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DIREITO PENAL E PROCESSO PENAL

Módulo:
Teoria do Crime

TEMA– ITER CRIMINIS

Aula 01 – ITER CRIMINIS

Iter criminis significa o caminho, as etapas, o percurso do crime.


Entre outras definições, temos que o crime pode ser consumado ou tentado,
por esse motivo se faz necessário o estudo do iter criminis no sentido de saber quais
são suas fases e em qual delas o sujeito pode ser punido.
Nesse sentido, temos como fases do iter crimins: Cogitação, Atos
Preparatórios, Atos executórios, consumação e em algumas situações o Exaurimento.
Quando se fala em tentativa, temos que, de acordo com o artigo 14, II, do
Código Penal, o crime é tentado quando, iniciada a execução, não se consuma por
circunstâncias alheias à vontade do agente.
Nesse sentido, temos que somente são punidos os atos praticados após o
início da execução.
As outras fases, quais sejam, a cogitação e os atos preparatórios não são
punidos, pois, não externados em direção à consumação do delito.
Sobre o tema nos ensinamentos do Prof. Guilherme de Souza Nucci:

Conceito e divisão do iter criminis: trata-se do percurso para a


realização do crime, que vai da cogitação à consumação. Divide-se
em duas fases – interna e externa –, que se subdividem: a) fase
interna, que ocorre na mente do agente, percorrendo, como regra, as
seguintes etapas: a.1) cogitação: é o momento de ideação do delito,
ou seja, quando o agente tem a ideia de praticar o crime; a.2)
deliberação: trata-se do momento em que o agente pondera os prós e
os contras da atividade criminosa idealizada; a.3) resolução: cuida do
instante em que o agente decide, efetivamente, praticar o delito. Tendo
em vista que a fase interna não é exteriorizada, logicamente não é
punida, pois cogitationis poenam nemo patitur (ninguém pode ser
punido por seus pensamentos), conforme já proclamava Ulpiano
(Digesto, lib. XLVIII, título 19, lei 18); b) fase externa, que ocorre no
momento em que o agente exterioriza, através de atos, seu objetivo
criminoso, subdividindo-se em: b.1) manifestação: é o momento em
que o agente proclama a quem queira e possa ouvir a sua resolução.
Embora não possa ser punida esta fase como tentativa do crime
almejado, é possível tornar-se figura típica autônoma, como acontece
com a concretização do delito de ameaça; b.2) preparação: é a fase
de exteriorização da ideia do crime, através de atos que começam a
materializar a perseguição ao alvo idealizado, configurando uma
verdadeira ponte entre a fase interna e a execução. O agente ainda
não ingressou nos atos executórios, daí por que não é punida a
preparação no direito brasileiro (ver nota 29-A supra). Exemplo de
Hungria, em relação aos atos preparatórios, não puníveis: “Tício,
tendo recebido uma bofetada de Caio, corre a umarmeiro, adquire um
revólver, carrega-o com seis balas e volta, ato seguido, à procura do
seu adversário, que, entretanto, por cautela ou casualmente, já não se
acha no local da contenda; Tício, porém, não desistindo de encontrar
Caio, vai postar-se, dissimulado, atrás de uma moita, junto ao caminho
onde ele habitualmente passa, rumo de casa, e ali espera em vão pelo
seu inimigo, que, desconfiado, tomou direção diversa. Não se pode
conceber uma série de atos mais inequivocamente reveladores da
intenção de matar, embora todos eles sejam meramente
preparatórios” (Comentários ao Código Penal, v. I, t. II, p. 79). Outro
exemplo, tratando do crime de estelionato: TJSP: “A mera cogitatio ou
mesmo atos preparatórios (o preenchimento do cheque) não se
encartam no segmento do iter criminis suscetível de punição da
tentativa” (Ap. 60.738-3, 1.ª C., rel. Marino Falcão, 28.03.1988, v. u.,
RT 629/323, embora antigo, não se alterou essa orientação).
Excepcionalmente, diante da relevância da conduta, o legislador pode
criar um tipo especial, prevendo punição para a preparação de certos
delitos, embora, nesses casos, exista autonomia do crime consumado.
Exemplo: possuir substância ou engenho explosivo, gás tóxico ou
asfixiante ou material destinado à sua fabricação (art. 253, CP) não
deixa de ser a preparação para os crimes de explosão (art. 251, CP)
ou de uso de gás tóxico (art. 252, CP), razão pela qual somente torna-
se conduta punível pela existência de tipicidade incriminadora
autônoma; b.3) execução: é a fase de realização da conduta
designada pelo núcleo da figura típica, constituída, como regra, de
atos idôneos e unívocos para chegar ao resultado, mas também
daqueles que representarem atos imediatamente anteriores a estes,
desde que se tenha certeza do plano concreto do autor (consultar,
sobre a passagem da preparação para a execução, as teorias
expostas na nota 32 abaixo). Exemplo: comprar um revólver para
matar a vítima é apenas a preparação do crime de homicídio, embora
dar tiros na direção do ofendido signifique atos idôneos para chegar
ao núcleo da figura típica “matar”; b.4) consumação: é o momento de
conclusão do delito, reunindo todos os elementos do tipo penal.”1

