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Quinta-feira, 13 de julho de 2023 I Série


Número 75

BOLETIM OFICIAL
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ÍNDICE
TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
Acórdão n.º 103/2023:
Proferido nos autos de Recurso de Amparo Constitucional n.º 1/2023, em que é recorrente Manuel Monteiro
Moreira e entidade recorrida o Tribunal da Relação de Sotavento.................................................1444
Acórdão n.º 104/2023:
Proferido nos autos de Recurso de Amparo Constitucional n.º 27/2022, em que é recorrente António das
Neves Furtado Tavares e entidade recorrida o Supremo Tribunal de Justiça...............................1452
Acórdão n.º 105/2023:
Proferido nos autos de Recurso de Amparo Constitucional n.º 7/2022, em que é recorrente Matthew Peter
Balme e entidade recorrida o Supremo Tribunal de Justiça. .........................................................1458
Acórdão n.º 106/2023:
Proferido nos autos de Recurso de Amparo Constitucional n.º 16/2023, em que é recorrente Braime
Hilique Semedo Tavares e entidade recorrida o Supremo Tribunal de Justiça. ...........................1469
Acórdão n.º 107/2023:
Proferido nos autos de Recurso de Amparo Constitucional n.º 17/2023, em que é recorrente Alberto
Monteiro Alves e entidade recorrida o Tribunal da Relação de Barlavento. .................................1471
Acórdão n.º 108/2023:
Proferido nos autos de Recurso de Amparo Constitucional n.º 18/2023, em que é recorrente Rui Jorge da
Costa Mendes e entidade recorrida o Supremo Tribunal de Justiça...............................................1475
Acórdão n.º 109/2023:
Proferido nos autos de Recurso de Amparo Constitucional n.º 15/2023, em que é recorrente Hélder Manuel
Duarte da Lomba e entidade recorrida o Tribunal da Relação de Sotavento.................................1478
Acórdão n.º 110/2023:
Proferido nos autos de Recurso de Amparo Constitucional n.º 5/2023, em que é recorrente Djanine Gomes
Rosa e entidade recorrida o Tribunal da Relação de Barlavento....................................................1486
Acórdão n.º 111/2023:
Proferido nos autos de Recurso de Amparo Constitucional n.º 1/2023, em que é recorrente Manuel Monteiro
Moreira e entidade recorrida o Tribunal da Relação de Sotavento.................................................1491
Acórdão n.º 112/2023:
Proferido nos autos de Recurso de Amparo Constitucional n.º 3/2021, em que é recorrente Antero Maria
Gomes de Oliveira e entidade recorrida o Supremo Tribunal de Justiça.......................................1494

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1444 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

Acórdão n.º 113/2023:


Proferido nos autos de Recurso de Amparo Constitucional n.º 46/2022, em que são recorrentes Osvaldo Rodrigues
Oliveira e Ramiro Rodrigues Oliveira, e entidade recorrida o Supremo Tribunal de Justiça...................1496
Acórdão n.º 114/2023:
Proferido nos autos de Recurso de Amparo Constitucional n.º 19/2023, em que é recorrente Amadeu
Fortes Oliveira e entidade recorrida o Supremo Tribunal de Justiça.............................................1498

TRIBUNAL CONSTITUCIONAL localizar as gravações, o que segundo […] a cota lançada


pela secretaria no processo[,] não foi possível”.
––––––
1.4. No acórdão recorrido, apesar do TRS ter supostamente
Cópia: reconhecido que o acesso à gravação da prova produzida
em audiência é imprescindível ao exercício do direito
Do acórdão proferido nos autos de Recurso de Amparo ao recurso em matéria de facto, ficaria prejudicado o
Constitucional n.º 1/2023, em que é recorrente Manuel conhecimento das “questões sobrantes (…) referentes à
Monteiro Moreira e entidade recorrida o Tribunal da impugnação da matéria de facto, por erro na apreciação
Relação de Sotavento. da prova e violação do in d[u]bio pro r[eo]”, terá, no
entanto, decidido que se estaria em presença de mera
Acórdão n.º 103/2023 irregularidade que deveria ter sido invocada nos três
(Autos de Amparo 1/2023, Manuel Monteiro Moreira v. dias seguintes a contar da data da diligência.
TRS, Inadmissão por Não-Atributabilidade de Condutas 1.4.1. Não o tendo feito dentro desse prazo, a irregularidade
Impugnadas ao Ato Judicial Recorrido e por Ausência de ficara sanada, sendo extemporâneo invocar tal irregularidade
Pedidos de Reparação) em sede de recurso;
I. Relatório 1.4.2. No entender do recorrente, tal decisão seria
1. O Senhor Manuel Monteiro Moreira interpôs recurso contrária à jurisprudência desta Corte, em especial a
de amparo constitucional contra o Acórdão TRS 180/2022, que ficou assentada no Acórdão 24/2018.
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de 05 de dezembro, apresentando extensa argumentação, 1.5. Além disso, a falta de prova seria tão notória,
a qual, afastando-se de uma exposição resumida das que o julgador na sentença condenatória, “limitou-se a
razões que fundamentam a petição, será sumarizada da remeter para a identificação das testemunhas sem nunca
seguinte forma: indicar o que teria efetivamente sido dito pelas referidas
1.1. O arguido, ora recorrente, foi condenado na pena de testemunhas”.
6 (seis) anos e 11 (onze) meses, pela prática de um crime 1.5.1. A seu ver a sentença é nula por falta de fundamentação,
de agressão sexual de criança p. e p. pelos artigos 13, 25, tendo em conta que o Tribunal da Relação deu por provado
142, nº 1 e 3, als. a) e b) do art.º 141, todos do CP, pelo factos “sem nunca trazer para a sentença, como estava
Juízo Crime do Tribunal da Comarca de Santa Catarina. obrigado [,] a declaração que serviu para formar a referida
1.2. Inconformado com a sentença, para a instrução convicção”;
do seu recurso, solicitou ao Tribunal a ata/gravação do 1.5.2. Diz que, no seu Acórdão, o TRS chegou mesmo a
julgamento. afirmar que “o Juiz pode unicamente proferir/fundamentar
a sentença com base nos apontamentos que retirou durante
1.3. Foram-lhe disponibilizados dois ficheiros áudio a audiência de discussão e julgamento”;
mp3, que não continham nem as declarações do arguido/
recorrente, nem as declarações prestadas pelas testemunhas, 1.5.3. A sentença terá sido fundamentada com apontamentos
que terão sido usadas como fundamento para formar a retirados pelo Juiz na audiência de discussão e julgamento,
convicção do tribunal e condená-lo. impedindo o exercício do contraditório sobre os mesmos;
1.3.1. Questionado um dos oficiais de justiça da 1.5.4. Foi surpreendido com o facto de a ponderação do
secretaria sobre a razão pela qual apenas lhe tinham caso e a determinação da pena a aplicar pelo TRS teria
sido disponibilizados os dois ficheiros que identificou no tido por base factos que não constariam da acusação e
ponto 6 da sua petição inicial, este ter-lhe-á respondido não resultariam de factos dados como provados;
que “procurado nos sistemas informáticos disponíveis
no tribunal (inclusive o computador da sala de audiência) 1.5.5. “Quanto aos factos dados como provados na
os únicos ficheiros disponíveis sobre o processo PCO n.º sentença condenatória estes apenas tiveram como base
213/2021. Arguido: Manuel Monteiro Moreira eram os que as alegadas declarações da(s) ofendida(s) que não foram
foram disponibilizados (ficheiros identificados no ponto 6)”; suportados, nem indiciariamente, por qualquer outro
meio de prova, inexistindo um juízo de certeza sobre a sua
1.3.2. Por entender que a “inexistência no tribunal de prática, pelo que deverá valer o princípio constitucional
ficheiros áudios com gravação completa da audiência (art.º 35º, n.º 1 da CRCV) e legal (art.º 1º, nº 1 da CPP)
de discussão e julgamento fere gravemente o direito do da presunção de inocência do arguido, de que é corolário
arguido ao contraditório, à defesa, ao acesso às provas e o princípio “in dubio pro reo””;
de recorrer de decisões que lhe são desfavoráveis, interpôs
recurso para o Tribunal da Relação de Sotavento (TRS); 1.5.6. Em suma, a seu ver, as declarações do TRS foram
contraditórias, incoerentes, e com vários desencontros, pois,
1.3.3. “Na sequência da interposição do recurso o M. a ata/gravação da audiência de discussão e julgamento
Juiz do Tribunal da Comarca de Santa Catarina, por terá desaparecido, pelo que deveria o TRS, aqui, também,
despacho de 29.08.2022, determinou, com caracter de em nome do in dubio por reo, resolver a questão a favor
urgência que a secretaria diligenciasse no sentido de do arguido.

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1445

1.6. “Por último, não menos importante, o arguido foi os elementos que julgar indispensáveis à aferição de
detido em 01.08.2021, em cumprimento de um mandato admissibilidade do recurso, bem como a procuração que
de detenção fora de flagrante delito, tendo, por despacho habilita o advogado subscritor a representá-lo; b) Indicar
de 05.08.2021[,] sido determinad[a] a prisão preventiva de forma clara e inequívoca a(s) conduta(s) imputável(is)
do mesmo, situação que permanece inalterada até hoje”; ao órgão judicial recorrido que pretende que seja(m)
escrutinada(s); c) Precisar os amparos que pretende obter
1.6.1. O Ministério Público concluiu o inquérito e deste Tribunal Constitucional para reparar as alegadas
proferiu despacho de acusação no dia 10 de outubro de violações de direitos por cada conduta que impugnar”.
2021 e notificou o recorrente e o seu mandatário;
3.2. Lavrada no Acórdão 54/2023, de 11 de abril,
1.6.2. Sem, no entanto, dar efetivo cumprimento ao Aperfeiçoamento por Falta de Junção de Documentos
direito de audiência do arguido, “fulminando aquela peça Essenciais à Aferição de Admissibilidade do Amparo; por
processual com nulidade insanável”, o que é fundamentado Obscuridade na Definição das Condutas Impugnadas; por
pelo recorrente na sua petição inicial através de referências Falta de Indicação dos Amparos Concretos que Almeja
aos artigos 151 al. k) e 305 nº 2 do CPP e ao artigo 35 nº Obter, Rel. JCP Pina Delgado, publicado no Boletim
6 e 7 da CRCV e à doutrina. Oficial, I Série, N. 45, 24 de abril de 2023, pp. 1103-1106,
1.7. Pede por isso que o recurso de amparo seja admitido, este foi notificado ao recorrente, através de mandatário,
julgado procedente, concedendo-se-lhe, em consequência, no dia 12 de abril de 2023.
o amparo constitucional dos seus direitos ao contraditório,
à ampla defesa, ao recurso, ao devido processo legal, ao 4. No dia 14 de abril de 2023, o recorrente protocolou
processo justo e equitativo, à liberdade sobre o corpo e uma peça de aperfeiçoamento, através da qual:
à presunção de inocência, com todas as consequências 4.1. Traz um extenso relato, acompanhado de conclusões
constitucionais e legais. e de pedidos;
1.8. Perante o que entende ser uma nulidade insanável e
cristalina, “tanto da sentença do Juízo Crime do Tribunal 4.2. Junta documentos.
da Comarca de Santa Catarina, como do [A]córdão n.º 5. A sessão marcada para apreciar o aperfeiçoamento
180/2022 do TRS e de todo o procedimento criminal” e e a admissibilidade foi marcada para o dia 28 de abril,
por estarem esgotados os prazos de prisão preventiva tendo o julgamento in camera ocorrido nessa data, dela
previstos no art.º 279º, n.º 1, al. a), b), c) do CPP, tornando decorrendo a decisão exposta e fundamentada a seguir.
a manutenção da prisão preventiva manifestamente
ilegal”, requer como medida provisória que esta Corte II. Fundamentação
ordene a sua soltura imediata.
1. Do ponto de vista constitucional, o recurso de amparo
2. Cumprindo o estabelecido no artigo 12 da Lei n.º é concebido como um direito fundamental de “requerer
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109/IV/94 de 24 de outubro, foram os autos com vista ao Tribunal (…) a tutela de (…) direitos, liberdades e
ao Ministério Público para emitir o parecer sobre a garantias, constitucionalmente reconhecidos”, e também
admissibilidade do recurso, tendo-o feito S. Excia o Sr. como um meio “de tutela de direitos, liberdades e garantias”,
Procurador-Geral da República, o qual ofereceu parecer consagrando-se a sua dupla-natureza subjetiva e objetiva.
com o seguinte teor:
1.1. Direito este que é delimitado materialmente, na medida
2.1. O recurso mostrar-se-ia tempestivo, o requerimento em que destinado à proteção direta de apenas uma das
apresentar-se-ia suficientemente fundamentado e o três categorias de direitos fundamentais previstas pela Lei
recorrente estaria provido de legitimidade, “porquanto Fundamental. Seriam os denominados direitos, liberdades
parece ser pessoa direta, atual e efetivamente afetada e garantias, tanto os individuais, como os de participação
pela decisão do acórdão recorrido”; política e de exercício da cidadania e, arguivelmente, os
2.2. Tendo a decisão ora impugnada sido prolatada pelo dos trabalhadores. É verdade que se estende para recobrir
Tribunal da Relação de Sotavento e não estando previsto os direitos análogos a direitos liberdades e garantias ou
qualquer recurso ordinário da mesma, ficariam esgotados que portem caraterísticas específicas com dimensões
todos os meios ordinários de defesa dos direitos, liberdades individuais e civis como, respetivamente, os direitos de
e garantias estabelecidos pela respetiva lei do processo. proteção judiciária (Acórdão 6/2017, de 21 de abril, Maria
de Lurdes v. STJ, sobre pedido de desistência, Rel: JC
2.3. Os direitos cuja violação o recorrente alega terem Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 42,
sido violados pelo órgão recorrido constituiriam direitos 21 de julho de 2017, pp. 898-903, 5; Acórdão 9/2017, de
e garantias fundamentais reconhecidos na CRCV como 8 de junho, Martiniano Oliveira v. STJ, Rel: JCP Pinto
suscetíveis de amparo; Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 42,
2.4. Não constaria que o Tribunal Constitucional tenha 21 de julho de 2017, pp. 925-929, e); Acórdão 13/2017,
rejeitado por decisão transitada em julgado um recurso de 20 de julho, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto
substancialmente igual; Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 47, 8 de
agosto de 2017, pp. 1024-1029, e); Acórdão 24/2017, de
2.5. Nada teria a promover sobre a medida provisória 9 de novembro, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto
porque nenhuma foi decretada e é de parecer que “o Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 78, 22
presente recurso de amparo constitucional preenche os de dezembro de 2017, pp. 1692-1698, e); Acórdão 12/2018,
requisitos de admissibilidade, devendo, entretanto, ser de 7 de junho, CIMA v. STJ, Rel: JC Aristides R. Lima,
regularizada a representação com a junção da competente Decisão de admissibilidade, publicado no Boletim Oficial,
procuração forense”; I Série, N. 49, 20 de julho de 2018, b; Acórdão 16/2018,
3. Marcada a sessão de julgamento para o dia 31 de março, de 28 de julho, Luigi Zirpoli v. TJCP, Rel: JCP Pinto
nessa data se realizou com a participação dos Venerandos Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 49, 20
Juízes-Conselheiros e do Senhor Secretário do TC. de julho de 2018, pp. 1298-1302, e); Acórdão 17/2018,
de 26 de julho, Amândio Vicente v. TRS, Rel: JCP Pinto
3.1. Dela decorrendo decisão de aperfeiçoamento, Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 51, 3 de
determinando a notificação do recorrente para que agosto de 2018, pp. 1328-1333, e); Acórdão 22/2018, de 11
diligenciasse no sentido de: “a) Juntar aos autos a de outubro, Martiniano v. STJ, sobre o direito de acesso
sentença do tribunal de julgamento, o recurso que dirigiu aos tribunais, Rel: JC José Pina Delgado, publicado no
ao TRS; qualquer incidente que tenha colocado, a peça Boletim Oficial, I Série, N. 76, 22 de dezembro de 2018, pp.
em que suscitou a omissão do MP a que se refere e todos 1824-1835, 2; Acórdão 3/2019, de 24 de janeiro, Ramiro

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1446 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

Rodrigues v. TRB, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no 1.3. E caraterizado pelo seu informalismo, urgência
Boletim Oficial, I Série, N. 28, 13 de março de 2019, pp. e sumariedade, conforme decorre da alínea b) do artigo
480-486, e); Acórdão 36/2022, de 12 de agosto, Ramiro 20, segundo a qual ele “pode ser requerido em simples
Oliveira Rodrigues v. TRB, sobre violação do direito de petição, tem caráter urgente e o seu processamento deve
acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva por não- ser baseado no princípio da sumariedade”.
admissão de recurso designado pelo recorrente amparo
ordinário por tribunal judicial, Rel: JC Pina Delgado, 1.4. Por conseguinte, está-se perante um direito
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 2, 5 de janeiro fundamental e um recurso constitucional desenhado
de 2023, p. 36-42, 2.1) e o direito à propriedade privada especialmente para a proteção de direitos, liberdades e
(Acórdão 30/2019, de 30 de agosto, Atlantic Global Asset garantias, que pode ser utilizado subsidiariamente quando
Management v. PGR, sobre violação do direito à propriedade os meios ordinários de tutela de direitos que correm os
privada, da garantia de juiz, da iniciativa privada e dos seus trâmites perante os tribunais judiciais ou outros,
direitos à defesa, ao contraditório e de acesso às provas a existirem, falham. Tais caraterísticas impõem que a
da acusação, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim própria lei de processo constitucional que desenvolve
Oficial, I Série, N. 110, 29 de outubro de 2019, pp. 1766- os procedimentos atinentes ao recurso de amparo seja
1789); ou ainda para situações que envolvam camadas interpretada como uma lei restritiva de direito cujo figurino
de proteção essenciais que remetam a certos direitos, básico se deve manter dentro dos confins dos números 4 e
liberdades e garantias como a vida ou a integridade 5 do artigo 17 da Constituição, ainda que parte do regime
pessoal. Porém, fora desses casos, com a tendencial possa ser legitimamente fixado pelo legislador em razão
não-inclusão dos direitos económicos, sociais e culturais da remissão à lei (“nos termos da lei”), desde que não se
e dos direitos de grupos vulneráveis que não portem atinja de modo ilegítimo as caraterísticas essenciais do
caraterísticas de direitos, liberdades e garantias, e também instituto impostas pelo próprio dispositivo constitucional
de princípios constitucionais objetivos, como, em diversos (“e com observância [obrigatória, diga-se] do disposto nas
momentos, este Tribunal já decidiu (Acórdão 11/2017, alíneas seguintes (…)”.
de 22 de junho, Maria de Lurdes v. STJ, sobre violação
do direito de constituir família por não reconhecimento 2. As exigências da peça de recurso de amparo são as
de união de facto, Rel: JC Pina Delgado, publicado no consagradas nos artigos 7º e 8º da Lei do Amparo e do
Boletim Oficial, I Série, N. 42, 21 de julho, pp. 933-950 e Habeas Data, os quais impõem, respetivamente, que:
na Coletânea de Decisões do Tribunal Constitucional de 2.1. A petição seja:
Cabo Verde, Vol. III, Praia, INCV, 2018 (2017), pp. 423-
477, 20.1; Acórdão 29/2017, de 5 de dezembro, Ovídio 2.1.1. Interposta através de simples requerimento,
de Pina v. STJ, Rel: JC Aristides R. Lima, publicado no com indicação expressa de que o recurso tem a natureza
Boletim Oficial, I Série, N. 6, 1 de fevereiro de 2018, pp. de amparo;
75-93, 20.1; Acórdão 06/2018, de 22 de março, Adilson
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Danielson v. STJ, Rel: JC Pina Delgado, Boletim Oficial, 2.1.2. Devidamente fundamentada; e
I Série, N. 21, de 11 de abril de 2018, pp. 495-505, 2;
Acórdão 27/2018, de 20 de dezembro, Judy Ike Hills v. 2.1.3. Entregue na Secretaria do Tribunal Constitucional.
STJ, sobre violação de garantia de inviolabilidade de
domicílio, de correspondência e de telecomunicações e 2.2. Quanto ao que a lei designa de “fundamentação
de garantia da presunção da inocência na sua dimensão do recurso”, exige-se que o recorrente, através da peça,
de in dubio pro reo, Rel: JC Pina Delgado, publicado no 2.2.1. Identifique a entidade, o funcionário ou o agente
Boletim Oficial, I Série, N. 11, 31 de janeiro de 2019, pp. autor do ato ou da omissão, bem como os interessados a
146-178, 2.1.1). Por conseguinte, trata-se de um recurso que o provimento do recurso possa diretamente beneficiar
especialmente desenhado para proteger uma categoria ou prejudicar, havendo-os;
especial de direitos que goza de regime de tutela mais
intenso: os direitos, liberdades e garantias. 2.2.2. Indique com precisão “o ato, facto ou a omissão”
que, na sua opinião, violou os seus direitos amparáveis;
1.2. E que fica processualmente condicionado ao
esgotamento das vias ordinárias de recurso, opção da 2.2.3. Indique com clareza quais deles terão sido
qual resulta um figurino constitucional que produz vulnerados, “com a expressa menção das normas ou
diversos efeitos. princípios jurídico-constitucionais que entende terem
1.2.1. Desde logo, a conceção de que todos os tribunais sido violados”;
cabo-verdianos são tribunais de proteção de direitos, nos 2.2.4. Exponha resumidamente as razões de facto que
termos da sua respetiva jurisdição, cabendo efetivar essa fundamentam o pedido, bem como “formul[e] conclusões,
tutela através dos processos ordinários desenhados pela lei, nas quais resumirá, por artigos, os fundamentos de facto
dos processos especiais previstos pela Constituição como o e de direito que justificam a petição”;
Habeas Corpus ou o recurso contencioso administrativo, ou
daqueles que venham a ser definidos pelo legislador, nos 2.2.5. Esta deverá “terminar com o pedido de amparo
termos do artigo 22, parágrafo sexto, segundo o qual “[p]ara constitucional no qual se indicará o amparo que o recorrente
a defesa dos direitos, liberdades e garantias individuais, a entende dever ser-lhe concedido para preservar ou
lei estabelece procedimentos judiciais céleres e prioritários restabelecer os direitos, liberdades ou garantias violados”,
que assegurem a tutela efetiva e em tempo útil contra devendo vir acompanhada dos “documentos que julgar
ameaças ou violações desses mesmos direitos, liberdades e pertinentes e necessários para a procedência do pedido”.
garantias” (Acórdão nº 36/2022, de 12 de agosto, Ramiro
Oliveira Rodrigues v. TRB, sobre violação do direito de acesso 2.3. O objeto dessas disposições é determinar o modo de
à justiça e à tutela jurisdicional efetiva por não-admissão interposição e definir a estrutura da peça processual, de
de recurso designado pelo recorrente de amparo ordinário tal sorte que, de forma célere e simplificada, se permita
por tribunal judicial, Rel: JC Pina Delgado, 5.1.3). ao Tribunal Constitucional identificar os elementos
constitutivos da súplica para que possa decidir sobre a
1.2.2. E, em consequência, a subsidiariedade do recurso sua admissibilidade, sobre eventuais medidas provisórias
de amparo, recurso constitucional de natureza especial, aplicáveis e, subsequentemente, sobre o seu mérito.
ao qual só se pode lançar mão, depois de se explorar os
mecanismos que correm perante os tribunais ordinários 2.3.1. De um lado, através da facilitação do acesso a
para que estes possam conhecer e garantir a tutela desses esses elementos que decorreriam do modo de organização
mesmos direitos. da peça e da entrega direta no Tribunal Constitucional;

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2.3.2. Do outro, pelo facto de se impor um determinado direitos que entende terem sido violados e, genericamente,
conteúdo à mesma, na medida em que, do ponto de vista intui-se o amparo último que almeja obter, aspetos que
do número 1 do artigo 8º, primeiro, remete-se, através das serão avaliados adiante, se for necessário. Isso porque
alíneas a) e b); para a identificação das condutas lesivas parece dizer que:
(“ato, facto ou a omissão”) e para o órgão do poder público
ao qual podem ser imputadas (“a entidade, o funcionário 3.1. As condutas impugnadas seriam, conforme precisão
ou o agente autor do ato ou da omissão”); segundo, por feita através do acórdão de aperfeiçoamento, oito. A saber:
meio da alínea c), aos direitos, liberdades e garantias
vulnerados por aquelas (“indicar com clareza os direitos, 3.1.1. Atos praticados tanto pelo tribunal de primeira
liberdades e garantias fundamentais”) e às disposições instância, como pela Relação, ao entenderem, quanto
onde estariam alojados ou os princípios de onde podem à inexistência dos ficheiros ata/áudio da gravação com
ser inferidos (“com a expressa menção das normas ou as declarações do arguido e testemunhas usadas para
princípios-constitucionais que entendem terem sido a condenação, que eles apenas serviriam para se poder
violados”); terceiro, nos termos do número 2 da mesma assegurar a veracidade do que se passou efetivamente em
disposição, à explicitação do amparo que se pretende para julgamento, consubstanciando-se estas, outrossim, nas provas
se remediar a eventual lesão (“a petição terminará com recolhidas com base no principio da imediação, elementos
o pedido de amparo constitucional no qual se indicará o estes que seriam necessários e indispensáveis para permitir
amparo que o recorrente entende dever ser-lhe concedido ao arguido, concordar ou discordar de uma decisão;
para preservar ou restabelecer os direitos, liberdades e 3.1.2. Ato praticado pelo TRS, ao entender que a
garantias fundamentais violados”). A argamassa que inexistência dos ficheiros ata/áudio da gravação com as
ligaria esses três elementos decorreria dos fundamentos declarações do arguido e testemunhas usadas para a
de facto e de direito que justificam a petição, como também condenação, corresponderiam a uma mera irregularidade,
se impõe apresentar, conforme o disposto nas alíneas d) afetante do julgamento ou da sentença, devendo ser
e e) do parágrafo primeiro da primeira disposição. invocada pelo arguido em três dias a contar da data da
2.3.3. A regra é que, do ponto de vista da articulação diligência para ser conhecida e sanável pelo decurso
da petição de amparo, deve haver o estabelecimento de desse prazo, sendo extemporâneo invocá-la na fase de
uma ligação lógica entre cada conduta impugnada, as recurso da sentença;
posições jurídicas decorrentes do(s) direito(s) que ela
vulnera e o amparo adequado para a remediar através da 3.1.3. A não-indicação pelo tribunal de primeira instância
fundamentação. O que se tem verificado até agora é que das razões/raciocínio de facto que terão levado o julgador a
na maior parte dos casos, isso é muito deficientemente considerar como provados determinados factos, limitando-
articulado, lançando-se para a peça de recurso, sem grande se este a remeter para a identificação das testemunhas,
precisão e racionalização, uma pluralidade de condutas sem nunca indicar ou resumir o que teria efetivamente
a que globalmente se imputam violações de um conjunto sido dito pelas mesmas num processo em que a gravação
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diversificado de direitos, e remetendo-se para amparos da audiência terá desaparecido;


genéricos ou impossíveis. O Tribunal Constitucional desde 3.1.4. A conduta do tribunal de primeira instância, que,
o Acórdão nº 10/2017, de 8 de junho, Adilson Danielson ao proceder à ponderação do caso e a determinação da
v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim pena a aplicar ao arguido, na sentença condenatória ao
Oficial, I Série, N. 42, 21 de julho de 2017, pp. 929-933, sustentar que “quem comanda o ato ou domínio de facto
b), tem tolerado a interposição de vários amparos que não é o arguido ao penet[r]ar seu pénis ereto na vagina da
cumprem essas exigências qualitativas, considerando que menor ora ofendida e a gravidade do acto é refletido no
a disposição deve ser lida sempre de forma compatível ao quantum da pena”, considerou facto que não constaria
direito constitucional ao amparo, no sentido de que “mais da acusação e nem terá sido dado por provado;
importante que o rigor formal é a inteligibilidade do que
se expõe e se requer”. Mas, a duras penas, considerando 3.1.5. A conduta do TRS de, sem questionar o Juiz de
a grande dificuldade que se tem para se compreender 1ª instância, e sem que este se tenha pronunciado se
o que se impugna, o que se pede e os fundamentos que ponderou ou não o facto, entendeu considerar a conduta
suportam as petições. A Corte Constitucional continuará – descrita na alínea anterior, como um mero lapso desse
transitoriamente – aberta a privilegiar as admissibilidades, magistrado;
suprindo ela própria eventuais deficiências das peças, mas,
depois de vários anos de prática do amparo em Cabo Verde, 3.1.6. A conduta do tribunal de primeira instância que
é preciso entrar numa nova fase mais exigente, sustentada não terá explicado de forma clara a razão de ter atribuído
numa melhor qualificação. mais valor às declarações da ofendida e de outra menor
do que o crédito que reservou às proferidas pelo arguido;
2.3.5. Na situação vertente, pode-se dizer que, no geral,
o recorrente, além de ter apresentado a sua peça na 3.1.7. A conduta do tribunal de primeira instância de
secretaria deste Tribunal, indicando expressamente que fundamentar a sentença com base nessas declarações,
se trata de um recurso de amparo, incluiu uma exposição sem que elas tenham sido suportadas por qualquer outro
das razões de facto que a fundamentam e integrou um meio de prova, não tendo promovido qualquer juízo de
segmento conclusivo resumindo por artigos os fundamentos certeza sobre a prática dos factos.
de facto e de direito que suportam os seus pedidos. Padecia,
no entanto, de algumas deficiências, que se julga terem 3.1.8. A conduta do Ministério Publico de concluir o
sido colmatadas com a peça que ora se apresentou de inquérito e proferir o despacho de acusação sem ouvir
forma tempestiva, já que desta consta, sobretudo na parte previamente o recorrente.
conclusiva, uma determinação apropriada das condutas
(alíneas a) a h)), os amparos que se requer também se 3.2. Porém, nos termos da jurisprudência deste Tribunal
encontram definidos de modo aceitável na parte petitória (Acórdão 6/2018, de 22 de março, Adilson Danielson v.
da peça de aperfeiçoamento e, no geral, os documentos STJ, sobre a violação dos direitos a não se ser discriminado,
solicitados foram juntados aos autos. à liberdade do corpo e à presunção da inocência, Rel:
JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série,
2.3.5. Em todo o caso, dá-se por corrigida a peça o que N. 21, 11 de abril de 2018, pp. 495-505, 5.3; o Acórdão
permite a continuidade da instância. 13/2018, de 7 de junho, Manuel Fonseca v. STJ, sobre
violação da garantia de presunção da inocência na sua
3. No essencial, consegue-se depreender as condutas que dimensão de in dubio pro reo e da garantia contra a
pretende impugnar e a entidade que as terá empreendido, os retroatividade da lei penal prejudicial ao arguido, Rel:

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1448 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, praticada, e por força do artigo 1º da Lei do Amparo e
N. 49, 20 de julho de 2018, pp. 1277-1285, 4; o Acórdão do artigo 50 da Lei do Tribunal Constitucional, com
20/2018, de 16 de outubro, Uchechukwu Vitus Ezeonwu suspensão de contagem aos sábados, domingos e feriados,
e Chijioke Duru v. STJ, sobre violação da garantia de conforme remissão para o Código de Processo Civil. No
presunção da inocência na sua dimensão de in dubio pro caso em análise,
reo, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial,
I Série, N. 68, 25 de outubro de 2018, pp. 1639-1648, 5; 4.3.1. Tendo sido notificado no dia 6 de fevereiro de
no Acórdão 5/2021, de 25 de janeiro, Évener de Pina v. 2023, e
STJ, sobre violação da garantia à presunção da inocência 4.3.2. Tendo o recurso dado entrada no dia 7 de março, não
e da garantia ao contraditório, Rel: JC Pina Delgado, há qualquer dúvida de que foi protocolado oportunamente.
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 25, 8 de março
de 2021, pp. 850-861, 2, e no Acórdão 1/2023, de 17 de 5. A construção adequada da peça ou o seu aperfeiçoamento
janeiro, por confirmação de sentença condenatória a pena permitem que o Tribunal Constitucional, antes de tudo,
de reclusão em situação em que não terá ficado provado consiga identificar o centro nevrálgico do escrutínio de
que soubesse que a ofendida era menor de catorze anos, por amparo – a conduta impugnada – que se constituirá no
alegada violação do direito à presunção de inocência do objeto do recurso. Podendo materializar-se tanto num
arguido, Ivan Furtado v. TRB, Rel: JC Pina Delgado, 4), ato, como numa omissão, a conduta corresponde a um
necessariamente reconduzíveis a cinco condutas passíveis comportamento de uma entidade à qual se imputa a
de apreciação em sede de amparo, vulneração de um direito, liberdade e garantia. É a isso
que se refere tanto o artigo 20 da Lei Fundamental quando
3.2.1. Já que aquelas que se referem à apreciação da remete à “tutela dos seus direitos, liberdades e garantias
prova, nomeadamente as referidas pelo recorrente nos fundamentais (…)”, como o artigo 2º da Lei do Amparo,
parágrafos 3.1.3; 3.1.4; 3.1.6 e 3.1.7 devem ser reunidas quando se refere à “prática de factos ou à omissão de
numa única conduta (Acórdão 46/2023, de 4 de abril, atos ou factos”. Isso desde que em relação aos atos, nos
Arlindo Teixeira v. STJ, Admissão Parcial de Condutas termos do artigo 2º, número 3, da Lei do Amparo e do
Impugnadas e Fixadas, Rel: JCP Pina Delgado, publicado Habeas Data, estes não assumam natureza legislativa
no Boletim Oficial, I Série, N. 44, 21 de abril de 2023, pp. ou normativa, devendo o Tribunal Constitucional recusar
1055-1065, 5.1.7), a de se saber se o tribunal de primeira qualquer impugnação que ataque diretamente norma
instância ao condenar o recorrente pela prática de um constante de dispositivo legal ou equiparado, como, de
crime de agressão sexual procedeu a uma determinação resto, tem feito ao recusar-se a admitir recursos de amparo
arbitrária da prova, no sentido de se ter ancorado em juízo que impugnam normas (Acórdão nº 35/2019, de 18 de
ilógico, contraditório ou insuscetível de ser suportado nos outubro, Alírio Barros v. TRS sobre indeferimento de recurso
elementos existentes. de fiscalização concreta da constitucionalidade por não
aplicação de norma impugnada, Rel: JC Pina Delgado,
3.2.2. Mantendo-se em análise, além desta, as demais
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publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 110, 29 de outubro


quatro. de 2019, pp. 1813-1828, 2, Acórdão nº 11/2017, de 22 de
3.3. As quais terão lesado um conjunto de direitos que, junho, Maria de Lurdes v. STJ, sobre violação do direito
na peça de aperfeiçoamento apresente de forma articulada de constituir família por não reconhecimento de união de
com cada uma dessas condutas; facto, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial,
I Série, N. 42, 21 de julho, pp. 933-950 e na Coletânea
3.4. Justificando a concessão de vários amparos que de Decisões do Tribunal Constitucional de Cabo Verde,
explicita na peça de aperfeiçoamento. Vol. III, Praia, INCV, 2018 (2017), pp. 423-477, 2.3.4.,
Acórdão 15/2017, de 26 de julho, INPS v. STJ, sobre a
4. Antes de prosseguir, cuida o Tribunal de verificar se constitucionalidade do nº 2) do Art. 3º e o Art. 2º do DL
os pressupostos gerais de admissibilidade se encontram 194/91, na interpretação que lhe foi dada pelo Presidente
preenchidos, caso seja necessário, ressaltando-se que: do STJ, no sentido de que fixa um prazo de recurso de
cinco dias, independentemente de se tratar de um litígio
4.1. Por força do artigo 20, parágrafo primeiro, da decorrente de relação de trabalho estabelecida ou de litígio
Constituição da República, e do artigo 18, alínea a) tendente à constituição de uma relação de trabalho, Rel:
da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série,
Tribunal Constitucional, é evidente que este tribunal é N. 35, 6 de junho de 2018, pp. 844-856 e na Coletânea
competente em razão da matéria, considerando que se de Decisões do Tribunal Constitucional de Cabo Verde,
imputa ao órgão judicial recorrido a violação de direito, Vol. IV, INCV, 2018 (2017), pp. 137-176, 2.2.1, Acórdão
liberdade e garantia; nº 22/2018, de 11 de outubro, Martiniano v. STJ, sobre a
4.2. O recorrente, na medida em que, nos termos do artigo violação do direito de acesso aos tribunais por decisão de
20, parágrafo primeiro, se arroga ser titular de posição deserção de recurso, Rel: JC José Pina Delgado, publicado
jurídica com essa natureza, e de, conforme a parte final no Boletim Oficial, I Série, N. 76, 22 de dezembro de 2018,
do número 1 do artigo 4º da Lei do Amparo e do Habeas pp. 1824-1835, 5. e 6., Acórdão nº 29/2019 e Acórdão nº
Data, ser pessoa direta, atual e efetivamente passível 39/2022, de 28 de outubro, Tecnicil Imobiliária e Alfredo
de ser afetada pela conduta impugnada, encontrando-se de Carvalho v. PGR, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado
privado da sua liberdade em estabelecimento penitenciário, no Boletim Oficial, I Série, N. 2, 5 de janeiro de 2023, pp.
condenado pela prática de crime, possui legitimidade 42-49, ii), estabelecendo claramente a distinção entre o
processual ativa, o mesmo ocorrendo, no polo passivo, objeto de recursos de amparo e o objeto de recursos de
com a entidade recorrida que praticou o ato ao qual se fiscalização concreta da constitucionalidade. Na medida
imputa a lesão dos direitos nos termos da orientação geral em que a aplicação de qualquer ato normativo poderá ser
(v. Acórdão nº 29/2021, de 3 de junho, António Veiga e impugnada através deste último recurso constitucional
Outros v. PGR, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no dificilmente se pode considerar o dispositivo legal que
Boletim Oficial, I Série, N. 88, 16 de setembro de 2021, exclui do objeto do recurso de amparo atos públicos como
pp. 2264-2270, c)). portador de um vício de inconstitucionalidade.

4.3. Por fim, tratando-se de recurso referente a questão 5.1. No caso concreto, o recorrente impugna cinco
suscitada em processo que corre os seus termos nos condutas:
tribunais regulado pelo artigo 5º, parágrafo primeiro, o 5.1.1. Ato praticado tanto pelo tribunal de primeira
prazo de interposição é de vinte dias contados da data de instância, como pela Relação, ao entenderem ao entenderem
notificação da decisão que se recusou a reparar a violação quanto à inexistência dos ficheiros ata/áudio da gravação

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1449

com as declaração do arguido e testemunhas usadas para 6.2.1. Neste particular, desde logo, ao imputar ao
a condenação, que eles apenas serviriam para se poder tribunal de instância a maior parte das violações, reunidas
assegurar a veracidade do que se passou efetivamente em em 5.1.3, acaba por excluí-las do escrutínio de amparo,
julgamento, consubstanciando-se estas, outrossim, nas provas posto que este permite apenas sindicar as condutas
recolhidas com base no principio da imediação, elementos que se atribui ao ato judicial recorrido, neste caso da
estes que seriam necessários e indispensáveis para permitir lavra do Egrégio TRS, conforme o pressuposto do artigo
ao arguido, concordar ou discordar de uma decisão; 3º, parágrafo primeiro, alínea b) de a violação resultar
“direta, imediata e necessariamente de ato ou omissão
5.1.2. Ato praticado pelo TRS, ao entender que a imputável ao órgão judicial”.
inexistência dos ficheiros ata/áudio da gravação com as
declarações do arguido e testemunhas usadas para a 6.2.2. Em relação ao facto de alegar não ter sido ouvido
condenação, corresponderiam a uma mera irregularidade, em audiência pelo Ministério Público antes de deduzir
afetante do julgamento ou da sentença, devendo ser acusação o que, além de parecer improvável, da leitura
invocada pelo arguido em três dias a contar da data da dos autos constata-se que pelo facto de o recorrente não
diligência para ser conhecida e sanável pelo decurso ter colocado esta questão ao órgão judicial recorrido,
desse prazo, sendo extemporâneo invocá-la na fase de decorre que este não se pronunciou a respeito. Destarte,
recurso da sentença; esta conduta não pode ser imputada ao órgão judicial
recorrido, o TRS.
5.1.3. Ato praticado pelo tribunal de primeira instância
de condenar o recorrente pela prática de um crime de 6.2.3. Portanto, só podem ser consideradas as condutas
agressão sexual com base numa determinação arbitrária atribuídas e atribuíveis ao TRS, nomeadamente de ter a)
da prova, no sentido de se ter ancorado em juízo ilógico, quanto à inexistência dos ficheiros ata/áudio da gravação
contraditório ou insuscetível de ser suportado nos com as declarações do arguido e testemunhas usadas para
elementos existentes; a condenação, alegadamente entendido que eles apenas
5.1.4. A conduta do TRS de, sem questionar o Juiz de serviriam para se poder assegurar a veracidade do que se
1ª instância, e sem que este se tenha pronunciado se passou efetivamente em julgamento, consubstanciando-
ponderou ou não o facto, entendeu considerar a conduta se estas, outrossim, nas provas recolhidas com base no
descrita na alínea anterior, como um mero lapso desse principio da imediação, elementos estes que seriam os
magistrado; necessários e indispensáveis para permitir ao arguido
concordar ou discordar de uma decisão; b) de ter considerado
5.1.5. A conduta do Ministério Publico de concluir o que a inexistência dos ficheiros ata/áudio da gravação com
inquérito e proferir o despacho de acusação sem ouvir as declarações do arguido e testemunhas usadas para a
previamente o recorrente. condenação, corresponderiam a uma mera irregularidade,
afetante do julgamento ou da sentença, devendo ser
5.2. Dando-se por preenchida essa imposição legal que invocada pelo arguido em três dias a contar da data da
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fixa o próprio objeto do recurso, caso ele seja admitido. diligência para ser conhecida e sanável pelo decurso desse
prazo, sendo extemporâneo invocá-la na fase de recurso
6. E, além disso, é determinante para se identificar os da sentença; c) de, sem questionar o Juiz de 1ª instância,
direitos potencialmente atingidos pela conduta lesiva, uma e sem que este se tenha pronunciado se ponderou ou não
etapa essencial para se verificar se a conduta em causa é o facto, ter concluído que a conduta de considerar factos
passível de ser amparada, do que depende, de uma parte, não constantes de alegação e que alegadamente não terá
de estar em causa posição jurídica dependente de direito, sido dado como provado para efeitos de ponderação e de
liberdade ou garantia ou direito que se pode beneficiar do justificação da determinação da pena, como mero lapso.
regime de proteção desta categoria de direitos, e, da outra, de,
em potência, ser ato que pode ser diretamente atribuível ao 6.2.4. Ficam, assim, as demais questões prejudicadas,
órgão judicial recorrido por este poder ter responsabilidade escusando-se o tribunal de continuar a aferir de sua
direta, imediata e necessária na sua violação, portanto de conformidade com os pressupostos do recurso de amparo.
esta poder ser-lhe imputável de alguma forma.
7. O pedido de amparo original no sentido de o
6.1. No caso concreto, o recorrente invoca vários direitos recurso ser admitido e julgado procedente o recurso e,
que, por serem garantias fundamentais, associadas à em consequência, restabelecidos os direitos violados era
liberdade sobre o corpo, e ao direito de proteção judiciária manifestamente insuficiente. Pelos motivos invocados,
são passíveis de serem amparados; cabe ao recorrente identificar claramente o remédio que
pretende obter. E fê-lo de forma adequada e, no geral,
6.1.1. Daí, dar-se por preenchida essa exigência formal de modo congruente com a Lei do Amparo e do Habeas
incontornável, seja pela sua localização sistemática, seja Data na peça de aperfeiçoamento ao pedir a reconstituição
pela sua natureza intrínseca de garantias associadas ao da ata/áudio contendo as declarações do arguido ou
direito à liberdade sobre o corpo, ou de direitos análogos alternativamente a anulação da sentença de primeira
de proteção judiciária. instância e a determinação de novo julgamento; a anulação
6.1.2. Assim, dúvidas não persistirão de que são, do acórdão recorrido; o restabelecimento de direitos de
respetivamente, garantias fundamentais em matéria sua titularidade que terão sido violados.
criminal ou direitos análogos a direitos, liberdade e
garantias, logo amparáveis. 8. Ademais, consideram-se pressupostos especiais
aplicáveis às situações em que o recurso de amparo é
6.1.3. Excluindo-se desse rol, naturalmente, a utilização colocado contra conduta do poder judicial que ela seja
de parâmetros objetivos, como os princípios constitucionais expressa e formalmente invocada no processo logo que
arrolados, e ordinários, como as regras do Código de o ofendido tenha dela recebido comunicação, que se
Processo Penal elencadas na peça. tenham esgotado as vias legais de recurso e que tenha
sido requerida reparação.
6.2. A determinação final da ocorrência de violação
imputável ao órgão judicial recorrido é feita na fase 8.1. A lei coloca, deste modo, um ónus sobre o titular
de mérito. No momento de avaliação da presença dos do direito de suscitar a questão no processo logo que o
pressupostos e requisitos de admissibilidade basta que ofendido tenha tido informação sobre o ocorrido, uma
o Tribunal avalie a possibilidade racional e abstrata de exigência que depende de o recorrente ter tomado
a conduta impugnada ser suscetível de ter sido praticada conhecimento da violação, nomeadamente através de
direta, imediata e necessariamente pela entidade recorrida. comunicações judiciais ou de consultas aos autos, e de

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1450 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

haver mecanismos processuais previstos para alegar o de Lurdes v. STJ, sobre violação do direito de constituir
que entender em sua defesa. família por não reconhecimento de união de facto, Rel:
JC Pina Delgado, 1.2.2, assentado entendimento de que
8.1.1. Em relação à maioria das condutas, dúvidas não é mister verificar se uma imputação de vulneração de
subsistem de que houve invocação quando o recorrente direito que é submetida foi precedida da colocação da
tomou conhecimento das violações, ainda que as tenha questão ao órgão judicial recorrido em moldes que este a
encaminhado ao TC diretamente; pudesse apreciar e reparar, a partir do Acórdão nº 13/2017,
de 20 de julho, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto
8.1.2. Embora, permaneça questão legítima sobre o Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 47, 8 de
cumprimento de obrigação legal de promover outras agosto de 2017, pp. 1024-1029, esta Corte Constitucional
diligências perante o órgão judicial recorrido antes de tem sustentado a imprescindibilidade de se confirmar
aqui chegar. que houve pedido de reparação, passando, já na fase de
8.2. De outra parte, dispõe o artigo 6º que “o recurso admissibilidade, a avaliar o cumprimento do disposto na
de amparo só poderá ser interposto depois de terem sido alínea c) do número 1 do artigo 3 em conjugação com o
esgotados todos os meios legais e todas as vias de recurso disposto no artigo 6. Portanto, para haver esgotamento
ordinário estabelecidas pela respetiva lei de processo”. das vias ordinárias de recurso é preciso que se prove
ter invocado perante a instância recorrida a violação
8.2.1. A fórmula utilizada vai num sentido extremamente do direito alegadamente violado em termos percetíveis,
amplo porque referindo-se a meios legais abarca mecanismo que se tenha requerido a sua reparação, que a violação
que seja idóneo assegurar a defesa de direitos e interesses não tenha sido reparada e que, no momento em que se
legítimos seja ela pré-decisório, decisório ou pós-decisório; requer o amparo ao Tribunal Constitucional, processos
ordinário, extraordinário ou especial. Do que decorre o paralelos, passíveis de garantia a tutela do direito, não
efeito evidente de que, neste caso por motivos evidentes, estejam a tramitar em qualquer outra instância (Acórdão
enquanto os mecanismos pré-decisórios de tutela através da 28/2020, de 24 de julho, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP
submissão de requerimentos vários podem ser absorvidos Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
pela necessidade de recurso ordinário decorrente do 139, 23 de dezembro de 2020, p. 2168-2172, d); Acórdão
segundo segmento da disposição, o facto de inexistirem 57/2020, de 2 de dezembro, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP
recursos ordinários disponíveis não isenta os titulares do Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série,
direito de terem de utilizar qualquer via legal decisória N. 16, 12 de fevereiro de 2021, p. 565-573, d); Acórdão
prevista na respetiva lei de processo, desde que ela seja 40/2021, de 14 de setembro, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP
hábil a produzir o efeito de proteção do direito. Isso, na Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
medida em que preservado o poder jurisdicional do tribunal 100, 15 de outubro de 2021, p. 2571-2579, d); Acórdão
recorrido em relação à questão colocada, por exemplo 45/2021, de 6 de outubro, Amadeu Oliveira v. STJ, Rel:
uma nulidade, esta possa revogar a sua própria decisão. JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série,
4 910000 000000

N. 100, 15 de outubro de 2021, p. 2604-2610, d)).


8.2.2. Na situação concreta que temos em mãos, haveria
que se verificar se o recorrente, tendo a possibilidade de Havendo, por motivos evidentes, flexibilidade para se
colocar a questão invocando o segmento do artigo 408, o fazer através de meios ordinários ou extraordinários,
parágrafo segundo, da lei de processo em causa, o Código é exigência incontornável que se assim se proceda – e,
de Processo Penal, não o fez. O preceito estabelece que talvez, sobretudo, nos casos em que a violação primária só
“será lícito ao tribunal, oficiosamente ou a requerimento, pode ser atribuída ao último tribunal na cadeia decisória
suprir nulidades, retificar erros materiais ou quaisquer – tanto nos casos em que se se lhe atribui uma violação
omissões, inexatidões ou lapsos manifestos, esclarecer por ação, como uma violação por omissão. Nesta situação
dúvidas existentes na decisão e reformá-la quanto a custas”. concreta, o que se observa é que:
Naturalmente, não se colocando questão de ter havido
erro material incidente sobre a própria decisão, a única 8.4. As três condutas que ainda se mantêm em apreciação
causa que interessará seria a da supressão de nulidades, só podiam ter sido perpetradas originariamente pelo
seja do processo, seja da decisão, seria decisivo verificar se Egrégio TRS porque foi esse órgão judicial e não o tribunal
era exigível esgotar esta via legal pós-decisória também. de comarca que considerou pioneiramente a finalidade
da gravação e os efeitos da sua inexistência, bem como
8.2.3. Por conseguinte, pode-se dizer que o recorrente foi ele que qualificou o vício referente à inexistência das
utilizou todas as vias ordinárias e legais previstas pela gravações, e que fez a determinação quanto aos efeitos da
lei de processo em causa para fazer valer os direitos de utilização de segmento de fundamentação que classificou
sua titularidade que julga terem sido violados, na medida de lapso manifesto.
em que não seria exigível atacar em sede de incidente
pós-decisório as condutas ainda em apreciação pelo 8.4.1. Por conseguinte, era exigência incontornável que
facto de isso ter o efeito de se atacar o próprio mérito da pedido de reparação dirigido ao TRS se seguisse a esse
decisão. Assim sendo, o Tribunal Constitucional dá por ato judicial na sequência da sua notificação ao recorrente.
ultrapassada a barreira do esgotamento de todas as vias Porém, tendo o mesmo recebido a notificação da decisão
legais disponíveis na lei de processo da qual emerge o a seguir à sua prolação não alega, nem se depreende dos
recurso de amparo, deixando em aberto a possibilidade autos, que tenha pedido reparação no concernente às três
de isso gerar efeito sobre o preenchimento do pressuposto condutas assinaladas.
subsequente.
8.4.2. Destarte, não parece a este Tribunal que o
8.3. Dispõe a lei que o pedido de amparo contra condutas pressuposto especial de pedido de reparação foi cumprido
do poder judicial depende de ter “sido requerida reparação”, pelo recorrente, inabilitando esta Corte Constitucional a
condição essencial para, por um lado, garantir que os conhecer a questão no mérito (Acórdão 14/2018, de 28 de
tribunais judiciais, que também são órgãos de proteção junho, Edmir de Barros e Outros v. STJ, Rel: JCP Pinto
de direitos, possam reparar eventuais lesões que tenham Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 49, de 20
ocasionado, e, do outro, evitar que o Tribunal Constitucional de julho de 2018, d); Acórdão 21/2018, de 16 de outubro,
seja inundado de súplicas de amparo que pudessem ter Edmir Semedo v. Diretor da Cadeia Central da Praia e
sido resolvidas e ultrapassadas através da intervenção dos Ministra da Justiça, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado
tribunais judiciais e garantir que quando ele intervenha todos no Boletim Oficial, I Série, N. 68, de 25 de outubro de
os argumentos já tenham sido apresentados e discutidos 2018, d); Acórdão 04/2019, de 24 de janeiro, Eduina
e a questão já esteja estabilizada e amadurecida. Sendo Ferreira v. Tribunal Judicial da Comarca do Paul, Rel:
assim, tendo o Acórdão nº 11/2017, de 22 de junho, Maria JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série,

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1451

N. 28, de 13 de março de 2019, d); Acórdão 21/2019, de Comarca do Paul, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado
27 de junho de 2019, Edgar Silva v. TRB, Rel: JCP Pinto no Boletim Oficial, I Série, N. 28, de 13 de março de
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 79, de 2019, pp. 484-490, d); Acórdão 22/2019, de 27 de junho,
22 de julho de 2019, d); Acórdão 22/2019, de 27 de junho, Elton Dias v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no
Elton Dias v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 79, de 22 de julho de 2019,
Boletim Oficial, I Série, N. 79, de 22 de julho de 2019, d); pp. 1227-1232, d); Acórdão 40/2019, de 11 de outubro,
Acórdão 25/2019, de 1 de agosto, Eder Yanick v. STJ, Rel: António Veiga e Outros v. PGR, Rel: JCP Pinto Semedo,
JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 6, de 14 de
N. 100, de 26 de setembro de 2019, d); Acórdão 40/2019, janeiro de 2020, pp. 121-131, d); Acórdão 44/2019, de
de 11 de outubro, António Veiga e Outros v. PGR, Rel: 20 de dezembro, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto
JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 6, de
N. 6, de 14 de janeiro de 2020, d); Acórdão 44/2019, 14 de janeiro de 2020, pp. 151-155, d); Acórdão 26/2020,
de 20 de dezembro, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP de 09 de julho, Vanda de Oliveira v. TJCSV, Rel: JCP
Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
6, de 14 de janeiro de 2020, d); Acórdão 47/2019, de 31 139, de 23 de dezembro de 2020, pp. 2152-2157; Acórdão
de dezembro, Admilson Tavares e Jeremias Montrond n.º 28/2020, de 24 de julho, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP
v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
Oficial, I Série, N. 14, de 4 de fevereiro de 2020, d); 139, de 23 de dezembro de 2020, pp. 2168-2172, d); Acórdão
Acórdão 04/2020, de 14 de fevereiro, Arlindo Teixeira 57/2020, de 27 de dezembro, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP
v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
Oficial, I Série, N. 25, de 3 de março de 2020, d); Acórdão 16, de 12 de fevereiro de 2021, pp. 565-573, d); Acórdão
07/2020, de 6 de março, Sanou Moussa v. STJ, Rel: JCP 29/2021, de 03 de junho, António Veiga e Outros v. PGR,
Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim oficial N. 88,
86, de 23 de julho de 2020, d); Acórdão 26/2022, de 24 de 16 de setembro, pp. 2264-2270, d); Acórdão 34/2021,
de junho, Anilton Vieira e Leocádio da Veiga v. STJ, Rel: de 11 de junho de 2021, Anilson Silva v. CSMJ, Rel: JCP
JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, Pinto Semedo, publicado no Boletim oficial N. 88, de 16
N. 94, de 28 de setembro de 2022, d)). de setembro, pp. 2299-2305, d); Acórdão 40/2021, de 14
de setembro, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo,
9. Como se tem considerado em outras ocasiões, a publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 100, de 15 de
ausência de uma das condições de recorribilidade é outubro de 2021, pp. 2571-2579, III; Acórdão 41/2021, de
suficiente para conduzir à inadmissão do recurso, ficando 14 de setembro, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo,
sem efeito útil qualquer inquérito sobre a presença ou publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 100, de 15 de
não das causas especiais de inadmissão previstas pelo outubro de 2021, pp. 2580-2590, III; Acórdão 45/2021,
artigo 16, alínea e) e f), da Lei do Amparo e do Habeas de 06 de 22 outubro, Amadeu Oliveira v. STJ, Rel: JCP
4 910000 000000

Data, nomeadamente as de manifestamente não estar Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
em causa violação de direitos, liberdades e garantias 100, de 15 de outubro de 2021, pp. 2604-2610, III, Acórdão
ou de o Tribunal já ter rejeitado, por decisão transitada 51/2021, de 25 novembro, Pedro Veiga v. STJ, Rel: JCP
em julgado, recurso com objeto substancialmente igual. Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 5,
10. Através da peça de aperfeiçoamento o recorrente de 17 de janeiro de 2022, pp. 95-99, III, Acórdão 56/2021,
parece pedir que lhe seja concedida medida provisória de de 06 de dezembro, Ognochukwo Barros v. STJ, Rel: JCP
restituição à liberdade, sem que antes o tenha feito na Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
peça de interposição do recurso de amparo. 5, de 17 de janeiro de 2022, pp. 121-126, III.; Acórdão
12/2022, de 8 de março, António Monteiro v. STJ, Rel:
10.1. Porém, se, do ponto de vista da tempestividade JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série,
nenhum problema se colocaria, posto que a lei não parece N. 30, de 5 de abril de 2022, pp. 909-916, III.; Acórdão
estabelecer limites temporais anteriores à apreciação da 18/2022, de 19 de abril, Ivan Jorge Fernandes v. STJ,
admissibilidade, para se protocolar pedido com esse teor, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I
Série, N. 65, de 1 de julho de 2022, pp. 1590-1596, III; e
10.2. Já é muito discutível que a forma como o recorrente Acórdão 39/2022, de 28 de outubro, Tecnicil Imobiliária
o fez é a mais correta, limitando-se, sem mais, a pedir a v. PGR, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim
decretação de medida provisória de soltura imediata sem Oficial, I Série, N. 2, de 5 de janeiro de 2023, pp. 42-49, III.
sequer se dar ao trabalho de alegar e provar a existência de
prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação, a liquidez do 10.5. Do que decorre que a não-admissão do recurso de
direito invocado e muito menos tentar afastar a existência amparo, prejudica a avaliação do pedido de decretação de
dos efeitos de perturbação de interesses gerais, da ordem medida provisória, o qual, em tais casos, deve ser, sem
ou da tranquilidade públicas ou de direitos de terceiros, mais, liminarmente rejeitado.
nos termos do artigo 14, alínea a), da LAHD.
III. Decisão
10.3. Contudo, não é necessário discutir esta questão
porque, a este respeito, o Tribunal já havia fixado orientação Pelo exposto, os juízes do Tribunal Constitucional
no sentido de que existe uma relação indissociável e reunidos em plenário decidem não admitir o recurso
instrumental entre o amparo destinado a remediar de amparo, ordenando o seu arquivamento, e negar a
situações de violação de direitos, liberdades e garantias e concessão de medida provisória.
as medidas provisórias requeridas no âmbito dos mesmos Registe, notifique e publique.
autos (Acórdão 08/2019, de 14 de fevereiro, João Baptista
Delgado v. TJCP, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Praia, 19 de junho de 2023
Boletim Oficial, I Série, N. 29, de 14 de março de 2019,
pp. 509-511, II.). José Pina Delgado (Relator)
10.4. A mesma orientação foi adotada, sem qualquer Aristides R. Lima
desvio, pelos seguintes arestos: Acórdão 21/2018, de 16
de outubro, Cleidir Semedo v. Diretor da Cadeia Central João Pinto Semedo
da Praia e Ministra da Justiça, Rel: JCP Pinto Semedo, Está conforme
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 68, de 25 de
outubro de 2018, pp. 1648-1655; Acórdão 04/2019, de Secretaria Judicial do Tribunal Constitucional, aos 19
24 de janeiro, Eduina Ferreira v. Tribunal Judicial da de junho de 2023. — O Secretário, João Borges.

