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1 PROPEDÊUTICA MÉDICA – ABORDAGEM SEMIOLÓGICA DA TOSSE

INTRODUÇÃO crônica. São as causas mais comuns nessas circunstâncias e de-


vem ser pensadas como principais hipóteses diagnósticas.
APRESENTAÇÃO

A tosse é muito comum na prática médica e deve ser investi- ANAMNESE


gada, haja visto que pode ocorrer por consequência de diversos IDENTIFICAÇÃO
estímulos. Esses estímulos podem ser químicos, inflamatórios,
térmicos e mecânicos. Alguns itens na identificação são particularmente importan-
tes como (1) idade, (2) sexo e (3) ocupação. A idade é importante
A divisão primordial para determinar a causa da tosse é a du- pois diversas doenças são mais comuns à medida que envelhece-
ração. Quando o paciente chega no centro de saúde queixando- mos. Idosos, por exemplo, podem fazer pneumonia sem tosse e
se de tosse, a primeira pergunta relacionada às características da com apirexia. Às vezes, o idoso tem pneumonia tendo a inape-
tosse é “há quanto tempo”. Assim, classificá-la em aguda, suba- tência como única manifestação.
guda e crônica.
O que ajuda em pacientes idosos é o exame físico e lembrar
AVALIAÇÃO CLÍNICA que se trata de um paciente em que os sintomas podem ser atí-
picos. Em relação ao sexo, sabemos que diversas doenças são
DURAÇÃO mais comuns em um sexo particular. Colagenoses, artrite, lúpus,
Tosse aguda. Em relação à duração, uma tosse aguda ocorre por exemplo, são mais comuns em mulheres. No sexo masculino,
em até 3 semanas. De 3 semana a dois meses chama-se de suba- doenças ocupacionais são mais comuns.
guda. As principais causas são (1) IVAS (gripe, resfriado, sinusite
Em relação à ocupação, sempre deve-se perguntar em que o
aguda, coqueluche, dentre outras), (2) exacerbação de DPOC
paciente trabalhar e em que ele já trabalhou. O trabalho em mi-
(sobretudo bronquite e enfisema) ou da asma, (3) PNM, (4) EAP
nas, fábricas de cimento, exposição à fumaça (fogareiro em casa
e (5) embolia pulmonar.
p. ex.). Questionar se outras pessoas do trabalho sentem sinto-
Ao falarmos de tosse subaguda, uma das principais causas é mas parecidos também é importante.
a tosse pós-infecciosa. O paciente chega com uma tosse entre 3
QUEIXA PRINCIPAL
semanas e dois meses, daí se pergunta se previamente (15 dias,
por exemplo) o paciente teve quadro de IVAS (espirro, tosse, Trata-se do sintoma que mais incomoda o paciente e ser o
edema de garganta etc.). mais objetivo possível.

