidade moral dessa miséria. Da! a expressão irônica que os ingle-

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ses cultos assumem - e não só eles, quer dizer, a classe mMia que " , lI.Ihesu, mas cm 1843-44 nl0 existiam (onles melhores do que IS que cu uliUzei. (F.E.).
U MaC<:ulloch: A O(cl/ollory ofCommure (ed. de 1840. Vol. I, p. 444) indica 1,21 1,4 mllhlo.
nós conhecemos no continente - quando se fala da situação dos ope­ Cf.llualmente Porter: op. cito vol. I, 1836, p. 229. Na ediçlo de 1847, MacCulloeh Indica 1,2
rários; daI a total ignorância de tudo o que diz respeito aos trabalha­ mUhlo (vol. I. p. 438). Enltels conserva o número primitivo.
dores em toda a classe média; daI as gafes ridlculas que esta classe • Bnael• linha lido multo Itentamente o livro de Porter tomlndo muit.. nolu. Utilizou prin­
cipalmente a ediçl0 de 18.4) para os seus artigos do VorworlS de alosto de 1844.
comete no parlamento quando se começa a discutir as condições de U £ posslvel pn:c1sar allumas das Indicaçõcs de Enaels: Carlwrilht nlo inventou o tear.
vida do proletariado; daI a indiferença sorridente a que se abando­ limilou-se a aperfeiçoA-Ia. Por oUlro lada. EnSels ignorava que quando James WaU reli.­
Irou uma patente pcla sua m'quina I vapor eua j1 rora inventada cm vlrios outros palscs.
na, num terreno minado debaixo dos seus pés e em que se pode afun­
• na França. na Alemanha. na Rússia .
dar a qualquer momento, e cujo próximo desmoronamento tem a • Unidade do sistema inglh, que equivale a 914 millmetros. (N:I'.)
inelutabilidade de uma lei matemática ou mecânica; daí este mila­ U Enacls tira esles numero. de A. Alison: Pritlcip/s of populoliotl (1840, vol. 11. p. 81)
armIondando-os. Alison rdere.se a 31.000 habitantes em 1170, 290.000 cm 1839.
gre: os ingleses ainda nâo possuem uma obra completa sobre a situa­
u Estll diferentes m1quinas slo anteriores" de Jacquart. Entre a miquina de Painl-net e a mi­
ção dos seus operários, se bem que façam investigações e andem à quina de Bobin.net h' sobretudo uma direrença de motivos. A primeira (az rendu com motivo
volta com este problema há não sei quantos anos, Mas é também is­ oblonla. a segunda com motivo heuaonal.
... P&s.sagem citada por Marli: O capilol. livro 1. I. II p. 104, Civiliz.açl0 Brlsileira. 1963.
so que explica a profunda cólera de toda a classe operária, de Lon­ U J. DisehoH: A comprchetlsillr hislory of t1r woofen olld worsld monu/ocIOrirs. 1842. vol. II,
dres a Glasgow, contra os ricos que os exploram sistematicamente aptndice., quadro IV, indica para o Yorkshire., 56.899 peças em 1738 contra 48).720 em 1117.
e os abandonam em seguida à sua sorte sem piedade, cólera que cm Enacls, que arredondou o sellundo número, cometeu provavtlmente erro ao copiar o primeiro.
M Os números aciml. como os da página precedente., foram lirados de Porter: op. cil.. pp. 196-197.
breve - quase o podemos calcular - explodirá numa revolução, à 200-201. 265.212.
vista da qual a primeira revolução francesa c o ano de 17943l serão 11 O lotl ou tonelada inglesa corresponde a 2.240 líbtl1s illll\csas (1892). Quer diz.er, quase 1.000
uma brincadeira de crianças, quilos. (F. E.) .
$I Porter: op. cil.. diz que., cm 18B, 238 U.bricas estavam cm atividade c 15 tinham (cdlldo as
portu (vaI. I, pp. 260-261). Enacls (ez a soma.
NOTAS " Fios de seda .
• EdlçAo de 1892: "utilizA-Ia".
11 Enaels corneie aqui um erro material: a ponle concebida por Paine c cujos elementos (oram
I As primeiras p4glnas desla inlroduçAo inspiram-se na obra de P. Oaskcll: Th MOfl/.vacluring fundidos cm Rotherham no Yorkshire nlo foi conslrurda neSla relilo. A primeira ponte de
Populatlon of En,/and. 1833. pp. 15.32. (erro do Yorkshire roi lanç.dl em 1779 sobrt o Scvtrn cm Coolbrookdale (C(. Conway: LVr
1 Se nlo criou. c:xpreulo, BOiei.  um do. primeiros I empres4.la (ef. Clark: Tht Idea o/ lhe of 77t. Paitl, 1892, valo I, p. 239 e Stas.). Eis o glnero de erros que W. o. Hendenon c W. H.
/ndWlr/a/ rtYolutlon. Glasgow, 19$3). Chaloner apontam na sua recente c meticulosa ediçio da obra de Engels. Enlels: Thr condi­
J O nm deste pad.ara(o resume uma pauagem de Oaskcll: op. cU.. pp. 16-17 • 11011 01 lhe work/ng claJS in Englond, O.dord, 19'8. Reliramos dai um certo numero de nolll.
• Nome da primeira mAquina de n., aJaodlo. J:llbla-se de toneladas inglesas. Ver alrAs nola 17.
J lhll-U na realidade de Stanhlll. Enacls provavelmenle cometeu CSlc erro por .dolar .oHOlra. U Nllmeros retirados de l'orter: op. rlt.. vol. I, 1836, IV.
n. de A. Urc: Tht cottOfl Ir/anlifactllrt alG. 11, 1836. p. 196. )6 Na lua edlçAo de 184), Porter precisa 4.871.000 tonel.du. Enacls consultou muito pro'YIvcl­
,
, Neste domfnlo, mu!la.lnvtnçOc.lmportlnle. tinham sido (eh .. na Inalaterrl a partir de 1738. mente um dos volumes anteriores que de filo dava 3 milhõcs de toneladas.
A Jrnny de HUlrClvtS (olapcrrciçoada de 1169 a 1171 por Richard Arkwright. cuja miquina .
JS Seman4rio publicado cm Durham desde 1820. Nos ano. 40. era de lendncla burlucsalibcral.
(oi denominada de throsllt.1! cm 1119 que Samuel Crompton di os últimos reloques l sua mu­ (N 1.826, junho de 1844, p. 2, "O monopólio de cardo").
It. Por nm, em 182', c1a.er' .ubstitulda pcla miqulnalutom4tlcI de Richard Robert chlmada JI A Durhom Chrolliclr di.c "cerca de W'.
St(f-tlClln,.mulr ou St(f-aClor. '.'
n Porter: op. cil.. vol. V, 1836. p. 110.
o R.cfere.1C ao.lrabalhadolt. que se dedicavam i. naçlo e l,ecc1agem e tambim 10 trabalho aarl. o Medida aariria que Viria. seJundo o pais. de 19 a 36 hectares. (N:I'.)
eolL Ver p. 32. (N:r.) :IS Só roi aberlo .. naveaaçl0 ent'l757.
, Ver aclml noll 6. p. 34. o Medida linear anglo-.a.xOnica que corresponde a 30,'U cm. (N.T.)
• "Ttaduçlo Ihera! "lear de correnlc". JI Porter (ala (vol. II, 1838) de 600 barcos cm circulaç.io no Reino Unido. Op. cil. p. 4.
, No orlaJna1: Vtllt'lcklulIg (Imbrlcamenlo); na ediçl0 de 1892: Enlwiklung (desenvolvimento). )O O recenseamenlo de 1841 Indicava 1.949.277 habitantes.
10 Sc.undo Porler: ('17Je) Progn!.U oflht 1I0110n Londres, 1836, vaI. I, 1838, vol. II. 1843, vol. )1 Nu ediçõcs inalesas de 1887 c 1892 ... trude ond commrrcr (industria e comircio).
III (de acordo com IndlcaçOc. oficiais) e selundo outra. rontes. a maior parte du qUlÍs Ilual­ JJ E.m franch no texto.
mente oficiai. (1892). O esboço histórico da revoluçAo Industrial acima i inc.u.to em al.uns H Eslalei, promulaada I 7 de junho de 1832, .uprimia de ralo o monopólio politico di aristocn-

28 29
,-,

t-
,

.
,

da financeira e rural. Ela abria a porta do parlamento.\ burguesia industrial. Um cerlo numero o PROLETARIADO INDUSTRIAL
de "bur,o. apodl'tCido." driuram de e.tar representados na CAmarL Mas 36 oblinham o direi­
lO de voto o. ddloru que pa,aV1lT1 mai. de la libras de impoSlo. quena burguesia e proleta­
riado. ll1alo. da rtforma. eram afa.tados do beneficio da lei eleitoral.
)4 Falaremo. ainda vtriu vcus desla sen.Jo parlamentar de 1844.
JJ I!naeb refert.se Km duvida ao lhror (189).

A ordem pela qual examinaremos as diferentes categorias do


 proletariado decorre imediatamente da história da sua gênese, que
acabamos de esboçar. Os primeiros proletários pertenciam à indús­
tria e foram diretamente engendrados por ela; os operários da in­
" dústria, os que se ocupam no trabalho com as mattrias-primas, re­
terão pois, cm primeiro lugar, a nossa atenção.
A produção do material industrial, das mattrias-primas c dos
combustlveis só se tornou verdadeiramente importante depois da re­
volução industrial e originou assim um novo proletariado industrial:
os operários das minas de carvão e das minas de metais. Em terceiro
lugar, a indústria exerceu influência sobre a agricultura e em quarto
lugar sobre a Irlanda, e t segundo esta ordem que t preeisoassinalar
o respectivo lugar das diversas frações do proletariado. Veremos igual­
mente que, talvez com exceção dos irlandeses, o nível cultural dos
diversos trabalhadores está em Intima ligação com as duas relações
com a indústria e que, por conseguinte, os operários da indústria são
os que têm mais consciência dos seus próprios interesses, os das mi­
nas já o têm menos e os da agricultura quase que ainda não O têm.
Mesmo nos operários da indústria encontraremos esta ordem, e ve.
remos como os operários das fábricas, esses filhos mais velhos da
revolução industrial, foram desde o prlnclpio att aos nossos dias o
núcleo do movimento operário e como os outros se ligaram ao mo­
vimento à medida que o seu oficio era arrastado pelo turbilhão da
indústria; assim com o exemplo da Inglaterra, vendo como o movi­
mento operário evol pari passu com o movimento industrial, com­
preenderemos a importância histórica da indústria.
Mas como atualmente quase todo o proletariado industrial foi
conquistado para este movimento, e como a situação das diversas
categorias de operários apresenta muitos pontos comuns - precisa-

30
31
sa de repugnante, que revolta a natureza humana. Estas ccntenas dc
milhar dc pessoas, de todos os Estados c todas as elasses, que sc apres­ como aqui nos aparecem na sua nudez e que já nada nos espanta,
sam c se empurram, não serão todas seres humanos possuindo as aceto que este mundo loueo ainda não tenha se desmembrado.
mcsmas qualidades e capacidades e o mesmo interesse na procura •. Dado que o capital, a propriedade direta ou indireta das sub­
da felicidade? E não deverão, enfim, procurar a felicidade eom os sistências e dos meios de produção é a arma com que se luta nesta
mesmos métodos e processos? E, contudo, estas pessoas cruzam-se :.. guerra social, é elaro como a luz que o pobre suporta todas as des­
apressadas como se nada livessem cm comum, nada a realizar jun­ vantagens de tal situação; ninguém se preocupa com ele. Lançado
 F


tas, e a única convenção que existe entre elas é o acordo tácito pelo neste turbilhão caótico, tem que se debater como puder. SJUclJUl.
qual cada um ocupa a sua direita no passeio, a fim de que as duas felicidade de encontrar trabalho, queLdizcr,',seaburguesia lhe faz
correntes da multidão que se cruzam não se constituam mutuamen­ õ-faVor de se enriquecer à sua custa, espera-o um salário que mal
te obstáculo; e, contudo, não vem ao espírito de ninguém a idéia de. chega para o manter vivo; se não encontrar trabalho, pode roubar,
conceder a outro um olhar sequer. Esta indiferença brutal, este iso­ se não temer a polícia; ou ainda morrer de fome, caso em que a polí­
lamento insensível de cada indivíduo no seio dos seus interesses par­ cia velará para que morra de forma tranqüila, e nem um pouco cho­
,

i
ticulares, são tanto mais repugnantes e chocantes quanto é maior o cante para a burguesia. .,

número destes individuas confinados neste reduzido espaço. E mes,. Durante a minha estada na Inglaterra, a causa direta da morte
mo quando sabemos que este isolamento do indivíduo, este egoísmo de 20 a 30 pessoas foi a fome, nas mais revoltantes condições, mas,
mesquinho, é em toda a parte o princípio fundamental da sociedade no momento de se proceder ao inquérito" raramente se encontrou
atual, em parte alguma ele se manifesta com uma impudêneia, uma um júri que tivesse a coragem de o tornar público. Os depoimentos
segurança tão completa como aqui, precisamente, na confusão da das testemunhas podiam ser elaros, desprovidos de qualquer equí­
grande cidade. A desagregação da humanidade em eélulas, das quais voco, que a burguesia - no seio da qual tinha sido escolhido o júri .li
cada uma tem um princípio de vida próprio e um objetivo particu­
lar, esta atomização do mundo, é aqui levada ao extremo.
j,
- encontrava sempre um pretexto que lhe permitia escapar a este
terrível veredicto: morto de fome.s A burguesia não ousa, nestes ca­ 'I
Disto resulta também que a guerra social, a guerra dc todos sos, dizer a verdade, visto que se condenaria a si mesma. Mas indire­
contra todos, é aqui decíarada abertamente. 1à1 como o amigo tamente também morreram muitas pessoas de fome - muitas mais
Slirner) I as pessoas não se 'consideram reciprocamente senão como do que diretamente - porque a falta contlnua de gêneros alimentl­
sujeitos utilizáveis; cada um explora o próximo, e o resultado é que cios suficientes provocou doenças mortais, e deste modo fez vitimas;
o forte pisa o fraco e que o pequeno número de fortes, que(dizcr, elas viram-se tão enfraquecidas que certos casos; os quais em outras
os capitalistas, se apropriam de tudo, enquanto que ao grande nú­ circunstâncias teriam evoluído favoravelmente, implicavam necessa.
mero de fraeos, aos pobres, não lhes resta senão a própria vida, e riamente graves doenças e a morte. Os o'perários ingleses chamam
nada mais.
E o que é verdade para Londres é também para Manchester,
a isto "crime social", e acusam toda a nossa sociedade de os cometer
eontinuamente. Estarão errados?
.'ji
"
,I
Birmingham e Lceds, é verdadeiro para todas as grandes cidades. Em Claro que só morrem de fome indivíduos isolados, mas em que
toda parte, indiferença bárbara, dureza egoísta, de um lado, e misé­ ',.
"
garantias se poderá base r o trabalhador para crer que a sua vez não ;I
ria indestrutível, por outro, em toda parte guerra social, a casa de chegará amanhã? Quem lhe assegura o trabalho? Quem é que lhe
cada um em estado de sítio, em toda parte pilhagem recíproca com garante que se amanhã o patrão o puser na rua, seja qual for a ra­
cobertura da lei e tudo com um cinismo e uma franqueza tais que zão, ele poderá agüentar-se, a si e à famma, até encontrar um outro
nos assustamos com as conseqüências do nosso estado social, tais "que lhe dê o pão"? Quem garante, pois, ao trabalhador que a von­
tade de trabalhar basta para arranjar emprego, que a probidade, o ,

36
37 Ii
';'. ,).
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--

J
Examinemos alguns destes bairros miseráveis. lemos primeiro
zelo; a economia e numerosas outras virtudes que a ajuizada bur­ Londres' e em Londres o célebre "Ninho dos Corvos" (Rookery).
guesia lhe recomenda. são realmente para ele o caminho da felicida­ St. Giles. que deverá ser destruido eom a eonstrução de ruas largas.
de? Ninguém. Ele sabe que hoje possui alguma coisa mas que não St. Giles fica no meio da parte mais populosa da cidade, rodeado
depende dele conservá-Ia amanhã; sabe que o menor suspiro. o me­ de ruas largas e luminosas. onde cireula o "grande mundo" londri­
nor capricho do patrão. a menor conjuntura comercial desfavorável. no - muito perto de Oxford Street. de Regent Street, de 1tafalgar
o lançarão no turbilhão desencadeado do qual escapou temporaria­ Square e do Strand. É uma massa de easas de três ou quatro anda­
mente e onde é diflcil. muitas vezes impossível. manter-se à superfl­ res. eonstruldas sem plano, com ruas tortuosas. estrei e sujas on­
cie. Sabe que se tem hoje meios de subsistência pode não os ter de reina uma animaçào tão intensa eomo nas prineipais ruas que atra­
amanhã. vessam a cidade, com a diferença que, em St. Giles. s6 se vê pessoas
Entretanto. passemos agora a um exame mais detalhado do es­ da classe operária. O mercado está instalado nas ruas: cestos de le­
tado em que a guerra social mergulha a e1asse que nada possui. Ve­ gumes e de frutos, todos naturalmente de má qualidade e dificilmente
jamos que salário a sociedade paga ao trabalhador em troca do seu

I
comestlveis. ainda reduzem a passagem. e deles emana. bem como
trabalho. sob a forma de habitação. vestuário e alimentação. que exis­ dos açougues. um eheiro repugnante. As casas são habitadas dos po­
tência é que ela assegura aos que mais contribuem para a sua exis­ rões aos desvãos. são tão sujas no exterior como no interior e têm
tência; consideraremos em primeiro lugar as habitações. um tal aspecto que ninguém as desejaria habitar. Mas isto ainda não
Thdas as grandes cidades possuem um ou vários "bairros de é nada comparado às habitações nos corredores e vielas transversais

