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Platão acreditava que deveríamos ser governados por uma elite intelectual, pois, para ele, a
democracia não viria a eleger o líder mais preparado. Um dos pilares para o discurso elitista de
Platão foi a queda de Atenas.
Após a Guerra de Peloponeso, Esparta manteve-se como uma enorme potência grega até a
derrota para Tebas na Batalha de Leuctra em 371 a.C. Com essa vitória, Tebas tornou-se a nova
soberana da Grécia. Esparta não poderia perder a sua hegemonia e, portanto, uniu-se com
Atenas contra Tebas, causando mais conflito e enfraquecimento das cidades gregas no final do
século IV a.C.
Com a Grécia enfraquecida por conta da divisão política e dos conflitos, tanto Esparta quanto
Atenas permitiram a ascensão da hegemonia macedônica. Macedônia, liderada Filipe II e
depois por Alexandre, o Grande, já era unificada, e se expandiu conquistando a Grécia e
acabando com regime democrático de Atenas.
“O castigo dos bons que não fazem política é ser governados pelos maus.”
Platão teve seu contato com críticos do sistema democrático desde cedo, pois ele cresceu em
uma família de aristocratas gregos, a sua base teórica para desenvolvimento de seu sistema
político-filosófico crítico à democracia parte de seu mentor, Sócrates, a postura de Platão pode
ser vista como uma radicalização das críticas já postas por Sócrates.
De acordo com Sócrates, toda e qualquer atividade humana deveria ser orientada pela
episteme, o conhecimento. A virtude e a excelência do fazer só poderia ser alcançada por meio
do domínio da episteme. Seguindo essa lógica, Platão chega à conclusão de que uma
sociedade só poderia triunfar se aqueles que a governam possuíssem o domínio da episteme
da governança. Porquanto, na democracia, a ausência do conhecimento dos cidadãos na
escolha de seus representantes significaria a escolha de pessoas amadoras e despreparadas
para governar. O sistema político ideal para Platão era a Sofocracia, um governo em que os
governantes se dedicam ao conhecimento (episteme) da organização da cidade e à melhor
conduta possível da mesma.
Na visão platônica, a democracia se origina da deterioração da oligarquia, quando o regime
oligarca se enfraquece, acontece a divisão da sociedade entre os ricos e os pobres, levando a
uma guerra civil onde os pobres vencem e, por fim, a democracia é instaurada. A crítica de
Platão é que a democracia não teria os freios institucionais rígidos da oligarquia, dessa forma,
surgiriam comportamentos desviantes. A liberdade da democracia: distorcida, desenfreada e
sem limites se resumiria à realização de desejos frívolos e superficiais, instaurando um
desrespeito às leis e aos indivíduos da cidade.
Platão nos diz que o homem é constituído de alma e de corpo. A essência do homem é a sua
alma que esta aprisionada em um corpo. Na visão platônica, a alma se divide hierarquicamente
em três partes:
A parte racional é a mais superior entre as três, sendo assim, uma pessoa mais racional, na
visão platônica, é superior a uma outra pessoa menos racional. A fonte de desenvolvimento do
racional é a paideia – o processo educacional. É pela paideia que ocorre o processo dialético
do mundo sensível, falso, para o mundo das ideias, real. Platão conclui que, as pessoas
incumbidas de um racional elevado às demais e que passaram pelo processo da paideia são as
únicas capazes de governar. Sendo assim, quem deve governar é um rei filósofo. E da mesma
que Platão divide a alma, ele também divide hierarquicamente a estrutura da sociedade,
baseado no desenvolvimento racional de seus integrantes
A democracia não imutável, e muito menos imune à críticas, ela se desenvolve com o passar
do tempo. Se Platão previa que a democracia geraria uma liberdade distorcida, com indivíduos
que não respeitam a moral e os seus pares de sociedade, hoje temos instituições que
garantem a estabilidade desse sistema, como o estado de direito, tripartição de poderes, freios
e contrapesos, etc. A democracia é um regime crítico, jamais um sistema arrogante e seguro
de si, aceita autocríticas, é inquieta, desconfiada e busca sempre se adaptar e reconhecer seus
próprios erros.