A tosse crônica é um tosse que dura mais de dois meses. As


H.D.A.
principais causas são: (1) asma, (2) DRGE, (3) gotejamento nasal
posterior (rinite alérgica, rinite vasomotora, sinusite bacteriana É a parte mais importante/difícil da anamnese e se deve saber
crônica), (4) DPOC, (5) drogas (IECA, beta-bloqueadores, cocaína de alguns aspectos indispensáveis a serem questionados durante
e crack), (6) IVE, (7) bronquiectasias, (8) infecções crônicas e (9) o interrogatório.
pneumoconioses.
H.D.A.
Outras causas de tosse crônica são (1) doenças pulmonares
intersticiais (sarcoidose, pneumonite por hiper-sensibilidade, fi- 1. Duração
brose pulmonar e colagenoses), (2) vasculites, (3) aspiração por 2. Frequência
corpo estranho, (4) neoplasias (carcinoma broncogênico, metás- 3. Intensidade
tases pulmonares). 4. Tonalidade
5. Presença de expectoração
Asmas e DPOC podem ser agudas ou crônicas. Pode ser aguda a. Volume
em quadros de exacerbação, na qual há uma agudização dessas b. Cor
patologias, que são crônicas. Ou seja, o que diferencia é que há c. Odor
uma mudança na tosse ou no padrão da tosse (aumento da in- d. Consistência
tensidade, frequência, padrão da expectoração etc.). 6. Relação com o decúbito e período do dia de maior intensi-
dade
Sobre o gotejamento nasal posterior, pergunta-se ao paci-
7. Sintomas associados
ente se ele sente como se engolisse algo do nariz para a garganta,
8. Fatores de melhora/piora
fica aquele pigarro, que, quando puxa, sai uma secreção, que pi-
9. Episódios prévios
ora quando se deita. É aquela condição que sai do nariz (seios da
face) e drena para a faringe e se acumula.
DURAÇÃO
Quando se tem uma tosse crônica, seca e com RX normal, O primeiro sintoma que deve ser questionado é a duração da
pensa-se em três causas: (1) asma, (2) DRGE e (3) rinosinusite tosse, a partir da qual será dividida em aguda, subaguda ou
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crônica. Uma tosse de uma semana possui suspeitas (com base SINTOMAS ASSOCIADOS
epidemiológica) distintas de uma tosse de um anos. Uma tosse
de uma semana pode-se pensar em um processo viral; ao passo Alguns sintomas são muito importantes de serem questiona-
que uma tosse de um ano se pode pensar em neoplasia. dos, tais como (1) dispneia e (2) dor toráxica (frequentemente
associados), (3) febre, (4) perda de peso, (5) coriza, (6) odinofa-
FREQUÊNCIA gia, (7) dor na garganta, (8) cefaleia, (9) algia facial, (10) DRGE.
Em geral, os sintomas associados irá depender da duração.
Deve-se perguntar qual a frequência dessa tosse, horários em
que ela é mais frequente (manhã, noite ou contínua). Algumas Paciente com tosse há mais de 3 semanas. Tosse subaguda
pessoa só tossem quando se alimentam, situação na qual asso- pode ser tuberculose, então, questiona-se sobre fatores associa-
cia-se a tosse a problemas do TGI. Outras pessoas tossem quando dos: hemoptise, perda de peso, sudorese, febre baixa vespertina.
vão fazer atividade física. Em resumo, divide-se em grandes grupos segundo a duração,
questionando o paciente sobre fatores que possam estar associ-
INTENSIDADE ados ao grupo de doenças de acordo com a duração. Também
deve-se investigar a cronologia do aparecimento de sintomas. “O
Questiona-se se é uma tosse intensa, tosse que atrapalha o
que começou primeiro?”.
sono, tosse que atrapalha suas atividades habituais? É uma tosse
que é tão forte que ele sente como se estivesse sendo asfixiado?
FATORES DE MELHORA/PIORA

TONALIDADE Deve-se entender o perfil da tosse. “O que faz piorar?”. Po-


eira, esforço, decúbito, ar-condicionado, fumaça etc. “O que faz
Outro aspecto semiológico da tosse é a tonalidade, isto é, se
melhorar?”. Repouso, medicação, “bombinha”, xarope, decúbito
a tosse possui uma, duas ou mais tonalidades. Aquela tosse que
etc. “Paciente 49 anos deu entrada no hospital após esforço” é
é bitonal, por exemplo, fala a favor de lesão de cordas vocais.
diferente de “paciente 26 anos deu entrada no hospital após con-
Outra hipótese é uma paresia em decorrência de lesão no nervo
tato com poeira”.
laríngeo recorrente. Outra tosse possível é a tosse laríngea
(rouca), típica de tabagistas crônicos.
EPISÓDIOS PRÉVIOS DE IVAS

PRESENÇA DE EXPECTORAÇÃO Episódios prévios de IVAS, bem como episódios prévios do