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1452 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

Cópia: 1.3. Em jeito de conclusões,


Do acórdão proferido nos autos de Recurso de Amparo 1.3.1. Reitera que foram violados vários dos seus direitos,
Constitucional n.º 27/2022, em que é recorrente António nomeadamente “o direito de acesso à justiça, direito a um
das Neves Furtado Tavares e entidade recorrida o processo justo e equitativo; direito a uma defesa ampla,
Supremo Tribunal de Justiça. direito de ser tratado em igualdade de tratamento com
os demais nacionais cabo-verdianos, o direito ao recurso
Acórdão n.º 104/2023 e o direito às garantias constitucionais de defesa nos
processos administrativo e criminal”, conforme formula
(Autos de Amparo 27/2022, António das Neves Furtado textualmente.
Tavares v. STJ, Inadmissão por ausência de pedido de
reparação) 1.3.2. Diz que por ser o acórdão ilegal por mor de violação
de normas ordinárias e constitucionais a decisão não
I. Relatório poderia ser mantida e não estariam reunidas as condições
para se executar essa sentença estrangeira.
1. O Senhor António das Neves Furtado Tavares, não se
conformando com o Acórdão STJ 68/2022, que procedeu 1.4. Pede que o recurso seja:
a revisão e confirmação de sentença estrangeira pede
amparo a este Tribunal, aduzindo para tanto a seguinte 1.4.1. Admitido;
argumentação: 1.4.2. Julgado procedente e consequentemente declarado
nulo o Acórdão 68/2022 do STJ com todas as consequências
1.1. Quanto à admissibilidade que: legais e constitucionais.
1.1.1. Suscitou a questão que traz ao TC no Processo 2. Cumprindo o estabelecido no artigo 12 da Lei n.º
Especial de Revisão de Sentença Estrangeira Nº 96/2021; 109/IV/94 de 24 de outubro, foram os autos com vista
ao Ministério Público para emissão de parecer sobre a
1.1.2. Esgotou todas as vias de recurso ordinário e terá admissibilidade do recurso, tendo-o feito o Exmo. Sr.
arguido nulidade do douto Acórdão do STJ; Procurador-Geral Adjunto, o qual articulou os seguintes
argumentos:
1.1.3. Identifica a natureza do seu recurso como sendo
de amparo e diz-se interessado no recurso. 2.1. Os direitos invocados seriam amparáveis, o recorrente
estaria provido de legitimidade, os meios ordinários de
1.2. Quanto aos atos, factos ou omissões que alegadamente recurso esgotados e as alegadas violações teriam sido
lesaram os seus direitos, invocadas logo que o ofendido teve delas conhecimento,
tendo este, no seu entender, requerido reparação.
4 910000 000000

1.2.1. Constrói a evolução processual a partir do


momento em que o Estado Português manifestou vontade 2.2. Porém, dúvidas se suscitariam quanto à tempestividade
na extradição do recorrente ou, alternativamente, na do recurso pelo seguinte:
impossibilidade disso poder ser concedido, inquiriu sobre
a viabilidade de “uma delegação de execução de sentença, 2.2.1. Apesar de constar dos autos um e-mail enviado
exarada contra o visado, em março do ano 2013”; tendo para a caixa de correio do Tribunal Constitucional datado
essa diligência merecido resposta positiva por parte do de 26 de agosto, na prática a data válida seria o dia 3
Estado Cabo-verdiano”, através da Senhora Ministra de agosto, posto ter sido esta a data da entrada da peça
da Justiça. na secretaria;

1.2.2. Na medida em que as sentenças estrangeiras 2.2.2. O regime jurídico aplicável à submissão de peças
só teriam eficácia depois de revistas e confirmadas para processuais, ainda que permissiva, sujeita-a a certas
se verificar se deveria ser “concedido o exequa[...]tur, exigências destinadas a garantir a autenticidade do
isto é, se a sentença est[aria] em condições de poder ser documento que, neste caso, não teriam sido respeitadas;
executada no território nacional”, a própria autoridade 2.2.3. Como o prazo de interposição do recurso de
governamental interveniente deveria ter verificado se a amparo é de vinte dias e seria contínuo, considerando que
ordem jurídica portuguesa asseguraria garantias de defesa o recorrente diz ter sido notificado no dia 11 de julho de
similares às previstas na ordem jurídica cabo-verdiana, 2022, tinha até 31 de julho para dar entrada ao recurso.
daí a desconformidade do despacho por ela exarado com “[T]endo, entretanto, a presente ação dado entrada na
o artigo 27 do CPP de Cabo Verde “conjugado com os secretaria do Tribunal Constitucional no dia 03 de agosto
art.38º nº 4, art.º35 nº 6 e 7, art.17 n.º 3, ambos [seria [de] 2022, portanto, aquém [seria além?]do prazo para o
todos???] da CRCV”. efeito, mostra[r-se-ia] o presente recurso intempestivo”.
1.2.3. Nessa conformidade entende que o “Acórdão n° 2.3. Destarte, oferece parecer no sentido de que o
68/2022, recorrido, ao confirmar a sentença estrangeira presente “recurso de amparo constitucional interposto
e permitir a sua execução, contra o requerido praticou não cumpre com os requisitos exigidos na Lei de Amparo,
um acto[…] [e adotou?] uma decisão judicial violadores devendo ser liminarmente rejeitado, ao abrigo do disposto
dos direitos, liberdades e garantias do arguido” ao não no artigo 16.° da mesma lei”.
salvaguardar o “direito de acesso à justiça, o direito a um
julgamento justo e equitativo e o direito ao recurso” e ao 3. Marcada sessão de julgamento para o dia 11 de maio,
não assegurar garantias de defesa similares às previstas nessa data se realizou, com a participação dos Venerandos
na ordem jurídica cabo-verdiana, conforme disposto no Juízes-Conselheiros e do Senhor Secretário do TC, dela
artigo 38, parágrafo 4, da CRCV. decorrendo a decisão de aperfeiçoamento justificada
pela alegação do recorrente no sentido de ter arguido a
1.2.4. Faz digressão legislativa e hermenêutica sobre nulidade do acórdão impugnado sem, no entanto, carrear
a aplicação da lei no tempo e a respeito da questão da para os autos a peça em que o teria feito ou decisão que
dupla-conforme, contrastando a sua interpretação com sobre ela tenha incidido.
alegadas pretensões processuais do MP acolhidas pelo
acórdão impugnado, para concluir que a interpretação 3.1. Neste sentido, o Tribunal Constitucional, através
que foi vertida para o acórdão restringiu os seus direitos dessa decisão, concedeu-lhe oportunidade de trazer para
fundamentais. os autos os documentos supramencionados.

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1453

3.2. Lavrada no Acórdão 79/2023, de 12 de maio, António v. TRB, sobre violação do direito de acesso à justiça e à
das Neves Furtado Tavares v. STJ, Aperfeiçoamento tutela jurisdicional efetiva por não-admissão de recurso
por Não-Junção de Documentos Essenciais à Aferição designado pelo recorrente amparo ordinário por tribunal
de Admissibilidade do Recurso, Rel: JCP Pina Delgado, judicial, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 59, 25 de maio Oficial, I Série, N. 2, 5 de janeiro de 2023, p. 36-42, 2.1)
de 2023, pp. 1337-1340, este foi notificado ao recorrente, e o direito à propriedade privada (Acórdão nº 30/2019,
através do seu mandatário, no dia 16 de maio de 2023. de 30 de agosto, Atlantic Global Asset Management v.
PGR, sobre violação do direito à propriedade privada, da
4. No dia 18 de maio de 2023, o recorrente protocolou garantia de juiz, da iniciativa privada e dos direitos à
uma peça de aperfeiçoamento, através da qual: defesa, ao contraditório e de acesso às provas da acusação,
Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I
4.1. Informa que a referência que fez ao incidente de Série, nº 110, 29 de outubro de 2019, pp. 1766-1789),
arguição de nulidade terá decorrido de um mero “lapso e ou para situações que envolvam camadas de proteção
gralha”, pedindo a compreensão do Tribunal Constitucional; essenciais que remetam a certos direitos, liberdades e
garantias como a vida ou a integridade pessoal. Porém,
4.2. E propõe tese de que com a prolação do Acórdão STJ fora desses casos, com a tendencial não-inclusão dos
68/2022, já havia esgotado as vias ordinárias de recurso; direitos económicos, sociais e culturais e dos direitos
de grupos vulneráveis que não portem caraterísticas de
4.3. Apresenta uma versão adaptada da sua peça de direitos, liberdades e garantias, e também de princípios
recurso, destacando a negrito certos trechos. constitucionais objetivos, como, em diversos momentos,
este Tribunal já decidiu (Acórdão nº 11/2017, de 22 de
5. A sessão marcada para apreciar o aperfeiçoamento junho, Maria de Lurdes v. STJ, sobre violação do direito
e a admissibilidade foi agendada para o dia 6 de junho, de constituir família por não reconhecimento de união de
tendo o julgamento in camera ocorrido nessa data, dela facto, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial,
decorrendo a decisão exposta e fundamentada a seguir. I Série, n. 42, 21 de julho, pp. 933-950 e na Coletânea de
Decisões do Tribunal Constitucional de Cabo Verde, Vol.
II. Fundamentação III, Praia, INCV, 2018 (2017), pp. 423-477, 20.1; Acórdão
nº 29/2017, de 5 de dezembro, Ovídio de Pina v. STJ,
1. Do ponto de vista constitucional, o recurso de amparo Rel: JC Aristides R. Lima, publicado no Boletim Oficial,
é concebido como um direito fundamental de “requerer ao I Série, n. 6, 1 de fevereiro de 2018, pp. 75-93, 20.1;
Tribunal (…) a tutela de (…) direitos, liberdade e garantias, Acórdão nº 06/2018, de 22 de março, Adilson Danielson
constitucionalmente reconhecidos”, e também como um v. STJ, Rel: JC Pina Delgado, Boletim Oficial, I Série,
meio “de tutela de direitos, liberdades e garantias”, nº 21, de 11 de abril de 2018, pp. 495-505, 2; Acórdão nº
consagrando-se a sua dupla-natureza subjetiva e objetiva. 27/2018, de 20 de dezembro, Judy Ike Hills v. STJ, sobre
4 910000 000000

violação de garantia de inviolabilidade de domicílio, de


1.1. Direito este que é delimitado materialmente, na medida correspondência e de telecomunicações e de garantia da
em que destinado à proteção direta de apenas uma das presunção da inocência na sua dimensão de in dubio pro
três categorias de direitos fundamentais previstas pela Lei reo, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial,
Fundamental. Seriam os denominados direitos, liberdades I Série, N. 11, 31 de janeiro de 2019, pp. 146-178, 2.1.1).
e garantia, tanto os individuais, como os de participação Por conseguinte, trata-se de um recurso desenhado
política e de exercício da cidadania e, arguivelmente, os especialmente para proteger uma categoria especial de
dos trabalhadores. É verdade que se estende para recobrir direitos que goza de regime de tutela mais intenso: os
os direitos análogos a direitos liberdades e garantias ou direitos, liberdades e garantias.
que portem caraterísticas específicas com dimensões
individuais e civis como, respetivamente, os direitos de 1.2. E que fica processualmente condicionado ao
proteção judiciária (Acórdão nº 6/2017, de 21 de abril, esgotamento das vias ordinárias de recurso, opção da
Maria de Lurdes v. STJ, sobre pedido de desistência, Rel: qual resulta um figurino constitucional que produz
JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, diversos efeitos.
N. 42, 21 de julho de 2017, pp. 898-903, 5; Acórdão nº
9/2017, de 8 de junho, Martiniano Oliveira v. STJ, Rel: 1.2.1. Desde logo, a conceção de que todos os tribunais
JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, cabo-verdianos são tribunais de proteção de direitos, nos
N. 42, 21 de julho de 2017, pp. 925-929, e); Acórdão nº termos da sua respetiva jurisdição, cabendo efetivar essa
13/2017, de 20 de julho, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: tutela através dos processos ordinários desenhados pela lei,
JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, dos processos especiais previstos pela Constituição como
N. 47, 8 de agosto de 2017, pp. 1024-1029, e); Acórdão o Habeas Corpus ou o recurso contencioso administrativo,
nº 24/2017, de 9 de novembro, Arlindo Teixeira v. STJ, ou daqueles que venham a ser definidos pelo legislador,
Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I nos termos do artigo 22, parágrafo sexto, segundo o qual
Série, N. 78, 22 de dezembro de 2017, pp. 1692-1698, e); “[p]ara a defesa dos direitos, liberdades e garantias
Acórdão 12/2018, de 7 de junho, CIMA v. STJ, Rel: JC individuais, a lei estabelece procedimentos judiciais céleres
Aristides R. Lima, Decisão de admissibilidade, publicado e prioritários que assegurem a tutela efetiva e em tempo
no Boletim Oficial, I Série, N. 49, 20 de julho de 2018, útil contra ameaças ou violações desses mesmos direitos,
b; Acórdão nº 16/2018, de 28 de julho, Luigi Zirpoli v. liberdades e garantias” (Acórdão nº 36/2022, de 12 de
TJCP, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim agosto, Ramiro Oliveira Rodrigues v. TRB, sobre violação
Oficial, I Série, N. 49, 20 de julho de 2018, pp. 1298-1302, do direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva
e); Acórdão nº 17/2018, de 26 de julho, Amândio Vicente por não-admissão de recurso designado pelo recorrente
v. TRS, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim de amparo ordinário por tribunal judicial, Rel: JC Pina
Oficial, I Série, N. 51, 3 de agosto de 2018, pp. 1328-1333, Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 2, 5 de
e); Acórdão nº 22/2018, de 11 de outubro, Martiniano v. janeiro de 2023, p. 36-42, 5.1.3).
STJ, sobre o direito de acesso aos tribunais, Rel: JC José
Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 1.2.2. E, em consequência, a subsidiariedade do recurso
76, 22 de dezembro de 2018, pp. 1824-1835, 2; Acórdão nº de amparo, recurso constitucional de natureza especial,
3/2019, de 24 de janeiro, Ramiro Rodrigues v. TRB, Rel: ao qual só se pode lançar mão, depois de se explorar os
JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, mecanismos que correm perante os tribunais ordinários
N. 28, 13 de março de 2019, pp. 480-486, e);; Acórdão para que estes possam conhecer e garantir a tutela desses
nº 36/2022, de 12 de agosto, Ramiro Oliveira Rodrigues mesmos direitos.

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1454 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

1.3. E caraterizado pelo seu informalismo, urgência 2.3.2. Do outro, pelo facto de se impor um determinado
e sumariedade, conforme decorre da alínea b) do artigo conteúdo à mesma, na medida em que, do ponto de vista
20, segundo a qual ele “pode ser requerido em simples do número 1 do artigo 8º, primeiro, remete-se, através das
petição, tem caráter urgente e o seu processamento deve alíneas a) e b); para a identificação das condutas lesivas
ser baseado no princípio da sumariedade”. (“ato, facto ou a omissão”) e para o órgão do poder público
ao qual podem ser imputadas (“a entidade, o funcionário
1.4. Por conseguinte, está-se perante um direito ou o agente autor do ato ou da omissão”); segundo, por
fundamental e um recurso constitucional desenhado meio da alínea c), aos direitos, liberdades garantias
especialmente para a proteção de direitos, liberdades e vulnerados por aquelas (“indicar com clareza os direitos,
garantias, que pode ser utilizado subsidiariamente quando liberdades e garantias fundamentais”) e às disposições
os meios ordinários de tutela de direitos que correm os onde estariam alojados ou os princípios de onde podem
seus trâmites perante os tribunais judiciais ou outros, ser inferidos (“com a expressa menção das normas ou
a existirem, falham. Tais caraterísticas impõem que a princípios-constitucionais que entendem terem sido
própria lei de processo constitucional que desenvolve violados”); terceiro, nos termos do número 2 da mesma
os procedimentos atinentes ao recurso de amparo seja
interpretada como uma lei restritiva de direito cujo figurino disposição, à explicitação do amparo que se pretende para
básico se deve manter dentro dos confins dos números 4 e se remediar a eventual lesão (“a petição terminará com
5 do artigo 17 da Constituição, ainda que parte do regime o pedido de amparo constitucional no qual se indicará o
possa ser legitimamente fixado pelo legislador em razão amparo que o recorrente entende dever ser-lhe concedido
da remissão à lei (“nos termos da lei”), desde que não se para preservar ou restabelecer os direitos, liberdades e
atinja de modo ilegítimo as caraterísticas essenciais do garantias fundamentais violados”). A argamassa que ligaria
instituto impostas pelo próprio dispositivo constitucional esses três elementos decorreria dos fundamentos de facto
(“e com observância [obrigatória, diga-se] do disposto nas e de direito que justificam a petição, conforme também
alíneas seguintes (…)”. se impõe apresentar, conforme o disposto nas alíneas d)
e e) do parágrafo primeiro da primeira disposição.
2. As exigências da peça de recurso de amparo são as
consagradas nos artigos 7º e 8º da Lei do Amparo e do 2.3.3. A regra é que deve haver do ponto de vista da
Habeas Data, os quais impõem, respetivamente, que: articulação da petição de amparo o estabelecimento de
uma ligação lógica entre cada conduta impugnada, as
2.1. A petição seja: posições jurídicas decorrentes do(s) direito(s) que ela
vulnera e o amparo adequado para a remediar através da
2.1.1. Interposta através de simples requerimento, fundamentação. O que se verifica é que na maior parte dos
com indicação expressa de que o recurso tem a natureza casos, isso é muito deficientemente articulado, lançando-se
de amparo; para a peça, sem grande precisão e racionalização, uma
pluralidade de condutas a que globalmente se imputam
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2.1.2. Devidamente fundamentada; e


e violações de um conjunto diversificado de direitos e
2.1.3. Entregue na Secretaria do Tribunal Constitucional. remetendo-se para amparos genéricos ou impossíveis.
O Tribunal Constitucional desde o Acórdão nº 10/2017,
2.2. Quanto ao que a lei designa de “fundamentação de 8 de junho, Adilson Danielson v. STJ, Rel: JCP Pinto
do recurso”, exige-se que o recorrente, através da peça, Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 42, 21 de
julho de 2017, pp. 929-933, b), tem tolerando a interposição
2.2.1. Identifique a entidade, o funcionário ou o agente de vários amparos que não cumprem essas exigências
autor do ato ou da omissão, bem como os interessados a qualitativas, considerado que a disposição deve ser lida
que o provimento do recurso possa diretamente beneficiar sempre de forma compatível ao direito constitucional ao
ou prejudicar, havendo-os; amparo, no sentido de que “mais importante que o rigor
2.2.2. Indique com precisão “o ato, facto ou a omissão” formal é a inteligibilidade do que se expõe e se requer”.
que, na sua opinião, violou os seus direitos amparáveis; Mas, a duras penas, considerando a grande dificuldade
que se tem para se compreender o que se impugna, o
2.2.3. Indique com clareza quais deles terão sido que se pede e os fundamentos que suportam as petições.
vulnerados, “com a expressa menção das normas ou A Corte Constitucional continuará – transitoriamente
princípios jurídico-constitucionais que entende terem – aberta a privilegiar as admissibilidades, suprindo ele
sido violados”; próprio eventuais deficiências, mas, depois de vários anos
de prática do amparo em Cabo Verde, é preciso entrar
2.2.4. Exponha resumidamente as razões de facto que numa nova fase mais exigente, sustentada numa melhor
fundamentam o pedido, bem como “formul[e] conclusões, qualificação.
nas quais resumirá, por artigos, os fundamentos de facto
e de direito que justificam a petição”; 2.3.4. Na situação vertente, pode-se dizer que, no
geral, o recorrente além de ter apresentado a sua peça
2.2.5. Esta deverá “terminar com o pedido de amparo na secretaria deste Tribunal, indicando expressamente
constitucional no qual se indicará o amparo que o recorrente que se trata de um recurso de amparo, de incluir uma
entende dever ser-lhe concedido para preservar ou exposição das razões de facto que a fundamentam e de
restabelecer os direitos, liberdades ou garantias violados”, integrar um segmento conclusivo resumindo por artigos
devendo vir acompanhada dos “documentos que julgar os fundamentos de facto e de direito que suportam os seus
pertinentes e necessários para a procedência do pedido”. pedidos. Ainda que com alguma repetição desnecessária,
2.3. O objeto dessas disposições é o de determinar o a petição corresponde às exigências mínimas previstas
modo de interposição e a estrutura da peça processual pela lei, permitindo a esta Corte apurar as suas intenções
que, de forma célere e simplificada, permita ao Tribunal e as pretensões que pretende valer em juízo.
Constitucional identificar os elementos constitutivos da 2.3.5. O problema que se tinha detetado deve ser dado
súplica, para que possa, de forma rápida, decidir sobre a por ultrapassado, considerando que, com o esclarecimento
sua admissibilidade, sobre eventuais medidas provisórias
aplicáveis e, subsequentemente, sobre o seu mérito. prestado, mostra-se a instrução do recurso completa. Na
exata medida em que não se terá promovido qualquer
2.3.1. De um lado, através da facilitação do acesso a incidente de arguição de nulidade tendente a pedir
esses elementos que decorreriam do modo de organização reparação dos direitos, não há nenhuma peça ou decisão
da peça e da entrega direta no Tribunal Constitucional; a apresentar.

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1455

2.3.6. Nesses precisos termos dá-se por corrigida a peça, praticou o ato ao qual se imputa a lesão dos direitos nos
permitindo que este Tribunal prossiga com a apreciação termos da orientação geral (v. Acórdão nº 29/2021, de 3
de admissibilidade do recurso de amparo. de junho, António Veiga e Outros v. PGR, Rel: JCP Pinto
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 88, 16
2.3.7. Mais especificamente, dispondo a Constituição de setembro de 2021, pp. 2264-2270, c)).
que a tramitação do amparo deve ser baseada no princípio
da celeridade, as condições para tanto devem começar a 4.3. Por fim, tratando-se de recurso referente a questão
ser criadas pelos próprios jurisdicionados apresentando suscitada em processo que corre os seus termos nos
devidamente as suas peças, calibrando a extensão da tribunais regulado pelo artigo 5º, parágrafo primeiro, o
sua argumentação, precisando os elementos nucleares do prazo de interposição é de vinte dias contados da data de
recurso em termos de identificação de conduta atribuível notificação da decisão que se recusou a reparar a violação
a poder público, indicação dos parâmetros de escrutínio praticada, e por força do artigo 1º da Lei do Amparo e do
e definição do amparo pretendido, a tríade que compõe artigo 50 da Lei do Tribunal Constitucional, com suspensão
a estrutura vital do amparo. Sendo certo que em relação de contagem aos sábados, domingos e feriados, conforme
aos derradeiros, a legislação de processo constitucional remissão para o Código de Processo Civil.
aplicável – neste caso, o artigo 24, parágrafo segundo,
da Lei do Amparo e do Habeas Data – permite a esta 4.3.1. No caso em análise, o recorrente impugna o
Corte suprir deficiências de indicação de parâmetros e Acórdão STJ 68/2022, datado de 8 de julho de 2022;
amparos, além de ser um risco que, desnecessariamente,
o recorrente não deve assumir, posto que se trata de ato 4.3.2. Dos autos do processo principal não consta a data
discricionário do Tribunal (note-se, num caso e no outro, de notificação do acórdão recorrido, mas considerando que o
a utilização da expressão “pode”) – que utilizará quando recurso foi remetido para o correio eletrónico do TC no dia
entender justificado e conveniente – isso, a) consome 26 de julho do mesmo ano, problemas de tempestividade
sempre muito mais tempo; b) desvia a atenção individual não se colocam.
dos juízes de outros aspetos da aferição de admissibilidade;
c) aumenta a carga de esforço do Coletivo em arbitrar ele 5. A construção adequada da peça ou o seu aperfeiçoamento
próprio parâmetros e amparos. E, d), no mínimo, pode permitem que o Tribunal Constitucional, antes de tudo,
resultar no adiamento da apreciação do pedido de amparo, consiga identificar o centro nevrálgico do escrutínio de
se não na sua inadmissão. amparo – a conduta impugnada – que se constituirá no
objeto do recurso. Podendo materializar-se tanto num
3. Feitas estas considerações, pode-se, no limite, ato, como numa omissão, a conduta corresponde a um
considerar que o Tribunal consegue depreender a conduta comportamento de uma entidade à qual se imputa a
que o recorrente pretende impugnar e a entidade que as vulneração de um direito, liberdade e garantia. É a isso
terá empreendido, os direitos que entende terem sido que se refere tanto o artigo 20 da Lei Fundamental quando
violados e, genericamente, intuir o amparo último que
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remete à “tutela dos seus direitos, liberdades e garantias


almeja obter, aspetos que serão avaliados adiante, se for fundamentais (…)”, como o artigo 2º da Lei do Amparo,
necessário. Isso na medida em que identifica: quando se refere à “prática de factos ou à omissão de
3.1. A conduta consistente no facto de o órgão judicial atos ou factos”. Isso desde que em relação aos atos, nos
recorrido ter confirmado sentença condenatória imposta termos do artigo 2º, número 3, da Lei do Amparo e do
por tribunal estrangeiro sem se assegurar que tenha Habeas Data, estes não assumam natureza legislativa
gozado de garantias similares às previstas na ordem ou normativa, devendo o Tribunal Constitucional recusar
jurídica cabo-verdiana, a qual, qualquer impugnação que ataque diretamente norma
constante de dispositivo legal ou equiparado, como, de
3.2. Violaria os direitos de acesso à justiça, a um processo resto, tem feito ao recusar-se a admitir recursos de amparo
justo e equitativo; à uma defesa ampla, a ser tratado que impugnam normas (Acórdão nº 35/2019, de 18 de
em igualdade de tratamento com os demais nacionais outubro, Alírio Barros v. TRS sobre indeferimento de recurso
cabo-verdianos, ao recurso e um direito às garantias de fiscalização concreta da constitucionalidade por não
constitucionais de defesa nos processos administrativo aplicação de norma impugnada, Rel: JC Pina Delgado,
e criminal, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 110, 29 de outubro
de 2019, pp. 1813-1828, 2., Acórdão nº 11/2017, de 22 de
3.3. E justificaria a concessão de amparo conducente junho, Maria de Lurdes v. STJ, sobre violação do direito
à determinação da violação e à consequente anulação do de constituir família por não reconhecimento de união de
acórdão recorrido. facto, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial,
I Série, N. 42, 21 de julho, pp. 933-950 e na Coletânea
4. Antes de prosseguir, cuida o Tribunal de verificar se de Decisões do Tribunal Constitucional de Cabo Verde,
os pressupostos gerais de admissibilidade se encontram Vol. III, Praia, INCV, 2018 (2017), pp. 423-477, 2.3.4,
preenchidos, ressaltando-se que: Acórdão 15/2017, de 26 de julho, INPS v. STJ, sobre a
constitucionalidade do nº 2) do Art. 3º e o Art. 2º do DL
4.1. Por força do artigo 20, parágrafo primeiro, da 194/91, na interpretação que lhe foi dada pelo Presidente
Constituição da República, e do artigo 18, alínea a), do STJ, no sentido de que fixa um prazo de recurso de
da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do cinco dias, independentemente de se tratar de um litígio
Tribunal Constitucional, é evidente que este tribunal é decorrente de relação de trabalho estabelecida ou de litígio
competente em razão da matéria, considerando que se tendente à constituição de uma relação de trabalho, Rel:
imputa ao órgão judicial recorrido a violação de direito, JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série,
liberdade e garantia; N. 35, 6 de junho de 2018, pp. 844-856 e na Coletânea
de Decisões do Tribunal Constitucional de Cabo Verde,
4.2. O recorrente, na medida em que, nos termos do artigo Vol. IV, INCV, 2018 (2017), pp. 137-176, 2.2.1, Acórdão
20, parágrafo primeiro, se arroga ser titular de posição nº 22/2018, de 11 de outubro, Martiniano v. STJ, sobre a
jurídica com essa natureza, e de, conforme a parte final violação do direito de acesso aos tribunais por decisão de
do número 1 do artigo 4º da Lei do Amparo e do Habeas deserção de recurso, Rel: JC José Pina Delgado, publicado
Data, ser pessoa direta, atual e efetivamente passível de no Boletim Oficial, I Série, N. 76, 22 de dezembro de 2018,
ser afetada pela conduta impugnada, já que teve sentença pp. 1824-1835, 5. e 6., Acórdão nº 29/2019 e Acórdão nº
condenatória decretada contra si por tribunal estrangeiro 39/2022, de 28 de outubro, Tecnicil Imobiliária e Alfredo
confirmada, possui legitimidade processual ativa, o mesmo de Carvalho v. PGR, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado
ocorrendo, no polo passivo, com a entidade recorrida que no Boletim Oficial, I Série, N. 2, 5 de janeiro de 2023, pp.

