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Egrégio Superior Tribunal de Justiça,

Colenda Turma Julgadora,


Doutos Ministros,

ANA BEATRIZ DA SILVA GOMES, inscrita na OAB/MG 188.826, com endereço


profissional na Av. Augusto de Lima, 1800, sala 407, Barro Preto, Belo Horizonte/MG, com
fundamento no art. 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal, e arts. 647 e seguintes do
Código de Processo Penal, vêm a Vossa Excelência impetrar ordem de

"HABEAS CORPUS"

em favor de CÉLIO CARVALHO DE SOUZA, natural de Belo Horizonte, nascido em


03 de março de 1987, filho de Valdir Peixoto de Souza e Maria de Lourdes Carvalho,
portador do RG 14918349, em face de constrangimento ilegal imposto pela 4ª Câmara
Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, que manteve a excessiva e
incorreta dosimetria da pena, promovendo constrangimento ilegal referente a prisão por
tempo maior que o necessário, pelas razões e fundamentos a seguir expostos.

I. BREVE HISTÓRICO
No dia 04/02/2020 transitou em julgado acordão prolatado pela 4ª Câmara do
TJMG, que manteve a condenação do então apelante a pena de 12 anos e 04 meses de
reclusão, em regime inicial fechado, pela prática do delito previstos no art. 121, §2º, II, III e
VI, c/c art. 14, II, ambos do CP. A decisão coatora manteve a reprimenda da sentença que
havia sido aplicada de forma incorreta.
II. DO CABIMENTO DE HABEAS CORPUS PARA DESCONSTITUIÇÃO DE
FLAGRANTE ILEGALIDADE – AUSÊNCIA DE COTEJAMENTO
PROBATÓRIO – REMANEJAMETO DA REPRIMENDA CORPORAL –
DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO
O presente Habeas Corpus tem como finalidade a revisão da pena imposta ao
Paciente, já transitada em julgado, que, em resumo, promoveu a dosimetria da pena de forma
incorreta conforme será demonstrado.
O pedido pode ser analisado tão somente a partir do mencionado acórdão, da
sentença de primeiro grau e da certidão de antecedentes criminais. Não há dilação probatória
e análise de mérito. Tão somente matéria de direito, com teses já pacificadas por esta Corte.
1) Sobre o cabimento de Habeas Corpus substitutivo de recurso próprio, este
STJ já decidiu antes sobre a fungibilidade de habeas corpus com revisão criminal. Isso
porque, diante de matéria exclusiva de direito e com flagrante ilegalidade a substituição dos
meios de impugnação é possível.
A este respeito:

AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS


SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. NÃO
CABIMENTO. TRÁFICO DE DROGAS. SEGREGAÇÃO
CAUTELAR DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA NA
GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. QUANTIDADE E
VARIEDADE DE DROGAS. INEXISTÊNCIA DE NOVOS
ARGUMENTOS APTOS A DESCONSTITUIR A DECISÃO
IMPUGNADA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
I - A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado
pela Primeira Turma do col. Pretório Excelso, firmou orientação no
sentido de não admitir a impetração de habeas corpus em
substituição ao recurso adequado, situação que implica o não-
conhecimento da impetração, ressalvados casos excepcionais em
que, configurada flagrante ilegalidade apta a gerar constrangimento
ilegal, seja possível a concessão da ordem de ofício.
II - A segregação cautelar deve ser considerada exceção, já que tal
medida constritiva só se justifica caso demonstrada sua real
indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução
criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do artigo 312 do Código
de Processo Penal.
III - Na hipótese, o decreto prisional encontra-se devidamente
fundamentado em dados concretos extraídos dos autos, que
evidenciam que a liberdade do Agravante acarretaria risco à ordem
pública, notadamente se considerada a gravidade concreta da
conduta atribuída ao Agravante, haja vista a apreensão de droga, em
quantidade e variedade, que denotam o envolvimento, ao menos em
tese, do Agravante com a mercancia ilícita de substâncias
entorpecentes;
nesse sentido, consta que foram encontradas, no contexto da
traficância desenvolvida, (422 porções de cocaína, 461 porções de
crack, 334 porções de maconha), além da apreensão de apetrechos
comuns à traficância, tais como balança de precisão e rádios
comunicadores, circunstâncias que evidenciam um maior desvalor
da conduta, a justificar a medida extrema em seu desfavor.
IV - A presença de circunstâncias pessoais favoráveis, tais como
primariedade, ocupação lícita e residência fixa, não tem o condão de
garantir a revogação da prisão se há nos autos elementos hábeis a
justificar a imposição da segregação cautelar, como na hipótese.
Pela mesma razão, não há que se falar em possibilidade de aplicação
de medidas cautelares diversas da prisão.
V - É assente nesta Corte Superior que o agravo regimental deve
trazer novos argumentos capazes de alterar o entendimento
anteriormente firmado, sob pena de ser mantida a r. decisão
vergastada pelos próprios fundamentos.
Precedentes.
Agravo regimental desprovido.
(AgRg no HC n. 770.279/SP, relator Ministro Jesuíno Rissato
(Desembargador Convocado do Tjdft), Quinta Turma, julgado em
18/10/2022, DJe de 28/10/2022.)