quadro geral são importantes para se pensar em diagnóstico.
Nessa etapa. Questiona-se o paciente se a tosse é cheia, com
Questionar sobre episódios semelhantes em pessoas próximas
presença de expectoração, ou seca, sem expectoração. Outro re-
também ajuda.
lato importante é o de que o paciente “engole”. Na H.D.A, diz-se
que se trata de uma tosse produtiva com expectoração retida.
DADOS IMPORTANTES NA AVALIAÇÃO DA TOSSE
Se for uma tosse produtiva, pensa-se em alterações da árvore CRÔNICA
brônquica; se seca, pensa-se que o paciente não tem comprome-
O (1) tabagismo, junto da carga tabágica e o tipo de cigarro.
timento brônquico (comprometimento pleurítico p. ex.). Esse ra-
(2) Mudança recente do padrão de tosse, serve, por exemplo,
ciocínio, no entanto, nem sempre é válido. No começo de uma
para detectar se é um quadro de exacerbação de uma DPOC. (3)
PNM, a tosse pode ser inicialmente seca, por exemplo.
Presença e quantidade de escarro. (4) Hemoptise, que pode si-
Em relação ao aspecto da expectoração, perguntas como (1) nalizar desde um tromboembolismo a uma neoplasia – tubercu-
volume (muito ou pouco?), (2) cor (mucoide [clara de ovo], es- lose também pode cursar com hemoptise.
verdeada, amarelada [purulenta], ferruginosa [típica de pneumo-
(5) Queimação retroesternal, que pode falar a favor de causas
coco]?), (3) odor (expectoração com odor muito fétido fala a fa-
cardíacas. (6) Exposição ocupacional, olhar com cuidado se o pa-
vor de MO anaeróbios, abcesso pulmonar) e (4) consistência (vis-
ciente trabalha em minas de carvão, fábrica de cimento etc. pode
cosa ou mais fluida) devem ser perguntados.
falar a favor de silicose, asbestose, infecções fúngicas, dentre ou-
tras. (7) História de alergia ou atopia, um paciente que tem der-
RELAÇÕES COM O DECÚBITO, PERÍODO DO DIA EM
matite, tem histórico de doenças alérgicas, história familiar etc.,
QUE É MAIOR SUA INTENSIDADE
pensa-se em asmas, rinite alérgica, dentre outras.
Se, por exemplo, o paciente tiver uma tosse decorrente de
um processo de sinusite, o decúbito piora. Isso ocorre porque o A (8) tosse noturna, que pode ser indicativo de rinossinusite.
decúbito piora a drenagem dos seios paranasais para a rinofa- (9) Cefaleia e sintomas de sinusopatia, aquela algia facial, secre-
ringe. Logo, o paciente terá tosse ao deitar-se. O período do dia ção nasal obstrução nasal. (10) Introdução de uma droga nova,
em que é maior a intensidade é outro fator importante. “Paci- principalmente IECA, algumas drogas que podem causar pneu-
ente tosse mais quando acorda, expectora mais também”, fala a monia por hipersensibilidade e AB. (11) Uso de drogas ilícitas.
favor de bronquiectasias.
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INTERROGATÓRIO SISTEMÁTICO HÁBITOS DE VIDA/PSICOSSOCIAL

Nessa etapa da anamnese, alguns sintomas devem ser dire- • Tabagismo → carga tabágica, tipo, frequência, ativo/passivo
tamente questionados ao paciente, um pouco diferente da • Etilismo
H.D.A, na qual há um relato, sim, direcionado, mas com um com- • Drogas ilícitas: crack, cocaína
ponente espontâneo bem maior – o paciente relatará que está • Animais domésticos
com falta de ar, coração acelerado e suando muito caso seja fa- • Fogão à lenha
tores que o incomodam, mesmo sem o questionamento médico.
IVAS
De acordo com cada tópico, pergunta-se:
Gripe
• Sintomas gerais: síndrome consumptiva (sudorese, febre,
perda de mais de 10% do peso, calafrio) – pode indicar lin- Resfriado
foma, que causa muita febre, muita sudorese e calafrio
Coqueluche
• Pele e fâneros: urticária/dermatite, impetigo ou lesões infec-
ciosas (falam a favor de infecção), rash cutâneo malar (fala a DPOC
favor de lúpus)
• Cabeça e pescoço: sintomas nasais, nódulos de tireoide, lin- Bronquite
fadenopatia, disfonia (bem presente na DRGE), pigarro
Enfisema
• Mamas: nódulo, ginecomastia
• TGI: pirose, dor retroesternal, regurgitação Asma
• Músculoesquelético: artralgia rigidez matinal – busca por
sintomas de alguma colagenose PNM
• Neurológicos: roncos, insônia, alteração do sensório, ansie-
EAP
dade
Embolia pulmonar
ANTECEDENTES MÉDICOS
Tosse pós-infecciosa
Nos antecedentes médicos, alguns fatores são importantes
diretamente para a tosse. DRGE

• Doenças da infância: sarampo, coqueluche, asma, pneumo- Bronquiectasias


nias de repetição – sarampo, pneumonias de repetição, co-
queluche podem causar desestruturação do parênquima Pneumoconioses
pulmonar, levando a bronquiectasias
Fibrose pulmonar
• Contato com tuberculose
• Diagnóstico de DM, DPOC, ICC, HIV, leucemia, transplanta- neoplasias (carcinoma broncogênico, metástases pulmona-
dos res)
• Colagenoses
• Neoplasias; radioterapia – afeta o parênquima pulmonar Gotejamento nasal posterior
• Uso de medicamentos – imunossupressores, CE, IECA, BB
• Antecedentes de trauma – fala a favor de pneumotórax
• Alergia
• DUM

ANTECEDENTES FAMILIARES

• TB
• Asma
• Atopia
• Bronquite/enfisema
• Deficiência de alfa1-antitripsina – interfere na elastase, cau-
sando destruição do septo interalveolar e DPOC em jovens
• Bronquiectasias
4 PROPEDÊUTICA MÉDICA – ABORDAGEM SEMIOLÓGICA DA TOSSE

BOX DAS DOENÇAS CITADAS

Bronquiectasias

DRGE

Asma

Síndrome consumptiva

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