I má.ItRutilÇàndCJc:sonttJúnUl.£IaSJit_OI!t[;lJ:ia::jtI;tWL(tllC
élID1 ücntlULlloblcza.rnO[aunl-ViclaBs.colldidas•.JllvilQ.PJ;rto
onde se chega através de passagens cobertas. e onde a sujeira e a ruI.
na ultrapassam a imaginação; não se vê, por assim dizer, um único
_l!iltáJ;io.u!..IiÇOkJ1Jas. sm.gcral.J:lcsigl!aril!1l-'.llJ.e...umll!&ar à JlllJ1Ç, vidro inteiro. as paredes estão leprosas. os batentes das portas e os
ol!d",,_ao-ªl1rigo-9os...oJ!Jam.daulasScS .maisJcJ izc.s...kJ1J.M.s.\;...sillli caixilhos das janelas estão quebrados ou deseolados, as portas ­
.so2'.Í.l!h!l•.mçlhol_Qu.pior.Eslcs..'.:bairr.QuI.l'J)1_ªEIllJJª-çà.úào..Q.r&'k quando as há - são feitas de pranchas velhas pregadas umas às ou­
•niza.d9UlllJodilJUJlglalm.aJl!aiS..QJL!1l.Ç!J9LdaJ!l.ÇSlll_a...[l1aneira. AS tras; aqui, mesmo neste bairro de ladrões. as portas são inÚteis por­
JliQress.asas nuarte mais feia da cidade; a maior parte das vezes que não há nada para roubar. Em toda parte montes de detritos e
sQ..ÇQJJstrnçQçuh:__I!.o.iUJ1dJ!s...QlLdJ!1.jQ.-ge tijolos. alinhadas de cinzas e as águas vertidas em frente às portas aeabam por formar
.cmQJJgaUllas..Je...Ro.illYCu.Q..m-p..QrQ.çs habitados c quase sempre ehareos nauseabundos. É aI que habitam os mais pobres dos pobres.
!u_cgvlarmen (UllliSW!!9J1s.];Slil$.p.J;Jlu..lliaSs.asilLd..t três QU....!lualr.o os trabalhadores mais mal pagos, com os ladrões, os escroques e as
cOmo dos e uma...kQÚnlliunam-se collage
vItimas da prostituição. todos misturados. A maior parte são irlan­
mente em tQdJU!Jnglaterra. ÇJ(cetQ em algunLl!;lirrQs de Londres. deses ou deseendentes de irlandeses. e os que ainda não se submer­
J!S ha!1i\<lç!lcs_dil...clasKQperária.Habit ualmentc'.aSPIÓpriauuasJlão giram no turbilhão desta degradação moral que os rodeia, mergu­
sãQ.planas.ncm.payimentadas;Jão_s uJas._cheiilS..5k.d[i IQutsetais lham nela eada vez mais. perdem todos os dias um pouco mais da"
unimais. sem eSBatos nem canais_de escoamento, mas em cootrn: força de resistir a0'l,efeitos desmoralizantes da miséria, da sujeira
.P!ll'!ic:lameadJ!S__de chms.cslll8l1;1QQillétiw. Além disso. a ven­ e do meio. . -
tilao to!:!!-se difleil. pela má e confusa construçào de todo o bairro Mas SI. Giles não é o Único bairro miserável de Londres. Neste
.e.como.aquLYiYtm.mlÜSSQas..m1!!lPs.@el1o__eW_aço. é fácil ima­ gigantesco labirinto de ruas existem eentenas de milhares de ruas e
ginar.o.acquHUespirnJlcsleÜiliI:r.QLoIlCrários. _!)c.!:esº,s ruas ruelas estreitas, cujas casas são demasiado miseráveis para quem quer
ql!andQ..háj).QmJIIJll)JSlcm:lellblc..YilIl!iuk...\l.rnilSasa a outra. on­ que possa ainda eonsagrar uma eerta quantia a uma habitação hu-
.t!.l:J.c pendura a roupa Úmida.
39
38
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mana e, muitas .vezes,  mesmo próximo das luxuosas casas dos ri­
paróquia:
cos que se encontram estes refúgios da mais atroz misria. Foi assim
que, recentemente, no deeurso de um inqurito mortuário, se quali­
Ela possui 1.400 casas habitadas por 2.795 (ammas, ou seja, cerca de
ficou um bairro muito perto de Portman Square, praça pública mui­ 12.000 PC$Soas. O espaço em que habita esta importante população oAo
to conveniente, de morada de uma "multidão de irlandeses desmo­ chega a 400 jardas quadradas, e num tal amontoado n40  raro encon.
Ializados pela sujeira e pobreza". Foi assim que se descobriu em ruas tror um homem, a sua mulher. quatro ou cinco nJhos e lambt!:m por
• como Long-Acre, ete., que sem serem "chiques" são apesar de tudo veles o avO e a avó num só quarto de Ia ou 12 pés- quadrados. onde
convenientes, um grande número de habitações em porões de onde trabalham, comem e dormem. Creio que antes do bispo de Londres ter
,
chamado a atenção do publico para esta parÓQuia tão miserável ela era
surgem as silhuetas de crianças doentes e mulheres esfarrapadas, meio  tão pouco conhecida na extremidade oeste da cidade como os selva­
mortas de fome. Nas cercanias do lCatro Drury-Lane - o segundo gens da Austrália ou das ilhas do Pacifico. E, se quisermos conhecer
de Londres - encontram-se algumas das piores ruas da cidade (ruas pessoalmente os sofrimentos destes infelizes, se os observarmos a co.
Charles, King e Parkcr) cujas casas, dos porões aos desvãos, tam­ mer a sua magra refeição e os virmos curvados pela doença e pelo de.
bm só são habitadas por famnias pobres. Nas paróquias de SI. John semprcgo, descobrimos uma tal soma de angústia e de miséria qUe uma
nação como a nossa deveria cnvergonhaNe de sua cxistncia. Fui pas.
e de SI. Margaret, em Westminster, habitavam em 1840, segundo o tor pcrto de Hudderslicld durante os tres anos de crise. no pior mo.
jornal da Sociedade de Estatísticas" 5.366 famílias de operários em menta de marasmo'das fábricas, mas nunca vi os pobres numa miséria
5.294 "habitações" - se se pode dar-lhes este nome - homens, mu­ tão profunda como depois, cm llethnal Green. Não há um único pai
.

-i de fam£lia em cada lO, em toda a vizinhança, que tenha OUlras roupas


lheres e crianças, misturados sem preocupações de idade ou sexo, num •
total de 26.830 indivfduos8; e, deste número dessas famílias, 3/4 não além de sua roupa de trabalho, e esta rota c C$farrapadaj muitos só I!m,
A noite, como cobertas. estes farrapos c, por cama. um saco cheio de
possulam senão um cômodo. Na aristocrática paróquia de SI. Geor­  palha e de serragem. 10 •
t
ge, Hanover Square, habitavam, segundo a mesma autoridade',
1.465 famílias operárias com um total di: cerca de 6.000 pessoas nas "
Esta descrição já nos mostra como são tais habitações. Por ou­
.,

,.


mesmas condições; e tambm aI mais de 213 das famílias amontoa­ tro lado, vamos seguir as autoridades inglesas que, por vezes, entraIrJ
das num só cõmodo. E de que maneira as classes proprietárias ex­ nestas casas proletárias. '
ploram legalmente a misria destes infelizes, em que os próprios la­ ., . Por ocasião de uma inspeção mortuária realizada pelo Sr. Car­
drões já nada esperam encontrar! Pelos hediondos alojamentos de ter, corOl/cr do Surrey, no corpo de Ann Galwayll, de 45 anos de
Drury-Lane, que referimos, pagam-se os seguintes aluguis: 2 cômo­ idade, em 14 de novembro de 1843, os jornais descreveram a casa
dos no porão, 3 shillings (1 taler); um cômodo no térreo, 4 shillings; da defunta nestes termos: habitava no n? 3, White Lion Court, Ber.
no I? andar, 4,5 shillings; no 2? andar, 4 shillings; mansardas, 3 shil­ mondsey Street, Londres, com o marido e o filho de 19 anos, em
/ings por semana. A ponto de os famlicos habitantes de Charles um pequeno quarto onde não havia nem cama, nem lençóis, nem
Strect pagarem aos proprietários de imóveis um tributo anual de 2.000 o menor móvel. Jazia morta ao lado do filho sobre um monte de
libras esterlinas (14.000 talcrs) e as já citadas 5.336 famílias de West­ penas, espa!hadas sobre o corpo quase nu, porque nãO.havia.'nem
minster um aluguel tota! de 40.000 libras esterlinas por ano. (270.000 cobertores nem lençóis. As penas estavam de ta! maneira'coladas'ao'.
;,.

'J.
talcrs).  : seu corpo que o moIico nem pôde observar o .cadávcr' antes'dstê'
Contudo, o maior bairro operário encontra-se a Este da Torre ter sido limpo; encontrou-o então totalmente descamado e.roldo pelos
. ' '. • -,." : ',', , '-Ir'

de Londres, em Whitechapel e Bethna! Green, onde se concentra a vermes. Parte do soa!ho da sala estava escavado .e esse blirnco':servia .
grande massa de operários da cidade. Escutemos o que diz M. G. de sanitário à famllia. . ......:'
A1ston, pregador de SI. Philip, em Bethnal Green, do estado da sua Na quinta-feira, 15 de janeiro de 1844, dois meninos mpare-
40
41
- ... - ----_.--_.--------

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1.
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"

ccram pcrantc o tribunal de policia dc Worsllip Strcet em Londres, de, há 10 que vivem melhor, mas afirmo que milhares de corajosas
porque pressionados pela fome tinham roubado numa loja um pe­ e laboriosas famílias - muito mais corajosas e honradas que todos
daço de carne meio eozido, que tinham devorado instantaneamen­ os ricos de Londres - se encontram nesta situação indigna de um
tc.12 O juiz foi obrigado a forçar o inquérito e em breve obteve dos ,homem e que todo o proletário, sem qualquer exceção, sem que a
policiais os seguintes esclarecimentos: a mãe dos meninos era viúva culpa seja sua e apesar de todos os esforços, pode vir a ter a mesma sorte.
de um antigo soldado, que sc tornara agente da policia, e tinha pas­ Mas no 'fim de contas, os que possuem um teto, seja ele qual
sado muita miséria depois da morte do marido, para sustentar os for, ainda são felizes ao lado daqueles que nem isso tem. Em lon­
nove filhos. dres levantam-se todas as manhãs 50.000 pessoas sem saberem onde
Habitava em Pool's Place, no n? 2 de Quaker Street, em Spi­ repousarão a cabeça na noite seguinte. Os mais felizes dentre eles
talfields, na maior miséria. Quando o agente da policia chegou à sua são os que conseguem conservar 1 ou 2 pence até à noite e ir para
casa encontrou-a eom scis dos filhos, literalmente empilhados num os "albergues no turnos" (Lodging-house) que existem em grande nú­
pequeno quarto nos fundos da casa, só tendo como móveis duas ve­ mero em todas as grandes cidades c onde lhes é dado abrigo em tro­
lhas cadeiras de vime sem fundo, uma pequena mesa com dois pés ca do seu dinhciro. Mas que abrigo! A casa está cheia de camas de
partidos, uma xíeara partida e um pequeno prato... Na entrada, um alto a baixo, 4, 5, 6 camas numa sala, tantas quantas caibam. Em
pouco de fogo, e num canto tantos trapos quantos uma mulher po­ cada cama cmpilham-se 4, 5, 6 pessoas, também tantas quantas cai­
de trazer no avental, que serviam de cama a toda a família. Só ti­ bam, doentes e sãs, velhos e jovens, homens e mulheres, bebados e
nham como cobertor as próprias roupas. A pobre mulher contou que pessoas sóbrias, tal é o quadro com todos misturados. Discutem,
tinha sido obrigada a vender a cama no ano anterior, para arranjar agridem-se, fercm-se, preparam roubos e entregam-se a práticas cuja
comida; os lençóis tinha-os deixado empenhados na mercearia a troco bestialidade a nossa lingua humanizada se recusa a descrever. I' E os
de alguns alimentos, e tinha tido que vender tudo só para comprar que não podem pagar esse alojamento7 Pois bem, esses dormem em
pão. O juiz do tribunal de policia concedeu a esta mulher um im­ qualquer lugar, nas esquinas, sob as arcadas, num recanto qualquer,
portante adiantamento da Caixa dos Pobres. onde a policia e os proprietários os deixem dormir tranqüilos; ai­
Em fevereiro de 1844, uma viúva de 60 anos, '!Cresa Bishop, guns vivem em asilos construidos aqui e ali por obras de beneficen­
foi recomendada, com a filha doente de 26 anos, aos cuidados do cia privadas, outros dormem nos baneos dos parques, mesmo de­
juiz do tribunal de policia de Marlborough Street.lJ Habitava o n? baixo das janelas da Rainha Vitória. Escutemos o que diz o Timesu
5 de Brown Street, Grosvenor Square, num pequeno quarto do pá­ de 12 dc outubro ,çlc 1843:
tio, que não era maior que um armário, e onde não havia um único
móvel. Num canto estavam alguns trapos onde ambas dormiam; um Ressalta da nossa seção de poUcia de ontem, que cm media dormem
caixote servia ao mesmo tempo de mesa e de cadeira. A mãe ganha­ 50 pessoas todas as noites nos parques. tendo como única proteçlo contra
va uns tostões trabalhando por dia; o proprietário disse que viviam as intemperies, as árvores e alguns buracos no cais. A malor parte: 1&0
mOÇaS. que, seduzidas por soldados., foram uarldas para a capital c aban­
naquela situação desde maio de 1843; tinham vendido ou empenha­ donadas neste vasto mundo. lançadas na miseria de uma cidade estra­
do aos poucos tudo o que ainda possuíam, e apesar disso nunca ti­ nha, v!lim. inconscientes c: precoces do vicio.
nham pago o aluguel. O juiz fez com que lhe dessem uma pensão É na realidade assustador. Pobres. e preciso que os haja. A necessidade
de uma libra na Caixa dos Pobres. há de abrir caminho por toda parte e instalar-se com lodos os seU5 hor­
rores no coraç40 de uma grande e florescente cidade. Nos milhares de
Não pretendo fazer crer que todos os trabalhadores londrinos becos e vielas de uma metrópole populosa haverá sempre necessaria­
viviam na mesma miséria que as três famílias citadas; sei muito bem mente _ assim o tememos - muita misria que fere a vista, e muita
que para cada homem que vive esmagado sem piedadc pela socieda- que nunca parecerâ à luz do dia.

42 43
mente porque todas são industriais - é preciso estudar primeiro es­ experimentados .torna-se cada vez maior; em virtude da concorrên­
ses pontos, a fim de que, em seguida, possamos examinar com mui­ cia que os empreiteiros da construção civil e também os fabricantes
to mais rigor cada ramificação na sua particularidade. de máquinas2, disponíveis, fazem entre si, podem-se fundar melho­
Já indicamos anteriormentc que a indústria ccntraliza a pro­ res estabelecimentos, mais baratos que numa região mais afastada,
pricdade nas mãos de um pequeno númcro dc pessoas. Exige enor­ para onde se teria que transportar primeiro a madeira de constru­
mes capitais por meio dos quais eonstrói gigantcscos estabelecimen- ; ção, as máquinas, os operários de construção e os operários' da in­
.. . tos - arruinando assim a pequena-burguesia artesanal - e com a ....
dústria; tem-se um mercado, uma bolsa onde se comprimem os com­
ajuda dos quais põe ao seu serviço as forças da natureza, a fim de ,"o'
pradores; mantêm-se relações dirctas com os mercados que entregam
expulsar do mercado o trabalhador manual individual. A divisão do a matéria-prima ou que distribuem os produtos acabados. Dai o de­
trabalho, a utilização da força hidráulica e sobretudo da força a va­ senvolvimento espantosamente rápido das grandes cidades industriais.
por, a maquinaria: eis as três grandes alavancas com as quais a in­ Certamente que o campo tem, em troca, a vantagem dos salários se­
dústria, desde meados do século passado, se esforça por fazer avan­ rem ai habitualmente mais baixos; as regiões rurais e a cidadeindus­
çar o mundo. A pequena indústria deu lugar à classe média, a gran­ trial mantêm-se assim em concorrência contlnua, e se hoje a vanta­
de indústria à classe operária, e colocou no trono alguns raros elei­ gem está do lado da cidade, amanhã o salário baixará na região que
tos da classe média, mas unicamente para um dia os abater com mais a rodeia a tal ponto que a criação de novoS estabelecimentos no cam­
segurança. Entretanto, é um fato inegável e facilmente explicável que po será vantajosa{Mas, apesar de tudo, a tendência centralizadoro
a numerosa pequena burguesia dos "velhos tempos" foi destruída mantém-se extremamente forte e cada nova indústria criada no campo
e decomposta em ricos capitalistas por um lado e pobres operários :,. traz em si o germe de uma cidade industrial. Se fosse passive! que
'!
por outro.' esta atividade louca da indústria durasse ainda cem anos, cada dis­
Mas a tendência centralizadora da indústria não fica por aí. trito industrial da Inglaterra ver-se-ia reduzido a uma úniea cidade
A população fica tão centralizada como o capital; nada mais natu­ industrial e Manchester e Liverpool eneontrar-se-iam em Warring- .
ral porque, na indústria, o homem. o trabalhador, não é considera­ ton ou Newton; porque esta centralização da população exerce igual.',
do senão como uma fração do capital à qual o industrial entrega mente o seu efeito sobre o comércio exatamente da mesma maneira I'
um juro - que se chama salário - como compensação ao que o e é por isso que alguns portos (Liverpool, Bristol, Hull e Londres)
trabalhador lhe proporciona. O grande estabclecimento industrial cxj­ monopolizam quase todo o comércio marítimo do Império Britânico.
. e numerosos operários trabalhando juntos num mesmo edifício; eles Dado que a indústria e o comércio se desenvolvem mais per­
têm que habitar juntos: para uma fábrica média já constituem uma feitamente nas grandes cidades é, pois, igualmente ai que aparecem
vila. Têm necessidades para cuja satisfação outras pessoas são ne­ mais manifesta e claramente as conseqüêneias que exercem sobre o
cessárias; os artesãos: alfaiates, sapateiros, padeiros, pedreiros e mar­ proletariado. Foi ai que a centralização dos bens atingiu o seu grau
ceneiros anuem. Os habitantes da vila, sobretudo a geração mais jo­ mais elevado, foi ai que os costumes e as condições de vida dos ve­
vem, habituam-se ao trabalho na fábrica, familiarizam-se com ele lhos tempos foram mais radicalmente destruidos; foi ai que se che­
e, logo que a primeira fábrica, como se compreende, já não os pode gou a um ponto em q,ue a expressão Old Merry Englamf! já não tem
ocupar a todos, o salário baixa e, por conseqüência, vêm-se instalar nenhum sentido, porque já nem se reconhece esta velha Inglaterra
novos industriais. De tal modo que a vila se transforma numa pe­ pela recordação e pela descrição dos avós. Thmbém é por isso que
quena cidade e a pequena cidade numa grande cidade. Quanto maior já não há aI senão uma classe rica e uma classe pobre, porque a pe­
for a cidade maiores são as vantagens da aglomeração. Surgem as quena burguesia cada dia desaparece mais. Ela que, outrora, era. a
vias férreas, os canais e as estradas; a escolha entre os trabalhadores classe mais estávcl, tornou-se agora a mais instável; já não se com-

32 33
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.,

AS GRANDES CIDADES1
põe senão de alguns vestígios de uma époea revolucionada e de um 1
certo 'número de pessoas que bem queriam fazer fortuna, cavaleiros "

da indústria e especuladores perfeitos, dos quais um em cada cem


"
enriquece, enquanto os outros 99 falham, e destes 99 mais da meta­
í ;'
de só vive de falências,
Mas a imensa maioria destas cidades é constitulda por prole­
tários, e agora o objeto do nosso estudo será saber como vivem e
qual a influência que a grande cidade exerce sobre eles.
U ma cidade como Londres, onde podemos andar horas sem
sequer chegar ao principio do fim, sem descobrir o menor indIcio
NaTAS
que assinale a proximidade do campo, é realmente um caso singular.

