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Introdução à Infectologia,

antimicrobianos e resistência
DR. RODRIGO SCHRAGE LINS
REDE DOR, SIERJ E AGORA PROFESSOR DA ESTÁCIO
Histórico

China, 2.500 anos – já eram conhecidas as propriedades anti-infecciosas do mofo da soja.

Grécia antiga – uso de substâncias antimicrobianas (vinho, mirra, sais inorgânicos).


Ignaz Philipp Semmelweis (1818-1865)
1847 - transmissão da febre puerperal
pelas mão dos médicos
Florence Nightingale (1820-1910)

1854 - relação entre as más


condições de higiene e as taxas de
complicações pós-operatórias
Louis Pasteur (1822-1895)
1857 - descoberta dos microrganismos
Joseph Lister (1827-1912)
1865 - utilização de substâncias
antissépticas nos atos cirúrgicos
Alexander Fleming (1881-1995)
1928 – Descoberta da penicilina.

1940 - Howard Florey e Ernst Chain – uso clínco


da penicilina.

1945 – Prêmio Nobel.


Curiosidades
O corpo humano possui cerca de 1013 células (10.000.000.000.000).

Existem cerca de 1014 microrganismos habitando o corpo humano (100.000.000.000.000),


correspondendo a um total aproximado de 1,2kg.

A massa total de microrganismos no planeta Terra é 25 vezes superior à massa total de vida
humana, animal e vegetal.
Definições - Colonização
Presença permanente ou temporária de qualquer microorganismo aderido à pele ou às mucosas
do hospedeiro, dissociadas de sinais ou sintomas de doença infecciosa

Não tem expressão patológica


A natureza odeia o vácuo
Definições - doença infecciosa
Decorre da agressão direta ou indireta do hospedeiro por um patógeno primário
Grande virulência
Não são causadas por patógenos da microbiota normal
São contraídas por contato do agente com o hospedeiro no meio externo
São etiologicamente específicas
Podem ser adotadas medidas de prevenção para cada doença
Exemplos: malária, leishmaniose, tuberculose, dengue
Doenças infecciosas
Decorre de um desequilíbrio entre mecanismos anti-infecciosos do hospedeiro e sua microbiota normal
Seus agentes possuem baixa virulência na ausência de condições predisponentes
Seus agentes fazem parte da microbiota do hospedeiro
Podem ser causadas por agentes transmitidos pelo contato direto ou indireto com outro indivíduo
São etiologicamente inespecíficas
Para seu tratamento é importante a recuperação dos sistemas de defesa do hospedeiro
Não são conhecidos métodos específicos para evitá-la, mas apenas para diminuir o risco de ocorrência
Exemplos: Infecção urinária, pneumonia, supuração da ferida cirúrgica
Antimicrobianos
Afetam a “flora” (microbiota) do indivíduo.
Induzem ou selecionam resistência.
Contribuem com o surgimento de infecção hospitalar.
Podem prejudicar o paciente “do lado”.
Alteram o meio ambiente.
Devemos sempre lembrar
“O objetivo da medicina assistencial é fazer o
diagnóstico”.

“A terapia é secundária ao diagnóstico”.


Tratamento empírico
O que é: é escolher o antimicrobiano que cobre a grande maior parte dos germes causadores da
infecção diagnosticada.

O que não é: utilizar antimicrobianos de amplo espectro para tratar pacientes sem diagnóstico.

E quando eu não sei o diagnóstico?


◦ Diagnóstico preciso
◦ Diagnóstico sindrômico
A escolha de um antimicrobiano
1 - A situação presente do paciente
2 - A situação futura do paciente
3 - Alteração da microbiota saprófita
4 - Toxicidade
5 - A ecologia ambiental e hospitalar
6 - Potencial de indução de resistência
Sequencia lógica para o pensamento
1 – Anamnese
2 – Exame físico
3 – Diagnóstico sindrômico inicial – achar o foco
4 – Laboratório geral
5 – Síndrome laboratorial (hemólise, síndrome nefrótica)
6 – Diagnósticos possíveis (no mínimo diagnóstico sindrômico)
7 – Laboratório diagnóstico (culturas, sorologias, etc)
8 – Exames de imagem
9 – Sem diagnóstico ******** É A EXCEÇÃO!
Associação de antimicrobianos
Garantir a efetividade do tratamento empírico

◦ Complemento de espectro

◦ Sinergismo
◦ É um conceito acadêmico, muito difícil de demonstrar em estudos clínicos
Middleton S, McElduff P, Ward J, Grimshaw JM, Dale S, D'Este C, Drury P, Griffiths R, Cheung NW, Quinn C, Evans M, Cadilhac D, Levi C; QASC Trialists Group.
Implementation of evidence-based treatment protocols to manage fever, hyperglycaemia, and swallowing dysfunction in acute stroke (QASC): a cluster
randomised controlled trial. Lancet. 2011 Nov 12;378(9804):1699-706.

https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(11)61485-2/fulltext
Percepção do problema da resistência
Anos 40 – uso clínico da penicilina e da estreptomicina.
Anos 50 – “idade do ouro” dos antibióticos.
Anos 60 – percepção da importância da resistência microbiana e criação da primeiras CCIH.
Anos 70-80 – importância do “uso racional” dos antibióticos.
1970 - I Conferência Internacional sobre Infecções Hospitalares.
1974 - projeto SENIC (“Study of the Eficacy of Nosocomial Infetion Control”) - publicado em 1983.
Final do século XX – tentativa de desenvolvimento de novas drogas contra bactérias multirresistentes.
Início do século XXI – tentativa de desenvolvimento de novas drogas contra bactérias
multirresistentes.
Infectologia
Equilíbrio entre paciente – patógeno – ambiente
O problema

CDC
Era uma vez na OMS…
(uma pequena história de resistência bacteriana)

2015 2017
Global Action Plan on The Selection and Use
Antimicrobial of Essential Medicines.
Resistance.