Como dito acima, não são todos os crimes que necessariamente chegam a
fase de exaurimento, é o que ocorre no contexto dos crimes formais, quando atingem
o resultado previsto no tipo – mas não obrigatório para consumação, conforme nos
ensina o professor Nucci:
“Exaurimento do crime: significa a produção de resultado lesivo a bem
jurídico após o delito já estar consumado, ou seja, é o esgotamento da
atividade criminosa, implicando em outros prejuízos além dos
atingidos pela consumação. É o que ocorre no contexto dos crimes
formais, quando atingem o resultado previsto no tipo – mas não
obrigatório para a consumação. Exemplo disso: o recebimento do
resgate (exaurimento) na extorsão mediante sequestro, que se
consuma após a realização da privação da liberdade da vítima.
Segundo ZAFFARONI e PIERANGELI, denomina-se também
consumação material (Da tentativa, p. 26).”2

Entretanto, quando se fala em Iter Criminis, não é só no caso de tentativa que


o crime não ocorre, sendo possível também que evento não ocorra por outras
situações.
São elas: Desistência voluntária ou arrependimento eficaz e crime impossível.

1
Nucci, Guilherme de Souza Código penal comentado : estudo integrado com processo
e execução penal : apresentação esquemática da matéria : jurisprudência atualizada /
Guilherme de Souza Nucci. – 14. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro : Forense,
2014. p. 161.
2
Ibiden
Bibliografia

DECRETO-LEI Nº 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940 – CÓDIGO PENAL


Nucci, Guilherme de Souza Código penal comentado : estudo integrado com
processo e execução penal : apresentação esquemática da matéria : jurisprudência
atualizada / Guilherme de Souza Nucci. – 14. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro
: Forense, 2014.
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Módulo:
Teoria do Crime

TEMA – ITER CRIMINIS

Aula 02 – ITER CRIMINIS

Desistência voluntária

A desistência voluntária e o arrependimento eficaz vêm descritos no artigo 15


do Código Penal.
Estudaremos cada instituto de forma autônoma.

Desistência voluntária e arrependimento eficaz

Art. 15 - O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na


execução ou impede que o resultado se produza, só responde pelos
atos já praticados