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1456 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

42-49, ii), estabelecendo claramente a distinção entre o internacional em matéria penal, condição de um combate
objeto de recursos de amparo e o objeto de recursos de mais eficaz à criminalidade transnacional, especialmente
fiscalização concreta da constitucionalidade. Na medida a organizada, a sua razão de ser é cobrir as situações em
em que a aplicação de qualquer ato normativo poderá ser que se manteve a vedação da extradição de nacionais
impugnada através deste último recurso constitucional nas situações que não se enquadrarem nas exceções
dificilmente se pode considerar o dispositivo legal que inseridas pelos números dois e três do artigo 38 da Lei
exclui do objeto do recurso de amparo atos públicos como Fundamental. Proporcionando à República de Cabo Verde
portador de um vício de inconstitucionalidade. a possibilidade de cooperar com outros Estados para evitar
que tais situações se mantenham cobertas por um manto
5.1. No caso concreto, na medida em que identifica como de impunidade, ao mesmo tempo que tenta preservar a
conduta o facto de o órgão judicial recorrido ter confirmado ordem pública interna, exigindo uma correspondência
sentença condenatória imposta por tribunal estrangeiro, em termos de devido processo e garantias básicas com
alegadamente sem se assegurar que o arguido tenha o ordenamento jurídico das entidades requerentes no
gozado de garantias similares às previstas na ordem quadro dos particularismos próprios de cada um deles.
jurídica cabo-verdiana, Como, de resto, os trabalhos preparatórios que envolvem
os debates entre parlamentares, projetos de lei de revisão
5.2. Dando-se por preenchida essa imposição legal que constitucional e audições de especialistas pela Comissão
fixa o próprio objeto do recurso, caso ele seja admitido. Eventual de Revisão Constitucional o demonstram (v.
os documentos e posições em José Pina Delgado; Jorge
6. E, além disso, é determinante para se identificar os Carlos Fonseca & Liriam Tiujo (orgs.), Aspectos Polémicos
direitos potencialmente atingidos pela conduta lesiva, uma da Extradição em Cabo Verde e no Espaço Lusófono:
etapa essencial para se verificar se a conduta em causa é Nacionalidade, Pena Aplicável, Institutos Afins, Praia,
passível de ser amparada, do que depende, de uma parte, ISCJS & FDJ, 2009, e Direito & Cidadania, Número
de estar em causa posição jurídica dependente de direito, Especial: Revisão Constitucional, José Pina Delgado &
liberdade ou garantia ou direito que se pode beneficiar Jorge Carlos Fonseca (coord.), Praia, a. 9, n. 28, 2009,
do regime de proteção desta categoria de direitos, e, da pp. 119-159).
outra, de, em potência, ser ato que pode ser diretamente
atribuível ao órgão judicial recorrido por este poder ter 6.2. A determinação final da ocorrência de violação
responsabilidade direta, imediata e necessária na sua imputável ao órgão judicial recorrido é feita na fase
violação, portanto de esta poder ser-lhe imputável de de mérito. No momento de avaliação da presença dos
alguma forma. pressupostos e requisitos de admissibilidade, basta que
o Tribunal avalie a possibilidade racional e abstrata de
6.1. No caso concreto, o recorrente invoca uma pluralidade a conduta impugnada ser suscetível de ter sido praticada
de direitos alegadamente violados, os quais são direitos, direta, imediata e necessariamente pela entidade recorrida.
liberdades e garantias e direitos ligados à proteção
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E neste particular a conduta impugnada só poderia ter


judiciária, logo amparáveis. sido praticada pelo Egrégio Supremo Tribunal de Justiça,
o único tribunal que interveio no processo.
6.1.1. Nomeadamente, os direitos de acesso à justiça,
a um processo justo e equitativo; à uma defesa ampla, 7. Um pedido de amparo de determinação da violação e de
a ser tratado em igualdade de tratamento como os anulação do acórdão recorrido, com todas as consequências
demais nacionais cabo-verdianos, ao recurso e um direito legais não é propriamente o mais exato, mas pode ser
às garantias constitucionais de defesa nos processos considerado congruente com o disposto no artigo 25 da
administrativo e criminal; Lei do Amparo e do Habeas Data.
6.1.2. Porém, o potencial lesivo da conduta sobre posições 8. Ademais, consideram-se pressupostos especiais
jurídicas geradas por esses direitos sempre dependeria de aplicáveis às situações em que o recurso de amparo é
uma vulneração primária à garantia expressa pelo artigo colocado contra conduta do poder judicial que ela seja
38, número 4, da Constituição. Este, ao mesmo tempo que expressa e formalmente invocada no processo logo que
garante uma prerrogativa de o Estado sujeitar cidadão o ofendido tenha dela recebido comunicação, que se
cuja extradição foi recusada, como foi o caso, a processo tenham esgotado as vias legais de recurso e que tenha
de natureza criminal perante os tribunais internos, sido requerida reparação.
com possibilidade de convalidação dos atos praticados
no processo decorrido no estrangeiro, como se tivessem 8.1. A lei coloca, deste modo, um ónus sobre o titular
sido praticados por autoridades nacionais, consagra uma do direito de suscitar a questão no processo logo que o
garantia individual nessas situações, que resultaria do ofendido tenha tido informação sobre o ocorrido, uma
condicionamento desses atos do poder público à existência exigência que depende de o recorrente ter tomado
de processo com garantias similares às previstas pela conhecimento da violação, nomeadamente através de
ordem jurídica cabo-verdiana. comunicações judiciais ou de consultas aos autos, e de
haver mecanismos processuais previstos para alegar o
Similares no sentido de materialmente equivalentes. que entender em sua defesa.
Não propriamente de formalmente iguais, até porque
dificilmente num contexto caraterizado por relações 8.1.1. Neste caso, a lesão do direito, a ter ocorrido, teria
que se processam num mundo marcado por um natural necessariamente que ser perpetrada pelo próprio órgão
pluralismo normativo, a prestação dessa modalidade de judicial recorrido, de modo que, independentemente de
cooperação judiciária, inserta num contexto relacional se saber se não seria de se exigir diligência preliminar, o
marcado por algum pragmatismo e realismo, e baseada que se retomará adiante, o facto é que pode dizer-se que
em regras inseridas pela lei de revisão constitucional de o recorrente manifestou a sua inconformação, assim que
2010 destinadas a evitar que a nacionalidade servisse dela tomou conhecimento.
de cobertura para a impunidade, teria na sua base a
condição de que as garantias de defesa teriam de ser 8.2. De outra parte, dispõe o artigo 6º que “o recurso
rigorosamente iguais. de amparo só poderá ser interposto depois de terem sido
esgotados todos os meios legais e todas as vias de recurso
Tendo a garantia sido inserta num complexo normativo ordinário estabelecidas pela respetiva lei de processo”.
da flexibilização da garantia de não-extradição de nacionais
cabo-verdianos justificada pelo legislador constituinte de 8.2.1. A fórmula utilizada vai num sentido extremamente
reforma como um meio facilitador da cooperação judiciária amplo porque referindo-se a meios legais abarca mecanismo

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que seja idóneo assegurar a defesa de direitos e interesses do direito alegadamente violado em termos percetíveis,
legítimos seja ela pré-decisório, decisório ou pós-decisório; que se tenha requerido a sua reparação, que a violação
ordinário, extraordinário ou especial. Do que decorre o não tenha sido reparada e que, no momento em que se
efeito evidente de que, neste caso, por motivos evidentes, requer o amparo ao Tribunal Constitucional, processos
enquanto os mecanismos pré-decisórios de tutela através da paralelos, passíveis de garantir a tutela do direito, não
submissão de requerimentos vários podem ser absorvidos estejam a tramitar em qualquer outra instância (Acórdão
pela necessidade de recurso ordinário decorrente do 28/2020, de 24 de julho, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP
segundo segmento da disposição, o facto de inexistirem Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
recursos ordinários disponíveis não isenta os titulares do 139, 23 de dezembro de 2020, p. 2168-2172, d); Acórdão
direito de terem de utilizar qualquer via legal decisória 57/2020, de 2 de dezembro, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP
prevista na respetiva lei de processo, desde que ela seja Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série,
hábil a produzir o efeito de proteção do direito. Isso, na N. 16, 12 de fevereiro de 2021, p. 565-573, d); Acórdão
medida em que preservado o poder jurisdicional do tribunal 40/2021, de 14 de setembro, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP
recorrido em relação à questão colocada, por exemplo Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
uma nulidade, este possa revogar a sua própria decisão. 100, 15 de outubro de 2021, p. 2571-2579, d); Acórdão
45/2021, de 6 de outubro, Amadeu Oliveira v. STJ, Rel:
8.2.2. Na situação concreta que temos em mãos, em JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série,
relação à conduta impugnada, sendo verdade que não havia N. 100, 15 de outubro de 2021, p. 2604-2610, d)).
mais vias ordinárias de recurso para serem esgotadas, as
próprias vias legais poderiam ter sido melhor exploradas. Havendo, por motivos evidentes, flexibilidade para se
Na situação concreta que temos em mãos, haveria que o fazer através de meios ordinários ou extraordinários,
se verificar se o recorrente, tendo a possibilidade de é exigência incontornável que se assim se proceda – e,
colocar a questão invocando o segmento do artigo 408, talvez, sobretudo, nos casos em que a violação primária só
parágrafo segundo, da lei de processo em causa, o Código pode ser atribuída ao último tribunal na cadeia decisória
de Processo Penal, não o fez. O preceito estabelece que – tanto nos casos em que se se lhe atribui uma violação
“será lícito ao tribunal, oficiosamente ou a requerimento, por ação, como uma violação por omissão.
suprir nulidades, retificar erros materiais ou quaisquer 8.3.1. Nesta situação concreta, o que se observa é que
omissões, inexatidões ou lapsos manifestos, esclarecer a lesão do direito, a ter ocorrido, só pode ser atribuída
dúvidas existentes na decisão e reformá-la quanto a ao Egrégio STJ, o único órgão judicial que interveio no
custas”. Naturalmente, não se colocando questão de ter processo. Sendo assim, e apesar de ter colocado a questão
havido erro material incidente sobre a própria decisão, antecipadamente ao órgão judicial recorrido, não se pode
a única causa que interessará seria a da supressão de considerar que tenha pedido reparação, precisamente
nulidades, seja do processo, seja da decisão, do que decorre porque esta sempre teria de decorrer do ato concreto
que seria decisivo verificar se era exigível esgotar esta via do poder judicial lesivo do direito, liberdade e garantia;
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legal pós-decisória também. E aqui parece que a partir necessariamente do acórdão recorrido.
do momento em que o recorrente entende que se adotou
uma decisão tão claramente inconstitucional não seria 8.3.2. A regra decorrente do artigo 3º, parágrafo primeiro,
de se descartar que, como dizia inicialmente ter feito, alínea c), é que deve haver pedido de reparação a partir
mas não demonstrou e acabou por reverter, pudesse ter do momento em que o ofendido tenha tido conhecimento
arguido a nulidade das mesmas, nos termos do CPP. E da violação. Sendo verdade que o Tribunal Constitucional
se dúvida em relação ao cumprimento dessa exigência tem dispensado o pedido de reparação dirigido ao último
ainda pudesse ser resolvida em favor do recorrente em tribunal na cadeia decisória em causa nas situações em
homenagem a um princípio pro-actione, esta mesma que a violação originária é praticada por um tribunal
razão interfere com a adequação ao pressuposto seguinte inferior ou por uma entidade administrativa e é arguida
e neste caso de modo irremediável. em sede de recurso ordinário, o facto é que, neste caso, a
alegada lesão do direito, a ter acontecido, seria sempre
8.3. Dispõe a lei que o pedido de amparo contra condutas praticada originariamente pelo próprio Supremo Tribunal
do poder judicial depende de ter “sido requerida reparação”, de Justiça, sem qualquer antecedente decisório.
condição essencial para, por um lado, garantir que os
tribunais judiciais, que também são órgãos de proteção 8.3.3. Num outro prisma, apesar de o recorrente ter
de direitos, possam reparar eventuais lesões que tenham aparentemente promovido alegações nesse sentido,
ocasionado, e, do outro, evitar que o Tribunal Constitucional não se tratava de um recurso contencioso de um ato da
seja inundado de súplicas de amparo que pudessem ter Ministra da Justiça, que se esgotou nos termos do artigo
sido resolvidas e ultrapassadas através da intervenção dos 95, parágrafo quarto, da Lei de Cooperação Judiciária
tribunais judiciais e garantir que quando ele intervenha todos Internacional em Matéria Penal, numa decisão de
os argumentos já tenham sido apresentados e discutidos admissibilidade, a qual por si só não tem caráter lesivo,
e a questão já esteja estabilizada e amadurecida. Sendo não vincula o tribunal – conforme o artigo 24, parágrafo
assim, tendo o Acórdão nº 11/2017, de 22 de junho, Maria primeiro, do mesmo diploma – e que, em todo o caso, não
de Lurdes v. STJ, sobre violação do direito de constituir fora impugnado. Outrossim, as questões que o recorrente
família por não reconhecimento de união de facto, Rel: houve por bem suscitar, fê-las no âmbito de uma oposição
JC Pina Delgado, 1.2.2, assentado entendimento de que a confirmação de sentença estrangeira no quadro de um
é mister verificar se uma imputação de vulneração de processo autónomo impulsionado pelo PGR, no qual,
direito que é submetida foi precedida da colocação da a única entidade judiciária que interveio foi o Egrégio
questão ao órgão judicial recorrido em moldes que este a Supremo Tribunal de Justiça.
pudesse apreciar e reparar, a partir do Acórdão nº 13/2017, 8.3.4. Logo, impondo sempre que este Alto Tribunal
de 20 de julho, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto fosse confrontado com a putativa vulneração de direito a
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 47, 8 de ele imputável que tivesse a oportunidade de a apreciar e
agosto de 2017, pp. 1024-1029, esta Corte Constitucional eventualmente repará-la antes de se trazer a queixa ao
tem sustentado a imprescindibilidade de se confirmar Tribunal Constitucional.
que houve pedido de reparação, passando, já na fase de
admissibilidade, a avaliar o cumprimento do disposto na 8.3.5. Ocorre que, apesar de o recorrente ter, inicialmente,
alínea c) do número 1 do artigo 3 em conjugação com o dito que arguiu a nulidade da decisão desse Alto Tribunal,
disposto no artigo 6. Portanto, para haver esgotamento peça em que poderia e deveria ter pedido reparação, veio
das vias ordinárias de recurso é preciso que se prove a confirma-se que, afinal, o ato que poderia ter franqueado
ter invocado perante a instância recorrida a violação as portas do TC, não foi efetivado.

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1458 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

8.4. Destarte, não parece a este Tribunal que o Cópia:


pressuposto especial de pedido de reparação foi cumprido
pelo recorrente, inabilitando esta Corte Constitucional a Do acórdão proferido nos autos de Recurso de Amparo
conhecer a questão no mérito (Acórdão 14/2018, de 28 de Constitucional n.º 7/2022, em que é recorrente Matthew
junho, Edmir de Barros e Outros v. STJ, Rel: JCP Pinto Peter Balme e entidade recorrida o Supremo Tribunal
de Justiça.
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 49, de 20
de julho de 2018, d); Acórdão 21/2018, de 16 de outubro, Acórdão n.º 105/2023
Edmir Semedo v. Diretor da Cadeia Central da Praia e
Ministra da Justiça, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado (Autos de Amparo 7/2022, Matthew Peter Balme v.
no Boletim Oficial, I Série, N. 68, de 25 de outubro de STJ, Admissão a trâmite de conduta de confirmação
2018, d); Acórdão 04/2019, de 24 de janeiro, Eduina judicial da extradição do recorrente, malgrado o Estado
Requerente não ter alegadamente apresentado garantias
Ferreira v. Tribunal Judicial da Comarca do Paul, Rel: suficientes de que teria reconhecido um direito ao recurso
JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, ou a um novo julgamento, por eventual violação do direito
N. 28, de 13 de março de 2019, d); Acórdão 21/2019, de de recurso e do direito à defesa em processo penal)
27 de junho de 2019, Edgar Silva v. TRB, Rel: JCP Pinto
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 79, de I. Relatório
22 de julho de 2019, d); Acórdão 22/2019, de 27 de junho,
1. O Senhor Matthew Peter Balme, cidadão britânico,
Elton Dias v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no vem a este Tribunal Constitucional interpor recurso de
Boletim Oficial, I Série, N. 79, de 22 de julho de 2019, d); amparo por não se conformar com o Acórdão STJ 141/2021,
Acórdão 25/2019, de 1 de agosto, Eder Yanick v. STJ, Rel: apresentando para tanto a seguinte motivação,
JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série,
N. 100, de 26 de setembro de 2019, d); Acórdão 40/2019, 1.1. Quanto à admissibilidade, que
de 11 de outubro, António Veiga e Outros v. PGR, Rel: JCP
1.1.1. Suscitou as questões que integram a petição ao
Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 6, longo do processo;
de 14 de janeiro de 2020, d); Acórdão 44/2019, de 20 de
dezembro, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, 1.1.2. Esgotou todos os meios legais de defesa dos seus
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 6, de 14 de janeiro direitos e todas as vias de recurso ordinário;
de 2020, d); Acórdão 47/2019, de 31 de dezembro, Adnilson
Montrond v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no 1.1.3. Foi recorrente em processo de extradição que
correu os seus termos no STJ, o órgão recorrido.
Boletim Oficial, I Série, N. 14, de 4 de fevereiro de 2020,
d); Acórdão 04/2020, de 14 de fevereiro, Arlindo Teixeira 1.2. Quanto às condutas impugnadas, que o acórdão
v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim terá violado os requisitos legais e constitucionais do
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Oficial, I Série, N. 25, de 3 de março de 2020, d); Acórdão processo de extradição previstos na Lei Fundamental,
07/2020, de 6 de março, Sanou Moussa v. STJ, Rel: JCP em instrumentos internacionais e na lei de cooperação
Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. judiciária em matéria penal. Porque:
86, de 23 de julho de 2020, d); Acórdão 26/2022, de 24 1.2.1. Primeiro, ao considerar que a violação da
de junho, Anilton Vieira e Leocádio da Veiga v. STJ, Rel: obrigação de não nomeação de intérprete geraria uma
JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, nulidade sanável e não insanável. Como a questão não
N. 94, de 28 de setembro de 2022, d)). foi suscitada perante a autoridade judiciária a quem foi
presente no seguimento da detenção nada se podia fazer
9. Como se tem considerado em outras ocasiões, a nas fases ulteriores do processo. Pelo contrário, na sua
ausência de uma das condições de recorribilidade é opinião, existindo essa obrigação, pelo facto de o ato de
suficiente para conduzir à inadmissão do recurso, ficando detenção ter impactos profundos sobre a liberdade do
sem efeito útil qualquer inquérito sobre a presença ou cidadão, isso geraria nulidade insanável. Quando mais
não das causas especiais de inadmissão previstas pelo não seja porque até a não tradução de mandado de busca
artigo 16, alínea e) e f), da Lei do Amparo e do Habeas e apreensão, muito menos gravoso, produziria vício dessa
Data, nomeadamente as de manifestamente não estar natureza. Daí concluir que “no direito cabo-verdiano e
em causa violação de direitos, liberdades e garantias tendo sempre a Constituição em referência como direito
ou de o Tribunal já ter rejeitado, por decisão transitada processual penal aplicado e [C]ódigo de [P]rocesso [P]
em julgado, recurso com objeto substancialmente igual. enal[,], norma a ser interpretada conforme a [C]onstituição,
o direito do arguido que não domina a língua do tribunal,
III. Decisão a assistência de um intérprete contém implicitamente
o direito a ser exibido o mandado e ordem de detenção
numa língua que domina”;
Pelo exposto, os juízes do Tribunal Constitucional,
reunidos em plenário, decidem não admitir o recurso de 1.2.2. Assim, “considerando que a ordem de detenção e
amparo, ordenando o seu arquivamento. o mandado de detenção têm conteúdos com fundamentos
de facto e de direito que legitimam o retirar da liberdade
Registe, notifique e publique. sobre o corpo do arguido, necessariamente esses conteúdos
devem ser comunicados numa das línguas que o arguido
Praia, 22 de junho de 2023 domina”, culminando o segmento relevante com consideração
segundo a qual “agindo no sentido contrário, entregar
José Pina Delgado (Relator) ao arguido um mandado de detenção numa língua em
que o arguido não domina, não poderá existir dúvidas
Aristides R. Lima que estaremos perante uma violação grave ao direito
ao intérprete com fundamento constitucional e previsão
no artigo 118, n. 4[,] conjugado com o artigo 6, ambos
João Pinto Semedo do CPP”. Essa seria também a orientação anterior do
Egrégio STJ que cita. Por isso, não assistiria “razão ao
Está conforme tribunal recorrido, que devia ter considerado procedente
a nulidade invocada nos termos do artigo 151, al. f), do
Secretaria Judicial do Tribunal Constitucional, aos 22 CPP por violação dos artigos 118, n. 4 e artigo 35 e 33 da
de junho de 2023. — O Secretário, João Borges. CRCV, com todas as consequências legais”;

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1459

1.2.3. Segundo, o órgão judicial recorrido consideraria 2.1. Como o acórdão recorrido que confirmou a extradição
plenamente justificado o afastamento da garantia de do recorrente havia transitado em julgado, o mesmo já
reciprocidade, nomeadamente porque a lei ordinária ao tinha sido removido para o Estado Requerente desde 3
prever que o autor dos factos também possa ser julgado de março de 2022;
em território nacional não obstaculiza a extradição,
posto ser essa competência uma faculdade e não uma 2.2. O recurso seria tempestivo, e, apesar da lacunosa
obrigatoriedade. Seria grave tal fundamento, significando factualidade e extensão das conclusões, a peça adequar-
que, tendo o Estado tomado conhecimento da prática se-ia às exigências formais da lei, o recorrente teria
de crimes em território nacional, trataria isso como legitimidade, da decisão recorrida já não caberia recurso
uma faculdade e não como uma obrigatoriedade, o que ordinário; os direitos invocados seriam amparáveis, e não
contrariaria o espírito do legislador e faria a prática do constaria que o Tribunal Constitucional tenha rejeitado,
crime nesse espaço compensar. Neste caso, considera que por decisão transitada em julgado, um recurso com objeto
o extraditando teria o direito de ser julgado pelo tribunal substancialmente igual.
cuja competência resulta da lei, assim em julgamento justo 2.3. Contudo, considera que o pedido de revogação do
e equitativo. Aparentemente, o STJ não teria seguido o acórdão recorrido que se deduz aparentemente não se
que a PGR e o TRB disseram a respeito da previsão do integra nas finalidades legais do recurso de amparo e
crime de lavagem de capitais na lei cabo-verdiana e da ainda que “se admitisse tal revogação, a consequência
sua gravidade. Assim, sendo Cabo Verde competente, lógica e, processualmente, admissível nunca poderia
isso seria motivo de denegação de cooperação judiciária, ser sobre o mérito do pedido de extradição, mas sobre
prejudicando igualmente a tese do PGR acolhida pelo TRB a violação ou não de direitos, liberdades ou garantias,
de que a extradição do recorrente seria aconselhável, até impondo a respetiva reparação, caso se pronuncie por
porque ela “é ainda negada quando não estiver garantida qualquer violação”.
a reciprocidade”, como teria sido demonstrado nos autos.
2.4. Além de clarificar a sua pretensão em termos de
1.2.4. Terceiro, a inexistência de um regime de prescrição amparos, o recorrente deveria aperfeiçoar o seu requerimento
no Estado Requisitante – o Reino Unido – atingiria a no concernente à definição das normas e dos princípios
garantia de processo justo e equitativo, que incluiria um constitucionais que entende terem sido violados, e juntar
“termo do cumprimento da pena num prazo razoável, pois procuração forense aos autos.
a imprescritibilidade” ofenderia “a paz jurídica inerente ao
decurso e as garantias de defesa”, algo que o órgão judicial 2.5. Conclui dizendo que se lhe “afigura (…) que estarão
recorrido não conheceu, limitando-se a dizer que se deu ao preenchidos os pressupostos para admissão do presente
extraditando conhecimento pormenorizado dos fundamentos recurso de amparo constitucional, se for clarificado o pedido
do pedido e este deduziu oposição bastante ao pedido. de amparo nos termos exigidos pela [L]ei de [A]mparo no
nº 2 do seu artigo 8.º, sendo igualmente, processualmente
1.2.5. Quarto, o Estado Requerente nunca chegou a útil, que o recorrente faça a menção expressa de normas
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apresentar a Prerrogativa Real que alegou, tendo o acórdão ou princípios jurídico-constitucionais que entende terem
recorrido sinalizado que a garantia ficou assegurada só pelo sido violados”, sendo de parecer que o recurso de amparo
facto de o Reino Unido ter juntado cópia de folha avulsa constitucional interposto preenche os demais pressupostos
da lei de recurso, quando, ao contrário de Cabo Verde, de admissibilidade.
o direito de recurso no Reino Unido dependeria de uma
apreciação do Tribunal de Recurso que, a seu bel prazer, 3. Marcada sessão de julgamento para o dia 6 de abril,
poderia autorizar o recurso ou não, decisão insuscetível de nessa data se realizou, com a participação dos Venerandos
reclamação. Daí considerar que “salvo melhor entendimento Juízes-Conselheiros e do Senhor Secretário do TC, dela
a garantia do direito de recurso e/ou a novo julgamento só decorrendo a decisão que se segue acompanhada dos
ficaria garantida com autorização expressa de recurso, o fundamentos articulados infra.
que nunca teria acontecido, pelo que não se encontraria II. Fundamentação
garantido esse requisito necessário a viabilizar a extradição”,
situação que seria fundamento para se recusar a extradição 1. Do ponto de vista constitucional, o recurso de amparo
pela insuficiência das garantias oferecidas, na medida em é concebido como um direito fundamental de “requerer
que esta não seriam vinculativas. ao Tribunal (…) a tutela de (…) direitos, liberdades e
garantias, constitucionalmente reconhecidos”, e também
1.3. Destarte, o acórdão recorrido violaria o direito ao como um meio “de tutela de direitos, liberdades e garantias”,
intérprete, o direito ao julgamento justo e equitativo, os consagrando-se a sua dupla-natureza subjetiva e objetiva.
direitos de ampla defesa e contraditório e as garantias
de defesa. 1.1. Direito este que é delimitado materialmente, na medida
em que destinado à proteção direta de apenas uma das
1.4. Reitera de forma resumida algumas dessas questões três categorias de direitos fundamentais previstas pela Lei
nas conclusões, com a exceção da questão da inexistência Fundamental. Seriam os denominados direitos, liberdades
da imprescritibilidade dos crimes no Reino Unido, sobre e garantias, tanto os individuais, como os de participação
a qual não há qualquer consideração nesse segmento. política e de exercício da cidadania e, arguivelmente, os
1.5. Termina o seu arrazoado, pedindo que o recurso: dos trabalhadores. É verdade que se estende para recobrir
os direitos análogos a direitos liberdades e garantias ou
1.5.1. Seja admitido, por ser legal, tempestivo, e que seja que portem caraterísticas específicas com dimensões
1.5.2. Considerado procedente e, em consequência, individuais e civis como, respetivamente, os direitos de
“revogado o acórdão recorrido, por ser ilegal, inconstitucional, proteção judiciária (Acórdão 6/2017, de 21 de abril, Maria
decidindo recusar a extradição do recorrente requerida pelo de Lurdes v. STJ, sobre pedido de desistência, Rel: JC
Estado do Reino Unido, por não terem sido verificados e Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 42,
respeitados os pressupostos legais para a extradição”, o que 21 de julho de 2017, pp. 898-903, 5; Acórdão 9/2017, de
deveria conduzir à “soltura imediata do extraditando, face 8 de junho, Martiniano Oliveira v. STJ, Rel: JCP Pinto
à nulidade da detenção e à falta dos requisitos do pedido”. Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 42,
21 de julho de 2017, pp. 925-929, e); Acórdão 13/2017,
2. Cumprindo o estabelecido no artigo 12 da Lei n.º de 20 de julho, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto
109/IV/94 de 24 de outubro, foram os autos com vista Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 47, 8 de
ao Ministério Público para emissão de parecer sobre a agosto de 2017, pp. 1024-1029, e); Acórdão 24/2017, de
admissibilidade do recurso, tendo-o feito o Exmo. Sr. 9 de novembro, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto
Procurador Geral da República, o qual articulou os Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 78, 22
seguintes argumentos: de dezembro de 2017, pp. 1692-1698, e); Acórdão 12/2018,