2014 2015 2021


Antimicrobial Global AMR Global Antimicrobial
Resistance. Global Surveillance System. Resistance and Use
Report on Surveillance. Surveillance System
(GLASS) Report: 2021
Primeira publicação de dados do GLASS no Brasil
Publicado em Janeiro de 2021

Progresso e limitação

X 3 hospitais de um estado no Brasil

Retrospectivo, nem todos os germes


X foram testados para os mesmos
antimicrobianos

X 11347 isolados em 2018


Continuando a nossa história
(com mais dois estudos importantes)

Estudo do banco mundial estima prejuízo de


trilhões de dólares em países desenvolvidos e
subdesenvolvidos.

Bactérias MDR
Principal causa de morte no
mundo em 30 anos

J O’Nell 2014. Antimicrobial Resistance: Tackling a crisis for the health and wealth of nations.
World Bank, March 2017. Drug Resistant Infections: A threat to our economic future.
Resistência – mecanismos de aquisição
1 - Mutação – alteração do próprio material genético

2 - Transdução – bacteriófagos

3 - Conjugação – Pili sexual


Como aparece a resistência?
Bactéria sensível

Bactéria resistente

Mutação

Transferência de gene
de resistência
Nova bactéria resistente
Charles Darwin

“Não é a espécie mais forte e nem a mais


inteligente que sobrevive e sim a mais
responsiva às mudanças”.
Conjugação
Resistência por seleção
Transmissão cruzada
Classes dos antimicrobianos
Beta-lactâmicos Polimixinas Streptograminas
◦ Penicilinas
Oxalidinonas Pleuromutilinas
◦ Cefalosporinas
◦ Monobactâmicos Antifolatos (sulfas) Fosfomicina
◦ Carbapenêmicos Tetraciclinas Cloranfenicol
Macrolídeos Glicilciclinas Outros
Aminoglicosídeos Ketolídeos
Lincosaminas Nitroimidazóis
Glicopeptídeos Rifamicinas
Lipopeptídeos Quinolonas
Mecanismos de ação de antimicrobianos

ANTIBACTERIANOS: PRINCIPAIS CLASSES, MECANISMOS DE AÇÃO E RESISTÊNCIA. Montes Claros, v. 18, n.2 - jul./dez. 2016. (ISSN 2236-5257)
Mecanismos de resistência
Impermeabilidade

Inativação enzimática

Mudança de receptor

Bomba de efluxo
Método de coloração de gram
Beta-lactâmicos
Beta-lactâmicos
◦ Penicilinas
◦ Cefalosporinas
◦ Monobactâmicos
◦ Carbapenêmicos
Enzimas
Classificação molecular

Tem aminoácido específico Precisa do íon zinco para


no sítio de ação (serina). A B funcionar.

Serinocarbapenemases Metalo-beta-lactamase
(KPC) Metalo-carbapenemase.
NSBL e ESBL

C D

Tem aminoácido específico Tem aminoácido específico


no sítio de ação (serina). no sítio de ação (serina).
Cefalosporinases Carbapenemases OXA
Amp-c
Classificação funcional

Grupo 1 Grupo 2 Grupo 3

• Classe C • Classes A e D • Classe B


• São cefalosporinases com • Penicilinases, Beta-lactamases • Metalocarbapenemase
resistência cromossomial. de espectro amplo, Beta-
• Inativam todos os B-lactâmicos
lactamases de espectro
• Não são inibidas pelo EDTA, exceto o aztreonam.
estendido.
ácido clavulânico ou
• Ex: IMI, VIM, NDM
tazobactam. • Carbapenemases dependentes
de serina A (KPC) e D (OXA).
• Podem ser sensíveis a
cefalosporina de 4ª geração
(cefepime).
Enzimas
E seus perfis de resistência

** Pode ser sensível ou resistente

Adaptado de W. Coronell-
Rodríguez et al. 2018.
Produção de enzimas
Resistência Enzimática de
Aminoglicosídeos
Transferases

Fosfotransferase
Acetiltransferase

Fonte: Beneviste R et al.


Proc Nat Acad Sci USA 1973;70:2276

Adeniltransferase
Produção de enzimas
Resistência Enzimática de
Macrolídeos
Estearases

Fonte: Morar M et al. Biochemistry 2012;61:1740


Outros mecanismos de resistência

03 - Permeabilidade
Bombas de efluxo
Mecanismo exclusivo de gram negativos.

02 - Permeabilidade
Alteração de porinas
01 – Sítio de ação
Predominante em gram positivos
Predominam em gram negativos (PBP).

Também podem ser alterados sítios de


ação de quinolonas, tetraciclinas,
aminoglicosídeos e macrolídeos

Pseudomonas aeruginosa comumente tem múltiplas alterações na


permeabilidade
Proteína ligadora de penicilina
Medidas de combate a resistência
Aumento da dose
Associação de antimicrobianos
Restrição do uso de antimicrobianos
Inativação do mecanismo de resistência
Novas drogas
Uso racional
Combate ao analfabetismo científico dentro da medicina
Sinusite

Primeiro tratamento
Amoxicilina
Amoxicilina + Clavulanato
Cefuroxima
Azitromicina ou Claritromicina
Levofloxacino
Leitura recomendada - ficção

“O Século dos cirurgiões”

Autor: Jürgen Thorwald


Albert Schweitzer (1875-1965)

"Quando o homem aprender a respeitar até o menor ser da criação, seja animal ou vegetal
ninguém precisará ensiná-lo a amar seu semelhante. "

Albert Schweitzer – Prêmio Nobel da Paz, 1952

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