Na desistência voluntária, o agente, voluntariamente interrompe a execução


do crime.
Importante salientar que a desistência não precisa ser, necessariamente
espontânea, mas é exigido que tenha partido do próprio agente, portanto, sem
qualquer influência de terceiro.
Ainda, a desistência tem que ocorrer antes de terminado os atos executórios,
senão estaríamos diante da figura da tentativa, ou seja, o agente poderia prosseguir
com os atos executórios, mas desistiu.
Nesse caso, deverá responder apenas pelo que já efetivamente praticou, até
o momento da desistência.
Nesse sentido, professor Guilherme de Souza Nucci:
“Conceito de desistência voluntária: trata-se da desistência no
prosseguimento dos atos executórios do crime, feita de modo
voluntário, respondendo o agente somente pelo que já praticou. “O
abandono é voluntário quando ocorre independentemente de
impedimentos obrigatórios; é voluntário quando o autor diz a si
mesmo: não quero mas posso; não voluntário, quando diz a si mesmo:
não posso mas quero” (cf. FRANK, citado por WELZEL, Derecho penal
alemán, p. 235).
Natureza jurídica da desistência voluntária e do arrependimento
eficaz: há pelo menos três correntes debatendo o tema: a) causa de
exclusão da tipicidade (FREDERICO MARQUES, HELENO
FRAGOSO, BASILEU GARCIA): o tipo penal da tentativa é formado
com a utilização do art. 14, inciso II, do Código Penal, que prevê o
início da execução e a não consumação por circunstâncias alheias à
vontade do agente. Daí porque, se a desistência for voluntária, não há
que se falar em causa alheia à vontade, afastando-se a tipicidade da
conduta. O agente, segundo a regra do art. 15, responde somente pelo
que já praticou. Exemplo: se estava tentando matar A e desiste, já
tendo alvejado a vítima, responderá unicamente pelas lesões
corporais causadas. Nas palavras de FREDERICO MARQUES: “Não
tem sentido dizer que a tentativa já foi perpetrada e por isso não pode
haver efeito ex tunc do arrependimento ou da desistência. (...) Os atos
de execução, quando o delito não se consuma, de per si, são atividade
atípica. Não fosse a norma de extensão sobre o conatus, e todo o
processo executivo, em tais casos, seria irrelevante para o Direito
Penal. Ora, se do próprio conteúdo dessa norma, que possibilita a
adequação típica indireta, tira-se a ilação de que a tentativa só existirá
se a consumação não ocorrer por motivos alheios à vontade do
agente, é mais que evidente que não há adequação típica quando a
não consumação decorre de ato voluntário do autor dos atos
executivos do delito” (Tratado de direito penal, v. II, p. 387). Nessa
ótica: STJ: “A configuração da desistência voluntária afasta,
inevitavelmente, o delito na sua forma tentada, respondendo o agente
pelos atos já praticados. Não há dúvida, entretanto, que na tentativa o
resultado não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do
agente. No caso, há esgotamento de todos os atos executórios ou o
agente é impedido de exauri-los. O dolo inicialmente pretendido,
entretanto, remanesce. Já na desistência voluntária e no
arrependimento eficaz, por opção/escolha do agente, o fim
inicialmente pretendido pelo agente não se realiza. Ou seja, ao alterar
o dolo inicialmente quisto, enseja a ocorrência da atipicidade,
respondendo, entretanto, pelos atos já praticados” (REsp
497.175/SC)” (HC 184.366/DF, 5.ª T., rel. Jorge Mussi, 02.08.2011,
v.u.); b) causa de exclusão da culpabilidade (WELZEL, ROXIN): tendo
em vista que o agente desistiu de prosseguir no crime idealizado, não
deve mais sofrer juízo de reprovação social, resultando no
afastamento da sua culpabilidade quanto ao delito principal, porém
respondendo pelo que já concretizou; c) causa pessoal de exclusão
da punibilidade (ZAFFARONI, Pierangeli, Roberto Reynoso D’Avila,
Aníbal Bruno, Paulo José da Costa Jr., Magalhães Noronha, Hungria):
afasta-se, no caso, a punibilidade do agente, mas não a tipicidade ou
a culpabilidade. Se o agente, exemplificando, estava atirando contra A
para matá-lo, cada tiro que desferia e errava, por si só, configurava
uma tentativa de homicídio, de modo que, ao cessar os atos
executórios, afasta a possibilidade de ser punido, embora não se
possa apagar uma tipicidade já existente. Trata-se de um prêmio pela
desistência do agente. Não se pode suprimir retroativamente a
tipicidade. Explicam ZAFFARONI e PIERANGELI: “A principal objeção
que se pode formular contra o argumento daqueles que pretendem ver
na desistência uma atipicidade, seja objetiva, seja subjetiva, encontra-
se na impossibilidade de ter a desistência a virtualidade e tornar atípica
uma conduta que antes era típica. Se o começo de execução é objetivo
e subjetivamente típico, não se compreende como um ato posterior
possa eliminar o que já se apresentou como proibido, situação que
muito se assemelha à do consentimento subsequente” (Da tentativa,
p. 87). Esta última corrente é, em nosso entender, a mais adequada.
Aliás, a opção pela excludente pessoal de punibilidade produz reflexos
concretos, como ocorre no contexto do concurso de pessoas. Imagine-
se a hipótese de um homicídio encomendado. O mandante efetua o
pagamento, embora, no momento da execução, o agente-executor
desiste voluntariamente de prosseguir. Assim, não responderia este
por tentativa de homicídio, mas somente pelo que já praticou,
enquanto o mandante, que não desistiu de prosseguir, seria punido
por tentativa de homicídio. Em idêntica visão: WELZEL (Derecho penal
alemán, p. 235).”1

