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CENTRO DE LETRAS
E CIÊNCIAS HUMANAS
REITORA
Nádina Aparecida Moreno
VICE-REITORA
Berenice Quinzani Jordão
DIRETORA DO CLCH
Mirian Donat
VICE-DIRETOR
Ariovaldo de Oliveira Santos
REDAÇÃO
Isabel Cristina Cordeiro
Esther Gomes de Oliveira
CAPA
Marcos da Mata
EDITORAÇÃO ELETRÔNICA E COMPOSIÇÃO
Maria de Lourdes Monteiro
CONSELHO EDITORIAL
Sérgio Paulo Adolfo
Volnei Edson dos Santos
Paulo Bassani
Paulo de Tarso Galembeck
Celso Vianna Bezerra de Menezes
PARECERISTAS
Dra. Maria Beatriz Pacca - UEL
Dr. Francisco Moreno Fernandes - Univ. Alcalá de Henares - España
Dr. Aquiles Cortes Guimarães - UFRJ
Dra. Adelaide Caramuru Cezar - UEL
Dr. Jesús Castilho - Univ. de Valladolid - España
Dr. José Oscar de Almeida Marques - UNICAMP
Dr. José Nicolau Julião - UFRRJ
Dra. Salma Ferraz - UFSC
Dr. Otávio Goes de Andrade - UEL
PUBLICAÇÕES
BOLETIM, CENTRO DE LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA – LONDRINA-PR. - BRASIL, 1980
I
BOLETIM 65
CENTRO DE LETRAS
E CIÊNCIAS HUMANAS
Boletim Cent. Let. Ci. Hum. UEL Londrina – nº 65 – p. 1-154, jul./dez. 2013
Indexado por / Indexed by
ISSN 0102-6968
Sociological Abstracts SA
Linguistics and Language Behavior Abstracts LLBA
boletimhumanas@uel.br
Fone / Fax:(43) 3371-4408
Semestral
ISSN 0102-6968
1. Sociologia – Periódico. 2. História – Periódico. 3. Letras – Periódico. 4.
Filosofia – Periódico. 1. Universidade Estadual de Londrina.
CDD 301.05
CDU 301:4:I(05)
Sumário
Apresentação............................................................................. 7
Introdução
2
O termo professor é aqui empregado para designar tanto aqueles que atuam na universidade
(professor formador), quanto aqueles envolvidos com a educação básica (professor
colaborador) ou ainda em formação inicial, cursando uma licenciatura (professor novato).
O PIBID de Letras-inglês
Operadores argumentativos
Mecanismos Intensificadores
Análise do corpus
Texto I
1
2
Meu último diário do PIBID, que mistura de sentimentos! Eu percebo
o quanto eu cresci e o quanto eu aprendi com o grupo. Sim, hoje eu sou
3
professora. Eu estudei 4 anos para estar preparada, eu realizei um ano de
regência num colégio público com mais seis meses de observação. Sim,
4
por mais que eu ainda não tenha decidido se escolhi que a docência será
minha carreira permanente, eu sou professora. Ouvir o pessoal mais novo
5
dizendo que não quer ser professor me fez lembrar como eu me sentia.
Acho que viver a docência todo esse tempo, descobrir os problemas, mas
6
também a gratificação, foi essencial para a formação dessa identidade
de professora. Gente, antes de negar essa possibilidade, experimentem,
7
tentem, errem, melhorem e cresçam. É pesado, é difícil, mas também é
divertido e gostoso.
8
“... por mais que eu AINDA não tenha decidido se escolhi que
a docência será minha carreira permanente, eu sou professora.”
(linhas 4-5)
“Acho que viver a docência TODO esse tempo (...) foi ESSENCIAL
para a formação dessa identidade de professora.” (linhas 6-8)
Texto II
1
Nem acredito que nosso trabalho esse ano jáacabou. Parece que foi ontem
2
que caí de paraquedas no grupo. Posso dizer que essa queda foi bem
emocionante:D. Do dia que entrei até agora tenho certeza que aprendi
3
em todas as reuniões, discussões, leituras, preparo de material, aulas,
trocas de e-mail e escrevendo e lendo diários e debriefings*. Me constituí
4
com o outro. Essa foi uma das reuniões em que eu mais me vi no discurso
dos integrantes, pois apesar de todos sermos diferentes, compartilhamos
5
a mesma experiência e estivemos por muito tempo na mesma
“sintonia”. Com tudo isso eu cresci pessoalmente, academicamente e
6
profissionalmente.
7
*Relatórios redigidos após as aulas ministradas.
Parece que foi ontem que caí de paraquedas no grupo. Posso dizer
que essa queda foi BEM EMOCIONANTE :D. (linhas 1-2)
Essa foi uma das reuniões em que eu MAIS me vi no discurso dos
integrantes... (linhas 4-5)
Referências
CLARKE, Mark A.; DAVIS, Alan; RHODES, Lynn K.; BAKER, Elaine
D. Principles of Collaboration in School-University Partnerships. TESOL
Quarterly, Vol. 32, No. 3, Research and Practice in English Language
Teacher Education (Autumn, 1998), pp. 592-600. Disponível em: http://
www.jstor.org/stable/3588130. Acesso em 14/10/11.
Daniela Leonhardt1
Gonçalves de Magalhães2
Resumo: O artigo busca verificar que os preceitos de construção de uma ideia de nação
a partir da narrativa épica, desenvolvidos no Romantismo no século XIX, mantêm-se
no romance contemporâneo A casa das sete mulheres, de Leticia Wierzchowski. Busca-
se em textos publicados por Jorge Luis Borges, Benedict Anderson e Stuart Hall uma
explicação para a conservação de ideais românticos na literatura produzida atualmente.
O romance analisado retorna às narrativas épicas produzidas no século XIX, abordando
a Revolução Farroupilha, conflito que ocorreu no sul do país e se estendeu por dez anos,
destacando a bravura e coragem das personagens e contribuindo, assim, para a criação
de um imaginário coletivo ligado à exaltação de valores heroicos.
Palavras-chave: Romantismo, épico, imaginário, nacionalismo.
Abstract: This article aims at verifying that the precepts of building an idea of
nation from the epic narrative, developed in the nineteenth century Romanticism,
are maintained in the contemporary novel House of the Seven Women, by Leticia
Wierzchowski. The explanation for the conservation of romantic ideals in literature
produced today is found in texts by Jorge Luis Borges, Benedict Anderson and Stuart
Hall. The analyzed novel returns to the epic narratives produced in the nineteenth
century, and addresses the Farroupilha Revolution, a conflict that occurred in the
south of Brazil and lasted ten years. The novel highlights the bravery and courage of the
characters and, therefore, contributes to the creation of a collective imaginary connected
to the exaltation of heroic values.
Keywords: Romanticism, epic, imaginary, nationalism.
1
Professora Especialista em Ensino de Língua Portuguesa. Aluna do Programa de Mestrado
em Letras da Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO), orientada pela
Professora Doutora Cláudia Rio Doce.
2
Mantida a grafia original.
3
Mantida a grafia original.
[...] a ficção épica não é nem deve ser lida como documento de
coisas e ações empíricas, pois sua narração estiliza a matéria histórica
numa maneira elevada, que põe em cena e celebra, por semelhança, a
forma essencial ou universal da ação, caracterizando-a como heroica
ou ilustre, grande e perfeita. (HANSEN, 2008, p. 42)
Considerações Finais
Referências Bibliográficas
BORGES, Jorge Luis. O narrar uma história. In. Esse Ofício do Verso. Trad.