I Ver. Cite respeito o meu "EJboço de uma crltlc. da economia poUllc .... no. AnQlslrrJffco-Qf
Esta enorme centralização, este amontoado de 3,5 milhões de
m4u. Neste trabalho. o ponto de par1lda t ''a IiVrt concorrenei,"; mu ,Indústria 010 l.cnlo seres humanos num único lugar, centuplicou o poder destes 3,5 mi­
• pritlca da livre conc:orr!ncl. c ctta apenu o principio da industria. (EC.) . lhõs de homens. Ela elevou Londres à condição de capita! comercia!
• Vrr ed!çlo cm linlu, portuJUesa ml "1tmu de Ci!nciu Hum.nu" n 5. S. Paulo. Li.,. Ed.
Cllnclu Humanu. 1979. pp. 1.29. do mundo, criou docas gigantescas c reuniu milhares de navios, que
1 Enaw refcre-K aOI opcrirlo. que fabricavam as mAquinas. cobrcm continuamente o Tãmisa. Não conheço nada mais imponente
J A boa velha Inal'lerra. que o espetáculo oferecido pelo Tâmisa, quando subimos o rio des­
de o mar até a ponte de Londres. A massa de casas, os estaleiros
navais de cada lado, sobretudo acima de Woolwich, os numerosos
navios dispostos ao longo das duas margens, apertando-se cada vez
, ,

mais uns contra os outros, a ponto de, por fim, deixarem somente
um estreito canal no meio do rio, sobre o qual se cruzam, a toda
a velocidade, uma centena de barcos a vapor - tudo isto é tão gran-'
dioso, tão enorme, que nos sentimos atordoados e ficamos estupe­
fatos com a grandeza da Inglaterra antes mesmo de pÔr os p'és em
terra.2
Quanto aos sacriflcios que tudo isto custou, só os descobrimos
mais tarde. Depois de pisarmos, durante alguns dias, as pedras das
ruas principais, de a custo termos aberto passagem através da multi.
dão, das filas sem fim de carros e carroças, depois de termos visita­
do os "bairros de má reputação" desta metrópole, só então começa.
mos a notar que estes londrinos tiveram que sacrificar a melhor par.
te da sua condição d"homens para realizar todos estes milagres da
civilização de que a cidade é fecunda, que mil forças que neles dor.
I
,

miam ficaram inativas e foram neutralizadas para que só algumas


!
pudessem se desenvolver mais e fossem multiplicadas pela união com I
outras. Até a própria multidão das ruas tem, por si só, qualquer coi.
,

34 35
grandes cidades do Reino Unido. Vejamos primeiro Dublin, cidade
Mas que no drculo traçado pela riquel.3, a alegria e o luxo, que mesmo cujo acesso ao mar  tâo encantador como o de Londres  imponen­
ao lado da grandeza real de St. James, nas proximidades do faustoso
le: a bala de Dublin  a mais bela das ilhas britânicas e os irlandeses
palácio de Oayswater, onde se encontram o antigo bairro aristocnl.lico
e o novo, numa parle da cidade onde o requinte da 3Hluitetura moder­ gostam de a comparar 11 de Nápoles. A própria cidade tem muitas
na se absteve prudenlemenle de construir O menor barraco para a po­ belezas'9 e os seus bairros aristocrátieos foram mais bem construi­
breza, num bairro que parece eslar exclusivamente consagrado aos pra. '' dos e com mais gosto do que os de qualquer outra cidade britâniea.
zeres da riqueza, que, precisamente al. se venham instalar a (orne e a " Mas, em contrapartida, os bairros mais pobres de Dublin estão en­
misria, a doença e o vicio com todo o seu cortejo de horrores, consu­
mindo corpo alrOb de corpo, alma atrás de almal
tre os mais repugnantes e mais feios que se podem imaginar. É que
.; o caráter nacional dos irlandeses, que em certas cireunstâncias só es­
ê re.. lmenle um estado de coisas monstruoso. As melhores sensações
Que podem proporcionar a saúde rfsica, a euforia intelcclUal, e os mais tilo à vontade na sujeira, tem aqui importãncia; mas, como também
inocentes prazeres dos sentidos. lado a lado com a mais cruel misrial ,t encontramos em todas as grandes cidades da Inglaterra e da Escócia
A riqueza rindo-se do alto dos seus brilhantes salões, rindo-se com uma
milhares de irlandeses e como toda a população pobre acaba neees­
brutal indiferença, mesmo ao lado da.,\ (cridas ignoradas da indigên­
cial A alegria, zombando insconsciente mas cruelmente do sofrimento
.
sariamente por sucumbir na mesma sordidez, a miséria cm Dublin
que geme ali em baixol Presentes todos os contrastes, todas as oposi­ .:\ nada tem de especifico, característico de cidade irlandesa,  pelo con­
ções, aceto uma: o vicio que conduz A tentaçAo, alia-se Aquele Que se trário, um traço eomum a todas as grandes cidades do mundo. Os
deiu lenlar.
bairros pobres de Dublin são extremamente grandes c a sujeira, a
Mas que lodos os homens reflilam: no bairro mais brilhante da cidade
mais rica do mundo. noite após noite. inverno após inverno, há mulhe­ inabitabilidade das casas, o abandono a que estão relegadas as ruas,
res, jovens na idade. envelhecidas pelos pecados e sofrimentos, banidas ultrapassam a imaginação. Podemos fazer uma idia de como os po­
da sociedade, atoladas na fome. na sujeira e na doença. Que pensem bres estão amontoados ao tomarmos conhecimento de que, em 1817,
c aprendam. não a construir teorias, mas a agirem. Deus sabe que há
segundo o relatório dos inspetores da Casa de 1hlbalh0lO, 1.318 pes­
ali hoje muito trabalho para ser fcito.".
soas habitavam na Barraek Street em 52 casas eom 390 quartos e

Anteriormente, falei dos albergues para desabrigados - dois 1.997 pessoas na Church Street c arredores, repartidas por 71 easas
exemplos mostram como estão repletos, Um Rtifuge of lhe Houselessl6, com 393 quartos; que

construído recentemente na Uper Ogle Street, com capacidade para


neste bairro e no bairro vizinho há uma multidão de ruelas c de pátios
albergar todas as noites 300 pessoas, acolheu desde a sua abertura, com odor nauseabundo (foul), que muitos porões só recebem a luz do
a 27 de janeiro, at 17 de março de 1844",2.740 pessoas por uma dia pela porta c que, em vários deles, os habitantes se deitam no chio
ou várias noites, e embora o tempo se tornasse menos rigoroso, o nu, embora a maior parte deles tenha pelo menos as armações da ca.

número de pedidos aumentou eonsideravelmente tanto neste como ma. Michc1son's Court, por exemplo, tem 131 pessoas vivendo cm 28
miseráveis Quartos. na maior miséria. a ponto de só se lerem encontra­
nos albergues de Whiteeross Street e de Wapping, e a cada noite uma
do cm todo o edifício, 2 armações de cama c dois coberlores.
multidão de desabrigados era rejeitada por falta de lugar. Num ou­
tro, O asilo eentral de Playhouse Yard, equipado com cerca de 460 A pobreza  tão grande cm Dublin que a única organização
camas, nos três primciros meses do ano de 1844 abrigou um total de benefieência, a "1plldicily Associatioll2l, acolhe 2.500 pessoas por
de 6.681 pessoas e distribuíram-se 96.141 rações de pâo. Contudo, dia, portanto, um por cento da população total, alimentado-as de
o eomitê diretor declarou que este estabelecimento só se tornou, em dia e despedindo-as à noite.
certa medida, suficiente em face da anuência de indigentes, depois
,.

É cm termos análogos que o doutor Alison se refere a Edim­


de o abrigo do leste ter sido aberto para acolher os desabrigados." burgo, uma cidade cuja esplêndida situação lhe valeu o nome de Ate-
Deixemos Londres para pereorrermos cada uma das outras
45
44

':

""""'i'.'
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nas moderna, e em que o luxuoso bairro aristoerático da cidade no­ ,< &aS têm cinco ou seis andares tal como em Paris e - contrariamente
va contrasta brutalmente com a miséria crassa dos pobres da cidade às da Inglaterra, onde tanto quanto possfvel cada um tem sua pró­
velha. Alison afirma que este vasto bairro é tão sujo e hediondo co­ pria casa - são habitadas por inúmeras famllias diferentes; a con­
mo os piores de Dublin e que a Melldicily Associalioll teria uma pro­ centração de numerosas pessoas numa superfície restrita aumenta
porção de pobres a socorrer tão grande como na capital irlandesa; assim por causa disto.
..
ele diz até que os pobres na Escócia, sobretudo em Edimburgo e Glas­ Uma revista inglesa", num artigo sobre as condições sanitárias
gow, têm uma vida mais dura do que em qualquer outra região do dos operários das cidades, afirma:
Império Britânico e que os mais miserávcis não são os irlandeses mas
,.

os escoceses.u O pregador da Old Church de Edimburgo, o Dr. Lce, Estas ruas são em geral tão estreitas que se pode saltar de uma janela
declarou em 1836 perante a Commissioll 0/ Religious IIlslruclioll2l para a da casa cm frente., e os edifícios apresentam, por outro lado. uma

que:
tal acumulação de andares que a luz mal pode penetrar no pAtio ou
na ruela que os separa. Nesta parte da cidade nlio há. nem esgotos nem
banheiros públicos ou sanitários nas casas, e  por isso que as imundf­
nunca tinha visto lnta miséria como na sua paróquia. As pessoas não
cies, detritos ou excrementos de, pelo menos, .50.000 pessoas slo lança­
tinham móveis, viviam sem nada: freqüentcmentc viviam dois casais no
dos todas as noites nas valetas, de tal modo que, apesar da Iimpez.a das
mesmo quarto. Num dia tinha visilado sele casas diferentes onde não
ruas, há uma massa de excremcntos secos com emanaçÕCJ nauseabun­
havia camas - cm algumas nem palha havia -; octogenários dormiam
das, que nlo só ferem a vista e o olfato, como, por outro lado. repre­
no chAo. quase todos conservavam de noite: as roupas que traziam de
sentam um perigo extremo para a saúde dos habitantes. Causaria es­
dia; num porlo encontrou duas famllias vindas do campo; pouco tem­
panto que cm tais locais se ncgligenciem os mínimos cuidados com a
po depois de chegarem à cidade. tinham morrido duns crianças; c a ter­
saúde, os bons costumes e at as regras mais elementares da decncia1
ceira agonizava na época da sua visita; para cada (amnia havia um monte
Pelo contrário., todos os que conhecem bem a siluaçAo dos habitantes
de palha suja num canto, C. ainda por cima, o porão. que era ta,O escu­
testemunhanlo o alto grau que a doença, a miséria e a ausencia de mo­
ro que não podia distinguir-se um ser humano em pleno dia, servia de
ral ali atingiram. Nestas regiões a sociedade desceu a um nível indescri­
estábulo de um burro. At um coração duro corno o diamante devia
tivelmente baixo e miserável. As habitaçõcs da classe pobre 110 em leral
sangrar à vista de tal misria. num pais como a Escócia.
muito sujas e aparentemente nunca sAo limpas. seja de que maneira for:
compõc.se, a maior partc das casas, de uma única sala - onde, apesar
O Dr. Honnen refere-se a fatos análogos no EdillburglJ Medi­ da ventilação ser das piores, faz scmpre frio por causa das janelas pani­
cai and Surgical Joumal.2A Um relatório parlamentar2.1 mostra a sor­ das ou mal adaptadas - que muitas vczcs é umida e fica no subsolo.
didez - que, como seria de esperar cm tais condições, reina nas ca­ sempre mal mobiliada e invnriavt1mente inabitável, a ponto de um monte
de palha servir freqüentementc: de enma para uma famOia inteira. cama
sas dos pobres de Edimburgo. Galinhas transformaram as armações
onde se deitam, numa confusão revoltante. homens, mulhefCS, velhos
das camas em poleiros no turnos, cães e até cavalos dormem com os c crianças. Só se encontra água nas bombas públicas e a dificuldade pa­
homens nos mesmos quartos, e a conseqüência natural é que uma ra a ir buscar favorece naturalmente toda a imundlcie passivei.
sujeira e um cheiro horrlveis enchem as habitações, bem como um
exército de vermes de toda espécie, 26 A maneira como Edimburgo As outras grandes cidades portuárias não são melhores. liver­
está construlda favorece, no mais alto grau, este estado de coisas. pool, apesar do seu tráfego, do seu luxo e da sua riqueza, trata ain­
A velha cidade foi construlda sobre as duas verlcntes de uma colina, da os seus trabalhadores com a mesma barbaridade. Um bom quin­
no cimo da qual passa a Rua Alta (High Street). Dela partem de am­ to da população, oJ"seja, mais de 45.000 pessoas, habitam na cidade
bos os lados uma multidão de vielas estreitas e tortuosas, chamadas em porões ex/guos, escuros e mal arejados, em número de 7.862."
wynds, por causa das suas numerosas sinuosidades, que descem a A isto ainda se juntam 2.270 pátios (courls): quer dizer, pequenos
colina e constituem o bairro proletário. As casas das cidades escoce- locais fechados pelos quatro lados, tendo como acesso e salda uma

46 47

.I'.
t,

estreita passagem, freqüentemente abobadada (que por conseguinte Glasgow parece-se com Edimburgo em muitos aspectos: as mes­
não permite a menor ventilação), a maior parte das vezes muito su­ mas wynds, as mesmas casas altas. A Artizan diz a respeito desta
jos e habitados quase exclusivamente por proletários. Voltaremos a cidade:
falar destes pátios quando chegarmos a Manehester. Em Dristol, fo­
Aqui a classe operária constitui cerca de 78'1. da populaçAo total (da
ram visitadas 2.800 famllias de operários das quais 46% não pos­
ordem de 300.000) e habita em bairros que ultrapassam cm misria e
suem senão um único quarto.29 horror os antros mais vis de St. Giles e Whitcchapel, os LitHrt;u de
Eneontramos cxatamente a mesma coisa nas cidades industriais. Dublin, 05 wymls de Edimburgo. Há uma quantidade de locais seme­
Em Nottingham há ao todo 11.000 casas das quais 7.000 ou 8.000 lhantes no coração da cidade, no sul de Ttomgate, a oeste do mercado
estão de tal maneira encostadas umas às outras que nenhuma venti­ do sal, no Calton, ao lado da High Street, ele. Labirintos interminivcis
nas ruas estreitas ou wynds, onde desembocam a cada passo pálios e
lação completa  posslvel, aIm de, na maior parte dos casos, não becos, constitufdos por velhas casas mal arejadas, muito altas, sem égua
existir senão um lavabo comum para várias casas. Uma inspeção re­ c decrpitas. Estas casas transbordam literalmente de habitantes. cada
cente revclou que várias filas de casas estavam construídas sobre ca. andar tem 3 ou 4 CamOias, talvez. vinte pessoas. Por vezes, os andares
nais de descargas pouco profundos, apenas cobertos pclas ripas do esll0 alugados como dormitórios para a noite, de Corma que quinze
ou vinte pessoas estão amontoadas - não ousamos diur albergadas
soalho.
_ num único quarto. Estes bairros abrigam os elementos mais pobres,
Em Leicester, Derby e Sheffield, passa-se o mesmo. Quanto a mais depravados, menos v.:l.lidos da população, e  preciso ver neles a
Birmingham, o artigo da Arlizan acima citada, diz o que segue: origem das terríveis epidemias de Cebre que. partindo daI. assolam toda
a cidade de Glasgow.
Nos velhos bairros da cidade hlt lugares sujos e mal conservados, cheios
de chartOs c$lagoados C' de montes de imundlcies. Em Dirmingham. os Escutemos a descrição que J. C: Symons, comissário do go­
pátios 540 muito numerosos, mais de 2.000, onde vive a maior parle vernO para a investigação sobre a situação dos tecelões manuais)2,
da classe operária. S;1o frcqüentementc exfguos, lamacentos, mal areja­
dos, com os condutos de evacuação defeituosos, agrupando entre 8 e
dá destes bairros:
20 prédios que na sua maior parte só recebem ar por um lado, visto
Vi aqui e no continente a miséria em alguns dos seus piores aspectos,
que a parede do fundo é divisória; no fundo do pátio há quase sempre
um buraco para as cinzas ou qualquer coisa deste genera, cuja sujeira
mas antes de ler visitado os wynds de Glasgow nio acreditava que lan".
é indescritJvcl. Contudo, é necessArio notar que os p.:l.tios modernos fo­ los crimes, miséria e doenças pudessem existir em qualquer pais civili.
ram construIdos de forma mais inteligente c estão mais bem conserva­ zado. Nos albergues de categoria inferior dormem, no mesmo chio. dez..
doz.c, e por vez.es vinte pessoas dos dois soas e de todas as idades. nu.
dos; c que, mesmo nos velhos, as casas estão menos amontoadas do
ma nudez. mais ou menos total. Estes alojamentos esllo normalmente
que cm Manchester ou Liverpool; isto também aplica que, na época
das epidemias, tenha havido menos casos mortais em Uirmi1l8hnl1l do
(general/y) tAo sujos, úmidos c arruinados que nlnaum alojaria, neles,
que, por exemplo, cm Wolverhampton, Dudlcy e llilstol1, Que só distam o seu cavalo.u
algumas milhas. Do mesmo modo. não h.:I. em Dirmingham moradias
nos subsolos, se bem que alguns porões sirvam impropriamente de ofi­ E, mais à frente:
cinas. Os albergues para prolcUrios 540 um pouco mais numerosos (mais
de 400), principalmente nos pátios do centro da cidade; são quase lo. Os wynds de Glasgow abrigam uma população nutuante de quinze a
dos os de uma sujeira revoltante, mal arejados, autenticas refúgios de trinta mil pessoas. Este bairro compõc-se somente de ruas estreitas e
mendigos, vagabundos, trampers (vollaremos a falar sobre o significa­ p.:l.tios rctaft:ulares no meio dos quais normalmente se eleva um monte
do dessa palavra), ladrõcs e prostitutas, que, sem se preocuparem com de estrume. Por mais revoltante que Casse o aspecto aterior destes lu.
as conveniencias ou com o conCorto, comem;bcbem: fumam e dormem gares, eu ainda não estava preparado para a sujeira e misria que rei­
numa atmosCera que só estes seres degradados podem suportar.JI nam no interior. Em alguns destes dormitórios que nós (o supcrinten.
dente da poUcia, capitão Miller, e Symons) visitamos de noite, encon .

.48 49

tramos um bom número de seres humanos estendidos no chão, por vc:­ '. ainda o estado lamentável em que se encontram os bairros operários
u.s de quinze a vinle:. alguns vestidos c outros nus, homens c mulheres .t,:' em volta de Kirkgale, March lane, Cross Street e Richmond Road, que
juntos. A cama deles era feila com um monte de palha bolorenta mis­ l;, se distinguem principalmente pelas ruas mal pavimentadas e sem esgo­
turada com trapos. Ou havia poucos móveis ou nenhum c a única coisa 1 tos, por uma arquitelura irregular, com numerosos pátios e becos e pe­
que dava a estas casas um aspecto de habitação era um fogo 31;esO. O c':. la ausncia total dos mais elementares meios de limpeza. Isto tudo jun­
roubo e a prostituição são as principais fontes de renda desta popula. '.. to dá-nos razões suficientes para explicar a excessiva mortalidade nes­
ção.H Ningum se dava ao trabalho de limpar esles cst.i1bulos de Au­
gias, c$te: pandcrnOnio, este conglomerado de crimes, de sujeira, de pes­
"
.\,l, tes infelizes feudos da mais sórdida misria. Em virtude das cheias do
Aire (que," acrescente-se, como todos os rios utilizados na indústria, en­
tilência, no coração da segunda cidade do Império. Numa vasta inspc­ '\ tra na cidactc claro e transparente para daI sair espesso, negro e mal­
";.
çâo dos piores bairros de outras cidades. nunca me foi dado ver nada chciroso, com todas as imundícies imagináveisl6), os porões e as casas
que. peJa intensidade da infecção moral c (bica, ncm pela densidade
t'
enchem-se freqüentemente de .ãgua a ponto de ser necessário bombe.1-la
,"'.
relativa da população, atingisse metade deste horror. A maior parte das 1" para a lançar na rua; portm, a água volta a entrar nos porões, mesmo
!;.
casas deste bairro est.i, classificada pela Courl o/ Gui/d como arruina­ c'"
.,',
onde há esgotos, provocando emanações miasmáticas, com forte per­
'.'
das e inabit.ãveis, mas são predsamente as mais habitadas, porque a lei centagcm de hidrogl1io sulfuroso deixando um depósito repugnante ex­
proCbe que por elas se 'tobre aluguel. '.\: tremamente prejudicial para a saúde. Durante as inundações da prima­
vera do ano dc 1839, os cfeitos de tal entupimenlo.dos esgotos foram
A grande região industrial no centro das Ilhas Britânicas, a zona lào nocivos que, segundo o relatório do oficial do registro civil deste
populosa do Yorkshire ocidental e do Lancashire meridional, com 'l: bairro, houve nesse trimestre trcs falecimentos a cada dois nascimentos
,.: .
enquanto que, durante o mesmo trimestre, lodos os outros bairros re.
as suas numerosas cidades industriais, em nada fica atrás em rela­ '"
gistraram lrês nascimentos para cada dois falecimentos.
çào às outras grandes cidades. A região lanlgera do West Riding, no Outros bairros com forle densidade de população estio desprovidos de
Yorkshirc,  uma região encantadora, uma bela terra de colinas ver­ ,
" sarjetas, e quando as hi nào servem para nada. Em alguns alinhamen­
dejantes, cujas elevações se tornam cada vez mais abruptas em dire­ " tos de casas os porôes raramente estão secos; em outros bairros, várias
ção a oeste at culminarem na crista escarpada de Blackstone Edge
\:. ruas éstAo cobertas por uma lama mole onde nos enterramos at os tor­
nozelos. De tempos cm tempos os habitantes esforçam-se em via por
- linha de partilha das águas entre o mar da Irlanda e o mar do
rcparar estas ruas, lançando algumas pazadas de cinzas; nlo obstante
Norte. Os vales do Airc, onde está situada Lceds, e do Calder, onde estas iniciativas, o esterco e as .ãguas sujas espalhados em frente das' I
passa a via frrea Manchester-Lceds, contam-se entre os mais riso­ casas estagnam cm todos os buracos at que o vento c o sol as sequem
'I
"
nhos da Inglaterra e estão semeados, por todo lado, de fábricas, vi­ (cC. relatório do Conselho municipal no Slatislica/ Journal, vai. 2, p.
las e cidades; as casas de pedra cinzenta têm um ar tão atraente e 404l'). Uma casa vulgar de Leeds não ocupa uma superffcie superior
a .5 jardas quadradas c t habitualmente composta por um porão. uma
limpo compatadas às construções de tijolos, negros de fuligem, do
",I
sala comum e um quarto de dormir. Estas habitações exíguas, noite e
Lancashirc, que at dão prazer. Mas assim que entramos nas pró­ dia cheios de seres humanos. conslituem outro perigo tanto para os cos­
prias cidades, encontramos poucas coisas que nos agradam. A si­
,

lumes como para a saúde dos habantes.JI


'I
tuação de Lceds  exatamente a que descreve a ArlizalJ (revista já ,

citada) e que eu pude confirmar: O relatório acima citado, sobre a situação sanitária da elasse
operária, diz-nos de que maneira as pessoas se amontoam nestes
,I
sobre uma suave encosta que desce pelo vale do Aire. Este rio serpen­ í' albergues:
tei, atrarn da cidade numa distlncia de cerca de milha e meia" e es­ ,i
tá sujeito, depois do perfodo do degelo ou depois de chuvas violentas, )'

Em Lceds, enconlramos irmãos e irmãs e pensionistas de ambo5 os se-
" ,

a fortes enxurradas. Os bairros do oeste, situados mais acima, são lim­


xos que partilham o quarto com os pais; o sentimento humano estre­
pos, para uma cidade tão grande, mas os bairros em volta do rio e dos i
riachos que ai se lançam (becks) slo sujos, apertados o suficiente para "
:. mece ao pensar nas conseqüências que dai resultam . .eo

t j:
abreviarem a vida dos habitantes, sobretudo das crianças. Acrescente-se
\ " II
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50 '
51 ,:
I'I'
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k .....  .• _.W . ..- .....  ....... 4_ ..