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1460 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

de 7 de junho, CIMA v. STJ, Rel: JC Aristides R. Lima, em tempo útil contra ameaças ou violações desses mesmos
Decisão de admissibilidade, publicado no Boletim Oficial, direitos, liberdades e garantias” (Acórdão nº 36/2022, de 12
I Série, N. 49, 20 de julho de 2018, b; Acórdão 16/2018, de agosto, Ramiro Oliveira Rodrigues v. TRB, sobre violação
de 28 de julho, Luigi Zirpoli v. TJCP, Rel: JCP Pinto do direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva por
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 49, 20 não-admissão de recurso designado pelo recorrente de amparo
de julho de 2018, pp. 1298-1302, e); Acórdão 17/2018, ordinário por tribunal judicial, Rel: JC Pina Delgado, 5.1.3).
de 26 de julho, Amândio Vicente v. TRS, Rel: JCP Pinto
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 51, 3 de 1.2.2. E, em consequência, a subsidiariedade do recurso
agosto de 2018, pp. 1328-1333, e); Acórdão 22/2018, de 11 de amparo, recurso constitucional de natureza especial,
de outubro, Martiniano v. STJ, sobre o direito de acesso ao qual só se pode lançar mão, depois de se explorar os
aos tribunais, Rel: JC José Pina Delgado, publicado no mecanismos que correm perante os tribunais ordinários
Boletim Oficial, I Série, N. 76, 22 de dezembro de 2018, pp. para que estes possam conhecer e garantir a tutela desses
1824-1835, 2; Acórdão 3/2019, de 24 de janeiro, Ramiro mesmos direitos.
Rodrigues v. TRB, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no 1.3. E caraterizado pelo seu informalismo, urgência
Boletim Oficial, I Série, N. 28, 13 de março de 2019, pp. e sumariedade, conforme decorre da alínea b) do artigo
480-486, e); Acórdão 36/2022, de 12 de agosto, Ramiro 20, segundo a qual ele “pode ser requerido em simples
Oliveira Rodrigues v. TRB, sobre violação do direito de petição, tem caráter urgente e o seu processamento deve
acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva por não- ser baseado no princípio da sumariedade”.
admissão de recurso designado pelo recorrente amparo
ordinário por tribunal judicial, Rel: JC Pina Delgado, 1.4. Por conseguinte, está-se perante um direito
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 2, 5 de janeiro fundamental e um recurso constitucional desenhado
de 2023, p. 36-42, 2.1) e o direito à propriedade privada especialmente para a proteção de direitos, liberdades e
(Acórdão 30/2019, de 30 de agosto, Atlantic Global Asset garantias, que pode ser utilizado subsidiariamente quando
Management v. PGR, sobre violação do direito à propriedade os meios ordinários de tutela de direitos que correm os
privada, da garantia de juiz, da iniciativa privada e dos seus trâmites perante os tribunais judiciais ou outros,
direitos à defesa, ao contraditório e de acesso às provas a existirem, falham. Tais caraterísticas impõem que a
da acusação, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim própria lei de processo constitucional que desenvolve
Oficial, I Série, N. 110, 29 de outubro de 2019, pp. 1766- os procedimentos atinentes ao recurso de amparo seja
1789); ou ainda para situações que envolvam camadas interpretada como uma lei restritiva de direito cujo figurino
de proteção essenciais que remetam a certos direitos, básico se deve manter dentro dos confins dos números 4 e
liberdades e garantias como a vida ou a integridade 5 do artigo 17 da Constituição, ainda que parte do regime
pessoal. Porém, fora desses casos, com a tendencial possa ser legitimamente fixado pelo legislador em razão
não-inclusão dos direitos económicos, sociais e culturais da remissão à lei (“nos termos da lei”), desde que não se
e dos direitos de grupos vulneráveis que não portem atinja de modo ilegítimo as caraterísticas essenciais do
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caraterísticas de direitos, liberdades e garantias, e também instituto impostas pelo próprio dispositivo constitucional
de princípios constitucionais objetivos, como, em diversos (“e com observância [obrigatória, diga-se] do disposto nas
momentos, este Tribunal já decidiu (Acórdão 11/2017, alíneas seguintes (…)”.
de 22 de junho, Maria de Lurdes v. STJ, sobre violação
do direito de constituir família por não reconhecimento 2. As exigências da peça de recurso de amparo são as
de união de facto, Rel: JC Pina Delgado, publicado no consagradas nos artigos 7º e 8º da Lei do Amparo e do
Boletim Oficial, I Série, N. 42, 21 de julho, pp. 933-950 e Habeas Data, os quais impõem, respetivamente, que:
na Coletânea de Decisões do Tribunal Constitucional de 2.1. A petição seja:
Cabo Verde, Vol. III, Praia, INCV, 2018 (2017), pp. 423-
477, 20.1; Acórdão 29/2017, de 5 de dezembro, Ovídio 2.1.1. Interposta através de simples requerimento,
de Pina v. STJ, Rel: JC Aristides R. Lima, publicado no com indicação expressa de que o recurso tem a natureza
Boletim Oficial, I Série, N. 6, 1 de fevereiro de 2018, pp. de amparo;
75-93, 20.1; Acórdão 06/2018, de 22 de março, Adilson
Danielson v. STJ, Rel: JC Pina Delgado, Boletim Oficial, 2.1.2. Devidamente fundamentada; e
I Série, N. 21, de 11 de abril de 2018, pp. 495-505, 2; 2.1.3. Entregue na Secretaria do Tribunal Constitucional.
Acórdão 27/2018, de 20 de dezembro, Judy Ike Hills v.
STJ, sobre violação de garantia de inviolabilidade de 2.2. Quanto ao que a lei designa de “fundamentação
domicílio, de correspondência e de telecomunicações e do recurso”, exige-se que o recorrente, através da peça,
de garantia da presunção da inocência na sua dimensão
de in dubio pro reo, Rel: JC Pina Delgado, publicado no 2.2.1. Identifique a entidade, o funcionário ou o agente
Boletim Oficial, I Série, N. 11, 31 de janeiro de 2019, pp. autor do ato ou da omissão, bem como os interessados a
146-178, 2.1.1). Por conseguinte, trata-se de um recurso que o provimento do recurso possa diretamente beneficiar
especialmente desenhado para proteger uma categoria ou prejudicar, havendo-os;
especial de direitos que goza de regime de tutela mais 2.2.2. Indique com precisão “o ato, facto ou a omissão”
intenso: os direitos, liberdades e garantias. que, na sua opinião, violou os seus direitos amparáveis;
1.2. E que fica processualmente condicionado ao 2.2.3. Indique com clareza quais deles terão sido
esgotamento das vias ordinárias de recurso, opção da vulnerados, “com a expressa menção das normas ou
qual resulta um figurino constitucional que produz princípios jurídico-constitucionais que entende terem
diversos efeitos. sido violados”;
1.2.1. Desde logo, a conceção de que todos os tribunais 2.2.4. Exponha resumidamente as razões de facto que
cabo-verdianos são tribunais de proteção de direitos, nos fundamentam o pedido, bem como “formul[e] conclusões,
termos da sua respetiva jurisdição, cabendo efetivar essa nas quais resumirá, por artigos, os fundamentos de facto
tutela através dos processos ordinários desenhados pela lei, e de direito que justificam a petição”;
dos processos especiais previstos pela Constituição como
o Habeas Corpus ou o recurso contencioso administrativo, 2.2.5. Esta deverá “terminar com o pedido de amparo
ou daqueles que venham a ser definidos pelo legislador, constitucional no qual se indicará o amparo que o recorrente
nos termos do artigo 22, parágrafo sexto, segundo o qual entende dever ser-lhe concedido para preservar ou
“[p]ara a defesa dos direitos, liberdades e garantias restabelecer os direitos, liberdades ou garantias violados”,
individuais, a lei estabelece procedimentos judiciais devendo vir acompanhada dos “documentos que julgar
céleres e prioritários que assegurem a tutela efetiva e pertinentes e necessários para a procedência do pedido”.

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1461

2.3. O objeto dessas disposições é determinar o modo de da conduta que pretendem impugnar, ficando muitas vezes
interposição e definir a estrutura da peça processual, de perdidas dentro de um emaranhado de relatos fáticos e
tal sorte que, de forma célere e simplificada, se permita de interpretações jurídicas, com atribuição de condutas
ao Tribunal Constitucional identificar os elementos ao STJ, ao TRS e até à PGR. Apesar da censura de que
constitutivos da súplica para que possa decidir sobre a se pode fazer com a máxima veemência a essa forma
sua admissibilidade, sobre eventuais medidas provisórias muito pouco clara de exposição que – em detrimento da
aplicáveis e, subsequentemente, sobre o seu mérito. inteligibilidade da peça – o recorrente promove em seu
próprio prejuízo, dá-se, in extremis, por preenchidas as
2.3.1. De um lado, através da facilitação do acesso a exigências mínimas previstas pela lei, permitindo a esta
esses elementos que decorreriam do modo de organização Corte apurar as intenções do recorrente e as pretensões
da peça e da entrega direta no Tribunal Constitucional; que pretende fazer valer em juízo.
2.3.2. Do outro, pelo facto de se impor um determinado 2.3.5. Mais especificamente, dispondo a Constituição
conteúdo à mesma, na medida em que, do ponto de vista que a tramitação do amparo deve ser baseada no princípio
do número 1 do artigo 8º, primeiro, remete-se, através das da celeridade, as condições para tanto devem começar a
alíneas a) e b); para a identificação das condutas lesivas ser criadas pelos próprios jurisdicionados apresentando
(“ato, facto ou a omissão”) e para o órgão do poder público devidamente as suas peças, calibrando a extensão da
ao qual podem ser imputadas (“a entidade, o funcionário sua argumentação, precisando os elementos nucleares do
ou o agente autor do ato ou da omissão”); segundo, por recurso em termos de identificação de conduta atribuível
meio da alínea c), aos direitos, liberdades e garantias a poder público, indicação dos parâmetros de escrutínio
vulnerados por aquelas (“indicar com clareza os direitos, e definição do amparo pretendido, a tríade que compõe a
liberdades e garantias fundamentais”) e às disposições estrutura vital deste recurso. Sendo certo que, em relação
onde estariam alojados ou os princípios de onde podem aos derradeiros, a legislação de processo constitucional
ser inferidos (“com a expressa menção das normas ou aplicável – neste caso, o artigo 24, parágrafo segundo,
princípios-constitucionais que entendem terem sido da Lei do Amparo e do Habeas Data – permite a esta
violados”); terceiro, nos termos do número 2 da mesma Corte suprir deficiências de indicação de parâmetros e
disposição, à explicitação do amparo que se pretende para amparos, além de ser um risco que, desnecessariamente,
se remediar a eventual lesão (“a petição terminará com o recorrente não deve assumir, posto que se trata de ato
o pedido de amparo constitucional no qual se indicará o discricionário do Tribunal (note-se, num caso e no outro,
amparo que o recorrente entende dever ser-lhe concedido a utilização da expressão “pode”) – que utilizará quando
para preservar ou restabelecer os direitos, liberdades e entender justificado e conveniente – isso, a) consome
garantias fundamentais violados”). A argamassa que sempre muito mais tempo; b) desvia a atenção individual
ligaria esses três elementos decorreria dos fundamentos dos juízes de outros aspetos da aferição de admissibilidade;
de facto e de direito que justificam a petição, como também c) aumenta a carga de esforço do Coletivo em arbitrar ele
se impõe apresentar, conforme o disposto nas alíneas d) próprio parâmetros e amparos. E, d), no mínimo, pode
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e e) do parágrafo primeiro da primeira disposição. resultar no adiamento da apreciação do pedido de amparo,


2.3.3. A regra é que, do ponto de vista da articulação se não na sua inadmissão.
da petição de amparo, deve haver o estabelecimento de
uma ligação lógica entre cada conduta impugnada, as 2.4. Sendo assim, todos os requisitos da peça estão
posições jurídicas decorrentes do(s) direito(s) que ela presentes, considerando o Tribunal ter, no limite, todos
vulnera e o amparo adequado para a remediar através da os elementos necessários a verificar se o recurso é
fundamentação. O que se tem verificado até agora é que admissível, sem a necessidade de emitir qualquer decisão
na maior parte dos casos, isso é muito deficientemente de aperfeiçoamento.
articulado, lançando-se para a peça de recurso, sem grande 3. No essencial, embora com grande dificuldade, consegue-
precisão e racionalização, uma pluralidade de condutas se intuir as condutas que o recorrente pretende impugnar
a que globalmente se imputam violações de um conjunto e a entidade que as terá empreendido, os direitos que
diversificado de direitos, e remetendo-se para amparos entende terem sido violados e, genericamente, intui-se
genéricos ou impossíveis. O Tribunal Constitucional o amparo último que almeja obter, aspetos que serão
desde o Acórdão nº 10/2017, de 8 de junho, Adilson avaliados adiante, se for necessário. Isso porque parece
Danielson v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado dizer na parte da fundamentação que:
no Boletim Oficial, I Série, N. 42, 21 de julho de 2017,
pp. 929-933, b), tem tolerado a interposição de vários 3.1. As aparentes condutas consubstanciadas:
amparos que não cumprem essas exigências qualitativas, 3.1.1. No facto de o acórdão recorrido ter confirmado
considerando que a disposição deve ser lida sempre de a sua extradição, considerando que eventual violação de
forma compatível ao direito constitucional ao amparo, obrigação de nomeação de intérprete geraria vício sanável
no sentido de que “mais importante que o rigor formal e não nulidade insanável, que, no caso concreto, por não
é a inteligibilidade do que se expõe e se requer”. Mas, ter sido suscitada a tempo, já se havia convalidado;
a duras penas, considerando a grande dificuldade que
se tem para se compreender o que se impugna, o que se 3.1.2. No facto de o acórdão recorrido ter confirmado a
pede e os fundamentos que suportam as petições. A Corte sua extradição, considerando que o afastamento da regra
Constitucional continuará – transitoriamente – aberta da reciprocidade, apesar de se prever a possibilidade de
a privilegiar as admissibilidades, suprindo ela própria ele ser julgado em Cabo Verde por crimes cometidos no
eventuais deficiências das peças, mas, depois de vários país, seria possível por se tratar de mera faculdade e não
anos de prática do amparo em Cabo Verde, é preciso de uma obrigatoriedade;
entrar numa nova fase mais exigente, sustentada numa
melhor qualificação. 3.1.3. No facto de o acórdão recorrido ter confirmado sua
extradição, malgrado o Estado Requerente não reconhecer
2.3.4. Na situação vertente, pode-se dizer que, no a figura da prescrição de crimes, com fundamento de que
geral, o recorrente, além de ter apresentado a sua peça ao abrigo da lei cabo-verdiana a prescrição não tinha
na secretaria deste Tribunal, indicando expressamente ocorrido;
que se trata de um recurso de amparo, incluiu uma
exposição das razões de facto que a fundamentam e 3.1.4. No facto de o acórdão recorrido ter confirmado a
integrou um segmento conclusivo resumindo por artigos sua extradição, malgrado o Estado Requerente não ter
os fundamentos de facto e de direito que suportam os seus alegadamente apresentado garantias suficientes de que
pedidos. Tirando isso, a peça não destaca devidamente as teria reconhecido um direito ao recurso ou a um novo
entidades judiciais alegadamente responsáveis pela prática julgamento,

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3.2. Lesariam o direito ao intérprete, o direito ao de liberdade e de responsabilidade, todos poderão ser
julgamento justo e equitativo, os direitos de ampla, sancionados por condutas que atingem bens jurídicos
defesa e contraditório e as garantias de defesa, todos de estabelecidos por uma determinada comunidade política.
sua titularidade; o que, por sua vez, Sem colocar de parte que haverá tradições penais de outros
países que seriam intoleráveis para a ordem pública cabo-
3.3. Justificaria a revogação do acórdão recorrido, por verdiana, podendo conduzir a uma recusa de prestação
ser ilegal, inconstitucional, decidindo-se pela recusa da de cooperação judiciária em matéria penal, a ausência
extradição do recorrente requerida pelo Estado do Reino de previsão de prescrição de crimes não seria uma delas.
Unido, por não terem sido verificados e respeitados os
pressupostos legais para a extradição, o que deveria Mesmo que se possa dizer que aos olhos da legislação
conduzir à “soltura imediata do extraditando face à cabo-verdiana, ela pode não se justificar para crimes
nulidade da detenção e à falta dos requisitos do pedido”. meramente financeiros, em matéria de relações externas,
3.4. Ocorre que a aparente conduta referente ao não não se impõe uma aplicação extraterritorial absolutista
reconhecimento do instituto da prescrição pelo direito dos valores e princípios sobre os quais se assenta a
do Estado Requerente não foi levada para as conclusões, comunidade política e o direito criminal interno. Ela
supondo-se que seja apenas parte do relato fáctico, sem requer outrossim reconhecimento da soberania do outro
propósitos impugnatórios concretos, devendo, em tais Estado, a não-ingerência na forma como o seu ordenamento
casos, ser afastada, como o Tribunal Constitucional já jurídico-penal está organizado e executa a sua política
tinha reconhecido em várias outras ocasiões (Acórdão criminal e aceitação de uma margem que ele tem para
41/2021, de 31 de outubro, Admir Dias v. STJ, Rel: JCP as definir de acordo com as tradições locais. Desde que
Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. elas não atinjam qualquer elemento da ordem pública
100, 15 de outubro de 2021, pp. 2580-2590, b); Acórdão constitucional cabo-verdiana, pela incompatibilidade
22/2021, de 14 de maio, Daniel Semedo e José Lino geral com os valores adotados por esta comunidade
v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim política. Nomeadamente, em relação ao sistema de justiça
Oficial, I Série, N. 62, 12 de junho de 2021, pp. 1884- penal, de esta estar assente em tribunais verdadeiramente
1887, 8; Acórdão 29/2021, de 3 de junho, António Veiga independentes do poder político e através de um processo
e Outros v. PGR, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no justo e equitativo. E mesmo fora desse quadro quando
Boletim Oficial, I Série, N. 88, 16 de setembro de 2021, pontualmente aplique um instituto jurídico incompatível com
pp. 2264-2270, ii; Acórdão 2/2022, de 26 de janeiro, alguma dimensão essencial da ordem pública nacional. O
Daniel Semedo e José Lino v. STJ, Rel: JC Aristides instituto da imprescritibilidade de crimes, uma caraterística
Lima, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 21, 22 de dos sistemas penais anglo-saxónicos, especificamente do
fevereiro de 2022, pp. 334-342, 4; Acórdão 13/2022, de 8 inglês, inserido num dos Estados em que o império do
de março, Luís Gregório e outros v. STJ, Rel: JCP Pinto direito é mais sólido, de modo algum atinge qualquer valor
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 35, 5 comunitário ou princípio constitucional estruturante.
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de abril de 2022, pp. 916-921, 7; Acórdão 86/2023, de 5 3.4.3. Segundo, tal tese dificilmente teria êxito perante
de junho, Eduardo Monteiro Pereira v. TRS, Inadmissão o que a jurisdição constitucional, na altura assumida pelo
por não-invocação da violação no processo logo que dela Egrégio STJ, disse a respeito da compatibilidade abstrata
tenha tido conhecimento, Rel: JCP Pina Delgado, publicado entre o instituto da imprescritibilidade dos crimes e a
no Boletim Oficial, I Série, N. 66, 15 de junho de 2023, Constituição da República, já havia considerado, quando
pp. 1406-1411, 5.2). Sendo certo, que também não era sustentou, em forma de obter dictum – já que a situação
conduta muito viável porque concreta somente envolvia crimes graves nomeadamente
3.4.1. O que o Supremo Tribunal de Justiça asseverou de homicídio agravado, e crimes internacionais – que
é que não poderia haver violação do direito ao processo não se pode dizer que o agente do crime “tenha, em
justo e equitativo porque o que interessaria seria o facto abstrato, um qualquer direito fundamental à prescrição
de “face ao nosso ordenamento jurídico a prescrição” ainda do procedimento criminal sobre o crime por ele praticado;
não havia ocorrido nem em relação à sentença de agosto aliás, numa determinada perspetiva, poder-se-á dizer
de 2018, nem em relação aos procedimentos criminais em que a prescrição pode ser a exceção, pois a regra é de
curso por crime de lavagem de capitais, cujo início seria que quem comete um crime, por ele seja perseguido
o mês de março de 2017. Por esta razão é convicção deste criminalmente, julgado, e, se se provar o facto delituoso,
Tribunal que a impugnação sempre conduziria a situação por ele seja devidamente sancionado” (Parecer 1/2015, de
em que manifestamente não estaria em causa violação de 7 de julho, Rel: JC Zaida Lima, não-publicado, disponível
direito, liberdade e garantia porque, como bem decidiu em https://www.tribunalconstitucional.cv/index.php/
o STJ, o que relevaria nunca seria a existência abstrata acordaos-do-tc-1995-a-2015/, 1a).
de institutos similares aos existentes no direito cabo- 3.4.4. Cai, portanto, esta possível, mas não concretizada,
verdiano – que, acrescente-se não é nenhuma exigência conduta, escusando-se o Tribunal de tecer qualquer
constitucional ou legal da prestação de cooperação judiciária consideração adicional sobre ela.
em matéria penal – mas se, no caso concreto, o crime já
estaria prescrito de acordo com a lei nacional; 4. Antes de prosseguir, cuida o Tribunal de verificar se
os pressupostos gerais de admissibilidade se encontram
3.4.2. Com efeito, não decorre nem da Constituição, preenchidos, ressaltando-se que:
nem da Lei uma proibição de extraditar o estrangeiro ou
o apátrida em função do não-reconhecimento da figura 4.1. Por força do artigo 20, parágrafo primeiro, da
da prescrição. A primeira, nos termos do número 1 do Constituição da República, e do artigo 18, alínea a)
seu artigo 38, limita-se a vedá-la quando requerida por da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do
motivos políticos, étnicos ou religiosos; quando estiver Tribunal Constitucional, é evidente que este tribunal é
em causa crime que corresponda no Estado requerente competente em razão da matéria, considerando que se
a pena de morte e nas situações em que, fundadamente, imputa ao órgão judicial recorrido a violação de direito,
se admita que o extraditando pode vir a ser sujeito a liberdade e garantia;
tortura, tratamento desumano, degradante ou cruel. Os
artigos 6º, 7º, 8ºe 32º da Lei de Cooperação Judiciária 4.2. O recorrente, na medida em que, nos termos do artigo
Internacional em Matéria Penal também não integram 20, parágrafo primeiro, se arroga ser titular de posição
qualquer referência a semelhante causa. jurídica com essa natureza, e de, conforme a parte final
do número 1 do artigo 4º da Lei do Amparo e do Habeas
O máximo que se poderia dizer é que haveria um efeito Data, ser pessoa direta, atual e efetivamente passível de
desse instituto sobre a garantia de processo equitativo, ser afetada pela conduta impugnada, já que extraditando
mas está longe de ser o caso, posto que, numa ordem em processo no âmbito do qual se proferiu a decisão que

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confirmou a sua entrega ao Estado Requerente, possui consiga identificar o centro nevrálgico do escrutínio de
legitimidade processual ativa, o mesmo ocorrendo, no amparo – a conduta impugnada – que se constituirá no
polo passivo, com a entidade recorrida que praticou o objeto do recurso. Podendo materializar-se tanto num
ato ao qual se imputa a lesão dos direitos nos termos da ato, como numa omissão, a conduta corresponde a um
orientação geral (v. Acórdão nº 29/2021, de 3 de junho, comportamento de uma entidade à qual se imputa a
António Veiga e Outros v. PGR, Rel: JCP Pinto Semedo, vulneração de um direito, liberdade e garantia. É a isso
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 88, 16 de setembro que se refere tanto o artigo 20 da Lei Fundamental quando
de 2021, pp. 2264-2270, c)). remete à “tutela dos seus direitos, liberdades e garantias
fundamentais (…)”, como o artigo 2º da Lei do Amparo,
O facto de o recorrente não possuir nacionalidade cabo- quando se refere à “prática de factos ou à omissão de
verdiana, em razão da natureza dos direitos em causa, não atos ou factos”. Isso desde que em relação aos atos, nos
é impeditivo de ele pedir amparo para proteger as posições termos do artigo 2º, número 3, da Lei do Amparo e do
jurídicas de que é titular, como o TC tem considerado Habeas Data, estes não assumam natureza legislativa
sistematicamente em decisões de admissibilidade (Acórdão ou normativa, devendo o Tribunal Constitucional recusar
5/2018, de 22 de março, Uchechukwu Vitus Ezeonwu qualquer impugnação que ataque diretamente norma
e Chijioke Duru v. STJ, publicado no Boletim oficial, constante de dispositivo legal ou equiparado, como,
Série, N. 21, 11 de abril de 2018, pp. 491-494, c); Acórdão de resto, tem feito ao recusar-se a admitir recursos de
12/2018, de 07 de junho, CIMA v. STJ, Rel: JC Aristides amparo que impugnam normas (Acórdão 35/2019, de 18
R. Lima, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 49, 20 de outubro, Alírio Barros v. TRS sobre indeferimento de
de julho de 2018, pp. 1270-1276, c); Acórdão 9/2019, de recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade
28 de fevereiro, Judy Ike Hills v. STJ, Rel: JCP Pinto por não aplicação de norma impugnada, Rel: JC Pina
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 29, Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 110, 29
14 de março de 2019, pp. 511-518, c); Acórdão 15/2019, de outubro de 2019, pp. 1813-1828, 2; Acórdão 11/2017,
de 21 de março, Ayo Abel Obire v. STJ, Rel: JCP Pinto de 22 de junho, Maria de Lurdes v. STJ, sobre violação
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 46, 24 de do direito de constituir família por não reconhecimento
abril de 2019, pp. 812-820, c); Acórdão 36/2019, de 15 de de união de facto, Rel: JC Pina Delgado, publicado no
outubro, Okwuchkwu Igwemadu v. STJ, Rel: JCP Pinto Boletim Oficial, I Série, N. 42, 21 de julho, pp. 933-950
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 142, 31 e na Coletânea de Decisões do Tribunal Constitucional
de dezembro de 2020, pp. 10-12, c); Acórdão 7/2020, de 6 de Cabo Verde, Vol. III, Praia, INCV, 2018 (2017), pp.
de março, Sanou Moussa v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, 423-477, 2.3.4; Acórdão 15/2017, de 26 de julho, INPS
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 86, 23 de julho de v. STJ, sobre a constitucionalidade do nº 2) do Art. 3º e o
2020, pp. 1722-1725, c); Acórdão 28/2020, de 24 de julho, Art. 2º do DL 194/91, na interpretação que lhe foi dada
Alex Saab v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no pelo Presidente do STJ, no sentido de que fixa um prazo de
Boletim Oficial, I Série, N. 139, 23 de dezembro de 2020, recurso de cinco dias, independentemente de se tratar de
pp. 2168-2172, c); Acórdão 57/2020, de 22 de dezembro,
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um litígio decorrente de relação de trabalho estabelecida


Alex Saab v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado ou de litígio tendente à constituição de uma relação de
no Boletim Oficial, I Série, N.16, 12 de fevereiro de trabalho, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim
2021, pp. 565-573, c); Acórdão 13/2022, de 8 de março, Oficial, I Série, N. 35, 6 de junho de 2018, pp. 844-856
Luís Gregório e outros v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, e na Coletânea de Decisões do Tribunal Constitucional
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 35, 5 de abril de Cabo Verde, Vol. IV, INCV, 2018 (2017), pp. 137-176,
de 2022, pp. 916-922, c), e de mérito (Acórdão 20/2018, 2.2.1; Acórdão 22/2018, de 11 de outubro, Martiniano v.
de 16 de outubro, Uchechukwu Vitus Ezeonwu e Chijioke STJ, sobre a violação do direito de acesso aos tribunais por
Duru v. STJ, sobre violação da garantia de presunção decisão de deserção de recurso, Rel: JC José Pina Delgado,
da inocência na sua dimensão de in dubio pro reo, Rel: publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 76, 22 de dezembro
JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, de 2018, pp. 1824-1835, 5 e 6; Acórdão 29/2019 e Acórdão
nº 68, 25 de outubro de 2018, pp. 1639-1648, 1; Acórdão 39/2022, de 28 de outubro, Tecnicil Imobiliária e Alfredo
27/2018, de 20 de dezembro, Judy Ike Hills v. STJ, sobre de Carvalho v. PGR, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado
violação de garantia de inviolabilidade de domicílio, de no Boletim Oficial, I Série, N. 2, 5 de janeiro de 2023, pp.
correspondência e de telecomunicações e de garantia da 42-49, ii), estabelecendo claramente a distinção entre o
presunção da inocência na sua dimensão de in dubio pro objeto de recursos de amparo e o objeto de recursos de
reo, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, fiscalização concreta da constitucionalidade. Na medida
I Série, nº 11, 31 de janeiro de 2019, pp. 146-178, 1.1). em que a aplicação de qualquer ato normativo poderá ser
4.3. Por fim, tratando-se de recurso referente a questão impugnada através deste último recurso constitucional
suscitada em processo que corre os seus termos nos dificilmente se pode considerar o dispositivo legal que
tribunais regulado pelo artigo 5º, parágrafo primeiro, o exclui do objeto do recurso de amparo atos públicos como
prazo de interposição é de vinte dias contados da data de portador de um vício de inconstitucionalidade.
notificação da decisão que se recusou a reparar a violação
praticada, e por força do artigo 1º da Lei do Amparo e do 5.1. No caso concreto, o recorrente levou aparentemente
artigo 50 da Lei do Tribunal Constitucional, com suspensão para as conclusões, o segmento que delimita o recurso,
de contagem aos sábados, domingos e feriados, conforme três condutas:
remissão para o Código de Processo Civil. 5.1.1. O facto de o acórdão recorrido ter confirmado a
4.3.1. No caso em análise, o recorrente impugna o sua extradição, considerando que eventual violação de
Acórdão STJ 141/2021, datado de 21 de dezembro de 2021; obrigação de nomeação de intérprete geraria vício sanável
e não nulidade insanável, que, no caso concreto, por não
4.3.2. Conforme se depreende de certidão de notificação ter sido suscitada a tempo, já se havia convalidado;
juntada aos autos, o recorrente tomou conhecimento dessa
decisão no dia 31 de janeiro de 2022 e os seus mandatários 5.1.2. O facto de o acórdão recorrido ter confirmado a sua
no dia 21 do mesmo mês; extradição considerando de que o afastamento da regra
4.3.3. Considerando que o recurso de amparo deu da reciprocidade, apesar de se prever a possibilidade de
entrada na secretaria do Tribunal Constitucional no ele ser julgado em Cabo Verde por crimes cometidos no
dia 21 de fevereiro do mesmo ano, a tempestividade do país, seria possível por se tratar de mera faculdade e não
mesmo é evidente. de uma obrigatoriedade;
5. A construção adequada da peça ou o seu aperfeiçoamento 5.1.3. O facto de o acórdão recorrido ter confirmado a
permitem que o Tribunal Constitucional, antes de tudo, sua extradição, malgrado o Estado Requerente não ter