MACEDO, José Marcos. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. p. 51-62
Danielli Rodrigues 1
Luciana Brito (co-autora)2
Resumo: Machado de Assis escreveu diversos livros e é estudado por inúmeros críticos,
como Roberto Schwarz, John Gledson, Antonio Candido, Alfredo Bosi, João Roberto
Faria, somente para citar alguns. Sem dúvida, pode ser considerado nome basilar na
literatura brasileira, digno de estudos e pesquisas sobre os variados aspectos de suas
obras. O presente estudo visa abordar a crítica literária do teatro brasileiro pelo olhar de
Machado de Assis, assim como apresentar o modo como ocorre a crítica teatral inserida
em nosso país, a caracterização do cenário teatral do século XIX e do gosto estético da
sociedade da época, além das contribuições para a formação de um teatro brasileiro.
Palavras-chave: Crítica. Teatro Brasileiro. Machado de Assis.
abstract: Machado de Assis wrote diverse books and his works are studied by many
literary critics such as Roberto Schwarz, John Gledson, Antonio Candido, Alfredo Bosi,
João Roberto Faria, among others. Doubtless, he can be considered as a rare pearl in
the Brazilian literature, worthy the study and the research of varied aspects presented
in his works. This present study aims at to approach the literary criticism in Brazilian
drama by Machado de Assis’ view as much as present the manner in which the drama
criticism embedded occurs in our country, the characterization of drama landscape of
XIX century and the esthetic ideal of that society epoch, besides his contributions for
formation of a Brazilian drama.
Keywords: Critic. Brazilian drama. Machado de Assis.
1
Danielli Rodrigues é Especialista em Literatura Brasileira e Mestranda em Letras – Estudos
Literários pela UEL, sendo bolsista do CNPq. E-mail: danielliokamura@yahoo.com.br
2
Luciana Brito é Coordenadora e Professora Doutora da UENP/CJ no curso de Letras, e
Professora no Programa de Pós-Graduação em Letras da UEL. E-mail: lbrito@uenp.edu.br
3
Não confundamos princípio com origem ou nascimento. Princípio se remete às motivações
intrínsecas da condição humana e independe da época em que se vive. Origem, ou nascimento,
tem seu sentido cristalizado numa determinada época histórica. Para Peixoto, “desde muitos
séculos antes de nossa era até hoje, nunca deixou de existir: há algum impulso no homem, desde
seus primórdios, que necessita deste instrumento de diversão e conhecimento, prazer e denúncia”
(PEIXOTO, 1986, p. 7).
4
Publicado em 13 fev., na Semana literária.
Conclusão
Referências
O roteiro e a adaptação
q- Cenas dramáticas – Para que haja uma cena eficaz, que chame a
atenção do espectador, é preciso que haja os objetivos, os obstáculos,
uma culminância e a resolução. Além disso, o protagonista que
compõe esta cena não precisa ser o mesmo de toda narrativa.
Quando o narrador do romance criou a passagem em que Juliana
revela à patroa que possui as provas do adultério, a criada é, neste
momento, a personagem central do conflito. Apesar de Juliana não
ser a personagem principal da história, ela é a dona da cena, conduz
aquele momento a outros acontecimentos. Uma ação dramática
pode se sintetizar em: alguém quer muito alguma coisa, existe um
obstáculo que atrapalha, a ação ocorre em algum espaço, em certo
tempo e, algumas vezes, responde o porquê do sucedido. Da teoria
à prática, no romance temos: Juliana quer o dinheiro, mas Luísa não
o tem. Ela toma as chantagens como armas para atingir seu objetivo.
A cena se passa no quarto de Luísa, numa tarde em que esta perdera
um dos encontros com o amante. Qual a ação de Juliana em seguida?
Coloca a patroa para realizar as tarefas domésticas castigando-a e
pressionando para que ela consiga o dinheiro em troca das cartas
e do silêncio.
A ação dramática que acabamos de descrever é transposta
para o filme com bastante semelhança: quando Luísa chega, furiosa,
do encontro que não deu certo, e tenta despedir Juliana ao ver
que seu quarto ainda está desarrumado, a criada revela a posse das
cartas e, no decorrer da história, submete a patroa às tarefas do lar
chantageando e ameaçando para que ela consiga logo o dinheiro.
Nas duas obras analisadas, por quase toda a narrativa, Juliana e Luísa
foram as protagonistas da ação. Por meio das descrições e diálogos,
bem como dos elementos das linguagens escrita e cinematográfica,
é possível identificar os desejos, medos e emoções das personagens
em questão.
Considerações finais
Referências
Filmografia
Introdução
1
Doutorando em Educação pela UNESP (Marília). Professor do Instituto Federal do Paraná
(IFPR). Email: felipe.figueira@ifpr.edu.br
(...) precisamos dela para a vida e para a ação, não para o abandono
confortável da vida ou da ação ou mesmo para o embelezamento da
vida egoísta e da ação covarde e ruim. Somente na medida em que a
história serve à vida queremos servi-la (NIETZSCHE, 2003, p. 5).
3
A II Intempestiva causou apatia, o que pode ser comprovado, também, pela recepção de
seu amigo Jacob Burckhardt, ao qual Nietzsche enviou um exemplar para apreciação, tendo
recebido, no entanto, uma mera resposta à carta que continha em anexo o livro. À parte isso,
é objetivo dessa dissertação abordar as críticas ao eruditismo nessa obra e não a recepção de
seus contemporâneos, pois geraria outro trabalho.
(...) todo homem de ação ama infinitamente mais o seu feito do que
este merecia ser amado: e os melhores feitos acontecem em meio a
uma tal superabundância de amor que, mesmo se o seu valor fosse
incalculavelmente grande também em outros aspectos, em todo
caso eles ainda deveriam ser dignos deste amor (NIETZSCHE,
2003, p. 13).
6
“O que Nietzsche procura nos grandes indivíduos que remodelaram seus horizontes históricos,
não são ídolos, nem o relato perfeito do que realizaram, mais modesto, pretende manter viva dada
força capaz de impulsionar o homem em sua tarefa de crescer em meio ao devir” (RANGEL,
2010, p. 218).
“(...) àquele que olha para trás com fidelidade e amor para o lugar
de onde veio e onde se criou; por intermédio desta piedade, ele
como que paga pouco a pouco, agradecido por sua existência”
(NIETZSCHE, 2003, p. 25).
8
Segundo Rangel: “(...) tendo em vista que o passado não pode ser reabilitado, pois não se encontra
mais oferecido em sua totalidade conformativa, em toda sua cadeia de relações, toda a tentativa
de encontrar o passado e de reconstruí-lo não passa de quimera, e o horizonte pretendido vai se
distanciando cada vez mais à medida que o homem dele se aproxima” (RANGEL, 2010, p. 78).
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Enfim, é urgente “forjar e promover a cultura de um povo”,
pois do contrário a própria barbárie cada vez mais imperará. Torna-
se imprescindível, para tanto, a restituição dos “instintos”, em
uma palavra, a valorização da vida. A conseqüência derradeira do
homem teórico torna-se, mais uma vez demonstrada, o “homem
instrumental”, que trata a razão de forma puramente egoísta. Esse
problema, por sua vez, pode ser encontrado de forma explícita
em Nietzsche, quando ele apresenta as cinco razões pelas quais o
excesso de história se torna nocivo, sobretudo a segunda, a quarta e
a quinta, mas que, devido à beleza orgânica destas razões, a primeira
e a terceira também serão apresentadas:
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só é suportada por personalidades fortes, as personalidades fracas são
completamente dizimadas por ela” (NIETZSCHE, 2003, p. 45 –
grifos do autor). Preocupar-se com a vida alheia já é, muitas vezes,
manipulá-la: esse é o perigo do excesso de história, e é esse também o
sentido de se valorizar a singularidade em Nietzsche. Ora, o passado
e suas respostas são sempre diferentes das do presente. Conhecer
por conhecer é tentar responder sem ter uma pergunta, é criar um
conhecimento estéril “que não leva a lugar algum”.