Também o pensamento do ilustre professor Ricardo Antonio Andreucci:

“O art. 15 do Código Penal cogita das hipóteses em que o agente


desiste de prosseguir no iter criminis ou, mesmo tendo-o percorrido
quase por completo, arrepende-se, impedindo que o fato se consume.
A desistência voluntária somente é possível na tentativa imperfeita.
Não havendo percorrido, ainda, toda a trajetória do delito, iniciados os
atos de execução, o agente pode deter-se, voluntariamente. Exemplo:
o agente ministra veneno à bebida da vítima, arrependendo-se depois
e impedindo-a de ingeri-la.”2

1
Nucci, Guilherme de Souza Código penal comentado : estudo integrado com processo
e execução penal : apresentação esquemática da matéria : jurisprudência atualizada /
Guilherme de Souza Nucci. – 14. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro : Forense,
2014. p. 172.
2
Andreucci, Ricardo Antonio. Manual de direito penal / Ricardo Antonio Andreucci. – 4.
ed. reformulada – São Paulo : Saraiva, 2008. p. 52.
Bibliografia

DECRETO-LEI Nº 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940 – CÓDIGO PENAL

Andreucci, Ricardo Antonio. Manual de direito penal / Ricardo Antonio


Andreucci. – 4. ed. reformulada – São Paulo : Saraiva, 2008.

Nucci, Guilherme de Souza Código penal comentado : estudo integrado com


processo e execução penal : apresentação esquemática da matéria : jurisprudência
atualizada / Guilherme de Souza Nucci. – 14. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro
: Forense, 2014.
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Teoria do Crime

TEMA – ITER CRIMINIS

Aula 03 – ITER CRIMINIS

Arrependimento eficaz

Desistência voluntária e arrependimento eficaz

Art. 15 - O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na


execução ou impede que o resultado se produza, só responde pelos
atos já praticados