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1464 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

alegadamente apresentado garantias suficientes de que extraditar quem ainda não tenha sido condenado com
teria reconhecido um direito ao recurso ou a um novo decisão transitada em julgado em país estrangeiro. Disso,
julgamento. contudo, não decorre que os direitos constitucionais de
um extraditando se limitem aos artigos 30, 31 ou 36.
5.2. Dando-se por preenchida essa imposição legal que Não portando as garantias constantes do artigo 38 da
fixa o próprio objeto do recurso, caso ele seja admitido. Constituição, no geral, natureza processual, são aplicados
6. E, além disso, é determinante para se identificar os a esse tipo de processo, como a qualquer outro, as que
direitos potencialmente atingidos pela conduta lesiva, decorrem do número 1 do artigo 22 sobre o acesso à
uma etapa essencial para se verificar se a conduta em causa justiça, sobretudo a garantia de um processo equitativo,
é passível de ser amparada, do que depende, de uma parte, (…)” (Acórdão 39/2021, de 30 de agosto, Alex Saab v.
de estar em causa posição jurídica dependente de direito, STJ, referente à aplicação de normas inconstitucionais
liberdade ou garantia ou direito que se pode beneficiar do no julgamento de detenção de pessoa, no julgamento do
regime de proteção desta categoria de direitos, e, da outra, de, processo de extradição e na autorização de extradição e
em potência, ser ato que pode ser diretamente atribuível ao recusa de aplicação de norma hipotética decorrente de
órgão judicial recorrido por este poder ter responsabilidade instrumentos internacionais por inconstitucionalidade,
direta, imediata e necessária na sua violação, portanto de Red. JC Pina Delgado; JC Aristides R. Lima e JCP Pinto
esta poder ser-lhe imputável de alguma forma. Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 100, 15
de outubro de 2021, pp. 2508-2570, 1.2.4)
6.1. No caso concreto, o recorrente invoca vários direitos
que, por serem garantias fundamentais, associadas à 6.1.2. Daí, dar-se por preenchida essa exigência formal
liberdade sobre o corpo, ou direitos de proteção judiciária, incontornável, seja pela sua localização sistemática, seja
são passíveis de serem amparados, ainda que, conforme pela sua natureza intrínseca de garantias associadas ao
o Tribunal já havia decidido de acordo com a natureza direito à liberdade sobre o corpo, adaptadas à natureza
específica que a Constituição dá ao extraditando e não específica decorrente do estatuto constitucional do
a partir da utilização de uma analogia plena com os extraditando, ou de direitos análogos de proteção judiciária.
direitos do arguido. 6.1.3. Assim, dúvidas não persistirão de que são,
6.1.1. Lembre-se que a respeito esta Corte já havia respetivamente, direitos análogos e verdadeiras garantias
distinguido os regimes os respetivos regimes constitucionais fundamentais amparáveis.
quando asseverou que “[a]s indicações constitucionais a 6.2. A determinação final da ocorrência de violação
respeito do processo de extradição e do processo penal imputável ao órgão judicial recorrido é feita na fase
demonstram o desenvolvimento de regimes que, partindo de mérito. No momento de avaliação da presença dos
parcialmente da mesma base, são considerados como pressupostos e requisitos de admissibilidade basta que
situações que podem justificar a privação da liberdade o Tribunal avalie a possibilidade racional e abstrata de
natural da pessoa reconhecida pelo artigo 30: a sentença a conduta impugnada ser suscetível de ter sido praticada
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judicial condenatória por prática de atos puníveis com direta, imediata e necessariamente pela entidade recorrida.
a pena de prisão (para. 2), por um lado, ou o decurso de E, neste particular, sendo a única entidade recorrida nos
um pedido de extradição (parágrafo terceiro, alínea f)), do autos, o Egrégio STJ, pode-se considerar que:
outro. Neste sentido, têm um regime comum estabelecido
pelo mesmo artigo 30, nomeadamente os direitos previstos 6.2.1. A primeira conduta identificada, referente à
pelos seus números 4, 5 e 6, nomeadamente de a pessoa ser qualificação do vício de preterição de obrigação de nomeação
informada, de forma clara ou compreensível, das razões da de intérprete, não pode ser atribuída, nos termos em que
sua detenção e dos seus direitos constitucionais ou legais, foi construída, ao Egrégio STJ, porque este órgão judicial,
de ser autorizada a contatar advogado diretamente ou ao contrário do que o recorrente formula, não se ancorou
por intermédio da sua família ou de pessoa de confiança; na premissa de que a preterição de nomeação de intérprete
à identificação dos responsáveis pela sua detenção ou conduziria a vício sanável e não a nulidade insanável.
prisão e pelo seu interrogatório, e a que se comunique O que este Alto Tribunal salientou foi que, por um lado,
imediatamente à sua família ou pessoa por si indicada perante o contexto concreto do recorrente, em que ele
da privação da liberdade de que padece, com descrição confirmou estar em Cabo Verde desde 2017, ter cinco
sumária das razões que a motivaram. No mesmo sentido, empresas no país, as quais empregariam cerca de trinta
entende o Tribunal Constitucional que a qualquer pessoa pessoas, e conviver com companheira cabo-verdiana, e, do
detida, independente da razão reconduzir a qualquer outro, pelo facto de essa pretensa ilegalidade não ter sido
dos itens do número 3 do artigo 30 da Constituição caso suscitada pelo interessado perante a autoridade judiciária
sujeito a prisão preventiva ou similar, têm os direitos a quem foi presente no seguimento da sua detenção, como
previstos pelo artigo 31. E, finalmente, retomando-se as seria natural para quem não entende um idioma, não seria
formulações genéricas com o artigo 36, sobre o habeas situação de designação obrigatória de intérprete porque o
corpus, a fazer uso desse remédio constitucional para recorrente entendera os motivos da sua detenção.
proteção do seu direito à liberdade sobre o corpo. Entre
essas normas, todavia, há uma cisão regulatória entre Fica evidente que o ato praticado pelo órgão judicial
situações que potenciam a privação da liberdade pelo recorrido não foi aquele que foi impugnado pelo recorrente,
cometimento de crime promovidas por autoridades cabo- o que seria suficiente para não se a conhecer no mérito,
verdianas para efeitos de julgamento e execução internos, sem sequer considerar que a hipotética conduta assente
às quais são aplicáveis os artigos 32 a 35 a questões de na qualificação do vício que o imputaram ao STJ, mesmo
privação da liberdade, e as em que o Estado atua como tivesse sido praticada por essa entidade, requereria um
mero colaborador de iniciativas de perseguição criminal pedido de reparação porque, em tal situação, seria conduta
de outra entidade congénere, reguladas pelo artigo 38. originária do mesmo. Cai igualmente esta conduta,
Vários princípios consagrados nessas normas são regulados escusando-se o Tribunal Constitucional de tecer qualquer
ou aplicados com conteúdo diferente daquele acolhido consideração suplementar sobre a mesma.
pela disposição sobre a extradição, nomeadamente o 6.2.2. Já à conduta de o órgão judicial recorrido ter
artigo 33 que proíbe a aplicação de pena privativa de alegadamente confirmado a sua extradição considerando
liberdade com caráter perpétuo ou de duração ilimitada que o afastamento da regra da reciprocidade, apesar de se
ou indefinida, garantia que, nos termos do número 2 do prever a possibilidade de ele ser julgado em Cabo Verde
artigo 38, limita-se textualmente ao cidadão cabo-verdiano, por crimes cometidos no país, seria possível por se tratar
ou por exemplo, o que acolhe o princípio da presunção de mera faculdade e não de uma obrigatoriedade, não
da inocência, o qual não pode ser considerado de forma pode deixar de ser atribuída ao órgão judicial recorrido
extensa em sede de extradição sob pena de não se poder que, perante a alegação do recorrente em sede de recurso

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1465

ordinário, afirmou efetivamente que “a circunstância da expressa e formalmente invocada no processo logo que
lei ordinária prever que o autor dos factos também possa o ofendido tenha dela recebido comunicação, que se
ser julgado em território nacional (…) não obstaculiza a tenham esgotado as vias legais de recurso e que tenha
extradição”, posto ser caso de “faculdade, e não de uma sido requerida reparação.
obrigatoriedade”. Logo, “ainda que a causa pudesse ser julgada
em Cabo Verde não há nenhuma proibição de extradição”. 8.1. A lei coloca, deste modo, um ónus sobre o titular
do direito de suscitar a questão no processo logo que o
6.2.3. Por fim, em relação à ultima conduta remanescente ofendido tenha tido informação sobre o ocorrido, uma
que remete para a conduta do órgão judicial recorrido de ter exigência que depende de o recorrente ter tomado
confirmado a extradição do recorrente malgrado o Estado conhecimento da violação, nomeadamente através de
Requerente não ter alegadamente apresentado garantias comunicações judiciais ou de consultas aos autos, e de
suficientes de que teria reconhecido um direito ao recurso haver mecanismos processuais previstos para alegar o
ou a um novo julgamento, também é atribuível ao órgão que entender em sua defesa. Neste caso, as duas condutas
judicial recorrido, na medida em que este considerou que que ainda se mantém em discussão, referentes à garantia
não se estava perante situação prevista pelo artigo 32, de reciprocidade e à garantia de possibilidade de recorrer
parágrafo segundo, da Lei de Cooperação Judiciária em ou de obter um novo julgamento foram suscitadas desde
Matéria Penal porque o próprio recorrente terá dado a a primeira hora, constando tanto da peça de dedução de
conhecer que fez diligência no sentido de recorrer/obter oposição, como na peça de recurso.
novo julgamento junto dos tribunais do Reino Unido e
até à data não se havia demonstrado que tal lhe havia 8.2. De outra parte, dispõe o artigo 6º que “o recurso
sido recusado, sendo que as garantias dadas pelo Estado de amparo só poderá ser interposto depois de terem sido
Requerente seriam suficientes. esgotados todos os meios legais e todas as vias de recurso
ordinário estabelecidas pela respetiva lei de processo”.
7. Um pedido de amparo de que seja “revogado o acórdão
recorrido, por ser ilegal, inconstitucional, decidindo recusar 8.2.1. A fórmula utilizada vai num sentido extremamente
a extradição do recorrente requerida pelo Estado do Reino amplo porque referindo-se a meios legais abarca mecanismo
Unido, por não terem sido verificados e respeitados os que seja idóneo assegurar a defesa de direitos e interesses
pressupostos legais para a extradição”, o que deveria legítimos seja ela pré-decisório, decisório ou pós-decisório;
conduzir à “a soltura imediata do extraditando face à ordinário, extraordinário ou especial. Do que decorre o
nulidade da detenção e à falta dos requisitos do pedido”, efeito evidente de que, neste caso por motivos evidentes,
não é integralmente preciso, mas aceita-se na medida enquanto os mecanismos pré-decisórios de tutela através da
em que pretenderia que o Tribunal reconhecesse os seus submissão de requerimentos vários podem ser absorvidos
direitos, declarasse a nulidade do ato judicial recorrido e pela necessidade de recurso ordinário decorrente do
determinasse a sua soltura por detenção ilegal. segundo segmento da disposição, o facto de inexistirem
recursos ordinários disponíveis não isenta os titulares do
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7.1. O Ministério Público informa que, como o acórdão direito de terem de utilizar qualquer via legal decisória
que confirmou a decisão teria transitado em julgado, o prevista na respetiva lei de processo, desde que ela seja
recorrente, à data em que proferiu o seu parecer, já havia hábil a produzir o efeito de proteção do direito. Isso, na
sido removido para o Estado requerente, e considera medida em que preservado o poder jurisdicional do tribunal
que o pedido de revogação do acórdão recorrido que se recorrido em relação à questão colocada, por exemplo
deduz aparentemente não se integra nas finalidades uma nulidade, este possa revogar a sua própria decisão.
legais do recurso de amparo e ainda que “se admitisse
tal revogação, a consequência lógica e, processualmente, 8.2.2. Na situação concreta que temos em mãos, é
admissível nunca poderia ser sobre o mérito do pedido importante registar que sendo ao ato formal impugnado da
de extradição, mas sobre a violação ou não de direitos, autoria do Egrégio STJ, por motivos naturais já não cabia
liberdades ou garantias, impondo a respetiva reparação, recursos ordinários. E, neste caso, tampouco seria viável
caso se pronuncie por qualquer violação”. suscitar qualquer incidente pós-decisório de nulidade, posto
que isso dependeria de se atacar um mérito da própria
7.2. Porém, além de nada impedir que o Tribunal decisão nos segmentos relevantes em jeito de pedido de
escrutine, através de recurso de amparo, o mérito da reconsideração, o que não é propriamente a função de
própria decisão de extraditar, na medida em que ela se tais meios de reação. Portanto, dá-se por preenchida a
constitua na conduta lesiva de direito, o artigo 25, parágrafo exigência de esgotamento das vias legais de proteção de
primeiro, alínea b), da Lei do Amparo e do Habeas Data direitos, liberdades e garantias.
confere poderes ao TC para declarar nulo ou inexistente
o ato judicial impugnado, o que equivale a dizer que, em 8.2.3. Porém, dispõe ainda a lei constitucional aplicável
última instância, o efeito revogatório da decisão não está que o pedido de amparo contra condutas do poder judicial
excluído pela lei. Ademais, o artigo 24, parágrafo segundo, depende de ter “sido requerida reparação”, condição essencial
permite que o TC decrete a adoção de qualquer medida para, por um lado, garantir que os tribunais judiciais,
que julgue “adequada para restabelecer e garantir ao que também são órgãos de proteção de direitos, possam
recorrente o pleno exercício dos direitos, liberdades e reparar eventuais lesões que tenham ocasionado, e, do
garantias”. A qual pode ser acompanhada, nos termos outro, evitar que o Tribunal Constitucional seja inundado
da alínea f) do número 1 do artigo 25 da Lei do Amparo de súplicas de amparo que pudessem ter sido resolvidas
da indicação do “órgão, agente ou funcionário que deve e ultrapassadas através da intervenção dos tribunais
praticar ou abster-se de praticar os atos” referidos na judiciais e garantir que quando ele intervenha todos os
decisão. Logo, sempre haveria margem para o Tribunal argumentos já tenham sido apresentados e discutidos e
Constitucional, mesmo considerando as circunstâncias a questão já esteja estabilizada e amadurecida. Sendo
muito particulares deste caso, em que um recorrente, assim, tendo o Acórdão nº 11/2017, de 22 de junho, Maria
que tem um recurso constitucional pendente, é removido de Lurdes v. STJ, sobre violação do direito de constituir
do território cabo-verdiano, perdendo o Estado o controlo família por não reconhecimento de união de facto, Rel:
sobre o seu corpo, ainda poderá, além de eventualmente JC Pina Delgado, 1.2.2, assentado entendimento de que
determinar a existência da violação dos direitos, caso é mister verificar se uma imputação de vulneração de
ela exista, aplicar outras medidas que sejam ajustadas direito que é submetida foi precedida da colocação da
a remediar a situação. questão ao órgão judicial recorrido em moldes que este a
pudesse apreciar e reparar, a partir do Acórdão nº 13/2017,
8. Ademais, consideram-se pressupostos especiais de 20 de julho, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto
aplicáveis às situações em que o recurso de amparo é Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 47, 8 de
colocado contra conduta do poder judicial que ela seja agosto de 2017, pp. 1024-1029, esta Corte Constitucional

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1466 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

tem sustentado a imprescindibilidade de se confirmar o afastamento de reciprocidade e quando, mais à frente, na


que houve pedido de reparação, passando, já na fase de alínea o) e ss., insurgiu-se contra a consideração de que se
admissibilidade, a avaliar o cumprimento do disposto na tinha prestado garantias suficientes de que caberia recurso
alínea c) do número 1 do artigo 3 em conjugação com o ou realização de novo julgamento por impulso do recorrente.
disposto no artigo 6. Portanto, para haver esgotamento
das vias ordinárias de recurso é preciso que se prove ter 8.3.3. Tanto assim é que através de circunstanciado
invocado perante a instância recorrida a violação do direito arrazoado o órgão judicial recorrido apreciou os diversos
alegadamente violado em termos percetíveis, que se tenha fundamentos apresentados pelos recorrentes a respeito e
requerido a sua reparação, que a violação não tenha sido decidiu no sentido da sua não procedência, apresentando
reparada e que, no momento em que se requer o amparo para tanto as doutas razões que ora se discute.
ao Tribunal Constitucional, processos paralelos, passíveis 8.3.4. Como esta Corte Constitucional tem entendido,
de garantir a tutela do direito, não estejam a tramitar em do ponto de vista legal, a reparação pode tanto ser
qualquer outra instância (Acórdão 28/2020, de 24 de julho, pedida através de um requerimento autónomo, como
Alex Saab v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no poderá integrar qualquer meio processual ordinário ou
Boletim Oficial, I Série, N. 139, 23 de dezembro de 2020, incidente pós-decisório idóneo a garantir a proteção do
p. 2168-2172, d); Acórdão 57/2020, de 2 de dezembro, direito em causa. Por conseguinte, considera-se que, com
Alex Saab v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no as observações feitas, houve um pedido de reparação que
Boletim Oficial, I Série, N. 16, 12 de fevereiro de 2021, permitiu ao órgão judicial recorrido apreciar a possível
p. 565-573, d); Acórdão 40/2021, de 14 de setembro, vulneração de posição jurídica essencial.
Alex Saab v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no
Boletim Oficial, I Série, N. 100, 15 de outubro de 2021, p. 9. Sendo assim, dá-se por preenchidas todas as
2571-2579, d); Acórdão 45/2021, de 6 de outubro, Amadeu condições de admissibilidade em relação às duas condutas
Oliveira v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no identificadas, o que não significa que se tenha de admitir
Boletim Oficial, I Série, N. 100, 15 de outubro de 2021, p. o recurso neste particular. Nomeadamente porque pode
2604-2610, d); Acórdão 18/2023, de 1 de março, Gailson dar-se o caso de serem aplicáveis as causas especiais de
Centeio Gonçalves v. STJ, Inadmissão por Manifesta inadmissão previstas pelas alíneas e) e f) artigo 16 da
Inviabilidade do Recurso de Amparo e por Rejeição de Lei do Amparo e do Habeas Data, nomeadamente as de
Recurso com Objeto Substancialmente Igual, Rel: JCP manifestamente não estar em causa violação de direitos,
Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 32, liberdades e garantias ou de o Tribunal já ter rejeitado,
29 de março de 2023, pp. 824-831, 9.1, Acórdão 21/2023, por decisão transitada em julgado, recurso com objeto
de 6 de março, João Pedro Macedo v. STJ, [Inadmissão] substancialmente igual.
por Manifesta Inviabilidade do Recurso de Amparo e 9.1. De acordo com a primeira disposição, “o recurso não
por Rejeição de Recurso com Objeto Substancialmente será admitido quando (…) manifestamente não estiver
Igual, Rel: JCP Pina Delgado, publicado no Boletim em causa a violação de direitos, liberdades e garantias
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Oficial, I Série, N. 32, 29 de março de 2023, pp. 824-831, individuais constitucionalmente reconhecidos como
9.1; Acórdão 46/2023, de 4 de abril, Arlindo Teixeira suscetíveis de amparo”.
v. STJ, Admissão Parcial de Condutas Impugnadas e
Fixadas, Rel: JCP Pina Delgado, publicado no Boletim 9.1.1. A jurisprudência do Tribunal Constitucional nesta
Oficial, I Série, N. 44, 21 de abril de 2023, pp. 1055-1065, matéria percorreu um longo caminho desde a discussão
5.1.7; Acórdão 100/2023, de 15 de junho, Júlio Monteiro inicial que se travou no âmbito dos Autos de Amparo
v. TRS, Admissão a trâmite de conduta atribuída pelo Constitucional 1/2016 e que resultou no Acórdão nº 5/2016,
recorrente ao TRS de, através do Acórdão 116/2022, ter de 14 de março, Emílio Monteiro v. STJ, Rel: JCP Pinto
confirmado a condenação proferida pelo Juízo Crime do Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 35, 10
Tribunal da Comarca do Tarrafal, não obstante haver de maio de 2016, p. 1211-1221, e), e numa declaração de
uma suposta contradição na sentença por alegadamente voto assinada pelo JC Pina Delgado.
se ter dado por provado que o arguido segurou o pescoço
da ofendida porque tinha a intenção de a matar, o que 9.1.2. A partir deste debate incorporou-se o entendimento
terá determinado a sua condenação, e ao mesmo tempo se de que o recurso a essa causa de inadmissão requereria
ter dito na fundamentação da mesma que ele o terá feito que se demonstrasse a ausência de fundamentalidade do
para soltar o dedo que se encontrava na boca da vítima, direito invocado, a ausência de conexão entre parâmetros
Rel: JCP Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I de escrutínio convocáveis e as condutas impugnadas e a
Série, N. 69, 22 de junho de 2023, pp. 1377-1387, 9.2). inviabilidade manifesta das pretensões do recorrente, que
se manifestaria nas circunstâncias em que todos os juízes
Havendo, por motivos evidentes, flexibilidade para se estivessem seguros de que a causa estava condenada a
o fazer através de meios ordinários ou extraordinários, fracassar no mérito, não havendo a mínima centelha de
é exigência incontornável que se assim se proceda, tanto poder ser estimado, caso admitido.
nos casos em que se se lhe atribui uma violação por ação, 9.1.3. Esta posição foi assumida plenamente pelo
como uma violação por omissão. Acórdão 13/2017, de 20 de julho, Arlindo Teixeira v. STJ,
8.3. Nesta situação concreta, o que se observa é que Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I
a lesão do direito – a ter ocorrido – através das duas Série, N. 47, 8 de agosto de 2017, pp. 1024-1029, e); e
condutas que ainda podem ser discutidas, são passíveis de seguidamente pelo Acórdão nº 3/2019, de 24 de janeiro,
serem atribuídas ao Egrégio STJ, mas foram promovidas Ramiro Rodrigues v. TRB, Rel: JCP Pinto Semedo,
originariamente pelo TRB. publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 28, de 13 de
março de 2019, p. 493-499, e); pelo Acórdão nº 23/2019,
8.3.1. Por conseguinte, era exigência incontornável de 27 de junho, Osmond Nnaemeka Odo v. STJ, Rel: JCP
que pedido de reparação se seguisse a esse ato judicial Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
na sequência da sua notificação ao recorrente. 79, de 22 de julho de 2019, p.1232-1236, e); pelo Acórdão
24/2019, de 4 de julho, Leny Martins e Fernando Varela
8.3.2. O que se observa do autuado e transcrito para v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim
a própria decisão recorrida e se depreende dos autos do Oficial, I Série, N. 100, 26 de setembro de 2019, p. 1580-
processo principal é que o recorrente pediu reparação 1585, e), sendo que nestes três últimos casos, apesar da
pela alegada prática dessas condutas ao Egrégio STJ em viabilidade extremamente reduzida, optou-se por se admitir
termos muito similares aos que trouxe a esta Corte em o recurso, posto não haver segurança total a respeito da
relação às duas questões ainda em análise. Nomeadamente, improcedência do pedido. Porém, em relação aos que já
quando, na alínea f) e ss. das suas conclusões, alega contra foram apreciados, conduzindo a decisão de improcedência

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1467

no mérito (Acórdão 36/2022, de 12 de agosto, Ramiro dele constar a expressão “salvo o disposto no número 3
Rodrigues v. TRB, sobre violação do direito de acesso à do artigo 3º, as quais remetem, nomeadamente, para a
justiça e à tutela jurisdicional efetiva por não-admissão situação que releva para apreciar este recurso de a falta
de recurso designado pelo recorrente de amparo ordinário de reciprocidade não impedir a satisfação de um pedido
por tribunal judicial, Rel: JC Pina Delgado, publicado no de cooperação, desde que esta se mostre aconselhável em
Boletim Oficial, I Série, N. 2, 5 de janeiro de 2023, pp. razão da natureza do facto ou de necessidade de lutar
36-42; Acórdão 26/2019, de 9 de agosto, sobre violação do contra certas formas graves de criminalidade, do artigo
direito à liberdade, da garantia de presunção de inocência 8º, parágrafo primeiro, resulta que “pode ser negada a
e da garantia de não ser mantido em prisão preventiva cooperação quando o facto que o motiva for objeto de
fora dos prazos legais, Rel: JC Pina Delgado, publicado no processo pendente ou quando esse facto deva ou possa
Boletim Oficial, I Série, N. 100, 24 de setembro de 2019, ser objeto de procedimento da competência de uma
pp. 1590-1595). A estes se junta o mais recente Acórdão autoridade judiciária cabo-verdiana”. Por conseguinte,
49/2022, de 12 de dezembro, Rel: JCP Pinto Semedo, não há nenhuma ligação entre uma causa e a outra,
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 2, 5 de janeiro na perspetiva de que a não garantia de reciprocidade
de 2023, pp. 92-96, que foi admitido in extremis porque vedaria a prestação de cooperação em casos nos quais
nem todos os juízes ficaram convictos que o pedido era as autoridade cabo-verdianas teriam competência para
manifestamente inviável, mas pouco tempo depois foi julgar determinado crime.
julgado improcedente pelo Acórdão 1/2023, de 17 de
janeiro, por confirmação de sentença condenatória a pena 9.1.8. Individualmente consideradas essas causas de
de reclusão em situação em que não terá ficado provado negação de cooperação judiciária em matéria penal não
que soubesse que a ofendida era menor de catorze anos, projetam desde logo qualquer fundamentalidade, no sentido
por alegada violação do direito à presunção de inocência de estarem ligadas a direitos subjetivos do recorrente,
do arguido, Ivan Furtado v. TRB, Rel: JC Pina Delgado, não parecendo estar em causa lesão direta de direito,
Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I liberdade e garantia, até porque a Lei Fundamental não
Série, N. 25, 13 de março de 2023, pp. 680-683). proíbe de forma direta a extradição em tais circunstâncias;
e, se está, o recorrente, não logrou demonstrá-lo de forma
9.1.4. Já no Acórdão nº 12/2022, de 8 de março, António cabal e percetível aos juízes do TC. Não havendo qualquer
Monteiro v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no garantia subjetivável nesta matéria, não há uma questão
Boletim Oficial, I Série, N. 35, 5 de abril de 2022, p. de lesão de direitos que possa ser arguida em sede de
909-915, e), considerou-se que manifestamente não era recurso de amparo.
viável violação da garantia de não ser mantido em prisão
preventiva sem proferimento de despacho de pronúncia, Em relação à questão específica da reciprocidade, a qual
em situação em que, embora este não tenha sido notificado projetando-se num quadro relacional de duas entidades
ao recorrente, foi proferido dentro do prazo legal de oito com personalidade jurídica internacional, do qual não
meses, e no Acórdão nº 27/2022, de 24 de junho, Gilson resultam efeitos subjetivos, o único parâmetro constitucional
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Vieira v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim geral que poderia acolher a pretensão do recorrente seria
Oficial, I Série, N. 94, 28 setembro de 2022, p. 1916-1921, o princípio da reciprocidade de vantagens previsto pelo
e), não se admitiu uma das condutas impugnadas por artigo 11, parágrafo primeiro, da Constituição. Porém,
considerar que era manifestamente inviável que tivesse além de a sua dimensão meramente objetiva não admitir
violado direito, liberdade ou garantia. impugnações de amparo, devendo, em tais casos serem
colocadas através de recursos de fiscalização concreta da
9.1.5. De todo esse debate emerge que a causa de constitucionalidade (Acórdão 11/2017, de 22 de junho,
admissibilidade da alínea e) do artigo 16 da Lei do Amparo Maria de Lurdes v. STJ, sobre violação do direito de
e do Habeas Data permite que se antecipe a falta de constituir família por não reconhecimento de união de
mérito de um pedido de amparo nos casos em que ele não facto, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial,
esteja devidamente ancorado numa posição jurídica que I Série, N. 42, 21 de julho, pp. 933-950 e na Coletânea de
remeta a um direito amparável (“fundamentalidade”); Decisões do Tribunal Constitucional de Cabo Verde, Vol.
em que entre as condutas impugnadas e os parâmetros III, Praia, INCV, 2018 (2017), pp. 423-477, 20.1; Acórdão
indicados não exista uma ligação lógica (“conexão”) ou que 29/2017, de 5 de dezembro, Ovídio de Pina v. STJ, Rel: JC
perfunctoriamente se consiga concluir que, de forma clara, Aristides R. Lima, publicado no Boletim Oficial, I Série,
não há qualquer hipótese de o recurso ser procedente no N. 6, 1 de fevereiro de 2018, pp. 75-93, 20.1; Acórdão
mérito (“viabilidade”), o que pode acontecer quando todos 06/2018, de 22 de março, Adilson Danielson v. STJ, Rel:
os juízes tiverem acesso aos autos e puderem analisar todos JC Pina Delgado, Boletim Oficial, I Série, N. 21, de 11 de
os elementos pertinentes e mostrarem-se confortáveis em abril de 2018, pp. 495-505, 2; Acórdão 18/2020, de 12 de
antecipar o julgamento de mérito da questão, tornando junho, Kevin Rodrigues e Leonardo da Cruz v. STJ, Rel:
inócuo qualquer juízo subsequente. JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série,
9.1.6. Neste caso concreto se isso não se pode dizer, N. 65, 19 de outubro de 2018, pp. 1610-1615, e). Acórdão
nesta fase, da conduta que se consubstancia na alegada 27/2018, de 20 de dezembro, Judy Ike Hills v. STJ, sobre
inadequação das garantias prestadas pelo Reino Unido violação de garantia de inviolabilidade de domicílio, de
de que o recorrente teria a oportunidade de recorrer e/ correspondência e de telecomunicações e de garantia da
ou quiçá de obter um novo julgamento, impugnação que presunção da inocência na sua dimensão de in dubio pro
mantém a sua viabilidade nesta fase em que o Tribunal reo, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial,
Constitucional ainda não pôde apreciar nem a peça em I Série, N. 11, 31 de janeiro de 2019, pp. 146-178, 2.1.1;
que se prestou a garantia, nem tampouco as disposições Acórdão 33/2018, de … Maria de Fátima Fontes v. JTTJCP,
do direito do país requerente, Rel. JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I
Série, N. 88, 16 de dezembro de 2021, pp. 2292-2299), o
9.1.7. O mesmo já não acontece com a conduta supostamente Tribunal Constitucional já havia assentado que a solução
relacionada à garantia de reciprocidade, a qual o Tribunal de afastamento legal da reciprocidade, “[primeiro, (…)
teve dificuldades extremas de entender. Pela singela de forma convergente com a Lei Fundamental, atribui
razão de que parece haver uma mistura entre duas tal apreciação a uma autoridade política, o Ministro da
causas autónomas de denegação de cooperação judiciária Justiça, que, ainda na fase administrativa do processo
em matéria penal, mas que, em retrospetiva, poderá ter de extradição passiva, em que pode fazer juízos de
resultado de estratégia da defesa. Com efeito, se o artigo oportunidade e de conveniência política quando pondera
6º, parágrafo quarto, dispõe que “o pedido de cooperação sobre a satisfação de um pedido de extradição, pode e
é ainda recusado quando não estiver em causa garantia deve balancear os vários objetivos de política externa
de reciprocidade”, instituindo, no entanto, exceções ao

