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Apostila do

do Curso de Fisiologia
Fisiologia 2007 101
Departamento de Fisiologia,
Fisiologia, IB Unesp-Botucatu
Unesp-Botucatu Profa. Silvia M. Nishida
Nishida

SENTIDOS QUÍMICOS: OLFAÇÃO E GUSTAÇÃO


Podemos admitir que os seres vivos se originaram e evoluíram num mar cheio de
substâncias químicas. Acredita-se que informações essenciais à sobrevivência como “comida”,
“predador” e “parceiro sexual” devem ter sido os sinalizadores químicos mais primitivos. Mesmo
com a evolução das espécies nos mais variados ambientes, o sentido químico dos animais foi
conservado tanto no ambiente aquático como no terrestre e surgiram formas adicionais de análise
da informação química. Na espécie humana, o sentido da olfação é o menos desenvolvido e em
relação aos outros mamíferos e nos consideramos microsmatas em relação aos cães.
Além de mediar o sentido olfatório, os receptores químicos proporcionam o sentido da
gustação. As informações gustativas e as olfativas são integradas no cérebro juntamente com
sensação de textura e temperatura dos alimentos nos proporcionando a impressão final dos
alimentos.
Finalmente, há os receptores químicos viscerais que nos proporcionam a detecção de
diferentes tipos de moléculas orgânicas e de íons porem de maneira totalmente inconsciente, ao
contrário dos sentidos olfatório e gustativo.

OLFAÇÃO
De um certo modo, estas duas modalidades sensoriais são consideradas como sendo uma
forma de sentido visceral por estarem associados com a função alimentar.
A olfação é um sentido primitivo que está presente nos vertebrados mais primitivos como
os peixes. Baseado no tamanho relativo do telencéfalo e do bulbo olfatório o olfato deve ser
bastante aguçada. Sem dúvida o tubarão detém o titulo de vertebrado com o sentido olfatório mais
aguçado.
O epitélio olfatório humano fica no teto da fossa nasal, junto à concha nasal superior e o
septo nasal e é aí que estão os receptores químicos ocupando uma área de 10cm 2. Já o epitélio
olfatório canino corresponde a uma área de 170 cm 2, com 100 vezes mais quimiorreceptores. É por
essa razão que, só pelo sentido do olfato, os cães podem detectar fêmeas no cio a alguns km de
distância e os homens não conseguem identificar mulheres em período fértil.
A cavidade nasal é uma região mal ventilada durante a respiração normal, mas quando
fungamos podemos aumentar a corrente de ventilação. É por isso que quando somos alertados por
alguma sensação olfativa nova aumentamos o diâmetro das narinas e a freqüência ventilatória
para melhor explorar o ambiente. Quando estamos com o alimento na boca, várias substâncias se
volatilizam e estimulam simultaneamente os receptores olfatórios contribuindo com a impressão
final sobre o sabor do alimento. É um sentido que permite avaliar o ambiente à distância, pois
podemos identificar odores agradáveis (alimento) ou desagradáveis (ambientes insalubres, comida
estragada, material pútrido, etc) e nos aproximar ou afastar dessas fontes odorantes.

Receptores olfativos
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Os receptores olfativos são químiorrecetores localizados na membrana da mucosa


olfativa cuja pigmentação é amarelada. No epitélio olfativo estão presentes células de sustentação
semelhantes a gliócitos que ajudam a produzir muco. Os receptores olfativos são renováveis e
estão num ciclo continuo de renovação (a cada 4-8 semanas).
Os químiorrecetores são neurônios do tipo bipolar que possuem um dendrito espesso e
curto com as terminações nervosas em forma de bastonete. Os prolongamentos axônicos
amielinícos são as próprias fibras aferentes de primeira ordem (nervo olfativo) que se projetam
diretamente no bulbo olfativo, atravessando a lâmina crivosa do osso etmóide. As células
sensoriais são ciliadas e estão mergulhados na superfície mucosa. As substâncias químicas
voláteis (aromatizantes ou odorantes) presentes no ar inspirado aderem-se ao muco e se ligam a
sítios específicos da membrana ciliada em moléculas receptoras específicas. O acoplamento induz,
alterações de condutância iônica usando o sistema de 2 o. Mensageiro: cAMP ou do IP2.
Apesar da grande quantidade de substâncias às quais somos sensíveis (em torno de
2.000), temos pouca capacidade de discriminar faixas amplas de intensidade para uma mesma
substância: é necessária uma variação de 30% da concentração para detectarmos as diferenças,
ao contrário do sentido visual que detecta variações de 1% na alteração da luminosidade. Por
outro lado o limiar de sensibilidade para as diferentes substâncias varia muito:

Substância Mg/l de ar
Álcool 5,83
Clorofórmio 3,3
Óleo de hortelã-pimenta 0,02
Almíscar artificial 0,00004
Metil mercaptano 0,0000004

O muco olfativo contribui com a mediação do sentido olfativo, produzindo moléculas


protéicas que se ligam aos odorantes (OBP), concentrando-os e transferindo para os sítios
receptores específicos de ligação.
A mucosa olfativa é também inervada por terminações nociceptivas do trigêmeo:
substâncias irritantes (cloro, pimenta) estimulam estes terminais causando sensação desagradável
e evocam respostas reflexas como espirro, lacrimejamento e inibição temporária do movimento
inspiratório.
Mecanismo de transdução sensorial

7 Etapas da transdução via


produção de cAMP:
1. Aromatizante se liga a receptores
específicos
6
2. Estimulação da proteína G

5 5 3. Ativação da adenilciclase
4 4. formação de cAMP
5. c-AMP liga-se a canais de Ca
3 6. Ca++ abrem canais de Cl

1,2 7. Despolarização resultante (=PR)

Há varias famílias de receptores que se ligam aos aromatizantes, mas todas elas utilizam a
mesma via final comum para excitar os receptores químicos.
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Vias olfativas

A via olfativa tem a trajetória em preto. Como já vimos, os neurônios sensoriais primários
são os próprios receptores olfatorios. Estes fazem sinapse no bulbo olfatório, principalmente com
as células mitrais (neurônios de 2a ordem) formando glomérulos olfatórios . Ocorre extensa
convergência nessas sinapses. Os axônios das células mitrais projetam-se através das estrias
olfatórias lateral e medial (formações anatômicas que delimitam uma área triangular conhecida
como trígono olfatório).
Os axônios que seguem pela estria lateral projetam-se para o córtex olfatório primário na
área pré-piriforme (=paleocórtex). Desta, seus axônios projetam-se para áreas olfativas
associativas (área entorrinal), onde a interpretação olfativa é realizada. A projeção é totalmente
homolateral e através da comissura anterior as informações olfativas são integradas. Note-se que a
via olfativa não passa para o relê talâmico . No entanto, as informações olfativas que chegam ao
tálamo indiretamente, são retransmitidas para o córtex pré-frontal e orbitário (neocórtex).
Os axônios da estria medial se dirigem sob a porção anterior do corpo caloso ( área
subcalosa) e do septo, localizados adiante da comissura anterior. A comissura anterior integra as
áreas olfativas de ambos os lados. Odores que nos despertam o apetite produzem salivação
abundante enquanto os nauseabundos, vômito. Isso significa que as informações olfatórias são
enviadas (via feixe prosencefálico medial) para circuitos associados com o sistema nervoso
autônomo no tronco encefálico.
Denominamos anosmia, a ausência do sentido do olfato; hiposmia à redução e disosmia,
quando a sensibilidade está distorcida. Mas os pacientes acabam se queixando mais de
problemas com o paladar do que com a olfação.

GUSTAÇÃO
A língua é um órgão muscular que move o alimento durante a mastigação e, sem dúvida,
de grande importância para a linguagem falada. Mas também é um órgão sensorial que nos
permite identificar vários aspectos dos alimentos sólidos e líquidos que ingerimos. Sobre a sua
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superfície estão diferentes tipos de papilas gustativas: fungiformes, as filiformes (nas regiões
anterior e lateral) e as circunvaladas (na base).
O sentido da gustação é evocado por substâncias químicas contidas nos alimentos que se
dissolvem na saliva e atingem os quimiorreceptores localizados nos corpúsculos gustativos.
Cada corpúsculo possui em torno de 50 a 150 células sensoriais mais as células de sustentação.
As células sensoriais fazem sinapse com as fibras aferentes primárias do VII (par de nervos
cranianos=facial), do IX (=glossofaríngeo) e do (X=vago) sendo que todas projetam-se no tronco
encefálico.
As papilas estão localizadas na mucosa da faringe, palato e epiglote e, em grande número,
na da língua, nas papilas fungiformes e circunvaladas. É interessante notar que as papilas
gustativas se renovam a cada 10 dias.