9
“Toda a reflexão de Nietzsche sobre a educação tem como finalidade principal denunciar o fato
de o saber ter-se tornado um luxo, um capital improdutivo com o qual nada se tem a fazer, e
protestar contra a “formação histórica” imposta à juventude na Alemanha de Bismarck. Segundo
Nietzsche, a educação que os jovens alemães recebem nas instituições de ensino funda-se numa
concepção de cultura história que, ao privilegiar os acontecimentos e as personagens do passado,
retira do presente sua efetividade e desenraiza o futuro. Uma história, um pensamento que não
servem para engendrar vida e impor um novo sentido às coisas só podem ser úteis àqueles que
querem manter a ordem estabelecida e o marasmo da vida cotidiana” (DIAS, 1991, p. 60).
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as coisas se combinam reciprocamente no filósofo, porque é preciso
que ele tire de si mesmo o maior ensinamento e porque ele faz uso
para si mesmo da imagem e do resumo do universo (NIETZSCHE,
2003b, p. 205).
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Enfim, ao se tirar continuamente, o “véu de ilusão”, ou seja,
o mistério de um sujeito, algo que cria uma “apatia prematura”, o
erudito-historiador-dissecador, com isso, mais uma vez sufoca a
vida. Ser o tempo todo submetido ao tribunal histórico e ver-se na
obrigação de responder a tudo seria, na linguagem d’O nascimento da
tragédia, a morte do dionisíaco, por decorrência, também a morte do
apolíneo: portanto, o assassinato da tragédia, o assassinato da vida em
sua máxima potência. Segundo Santos: “(...) para Nietzsche, o excesso
do conhecimento histórico impede-nos de sentir diretamente a realidade,
provocando o embotamento da capacidade de admiração ao ponto de
nos convencer que já nascemos velhos” (SANTOS, 1993, p. 61). E
será a respeito da juventude que Nietzsche terá grande preocupação,
pois a nova geração é a que se encontra mais apta a mudar os rumos
degenerescentes de então. Para tal objetivo renovador escreve:
Sim, sabe-se que a história possibilita uma certa preponderância,
através da qual algo que conhecemos com exatidão desenraiza os
instintos mais fortes da juventude: seu fogo, sua rebeldia, seu auto-
esquecimento e seu amor, diminuindo o calor de seu sentimento de
justiça, amadurecendo lentamente os desejos através do contradesejo
de estar rapidamente a postos, útil e frutífero para dominar ou
reprimir, para, ceticamente, tornar doentes a seriedade e a ousadia
das sensações: sim, a própria história consegue até mesmo iludir a
juventude quanto ao seu privilégio mais belo, quanto à sua força
para semear em si um grande pensamento com uma fé exuberante
e para deixar crescer a partir dele um pensamento ainda maior
(NIETZSCHE, 2003, p. 88).
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Teu modo de andar, mais exatamente como andas enquanto homem
de conhecimento, é tua fatalidade; fundamento e solo, segundo
pensas, recuas para o interior da incerteza; para a tua vida, não há
mais nenhum suporte, só teias de aranha rompidas a cada nova
intervenção de teu conhecimento (NIETZSCHE, 2003, p. 77).
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vez que esta é uma atividade de alfaiates alemães (NIETZSCHE,
2003, p. 64-65).
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No entanto, a Alemanha de Nietzsche acreditava estar no ápice
da história, tendo atingido o cume ao qual o ser humano poderia
chegar, e sonhar chegar. Nietzsche, amparado em Schopenhauer e
sua crítica à filosofia universitária, designa uma filosofia específica
que fortificava e promovia esse pensamento bizarro: a hegeliana10.
Tal filosofia fez com que os alemães acreditassem que toda a história
humana havia culminado necessariamente na história alemã. A
estrutura segregacionista, etnocêntrica, estava lançada11. Enfim,
As massas e o Estado
10
“Esses fins estatais da filosofia universitária foram, porém, os que propiciaram à hegelharia um
favor ministerial tão ímpar. Pois, para ela, o Estado era o ‘organismo ético absolutamente perfeito’,
fazendo com que todo o fim da existência humana se absorvesse no Estado” (SCHOPENHAUER,
2001, p. 17).
11
Esse tipo de história, que será designado pelo nome de historicismo, que se crê com a verdade,
tendo compreendido o sentido – teleologia – da história, será veementemente criticada por
Nietzsche. José Fernandes Weber nos ajuda a compreender o sentido dessa crítica: “Reconhecer
que não há verdades absolutas, que também o homem veio a ser, que sua faculdade de cognição
veio a ser, é o que impede confundir a valorização da história com uma defesa do historicismo.
Aliás, a crítica ao historicismo é a crítica à pretensão de objetividade da ciência história, a crítica
da tentativa que essa corrente de pensamento efetua de, por meio do estudo da história, encontrar
o telos dos acontecimentos, em suma, a crítica à compreensão metafísica da história” (WEBER,
2011, p. 181). Tal história, por sua vez, serve muito bem aos interesses utilitários e egoístas
do Estado, o que será grandemente analisado por Nietzsche em suas Conferências e na III
Consideração Intempestiva.
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um dia se chegou ao cume da história; o excesso de conhecimento
histórico; a morte ao instinto; o império das massas. Todos esses
aspectos encontram-se vinculados a Hegel, mas são diametralmente
opostos aos de Schopenhauer e Nietzsche. Não há mais nada a se
esperar de tal tipo de ser humano: “(...) pois a presunção do pequeno
verme humano é agora a coisa mais divertida e mais hilariante sobre o
palco terrestre” (NIETZSCHE, 2003, p. 84). E o erudito é aquele
que, como se não bastasse, disseca o verme.
Schopenhauer, no que diz respeito à crítica ao Estado, torna-
se pensador basilar, que fundamenta grandemente as críticas de
Nietzsche a essa instituição e à universidade. Para Schopenhauer,
Hegel é o indivíduo que fundamentou as bases do Estado, algo que,
por si só, se torna motivo de aspereza por parte de todo aquele que
visa uma formação genuína, não-utilitária. Tratar a filosofia enquanto
“ganha-pão” foi uma das características da “hegelharia”. Essa nova
forma de tratar a filosofia, todavia, é semelhante à prostituição. Nas
palavras de Schopenhauer:
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Quando as massas reinam, ou seja, a vulgaridade, que também
pode ser representada pelo populacho hegeliano, a banalização, o
tipo nobre, aristocrático, é tratado como inferior, arrogante, digno
do mais absoluto desprezo, e é por esse operar bárbaro que estas
vão para “(...) o diabo, e a estatística as carreguem!” (NIETZSCHE,
2003, p. 84).
Nietzsche combate esse cenário de forma tão exacerbada
e apaixonada, que é impossível não perceber amor pelo que
faz, sendo ele um “homem de ação”, alguém em luta contra o
seu tempo, alguém que cria e destrói, destrói e cria, enfim, um
extemporâneo, que tinha noção dos prejuízos da massa para a
vida. Massas e autenticidade cultural possuem sentidos opostos:
Nietzsche, obviamente, se posiciona de forma aristocrática, como
signo de valorização da vida, como signo de luta contra a barbárie.
Quem aceita a fragmentariedade, ou seja, quem nega a totalidade, a
teleologia aos moldes apregoados por Hegel, a crença na totalidade
sendo o credo típico da ciência, da filosofia, ao menos até o século
XIX, é o único que pode almejar a uma formação aristocrática, que
não aceita uma “compreensão metafísica da história”. A integralidade
que a educação aristocrática de Nietzsche almeja, não é a de uma
totalidade, entendida enquanto universalidade, e sim da lida com o
conjunto dos elementos que cada um é. É total, mas não é universal.
A educação aristocrática assume a fragmentariedade do mundo, do
homem e busca criar com isso um sistema de significado para o
homem, para o mundo. A tragédia faz precisamente isso. O sentido
da história hegeliana, e tudo o que dela procede, inclusive o Estado,
por sua vez, tornam-se desprovidos de sentido.