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I••P.'; .

ii.:
1.;
o mesmo se passa em Dradford, que dista somentc scte milhas "'t;"
de.Leeds, na eonfluência de vários vales, à beira dc um pcqueno ria­ ,,,,;q:a'obra-prima c de ondc partem todos os movimentos operários:
cho com águas eompletamente negras e nauseabundas. O alto das ;'o Lancashire mcridional com o seu grande centro, Manchester. Thm­
colinas que rodeiam a cidade oferece-nos um belo domingo - por­ / bém aqui encontramos uma bcla rcgião com colinas que se inclinam
que durante a semana a cidadc está envolvida por uma nuvcm cin­ f;.:: Juavemcnte para ocste, desde a vertente ociental até a mar da Ir­
zenta de fumaça de carvão -, um magnifico panorama. Mas, no i' ,!anda. com os scus encantadoes vales verdejantes do. Rlbble, d? Ir­
interior, é a mesma sujeira e o mesmo desconforto que cm Lccds. .,'.. woll. do Mersey e dos respcctlvos afluentes; esta região. que amda
Os velhos bairros. em encostas íngremes são apcrtados e irregular­ i, há um século não passava. na sua maior parte, de um pântano qua­
,.

mente construídos; nas ruclas, bccos e pátios. estão amontoados Ii-' .;c, 'lO desabitado. está agora totalmente coberta de vilas e cidades e é
xos e imundlcies; as casas estão arruinadas, sujas e desconfortáveis; l:'. a'zona mais populosa da Inglaterra. É no Lancashire meridIonal e
no fundo do vale, nas proximidades do curso de água, cncontrei vá­ ' ., principalmente em Manchester que a indústria do Império' Britâni­
rias cujo andar inferior era inabitável por ser meio escavado no flanco ,\,,,, co tem o seu ponto de partida e o seu centro; a Bolsa de Manchester
da colina. De um modo gcral, os bairros do fundo do vale, ondc os ." é.o barômelro de todas as flutuações do tráfego industrial. e as mo­
alojamentos dos opcrários estão comprimidos entrc as altas fábri­ '\ demas técnicas de fabricação atingiram aI a sua perfeição. Na in­
cas, são os mais mal construídos e mais sujos dc toda a cidade. Nos dústria algodoeira do Lancashire meridional. a utilização das forças
bairros mais recentes desta cidade, como nos de qualqucr outra ci­ da natureza. a substituição do trabalho manual pelas máquinas (so.
dade industrial, as casas estão alinhadas de forma mais rcgular. mas bretudo. no caso do tcar mecânico e do self-actor mule) e a divisão
têm todos os inconvenientes inerentes à maneira tradicional dc alo­ do trabalho parccem estar no apogeu; e se reconhecermos nestes três
jar os operários e dc que falaremos mais pormcnorizadamcntc a pro­ elementos as earacterlsticas da indústria moderna. é preciso confes­
pósito de Manchestcr. Passa-sc o mesmo com as outras cidadcs de sar que, mesmo neste aspecto. a indústria da transformação do ai.
West Riding, principalmente com Darnsley, Halifax e Huddcrsficld. godão eonscrvou sobre os outros setores industriais o avanço que
Esta última. de longe a mais bela de todas as cidadcs industriais do tinha adquirido desde o princfpio. Mas também é a! que, simulta­
Yorkshirc e do Lancashire, pcla sua cncantadora situação c pela sua neamente, as eonseqüências da indústria moderna se desenvolveram
arquitctura moderna, também tem, contudo, os seus bairros maus; completamente e na sua forma mais pura. e o proletariado indus.
por isso, um comitê designado por uma reunião dc cidadãos para tria! se manifestou de forma mais clássica. Thmbém aqui devia ser
inspecionar a cidade relatou, a 5 de agosto dc 1844: elevada ao máximo a degradação na qual se encontra o proletariado
,
devido à utilização do vapor, das máquinas e da divisão do trabalho
e. de salientar que ruas inteiras c numerosas ruelas c pátios de Hud.
,

e, assim. os esforços do proletariado para libertar-se desta situação


dcnfidd não cstlo ncm pavimentados, nem providos de esgotos ou outra
indigna fizeram-no adquirir uma consciência clara. Portanto. por ser
(orma de escoamento; nestes porões amontoam-se detritos. imundlcies
c sujeira de todas as espécies, Que aI (ermentam c apodrecem, c quase
,
Manchester o tipo clássico da cidade industrial moderna e também
'i"
por todo o lado a oigua estagnada acumula.sc cm charcos; cm conse. por conhecê-Ia tão bem como a minha cidade natal - melhor que
qüência disso. os alojamentos contlguas 5410 necessariamente sujos l .::; a maioria de se.us habitantcs - que nos deteremos nela. mais
insalubres. de tal modo que ar aparecem doenças que ameaçam a salu­ dcmoradamcnte.
bridade de toda a cidade.-I
As cidadcs qlre rodeiam Manchestcr pouco diferem da cidade
central com respeito aos bairros opcrários.2• excelo na medida em
Se atravessarmos Blackstone-Edge a pé, ou se tomarmos a fer­
que nestas cidades os operários talvez representem uma fração ain­
rovia. chegamos à terra clássica onde a indústria inglesa realizou a
da mais importante da população.•3 Com efeito. estes aglomerados
são unicamente industriais e rcalizam todo seu intercâmbio comer-
52
53

cial através de Manchester; dcpendem totalmente de Manchester c brios c cheios de fumaça e oferece efetivamente :.... sobretudo quan­
por conseqüência só são habitados por trabalhadores, indostriais c do vista do viaduto - uma visão nada atraentc. Mas, aspecto pior
comerciantes de 2 classe; enquanto Manchester possui uma popu­ tem as filas de casas e de porões que os proletários habitam por toda
lação comercial muito importante, composta, principalmente, de co­ a cidade, desde o fundo do vale ao topo das colinas. Não me recor­
missários c varejistas muito conhecidos. É por isso que Dolton, Pres­ do de ter visto, cm qualquer outra cidade desta região, uma propor.
ton, Wigan, Bury, Rochdale, Middleton, Hoywood, Oldham, Ash­ ção tão grande de porões habitados.
• ton, Stalybridge, Stockport, etc., mesmo sendo quase todas cidades Apenas algumas milhas a nordeste de Stoekport encontra-se
de 30, 50, 70 c até 90 mil habitantes, não passam de grandes bairros Ashton-under-Lyne, um dos centros industriais mais recentes da re­
operários interrompidos por fábricas e algumas grandes artérias la­ gião. Esta cidade, situada na vertente da colina, em cujo sopé cor­
deadas de lojas e tendo algumas ruas pavimentadas, ao longo das rem o canal e o rio Thme, está cm geral construída segundo um pIa­
quais estão dispostos os jardins e as casas dos fabricantes que lem­ no moderno c mais regular. Cinco ou seis grandes ruas paralelas atra­
bram as das vilas. As cidades estão mal c irregularmentc construí­ vessam toda a colina c são cortadas perpendicularmente por outras
artérias que descem cm direção ao valc. Graças a esta disposição,
.

das, com pátios sujos, ruas estreitas c vielas cheias de fumaça de car­ ,,','
,r,'

vão. O emprego do tijolo, primitivamente vermclho vivo - que é ,. as fábricas ficariam fora da eidade propriamente dita, se a .proximi­
o material habitual de construção - escurecido pela fumaça, dá. dade da água e da via fluvial não as tivesse atraído todas para o fun­
lhes um aspecto muito pouco agradável. A regra geral são as habita­ do do vale, onde se comprimem c amontoam, lançando pelas cha­
ções nos porões; onde quer que seja posslvel constroem.se estes po­ minés uma espessa fumaça. Isto faz com que Ashton tenha um as­
rões, c é aí que uma importante parte da população vivc. pecto muito mais agradável do que a maior parte das outras cidades
Entre as eidades mais feias, juntamente com Preston c Oldham, industriais; as ruas são largas e limpas, as casas de um vermelho vi­
temos Bolton, a onze milhas a nordeste de Manchestcr. Esta cidade vo têm um ar novo c muito habitável. Mas o novo sistema de cons­
só possui, tal como mé foi dado verificar durante várias estadas, uma trução de casas para trabalhadores também tem os seus lados maus;
:l' .
rua principal, Deansgate, de resto bastante suja, que ao mesmo tem­ todas as ruas possuem uma ruela atrás, escondida, onde se chega'
po serve de mercado e que, mesmo com muito bom tempo, não pas­ por uma estreita passagem lateral que é muito suja. E se bem' que
sa de uma passagem sombria e miserável, embora só tenha, além das eu não tenha visto edifícios com mais de cinqUenta anos, exceto ai.
fábricas, casas baixas de um ou dois andares. Como sempre, a parte guns na entrada - até em Ashton há uas onde as casas são feias
antiga da cidade está particularmente vetustll e é miserável. Atravcs­ e estragadas, cujos tijolos das esquinll6.estão partidos e as paredes
sa-a uma água negra - córrego ou uma sucessão de charcos pesti­ abrem fendas e cujo revestimento de cal se esboroa e cal no interior
lentos? - que contribui para empestear completamente um ar já nada - há ruas cujo aspecto sórdido e cheio 'de fumaça nada fica a dever
puro. às outras cidades da região, embora Ashton seja a exceção à regra.
Mais longe encontra-se Stockport, que, apesar de situada na Uma milha mais para leste fica Stalybridge, também nas mar­
margem do Merscy, que pertence ao Cheshire, faz parte do distrito gens do Thmc. Quando, vindos de Ashton, atravessamos a monta­
industrial de Manchester. Estende-se num estreito vale paralelamen­ nha, descobrimos no alto, à direita c à esquerda, grandes e belos jar­
te ao Merscy, de forma que um lado da rua apresenta uma descida dins rodeando m"kníficas casas, freqüentemente no estilo
brusca para voltar a subir do outro com uma inclinação igualmente elisabetano", quc está para O gótico como a religião protestante an­
acentuada, enquanto a via férrea de Manchester a Birmingham pas­ glicana está para a região católica, apostólica c romana. Ccrn passos
sa sobre um alto viaduto, por cima da cidade c do próprio valc. Stoek­ mais à frente aparece Stalybridge no vale, mas que contrasta surpreen.
por! é conhecida em toda a região por ser um dos buracos mais som- dentemente com aquelas magníficas propriedades e até com as mo-

S4 55

,

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destas casas de Ashton: Stalybridge está situada numa garganta es­ (.6cios ou a passearmos. Mas isto deve-se principalmete' aó fato. de
treita e sinuosa, ainda muito mais estreita que o vale de Stockport, '.1' OS bairros operários - quer por um acordo insconsclente e táCito,
e cujas vertentes são recobertas por um extraordinário emaranhado r.!;quer por intcnção conscicnte e confcssa - estarem separados com
de casas de campo, prMios e oficinas. Logo que lá entramos, vemos ''o:maior rigor das' partes da cidade reservadas à elasse média;'ou,
as primeiras casas exíguas, cheias de fumaça, velhas e arruinadas e .Sentão, quando isso é imposslvel, dissimulados sob o manto da cari-
toda a cidade reOete esta imagem. Há poucas ruas no estreito fundo 'f '. dade. Manchester abriga, no seu centro, um bairro comercial bas­
do vale; a maior parte cruza-se e recruza-se, sobe e desce. Em virtu­ ;.--: tante extenso, com o comprimento de cerca de milha e meia e igual

de desta disposição inclinada, o andar térreo de quase todas as' ca­ it> largura, composto quase exclusivamente de escritórios e armazéns
sas está meio metido no chão; e das montanhas, de onde descobri­ t... (warehouses). lbdo este bairro está quase completamente desabita­
mos a cidade como se a sobrevoássemos, podemos ver a multidão .; . do, c durante a noite vazio c deserto; só as patrulhas da pollcia cir-
de pátios, de ruelas escondidas e de recantos isolados que esta cons­ o eulam com as suas lanternas nas ruas estreitas e sombrias: '"
trução sem plano fez nascer. Juntemos a isto uma sujeira assustado­ Esta zona está sulcada de algumas grandes ruas com muito trá­
ra c compreenderemos a repugnante impressão que causa Stalybrid­ fego ocupadas por luxuosas lojas; nestas ruas encontra-se um ou ou­
ge, apesar dos seus encantadores arredores. tro pavimento ocupado e reina até noite alta uma animação bastan­
'. Mas já basta sobre estas cidadezinhas. lbdas têm as suas pecu­ te grande. Com exceção deste bairro comercial, toda a cidade de Man­
liaridades mas, no fim de contas, os trabalhadores vivem nelas como chester propriamente dita, toda Salford c Hulme, uma parte impor­
em Manchester. Por isso só me refiro ao aspecto particular da sua cons­ tante de Pendleton c Chorlton, dois terços de Cheetam Hill e Brough­
trução e limito-me a apontar que todos os reparos gerais sobre o esta­ -{:: ton, não são senão um bairro operário que rodeia a zona comercial
do das habitações dos operários também se aplicam na totalidade às . :', como uma cintura, cuja largura média é de uma milha e meia. Além
cidades vizinhas. Passemos agora a este grande centro propriamente dito. f desta cintura habitam a média burguesia e a alta burguesia: a média
Manchester estende-se no sopé da vertente sul de uma cadeia , ,,' burguesia em ruas regulares, próximas do bairro operário, sobretu­
de colinas que, partindo de Oldham, atravessa os vales do lrwell e do em Chorlton e nas regiões de Cheetam Hill situadas mais abaixo;
do Medlock e cujo último cume, o Kersall-Moor, é ao mesmo tempo \. a alta burguesia em vivendas com jardins, mais afastadas, em Chorl-
o campo de corridas e O mons sacer" de Manchester. A cidade pro­ ton e Ardwick, ou então sobre as alturas arejadas de Cheetam Hill,
priamente dita situa-se na margem esquerda do Irwell, entre este curso Broughton e Pendleton, em pleno ar puro do campo, 'em habitações
de água e outros dois menores, o Irk e O Medlok, que aqui desá­ { .
esplêndidas e confortáveis, servidas de meia em meia hora ou de quar­
guam no Irwell. Na margem direita deste, encerrada num grande anel to em quarto de hora por Ônibus que conduzem à cidade.47 E o mais
do rio, estende-se Salford, mais a oeste fica Pendleton; ao norte do curioso é que estes ricos aristocratas da finança podem' atravessar
lrwell encontram-se Higher e Lower Broughton, e ao norte do lrk, os bairros operários pelo caminho mais curto, em direção aos seus
Cheetam Hill; ao sul do Medlock encontra-se Hulme, mais para les­ .,
escritórios no centro da cidade, sem sequer notar que estão ladea­
:..

te, Chorlton-on-Medlock e ainda mais longe, mais ou menos a leste dos, à direita c à esquerda, pela mais sórdida miséria•.
de Manchester, Ardwick. lbdo este conjunto é vulgarmente deno­ Com efeito, as grandes ruas que, partindo da Bolsa, deixam
minado Manchester e conta pelo menos com 400.000 habitantes, se­ a cidade em todas a!'direções, estão franqueadas de ambos os lados
não mais.•• A própria cidade está construlda de uma maneira tão por uma fila quase ininterrupta de lojas que pertencem à pequena
peculiar, que podemos habitá-Ia durante anos, sair e entrar nela co­ c média burguesia que os mantêm, em seu próprio interesse, com um
tidianamente sem nunca entrevermos um bairro operário nem sequer aspecto decente c limpo. Claro que estas lojas têm uma certa seme­
encontrarmos operários, se nos limitarmos a cuidar dos nossos ne- lhança com os bairros que estão atrás delas e, por conseguinte, são

56 57
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mais elegantes no bairro eomercial e perto dos bairros burgueses do


que ali, onde masearam as s6rdidas casas operárias; mas de qual­
f do acaso; e então quando penso na classe média declarando apres­
sadamente que os operários se portam o melhor possível, pressinto
quer modo são o suficiente para dissimularem aos olhos dos ricos que os industriais liberais, os big wiligsA8 de Manchester, não estão
senhores e senhoras, de estômago robusto e nervos débeis, a miséria inocentes nesta pudiea disposição dos bairros.

e a sujeira, complementos do seu luxo e da sua riqueza. É isto que
acontece, por exemplo, com Deansgate que, da Vclha Igreja, se diri­
ge para o sul, no princlpio ladeada por armazéns e fábricas, em se­ '.i' .

guida por lojas de segunda classe e algumas cervejarias; mais ao sul, (


quando abandona o bairro comercial, por lojas menos reluzentes, .'.

as quais, à medida que avançamos, se tornam cada vez mais sujas


e cada vez mais intercaladas com tabernas; até que na extremidade
sul, o aspecto das lojas não deixa dúvidas sobre a qualidade dos clien­
tes: são operários e s6 operários. Acontece o mesmo com Market
Street, que parte da Bolsa em direção a sudeste; primciro encontra­
mos belas lojas de primeira categoria, e nos andares superiores fá­
bricas e entrepostos; mais à frente, à medida que avançamos (Picca­
dilly), vemos gigantescos hotéis e entrepostos; mais adiante ainda
(London Road) na região do Medlock, fábricas, tabernas, lojas para
a pequena burguesia e os operários; mais perto de Ardwick Green,
casas reservadas à alta e média burguesia, e a partir daí enormes jar­
dins e enormes casas de campo para os mais ricos industriais e co­
merciantes. Desta maneira podemos, desde que conheçamos Man­
chester, deduzir pelo aspecto das ruas principais o tipo de bairros . Fcnnd . urcct
contíguos, mas, nestas ruas, raramente estamos em condiçôes de co­
nhecer realmente os bairros operários. Sei muito bem que esta dis.
Recordo ainda que os estabelecimentos industriais se situam
posição hip6crita das construções é mais ou menos comum a todas
quase todos à beira de três cursos de água ou dos diferentes canais
as grandes eidades; também sei que os varejistas devem, pela pr6.
que se ramificam através da cidade, e passo a descrever os bairros
pria natureza do seu comércio, monopolizar as ruas principais; sei
operários propriamente ditos. 11:mos primeiro a velha vila de Man­
que em toda a parte se vêem, nas ruas deste gênero, mais casas boni­
chester, entre o limite norte do bairro comereial e o Irk. Aí, mesmo
tas do que feias, e que o valor do terreno que as rodeia é mais eleva­
as mclhores ruas são estreitas e tortuosas -lbdd Street, Long Mill­
do que nos bairros periféricos. Mas em parte alguma constatei um
gate, Withy Grove e Shudehill por exemplo - as casas são sujas,
isolamento tão sistemático da classe operária, afastada das grandes
velhas, arruinadas, "'f.s ruas adjacentes totalmente hediondas. Quan­
ruas, uma arte tão delicada em mascarar tudo O que pudesse ferir
do, vindos da velha igreja, entramos em Long Millgate temos ime­
a vista ou os nervos da burguesia como em Manchester. E, contudo,
a construção de Manchester corresponde menos do que a de qual­ diatamente à direita uma fila de casas em estilo antigo, todas elas
quer outra cidade a um plano preciso. ou a regulamentos de polícia; decadentes; são os vestígios da velha Manchester da época pré­
industrial, cujos antigos habitantes emigraram com os seus bens pa-
a sua disposição, mais do que a de qualquer outra cidade, é fruto

58 59
,

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1\'

i
.