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1468 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

que podem recomendar ou não o prosseguimento da De resto, mesmo que se possa dizer que a discricionariedade
extradição, nomeadamente todos os que decorrem do que é garantida às autoridades para negar a extradição
artigo 11. Segundo, permite-se a essa mesma entidade nesses casos é sindicável no seu mérito, seria sempre
satisfazer o pedido sem solicitar reciprocidade se, dentre situação de utilização de controlo lasso de cariz negativo
outras circunstâncias, se tal se mostrar aconselhável em (Acórdão 6/2018, de 22 de março, Adilson Danielson v.
razão da natureza do facto ou da necessidade de lutar STJ, sobre a violação dos direitos a não se ser discriminado,
contra certas formas graves de criminalidade, algo que, à liberdade do corpo e à presunção da inocência, Rel:
caso a caso, e de acordo com essas balizas, ele determina, JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série,
assim não se aplicando a norma do número 4 do artigo 6º, N. 21, 11 de abril de 2018, pp. 495-505, 5; Acórdão
primeiro segmento, que sujeita a cooperação judiciária à 13/2018, de 7 de junho, Manuel Fonseca v. STJ, sobre
reciprocidade, na medida em que o disposto na parte final violação da garantia de presunção da inocência na sua
do mesmo preceito e no número 3 do artigo 3º constitui- dimensão de in dubio pro reo e da garantia contra a
se em exceção a esta regra. O Tribunal Constitucional retroatividade da lei penal prejudicial ao arguido, Rel:
considera que essa norma que permite que a ausência JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série,
de reciprocidade não impeça a concessão de extradição, N. 49, 20 de julho de 2018, pp. 1277-1285, 4; Acórdão
estando presentes determinadas circunstâncias, não é 20/2018, de 16 de outubro, Uchechukwu Vitus Ezeonwu
desconforme ao princípio da reciprocidade de vantagens”. e Chijioke Duru v. STJ, sobre violação da garantia de
presunção da inocência na sua dimensão de in dubio pro
9.1.9. No que diz respeito ao argumento da competência reo, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial,
dos tribunais cabo-verdianos, há, com efeito, uma tentativa I Série, N. 68, 25 de outubro de 2018, pp. 1639-1648, 5;
de encontrar alguma base de subjetivação quando o Acórdão 27/2018, de 20 de dezembro, Judy Ike Hills v.
recorrente diz que se estaria defronte de situação em STJ, sobre violação de garantia de inviolabilidade de
que os tribunais cabo-verdianos teriam competência domicílio, de correspondência e de telecomunicações e
“para investigar e punir o extraditando”, sugerindo que de garantia da presunção da inocência na sua dimensão
uma associação com o direito do recorrente ser “julgado de in dubio pro reo, Rel: JC Pina Delgado, publicado no
cuja competência resulta da lei, assegurando, assim[,] Boletim Oficial, I Série, N. 11, 31 de janeiro de 2019, pp.
um julgamento justo e equitativo”. Contudo, as vias 146-178, 2.1.3; Acórdão 5/2021, de 25 de janeiro, Évener
abertas por essa argumentação, no geral, não conduzem a de Pina v. STJ, sobre violação da garantia à presunção
qualquer violação dessa garantia porque os juízes ingleses da inocência e da garantia ao contraditório, Rel: JC Pina
não deixam de também serem competentes para julgar Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 25, 8
o recorrente. O que o recorrente poderia estar a invocar de março de 2021, pp. 850-861, 2.1.3; Acórdão 43/2022,
quando assevera que seria muito grave que tendo o Estado de 4 de outubro, Amadeu Oliveira v. Supremo Tribunal
de Cabo Verde tomado conhecimento da prática de um de Justiça, sobre a violação do direito à liberdade sobre
crime no território nacional ainda assim extraditasse o corpo, Rel: JC Aristides R. Lima, publicado no Boletim
o suposto criminoso, seria uma preferência baseada no
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Oficial, I Série, N. 2, 5 de janeiro de 2023, 62-71, 4.3.1<,


princípio da soberania num caso de suposta concorrência Acórdão 1/2023, de 17 de janeiro, Ivan dos Santos v.
entre um tribunal nacional e um tribunal estrangeiro. TRB, por confirmação de sentença condenatória a pena
de reclusão em situação em que não terá ficado provado
Mas, essa já não é uma questão de direitos, remetendo que soubesse que a ofendida era menor de catorze anos,
a mera e putativa incompatibilidade de norma com um por alegada violação do direito à presunção de inocência
princípio objetivo da Constituição, que não foi arguida do arguido, Rel: JCP Pina Delgado, publicado no Boletim
através do processo próprio. Em matéria sobre o qual a Oficial, I Série, N. 25, 13 de março de 2023, 680-683;
lei tomou posição ao não instituí-la como uma obrigação, Acórdão 81/2023, de 22 de maio, José Eduíno v. STJ, Rel:
limitando-se a explicitar, como bem disse o STJ, uma JC Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série,
clara faculdade expressa pela fórmula “pode ser negada N. 66, 15 de junho de 2023, pp. 1376-1384, 13), o qual
a cooperação quando o facto que a motiva (…) possa somente poderia conduzir à determinação de violação de
também ser objeto de procedimento de competência qualquer direito se resultasse de um juízo arbitrário por
de uma autoridade judiciária cabo-verdiana”, num ser contraditório, ilógico ou insuscetível de ser justificado.
dispositivo, o artigo 8º, parágrafo primeiro, da Lei de
Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal
sugestivamente intitulado de “denegação facultativa de No caso concreto, é evidente não haver qualquer
cooperação internacional”. Destarte, nunca seria exigível contradição. Ao contrário do que o recorrente quer fazer
uma interpretação que transformasse a expressão “pode ser crer, em nenhum momento o órgão judicial recorrido disse
negada” inserta num preceito que indica expressamente a que o crime tinha sido praticado em Cabo Verde. Ao dizer
natureza facultativa do instituto (“denegação facultativa”) que “a circunstância de a lei ordinária prever que o autor
numa obrigação de negação de extradição, e que obrigasse dos factos também possa ser julgado em território nacional,
o órgão judicial recorrido a promover interpretação mais conforme refere o recorrente [parte cortada pela citação
conforme a suposto direito subjetivo que a pessoa tivesse do peticionário], não obstaculiza a extradição”, limitou-
em tais situações. se, como em muitas ocasiões já havia feito o Tribunal
Constitucional e muitos outros, a retomar os argumentos
Aliás, de um ponto de vista do direito ordinário, se do recorrente antes de apresentar a sua posição sobre a
o tribunal recorrido se deixasse atrair pelas teses do questão, o que não gera qualquer contradição (Acórdão
recorrente, muitas situações haveria em que seria 47/2021, de 13 de outubro, Alex Saab v. STJ, Referente
impossível a extradição de pessoas procuradas ou já a Arguição de Nulidade do Acórdão 39/2021, de 30 de
condenadas em outros países. Bastaria invocar o artigo 4º agosto, por alegadas nulidades na tramitação processual,
do Código Penal, que confere competência extraterritorial nulidades do acórdão e violação de princípios jurídicos,
em matéria penal aos tribunais cabo-verdianos para julgar Red. JC Pina Delgado; JC Aristides R. Lima; JCP Pinto
os mais diversos delitos, nomeadamente quando resulta Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 100,
de obrigação convencional de julgar, para que crimes 15 de outubro, pp. 2619-2636, 6.5.2) por depois expor
cometidos no estrangeiro por não-nacionais – em situações a própria posição do órgão judicial recorrido quando
nas quais não se aplica nem o critério territorial de fixação disse que “[o] preceituado no artigo 3º[,] alínea c) [da
da jurisdição criminal, nem o critério da nacionalidade LCJIMP] é uma faculdade, e não uma obrigatoriedade.
assente na personalidade ativa ou sequer o da passiva, Ainda que a causa pudesse ser julgada em Cabo Verde,
mas o que autoriza o exercício limitado de jurisdição não há nenhuma proibição à extradição”. Neste sentido,
universal pelos tribunais cabo-verdianos – para que a simplesmente sublinhando que ainda que fosse uma
pessoa não pudesse ser extraditada. espécie de crime que os tribunais têm jurisdição, ainda

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1469

assim a extradição não seria vedada. O que é bem diferente III. Decisão
do que vem sugerir perante este Tribunal, torcendo o
sentido das expressões inseridas no acórdão recorrido. Pelo exposto, os juízes do Tribunal Constitucional reunidos
Muito menos o raciocínio que o suporta a decisão de não em plenário decidem admitir a trâmite o recurso de amparo
negar a extradição nesse caso pode ser tido por ilógico, impetrado contra o Acórdão 141/2021, prolatado pelo
posto fazer sentido extraditar alguém para ser julgado STJ, que confirmou a extradição do recorrente, malgrado
no seu próprio país, onde já tinha sido condenado pela o Estado Requerente não ter alegadamente apresentado
prática de outro delito, somente pelo facto de outros garantias suficientes de que teria reconhecido um direito ao
crimes eventualmente de que está a ser processado no recurso ou a um novo julgamento, por eventual violação do
país requerente poderem ser também da competência direito de recurso e do direito à defesa em processo penal.
dos tribunais cabo-verdianos. E sequer insuscetível de Registe, notifique e publique.
ser justificado racionalmente por essas mesmas razões. Praia, 26 de junho de 2023
9.2. O que também é reforçado em razão da segunda José Pina Delgado (Relator)
causa, que, dependendo de redação segundo a qual “o Aristides R. Lima
recurso não será admitido quando (…) o Tribunal tiver
rejeitado, por decisão transitada em julgado, um recurso João Pinto Semedo
com objeto substancialmente igual” permite utilizar Está conforme
a jurisprudência do Tribunal para, ainda na fase de
admissibilidade, antecipar uma decisão conforme, poupando Secretaria Judicial do Tribunal Constitucional, aos 26
o Coletivo de ter de admitir um recurso à partida fadado de junho de 2023. — O Secretário, João Borges.
a não obter provimento. ––––––
9.2.1. Também a este respeito o Tribunal Constitucional Cópia:
já havia travado algum debate no âmbito dos Autos de Do acórdão proferido nos autos de Recurso de Amparo
Recurso de Amparo 6/2016, o qual conduziu à adoção Constitucional n.º 16/2023, em que é recorrente Braime
do Acórdão 3/2017, de 15 de fevereiro, Rel: JCP Pinto Hilique Semedo Tavares e entidade recorrida o Supremo
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 10, 27 Tribunal de Justiça.
de fevereiro de 2017, pp. 266-271, e a um voto vencido
do JC Pina Delgado. Acórdão n.º 106/2023
(Autos de Amparo 16/2023, Braime Hilique Semedo
9.2.2. A que se seguiu a prolação do Acórdão nº 12/2022, Tavares v. STJ, Inadmissão por não aperfeiçoamento das
de 8 de março, António Monteiro v. STJ, Rel: JCP Pinto insuficiências de que o recurso padece)
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 35, 5
de abril de 2022, p. 909-915, e), em que se recorreu por I. Relatório
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unanimidade à alínea f) do artigo 16 da Lei do Amparo 1. O Senhor Braime Hilique Semedo Tavares, interpôs
e do Habeas Data para não se admitir um recurso de recurso de amparo impugnando o Acórdão STJ 53/2023, de 29
amparo, remetendo a decisões de mérito em que se rejeitou, de março, sumarizando da seguinte forma os seus argumentos:
por decisão transitada em julgado, recursos com objeto
substancialmente igual. 1.1. Quanto aos factos, que teriam sido dados como
provados, destaca que:
9.2.3. Do que decorre que em situação nas quais exista 1.1.1. O recorrente, enquanto arguido, foi condenado
jurisprudência sedimentada do Tribunal Constitucional em no PCO nº 190/20-21 pelo 3º Juízo Crime do Tribunal
relação a uma determinada matéria e ocorrendo interposição Judicial da Comarca da Praia, na pena única de 11 anos e
de recurso de amparo com objeto substancialmente igual 11 meses de prisão, resultante do cúmulo jurídico das penas
considerando o pedido e a causa de pedir, seria legítimo de cinco anos de prisão pelo crime de roubo com violência
a esta Corte não-admitir o recurso com fundamento na sobre pessoas, cinco anos de prisão pelo crime de arma de
inutilidade da admissão do recurso de amparo por força guerra e três anos de prisão por um crime de armas;
da existência de orientações firmes e assentadas já
manifestadas em outros acórdãos de mérito. 1.1.2. Porque, em síntese, segundo o narrado na sua
petição inicial, após a detenção do arguido Bruno pela PN
9.2.4. E esta reforçaria a exclusão da conduta referente no dia 1 de novembro pelas 20:30, por estar na posse de
à reciprocidade, pelo menos na medida em que o Acórdão uma arma de fogo “boka bedjo” a ameaçar moradores da
39/2021, de 30 de agosto, Alex Saab v. STJ, referente à Várzea, este disponibilizou-se a colaborar com os agentes
aplicação de normas inconstitucionais no julgamento levando-os à residência do Osvaldir;
de detenção de pessoa, no julgamento do processo de
extradição e na autorização de extradição e recusa de 1.1.3. Ali chegados, com o consentimento da testemunha
aplicação de norma hipotética decorrente de instrumentos Neémia, os agentes da PN entraram e procederam a uma
internacionais por inconstitucionalidade, Red. JC Pina busca domiciliária no local que culminou com a apreensão
Delgado; JC Aristides R. Lima e JCP Pinto Semedo, de três armas de fogo, um cartuxo de 12mm e várias peças
9.6, reconheceu forte discricionariedade às autoridades utilizadas no fabrico de “bo[k]a bedjo”;
nacionais para ponderar os casos em que haveria dispensa 1.1.4. Entretanto, na sequência das buscas e apreensões
de reciprocidade, o que, em certa medida, ainda que feitas pela PN, o recorrente foi submetido a uma revista
por si só não conduza a causa de inadmissão, reforça o de segurança pessoal e acabou por ser detido por ter sido
argumento de que manifestamente não há violação de encontrado na sua posse uma arma de fogo de 9mm;
direito, liberdade e garantia. 1.1.5. O recorrente refere-se ao assalto perpetrado por ele
10. Sendo assim, somente uma conduta deve ser e pelo arguido Cleidir Gomes contra o Sr. António Mendes
admitida a trâmite: Lopes e à sua família em Ponta de Água, quando estes
voltavam do aeroporto, em que o Cleidir terá disparado
10.1. O facto de o Acórdão 141/2021, prolatado pelo a arma de fogo que tinha em sua posse contra a perna
STJ, ter confirmado a extradição do recorrente, malgrado do Sr. António por este ter oferecido resistência quando
o Estado Requerente não ter alegadamente apresentado lhes foram retiradas as malas contendo a sua bagagem;
garantias suficientes de que teria reconhecido um direito
ao recurso ou a um novo julgamento; 1.1.6. Após apoderarem-se dos pertences do ofendido,
os meliantes puseram-se em fuga em direção à casa do
10.2. Por eventual violação do direito de recurso e do arguido Estivy Barbosa que aceitou guardar as malas
direito à defesa em processo penal. mesmo sabendo que poderiam ter sido roubadas;

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1470 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

1.1.7. Na sequência do assalto, foi acionada a polícia, 1.4.2. Julgado procedente e, em consequência, lhe seja
que seguiu o trajeto indicado pela testemunha Jaírson concedido o amparo constitucional dos seus direitos ao
e deteve os assaltantes, acabando ainda por localizar e contraditório e a um julgamento justo e equitativo;
apreender os bens dos assaltados, com o auxílio do Cleidir 1.4.3. E que seja oficiado o Supremo Tribunal de Justiça
e da testemunha Ricardo; para juntar a estes autos a certidão de todo o processo
1.1.8. De seguida, transcreve para a sua peça um conjunto de recurso ordinário.
de factos que alega que durante o julgamento o Tribunal 2. Cumprindo o estabelecido no artigo 12 da Lei n.º
da Comarca da Praia teria dado como não provados; 109/IV/94, de 24 de outubro, foram os autos com vista
1.1.9. Inconformado com a decisão do tribunal de primeira ao Ministério Público para emissão de parecer sobre
instância interpôs recurso para o Tribunal da Relação a admissibilidade do recurso, tendo-o feito S. Excia. o
de Sotavento (TRS) sustentando que teria havido uma Sr. Procurador-Geral da República, o qual articulou os
incorreta apreciação dos factos dados como provados na seguintes argumentos:
audiência de julgamento do dia 20 de setembro de 2021, 2.1. Não tendo o recorrente juntado aos autos qualquer
mas o mesmo foi julgado improcedente, confirmando-se documento comprovativo da data em que lhe foi notificado
a decisão recorrida. Continuou a arguir, desta feita, o acórdão recorrido, caso se confirme que teria sido no dia
perante o STJ, a incorreta interpretação que o TRS 12 de abril de 2023, o recurso revelar-se-ia tempestivo;
teria lançado ao número 3 do artigo 452-A do CPP ao
sustentar que, caso quisesse pôr em causa matéria de 2.2. Além disso, o recorrente estaria provido de
facto, deveria fazê-lo adequadamente, o que não teria legitimidade por ser pessoa direta, atual e efetivamente
sucedido. Esse tribunal julgou parcialmente procedente afetada pela decisão recorrida;
o pedido, diminuindo a pena aplicada, mas confirmando 2.3. A decisão impugnada foi proferida pelo STJ em autos
o restante da decisão do TRS. de recurso ordinário e por isso estariam esgotados todos
1.2. Do ponto de vista do direito, destaca que: os meios de defesa dos direitos, liberdades e garantias
estabelecidos na lei do processo;
1.2.1. Discorda da decisão do STJ na parte em que 2.4. No entanto, entende que o requerimento apenas
terá alegado que ele só teria procurado pôr em causa cumpriria em parte o disposto nos artigos 7º e 8º da Lei
a prova feita em julgamento “sem, contudo, seguir os do Amparo, porque não lhe pareceu que a identificação
procedimentos impostos pela lei, mais concretamente, do objeto do recurso seria “concebível” e nem o amparo
pelo artigo 452º, nº 38[,] do CPP, razão pela qual, nem se solicitado “credível”.
debruçou sobre a matéria, tendo-se limitado a confirmar
a decisão da primeira instância”; 2.5. Não lhe terá parecido que a construção do objeto
de recurso feita pelo recorrente seria merecedora de
1.2.2. Isto, porque, segundo diz, “desde a sua primeira acolhimento, nem a invocação das supostas violações
reação, através do recurso contra a decisão recorrida, e princípios constitucionais de contraditório e de um
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fez questão de transcrever os fatos discordantes, bem julgamento justo e equitativo.


como, as contradições havidas, tendo-se preocupado em
enumerar todos os intervenientes e o tempo real de suas 2.6. Por isso é de parecer que o presente recurso
intervenções, para que dúvidas não restassem sobre de amparo não preencheria todos os pressupostos de
os concretos pontos de fato que considera terem sido admissibilidade, por manifesta carência de objeto.
incorretamente julgados”; 3. Marcada sessão de julgamento para o dia 8 de junho
1.2.3. Defende, com base na doutrina de Germano de 2023, nessa data se realizou, com a participação dos
Marques da Silva, que apesar do imperar no nosso Venerandos Juízes-Conselheiros e do Senhor Secretário do
sistema processual o princípio da livre apreciação de TC, depois de apreciada a conformidade formal e material
prova, conforme o disposto nos artigos 174º e 177º do da peça ficou prejudicada a análise de admissibilidade,
CPP, “não pode corroborar [seria aceitar?] que seja feita lavrando-se no Acórdão 98/2023, de 14 de junho, Braime
a apreciação arbitrária da prova, pois que, assim como, os Hilique Semedo Tavares v. STJ, Aperfeiçoamento por
intervenientes processuais estão vinculados ao dever de se Deficiente Indicação da(s) Conduta(s) Impugnada(s);
chegar à verdade material, o julgador está vinculado aos falta de especificação do amparo pretendido e Omissão de
princípios em que se consubstancia o direito probatório”; Junção de Documentos Essenciais à Instrução do Pedido,
Rel: JCP Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial,
1.2.4. Alude que entre os factos anómalos ocorridos I Série, N. 69, 22 de junho de 2023, pp. 1369-1372, a
durante a audiência de julgamento, a situação mais grave necessidade de aperfeiçoamento do recurso em razão da
terá sido aquela em que o arguido Cleidir, que, na fase da sua obscuridade e deficiente instrução.
instrução, teria dito que no momento do assalto estava na
companhia do recorrente, em audiência de julgamento veio 3.1. No essencial, decidiu-se, ao abrigo do artigo 17
negar tais factos, alegando ter sido vítima de chantagem da Lei do Amparo e do Habeas Data, “determinar a
por parte do arguido Estivy, tendo, no entanto, o tribunal notificação do recorrente para aperfeiçoar o recurso: a)
ignorado tais declarações; Clarificando a(s) conduta(s) que pretende que o Tribunal
escrutine; b) Especificando qual o amparo que pretende
1.2.5. Por isso, entende que o Acórdão do STJ terá que lhe seja outorgado para que sejam restabelecidos os
violado o princípio do contraditório, e ainda, o princípio seus direitos fundamentais alegadamente violados; c)
do in dubio pro reo, “que consubstancia o da presunção Juntando a certidão de notificação do acórdão recorrido,
de inocência e que advém do direito a uma defesa justa e, d) Carreando para os autos a sentença do tribunal
e equitativa que assiste a todo o cidadão”, consagrados de instância, o acórdão do TRS e todas as peças em que
nos artigos 15º, 16º, 22º e 35º da CRCV. terá suscitado as questões referentes à violação dos seus
1.3. No tocante ao cumprimento das condições de direitos constitucionalmente estabelecidos, nomeadamente
admissibilidade, assevera ter esgotado todos os meios os recursos ordinários que interpôs”.
legais de defesa dos seus direitos e todas as vias de recurso 3.2. Disso o recorrente foi notificado no dia 14 de junho,
ordinário previstos no nosso ordenamento jurídico, porque conforme consta da f. 64 dos Autos;
as questões suscitadas no âmbito do presente processo 3.3. Até ao dia em que realizou novo julgamento para se
já tinham sido objeto de recurso. apreciar a admissibilidade do recurso por ele protocolado
1.4. Conclui pedindo que o presente recurso de amparo nenhuma peça tinha entrado ou documento juntado.
seja: 4. Marcada sessão final de julgamento para o dia 23
1.4.1. Admitido; de junho, nessa data se realizou, com a participação dos

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1471

Venerandos Juízes-Conselheiros e do Senhor Secretário do Cópia:


TC, dela decorrendo a decisão que se segue acompanhada
dos fundamentos articulados infra. Do acórdão proferido nos autos de Recurso de Amparo
Constitucional n.º 17/2023, em que é recorrente Alberto
II. Fundamentação Monteiro Alves e entidade recorrida o Tribunal da Relação
1. Conforme consta do relatório, o recurso foi objeto de de Barlavento.
uma decisão de aperfeiçoamento, determinando-se que o Acórdão n.º 107/2023
recorrente suprisse deficiências da petição que impediam
o Tribunal Constitucional de avaliar a admissibilidade (Autos de Amparo 17/2023, Alberto Monteiro Alves v.
do recurso, no sentido de clarificar a(s) conduta(s) que TRB, Aperfeiçoamento por Não-Junção de Documentos
pretendia que o Tribunal escrutinasse; especificar qual Essenciais para a aferição de Admissibilidade do Recurso)
o amparo que pretendia que lhe fosse outorgado para I. Relatório
o restabelecimento dos seus direitos fundamentais
alegadamente violados; juntar a certidão de notificação do 1. O Senhor Alberto Monteiro Alves interpôs recurso
acórdão recorrido, e, d) carrear para os autos a sentença do de amparo, impugnando o Acórdão TRB 48/2022/2023,
tribunal de instância, o acórdão do TRS e todas as peças relacionando, para tanto, argumentos que se pode sumarizar
em que terá suscitado as questões referentes à violação da seguinte forma:
dos seus direitos constitucionalmente estabelecidos, 1.1. O recorrente esgotou todos os meios legais de defesa
nomeadamente os recursos ordinários que interpôs. de direitos e todas as vias de recurso ordinário;
2. Nos termos do artigo 17, parágrafo segundo, da Lei 1.2. O presente recurso tem natureza de amparo
do Amparo e do Habeas Data, “[n]a falta, insuficiência ou constitucional e o recorrente tem legitimidade por ser
obscuridade dos fundamentos de facto ou de direito, será o interessado no mesmo;
recorrente notificado para suprir as deficiências, no prazo
de dois dias”. O regime também é integrado pelo artigo 1.3. Quanto à identificação dos atos, factos ou omissões,
16, alínea b), que dispõe que “o recurso não será admitido violadores dos seus direitos, liberdades e garantias, até
quando a petição não obedeça aos requisitos estabelecidos onde se consegue decifrar, dada à falta de qualidade do
nos artigos 7º e 8º” e pelo número 2 da mesma disposição seu requerimento, diz que;
que reza que “[n]o caso da alínea b) do número anterior
a petição só será rejeitada se a falta não for suprida no 1.3.1.O acórdão do Tribunal da Relação de Barlavento
prazo a que se refere o artigo 17º”. que diz juntar em anexo, ao confirmar a decisão do Tribunal
da Relação de Barlavento [terá querido dizer a decisão
2.1. Ora, no caso concreto, do tribunal de 1ª instância] que o condenou pelo crime
2.1.1. O recorrente foi notificado do Acórdão 98/2023, de tráfico de drogas de alto risco violou os seus direitos
de 14 de junho, Braime Hilique Semedo Tavares v. STJ, liberdades e garantias;
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Aperfeiçoamento por Deficiente Indicação da(s) Conduta(s) 1.3.2. Os direitos, liberdades e garantias alegadamente
Impugnada(s); falta de especificação do amparo pretendido violados pelo Tribunal da Relação de Barlavento foram
e Omissão de Junção de Documentos Essenciais à Instrução o direito a um processo justo e equitativo e as garantias
do Pedido, Rel: JCP Pina Delgado, que lhe concedeu de defesa consagradas, respetivamente, no artigo 22, nº
oportunidade de aperfeiçoamento, no dia 14 de junho, 1, e no artigo 35, ambos da CRCV.
como deflui da f. 64 dos Autos;
1.4. No que tange às razões de facto, faz o seguinte
2.1.2. Tinha, pois, até ao dia 16 de junho para submeter resumo:
a sua peça de aperfeiçoamento e para juntar os documentos
essenciais à aferição de tempestividade do recurso. 1.4.1. Alega que o acórdão recorrido não respeitou o
direito do recorrente, ao confirmar uma pena exagerada,
2.1.3. Até ao dia 23 de junho, data em que se realizou violando assim o princípio da necessidade e do princípio
a conferência de julgamento, nada fez para corrigir o da proporcionalidade;
seu recurso, nos termos indicados, nem nada alegou que
pudesse reconduzir a uma situação de justo impedimento. 1.4.2. Além de ser seu entendimento que a pena aplicada
foi exagerada, diz ter questionado sempre a decisão que
2.1.4. Pressupõe-se que, pelo seu comportamento o condenou como reincidente sem que tal facto tivesse
omissivo, não esteja mais interessado no prosseguimento sido provado nos autos, o que considera vulnerador do
da instância. previsto no artigo 22 da CRCV;
2.2. Seja como for, decorrido o prazo legal para se
aperfeiçoar, na falta de apresentação de um motivo 1.4.3. Entende que caso não tivesse sido condenado por
justificante, desencadeiam-se as consequências legais essa qualidade, isso teria permitido a redução da pena e,
do artigo 16, alínea b), e artigo 16, parágrafo segundo, consequentemente, a suspensão da execução da mesma,
da Lei do Amparo, conducentes à inadmissão do recurso. tornando-a numa pena justa e adequada;
2.3. Neste sentido, o recurso não é admitido por não 1.5. Repete na parte destinada às conclusões o que já
aperfeiçoamento das insuficiências de que padece. havia exposto anteriormente e termina o seu arrazoado
pedindo que seja:
III. Decisão
a) Dado provimento ao presente recurso de amparo;
Pelo exposto, os juízes do Tribunal Constitucional,
reunidos em plenário, decidem não admitir o recurso de b) Concedido ao recorrente o amparo constitucional de
amparo, ordenando o seu arquivamento. restabelecimento do seu direito a um processo
justo e equitativo e, em consequência, declarado
Registe, notifique e publique. nulo o acórdão recorrido;
Praia, 26 de junho de 2023 1.6. Diz juntar:
José Pina Delgado (Relator)
a) Procuração forense;
Aristides R. Lima
b) Cópias do Acórdão TRB 48/2022/2023; e
João Pinto Semedo
c) Requer, para efeitos de instrução do presente, que
Está conforme seja solicitado junto ao TRB o “reenvio” dos
Secretaria Judicial do Tribunal Constitucional, aos 26 Autos do Processo Ordinário nº 253/21-22 – Juízo
de junho de 2023. — O Secretário, João Borges. Crime da Comarca de S [seria São Vicente].