O “homem teórico”, esse ser tão visado pela educação,
engendrou a barbárie, daí o combate de Nietzsche contra o seu ideal
“cultural”. Esse “saber sobre a cultura”, por seu turno,
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épocas e dos povos do passado, não da intuição imediata da vida
(NIETZSCHE, 2003, p. 92).
Referências
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________. Segunda consideração intempestiva: da utilidade e desvantagem
da história para a vida. Trad. de Marco Antônio Casanova. Rio de Janeiro:
Relume Dumará, 2003.
________. III Consideração Intempestiva - Schopenhauer como educador.
Trad. de Noéli Correia de Melo Sobrinho. Rio de Janeiro: Ed. PUC-Rio;
São Paulo: Loyola, 2003b.
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Era uma vez, dois irmãos
e os contos de fadas
Resumo: O presente artigo tem como preocupação mostrar, não somente a relação das
histórias populares com a sociedade, mas ainda o desenvolvimento que tais histórias
tomaram, enquanto representações culturais, desde a época em que começaram
a se instituir como tal. Os chamados “Contos de Fadas” que os irmãos Grimm
compilaram podem servir como base para um estudo historiográfico da sociedade
em que foram coletados. A relação história com literatura serve, aqui, para ajudar
a situar e compreender melhor as representações sociais presentes na tradição oral e,
consequentemente, na escrita de tais contos. O objeto principal desse estudo são os
contos compilados pelos Irmãos Grimm, a sua relação histórica com a sociedade em
que surgiram e a sua transformação cultural. A análise histórica desses contos enquanto
fonte visa mostrar os elementos existentes na cultura popular que estão presentes nessa
representação artística.
Palavras-chave: Irmãos Grimm, História, Cultura.
Abstract: This current article is concerned to show, not only the relation of the popular
stories with the society, but still the development which such stories had, as long as
representation of culture, since the times they began to be defined as such. The so called
“Fairy Tales” that the Brothers Grimm had compiled are the bases to an historiographic
study about the society which they emerge. The relation of history and literature helps to
situate and better understand the social representation belonging in the oral’s tradition
and, consequently, on the written of this tales. The main object of this essay are the
tales compiled by the Brothers Grimm, their relation historical with the society in
which they emerged and their culture’s transformation. Those tales are the source of an
historical analysis, which intents to show the elements of the popular’s culture, inside
of this artistical representation.
Keywords: Brothers Grimm, History, Culture.
Introdução
1
Graduada em História pela UNIOESTE - Marechal Cândido Rondon.
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Grimm, além da compilação e publicação da coletânea Kinder und
Hausmärchen (Contos da Criança e do Lar). Entretanto, esse texto
focará principalmente nessa característica de coletores e publicadores
de contos populares.
Este artigo abordará o lançamento dessa coletânea de contos,
que foram colhidos pelos próprios autores da tradição oral para
serem publicados, e o processo que envolveu esse lançamento. Entre
os assuntos abordados, apresenta-se a importância histórica que as
histórias populares possuem quando relacionadas com o contexto
social em que foram recolhidas, e como passaram da forma oral à
escrita. Além disso, pode-se analisar a afinidade e a relevância da
publicação dos contos, bem como a mudança do conto original oral
para a versão publicada.
A análise baseada nos contos dos Grimm irá relacioná-los
com o contexto histórico em que surgiram e sobre a sua relevância.
A relação história-literatura revela um novo objeto de estudo e os
contos populares são um exemplo da mentalidade e dos significados
da época de sua publicação.
Trata-se de um assunto interdisciplinar que envolve tanto a
história quanto a literatura, onde se usa a obra literária e a sua análise
para a compreensão da mentalidade cultural e social da época em que
o objeto de estudo foi produzido. Neste caso serão utilizados contos
que contemporaneamente são denominados “contos de fadas”.
Porém após análise histórica sobre as suas primeiras publicações,
entende-se que o meio em que tais histórias vieram não eram
“infantis”, daí a importância da análise de tais registros não só no
campo literário, mas também historiográfico.
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Juntamente com o levantamento histórico a fim de entender
o contexto que produziu o objeto de estudos, há que se levar alguns
fatores em consideração, como a passagem da tradição oral para a
escrita, tanto quanto a função que aquele conto publicado viria a
ter. Essa pesquisa, portanto, compromete-se a expor o significado
e o surgimento desses contos para entendermos sua função social-
histórica associada à cultura. Seja como registro histórico, ou como
representação cultural, o estudo da criação e da função dos contos dos
Grimm perpassa também a passagem da tradição oral para a escrita.
Contos de fadas
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em sua experiência e interpretação da realidade que vivenciavam.4
(FABRI, 2008, p.9)
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Dessa maneira, entende-se que o campo dos contos de fadas
não pertence unicamente às crianças, mas podem revelar muito se
estudado o seu surgimento e o que os levou a serem considerados
infantis.
Ainda segundo Tolkien, o conceito “Contos de Fadas” se
refere originalmente a histórias sobre o reino em que existiam as
fadas, elfos e os seres fantásticos e portadores de magia.8 Porém
a associação do termo Contos de Fadas aos contos de origem
popular publicados pelos Grimm se dá comumente pela presença
de elementos mágicos, sobrenaturais ou até mesmo fantásticos, em
alguns de seus contos. Logo, desmistificar os contos dos Grimm
como Contos de Fadas e caracterizá-los corretamente enquanto o que
realmente são: histórias populares transcritos da tradição popular de
um povo e pertencente à representação cultural de uma época ajuda
a procurar os meios corretos de estudo para essa fonte histórica.
Além de Contos de Fadas, é preciso saber diferenciar a
obra de Charles Perrault9 e os contos reunidos e publicados pelos
irmãos Grimm. Apesar de apresentarem similaridades com os
contos lançados por Perrault, a publicação dos irmãos se diferencia
exatamente em virtude das fontes narrativas. As fontes orais que
contribuíram com o Kinder und Hausmärchen tiveram algum
contato com a cultura francesa devido à proximidade geográfica.
A importância de tais fontes para diferenciar a obra dos Grimm,
segundo Darnton, é “como todos os contadores de história, os
narradores camponeses adaptavam o cenário de seus relatos ao
próprio meio; mas mantinham intatos os principais elementos
[...].”10 Mostrando, assim, que as fontes dos contos compilados
pelos irmãos adaptavam a história à sua vivência, incorporando
características dessa cultura germânica.
8
(...) porque no uso corrente do termo histórias de fadas não são histórias sobre fadas ou elfos,
mas sim sobre o Belo Reino, Faërie, o reino ou estado no qual as fadas existem.” In: Ibid. p. 15.
9
Charles Perraul lançou o Contes de ma mère l’oye (Contos da Mamãe Ganso) em 1697, uma
coletânea que veio a influenciar nos contos recolhidos pelos irmãos Grimm um século depois.
10
DARNTON, R. Op. Cit. p. 30-31.
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Os contos publicados pelos Grimm pertencem e carregam,
enquanto representações populares, elementos da sociedade em que
são lançados. Como anteriormente dito, não são criações dos autores,
mas registros recolhidos da tradição oral popular, e como tais,
apresentam em si elementos da cultura de onde foram recolhidos.
Segundo Darnton a análise realizada pelos historiadores com os
contos ajuda a compreender o significado presente nelas, pois “[...]
relacionam os contos com a arte de narrar histórias com o contexto
no qual isso ocorre. Examinam a maneira como o narrador adapta
o tema herdado a sua audiência, de modo que a especificidade do
tempo e do lugar apareça, através da universalidade do motivo.” 11
Dessa maneira, analisar uma versão de um conto dos Grimm
permite a compreensão também dos elementos culturais comuns aos
narradores de tais histórias. Como exemplo, ao averiguar os contos
escritos por eles, pode-se identificar a presença de exemplos de seu
universo mental: como o desejo por comida, riqueza ou casamento,
presente em contos como “Chapeuzinho Vermelho”, “Raponcel”12,
“Joãozinho e Margarida”, “O Casamento de João”, “João Jogatudo”,
entre outros.