'I,
ainda não é nada em comparação com as ruelas e os pátios dos fun­
dos, onde se chega por becos estreitos e fechados em que duas pes­
soas não conseguem se cruzar.
"
É imposslvel imaginar o desordenado amontoamento das ca­
:t
sas, literalmente empilhadas umas sobre as outras, verdadeiro desa­
fio a qualquer arquiletura racional. E a responsabilidade disto não
,
cabe só às construções que datam da antiga Manchester. Na nossa
 época a confusão foi levada ao máximo porque, 'onde quer que o
urbanismo da época anterior tivesse deixado o menor espaço livre,
reconstruiu-se c remendou-se até que por fim não restou entre as ca­
1: sas um centímetro livre onde fosse posslvel construir. Como prova,
reproduzo aqui um pequeno fragmento da planta de Manchester; de
resto há pior c ela não representa nem a décima parte da cidade.
Esta planta será suficiente para caracterizar a arquitetura irra.
cional de todo o bairro, principalmente perto do lrk. Aqui a mar­
gem sul do lrk é muito abrupta e tem entre cinco e dez metros de
altura; nesta encosta, escarpada, estão implantadas freqüentemente
3 filas de casas, das quais a mais baixa emerge diretamente do rio,
enquanto que a fachada da mais alta se encontra ao nível do topo I

das colinas de Long MiIIgatc. Além disso, nos intervalos, há fábricas i


à beira dos cursos de água. Em resumo, aqui a disposição das casas II
é tão desordenada c apertada como na parte baixa de MilIgate. I
Escal.:
 O'rrlo (amuei" À esquerda c à direita, um grande número de passagens cober­ I
- I MUla,
tas conduzem da rua principal aos numerosos pátios e, assim que I

aI penetramos, ficamos rodeados por uma sujcira c uma sordidez


repugnantes, sem comparação com nada que eu conheça, particu.
larmente nos pátios que descem para à lrk e onde, na realidade, se
encontram as piores habitações que me 'foi dado ver até hoje. Num
I - DoI 2 - Velha larej.: J - Casa dos pobrn:  - Cemitério dos pobre1 (alinha do cami­ destes pátios, precisamente na entrada, na extremidade do corredor
nho de ferro ued.-llverpool paUl cnlre • CI.1.I dos pobres c o ccrnlltrio); j; _ Igttja de 5t.
Mítchd: 6 - Scolland brid.c lobre o Jrk (a rUI que vai d. velha larc:Ja" Scotl.nd bridae t Lona coberto, há banheiros sem portas, c tão sujos que os habitantes para
MiII,ltc); 7 - Ducic Dridac sobre o Irk; 8 - qucn. Irlanda. entrarem ou saírem do pátio têm de atravessar um charco de urina
pestilenta c de excrementos que rodeia estcs locais; é o primeiro pá­
ra bairros melhor construídos, abandonando as casas que achavam tio à beira do lrk, a!ima da Ducie Bridge'9, caso alguém deseje ir
impróprias, para uma população operária de origem predominante­ vê-lo; cm baixo, nas' margens do curso de água, há várias fábricas
mente irlandesa. Deparamos aqui com um bairro verdadeiramente de curtumes que empesteiam toda a região com o fedor que emana
operário que quase não está camuflado, porque nem mesmo as lojas da decomposição das matérias orgãnicas.
e tabernas da rua se dão ao trabalho de parecerem limpas. Mas isto Nos pátios abaixo de Ducie Bridge, é preciso freqüentemente

60 61
---- _. __ .> ._------- -------

descer escadas estreitas e sujas e atravessar muntes Je detritos e de janelas. Ao fundo, destc lado, vemos o cemitérió dos pobres, as es­
imundleies para atingir as casas, tações da ferrovia de Lccds e Liverpool e, atrás, a Casa dos Pobres,
, O primeiro pátio abaixo de Ducic Bridge chama-se Allen's a Bastilha da Lei dos Pobres de Manchester, que, tal como uma ci­
Court; na época da epidemia de cólera (1832) encontrava-se num tal dadela, observa ameaçadoramente do alto da colina, por trás das suas
estado que foi evacuado, limpo e desinfetado com cloro pclo serviço altas muralhas e ameias o bairro operário que se estende à sua frente.
sanitário; numa broehuralo o Dr. Kay fornece uma deserição assus­ Acima de Dueie Bridge, a margem esquerda torna-se mais pla­
tadora do estado deste pátio nessa época. Depois, pareee ter sido par­ na e em contrapartida à direita mais abrupta; mas o estado das ca­
cialmente demolido e reconstruido; em todo o caso, do alto de Ou­ sas dos dois lados do Irk tem tcndêneia a piorar.
cie Bridge ainda se vêem várias paredes em rulnas e enormes montes ': Se deixarmos a rua principal, que continua a ser Long Millga­
de eseombros ao lado das easas de eonstrução mais recente. O que te, voltando à esquerda, sentimo-nos perdidos. Passamos de pátio
se pode ver da ponte - disfarçado dclieadamente aos mortais de pe­ para pátio e não vemos mais do que becos estreitos e passagens imun­
quena estatura por um parapcito de pedra da altura de um homem das; ao fim de alguns minutos estamos completamente desorienta­
- é de resto caracteristico de todo o bairro. Em baixo corre, ou an­
,

'.I dos, não sabendo para onde nos dirigirmos. Por toda a parte, os edi­
tes, estagna o Irk, delgado curso de água, escuro como o breu e de flcios estão semi ou completamente em ruínas, alguns são realmente
cheiro nauseabundo, cheio de imundícies e de detritos que deposita inabitáveis e isto é significativo. Nas casas quase nunca há assoalho
na margem direita que é a mais baixa; com tempo seeo subsistem ou mesmo ladrilhos e as janelas c as portas estão quase sempre par­
.':

nesta margem toda uma série de charcos lamacentos, fétidos, de um tidas e mal ajustadas. Que sujeiral Por toda parte montes de escom.
,
verde eseuro, do fundo dos quais sobem bolhas de gás mefltieo ema­ bros, de detritos e de imundleies; em vez de valetas, poças estagna­
nando um cheiro que, mesmo do alto da ponte, 12 a 15 metros aci­
"I ma da água, é insuportável. O próprio rio, por outro lado, é retido
das e um cheiro que, por si só, impediria qualquer homem, por pou­
co civilizado que fosse, de ali viver. O prolongamento, recentemente
I
II a cada passo por altas barragens, por detrás das quais se depositam concluldo, da estrada de ferro de Lceds, que aqui atravessa o Irk,
!I grandes quantidades de lama e detritos que aí se decompõem.
Acima da ponte vêem-se grandes curtumes, mais longe ainda
fez desaparecer uma parte destes pátios e destas ruelas mas, em con­
trapartida, cxpõs outros à vista. E assim que mesmo sob a ponte da.
tinturarias, fábricas de artigos de osso e fábricas de gás cujas águas estrada de ferro, há um pátio que supera, e muito, todos os outros
usadas e detritos vão todos parar no lrk que, além disso, recolhe o em sujeira e horror, talvez porque até agora estava tão à margem,
conteúdo dos esgotos e dos banheiros que nele desembocam. Pode­ tão afastado, que só dificilmente podia ser atingido; eu mesmo nun.
mos pois imaginar a natureza dos reslduos que se acumulam no rio. ca o teria descoberto sem a construção do viaduto da ferrovia, em­
Abaixo da ponte, avistam-se os montes de lixo, as imundícies, a su­ bora julgasse conhecer muito bem esse local. É quando atravessa­
jeira e a rulna dos pátios, situados na abrupta margem esquerda; as mos uma escarpa abrupta, cntre estacas e,varais, que penetramos neste
casas estão comprimidas umas contra as outras e a inclinação da mar­ caos de pequenos casebres térreos com um único compartimel)to qua­
gem só permite ver uma fração de .ada uma delas, todas negras de se sempre sem assoalho. Aí é, simultaneamente, a cozinha, a sala co­
fumaça, decrépitas, velhas, com as janelas de caixilhos e vidros par­ mum e o quarto.
tidos. O plano de fundo é constituído por velhos edifleios de fábri­ Num destes buracos, que não chegava a medir seis pés de com.
cas, que parecem casernas. Na margem direita, completamente pla­ primento e cinco d! largurall, vi duas eamas - e que eamasl ­
na, levanta-se uma longa fita de casas e de fábricas. A segunda casa que, com uma eseada e uma lareira, enchiam todo o quarto. Em vá­
está em rulnas, sem teto, cheia de escombros, e a terceira é tão baixa rios outros não vi absolutamente nada, se bem que a porta estivesse
que o andar inferior é inabitável e por conseguinte sem portas ncm escancarada e os habitantes lá estivessem instalados. Diante das portas

62 63
eneontrava-se, por toda parte, entulho e detritos; nem se podia ver longas ruelas e becos retillneos, ou então pátios retangularcs que não
se por baixo havia pavimento, limitando-nos a senti-lo com o pé em foram feitos ao acaso; mas se, anteriormente, era eada easa em par.
alguns locais. Todo este conjunto de estábulos habitados por pes­ ticular, aqui são as ruelas e os becos que estão construídos arbitra­
soas estava cercado de dois dos lados por casas e uma fábrica, dõ riamente, sem qualquer preocupaçào com a disposição dos outros.
terceiro pelo rio. Uma rua ora segue numa direção, ora cm outra; a cada passo de­
Exeluindo o pequeno atalho na margem do rio, a única forma semboca num beco ou esquina que nos obriga a voltar ao loeal de
de sair era através de uma estrcita porta que dava para mais outro onde viemos - alguém que não habite neste labirinto há um certo

labirinto de casas, quase tão mal construídas c tão pouco conserva­ tempo, dificilmente encontra a sua saída. A ventilação - se é possl­
das como estas. Estes exemplos bastam. vel usar esta palavra a propósito deste bairro - das ruas e dos pá­
É este o espetáculo de toda a margem do lrk; verdadeiro caos tios é tão imperfeita eomo nas margens do lrk; é verdade que as ea­
de casas amontoadas, mais ou menos inabitáveis e cujo interior está sas são mais recentes, as ruas pelo menos em alguns locais tem ca­
em perfeita harmonia com a sujeira das redondezas. Assim, com<;l nais de escoamento, mas, em contrapartida, possui, em quase todas
é possível desejar que as pessoas sejam limpas? I Nem sequer há con­ :11 as casas, habitações nos subsolos, o que raramente existe no vale do
dições para a satisfação das necessidades mais elementares e coti­ lrk, precisamente por ser uma zona mais antiga e de construção me­
dianas. As instalações sanitárias são tão raras que ou estão constan­ nos cuidada. De resto, a sujeira, os montes de entulho e de cinzas,
,.

temente ocupadas ou ficam muito afastadas para a maior parte das os charcos nas ruas são comuns aos dois bairros e, naquele de que
pessoas. Como se pode querer que as pessoas se lavem quando não falamos agora, constatamos ainda um outro fato muito prejudicial
possuem nas proximidades senão as águas sujas do lrk, e quando à higiene dos habitantes: o grande número de porcos que passam por
as canalizações e as bombas só existem nos bairros decentes? Na ver­ todo o lado nas ruas remexendo o lixo ou que estão fechados no in­
dade, é imposslvel censurar estes i10tas da sociedade moderna, por terior dos pátios em pequenas pocilgas. Os eriadores de porcos alu­
seus alojamentos não serem mais limpos que os ehiquciros que se gam os pátios, como na maior parte dos bairros operários de Man­
eneontram de vez em quando no meio deles. Os proprietários, esses chester, e a[ instalam pocilgas; cm quase todos os pátios há um ou
não tem vergonha de alugar habitações como os seis ou sete porões vários recantos separados do resto, onde os habitantes jogam o lixo
que dão para o cais, logo acima da Scotland Bridge e cujo chão está e detritos. Os porcos alimentam-se disso, c a atmosfera destes pá­
pelo menos dois pés abaixo do nível das águas - quando as águas tios, fechados de todos os lados, fiea empesteado devido à putrefa­
estão baixas - do lrk, que corre a menos de seis pés de distância. ção das matérias animais c vegetais. Abriram uma rua larga e bas­
Ou entào eomo o andar superior da easa de esquina, na outm mar­ tante decente através deste bairro - Millers Streel - dissimulando
gem, imediatamente antes da ponte, cujo andar térreo é inabitável, com bastante êxito o que fica por trás. M.s, se nos dcixarmos arras­
sem nada para tapar os buracos das janelas e da porta. Este é um tar pela curiosidade e entrarmos por uma das numerosas passagens
caso que não é raro nesta região: o andar térreo aberto serve nor­ que levam aOS pátios internos, poderemos constatar, a cada vinte pas­
malmente a toda a vizinhança para satisfazer as suas necessidades, sos, uma destas pocilgas, no sentido exato da palavra.
à falta de locais apropriados. Thl é a cidade de Manchester, e, ao reler a minha descrição, te­
Se deixarmos o lrk para entrarmos pelo outro lado de Long nho de reconhecer q.,. longe de serem exageradas, as suas cores não
Millgate, no coração das habitações operárias, chegamos a um bair­ são suficientemente eruas para darem a noção real da sujeira, da de­
ro um pouco mais recente, que se estende desde a igreja de São Mi­ cadencia e do desconforto, nem a que ponto a construção deste bairro
guel até à Withy Grove c Shudehill. Aqui há, pelo menos, um pouco com uma população de, pelo menos, entre 20 e 30 mil habitantes,
mais de ordem; em vez de uma arquitetura anárquica encontramos é um desafio a todas as regras de salubridade, arejamento e higiene.

64 65
E um tal bairro existe no coração da segunda cidade da Inglaterra, aspecto da cidade nova (lhe new lown).
da primeira cidade industrial do Mundo. Se quisermos ver que espa. ... A cidade nova, tambm chamada a cidade irlandesa (lhe Irish
ço mínimo neeessita o homem para se mover, que pequena quanti­ 7bwn) estende-se alm da cidade velha no flanco de uma colina ar­
dade de ar - e que arl que lhe basta para respirar, a que grau ínfi­ . gilosa entre o lrk c St. Oeorge's Road. Aqui todo o aspecto urbano
mo de civilização cle pode sobreviver, basta visitar estes lugares. Claro, desaparece. Filas isoladas de casas ou formando um conjunto de ruas
trata-se da cidade velha -  o argumento das pessoas daqui, quan­ elevam-se cm certos locais, como pequenas aldeias, sobre o solo ar­
, do lhes mencionamos o estado espantoso deste inferno na 1l:rra ­ giloso c nu, onde nem a relva cresce; as casas, ou melhor, os case­
mas, o que isto significa? Aqui, tudo o que nos suscita mais horror bres, estão cm mau estado, nunca foram reparados, são sujos e têm
e indignação  recente e data da época industrial. As poucas cente­ habitações nos subsolos, úmidas c sórdidas; as ruelas não têm nem
nas. de casas provenientes da vclha Manchester já foram abandona­ pavimento nem canais de escoamento; cm contrapartida abrigam nu­
das há muito tempo pclos seus primitivos habitantes; foi a indústria merosas colônias de porcos, fechados cm pequenos pátios ou pocil­
que fez com que fossem invadidas por multidões de operários que gas ou então passeiam em liberdade na encosta. Aqui .os caminhos
atualmente as habitam; foi a indústria que obrigou a construir em são de tal maneira lamacentos que  preciso que O tempo esteja mui­
cada espaço que separava estas velhas casas, a fim de aí abrigar as to seco para podermos sair sem nos enterrarmos a cada passo at
massas que obrigava a vir do campo e da Irlanda; foi a indústria os tornozelos. Perto de St. Oeorge's Róad onde as diferentes ilhotas
que permitiu aos proprietários destes estábulos alugá-los como se juntam-se, entramos numa interminável srie de ruelas, becos, ruas
fossem habitações de seres humanos, explorando a misria dos ope­ nos fundos c pátios, cuja densidade c desordem aumentam à medi­
rários, minando a saúde de milhares de pessoas em seu exclusivo pro­ da que nos aproximamos do centro da cidade. No entanto, estas vias
veito; foi a indústria que fez com que o trabalhador, recm-Iiberta­ 'i
estão,  verdade, freqüentemente pavimentadas ou, pelo menos, pos­
do da servidão, pudesse ser utilizado de novo como simples mate­ suem passagens para pedestres pavimentadas c canais de escoamen­
rial, como coisa, a ponto de ter de se deixar encerrar em habitações, to; mas a sujeira c o mau estado das casas, e sobretudo dos porões,
que ningum mais ocuparia, assumindo o dircito de deixá-Ia cair em permanecem os mesmos. •
ruínas, por um alto preço. Isto foi obra da indústria, exclusivamen­ Cabem aqui alguns reparos sobre a maneira como são habi­
te, ela que não poderia existir sem estes operários, sem a misria e tualmente construidos os bairros operários em Manchester. Vimos
a servidão destes seres. É verdade que a disposição inicial deste bair­ na cidade velha que freqüentemente o acaso presidia ao agrupamen.
ro era má, pouca coisa de bom se poderia fazer dele; mas, tcrâ'"o os to das casas. Cada casa  construfda sem ter em conta as outras e
proprietários prediais c a Administração feito fosse o que fosse para os intervalos de forma irregular entre as casas chamam-se, à falta
o melhorar, quando aí começaram a construir? Pelo contrário: onde de melhor termo, pátios (courls). Nas .zonas um pouco mais recen­
ainda havia uma parcela de terra livre construiu-se uma casa; onde tes deste mesmo bairro, c noutros bairros operáriosS2 que datam dos
ainda havia uma saída suprflua ergueu-se um muro; o valor fun­
primeiros tempos do desenvolvimento industrial nota-se um esboço
diário aumentou com o desenvolvimento industrial e quanto mais de plano. O intervalo que separa duas ruas está dividido em pátios,
se elevava, mais freneticamente se construra, sem a menor preocu­ mais regulares, a maior parte das vezes quadrangulares, mais ou me­
pação com a higiene e o conforto dos habitantes, com a única preo­ nos como se vê nl' figura que segue:
cupação de obter o maior lucro possível e de acordo com o princí­ Estes pátios foram inicialmente dispostos assim: as ruas se co­
pio: por pior que seja um casebre, hd sempre um pobre que não po­ municam com eles por passagens cobertas. Se este tipo de construo
de pagar um melhor. Mas que quercis,  a cidade velha, e  com este ção desordenada já era muito prejudicial à saúde dos habitantes, na
argumento que a burguesia se tranquiliza. Vejamos então qual  o medida cm que impedia o arejamento, este mtodo de encerrar os

66 67
operários em pátios fechados por todos os lados o c mais ainda. Aqui
comuns com as da terceira fila de casas que dão para o lado oposto
não há qualquer possibilidade de o ar ser renovado. As chaminés
da rua, c correspondem a um aluguel mais baixo que a primeira fila
das casas - se o fogo não está aceso - são as únicas saídas possl­
mas maior que a segunda. A disposição das ruas c mais ou menos
veis para o ar retido no inlerior dos pátios.sl
assim:

RUA
"''''r. fila y,

', rito elo mO;. C

A
1"";........ Ala
COf'\ pit-i
RUA
lUA
I
\ ,Acrescente..se ainda que as casas cm torno cJcstcs pálios são
construída.-; freqüentcmente duas a.duas, sendo a parede dó fundo
Este sistema de construção garante, para a primeira fila de ca­
sas, uma boa ventilação c mantem, da mesma maneira, a ventilação
divis6ria, c isto já é o siificiente para impedir um arejamento satis­ da terceira fila, cm comparação com as edificações anteriorcs; cm
fat6rio c com'pleto. E, como o policiamento das ruas não se preocu­ contrapartida, a fila do meio está pelo menos tão mal arejada como
pa com o estado destes pátioss" como tudo quanto aí c jogado apo­ as casas eonstruldas cm pátios c as ruelas dos fundos estão no mes­
;<, .
drece tranqüilamente, não devemos nos espantar com a sujcira e com mo estado de sujeira e têm uma aparência tão horrível quanto os
a quantidade de cinzas e detritos que ai encontramos. Visitei pátios; ,' pátios. Os empreiteiros preferem este tipo de construção porque ele
';,j'
perto de Millers Street, que estavam pelo lI)enos mcio pc abaixo do ,

poupa espaço c dá-lhes a possibilidade de explorarem mais à vonta­


nível da rua principal, e que não tinham a menor valeta para escoa­ de os trabalhadores mais bem pagos pedindo-lhes aluguéis mais ele.
mento das águas da chuva que aí estagnavam ate .scprl . vados pelas casas da primeira e terceira filas. Estes três tipos de cons­
Mais tarde, começou a adotar-se outro estilo de construção, que trução de casas operárias encontram-se cm toda a cidade de Man­
. c agora o mais corretamente. Não se constroem as casas operárias chester c atraves do Laneashire e do Yorkshire, muitas vezes confun­
isoladamente, 'mas, às dúzias ou mesmo às grosas, c um único em­ didos mas de modo geral sufieientemante distintos para, com base
preiteíro constr6i ao mesmo lempo uma ou várias ruas. Estas estão neles, podermos deduzir a idade relativa dos diversos bairros da ci­
dispostas da seguinte maneira; uma das fachadas (Cr. o desenho abai­ dade. O terceiro sistema, o das ruas dos fundos predomina nitida­
xo) compreende as casas de primeira categoria que têm a sorte de mente no grande bairro operário, a leste de St. Oeorge's Road, dos
possuir uma porta c um pequeno pátio c que correspondem ao alu­ doís lados de Oldham Road e Oreal Aneoats Street, c é também o
guei mais alio. Por Irás das paredes destas easas, há IIl1la eslrcila ruela,
mais comum nos utros bairros operários de Manchester e nos
a rua dos rllndos (/wck ,\II ceI), rechada de ambos os lados e cujo
arredores.
acesso c feilo laleralmente por Ulll estrciln caminho ou por uma pas­
É no grande bairro que mencionamos, c a que chamam An­
sagem eobena. As easas que dão para esla ruela pagan] O aluguel
coats, que estão instaladas, ao longo dos canais, a maior parte das
mais baixo, e são as I1mis descuidadas. As suas parcdcs de t(ás são
fábricas c as mais importantes - gigantescas construções de seis ou

68
69
... '. •• •• _ •• _ ••• __........... .'",;,1 •

sete, andares, que com as suas chaminés esguias dominam. do alto.


as casas baiJ<as dos operários. A população do bairro compõc-sc prin­
cipalmente de operários de fábrica e, nas piores ruas, de tecelões ma­
nuais. As ruas situadas nas imediações do centro da cidade são as
'.' .

"
010101010
mais velhas. portanto as piorcs. cmbora estejam pavimentadas e pro­
vidas de valetas; incluo af as ruas paralelas mais próximas: Oldham
Road c Oreat Aneoats Street. Mais ao norte encontramos muitas ruas
de construção recente: af as casas são graciosas c limpas; as portas
c as janelas são novas c pintadas recentemente, os interiores são lim­

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pos; as próprias ruas são mais arejadas, os espaços livres são maio­
res e mais numerosos. Mas isto só se aplica à menor parte das habi­
tações porque existem cm quase todas as casas habitações nos sub­
solos; muitas ruas não estão pavimentadas c não têm valetas de es­
coamento e sobretudo o aspecto limpo não passa de uma aparência ai se encontra. à posse do seu primeiro proprietário. sem que este
que desaparece ao fim de dez anos. Com efeito, o modo de constru­ tenha de pagar. seja o que for, como indenização pelas instalações
ção das diferentes casas não é menos condenávcl que a disposição que af foram feitas. O locatário do terreno calcula O preço destas
das ruas'. A primeira vista, 'estas casas parecem muito bonitas c bem instalações de forma a que tenham o menor valor possfvel quando
feitas, as paredes de tijolos maciços cativam quem passa e, quando o contrato expirar; como as casas deste gênero só são cOllstrufdas
percorremos uma rua operária de construção recente sem nos preo­ vinte ou trinta anos antes desta data. compreende-se que os emprei­
cuparmos mais com as ruelas dos fundos nem com a forma como teiros não queiram ter grandes despesas com elas. Acrescente-se que
as casas estão construldas. nos sentimos inclinados a concordar com estes empreiteiros. durante muito tempo pedreiros, carpinteiros ou.
a opinião dos fabricantes liberais, que afirmam que cm parte algu­ industriais, quase não fazem reparos, em parte porque não querem
'I'
ma os operários estão tão bem alojados como na Inglaterra. Mas reduzir o lucro dos aluguéis, em parte porque se aproxima o fim do
quando olhamos de perto, vemos que as paredes destas casas são as aluguel do terreno construfdo, e porque, em virtude das crises eco­
.,'"
mais estreitas passiveI. As paredes exteriores, que sustentam o sub­ "" nOmicas c das privações que as seguem freqUentemente, ruas lntei.
solo. o rés-do-chão e O telhado têm. quanto muito, a espessura de
ras ficam desertas. Por conseguinte, as casas deterioram-se rapida­
um tijolo, estando, em cada camada horizontal. os tijolos dispostos ",
mente c tornam-se inabitáveis. Com efei,to. calcula-se que as habita­
uns ao lado dos outros. no sentido do comprimento. ções operárias só são habitáveis cm média quarenta anos. Isto pode
Mas vi em muitas casas da mesma altura - algumas cm cons­
parecer estranho, quando vcmos as belas paredes das casas novas.
trução - em que as paredes exteriores não tinham senão meio tijo­
quc parccem durar vários séculos, mas é assim mesmo - a avareza
lo de espessura c onde estes. por conseguinte, não estavam dispostos que preside à construção. a ausência sistemática de reparos, os pe­
no sentido do comprimento, mas no da largura, ajustados pelo lado !1. ríodos freqüentes ettl que não são ocupadas, a continua mudança
mais estreito.
de locatários e, por outro lado, as depredações que estes cometem
Isto, cm parte, a fim de economizar os materiais, cm parte tam­
(a maior parte são irlandeses) durante os dez últimos anos cm que
bém porque os empreiteiros nunca são os proprietários do terreno:
a casa é habitável; arrancam freqUentemente as vigas de madeira pa­
limitam-se a alugá-lo à moda inglesa por vinte, trinta. quarenta. cin­
ra fazer fogo; tudo isto faz com que ao fim de quarenta anos estas
qüenta ou noventa anos. após o que este retorna. com tudo o que

70 71

casas cstejam cm rulnas. É por isso que a região de Aneoats, eujas Ao sul de Oreal Ancoats Street estende-se um grande bairro
easas datam do descnvolvimento industrial e, em grande parte, ape­ operário semiconstrufdo, uma zona de colinas, sem vegetação, com
nas deste séeulo, conta apesar de tudo eom grande quantidade de liIas ou grupos isolados de casas, dispostos desordenadamente. Nos
casas velhas e arruinadas, cm que a maioria já atingiu o último eslá­ intervalos, ficam loeais vazios, argilosos, desiguais, sem vegetação
gio de habitabilidade. Não quero calcular aqui a quantidade de ca­ e conseqüentemente dificcis de atravessar com tempo chuvoso. As
pitais que foram desperdiçados deste modo, nem como um investi­ casas são todas sujas e velhas, freqüentemente situadas em buracos
• mento inicial um pouco mais elevado, bem como pequenos reparos profundos, que lembram a cidade nova. O bairro que é atravessado
teriam sido suficientes para que todo este bairro se mantivesse lim­ pela via férrea de Birmingham é aquele em que as casas estão mais
po, conveniente e habitável durante muitos anos. Só me interessa a ,{
amontoadas e é, portanto, o pior.
situação das casas e dos seus habitantes, e é preciso marcar bem que  Neste local, os numerosos meandros do Medlock percorrem um
não há sistema mais nefasto c mais desmoralizante do que este para vale quc cm certos locais é perfeitamente análogo ao do rio lrk. De
alojar os trabalhadores. ambos os lados do rio de águas cstagnadas e nauscabundas, tão ne­
O operário é constrangido a habitar estas casas em mau esta­ gro como o breu, estcnde-se, desde a sua entrada na cidade até à con­
do porque não pode pagar o aluguel de outras melhores, ou então fluência com o lrwell, um cinturão de fábricas e de habitações ope­
porque nào existem melhores nas proximidades da fábriea, e até tal­ rárias; estas encontram-se em estado deplorável.
vez porque estas casas pertencem ao industrial e este só empregue Freqüentemente, a margem é escarpada e as construções des­
os que aceitam habitar uma destas moradias. Claro que esta dura­ cem até o rio, tal como no lrk; e as ruas e casas estào mal construI­
ção de quarenta anos não é rlgida, porque se estas habitações estão das tanto do lado de Manchester como do de Ardwick, Chorlton
situadas num bairro eom grande densidade de imóveis c se, por con­ ou Hulme. O local mais tenebroso (se cu quisesse falar pormenori­
seguinte, apesar da renda predial mais elevada, há sempre possibili­ zadamente de todos os bloeos de imóveis nunca mais acabaria) situa­
dades de encontrar locatários, os empreiteiros fazem alguns esfor­ se do lado de Manchester, a sudoeste de Oxford Road e chama-se
ços para assegurar a habitabilidade relativa de tais habitações para Pequena Irlanda (LilIle Ireland). Numa profunda depressão de ter_O
mais de quarenta anos. Mas neste caso não ultrapassam o mlnimo rena, numa curva do Medlock, e cercada pelos quatro lados por gran­
indispensável, e então estas casas reparadas são em muitos casos as des fábricas e margens altas cobertas de casas ou aterros, estão cerca
piores. De tempos em tempos, quando se receiam epidemias, a cons­ de 200 casas repartidas em dois grupos, sendo freqUentemente a pa­
ciência dos serviços de higiene, normalmeme muito sonolenta, des­ rede de trás da divisória; habitam aI eerca de 4.000 pessoas, quase
perta um pouco. Então empreendem expedições aos bairros operá­ todas irlandesas. As casas são velhas, sujas e do tipo mais pequeno:
rios, fecham toda uma série de porões e de casas, como foi o caso as ruas são desiguais e cheias de saliências, em parte sem pavimento
de várias ruelas nas cercanias de Oldham Road. Mas isto não dura nem valetas; por todo o lado há uma quantidade considerável de
muito; cm breve estas habitações voltam a ser oeupadas e os pro­ imundícies, detritos e lama nauseabunda entre as poças estagnadas;
prietários ainda têm mais facilidade em encontrar locatários; sabe­ a atmosfera está empesteada com estas emanações, enegrecida e pe­
se bem que os fiscais dos serviços de higiene não voltarão tão cedo! sada de fumaça de Ipllla dúzia de chaminés de fábricas. Uma multi­
Esta parte leste c nordeste de Manchester é a única em que a dão de mulheres e crianças esfarrapadas vagueiam por aqui, tão su­
burguesia não se instalou, pela forte razão de que o vento dominan­ jas como os porcos que chafurdam nos montes de cinzas e nas po­
te, que sopra durante dez ou onze meses do ano, de oeste a sudoeste, ças: Em resumo, todo este local oferece um espetáculo tão repug­
arrasta para aI a fumaça de todas as fábricas. Esta fumaça os operá­ nante como os piores bairros das margens do Irk;?- população que
rios que a respirem sozinhos. vive nestas easas arruinadas, por detrás destas janelas quebradas nas

72 73
I • • h+hn+- -n

t'. cionalmente fechada, na verdade deve situar-se no esealão mais bai­


);:.. XI) da humanidade. lãl é a conclusão e a impressão que o aspecto
( deste bairro, visto do exterior, impõe ao visitante. Mas, que dizer,
;;" ao sabermosss que em cada uma destas pequenas casas, que, quan­
fi'.' do muito, têm duas divisões e um sótão, por vezes um porão, mo­
I: mm vinte pessoas e que em todo este bairro há uma única instalação
1:/ lllJlitária - quase sempre ocupada, claro - para cerca de cento e
.;:' vinte pessoas e que apesar de todos os sermões dos médicos, apesar
t: da emoção que se apoderou da inspeção da higiene durante a epide­
",' mia de cólera, quando descobriu o estado da Pequena Irlanda, hoje,
no ano da graça de 1844, tudo está quase no mesmo estado que em
1831? O Dr. Kay relata que, neste bairro, não são apenas os porões
mas também os próprios andares térreos que são úmidos; antes, al­
guns dos porões tinham sido entulhados, explica ele, mas pouco a
pouco desentulharam-nos e agora são habitados por irlandeses; num
porão em que o solo ficava abaixo do nível do rio, a água sala conti­
nuamente de um buraco de evacuação fechado com argila, a ponto
., de, todas as manhãs, o locatário, um tecelão manual, ter de esvaziar
: o porão e jogar a água na rua. S6
;, Mais abaixo, encontra-se H ui me, na margem esquerda do Me-
l.,'I
dlock, cidade que não passa de um grande bairro operário cujo es- •

. tado, em quase todos os aspectos, é semelhante ao do bairro de An-


coats. Os bairros de grande densidade habitacional estão freqUente­
mente em mIsero estado e quase sempre em ruínas; os bairros com
),; população menos densa e de construção mais recente são mais are.
jados, mas também freqUentcmente atolados de lama. Em geral, as
casas são úmidas e providas de uma rua de fundos e habitações nos
subsolos. Na outra margem do Medlock, em Manchester prop.ria­
mente dita, existe um segundo grande bairro operário que se estende
de ambos os lados de Deansgate até o bairro comercial e que em cer­
tos locais não fica em nada atrás da cidade velha. Principalmente
LItTU IJtEJ.»lD (1849) junto do bairro cOll1flrcial entre Bridge Street e Quay Street, Prin.
cess Street e Peter Street, o amontoamento das casas ultrapassa em
quais foi colocado papel oleado e destas portas rachadas com os ba­ alguns locais o dos mais estrcítos pátios da cidade velha. Encontra­
tentes podres e até nos porões úmidos e sombrios, no meio desta su­ mos ai compridas vielas, entre as quais há pátios com cantos e re­
jeira e deste cheiro inqualificáveis, nesta atmosfera que parece inten- cantos, e passagens cujas entradas e saídas estão arranjadas com tão
pouco método que, em semelhante labirinto entramos a cada passo
74
7S

I
I
I
I
, I

num beco sem salda ou enganamo-nos na saida, sc não conhecemos balho de percorrer estas ruelas, de darmos uma olhada nestas por­
I a fundo cada passagem e cada pátio. É nestes locais exiguos, arrui­ tas e janelas abertas nos porões e nas casas, verificamos a cada mo­
! mento que os operários de Salford vivem em casas nas quais qual­
I
nados e sujos, que habita, segundo o Dr. Kay, a classe mais amoral
,

de toda a Manchester, cuja profissão é O roubo ou a prostituição, quer limpeza ou conforto é impossível. A mesma situação pode ser
e que, segundo parece, ainda hoje existe. Quando -a inspeção de hi­ encontrada nos bairros mais afastados de Salford, em Islington, perto
giene aqui fez uma busca em 1831, descobriu uma insalubridade tão de Regent Road, e po.r trás da estrada de ferro de Bolton. Nas habi­
grande como nas margens do Irk ou na Pequena Irlanda (posso tes­ tações operárias entre Oldfield Road e Cross Lane, ou em algumas
temunhar que ainda hoje está na mesma) e entrc outras coisas, uma de Hope Street, encontramos um grande número de pátios e ruelas
úniea instalação sanitária para 380 pessoas na Parliament St., e ou­ num estado dos mais deploráveis, rivalizando em sujeira e densida­
tra para trinta casas com grande densidade populacional na Padia­ de de população com a cidade velha de Manchester. Aqui'encontrei
ment Passage. um homem que parecia ter sessenta anos e vivia num estábulo. Ti­
Quando vamos a Salford, ao atravessar o Irwell encontramos, nha construido 'neste buraco quadrado, sem janelas, sem 'soalho nem
numa penInsula formada por esle rio, uma cidade com oitenta mil chão pavimentado, uma espécie de chaminé; tinha instalado aI um
habitantes que, para falar a verdade, não passa de um grande bairro catre e ai morava, se bem que a chuva penetrasse através do teto em
operário atravessado por uma única e larga rua. Salford, outrora mais ruínas. O homem, demasiado idoso e fraco para suportar um traba­
importante que Manchester, era nessa época o principal centro do lho regular, ganhava seu sustento transportando estrume e outras coi­
distrito que a rodeia c que tem ainda o seu nome: Salford Hundred. ':. sas no seu carrinho de mão; um mar de esterco quase atingia o seu
É por isso que também aqui há um bairro bastante velho, e conse­ estábulo. '

qüentemente, insalubre, sujo e em ruínas, em frente da velha igreja Eis uma descrição dos diferentes bairros operários de Manches-
de Manchester, e que está em tão mau estado como a cidade velha, ter, tais como tive ocasião de os observar durante vinte meses. Para
na outra margem do Irwell. Um pouco mais afastado do rio estende-se . 'resumir o resultado das nossas perambulações através destas locaii­
um bairro mais reccnte, mas que também data de há mais de 40 anos, !'
dades, diremos que a quase lotalidade dos 350 mil operários de Man••
apresentando, em conseqüência, um aspecto decrepto. Toda Salford chester e dos seus arredores habita em casas em mau estado, úmidas
foi construída cm pátios ou ruelas tão estreitos que me lembraram e sujas; que as ruas por onde têm de passar estão na maior parte
os becos mais estreitos que conheci, em Gênova. Deste ponto de vis­ das vezes num estado deplorável e extremamente sujas e que foram
ta, a maneira como Salford está construída ainda é bem pior que construídas sem o menor cuidado de ventilação, com a única preo­
a de Manchester, e o mesmo se pode dizer a respeito da limpeza. Se cupação do maior lucro posslvel para. o construtor. Nas habitações
em Manchester a inspeção ia pelo menos de tempos em tempos _ operárias de Manchester não há limpeza nem conforto, e, portanto
uma vez de seis ou de dez em dez anos - aos bairros operários, para não há vida familiar possível; só uma raça desumanizada, degrada­
fechar as piores habitações e limpar os cantos mais sujos destes es­ da, rebaixada a um nIvel bestial, tanto do ponto de vista intelectual
tábulos de Augias, parece nunca ter fcito nada em Salford. Decerto como, moral, fisicamente mórbida, poderia sentir-se à vo'ntade e
que as estreitas ruelas transversais e os pátios de Chapei Street, Green­ sentir-se em casa. E não sou o único a afirmá-lo. Vimos que o Dr.
gate e Gravei Lane nunca foram limpos desde que foram construi­ Kay fornece uma delltrição perfeitamente análoga e, além disso, ain-
dos; atualmente a via férrea de Liverpool atravessa estes bairros num da vou citar as palavras de um liberal, de um homem cuja autorida.
alto viaduto e fez desaparecer muitos dos mais sujos recantos, mas " de é reconhecida c apreciada pelos industriais, adversários fanáticos
o que é que isso altera? Ao passar no viaduto, ainda podemos ver de qualquer movimento operário independente, N. SeniorS7;
daqui de cima bastante podridão e miséria, e se nos dermos ao tra-

76
77
. .