Outro ponto importante da obra de Platão está na incapacidade do povo de escolher o melhor
representante para governá-los, entretanto, o conceito de melhor representante depende da
perspectiva de cada indivíduo, portanto, somente o povo pode dizer qual é um bom
governante e qual não é. Mesmo que a elite intelectual possua base teórica para dizer o que
levaria ao desenvolvimento da sociedade, se o povo não concordar com ela, a medida
determinada pelos governantes não será tida como boa e será desaprovada pela sociedade,
instaurando-se um conflito entre os governantes e a população.
A afirmação de que uma ação ou crença é boa é subjetiva, o homem, mantendo um ponto de
vista ou opinião, é que dá a medida de seu valor. Por exemplo, durante a primavera, um
visitante sueco em Atenas poderá dizer que o tempo está quente, enquanto um visitante do
Egito pode dizer que o tempo está frio, ambos estão falando a verdade, pois, a verdade
depende da perspectiva e, portanto, é relativa.
– Protágoras
Sendo assim, a sofocracia só poderia ocorrer por meio de um regime autoritário, uma ditadura
que não permitisse que o povo discordasse dos seus líderes. Além disso, se haveria uma
barreira para se tornar parte da elite intelectual de uma sociedade, materializada pelos
guardiões, por consequência, também haveria a necessidade de alguém determinar o que é
uma episteme aceita e o que não é. Ou seja, uma pessoa com conhecimento poderia ser
barrada de fazer parte dos governantes simplesmente porque as suas ideias, mesmo racionais,
diferem do paradigma estabelecido pela elite intelectual no poder.
Platão atestava haver quatro modelos de governo dignos de atenção e das quais importava ver
os defeitos. O primeiro, e muito elogiado, é o de Creta e da Lacedemônia, o segundo é a
oligarquia, o terceiro é a democracia e em quarto, a tirania.
Timocracia
Voltemos a atenção a forma de governo da timocracia, como chegamos nela? Como ocorre a
transição da aristocracia para timocracia? Na fala de Sócrates, toda constituição se modifica de
acordo com quem detém o poder, e para destituí-la é preciso abalá-la. Com o passar do
tempo, o lugar de poder, antes ocupado por homens dignos, será ocupado por homens não
favorecidos nem pela natureza nem pela fortuna, uma geração inculta de líderes indignos que
menosprezarão o cargo que ocupam. Sócrates continua, daí saíram chefes pouco capazes de
zelar pelo estado e que não sabe notar a diferença nem das raças de Hesíodo nem das vossas
raças de ouro, prata, bronze e feno. Deste modo, misturando-se o ferro com a prata e o bronze
com ouro, resultará destas misturas um defeito de conveniência, de regularidade e de
harmonia que, uma vez instaurado, engendra sempre a guerra e o ódio. Disso, instaurará uma
divisão, as duas raças de feno e bronze aspirarão enriquecer, enquanto que as raças de ouro e
prata, sendo ricas por natureza, tendem a virtude e a manter a antiga constituição. Após o
conflito entre as raças, elas concordam em dividir as terras e as riquezas, os homens livres
agora são subjugados e tratados como servidores. Nesse momento, nos encontramos entre a
Aristocracia e a Oligarquia.
A Alma do Timocráta
Oligarquia
Primeiro, os cidadãos descobrem motivos para enriquecer, e para os satisfazer, deturpam a lei
e a desobedecem, dessa forma, criando um efeito dominó, um vê no outro a ambição e passa
a imitá-la e, por fim, toda a massa de pessoas passa a assemelhar essa ambição. Sócrates diz
que, a partir disso, a sua avidez pelo ganho progride rapidamente e quanto mais amor se tem
pela riqueza menos se tem pela virtude.
Deste modo, o rico torna-se louvado e chega ao poder, enquanto o pobre é desprezado.
O primeiro defeito da oligarquia é o seu próprio princípio de elevação daqueles com riqueza.
Sócrates faz a seguinte analogia: imagine o que aconteceria se os navegantes fossem
escolhidos segundo a sua riqueza e se excluísse o pobre, embora ele fosse mais capaz de
segurar o leme…
O segundo defeito se dá pela estrutura da cidade, que é dividida entre os pobre e os ricos,
ambos conspiraram continuamente uns contra os outros.