Assim, ao estudar os elementos presentes nos contos dos
Grimm, nota-se as características sociais e culturais que eles
carregam, assim como Darnton fez. Entretanto esse artigo não irá se
aprofundar na dissecação do significado de cada conto, mas contará
com exemplos dos contos dos Grimm para demonstrar a importância
de relacionar literatura e história, e dialogar com seus significados.
Outro ponto comum das histórias dos Grimm que ajuda a
visualizar a mentalidade e a forma de vida da época em que foram
recolhidas é o local das narrativas. Geralmente em florestas, como
Chapeuzinho Vermelho, O Pequeno Polegar, Joãozinho e Maria,
Raponcel, entre outras. Essa característica ajuda a situar o meio
11
Ibid. p. 29.
12
A versão usada nesse artigo é “Raponcel”, pois a mulher fica com desejo de raponços e
devido a isso, a menina ganha esse nome nesta versão. GRIMM, J.; GRIMM, W. Contos
e Lendas dos Irmãos Grimm. II Volume. São Paulo: Editora Parma LTDA, s.d. p. 237-243.
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comum dos narradores como sendo anterior à industrialização e ao
desenvolvimento das cidades.
História-literatura
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do outro (arte -> sociedade). Com efeito, a atividade do artista
estimula a diferenciação de grupos; a criação de obras modifica os
recursos de comunicação expressiva; as obras delimitam e organizam
o público. Vendo os problemas sob esta dupla perspectiva, percebe-
se o movimento dialético que engloba a arte e a sociedade num
vasto sistema solidário de influência recíproca.14 (CÂNDIDO,
1976, p.24)
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A exemplo disso tem-se a influência dos autores, onde,
diferentemente dos contos provindos da tradição oral ou dos
contos de Perrault16, a publicação dos Grimm exprime a presença
das características da criação religiosa dos irmãos, e também da
cultura germânica que é a fonte das narrativas. Leva-se, ainda,
em consideração que além da formação religiosa dos autores, eles
pertenciam a uma camada social distinta daquela que narrou os
contos. Era esse o seu público alvo ao lançar os contos, e não o
público que contou as histórias, porém analfabeto.
Para Terry Eagleton acerca da literatura e a sua função, ela é
considerada também como uma mercadoria, um produto idealizado
obedecendo à finalidade que o seu criador dá a ela. Apesar de
representar os elementos sociais da época e da realidade de onde
surge, a literatura também é comercializada, gerando lucro e por
isso, direcionada a um público para ser consumida. Essa atividade
econômica que influência diretamente a produção artística como a
necessidade de lucro, serve também para justificar a relevância da
publicação de certa obra artística, e dita as regras de sua publicação
para atingir um público-alvo.17
Dessa forma, a publicação dos contos obedece ao propósito
pensado pelos seus editores. Os Grimm, embora muito interessados
em fazer o levantamento dos elementos culturais germânicos,
também obedeciam a critérios próprios. Critérios estes diferentes
de outros autores da época, explicando assim a diferenciação de sua
publicação.
Peter Burke fala que a manifestação de cultura popular está
enraizada profundamente com a realidade à qual ela está inserida. A
16
A obra de Perrault, por ter sido lançada visando à corte francesa, apresentou um caráter de
diversão, enquanto a publicação dos Grimm, seguindo a formação e o público para o qual
foi lançado, teve uma constituição diferente, mais moralista.
17
A literatura pode ser um artefacto, um produto da consciência social, uma visão do mundo;
mas é também uma indústria. Os livros não são apenas estruturas significativas, são também
mercadorias produzidas por editores e vendidas no mercado com lucro. [...] Podemos ver
a literatura como um texto, mas podemos também vê-la como uma actividade social, uma
forma de produção social e econômica que existe a par de outras formas semelhantes e se
interrelaciona com elas.” In: EAGLETON, T. Op. Cit. p. 77-78.
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cultura expressa as características do meio ao qual ela está inserida,
por isso é passiva de mudança conforme o meio muda. A análise do
significado presente na obra dos irmãos Grimm se relaciona com o
meio ao qual tais contos foram lançados, mesmo que tenham tido
contato com outras formas culturais, e anos após esse lançamento,
seu enredo se transformou com as mudanças sociais. Cada versão
de um conto, dessa forma, adquire as características culturais do
meio em que ele surge. 18
Logo, nota-se que além do interesse em registrar a cultura
popular, o outro intuito com o lançamento da coletânea era a sua
venda. E isso acontecia direcionando ao público que a compraria.
Ao contrário dos camponeses que transmitiram sua tradição
popular, mas, que desconheciam a leitura, os contos foram lançados
direcionados à camada burguesa letrada.19 Ademais, nota-se a
presença da criação religiosa dos irmãos na publicação.
A criação dos Grimm influência em sua publicação na
medida em que eles inserem elementos de sua formação religiosa
em muitos dos contos. A comparar com contos presentes na edição
de Perrault, por exemplo, constata-se a presença de elementos dessa
criação huguenote, como os contos “Copinho de Nossa Senhora”,
“João Jogatudo”, “São José na Floresta”, “Os três raminhos verdes”,
entre outros.20
18
A cultura popular, como vimos, estava intimamente relacionada com seu ambiente, adaptada
a diferentes grupos profissionais e modos regionais de vida. Necessariamente mudaria quando
mudasse seu ambiente. A maneira como ela mudou é um tema que os historiadores estão
apenas começando a investigar, e é de se esperar que essa história, quando for finalmente
contada, seja complexa, visto que as diferentes partes da Europa foram atingidas em diferentes
graus pelas transformações econômicas.” In: BURKE, P. Cultura popular na idade moderna.
2 ed. São Paulo: Companhia das letras, 1995. p. 267-268.
19
Quando Jacob e Wilhelm Grimm desenvolveram seu primeiro plano de compilar contos
populares alemães, tinham em mente um projeto erudito. Queriam capturar a voz ‘pura’ do
povo alemão e preservar na página impressa a poesia oracular da gente comum.” In: TATAR,
M. Contos de Fadas: Edição comentada e Ilustrada. Tradução: Maria Luisa X. de Borges. Rio
de Janeiro: Ed. Jorge ZAHAR Editor, 2004. p. 350.
20
Esses contos citados como exemplo apresentam em sua estrutura elementos de caráter
religioso, como a presença de santos ou anjos e uma linguagem religiosa moralista, incutindo
assim, os ideais religiosos. Esses ideais religiosos citados que estavam presentes nesses contos
eram a bondade, e ensinamentos de compaixão.” In: FABRI, L. C. Op. Cit. p. 28.
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Esse aspecto religioso exprime também a interferência dos
autores na publicação para servir a um público-alvo. Dessa forma
os próprios Grimm têm interferência direta sobre o lançamento
dos contos orais recolhidos, passando à medida que são relançados,
abrandando a linguagem, como Maria Tatar relaciona em seu
“Contos de Fadas” (2004):
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Esse tipo de manifestação de cultura popular que apresenta a
passagem da fonte oral para a publicação escrita mostra-se distinta
na obra dos Grimm do que em outros contos populares como o de
Perrault. Diferentemente de criar uma história, os irmãos publicaram
contos populares que coletaram oralmente em grande parte por
camponeses germânicos e adicionaram elementos próprios. Porém
alguns desses contos apresentavam contato com as histórias lançadas
por Perrault na França, embora muitas narrativas tenham vindo
realmente carregadas de elementos culturais originados da cultura
camponesa germânica.23
Darnton evidencia essa presença de elementos dos contos
de Perraul no lançamento da obra dos Grimm ao falar que
“’Chapeuzinho Vermelho’ inseriu-se na tradição literária alemã [...]
com suas origens francesas não detectadas.”24 E assim como houve a
mudança na passagem dos contos pelos diferentes meios culturais, a
mudança da oralidade e escrita também modificou as características
presentes no lançamento das histórias.