No mesmo sentido, o Supremo Tribunal Federal entende não obstante o trânsito em


julgado de sentença penal condenatória, as particularidades do caso autorizam a utilização do
Habeas Corpus como substitutivo da revisão criminal. Esse entendimento valoriza o Habeas
Corpus como um instrumento de defesa da liberdade de locomoção, quando os fatos se
mostrarem líquidos e certos.

EMENTA Habeas corpus. Penal. Posse ilegal de munição de uso


restrito. Artigo 16 da Lei nº 10.826/03. Condenação transitada em
julgado. Impetração utilizada como sucedâneo de revisão criminal.
Possibilidade em hipóteses excepcionais, quando líquidos e
incontroversos os fatos postos à apreciação da Corte. Precedente da
Segunda Turma. Cognoscibilidade do habeas corpus. Pretendido
reconhecimento do princípio da insignificância. Possibilidade, à luz
do caso concreto. Paciente que guardava em sua residência uma
única munição de fuzil (calibre 762). Ação que não tem o condão de
gerar perigo para a sociedade, de modo a contundir o bem jurídico
tutelado pela norma penal incriminadora. Precedentes. Atipicidade
material da conduta reconhecida. Ordem concedida. 1. A decisão
que se pretende desconstituir transitou em julgado, sendo o writ,
portanto, manejado como sucedâneo de revisão criminal (v.g. RHC
nº 110.513/RJ, Segunda Turma, Relator o Ministro Joaquim
Barbosa, DJe de 18/6/12). 2. Todavia, a Segunda Turma (RHC nº
146.327/RS, Relator o Ministro Gilmar Mendes, julgado em
27/2/18) assentou, expressamente, a cognoscibilidade de habeas
corpus manejado em face de decisão já transitada em julgado em
hipóteses excepcionais, desde que líquidos e incontroversos os fatos
postos à apreciação do Supremo Tribunal Federal. 3. O
conhecimento da impetração bem se amolda ao julgado paradigma.
4. O paciente foi condenado pelo delito de posse de munição de uso
restrito (art. 16 da Lei nº 10.826/03), sendo apenado em 3 (três)
anos e 6 (seis) meses de reclusão em regime fechado e ao pagamento
de 11 dias-multa. 5. Na linha de precedentes, o porte ilegal de arma
ou munições é crime de perigo abstrato, cuja consumação
independente de demonstração de sua potencialidade lesiva. 6. A
hipótese retratada autoriza a mitigação do referido entendimento,
uma vez que a conduta do paciente de manter em sua posse uma
única munição de fuzil (calibre 762), recebida, segundo a sentença,
de amigos que trabalharam no Exército, não tem o condão de gerar
perigo para a sociedade, de modo a contundir o bem jurídico
tutelado pela norma penal incriminadora. 7. É certo que a sentença
condenatória reconheceu a reincidência do paciente. Porém, bem
apontou a Procuradoria-Geral da República que a questão “está
pendente de análise em sede de revisão criminal, porque, ao que
parece, a condenação que gerou a reincidência refere-se ao
homônimo ‘José Luiz da Silva Gonçalves’.” 8. Não há, portanto,
óbice à aplicação do princípio da insignificância na espécie, sendo
de rigor seu reconhecimento. 9. Ordem concedida para, em razão
do princípio da insignificância, reconhecer a atipicidade material da
conduta imputada ao paciente.
(HC 154390, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado
em 17/04/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-087 DIVULG
04-05-2018 PUBLIC 07-05-2018)

2) No que diz respeito o manejo de habeas corpus para análise da dosimetria da pena
e alteração de regime inicial, como é o caso vertente, esta Corte também já entendeu cabível
desde que não demanda análise de prova e esteja presente flagrante ilegalidade. Neste sentido:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO


DE ENTORPECENTES. DOSIMETRIA. PENA INFERIOR A
8 ANOS. REGIME FECHADO. CIRCUNSTÂNCIAS
JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. CONSTRANGIMENTO
ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. AGRAVO DESPROVIDO.
I - A parte que se considerar agravada por decisão de relator, à
exceção do indeferimento de liminar em procedimento de habeas
corpus e recurso ordinário em habeas corpus, poderá requerer,
dentro de cinco dias, a apresentação do feito em mesa relativo à
matéria penal em geral, para que a Corte Especial, a Seção ou a
Turma sobre ela se pronuncie, confirmando-a ou reformando-a.
II - A via do writ somente se mostra adequada para a análise da
dosimetria da pena, quando não for necessária uma análise
aprofundada do conjunto probatório e houver flagrante ilegalidade.
III - O Plenário do col. Supremo Tribunal Federal declarou
inconstitucional o art. 2º, § 1º, da Lei n. 8.072/90 - com redação
dada pela Lei n. 11.464/07, não sendo mais possível, portanto, a
fixação de regime prisional inicialmente fechado com base no
mencionado dispositivo. Para tanto, devem ser observados os
preceitos constantes dos arts. 33 e 59, ambos do Código Penal.
IV - No presente caso, a quantidade de droga aprendida (35,54kg de
maconha) revela maior gravidade, o que justifica a manutenção do
regime inicial fechado, pois está de acordo com os parâmetros legais
expressos no art. 33, § 2º, b, do Código Penal.
Agravo regimental desprovido.
(AgRg no HC n. 766.321/SC, relator Ministro Jesuíno Rissato
(Desembargador Convocado do Tjdft), Quinta Turma, julgado em
18/10/2022, DJe de 28/10/2022.)

Também neste sentido:


PROCESSO PENAL E PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO
HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO. ABSOLVIÇÃO.
REVOLVIMENTO DE PROVA. IMPROPRIEDADE DA VIA
ELEITA. DOSIMETRIA. IMPOSSIBLIDADE DE FIXAÇÃO
DA PENA-BASE ABAIXO DO MÍNIMO LEGAL. REGIME
PRISIONAL MANTIDO. ÓBICE À CONVERSÃO DA PENA
CORPORAL EM RESTRITIVA DE DIREITOS. AGRAVO
DESPROVIDO.
1. O habeas corpus não se presta para a apreciação de alegações que
buscam a absolvição do paciente, em virtude da necessidade de
revolvimento do conjunto fático-probatório, o que é inviável na via
eleita.
2. Se as instâncias ordinárias, mediante valoração do acervo
probatório produzido nos autos, entenderam, de forma
fundamentada, ser o réu autor do delito descrito na exordial
acusatória, a análise das alegações concernentes ao pleito de
absolvição demandaria exame detido de provas, inviável em sede de
writ.
3. A individualização da pena, como atividade discricionária do
julgador, está sujeita à revisão apenas nas hipóteses de flagrante
ilegalidade ou teratologia, quando não observados os parâmetros
legais estabelecidos ou o princípio da proporcionalidade.
4. Descabe falar em fixação da pena-base abaixo do piso legal,
devendo pena ser mantida acima do mínimo estabelecido no
preceito secundário, máxime se considerada a presença de vetoriais
desabonadoras.
5. Mantido o quantum de pena, não se cogita da fixação de meio
prisional menos severo, bem como de conversão da sanção corporal
em restritiva de direitos.
6. Agravo desprovido.
(AgRg no HC n. 767.083/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas,
Quinta Turma, julgado em 11/10/2022, DJe de 18/10/2022.)