A Alma Oligarca
Enquanto a alma oligarca, ela é preenchida apenas pelo desejo de aumentar a fortuna, preza
apenas pela riqueza. Em resumo, alma oligarca não é culta, é constituída apenas pela avareza.
Democracia
Os chefes oligarcas, por sua avareza, pela sua negligência e as facilidades que concedem à
libertinagem, reduzem por vezes à indigência homens nobres.
A estrutura da cidade oligarca, dividida entre ricos e pobres, é a gênese da revolução dos
pobres que conspiram contra aqueles que tomaram os seus bens. Como os oligarcas não se
mobilizam para sanar o problema do crescimento da “raça do zangão e do mendigo”, com ela
também cresce a revolta contra o sistema estabelecido.
O governo democrático é livre, dessa forma, as pessoas organizarão a sua vida como
preferirem. Assim, encontraremos todos os tipos de pessoas nesse governo. Essa mesma
liberdade também seria um problema.
“A mansidão das democracias para com certos condenados não é elegante? Não viste ainda
num governo desta natureza homens feridos por uma sentença de morte ou de exílio
continuarem na sua pátria e circularem em publico? O condenado, como se ninguém se
preocupasse com ele nem o visse, passeia como um herói invisível.”
A Alma Democrática
“Hoje embriaga-se ao som da flauta, amanhã beberá água pura e jejuará. Ora se exercita na
ginástica, ora se entrega ao ócio e não se preocupa com nada; ora parece dedicado na
filosofia. […] A sua vida não conhece nem ordem nem necessidade, mas considera-a agradável,
livre, feliz e se mantém fiel a ela.”
Tirania
Para Platão, a tirania nunca se originou de qualquer outra forma de governo que não seja a
democracia. É o excesso de liberdade que conduz um excesso de servidão, tanto no indivíduo
como no Estado.
Para chegarmos ao início da tirania é preciso entender a divisão da cidade democrática, Platão
divide-a em três classes.
2. A segunda classe se distingue das demais, são os mais disciplinados e que conseguem
se tornar os mais ricos.
3. A terceira classe é o povo, todos os que trabalham com as mãos e os que são
estranhos aos negócios e não possuem quase nada. Numa democracia, esta classe é a
mais numerosa e a mais poderosa — quando está unida.
Os chefes de governo podem apropriar-se das riquezas da segunda classe e dividi-la entre os
pobres, e os ricos, para se defenderem, falam ao povo e servem-se de todos os meios ao seu
alcance para manterem a sua riqueza. Assim, os governantes acusam os ricos de serem
oligarcas e de conspirarem contra o povo, a terceira classe acredita no que os governantes
dizem e se voltam contra os ricos, dessa forma, os ricos se veem obrigados a se tornarem
oligarcas — eles não fazem isso espontaneamente, mas porque foram provocados. Daí, nasce
o conflito. Os chefes de governo criam um falso inimigo, os ricos, e une o povo contra ele. No
entanto, depois de se livrar dos seus inimigos, e ao se sentir tranquilo deste lado, o governante
começa a provocar guerras, para que o povo tenha necessidade de um chefe. E o protetor do
povo, os governantes, tornam-se os seus tiranos quando expulsam e matam os ricos da cidade.
Para se manter no poder, o tirano elimina aqueles que são suspeitos de conspirarem contra o
governo, quanto mais numeroso se tornar as pessoas que carregam um ódio ao tirano, maior
será a necessidade de ter um guarda numerosa ao seu dispor. O tirano tira tudo que há de
bom no Estado, e mantém o que é ruim para permanecer no poder, extingue a busca pela paz
e harmonia e persegue a guerra e o medo.
“Então, ao que me parece, chegamos ao que se costuma chamar de tirania: o povo, de acordo
com o ditado, evitando a fumaça da submissão a homens livres, caiu no fogo do despotismo
dos escravos e, em troca de uma liberdade excessiva e inoportuna, vestiu a farda mais dura e
mais amarga das servidões.”