A mudança de elementos que é evidenciada quando são
comparadas as versões de Perrault com a dos Grimm mostra a
existência de uma discrepância entre a mentalidade vivenciada por
Perrault e a vivenciada pelos Grimm. À exemplo disso temos a versão
do conto “Chapeuzinho Vermelho” de Perrault, onde a menina é
simplesmente devorada. Entretanto, quando confrontada com a
versão dos Grimm, surge um elemento de redenção, o lenhador que
a salva e confere o caráter moralista ao conto,25 deixando claras as
dar-lhes um tom mais oral. Por exemplo, inseriram fórmulas tradicionais em Branca de Neve
que iam desde ‘era uma vez’ (Es war einmal) até ‘eles viveram felizes para sempre’ (sie lebten
glücklich bis na ihr Ende).” In: BURKE, P. Op. Cit. p. 46-47.
23
“Os contos da coletânea dos Grimm passaram a constituir um arquivo cultural do folclore
alemão, de histórias que ao que se pensava, espalhavam e modelavam a identidade nacional.
(...) Os Grimm baseavam-se em diversas fontes, tanto orais quanto literárias, para compilar
sua coletânea.” In: TATAR, M. Op. Cit. p. 351.
24
DARNTON, R. Op. Cit. p. 24.
25
“[...] na versão dos irmãos Grimm, a personagem título ser salva no final pelo personagem
do caçador, enquanto que na versão de Perrault esse personagem não existe.” In: FABRI, L.
C. Op. Cit. p. 59.
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origens e identidades de cada conto, que assume a forma proposta
pelo seu autor.
A análise fiel, entretanto, da versão oral não poderá ser feita,
devido a sua mudança quando transcrita e publicada.26 Essa mudança
de meio tende a mudar elementos da história e a pesquisa focada
nas versões escritas nem sempre podem garantir a sua transposição
total, perdendo alguns elementos nessa mudança. A narrativa oral é
perpassada, porém a história publicada escrita está a mercê de outros
fatores decisivos. O transmissor do conto e o seu receptor, portanto,
têm papel relevante para o lançamento da versão escrita da história.
Ainda sobre narrativa, segundo Walter Benjamim
26
O maior obstáculo é a impossibilidade de escutar as narrativas, como eram feitas pelos
contadores de histórias. Por mais exatas que sejam, as versões escritas dos contos não
podem transmitir os efeitos que devem ter dado vida às histórias no século XVIII [...]” In:
DARNTON, R. Op. Cit. p. 32.
27
BENJAMIN, W. Magia e técnica, arte e política. 3 Ed. São Paulo: Brasiliense, 1987. p. 205.
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motivo ajuda a justificar a diferença dos contos dos Grimm com
outros contos e nota-se aí o motivo pelo qual estudar esses contos:
explorar esse universo cultural.
Tem-se que ter em mente qual a definição de cultura usada no
texto e relacionada com seu contexto social. Segundo Peter Burke,
28
BURKE, P. Op. Cit. p. 25.
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A literatura popular tem sido um tema de pesquisa muito
concorrido nesses últimos dez anos, apesar da tendência cada vez
maior de questionar a idéia de que os livretos baratos, como a
bibliothèque bleue, tenham representado uma cultura autônoma da
gente simples, ou de que seja possível distinguir claramente entre
correntes da cultura de ‘elite’ e da cultura ‘popular’. Atualmente,
parece descabido conceber a transformação cultural como um
movimento linear, ou gradualmente descendente, de influências.
As correntes não só desciam, mas também subiam, fundindo-se e
misturando-se nesse transito.29 (DARNTON, 1990, p. 129.)
29
DARNTON, R. O Beijo de Lamourette. São Paulo: Companhia das Letras, 1990. p.129.
30
“Um outro fator que unia a cultura artesã e a cultura urbana, separando-as da cultura
camponesa, era a alfabetização. Os habitantes da cidade tinham oportunidades muito maiores
de aprender a ler e escrever do que os camponeses, visto que tinham mais acessos a mestres-
escolas.” In: BURKE, P. Op. Cit. p. 68.
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Um dos poucos casos extraordinários de interação entre a tradição
erudita e a popular é o da bruxa. Jacob Grimm achava que a crença
nas bruxas vinha do povo; Joseph Hansen, no final do século XIX
sustentou que ela tinha sido elaborada por teólogos a partir de
materiais extraídos das tradições clássica e cristã. Pesquisas mais
recentes sugerem que ambos estavam certos – em parte: a imagem
da bruxa corrente nos séculos XVI e XVII envolvia elementos
populares, como a crença de que certas pessoas tinham o poder
de voar pelos ares ou de fazer mal aos seus vizinhos por meios
sobrenaturais, e elementos eruditos, notadamente a idéia de um
pacto com o diabo.31 (BURKE, 1995, p.88-89)
Contos populares
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Industrial, a sociedade foi mudando e relegando o conteúdo dessas
histórias ao universo infantil.
Os contos dos Grimm, então, são únicos enquanto
representações de caráter popular com elementos sociais da época
em que surgem. A realidade desse período influenciou a obra dos
irmãos, assim como seu significado. Levando isso em consideração,
então, as características presentes nesses contos podem ser
analisadas relacionando com essa realidade que a originou e ajudar
à compreensão da mentalidade social dessa época.
Como já foi dito, anteriormente, a diferenciação dos contos
dos Grimm para os contos de Perrault é o significado presente
em cada obra. Mesmo ambas terem sido provenientes da tradição
oral, as histórias lançadas por Charles Perrault na França serviam
principalmente para “divertir a corte francesa do final do século
XVII”33. Por outro lado a análise dos contos e do contexto em que
eles surgiram determina o grau de influência dos Grimm enquanto
autores; revelando que a publicação dos irmãos serviu, além como
compilação de contos populares com características germânicas da
oralidade, também tinham presente aquilo que os Grimm desejavam
lançar. Essa presença exprimia aquilo que os autores desejavam
transmitir: uma obra com a presença religiosa moralista. Esse aspecto
dos contos dos Grimm os torna únicos e diferenciados de qualquer
outra manifestação de arte popular semelhante, e mostra também a
presença de elementos da cultura germânica do final do século XVIII.
Porém, para evidenciar o caráter distinto dos contos, eles
precisam ser confrontados, como Darnton fez em seu livro34, e revelar
os elementos presentes nas narrativas. Mesmo mantendo o sentido
e os elementos de sua forma oral, os contos ao serem publicados
também obedecem à influência dos irmãos Grimm.
33
FORTES, R. F.; ZANCHET, M. B.; LOTTERMANN, C. Tradição, estética e palavra
na literatura infanto-juvenil. Cascavel: Gráfica Universitária - UNIOESTE, 1996. p. 15.
34
O Grande Massacre de Gatos.
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“Charles Perrault publicou a primeira adaptação literária de
Chapeuzinho Vermelho em 1697, mas poucos pais se dispunham a
ler aquela versão do conto para os filhos, pois termina com o ‘lobo
mau’ jogando-se sobre Chapeuzinho Vermelho e devorando-a. Na
versão dos Grimm, a menina e a avó são salvas por um caçador,
[...].”35 (TATAR, 2004, p. 28)
35
TATAR, M. Op. Cit. p. 28.
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A primeira Cinderela que conhecemos chamava-se Yeh-hsien, e sua
história foi registrada por Tuan Ch’engshih por volta de 850 d.C.