Quando percorri as habitações dos operários das fábricas na cidade ir­ tagnadas, montes de lixo, detritos e outros dejetos.'" É evidente que
landesa, cm Aneoau c na "Pequena Irlanda" a minha única surpresa era praticamente imposslvel limpar estes estábulos de Augias antes
foi ver como era poulvcl se conservar uma saúde razoável cm tais iD­ de ehegar a cólera. Foi por isso que se contentaram em limpar al­
eais. estas cidades - porque do cidades pela sua extensão c pela sua
guns dos piores cantos e deixaram o resto eomo estava. Diga-se de
populaçAo - foram edificadas com desprezo 101301 por lodos os prind.
pios. cxcelo O lucro Imediato dos especuladores encarregados da cons­ passagem que alguns meses mais tarde os locais limpos já estavam
truçAo. Um carpinteiro c um pedreiro associam-se para comprar (quer no mesmo estado de sordidez, como o prova a Pequena Irlanda.
dizer, para alugar duranle um ccrlo número de anos) uma série de ID­ Quanto ao interior destas casas a mesma comissão diz mais ou me­

eais para construç10 c para os cobrirem de pretensas casas. Num local, :}.
nos o que já sabemos de Londres, Edimburgo e outras cidades.
enconlramos uma rua inteira que seguia o curso de uma vala, para le­
.,
rcrn assim os porões mais profundos sem as despesas de escavação. po­
Freqüentemente. todos os membros de uma farnllia irlandesa estio amon.
rôcs Que nAo se destinavam a servir de despensa ou armalm mas sim
toados numa única coma,' freqüentemente.  um monte de palha seca
de habitaçao para seres humanos. Nem uma única destas casas esca­
pou  cdlera. E, em geral, as ruas destes arredores não são pavimenta­ e de cobertores feilos com velhos sacos Que os cobre a todos numa con­
das, tm um monte de estrume ou uma poça no meio, as casas estão
fusa amj,lgama de seres, Que a necessidade. o embrutecimento e o de­

encostadas umas 1s outras. senl'vcntilação nem drenagem no chão, e semprego rebaium do mesmo modo. Os inspetores encontraram mui.
famllias inteiras vêem-se obrigadas a viver no eanto de um porão ou tas vezes 2 famnias numa casa de duas divisões. Uma delas servia de

de uma mansarda.
quarto de dormir para todos, a outra era a sala de jantar e a cozinha
em comum. FreqUentemente. mais que uma (amnia habitava num p0­
rão úmido onde doze ou dezcsseis pessoas estavam amontoadas numa
Já mencionei anteriormente a atividade invulgar que a inspe­
atmosfera pestilenta. A esla e outras fonteJ de doença Juntava-se o fato
ção sanitária despendeu durante a epidemia de eólera em Manehes­ de se criarem porcos, alm de se enconlrarem situações verdadeiramen­
ter. Com efeito, quando esta epidemia começou a se aproximar, te abjetas e das mais revo!tantcs.(,(l
apoderou-se da burguesia desta cidade um medo generalizado. De
repente lembrou-se das habitações insalubres dos pobres, e tremeu Dcvemos acrescentar que numerosas fammas, não tendo senão
com a certeza de que cada um destes bairros miseráveis ia constituir um quarto, recebem pensionistas e hóspedes de noite em troea de
um foco de epidemia, a partir do qual esta estenderia seus tentácu­ algum dinheiro; é freqüente que pensionistas dos dois sexos deitenl­
los em todos os sentidos para as rcsidencias da classe proprietária. se na mesma cama que o easal; que, por exemplo, segundo o Relató­
Designaram uma eomissão de higiene para investigar estes bairros rio sobre o Estado Sa/litdrio da Classe Operdria6' foi eonstatado pe­
e remeter ao Conselho Municipal um relatório exato sobre a sua si­ lo menos seis vezes em Manchester o caso de um homem, da mulher
tuação.l8 O Dr. Kay, ele próprio membro da comissão, que visitou e da cunhada adulta que dormiam na mesma cama. Os alberques
especialmente cada distrito de policia, com exceção do décimo pri­ também são muito numerosos aqui; o Dr. Kay fIXa o número em 207
meiro, fornece-nos alguns extratos do seu relatório. Ao todo foram na própria Manchester, em 1831, e dede então devem ter aumenta.
inspecionadas 6.951 casas, naturalmente apenas em Manchester, com ,',"
do sensivelmente. Cada um alberga vinte ou trinta hóspedes, num
exclusão de Salford e outros arredores; 6.565 tinham necessidade ur­ total geral de cinco a seis mil pessoas todas as noites. O catáter des­
gente de Serem eaiadas interiormente, em 960 tinham sido negligen­ tas casas e dos seus clientes é igual ao das outras cidades. Cinco a
ciadas as necessárias reparações (\Vere out of repair), 939 eram des­ sete eolchões estãr, no chão de cada quarto, sem camas, e i.nstlilam­
providas de instalações de escoamento suficientes, 1.435 eram úmi­ se ar tantas pessoas quantas houver, todas misturadas. Desnecessá­
das, 452 mal arejadas, 2.221 desprovidas de instalações sanitárias. ':, rio desercver o ambiente físico e moral reinante nestes antros de vI­
Das 687 ruas inspecionadas, 248 não estavam pavimentadas, 53 só cio. Cada uma destas casas é um centro de crime e cenário de atas
o estavam parcialmente, 112 mal arejadas, 352 continham poças es- que rcv,?ltam a humanidade e que nunca teriam sido perpetrados sem

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.
''

esta eentralização imposta de imoralidade. Segundo Gaskell", o nú.


mero'de indivIduas que vivem em subsolos na própria cidade de Man. das de temperatura, obriga quase toda a e1asse média a trazer por
ehester é de 20.000. O Week/y Dispar/eh indica "scgundo relatórios
;' cima da pele roupa de flanela, sendo quase generalizado o uso de
oficiais", a porcelllagem de 12'10 da elasse operária, o que parece cor. eachecóis e camisas de flanela. A classe operária não só desconhece
,.
responder a este número; sendo o número de trabalhadores, aproxi. esta precaução, como também quase nunca tem recursos para ado
madamente 175.000, 12'10 são 21.000.6] Nos arredores as habitações quirir o menor fio de lã. Ora, os pesados tecidos de algodão mais
em subsolos são pelo lIIellOS igualmente numerosas e assim o núme­ espessos, mais rfgidos e mais densos que as fazendas de lã, prote.
• ro de pessoas que vivem em subsolo no aglomerado de Manchestcr gem apesar de tudo muito menos do frio e da umidáde. A espessura
eleva.se pelo menos a 40 ou 50.000. Eis o que se pode dizer das habi. e a natureza do tecido fazem com que este conserve muito tempo
tações operárias nas grandes cidades. A maneira como é satisfcita a umidade e, finalmente, não têm a impermeabilidade da lã carda.
a neeessidade de abrigo é um critério que nos permite saber como da. E quando um dia o operário pode adquirir um paletó de lã para
são satisfeitas todas as outras necessidades. É fácil coneluir que só o domingo, tem de ir às lojas mais baratas onde lhe fornecem um
uma população esfarrapada, mal alimelllada, pode morar nestes suo tecido ordinário chamado devil's dus/65 que "só é feito para ser ven­
jos covis. E, na realidade, é o que acontece. As roupas dos operá­ dido e não para ser usado" e que se rasga ou gasta ao fim de quinze
rios, na maior parte dos easos, estão em péssimo estado. Os tecidos dias. Ou então tem de comprar numa loja de roupas usadas um ve.
utilizados para a sua confecção já não são os mais apropriados; o lho paletó, meio puldo, que só dura algumas semanas. Mencione­
linho e a lã quase que desapareceram do guarda-roupa de homens mos ainda o mau estado do guarda-roupa da maior parte das pes­
e mulheres sendo substituldos pelo algodão. As camisas são em pa­ soas e a necessidade em que se vêem muitas vezes de pôr as suas me.
no de algodão, branco ou colorido; do mesmo modo, as roupas das Ihores roupas numa casa de penhores. Contudo, para um grande nú­
mulheres são de chita indiana e raramente se vê secar nos varais rou. mero, principalmente de ascendência irlandesa, as roupas são ver.
pas de baixo de lã. Os homens usam na maior parte das vezes calças dadeiros farrapos, muitas vezes impossíveis de remendar ou cuja cor
de veludo ou de qualquer outro<!.ecido pesado de algodão e casacos original é imposslvel de reconhecer, tantas vezes foram remendadas.
e paletós do mesmo pano. O paletó de veludo de algodão (fus/iall) Contudo, os ingleses, ou os anglo.irlandeses, continuam a remendá•.
tornou-se mesmo o traje lípico dos operários; fus/iall-jaeke/s é as. las e tornaram-se mestres nesta arte; lã ou linho sobre veludo ou vice.
sim que se ouve chamar os operários, é assim que estes se chamam versa, pouco lhes importa; quanto aos autênticos emigrantes irlan.
a si mesmos em oposição aos cavalheiros vestidos de lã (broad-c1o/h). .:. deses, quase nunca remendam, salvo em caso de extrema necessida•
expressão também utilizada para designar a e1asse média. Quando de, quando as roupas ameaçam esfarrapar.se; é comum vê-los com
Feargus O'Connor, o chefe dos cartistas, veio a Manehester durante pedaços de camisa que passam através dos rasgos do casaco ou das
a insurreição de 184264, apareeeu com um paletó de veludo perante calças; trazem:como diz Thomas Carlyle66;
os aplausos arrebatados dos operários. Na Inglaterra, o uso dos cha.
péus está generalizado, mesmo entre os operários; têm as mais di. Um paletó de farrapos: vcsti.lo ou dc:spi.lo representa uma das opera­
ções mais delicadas à qual só se procede nos dias de (esta c cm momen.
versas formas: redondos, cõnicos ou cillndricos, com abas largas, es.
tos particularmente favoráveis.
treitas ou sem abas. Nas cidades industriais só os jovens usam bo­
Os irlandeses •também introduziram o hábito, outrora desco-
nés. Quem não tem ehapéu, faz um gorro baixo e quadrado, de papel.
Todas as roupas dos operários, mesmo supondo que estejam nhecido dos ingleses, de andarem descalços. Atualmente vemos em
em bom estado, são muito pouco adaptadas ao clima. O ar úmido
todas as cidades industriais um grande número de pessoas, sobretu­
da Inglaterra que, devido às bruscas mudanças de clima, provoca que-
do crianças e mulheres, que circulam descalços e pouco a pouco este

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-,--------- --- --

Mbito também vai conquistando os inglcscs pobrcs. ram confiscados 64 gansos de Natal recheados, que não tinham sido
O que é verdade para as roupas, também o é para a alimenta­ vendidos em Liverpool e tinham sido transportados para Manches­
ção. Aos trabalhadores cabe o que a e1asse possuidora acha excessi­ ter, onde chegaram ao mercado estragados e cheirando mal.
vamente mau. Nas grandes cidades inglesas pode-se ter tudo e da Este epis6dio apareceu, na época, no Manchester GuarrJianM
melhor qualidade, mas isso custa muito caro; o trabalhador que pre­ com os nomes c o montante da multa. Durantc as seis semanas do
cisa morar e se alimentar com poucos recursos, não pode gastar tan­ I? de julho ao 14 de agosto, o mesmo jornal relata tres casos seme­
to. Além disso, na maior parte dos casos, ele s6 é pago aos sábados lhantes. Segundo o número de 3 de julho, foi confiscado em Hcy­
à noite; alguns,pagamentos começaram a ser feitos às sextas-feiras, wood um porco de 200 libras morto e estragado, que tinha sido es­
mas esta iniciativa ainda não está generalizada e é por isso que s6 quartejado em um açougue e posto à venda. Segundo o de 31, dois
chega ao mercado ao sábado à tarde, às cinco ou mesmo sete horas, açougueiros de Wigon, dos quais um já tinha siqo acusado pelo mes­
quando a e1asse média já escolheu o que havia de melhor. De ma­ mo delito anteriormente, foram condenados a duas e quatro libras
nhã, o mercado regurgita com os melhores artigos; mas quando os esterlinas de multa por terem posto à venda carne impr6pria para
operários chegam o melhor acabou, e mesmo que tivesse sobrado, ,

c, ....
consumo. Segundo o número de 10 de agosto, foram apreendidos
não poderiam comprá-lo. As batatas compradas pelos operários são, ;'JI numa mercearia de Bolton vinte e seis presuntos estragados que fo­
freqilentemente, de má qualidade, os legumes estão murchos, O queijo ram queimados publicamente; o comerciante foi condenado a uma
velho é medíocre, o toucinho rançoso, a carne magra, velha, dura, multa de 20 shillings. Mas isto não nos dá conta de todos os casos,
proveniente muitas vezes de animais doentes ou mortos, geralmente e nem sequer representa para estas seis semanas uma mMia segundo
em decomposição. Freqilentem/(nte, os vendedores são pequenos re­ a qual pudéssemos calcular uma percentagem anual. Acontece fre­
talhistas que compram mercad6rias ordinárias em quantidade e as
revendem muito baratas precisamente devido à sua má qualidade. ''o
" qüentemente que cada número do Guardian, que aparece duas vezes
por semana, rclata um fato análogo cm Manchester ou no distrito
Os trabalhadores mais pobres tem de fazer imensos esforços para con­ industrial vizinho. E quando pensamos no número de casos quc de­
seguir sobreviver com o pouco dinhciro que ganham, mesmo quan­ vem ocorrer nos vastos mercados que margciam as longas artérias
do os artigos que compram são da pior qualidade. Com efeito, co­ c quc dcvcm cscapar às raras inspcçõcs dos fiscais dc mercados :.-.
mo à meia-noite de sábado as lojas tem de fechar e nada pode ser dc outra maneira como se cxplicaria O dcspudor com' que estas pe­
vendido aos domingos, os restos que se estragariam se tivessem de ças intciras dc gado são postas à vcnda? -; quando pcnsamos como
esperar até segunda de manhã são liquidados a prcços irris6rios en­ ':
devc ser grandc a tentação, dado o montantc incomprcensivclmente
tre as dez e a meia-noite. Mas nove décimos do que nào foi vendido baixo das multas; quando pensamos em que estado deve .estar um
'até às dez horas já não é comestlvel no domingo de manhã. São pre­ bocado de carne para que seja declarada completamente imprópria
cisamente estes restos que constituem a refeição dominical da classe o'. para o consumo e confiscada pelos fiscais - é imposslvel acreditar
mais miserável. A carne que é vendida aos operários é freqUentemente .,. que, em geral, os operários possam eomprar uma carne sã c nutriti•
intragável mas, na medida em que foi comprada, é necessário come-Ia. "
va. Contudo, eles ainda são ludibriados de outra maneira pela cu pi- '
A 6 de janeiro de 1844 (se não me engano)67, houve uma ses­ dez da classe média. Os varejistas e os fabricantes falsificam todos
são do tribunal de comércio de Manchester no decurso da qual fo­ os generos alilllf'ltlcios de uma forma vergonhosa, com completo
ram condenados onze açougueiros por terem vendido carne impr6­ desprezo pela saúde dos que os devem consumir. Mais acima demos
pria para consumo. Cada um deles possura ainda um boi ou um porco a palavra ao Manchester Guardian, escutemos agora outro jornal da
inteiro, ou vários carneiros ou ainda 50 ou 60 libras de carne que classe média - gosto de me servir dos meus adversários como teste­
foram apreendidas, tudo no mesmo estado. Em casa de um dcles fo- munhas - escutemos o Liverpool MrcurY"9:

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'.

qualidade ou adulterada: o rico, mimado pela boa comida, deseobre


Vendem manteiga salgada como manteiga fresca. cobrindo-a com uma
mais faeilmente a fraude graças ao seu paladar apurado. Thdos os
camada de manteiga fresca, ou colocando à mostra I libra de manteiga
fresca. para provar. c vendendo cm seguida libras de manteiga salgada, gêneros falsificados ou até envenenados estão destinados ao pobre,
ou retirando o sal pela lavagem c vendendo cm seguida a manteiga co­ ao operário, para quem alguns pfennigs já representam muito, que
mo se fosse fresca. Misturam ao açúcar a (arinha de arrOLOU outros tem de comprar muitas coisas com poueo dinheiro, que não tem nem
gêneros baratos Que vendem a preços altos. Os reslduas de sabão tam. o direito nem a possibilidade de reparar na qualidade, porque nunca
bm slo misturados com OUlras mercadorias c vendidos como açúcar. :
Misturam chicória ou outros produtos baratos ao caf moldo; chegam
teve oportunidade de educar o paladar. 1l:m de jr às mercadorias que,
"
mesmo a misturá-los ao car cm gra.o, dando à mistura a forma de grão • em virtude do seu pequeno capital e das suas despesas gerais bas­
de caft. Frequentemente misturam ao cacau terra escura c fina, que es­ tante importantes, nem sequer podem vender tão barato e com a mes­
tá envolvida cm banha de carneiro, para mais facilmente se misturar ma qualidade que os retalhistas mais importantes e são constrangi­
com o verdadeiro cacau. Juntam ao chá folhas de ameixeira e outros
dos a fornecer, conscientemente ou não, gêneros adulterados por cau­
restos, ou então secam folhas de chá que já serviram, lost.mdo-as so­
bre placas de:: cobre muito quentes para que retomem a cor, e vendem.
sa dos preços baixos que lhes pedem e da concorrência dos outros.
nas como chá fresco. A pimenta é falsificada por meio de cascas cm .... Por outro lado, se para um grande retalhista, que tem muito capital
pó, etc. O vinho do Porto  literalmente falsificado (a partir de coran. envolvido no negócio, a descoberta de uma fraude significa a rulna
tes, álcool, etc.), porque é notório que se bebe mais na Inglaterra do porque lhe faz perder todo o crédito, que importa a um .pequeno va­
que ludo aquilo que é produzido em Portugal; o tabaco é misturado
rejista, que fornece a uma única rua, ser acusado de fraudei Se não
com matérias repugnantes de toda espécie" seja qual for a forma como
este produto é pOSIO 1 venda. . confiam nele em Ancoats, vai-se embora para Chorlton ou Hulme,
onde ninguém o conhece e recomeça a fazer fraudes; só estão pre­
I
Posso acrescentar que, devido à falsificação geral do tabaeo, .",.
vistas penas legais para um número restrito de fraudes, exceto se fo­
vários fornecedores de Manchester, entre os mais considerados, de­ rem acompanhadas por fraudes fiscais. Mas não é só na qualidade
clararam publicamente no verão passado que dadas estas falsifica­ mas também na quantidade que o trabalhador inglês é enganado.
ções generalizadas nenhuma firma poderia manter-se sem elas e que Na maior parte dos casos, os pequenos comerciantes têm falsas me:
nenhum cigarro, cujo preço seja inferior a três pence, eontém taba­ didas e falsos pesos, e todos os dias podemos ler nos relatórios da
co puro.70 Claro que não se limitam às fraudes com produtos ali­ polfcia um número inacreditável de contravenções por delitos deste
mentares e poderia citar mais uma dúzia delas, entre outras a práti­ gênero. A que pOnto as fraudes deste tipo estão generalizadas nos
ca infame que consiste em misturar giz ou gesso à farinha.71 Fazem­ bairros das fábricas é o que se verá por alguns excertos do Manches.
se fraudes com todos os artigos, esticam a nanela, as meias, etc. pa­ ter Guardian. Referem-se apenas a um curto lapso de tempo, e mes.
ra as fazerem parecer maiores e elas encolhem com a primeira lava­ mo para este período não possuo todbs os números do jornal:
gem; um corte de fazenda estreita é vendido por um corte de mais Guardian de 16 de junho de 1844. Sessões do tribunal de Roch­
polegada e meia ou três polegadas72, a louça está coberta com um dale - quatro merceeiros são multados de cinco a dez shilfTngs por
esmalte tão fino que praticamente não é esmaltada e lasca facilmen­ uso de pesos demasiados leves. Sessões de Stockport: dois merceei­
te, e mais cem ignomínias, tout comme chez nous.73 Mas os princi­ ros condenados a 'Ifla multa de um shilling: um deles tinha sete pe­
pais prejudicados com estes logros são os trabalhadores. O rico não sos demasiados leves a um prato da balança falsificado, e já ambos
é enganado porque pode pagar os altos preços dos grande estabele­ tinham sido advertidos.
cimentos que devem zelar pelo seu bom nome e que se prejudica­ Guardian, .19 de junho, sessões de Rochdale: um merceeiro con.
riam principalmente a si próprios se vendessem mercadoria de baixa denado a uma multa de cinco shil/ings, e dois camponeses condena­
dos a pagar dez shillings.