Mecanismos de transdução e vias gustativas


As submodalidades gustativas são:
doce, ácido, amargo e salgado. Os
receptores gustativos são sensíveis a todos
estímulos, sendo mais sensível a uma
submodalidade especifica. Os estímulos
químicos que causam mais eficientemente
cada uma das modalidades são: NaCl
(salgado); sacarose (doce), quinino (amargo)
e ácido (HCl). Por outro lado, alguns
aminoácidos como sacarina e o aspartame
que são utilizados nos adoçantes causam
sensação de doce...Uma outra
submodalidade denominada umami
Figura mostrando as regiões da língua e as respectivas qualidades (delicioso em japonês) é estimulada pelo
sensoriais da gustação mais comumente evocadas. Ao lado, aminoácido glutamato especialmente uma
detalhes da papila gustativa e da célula sensorial quimiorreceptora
e sua inervação aferente.
sensação prazerosa.
Realizando testes com várias
substâncias químicas observou-se que os
receptores gustativos respondem a todas
elas, porém, com preferência a determinadas
substâncias. No exemplo ao lado, um
determinado receptor responde mais
sensivelmente com PR despolarizante ao
NaCl enquanto o outro, tanto ao NaCl como
ao HCl. Repare que as fibras aferentes
primárias aumentam a freqüência dos PA em
sincronia aos PR despolarizantes e diminuem
aos PR hiperpolarizantes.
As substâncias químicas operam
alterando o PA de maneira mais ou menos
especifica para o grupo de substâncias
químicas:
1) passam diretamente pelos canais iônicos (NaCl e amargo)
2) ligam-se aos canais iônicos bloqueando-os (amargo e quinino)
3) ligam-se aos canais iônicos abrindo-os
4) ligam-se a receptores moleculares que ativam 2o mensageiros que por sua vez, abrem ou
fecham canais iônicos(doce e amargo)
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Repare que em todos os casos a via final comum é estimular a liberação de NT na sinapse
que é um processo cálcio-dependente (como nas demais neurotransmissões, lembram-se?).
Concluímos que a ativações dos receptores gustativos depende de “chaves” para cada “fechadura”
especifica e que a resposta de cada botão gustativo (conjunto de células sensoriais) deverá ser o
resultado do recrutamento de determinadas fibras aferentes.
Outras modalidades sensoriais contribuem com a experiência gustativa consciente
De que modo então os variados alimentos evocam sabores tão peculiares? Como
discriminamos o sabor de um sorvete e de um churrasco?
A percepção consciente dos alimentos que experimentamos depende da interpretação
integrada com as informações aferentes não só gustativa como também olfativas que emanam do
alimento. (o quê acontece quando você está resfriado e o epitélio olfativo está recoberto com
muco?). Além disso, características como textura e temperatura também fazem parte das
informações que contribuem com o sentido do paladar (aferentes somestésicos, mediados V par
=trigêmeo). Alguns sabores são enfatizados quando associados à dor... Isso mesmo: os alimentos
de sabor picante estimulam nociceptores químicos que para alguns enfatizam o sabor e aumenta a
palatabilidade do alimento. Assim, alem da sensação de fome, a palatabilidade também aumenta
(ou diminui) a nossa ingestão alimentar.

A via gustativa
Os impulsos originados nos 2/3 anteriores da língua chegam ao SNC pelo VII par craniano.
Já o IX par é responsável por 1/3 posterior e faringe e o X par, pela epiglote. As projeções centrais
dos neurônios de primeira ordem ocorrem no bulbo, mais especificamente no núcleo do trato
solitário. Dai, os neurônios de 2 a.ordem projetam-se para o tálamo (Núcleos Ventrais Póstero
Mediais ou VPM) do mesmo lado e do lado oposto. As fibras tálamo-corticais (3 a.ordem) se
projetam para o córtex cerebral, na área gustativa primária , situada na parte inferior do giro pós-
central, adjacente à parte somestésica da língua.
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