Yeh-hsien usa um vestido feito de plumas de martim-pescador e
minúsculos sapatos de ouro. Ela triunfa sobre sua madrasta e a filha
desta, que são mortas a pedradas. Como as Cinderelas ocidentais,
Yeh-hsien é uma criatura humilde, que faz os serviços domésticos
e sofre tratamento humilhante nas mãos da madrasta e da filha
desta. Sua salvação aparece na forma de um peixe de três metros
de comprimento que a cumula de ouro, perolas, vestidos e comida.
As Cinderelas que seguem nas pegadas de Yeh-hsien encontram
sua salvação na forma de doadores mágicos. Na “Aschenputtel”
dos Grimm, uma árvore derrama sobre Cinderela uma profusão
de presentes; na “Cendrillon” de Perrault, uma fada madrinha lhe
proporciona uma carruagem, lacaios e lindas roupas; na escocesa
“Rashin Coatie”, um bezerrinho vermelho gera um vestido.36
36
TATAR, M. Op. Cit. p.37-8.
37
Disponível em: <http://www.worldoftales.com/fairy_tales/Charles_Perrault/
CINDERELLA,_OR_THE_LITTLE_GLASS_SLIPPER.html>. Acesso em 22 fev. 2013.
38
Disponível em: <http://www.worldoftales.com/fairy_tales/Brothers_Grimm/Margaret_
Hunt/Cinderella.html>. Acesso em 22 fev. 2013.
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O apelo duradouro de Cinderela provém não só da trajetória dos
trapos ao luxo da heroína do conto, mas também do modo como a
história se conecta com conflitos de família clássicos que vão desde
a rivalidade entre irmãos a ciúmes sexuais. [...] Se a mãe biológica
de Cinderela está morta, seu espírito reaparece e como o doador
mágico que dá a heroína os presentes de que ela precisa para fazer
uma aparição esplendida no baile. [...] A versão de Perrault de
1697, em seus Contos da Mamãe Gansa, está entre as primeiras
elaborações literárias completas da história. Foi seguida pela versão
mais violenta registrada em 1812 pelos Irmãos Grimm. Estes se
deleitaram descrevendo o sangue nos sapatos das filhas da madrasta,
que tentam cortar fora pedaços de seus calcanhares para que o
sapatinho lhes sirva. A versão alemã também nos dá uma Cinderela
menos compassiva, que não perdoa as filhas da madrasta mas as
convida para seu casamento quando pombos lhes bicam os olhos.39
39
TATAR, M. Op. Cit. p. 38.
40
Sobre Perrault “(
) recolheu as histórias da tradição oral e adaptou-as para o salão, com
um ajuste de tom, para atender ao gosto de uma audiencia sofisticada.” In: DARNTON,
R. Op. Cit. 1986. p. 89.
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Enquanto os contos franceses tendem a ser realistas, grosseiros,
libidinosos e cômicos, os alemães partem para o sobrenatural,
o poético, o exótico e o violento. Naturalmente, as diferenças
culturais não podem ser reduzidas a uma fórmula – astúcia francesa
contra crueldade alemã – mas as comparações possibilitam que se
identifique o tom peculiar que os franceses davam às suas histórias;
e a maneira como eles contam histórias fornece pistas quanto à sua
maneira de encarar o mundo.41(1986, p. 75)
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com o lobo devorando a menina. Ela nada fizera para merecer esse
destino; porque, nos contos camponeses, ao contrário dos contos
de Perrault e dos irmãos Grimm, não desobedece a sua mãe nem
deixa de ler os letreiros de uma ordem moral implícita, escritos
no mundo que a rodeia. Ela, simplesmente, caminhou para as
mandíbulas da morte. É a natureza inescrutável e inexorável de
calamidades que torna os contos tão comoventes, e não os finais
felizes que eles, com freqüência, adquirem, depois do século XVIII.44
(DARNTON, 1986, p.78-79)
44
DARNTON, R. Op. Cit. 1986. p. 78-79.
45
TATAR, M. Op. Cit. p.356.
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Logo, o grande passo dos Grimm com a publicação de contos
populares não foi só no caráter de preservar uma memória que foi
sendo esquecida, nem contribuir para o gênero literário com sua
formação e pesquisa, mas também vieram a influenciar diversos
autores posteriores, que ao ter seus contos como base, criaram as
mais diversas obras literárias. Pois como Perrault, conexão com
suas publicações o que permitiu o surgimento de outros nomes na
literatura universal.
Considerações finais
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Perrault com a publicação de sua compilação pode ser analisada na
medida em que foi uma das fontes para que os contos chegassem
aos Grimm, porém de forma indireta e oral atraves dos narradores
populares.
A mudança de características que as publicações carregam
mostra as suas influências e a relação com o público que iria recebê-
la. Com o decorrer do tempo, entretanto, ocorrem significativas
mudanças no contexto das publicações e consequentemente em
seu significado.
Como a análise entre Perrault e Grimm deixa claro, passado
um século entre os lançamentos e encontrando-se em culturas
diferentes, já diferem o seu sentido e a sua finalidade. Logo, após
o lancamento dos Grimm, nota-se também uma transformação no
contexto dos contos, até serem considerado na atualidade como
contos de caráter infantil, o contrário do que eram quando surgiram.
Dessa forma, a passagem da oralidade para a escrita, apesar de
contribuir para o seu registro e impedir a perda de seu conteúdo,
veio alterar, preogressivamente com o desenvolvimento da sociedade,
seu desígnio original: ser um registro cultural e transmitir elementos
da mentalidade popular da época em que foram recolhidos.
Além de acontecimentos históricos serem registrados
em fontes oficiais, a análise dos elementos presentes em cada
cultura ajudam a conhecer a situação de cada época. Mesmo
uma criação artística consegue demonstrar as caracteristicas de
uma época, relacionar um povo e sua cultura e preservar essa
memória. Entretanto, além de somente preservar, o estudo sobre as
características que favoreceram o surgimento dessa expressao artística
é muito importante e determinante para entender seu surgimento
e sua relação cultural.
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uma outra forma de ler os acontecimentos constitutivos da realidade
que motiva a arte literária.46 (MENDONÇA; ALVES, 2003, p. 02)
Referências
46
MENDONÇA, C. V. C. de; ALVES, G. S. Op. Cit. p. 2.
Boletim Cent. Let. Ci. Hum. UEL Londrina–nº 65 – p. 113-138––jan./jun. 2013 137
FABRI, Lorena Carolina. Era uma vez nos contos de fadas dos irmãos Grimm.
(graduação em história). Marechal Cândido Rondon: UNIOESTE, 2008.
TOLKIEN, John Ronald Reuel. Sobre histórias de fadas. São Paulo: Conrad,
2006.
Sites acessados
Boletim Cent. Let. Ci. Hum. UEL Londrina–nº 65 – p. 113-138––jan./jun. 2013 138
A seleção lexical como recurso de análise de texto
sobre as expectativas acadêmicas e profissionais de uma
futura professora de espanhol como língua estrangeira
(e/le)
Resumo: Este artigo apresenta análise de seleção lexical, em texto escrito em espanhol,
com foco no uso de adjetivos. O texto é de autoria de uma aluna em processo de formação
acadêmica, futura professora de espanhol como língua estrangeira (E/LE). O objetivo
da análise é identificar a ideologia implícita no texto sobre as expectativas relacionadas
ao desenvolvimento do estágio em instituição pública de ensino e à carreira docente.
Palavras-chave: seleção lexical, texto escrito, espanhol como língua estrangeira (E/LE)
Abstract: This article presents an analysis of lexical selection, in written text in Spanish,
with focus in the usage of adjectives. The text is authored by a student in the academic
formation process, a future teacher of Spanish as a foreign language. The purpose of this
analysis is to identify the ideology implicit in the text about the expectations related to the
internship development in an educational public institution and to the teaching carrier.