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'.

, Guardiall, 22 de junho - Justiça da Paz de Manchester: deze­ >Avel como o café entre nós, e as casas em que nem chá se bebe, são
nove merceeiros são punidos com multas de 2 1/2 silillillgs a duas sempre o reino da mais negra miséria. Mas isto só é verdade se o
libras. trabalhador tem trabalho. Se não o tem, fica completamente à mer­
Guardiall, 26 de junho - Sessão breve do tribunal de Ashton: ei! da sorte, e come o que lhe dão, o que mendiga, ou o que rouba.
14 merceeiros e camponeses punidos com 2 112 silillillgs a uma libra E se não tem nada morre simplesmente de fom.e, como já disse ante­
esterlina de multa. Sessão breve do tribunal de Hyde: nove campo­ riormente. É fácil de ver que tanto a quantidade como a qualidade
neses e merceeiros condenados a cinco silillillgs de multa. da comida dependem do salário, e que, mesmo em período de pleno
Guardiall, 6 de julho - Manchester: 16 merceeiros condena­ trabalho, a fome reina entre os trabalhadores mais mal pagos, so­
dos ao pagamento de custas e multas inferiores a dez silillillgs. .bretudo quando têm pesados encargos de famfiia. Ora o número des­
Guardiall, 13 de julho - Manchester: nove merceeiros puni­ tes trabalhadores mal pagos é muito grande. Principalmente em Lon­
dos com multas de 2 1/2 a vinte silillillgs. dres, onde a concorrência entre operários cresce na proporção direta
Guardiall, 24 de julho \" Rochdale: quatro merceeiros puni­ da população, esta cate&oria é muito numerosa, mas também a en.
dos com multas de dez a vinte silillillgs. contramos em todas as outras cidades. Por isso recorre:se ai a todos
Guardiall, 17 de julho - Bolton: doze merceeiros e hoteleiros os expedientes: comem-se, à falta de melhor alimento, as cascas das
condenados ao pagamento das custas. batatas, resíduos de legumes, vegetais apodrecidos'., e apanha-se
Guardiall, 3 de agosto - Bolton: três merceeiros c hoteleiros ainda tudo o que possa conter um átomo que seja de produto co­
multados com 2 V, a cinco silillillgs. mestível. E, quando o salário semanal se acaba antes do fim de se­
Guardiall, 10 de agosto - Bollon: um merceeiro-hoteleiro con­ mana, acontece freqüentemente que a familia, durante os últimos
denado a cineo silillillgs de multa. :I, dias, já não tenha nada para comer ou tenha o estritamente necessá­
E as mesmas razões pelas quais os operários são as principais ,; rio para não morrer de fome. Evidentemente que semelhante modo
vitimas das fraudes na qualidade explicam que também o sejam das ji' de vida não pode deixar de originar numerosas doenças. Quando estas
fraudes na quantidade. {r surgem, quando o homem, cujo trabalho sustenta a famfiia e cuja
A alimentação habitual do trabalhador industrial varia, eviden­ .; atividade penosa exige mais alimentação - e por conseguinte suo
temente, segundo o salário. Os mais bem pagos principalmente os ' cumbe primeiro - quando esse homem adoece, é então que começa
operários em que cada membro da família está apto a ganhar algu­ a grande miséria, é só então que, de maneira espantosa, se manifesta
ma coisa, lêm enquanto esta situação se mantiver, uma boa alimen­ a brutalidade com que a sociedade abandona os seus membros, jus.
tação, carne todos os dias e, à noite, toucinho c queijo. Mas nas fa­ tamente quando eles mais precisam da sua ajuda.
mílias que ganham menos, só há carne aos domingos ou duas ou Para coneluir, resumamos de novo os fatos citados. As gran­
três vezes por semana e, em contrapartida, há mais batatas e mais des cidades são habitadas principalmente por operários, visto que,
pão: se descermos gradualmente na escala verificamos que a alimen­ na melhor das hipóteses, há um burguês para dois, muitas vezes três
tação de origem animal se reduz a alguns pedaços de toucinho, mis­ e em alguns lugares para quatro operários; estes operários nada pos­
turados com batatas; ainda mais abaixo, até o toucinho desaparece, suem e vivem do seu salário que na maior parte das vezes só permite
só fica o queijo, o pão, o mingau de aveia (porridge) e as batatas, a subsistência cotidiana. A sociedade, individualizada ao máximo,
até chegarmos aos irlandeses, onde o único alimento são batatas. Em não se preocupa om eles, atribuindo-lhes o encargo de prover às
geral, com estes alimentos bebe-se um chá ligeiro, por vezes com um f;,' suas necessidades e da familia; contudo, não lhes fornece os meios
pouco de açúcar, leite, ou aguardente. O chá, na Inglaterra, e mes­ de o fazerem de forma eficaz e duradoura. Qualquer operário, mes.
mo na Irlanda, passa por ser uma bebida tão necessária e indispen- mo o melhor, está constantemente submetido às privações, quer di-

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zer, a morrer de fome, e uma maioria sueumbe. Regra geral, as easas l IHr ein:.ige Ilnd sein eigenlhum (O único e o suO' propriedade), Lelpz1a. 184'.
to Para Qualquer morte violenta ou suspeita, o coroner (olidal d. pollci.) procedia, "silUdo por
dos.trabalhadores estão mal implantadas, mal construídas, mal con­ . um Juri, a um Inquérito e estava encarreiado de ver o cad'...er.
servadas, mal arejadas, úmidas e insalubres; nelas, os habitantes es­ J Sobre este problema, d. R. f. Wcarmouth: A!trhodism and lht Slrvlllt of lhe woril"l c/QJ.US,
tão confinados a um espaço mini mo e, na maior parte dos casos, 1150-1190. 191', pp. 21-)0•
• Após redliir esta, tive acesso I um Irtigo sobre os bairros operArlos de Londres, no //lumi"o.
num cômodo dorme pelo menos uma família intcira. A disposição . lN Ma'0l.int' (out. 1844), que concorda enl muit.s passagens quase pal....ra por palavra com
interior das casas é miserável; chega-se num certo grau à ausência o meu. intitula.se ''The Dwcllinls or the roor, bom the notebook oC a M. 0:' ("As habita.
total dos móveis mais indispensáveis. As roupas dos trabalhadores
çôcs dos pobres, Kiundo o caderno de .pontamentos de um M. 0:'1 (Doutor em Mcdlcina)
(F.E.). .
também são, regra geral, medíocres e estão freqüentemente esfarra­ • Pp. ))6-340. Só as iniciais do lutor, J. 11., Cigur. nesta revista, da qual wstc um oemplar
,

padas. A comida é geralmente má, muitas vezes imprópria para con­ no Dritish Museum.
, Joumol 01 lhe srorislicol socitlY, '101. 111, 1840, pp. 14.24.
sumo, em muitos casos, pelo mcnos em certos pedodos, insuficiente .' O rel.tório oCicial 0.10 dA senAo 16.116. Engels retomou o numero de Norl/'lull slDr, D 3JS.
e, no extremo, há pessoas que morrem de fome. A classe operária 4 de maio de 1844, p. 6.
das grandes cidades apresenta-nos, pois, um leque de modos de vida , cr. Weld: 011 lhe condirio"s 01 lhe working classes ln rhe i"ntr )'Qrd 01 St. Gt'OIIt's Purlsh,
Ha"ovtr Squort, '101. VI. 1843, pp. 17.27,
diferentes. No melhor dos Casos, uma existência momentânea supor­ 10 £ate relAtório linha sido publicado cm primeiro lugar no órlAo dos radicals Tht ...-ni/, Dis.
tável: para um trabalho duro, bom alojamento e comida menos má parch. Foi publicado em seluida no jornal dos cartistas Norrhcrn Stor. n 338, de 4 de mala
(do ponto de vista do operário, evidentemente, tudo isto é bom e su­ de 1844. ,.
II 71lt Tlmr.s, 17 de novembro de 1843. Norlht'" Sror, n! li', 2j de novembro de 1843.
portável); no pior dos casos uma miséria cruel pode ir até à ausência
• Equivale a 30,48 cm.
do fogo e casa e à morte pela fome; mas a média cstá muito mais Il 71Jt nmr.s, 16 de janeiro de 1844, p. " cal. 2.
próxima do pior do que do melhor dos casos. E não julguemos que u 71lt Times, 12 de fevereiro de 1844, p. 7, coI. 6.
... CC. Humphrey 1I0use: The DickelU world, 1941, pp. 217 e seluintCl.
esta gama de operários se limita a categorias fixas que nos permiti­ u O Irande jornal conser...ador tinha sido rundado em 118' sob o nome de "Dlli.ly Universal Rc--
riam dizer: esta fração da classe operária vive bem, aquela mal, sem­ a.ister". Só em 1788 tomou O scu nome atual.
pre foi e será assim. Pelo contrário, se por vezes isso acontece, se certos u'71lt T/mts, 12 de outubro de 1843, p. 4, cal. l.
" Albergue para desabrigados.
setores isolados ainda gozam de certa vantagem sobre outros, a si­ 11 Tht Tjma mencionou este alberlue vAriu yezes nos seus n!" S. 9 e 12 úe fevereiro de lB44.
tuação dos operários em cada ramo é tâo instável que qualquer tra­ Sobre estes albergues e o seu papel na história da liIantrapia Inglesa, cr. A. F. Younl c e.. T:
balhador pode ter de percorrer todos os degraus da escala, do relati­ A,hton: Br;rúh sodol work jl1 Iht 191h Ct"/IUY, 19S6, pp. SI e M.U.
II Tht Tlmr.s, 22 de dezembro de 1843, p. 3, cal. 6. North"" sror, n l20, 30 de dezembro de
vo conforto à extrema necessidade, e até correr o perigo de morrer 1843, p. 6. coI. 2.
de fome; de resto, quase não há operário inglês que nâo tenha muito '. I' Na ed. de IB92, esta palavra estA no singular: A cidade  muito bela.
que dizer sobre os grandes reveses da sorte. São as causas desta si­
XI Cilado no Dr. W. P. Alison, F.RS.E., r-ellow and late President or lhe Royal Collele oC Phhi.
; clans. etc.: Obstrvallons on rht mo"altmenr 01tht poor I" Scorland ol1d ies (//«ts 011 thl hNI,h
tuação que agora iremos examinar mais de perto. 01 grral lowns (ObservaçOCs sobre a administraçlo dos pobres na Escócia e os seus cedto, 10­
bre I higiene das grandes cidades)., Edimburgo, 184!). O aulor  um piedoso tor" lrmlo do
historiador An;:h. Alison. (F.E.)
NOTAS .'
21 Associaçlo de ajuda aos mendigos.
n Alison retoma. na verdade, uma aCirmaçlo do Reverendo Dr. Lre. .
I Em O capital LI. VII. Cap. XXIII. Rio, Civ. Oras. 1968, pp. 760-771. MlIr aborda rcsumida­ 1) Comisslo para o ensino rt'1iaioso.
mente: &5 condiçOcs de habitaç.lo c alimcntaçio dos opcririos inEtlescs no IKtlodo seguinl!: (20 • O próprio Alison cita scRundo F. Uarlu:r c J. ChC'Yne: An 11('0011'" ollllt Riu, Prolrt.5S lI"d
anol mais tarde). 11 inlerusanlc comparar as suas indkaçOcs com a, que Engels fornC(c: ncslc dtcUnt ollht FtVef lal'" tpidtmical jn Jrtla"d. 1821, vaI. li, pp. 160-161. As desaiçOu de
np[lulo. Engels destoam, portanto, um pouco.
1 (1892) Isto se deu h4 quase 50 anos, na lpoca dos pitorcKos vtlciros. Alualmcnl o TAmisa 1" VaI. 14, IBI8, pp. 40B-46S.
nlo  mais do qUe um higubrc amonloado de vaporei horrendos. negros de fuligem (EE.). U Rtpor' lo Iht homt stcrttar,lrom tllt Poor I.JJW Commwio"ers O" o,. inqulr, /"ro Iht sonflo'l
J Max Slirncr. pseudÓnimo de Johann Caspar Schmidl (1806-1856): Filósofo c cscrllor alemão. condWol1 01 tllt labouril1 (/aJ,JtS 01 Grtal nritai". Wlth ap"dlces.. PmtnUd to both Jlowr.s
Um dos idcóloaos do individualismo burlUh e do anarquismo. A sua obra nlnis conhecida 01 J\uliomtnr i" july 1841 (Relatório dos ComissArios para a Lei dos l-obres, apresent.do la

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llO Kay: op. cil.• P. 32. (F. U.)


iiéoNCORRNCIA II;
'l1tslemunho de James Riddel Wood, pp. 12".IH. I .......

'J P. Gaskdl: Tht Mamúaclurln, l\Jpulalion o/ Enf(and. ils Moro' Social and Physica( COfl
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110ft, afld Iht Chafl,ts which havt aruín,/rom Iht Ust 01 Sltam Maehl"try: w;lh an Examl,...
'ih-. ,
"I:
lion o/Itl/afll Lobour. "FiaI JuSlllia" (A Populaçlo doi Or'riol de F'bricas na Inllatem.
o leu Estado Moral, Social e FJsico e .s Mud.nças C,uSldu pel. Ulilil.,\ÇAo de M'quinas I l 'l :' li
: V.por. Com um Inqurilo sobee o Tr.balho das Crlançn "Seja feila Jusli.;.", 11133. l>eSCf'C'f' " I
princip.lmente a situaçio dos Opel'riOS do lanc.shirc. O aulor  um liberal. l11as escrcvi. nla­ ,,:.1.; :' 'I
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m. tpoc. em que o liberalismo ainua n10 implic..... lou ...ar aftlicidadt dos opcririos. £ por ''',"1
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• isso que ainda 1140 Itm ídiia pnconetbídos t ainda Itm o dirtito dt Vtr os malts do rt,IIN ):r.t;", " ..
Vi,tfllt, cm particular os do sistema industrial. Em conu"apartida. tam1Xm escreve anlccipandl>llC
i/l:,Vimos na introdução como, desde o início da revolução indus­
\ ao FiJCIoriu Inquiry Commiu/on bunndo-se em fonles du ... idosas e delu extraindo muilu _01
.firmaçs ullerlormente rdutadas pelo relalório da comissAo. A obra, embora boa no ,eu con- .1J 'tdll.. a concorrência deu origem ao proletariado, fazendo subir o sa­
I . ,
j junto. dCV1: por conseluinle _ e lambtm porque. lal como Kay, o autor confunde a classe opc--  ido.do tecelão em conseqüência do aumento da procura de tecidos
, rária em leral com I clane opcr!ria das U.bricas - ser utiliuda com preuuçAo nos detalhes. _
iDcitava os camponeses tecelões a abandonarem a eultura de seus
ii
II
,
A história da C"o'Oluçlo do prolellfiado que vimos na lnlroduçlo lo em ,rande parte, relira4a 
desca obra. (F.E.) . pcs para ganharem mais tecendo. Vimos como a introdução da

1\
"

4J H"tI, DÚPOfCll, n 2.219 dc  de mAio de 18 ..... Um relal6rio olicial de 18J8 e Slancy: 011
_.ura em larga escala despojou os pequenos camponeses, os redu-
cil. p. 19. dio-nol o mumo m'lmelo. í ....]r. "

IH Em agOllo de 18.42, os oper.t.rios inlle)cs tencaram dcsencadur uma Ireve ,cral em ... irias re. ':jJIu ao estado de proletários e, em seguida, atirou grande parte deles
.is indultriais (principalmente Lanca.hlre e Yorkshire). Algumas cidades produziram no de. para as cidades; como, por outro lado, arruinou em grande parte os

1\
cuno da arCV1: choques violentos entre arevistas e tropas ou forças da policia.
6' "Poeir. do diabo": leddo .. bõue de libras de 14 de mA qualidade.
pcqueno-burgueses e os fez também descer às fileiras proletárias; co­
M Thonlas Carlyle: Chartúm, Londru, 1839, p. 28, Sobre Thomas Carlyle ver mais adiante.- (F.E.)  centralizou o capital nas mãos de uma minoria e juntou a popu-
" Noll 1 do ultimo capItulo deste li ...ro "A atilude da burluesia face ao prolelariado", (N:T.)
61 Na realidade, o processo t rdalado no numero de 10 de: maio de 1843 do ManeMsI'" GuardJtJflo
lIçionas grandes cidades. Eis as diferentes vias e as diferentes ma­
.,Dáras pelas quais a concorrência - depois de se ter manifestado pie­
I
I
d. igualmenle Thuollfl (tef rrcords oflht mantrof Manell/(!r. vol. 12 (1882.1846), pp. 191.223.
.. O Manc!lt.lftr Guardlan. que: se publica em Manchester llesde 1821, foi primeiro o 6r810 dOI ,Yllllllente na indústria moderna e depois de se ter livremente desen­
li"'n:-carnhistl.l e mail tarde lornou.se o jornal do partido liberal.
.. Livupoo( Ioftrcur" 9 de fcvereiro de 1844, p. 46. I3ngell não cila com muita ex.alidAo. Re:suf'lW:
.l'Olvido com todas as conseqüências - fez nascer o proletariado e
e traduz o conteudo do arligo. nem sempre littralnlente. 'o'desenvolveu. Iremos agora examinar a sua influência sobre o pro-
10 Os jornais da poca apontam casos muito (requentes de illlervençJo dos servi.;os alrandeguios Jaariado já existente, mas precisamos primeiro estudar e explicar a
..
conlra Uln tahilicadores. o que: pro'" a importJnda da fraude. d. Maneh,slrr Guoroiofl, 14
de rro. 27 de .bril 1844, Livtrpoollolurur.v, 6, 22 de s.clembro de 18-44.
'kcuoconência dos trabalhadores entre si e as suas conseqüências.
7J UvrrpooI MtTT.1/r;r. 12 de julho. 19 de julho. t 2 de' lIOJIo de 1844. 'Iii:' A concorrência é a c..pressão mais acabada da guerra de todos
"'= Â pokpd.a u • .2>4 cm." (mudt i pois de' . OÍIO a::DtimcuoI de'  do,) maAa. ' lodos Que caracleriza a sociedade burguesa moderna. Esta
'rJ E.- tr-::b 80 aaJn
"" lJk-lJ;r Drs;wd&. .afri (lQ .wo de' JW". sqvnJ.J um rdalório do Df. Soucb.OOoJ SmiU-
'JKrnI, guerra pela vida, pela existência, por tudo, e QUe, dadas as
sotn • sirU.l\'"io dos inoJirm1ts cm londrn.. (F. E.) c:IaamstAncias, pode ser uma guerra de mdrte, põe em luta não s6
- 1n.1"s.c pouh'tlmtnlt do ocmplat dc's de maio ICr. c.mMm, a..'tn.:a desle rdatÓrio. NOI'o
:."diferentes classes da sociedade mas também os diferentes mem­
''''rn SIiJr. 2" lo1e fC'-creiro).
-- O Ur. Southwood Smllh era IInla alllorilo1.de rKonhtclda ncst .. , Questõcs. I:u .... rios relat,). ililos dessas classes. Cada um impede o caminho do outro, e é por
rioJ em 18J8, J9 e 040 sobre o Cllado sllnilirio dos bairros pobres de Loudres, durante lU .iIIo Que todos procuram eliminar quem quer que lhes atravesse no
comlnôes oliel_ls. (CC. R. A. I..cwh: EJwitl Ch"l(/wkA:. olld Ih IlUb(j(.. htiJ/11J fIl()tmtfll
/8JJ.f8J4, 1'J5, pp. Jy... J9's).
cáminho e lhes tente tomar o lugar. Os trabalhadores concorrem en­
In: li tal como os burgll'eses. O tecelão que trabalha com um tear
l.mtra em concorrência com o tecelão manual, o tecelão manual de­
'fi'lCIIIpregado ou mal pago entra em concorrência com o que tem tra­
..balho ou é melhor remunerado, e procura afastá-lo de seu caminho.
'
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92 ,.

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