Conforme será observado, o caso vertente trata de ilegalidade no que se refere a


fixação da pena.
III. RAZÕES DO PEDIDO DE REFORMA DA PENA IMPOSTA PELO
ACÓRDÃO

III.1 Da incorreção da pena base – da impossibilidade de elevação da pena pelos


antecedentes – da impossibilidade de elevação da pena pelas três qualificadoras
simultaneamente
Ao analisar detidamente o acórdão proferido pela 4ª Câmara do Tribunal de
Justiça de Minas Gerais, aqui como o ato coator, verifica-se que ele manteve na integralidade
a sentença de primeiro grau pelos seus próprios fundamentos. Todavia, como se passará a
demonstrar a dosimetria da pena feita pela Magistrada Presidente do Tribunal do Júri, e
mantida em decisão colegiada, está incorreta. Senão vejamos.
Há dois pontos que são confrontados neste Habeas Corpus: 1) o fato de as três
qualificadoras reconhecidas pelo Conselho de Sentença figurarem como circunstâncias
judiciais desfavoráveis; 2) a majoração da pena pelos maus antecedentes, sendo que não
possuía nenhuma à época da decisão.
Inicialmente, sobre o primeiro ponto verifica-se que foi imputado na denúncia,
reconhecido na pronúncia e acatado pelos jurados no Conselho de Sentença a presença de
três qualificadoras em desfavor do Paciente, são elas: o motivo torpe, o meio cruel e o recurso
que impossibilitou a defesa da vítima.
Segue imputação narrada pela Sentença da Juíza Presidente:

Entretanto, ao promover a dosimetria da pena em relação ao Paciente na


primeira etapa, verifica-se que a Magistrada considerou desfavorável todas as três
circunstâncias, caracterizando bis in idem haja vista uma delas já ter sido utilizada para
qualificar o delito.
Segue dosimetria da pena da sentença de primeiro grau:

Diante dessa incorreção, a Defesa apelou ao Tribunal ad quem, o qual teve a


oportunidade de corrigir a falha. Todavia, manteve a dosimetria da pena pelos mesmos
fundamentos, sem se atentar ao bis in idem.
Segue confirmação da dosimetria da pena pelo acórdão:

Diante de tal situação, nesta primeira fase da dosimetria, o primeiro ponto a ser
reavaliado por Vossas Excelências é o flagrante bis in idem com a consequente supressão de
uma das circunstâncias negativas por estes fundamentos.
O segundo ponto que merece reforma neste acórdão reside no fato de a
Sentença e, posteriormente, o acórdão terem considerado o Paciente como portador de maus
antecedentes. Ao analisar detidamente a certidão de antecedentes criminais, é evidente que
quando da prolação da decisão em 10/05/2019 não havia maus antecedentes, tão somente a
reincidência caracterizada em dois delitos.
O que havia, naquele momento, além das duas reincidências, era uma
condenação criminal, de nº 0023271-70.2012.8.13.0231, não transitada em julgado, que
aguardava recurso.
Segue imagem processo na certidão de antecedentes, a qual está juntada nos
autos.

Para aclarar ainda mais, observa-se que ele veio a transitar apenas em
27/08/2020. Segue registro do TJMG:

Dessa maneira, é patente a supressão de duas circunstâncias judiciais


consideradas negativas pela decisão coatora.
Vale pontuar que a sentença de primeiro grau estabeleceu e, posteriormente, o
ato coator manteve o aumento de pena definido na primeira fase da dosimetria da pena, qual
seja, de 16 anos e 6 meses de reclusão. Como não foi mencionado que alguma das
circunstâncias judiciais era preponderante a outras, constata-se, por uma simples divisão, que
cada circunstância judicial aumentou a reprimenda em 1 ano, 1 mês e 15 dias,
Dessa forma, considerando incorreta a postura do ato coator, a redução nesta
primeira fase deverá ser feita de forma objetiva e pragmática, ou seja, reduzindo em 2 anos e
3 meses a pena, estabelecendo-se em 14 anos e 3 meses de reclusão na primeira fase.
No que diz respeito a segunda etapa, entendendo a Impetrante que foi correto
o acrescimento de 1 ano de reclusão para cada reincidência, é patente definir a pena
intermediária em 16 anos e 3 meses de reclusão.
Por fim, na terceira fase, com base na fração de redução da pena de 1/3, a
reprimenda corporal deverá estabelecida em 10 anos e 10 meses de reclusão.

IV. DO PRAZO PARA A JUNTADA DE PROCURAÇÃO OU


SUBSTABELECIMENTO
Por dificuldades de se dirigir ao presídio onde encontra-se acautelado o Paciente
em razão das inúmeras paralizações de caminhoneiros nas estradas e de o advogado
constituído pelo Paciente não estar em condições imediatas de confeccionar
substabelecimento, requer prazo 10 dias para a juntada do respectivo instrumento de
mandado.

V. DO PEDIDO
Diante de todo exposto, pede-se que seja conhecido este habeas corpus e dado
provimento para reformar a decisão coatora, concedendo-se a ordem a fim de que seja
reconhecido o excesso da dosimetria da pena e restabelecido nos patamares legítimos.

Pede deferimento.

De Belo Horizonte para Brasília, 04 de novembro de 2022.

Ana Beatriz da Silva Gomes


OAB: 188.826

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