Key words: lexical selection, written text, Spanish/foreign language
Introdução
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Relatório de Estágio4 (RE), do terceiro ano, em 2012, à disciplina
de Estágio Supervisionado I, 6EST111, ministrada por esta docente.
Os dados de identificação da turma, do turno e da aluna5 não são
explicitados.
Na disciplina mencionada, além de preparar o aluno, futuro
professor, para a prática docente, no que diz respeito a procedimentos
teórico-prático-metodológicos, conhecimento das leis, diretrizes e
propostas governamentais para a Educação Básica, no que se refere à
língua estrangeira (LE), também se espera que os alunos demonstrem
um nível adequado de competência discursiva. Esclarecemos que,
para essa série6, o aluno deve, ao final do ano letivo, apresentar o
seguinte desenvolvimento na habilidade de expressão escrita (EE),
nível B2:
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Trabalho acadêmico exigido na 3ª Série do curso mencionado, como critério para promoção
de série, essa atividade compreendeu 20 (vinte) horas de observação de aulas, em 2012, em
instituições que oferecem o E/LE por meio do CELEM – Centro de Línguas Estrangeiras
Modernas.
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A autorização dos alunos para utilização dos relatórios como corpus para a pesquisa foi
devidamente documentada e esclarecida.
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A partir de 2012, a cada série do curso foi estabelecido um nível específico, com descritores
para cada uma das habilidades.
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No original: Soy capaz de escribir textos claros y detallados sobre una amplia serie de temas
relacionados con mis intereses. Puedo escribir redacciones o informes transmitiendo información
o proponiendo motivos que apoyen o refuten un punto de vista concreto. Sé escribir cartas que
destacan la importancia que le doy a determinados hechos y experiencias.
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http://cvc.cervantes.es/ensenanza/biblioteca_ele/marco/cvc_mer.pdf
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disciplinas do curso e é apresentada e discutida no início do ano
letivo entre docentes e discentes.
Dessa forma, a competência discursiva atinge seu máximo
de exposição quando o aluno redige o RE, realizado em contexto
de ensino de espanhol como língua estrangeira (E/LE), nos Centros
de Estudos de Línguas Estrangeiras Modernas (CELEM), em
instituições de ensino da rede pública da cidade de Londrina.
A análise proposta tem por base a seleção lexical do texto
introdutório, no qual a aluna/estagiária/autora manifesta sua opinião
e expectativas sobre seu processo de formação e futura atuação
profissional na área docente. A justificativa da análise encontra-se,
primeiramente, na carga emocional que a redação desse texto deve
suscitar no aluno ao referir-se, tanto à sua caminhada para obter
a titulação acadêmica, quanto ao seu engajamento no processo, e
em um segundo momento, a observação da presença de palavras
que se relacionem à visão do aluno sobre a profissão docente, o que
permite, também, uma visão da formação oferecida pelo curso, do
ponto de vista discente, em meio ao seu processo de aprendizagem.
Contextualização
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a que, na cidade de Londrina, o número de escolas públicas que
oferecem o E/LE em horário regular de aulas é reduzido, conforme
atesta Silva (2011, p. 6-7),
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parte final do trabalho, sobre o processo vivenciado na instituição
de ensino, em confronto e análise com o construto teórico e as
práticas da disciplina.
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A comunicação e a semântica argumentativa
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sua opinião, argumentar sobre sua visão acerca do processo inicial
de estágio.
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Análise
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O texto não sofreu correções ou quaisquer adequações para esta análise.
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No quadro seguinte, disponho os adjetivos identificados e
classificados, por parágrafos, segundo a ideia de tempo a que se
referem. Após o quadro, comento o uso dos adjetivos em relação à
temática do texto.
feliz
mejor
- excelentes -
1º
extrajera
2º - - público
difícil
3º - conmovida -
única
responsable
4º - -
única
- rica (no serlo)
5º -
Comentários
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interpretação é confirmada pelo uso de MEJOR, adjunto adnominal
de universidade, especifica o status, em sua opinião, da instituição
dentro da comunidade local. Esse conceito de fazer parte do que
há de melhor, em termos acadêmicos, também é explicitado pelo
qualificativo EXCELENTES, em relação ao corpo docente de seu
curso. É clara a evidência de satisfação pessoal no sentimento
de pertencimento da autora, no que se refere ao seu universo de
aprendizagem.
No terceiro parágrafo, o adjetivo DIFÍCIL, também
predicativo do sujeito, indica a dificuldade de exposição pessoal,
de exteriorizar sentimentos com relação ao que espera de e para si
mesma. O uso de CONMOVIDA, para explicar a condição da autora
no momento de redação do texto, em relação a seu pensamento
sobre o futuro, confirma o uso do adjetivo anterior e sua carga
semântica, (DIFÍCIL).
No quarto parágrafo, a autora faz uso do adjetivo ÚNICA,
em dois momentos: linha 2 e linha 3, em ambos com a função de
adjunto adnominal do substantivo persona.
No mesmo parágrafo, o adjetivo, adjunto adnominal,
RESPONSABLE é usado para determinar, também, o substantivo
PERSONA, referindo-se a ela mesma, em uma atitude de
reconhecimento da responsabilidade por seu sucesso, sem restringir-
se ao campo profissional de forma explícita.
Com relação à seleção lexical e ao uso de adjetivos relacionados
ao presente, à fase inicial do estágio, no processo de formação, a
autora permite a compreensão de uma postura exigente em relação
à qualificação.
Quanto ao uso de adjetivos relacionados ao futuro, a autora
usa o adjetivo PÚBLICO, para esclarecer que gostaria de exercer
sua profissão na rede pública de ensino. Ao observar o próximo
adjetivo, o do quinto parágrafo, predicativo do sujeito, RICA, em
sentido de não sê-lo, há a exteriorização de que, embora possa
conseguir uma vaga em instituição pública, já manifesta ter como
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clara e determinada a baixa remuneração, sem entrar em detalhes
para justificar ou esclarecer seu posicionamento.
Essa constatação demonstra a crença e a convicção de um
futuro econômico não promissor, reforça o lugar comum de que
ser professor é uma realização pessoal, um ideal, uma contribuição
social, um ato de amor ou, ainda, exercer um dom.
A autora faz uso de duas expressões que chamam a atenção
(marcadas em cinza): COMO ESTUDIANTE, no segundo e no
terceiro parágrafos, e COMO PROFESORA, no quinto e último
parágrafo. Essas expressões sugerem duas etapas de sua vida, dois
papéis, os quais demonstram a mesma postura ou visão negativa em
relação à sua formação acadêmica e à área de atuação profissional do
docente. A primeira, de perda de identidade e a segunda, de perda
de uma boa remuneração salarial.
Embora a palavra SUEÑO, no singular e no plural, apareça
no texto (2º, 3º e 4º parágrafos), tanto relacionada ao campo da
vida pessoal da autora, como no sentido de abrangência a outros
colegas de formação, esse vocábulo cede lugar aos aspectos reais da
formação e da atuação profissional, a realidade demonstra já estar
internalizada, mais presente, mais marcada no discurso.
Considerações finais
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como indivíduo que se desloca de sua zona de conforto para o real
idealizado, para a interação, o encontro e o confronto teórico e
prático. Os demais textos do RE fornecem mais dados e reflexões.
Certamente, o trabalho de escritura desse material de avaliação
ultrapassa o cumprimento de atividades obrigatórias, pode ser
considerado um divisor de águas na formação profissional. Neste
espaço delimitado, temos o início, as expectativas e as primeiras
manifestações do pessoal no coletivo e as interferências do coletivo
no pessoal.
Referências
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________. Argumentação: da Idade Média ao Século XX. Signum: Estudos
da Linguagem, Londrina, n.7/2, p. 109-131, 2004.
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