No arrependimento eficaz estamos diante da situação onde o agente esgota


os meios executórios, entretanto, antes da consumação impede que o crime se
concretize.
Essa ação tem que ser voluntária, sem intervenção de terceiro, e eficaz, ou
seja, que efetivamente impeça o resultado.
No caso de efetivamente evitar o resultado, por exemplo no caso de homicídio,
onde o agente, após realizar todos os atos executórios socorre a vítima, responderá
pelos atos praticados.
No caso de, embora tenha socorrido, a vítima venha a falecer, o crime de
homicídio está caracterizado, portanto, não se aplica o arrependimento eficaz, que por
certo não ocorreu. O arrependimento foi ineficaz.
Não se exige que o arrependimento seja espontâneo.
Segundo nos ensina o professor Guilherme de Souza Nucci:
“Conceito de arrependimento eficaz: trata-se da desistência que
ocorre entre o término dos atos executórios e a consumação. O
agente, nesse caso, já fez tudo o que podia para atingir o resultado,
mas resolve interferir para evitar a sua concretização. Exemplo: o
autor ministra veneno a B; os atos executórios estão concluídos; se
nada fizer para impedir o resultado, a vítima morrerá. Por isso, o autor
deve agir, aplicando o antídoto para fazer cessar os efeitos do que ele
mesmo causou. Eficácia do arrependimento: exige a norma do art. 15
que o arrependimento do agente seja realmente eficaz, ou seja, capaz
de impedir o resultado. Não se aplica o benefício previsto neste artigo
caso o autor dos atos executórios, embora arrependido, não consiga
evitar que o resultado se produza, por qualquer causa.
Exemplificando: se o agente dá veneno, pretendendo matar a vítima,
mas, antes que esta morra, arrepende-se e resolve ministrar o
antídoto; caso o ofendido não se salve (seja porque o antídoto falhou
ou mesmo porque a vítima não quis ingeri-lo), responderá por
homicídio consumado. Confira-se a lição de MAGALHÃES
NORONHA: “A responsabilidade perdura, a nosso ver, mesmo que
outra causa concorra. Ainda na hipótese em questão, se, apresentado
o antídoto, a vítima recusar-se a tomá-lo, por achar-se desgostosa da
vida e querer consumar seus dias, não há isenção de pena ao agente,
pois seu arrependimento não teve eficácia. A recusa da vítima não
rompe o nexo causal entre a ministração do tóxico e a morte (por mais
miraculosa fosse essa vontade, não teria o condão de fazer aparecer
veneno nas vísceras do sujeito passivo). Por outro lado, é patente ser
essa vontade uma concausa (não ter observado o regime médico-
higiênico reclamado por seu estado)” (Direito penal, v. 1, p. 131).
Voluntariedade e espontaneidade: no contexto do direito penal, há
diferença entre voluntário e espontâneo. Agir voluntariamente significa
atuar livremente, sem qualquer coação. Agir espontaneamente quer
dizer uma vontade sincera, fruto do mais íntimo desejo do agente. No
caso da desistência e do arrependimento eficaz, exige-se apenas
voluntariedade, mas não espontaneidade. Se o agente deixar de
prosseguir na trajetória criminosa porque se arrependeu do que vinha
fazendo, terá agido de modo voluntário e espontâneo, embora não
seja necessário este último requisito para configurar a excludente.
Desistência momentânea: é consistente para determinar a desistência
voluntária, pois houve voluntariedade na conduta, embora possa não
haver espontaneidade. Se o agente desistir de prosseguir na
execução do delito, porque achou que o momento era inconveniente,
pretendendo continuar em outra época, deve ser beneficiado pela
excludente. É o pensamento majoritário. Na lição de HUNGRIA:
“Mesmo no caso em que o agente desiste da atividade executiva com
o desígnio de repeti-la em outra ocasião (desistência da consumação,
sem abandono total do propósito criminoso), há desistência voluntária”
(Comentários ao Código Penal, v. I, t. II, p. 98). Há diferença, no
entanto, entre adiamento da execução e pausa na execução, isto é,
quando o agente suspende a execução, aguardando momento mais
propício para concluir o delito, com nítida proximidade de nexo
temporal. Ex.: espera o ladrão, que havia iniciado o arrombamento de
uma janela, a passagem do vigia noturno pela rua, a fim de dar
prosseguimento no intento de praticar o furto. Se for surpreendido,
durante a pausa, haverá tentativa de furto. Em contrário, não
aceitando a hipótese de desistência momentânea, ressalte-se da
posição de COSTA E SILVA: “Não existe desistência, quando o agente
suspende a execução com o pensamento de continuá-la depois,
emocasião propícia. Assim também quando deixa apenas de repetir o
ato. A desfecha em B com o intuito de matá-lo, um tiro de seu revólver.
A bala não fere o alvo: perde-se no espaço. Dispondo ainda de mais
projéteis em sua arma, deixa A de deflagrá-los. Segundo algumas
opiniões, há na hipótese uma desistência, que torna a tentativa
impunível. Temos como mais jurídica a solução contrária. O tiro que
falhou representa uma tentativa perfeita ou acabada. A inação,
consistente na abstenção de novos tiros, não corresponde à exigência
legal de voluntário impedimento do resultado. Nem de lege ferenda as
aludidas opiniões se justificam. Elas criam uma situação de favor para
o indivíduo que cautelosamente carrega todo o cilindro de seu
revólver. O que dispõe só de uma bala, incorre em tentativa punível.
O que dispõe de várias, não. É palpável o absurdo” (Código Penal, p.
92-93).”1

Ainda seguindo o pensamento do professor Nucci, a diferença entre


desistência ou arrependimento e tentativa está no fato de que nas duas primeiras
situações o agente não deseja mais o resultado e desiste ou se arrepende
voluntariamente, enquanto que na tentativa existe a intervenção de terceiro, ou seja,
por forças alheias à vontade do agente.
Abrange por fim a tentativa qualificada, quando são puníveis os fatos já
consumados.

“2Diferença entre desistência ou arrependimento e tentativa: nas duas


primeiras hipóteses, o agente, voluntariamente, não mais deseja
chegar ao resultado, cessando a sua atividade executória (desistência
voluntária) ou agindo para impedir a consumação (arrependimento
eficaz), enquanto na terceira hipótese o agente quer atingir o
resultado, embora seja impedido por fatores estranhos à sua vontade.
Tentativa qualificada: são os fatos puníveis já consumados quando há
a desistência de prosseguir na execução do crime ou ocorre
arrependimento eficaz (cf. ROBERTO REYNOSO D’AVILA, Teoría
general del delito, p. 313; WELZEL, Derecho penal alemán, p. 235).”

1
Nucci, Guilherme de Souza Código penal comentado : estudo integrado com processo
e execução penal : apresentação esquemática da matéria : jurisprudência atualizada /
Guilherme de Souza Nucci. – 14. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro : Forense,
2014. p. 174.
2
Ididen
Bibliografia

DECRETO-LEI Nº 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940 – CÓDIGO PENAL

Nucci, Guilherme de Souza Código penal comentado : estudo integrado com


processo e execução penal : apresentação esquemática da matéria : jurisprudência
atualizada / Guilherme de Souza Nucci. – 14. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro:
Forense, 2014.
DIREITO PENAL E PROCESSO PENAL

Módulo:
Teoria do Crime

TEMA – ITER CRIMINIS

Aula 04 – ITER CRIMINIS

Crime impossível

Crime impossível

Art. 17 - Não se pune a tentativa quando, por ineficácia


absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do
objeto, é impossível consumar-se o crime.

O crime impossível vem descrito no artigo 17 do Código Penal, sendo certo


que não pune a tentativa, quando há ineficácia absoluta do meio ou por absoluta
impropriedade do objeto.
O professor Ricardo Andreucci traz os seguintes exemplos:

“Exemplo de ineficácia absoluta do meio é alguém, querendo


envenenar seu inimigo, ministra-lhe açúcar em vez de veneno.
Exemplo de impropriedade do objeto é a mulher, julgando-se grávida,
praticar manobras abortivas.
No crime impossível existe a exclusão da própria tipicidade, e não a
causa de isenção de pena.
O nosso Código Penal adotou a teoria objetiva temperada com relação
à punibilidade do crime impossível, uma vez que, ausentes os
elementos objetivos da tentativa, não corre risco o bem jurídico, pouco
importando o elemento subjetivo do agente.
Entretanto, a ineficácia do meio e a impropriedade do objeto devem
ser absolutas, ou seja, o delito, naquelas circunstancias, nunca
poderia se consumar. Se a ineficácia do meio e a impropriedade do
objeto forem relativas, aí sim poderia o crime se consumar (teoria
objetiva temperada).”1

Importante nesse aspecto, transcrever as lições do professor Fernando


Capez:
“Nomenclatura: o crime impossível é também chamado de tentativa
inidônea, tentativa inadequada ou quase-crime.
Conceito: é aquele que, pela ineficácia total do meio empregado ou
pela impropriedade absoluta do objeto material, é impossível de se
consumar.
Natureza jurídica: não se trata de causa de isenção de pena, como
parecer sugerir a redação do art. 17 do Código Penal, mas de uma
causa geradora de atipicidade, pois não se concebe queira o tipo
incriminador descrever como crime uma ação impossível de se
realizar. Trata-se, portanto, de verdadeira causa de exclusão da
própria tipicidade. Muguel Reale Júnior observa a respeito: ‘Enquanto
no crime tentado a consumação deixa de ocorrer pela interferência de
causa alheia à vontade do agente, no crime impossível a consumação
jamais ocorrerá, e, assim sendo, a ação não se configura como
tentativa de crime, que se pretendia cometer, por ausência de
tipicidade. Dessa forma, equivoca-se o legislador ao editar: ‘não é
punível a tentativa’ como se tratasse de causa de impunidade de um
crime tentado configurado’ (Parte geral do Código Penal – nova
interpretação, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1998, p. 80). Trata-
se, portanto, de causa excludente do fato típico.”2

E não é diferente o entendimento do professor Guilherme de Souza Nucci:

“Conceito de crime impossível (tentativa inidônea, impossível, inútil,


inadequada ou quase crime): é a tentativa não punível, porque o
agente se vale de meios absolutamente ineficazes ou volta-se contra
objetos absolutamente impróprios, tornando impossível a consumação
do crime. Trata-se de uma autêntica “carência de tipo”, nas palavras
de ANÍBAL BRUNO (Sobre o tipo no direito penal, p. 56). Exemplos:
atirar, para matar, contra um cadáver (objeto absolutamente impróprio)
ou atirar, para matar, com uma arma descarregada (meio
absolutamente ineficaz). Natureza jurídica do crime impossível: é uma
causa excludente da tipicidade. Fundamento da não punição do crime
impossível: adota-se, no Brasil, a teoria objetiva, vale dizer, leva-se em
conta, para punir a tentativa, o risco objetivo que o bem jurídico corre.
No caso da tentativa inidônea, o bem jurídico não sofreu risco algum,
seja porque o meio é totalmente ineficaz, seja porque o objeto é
inteiramente impróprio. Daí por que não há punição. Acrescenta

1
Andreucci, Ricardo Antonio. Manual de direito penal / Ricardo Antonio Andreucci. – 4.
ed. reformulada – São Paulo : Saraiva, 2008. p. 53.
2
Capez, Fernando. Curso de direito penal : parte geral : volume 1 / Fernando Capez, -
5. ed. rev. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2003. p. 228.
MARCELO SEMER, expondo as várias teorias acerca do crime
impossível, ter o Código Penal adotado a teoria objetiva temperada ou
moderada. A diferença básica entre a objetiva pura e a objetiva
temperada está na exigência de meio ou objeto absolutamente
ineficaz ou impróprio (temperada) e meio ou objeto relativamente
ineficaz ou impróprio (pura). Isto significa, ilustrativamente, que um
sujeito, ao tentar envenenar alguém, usando substância letal, mas em
dose insuficiente (meio relativamente ineficaz), pela teoria adotada no
Brasil, deve responder por tentativa de homicídio. Somente não
responderia se utilizasse substância totalmente inofensiva para a
vítima, no caso concreto (meio absolutamente ineficaz). Conclui o
autor que, para “a teoria objetiva temperada, em resumo, crime
impossível é a tentativa realizada com meios absolutamente inidôneos
ou dirigidos a um objetivo inidôneo. Em ambas as situações está
ausente o perigo real que deve acompanhar, em todo caso como
consequência, tanto o crime consumado como o tentado. A tentativa,
pois, não seria punível, eis que ausente seu caráter objetivo. A
contrario sensu, a tentativa está caracterizada – afastado, portanto, o
delito impossível – quando os meios forem relativamente inidôneos”
(Crime impossível e a proteção aos bens jurídicos, p. 36-38).”3

Por fim, importante a observação do professor Cristiano Rodrigues:

“Se o meio ou o objeto forem apenas relativamente incapazes de gerar


o resultado lesivo, não haverá crime impossível, mas sim tentativa
punível. Logo, de acordo com o STJ, a tentativa de furtos em lojas com
sistema de segurança , vigilância e câmeras será punida
normalmente, não gerando crime impossível, já que, por menor que
seja, sempre existe uma chance de o crime se consumar. Ainda, de
acordo com o STF, o flagrante preparado, também chamado de
delito de ensaio, em face da impossibilidade de consumação,
configura crime impossível, e não será válido, afastando assim a
tentativa e tornando o fato atípico (Súmula 145 do STF).”4

3
Nucci, Guilherme de Souza Código penal comentado : estudo integrado com processo
e execução penal : apresentação esquemática da matéria : jurisprudência atualizada /
Guilherme de Souza Nucci. – 14. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro : Forense,
2014 p. 182.
4
Rodrigues, Cristiano. Direito Penal / Cristiano Rodrigues. – 1. Ed. – São Paulo:
Forense, 2017. (Método de estudo OAB). p. 44.
Bibliografia

DECRETO-LEI Nº 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940 – CÓDIGO PENAL

Andreucci, Ricardo Antonio. Manual de direito penal / Ricardo Antonio


Andreucci. – 4. ed. reformulada – São Paulo : Saraiva, 2008.

Capez, Fernando. Curso de direito penal : parte geral : volume 1 / Fernando


Capez, - 5. ed. rev. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2003.

Nucci, Guilherme de Souza Código penal comentado : estudo integrado com


processo e execução penal : apresentação esquemática da matéria : jurisprudência
atualizada / Guilherme de Souza Nucci. – 14. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro
: Forense, 2014.

Rodrigues, Cristiano. Direito Penal / Cristiano Rodrigues. – 1. Ed. – São Paulo:


Forense, 2017. (Método de estudo OAB).

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