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1472 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

1.7. Dos presentes autos, para além da mencionada 1.1. Direito este que é delimitado materialmente, na medida
procuração forense, consta a comunicação trocada por via em que destinado à proteção direta de apenas uma das
eletrónica entre o Secretário do Tribunal Constitucional e o três categorias de direitos fundamentais previstas pela Lei
mandatário do recorrente, onde este último foi informado, Fundamental. Seriam os denominados direitos, liberdades
em mensagem de 17 de maio de 2023, que o Tribunal não e garantias, tanto os individuais, como os de participação
tinha recebido o recurso que, na sua mensagem de 9 de política e de exercício da cidadania e, arguivelmente, os
maio, dizia estar a enviar em anexo; dos trabalhadores. É verdade que se estende para recobrir
os direitos análogos a direitos liberdades e garantias ou
1.7.1. Para além da comunicação acima referida, que portem caraterísticas específicas com dimensões
encontra-se nos autos um documento de informação individuais e civis como, respetivamente, os direitos de
interna, assinada pelo mesmo Secretário Judicial, portando proteção judiciária (Acórdão 6/2017, de 21 de abril, Maria
o seguinte teor: de Lurdes v. STJ, sobre pedido de desistência, Rel: JC
1.7.2. O Tribunal Constitucional, através do seu correio Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 42,
eletrónico recebeu, no dia 31 de março de 2023, a petição 21 de julho de 2017, pp. 898-903, 5; Acórdão 9/2017, de
do presente recurso de amparo que, no entanto, por motivo 8 de junho, Martiniano Oliveira v. STJ, Rel: JCP Pinto
desconhecido, foi automaticamente direcionada para o Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 42,
spam do referido correio; 21 de julho de 2017, pp. 925-929, e); Acórdão 13/2017,
de 20 de julho, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto
1.7.3. No dia 09 de maio, o mandatário do recorrente Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 47, 8 de
viria a enviar duas mensagens, sendo a primeira em agosto de 2017, pp. 1024-1029, e); Acórdão 24/2017, de
branco e a segunda de reencaminhamento do e-mail que 9 de novembro, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto
enviara no dia 31 de março pelas 20h21, porém, sem o Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 78, 22
referido anexo; de dezembro de 2017, pp. 1692-1698, e); Acórdão 12/2018,
1.7.4. Passados os cinco dias úteis sem que tivesse sido de 7 de junho, CIMA v. STJ, Rel: JC Aristides R. Lima,
confirmada qualquer peça subscrita pelo mandatário junto Decisão de admissibilidade, publicado no Boletim Oficial,
ao Tribunal Constitucional mediante entrega de cópia em I Série, N. 49, 20 de julho de 2018, b; Acórdão 16/2018,
suporte de papel, observando o disposto no artigo 143, de 28 de julho, Luigi Zirpoli v. TJCP, Rel: JCP Pinto
número 2, do CPC, no dia 17 de maio foi comunicado ao Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 49, 20
ilustre advogado estagiário do recorrente que o Tribunal de julho de 2018, pp. 1298-1302, e); Acórdão 17/2018,
não havia recebido o recurso. de 26 de julho, Amândio Vicente v. TRS, Rel: JCP Pinto
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 51, 3 de
1.7.5. Em resposta à mensagem do Tribunal foi agosto de 2018, pp. 1328-1333, e); Acórdão 22/2018, de 11
reencaminhado o e-mail que o digníssimo mandatário de outubro, Martiniano v. STJ, sobre o direito de acesso
do recorrente havia enviado a 31 de março de 2023 que aos tribunais, Rel: JC José Pina Delgado, publicado no
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acabaria por ser localizado na pasta spam, estando, Boletim Oficial, I Série, N. 76, 22 de dezembro de 2018, pp.
entretanto, em falta, a cópia do acórdão 48/2022/2023 1824-1835, 2; Acórdão 3/2019, de 24 de janeiro, Ramiro
mencionado pelo recorrente na sua peça de recurso. Rodrigues v. TRB, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no
Boletim Oficial, I Série, N. 28, 13 de março de 2019, pp.
2. Cumprindo o estabelecido no artigo 12 da Lei n.º 480-486, e); Acórdão 36/2022, de 12 de agosto, Ramiro
109/IV/94 de 24 de outubro, foram os autos com vista Oliveira Rodrigues v. TRB, sobre violação do direito de
ao Ministério Público para emissão de parecer sobre a acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva por não-
admissibilidade do recurso, tendo-o feito S. Excia. o Sr. admissão de recurso designado pelo recorrente amparo
Procurador-Geral Adjunto, o qual articulou os seguintes ordinário por tribunal judicial, Rel: JC Pina Delgado,
argumentos: publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 2, 5 de janeiro
2.1. Afigura-se-lhe que não teria condições para se de 2023, p. 36-42, 2.1) e o direito à propriedade privada
pronunciar sobre a admissibilidade ou rejeição do presente (Acórdão 30/2019, de 30 de agosto, Atlantic Global Asset
recurso de amparo devido à forma como foram instruídos Management v. PGR, sobre violação do direito à propriedade
os presentes autos; privada, da garantia de juiz, da iniciativa privada e dos
direitos à defesa, ao contraditório e de acesso às provas
2.2. Só com muito esforço se conseguiria ler a PI devido da acusação, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim
à qualidade da impressão/digitalização, mas que, ainda Oficial, I Série, N. 110, 29 de outubro de 2019, pp. 1766-
assim, por a petição não vir acompanhada de quaisquer 1789); ou ainda para situações que envolvam camadas
documentos e os mesmos não vieram apensos aos autos de proteção essenciais que remetam a certos direitos,
do recurso ordinário interposto pelo recorrente, não liberdades e garantias como a vida ou a integridade
seria possível aferir a verificação dos pressupostos de pessoal. Porém, fora desses casos, com a tendencial
admissibilidade do presente recurso; não-inclusão dos direitos económicos, sociais e culturais
2.3. Conclui que, face à total ausência de elementos para e dos direitos de grupos vulneráveis que não portem
o efeito, não logrará oferecer o seu pronunciamento, sem caraterísticas de direitos, liberdades e garantias, e também
prejuízo de vir a fazê-lo após a junção dos documentos de princípios constitucionais objetivos, como, em diversos
referidos nos termos do artigo 8º, número 3, da Lei do momentos, este Tribunal já decidiu (Acórdão 11/2017,
Amparo. de 22 de junho, Maria de Lurdes v. STJ, sobre violação
do direito de constituir família por não reconhecimento
3. Marcada sessão de julgamento para o dia 22 de junho, de união de facto, Rel: JC Pina Delgado, publicado no
nessa data se realizou, com a participação dos Venerandos Boletim Oficial, I Série, N. 42, 21 de julho, pp. 933-950 e
Juízes-Conselheiros e do Senhor Secretário do TC, dela na Coletânea de Decisões do Tribunal Constitucional de
decorrendo a decisão que se segue acompanhada dos Cabo Verde, Vol. III, Praia, INCV, 2018 (2017), pp. 423-
fundamentos articulados infra. 477, 20.1; Acórdão 29/2017, de 5 de dezembro, Ovídio
de Pina v. STJ, Rel: JC Aristides R. Lima, publicado no
II. Fundamentação Boletim Oficial, I Série, N. 6, 1 de fevereiro de 2018, pp.
1. Do ponto de vista constitucional, o recurso de amparo 75-93, 20.1; Acórdão 06/2018, de 22 de março, Adilson
é concebido como um direito fundamental de “requerer Danielson v. STJ, Rel: JC Pina Delgado, Boletim Oficial,
ao Tribunal (…) a tutela de (…) direitos, liberdades e I Série, N. 21, de 11 de abril de 2018, pp. 495-505, 2;
garantias, constitucionalmente reconhecidos”, e também Acórdão 27/2018, de 20 de dezembro, Judy Ike Hills v.
como um meio “de tutela de direitos, liberdades e garantias”, STJ, sobre violação de garantia de inviolabilidade de
consagrando-se a sua dupla-natureza subjetiva e objetiva. domicílio, de correspondência e de telecomunicações e

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1473

de garantia da presunção da inocência na sua dimensão 2.2.1. Identifique a entidade, o funcionário ou o agente
de in dubio pro reo, Rel: JC Pina Delgado, publicado no autor do ato ou da omissão, bem como os interessados a
Boletim Oficial, I Série, N. 11, 31 de janeiro de 2019, pp. que o provimento do recurso possa diretamente beneficiar
146-178, 2.1.1). Por conseguinte, trata-se de um recurso ou prejudicar, havendo-os;
especialmente desenhado para proteger uma categoria
especial de direitos que goza de regime de tutela mais 2.2.2. Indique com precisão “o ato, facto ou a omissão”
intenso: os direitos, liberdades e garantias. que, na sua opinião, violou os seus direitos amparáveis;
1.2. E que fica processualmente condicionado ao 2.2.3. Indique com clareza quais deles terão sido
esgotamento das vias ordinárias de recurso, opção da vulnerados, “com a expressa menção das normas ou
qual resulta um figurino constitucional que produz princípios jurídico-constitucionais que entende terem
diversos efeitos. sido violados”;
2.2.4. Exponha resumidamente as razões de facto que
1.2.1. Desde logo, a conceção de que todos os tribunais fundamentam o pedido, bem como “formul[e] conclusões,
cabo-verdianos são tribunais de proteção de direitos, nos nas quais resumirá, por artigos, os fundamentos de facto
termos da sua respetiva jurisdição, cabendo efetivar essa e de direito que justificam a petição”;
tutela através dos processos ordinários desenhados pela lei,
dos processos especiais previstos pela Constituição como 2.2.5. Esta deverá “terminar com o pedido de amparo
o Habeas Corpus ou o recurso contencioso administrativo, constitucional no qual se indicará o amparo que o recorrente
ou daqueles que venham a ser definidos pelo legislador, entende dever ser-lhe concedido para preservar ou
nos termos do artigo 22, parágrafo sexto, segundo o qual restabelecer os direitos, liberdades ou garantias violados”,
“[p]ara a defesa dos direitos, liberdades e garantias devendo vir acompanhada dos “documentos que julgar
individuais, a lei estabelece procedimentos judiciais céleres pertinentes e necessários para a procedência do pedido”.
e prioritários que assegurem a tutela efetiva e em tempo 2.3. O objeto dessas disposições é determinar o modo de
útil contra ameaças ou violações desses mesmos direitos, interposição e definir a estrutura da peça processual, de
liberdades e garantias” (Acórdão nº 36/2022, de 12 de tal sorte que, de forma célere e simplificada, se permita
agosto, Ramiro Oliveira Rodrigues v. TRB, sobre violação ao Tribunal Constitucional identificar os elementos
do direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva constitutivos da súplica para que possa decidir sobre a
por não-admissão de recurso designado pelo recorrente sua admissibilidade, sobre eventuais medidas provisórias
de amparo ordinário por tribunal judicial, Rel: JC Pina aplicáveis e, subsequentemente, sobre o seu mérito.
Delgado, 5.1.3).
2.3.1. De um lado, através da facilitação do acesso a
1.2.2. E, em consequência, a subsidiariedade do recurso esses elementos que decorreriam do modo de organização
de amparo, recurso constitucional de natureza especial, da peça e da entrega direta no Tribunal Constitucional;
ao qual só se pode lançar mão, depois de se explorar os
mecanismos que correm perante os tribunais ordinários 2.3.2. Do outro, pelo facto de se impor um determinado
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para que estes possam conhecer e garantir a tutela desses conteúdo à mesma, na medida em que, do ponto de vista
mesmos direitos. do número 1 do artigo 8º, primeiro, remete-se, através das
alíneas a) e b); para a identificação das condutas lesivas
1.3. E caraterizado pelo seu informalismo, urgência (“ato, facto ou a omissão”) e para o órgão do poder público
e sumariedade, conforme decorre da alínea b) do artigo ao qual podem ser imputadas (“a entidade, o funcionário
20, segundo a qual ele “pode ser requerido em simples ou o agente autor do ato ou da omissão”); segundo, por
petição, tem caráter urgente e o seu processamento deve meio da alínea c), aos direitos, liberdades e garantias
ser baseado no princípio da sumariedade”. vulnerados por aquelas (“indicar com clareza os direitos,
1.4. Por conseguinte, está-se perante um direito liberdades e garantias fundamentais”) e às disposições
fundamental e um recurso constitucional desenhado onde estariam alojados ou os princípios de onde podem
especialmente para a proteção de direitos, liberdades e ser inferidos (“com a expressa menção das normas ou
garantias, que pode ser utilizado subsidiariamente quando princípios-constitucionais que entendem terem sido
os meios ordinários de tutela de direitos que correm os violados”); terceiro, nos termos do número 2 da mesma
seus trâmites perante os tribunais judiciais ou outros, disposição, à explicitação do amparo que se pretende para
a existirem, falham. Tais caraterísticas impõem que a se remediar a eventual lesão (“a petição terminará com
própria lei de processo constitucional que desenvolve o pedido de amparo constitucional no qual se indicará o
os procedimentos atinentes ao recurso de amparo seja amparo que o recorrente entende dever ser-lhe concedido
interpretada como uma lei restritiva de direito cujo figurino para preservar ou restabelecer os direitos, liberdades e
básico se deve manter dentro dos confins dos números 4 e garantias fundamentais violados”). A argamassa que
5 do artigo 17 da Constituição, ainda que parte do regime ligaria esses três elementos decorreria dos fundamentos
possa ser legitimamente fixado pelo legislador em razão de facto e de direito que justificam a petição, como também
da remissão à lei (“nos termos da lei”), desde que não se se impõe apresentar, conforme o disposto nas alíneas d)
atinja de modo ilegítimo as caraterísticas essenciais do e e) do parágrafo primeiro da primeira disposição.
instituto impostas pelo próprio dispositivo constitucional 2.3.3. A regra é que, do ponto de vista da articulação
(“e com observância [obrigatória, diga-se] do disposto nas da petição de amparo, deve haver o estabelecimento de
alíneas seguintes (…)”. uma ligação lógica entre cada conduta impugnada, as
2. As exigências da peça de recurso de amparo são as posições jurídicas decorrentes do(s) direito(s) que ela
consagradas nos artigos 7º e 8º da Lei do Amparo e do vulnera e o amparo adequado para a remediar através da
Habeas Data, os quais impõem, respetivamente, que: fundamentação. O que se tem verificado até agora é que
na maior parte dos casos, isso é muito deficientemente
2.1. A petição seja: articulado, lançando-se para a peça de recurso, sem grande
2.1.1. Interposta através de simples requerimento, precisão e racionalização, uma pluralidade de condutas
com indicação expressa de que o recurso tem a natureza a que globalmente se imputam violações de um conjunto
de amparo; diversificado de direitos, e remetendo-se para amparos
genéricos ou impossíveis. O Tribunal Constitucional
2.1.2. Devidamente fundamentada; e desde o Acórdão nº 10/2017, de 8 de junho, Adilson
Danielson v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado
2.1.3. Entregue na Secretaria do Tribunal Constitucional. no Boletim Oficial, I Série, N. 42, 21 de julho de 2017,
2.2. Quanto ao que a lei designa de “fundamentação pp. 929-933, b), tem tolerado a interposição de vários
do recurso”, exige-se que o recorrente, através da peça, amparos que não cumprem essas exigências qualitativas,

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1474 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

considerando que a disposição deve ser lida sempre de dos recorrentes, os principais interessados, e que devem
forma compatível ao direito constitucional ao amparo, obrigatoriamente acompanhá-lo. Por conseguinte, quem
no sentido de que “mais importante que o rigor formal deve carrear para os autos as peças que sejam necessárias
é a inteligibilidade do que se expõe e se requer”. Mas, à aferição de admissibilidade são os próprios recorrentes,
a duras penas, considerando a grande dificuldade que sendo exigência incontornável que, no mínimo, e desde o
se tem para se compreender o que se impugna, o que se momento da interposição, juntem cópias das peças que
pede e os fundamentos que suportam as petições. A Corte protocolaram ou que lhes foram notificadas, nomeadamente
Constitucional continuará – transitoriamente – aberta a decisão recorrida, a certidão de notificação, as decisões
a privilegiar as admissibilidades, suprindo ela própria proferidas pelos órgãos judiciais e que contenham os atos
eventuais deficiências das peças, mas, depois de vários ou omissões que julguem terem violado os seus direitos,
anos de prática do amparo em Cabo Verde, é preciso os pedidos de reparação que tenham apresentado, e o
entrar numa nova fase mais exigente, sustentada numa mandato forense que habilita a representação.
melhor qualificação.
2.4. No caso em apreço, verifica-se que a instrução do
2.3.4. Na situação vertente, pode-se dizer que, no geral, processo não foi completa, e não só impediu este Tribunal de
o recorrente, além de ter apresentado a sua peça na verificar se o recurso pode ser admitido, como inviabilizou
secretaria deste Tribunal, indicando expressamente que a emissão do parecer do Ministério Público.
se trata de um recurso de amparo, incluiu uma exposição
das razões de facto que a fundamentam e integrou um 2.4.1. Nomeadamente, porque uma alegação importante
segmento conclusivo, resumindo por artigos os fundamentos no quadro da aferição de admissibilidade do recurso não se
de facto e de direito que suportam os seus pedidos. Não encontra devidamente consubstanciada por elementos. Com
obstante, como referiu o Digníssimo Representante do efeito, o recorrente no ponto 2. (p. 1) da sua peça refere que
Ministério Público no douto parecer que se encontra esgotou “todos os meios legais de defesa dos seus direitos
junto aos autos, só com muito esforço se conseguiria ler e todas as vias de recurso ordinário”, retomando essa
o que consta da petição inicial do recorrente devido à questão na parte das conclusões. Embora tenha indicado
má qualidade da impressão/digitalização. Ademais, o que juntou cópia do Acórdão TRB 48/2022/2023, esse
recorrente não juntou qualquer documento que permitiria documento não foi encontrado na mensagem eletrónica
a verificação dos pressupostos de admissibilidade do seu que enviou;
recurso de amparo.
2.3.5. Ao invés, apela a uma intervenção desta 2.4.2. Além de ser elemento decisivo para se comprovar
Corte para pedir elementos constantes do autuado no o esgotamento das vias ordinárias do recurso, o acesso ao
processo principal ao TRB, o que, desde já, indefere-se Acórdão TRB 48/2022-2023 sempre seria essencial para
liminarmente. Como ficou assente no Acórdão 59/2023, se poder apreciar o teor da decisão a que se imputa uma
de 26 de abril de 2023, Dénis Delgado Furtado v. STJ, aparente violação na forma como se determinou a pena,
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Aperfeiçoamento por obscuridade na identificação das designadamente para se poder atestar que a conduta
condutas impugnadas; por deficiência na identificação impugnada é imputável ao órgão judicial recorrido;
das entidades alegadamente responsáveis pela prática
dos factos; por não explicitação do modo como a suposta 2.4.3. Acresce que, numa questão que poderá ter que
violação de direitos de terceiros repercute sobre os direitos ver com violação originária perpetrada por tribunal de
do recorrente e por falta de junção de documentos essenciais julgamento, o recorrente não se preocupou em juntar a
à aferição de admissibilidade do amparo, Rel: José Pina sentença prolatada pela primeira instância;
Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 57, de
22 de maio de 2023, pp. 1251-1253, “[o] recorrente tem 2.4.4. Tampouco se consegue verificar quando é que
um prazo judicial de vinte dias para interpor um recurso suscitou a violação do seu direito, porque, designadamente,
de amparo, o qual, registe-se, não sobe nos autos. Logo, não anexou qualquer documento em que o tenha feita,
possui tempo suficiente para requerer a certidão de todo fosse ele o recurso ordinário ou qualquer requerimento
o processado caso entenda conterem elementos que o avulso que tenha dirigido aos tribunais que intervieram
Tribunal Constitucional deva considerar ou para juntar no seu processo;
toda a documentação que tenha por necessária para
efeitos de apreciação do amparo. A peça de amparo que 2.4.5. Ficou ainda por juntar a certidão de notificação
integra esses elementos deve ser autossuficiente. Disso do acórdão recorrido ou documento que tenha informação
decorrendo que, em princípio, serão considerados só os equiparável, elemento essencial para a aferição da
que forem autuados, caso deles se logre inferir todas as tempestividade do recurso, já que o recorrente sequer
informações que o Coletivo precise para apreciar se o faz referência na sua PI à data da prolação do acórdão
recurso é admissível. Caso contrário, emite-se acórdão recorrido;
de aperfeiçoamento, o qual deverá ser cumprido dentro
do prazo legal para que a instância prossiga”. 2.4.6. As alegações aparentemente centrais relativamente
à determinação da pena com base na consideração da sua
2.3.6. E, com efeito, a não junção de documentos reincidência são muito parcamente desenvolvidas, devendo
pertinentes à aferição de admissibilidade, além de ser melhor densificadas e articuladas pelo recorrente.
dificultar um pronunciamento informado do Ministério
Público a esse respeito, priva o Tribunal Constitucional 3. Sendo assim, é imperioso que promova a articulação
de aceder a elementos indispensáveis para promover esse desses argumentos e a junção de todos esses documentos
juízo, nomeadamente porque não se trata de recurso que para que o Tribunal Constitucional tenha todos os
suba nos autos. Por essa razão, integram o recurso de elementos necessários a verificar a presença das condições
amparo todos os documentos necessários à aferição de de admissibilidade previstas pela lei.
admissibilidade, de tal sorte que ele seja autossuficiente
no sentido de o Tribunal Constitucional poder decidir 3.1. Submetida a peça de aperfeiçoamento e juntados
sobre a sua admissibilidade com base exclusiva naquilo os documentos determinados pelo acórdão, o recurso será
que for autuado. Ademais, o recurso de amparo é um analisado para efeitos de admissibilidade pelo Tribunal,
recurso célere, que não se compadece com a necessidade nos termos da lei;
sistemática de o Tribunal Constitucional requisitar autos
ou certidões de peças processuais aos tribunais judiciais, 3.2. Não sem antes remeter-se esses elementos ao
perdendo tempo e onerando desnecessariamente esses Ministério Público para que esta entidade possa emitir
órgãos de soberania para obter peças que já estão na posse o seu parecer.

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1475

III. Decisão 1.2.2. Na sequência do primeiro interrogatório, o


Meritíssimo Juiz aplicou-lhe a medida de coação de
Pelo exposto, nos termos do artigo 17 da Lei do Amparo prisão preventiva e determinou a sua condução à Cadeia
e do Habeas Data, os Juízes-Conselheiros do Tribunal Central da Praia;
Constitucional decidem determinar a notificação do
recorrente para aperfeiçoar o seu recurso, 1.2.3. Depois da acusação do MP, foi submetido a
julgamento pelo 1º Juízo do Tribunal da Comarca da Praia
a) Juntando o Acórdão recorrido e a sentença prolatada e condenado à pena de cinco anos de prisão efetiva, por
aparentemente pelo 1º Juízo-Crime do Tribunal tráfico de estupefaciente;
Judicial da Comarca de São Vicente;
1.2.4. Não se conformando com essa condenação dela
b) Juntando aos autos o recurso ordinário que terá recorreu para o TRS, com os fundamentos baseados em
dirigido ao TRB e, a existir, qualquer requerimento falta de fundamentação da decisão e em injustiça da
avulso em que tenha suscitado a questão da condenação;
violação do seu direito;
1.2.5. Tendo na sequência sido notificado no dia 5 de
c) Juntando aos autos a certidão da notificação do outubro de 2021 da subida do seu recurso para aquele
acórdão recorrido do recorrente ou documento órgão, o qual foi autuado e registado, como Autos de
equivalente; e Recurso Ordinário 236/22;
d) Densificando os argumentos que formula a respeito 1.2.6. No dia 20 de março de 2023, ter-se-á, na sua
da consideração da reincidência na determinação opinião, completado vinte meses de prisão preventiva do
da sua pena. recorrente sem haver condenação em segunda instância;
Registe, notifique e publique. 1.2.7. Com base em preceitos do Código de Processo Penal
Praia, 26 de junho de 2023 e da Constituição da República, impetrou providência de
habeas corpus junto ao Egrégio STJ pedindo a decretação
José Pina Delgado (Relator) de extinção da prisão preventiva a partir de 21 de março
Aristides R. Lima de 2023, pelo esgotamento do prazo de vinte meses sem
que tenha havido condenação em segunda instância,
João Pinto Semedo restituindo-o imediatamente à liberdade;
Está conforme 1.2.8. Após a resposta do TRS, o órgão recorrido indeferiu
a providência de habeas corpus por meio do Acórdão STJ
Secretaria Judicial do Tribunal Constitucional, aos 26 60/2023, malgrado ter alegadamente ficado provado nesta
de junho de 2023. — O Secretário, João Borges. sede que Acórdão TRS 37/2023 não havia se pronunciado
sobre o recurso interposto pelo recorrente;
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––––––
Cópia: 1.2.9. No dia 17 de abril de 2023, o recorrente meteu um
outro requerimento junto à entidade recorrida pedindo
Do acórdão proferido nos autos de Recurso de Amparo esclarecimento de ambiguidades e reforma do Acórdão
Constitucional n.º 18/2023, em que é recorrente Rui Jorge STJ 60/2023;
da Costa Mendes e entidade recorrida o Supremo
Tribunal de Justiça. 1.2.10. No dia seguinte, meteu um outro requerimento,
agora pedindo a reparação de seus direitos, liberdades
Acórdão n.º 108/2023 e garantias de acesso à justiça, ao habeas corpus e à
liberdade sobre o corpo;
(Autos de Amparo 18/2023, Rui Jorge da Costa Mendes
v. STJ, Aperfeiçoamento por Obscuridade na Construção 1.2.11. Requerimentos que foram indeferidos pelo órgão
de uma das Condutas Impugnadas) recorrido por meio do seu Acórdão 84/2023;
I. Relatório 1.2.12. Acrescenta que o TRS assumiu de forma expressa
que no seu Acórdão 37/2023 não considerou e não se
1. O Senhor Rui Jorge da Costa Mendes, não se pronunciou sobre o recurso impetrado pelo recorrente e,
conformando com os Acórdãos STJ 60/2023 e 84/2023, consequentemente, também não o notificou dessa decisão;
veio a este Tribunal interpor recurso de amparo, aduzindo
razões que assim podem ser sumarizadas: 1.2.13. E que, portanto, não tendo este órgão se
pronunciado sobre o seu recurso seria inequívoco que já
1.1. Quanto à admissibilidade, diz que: se teria esgotado o prazo de vinte meses previsto pela
1.1.1. Foi notificado do Acórdão 60/2023 em 13 de abril alínea d) do número 1 do artigo 279 do CPP.
de 2023 e do Acórdão 84/2023 em 5 de maio de 2023, pelo 1.3. Relativamente ao direito,
que, tendo em conta o prazo de vinte dias para interpor
o recurso de amparo, estaria em tempo; 1.3.1. Diz que os Acórdãos STJ 60/2023 e 84/2023
afrontam os seus direitos de acesso à justiça, ao habeas
1.1.2. O órgão cujo ato o recorrente impugna é a última corpus e à liberdade sobre o corpo, pois que exigir que
instância hierárquica de recurso, estando, por isso, ele deve meter um recurso ordinário contra a decisão de
esgotadas as vias de recurso ordinário; segunda instância seria estranho, senão contrassenso
1.1.3. A legitimidade do recorrente seria inquestionável, pois não tinha sido notificado dessa decisão que sequer
posto ser o visado pelo acórdão recorrido e a legitimidade se pronunciou acerca do seu recurso;
do STJ também seria pacífica, visto ser esta a entidade 1.3.2. Entendimento que seria manifestamente ilegal e
que proferiu o referido acórdão; inconstitucional, pois somente uma decisão que tivesse se
1.2. Quanto aos atos, factos e omissões violadores dos pronunciado sobre o seu requerimento de interposição de
seus direitos, assevera que: recurso ordinário contra a decisão de primeira instância
teria o condão de suspender o prazo de vinte dias previsto
1.2.1. Detido fora de flagrante delito no dia 20 de julho pela alínea d) do número 1 do artigo 279 do CPP;
de 2023, mediante promoção do Ministério Público, foi
apresentado ao 3º Juízo Crime do Tribunal da Comarca da 1.3.3. E que, não o tendo feito, seria inequívoco que
Praia, para efeitos de primeiro interrogatório de arguido este prazo se esgotara, constituindo fundamento para
detido e aplicação de medida de coação; habeas corpus;

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1476 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

1.3.4. Diz concordar com o órgão recorrido a respeito do 2.7. Quanto ao Acórdão 84/2023, entende que foram
princípio do esgotamento do poder jurisdicional do tribunal esgotadas as vias ordinárias e que a vionlação foi expressa
previsto pelo artigo 408 número do CPP, mas que sendo a e formalmente invocada logo que o recorrente teve
existência de pedido de reparação, em sede de habeas corpus, conhecimento e que o recurso se mostra tempestivo pois
condição sine qua non de acesso ao Tribunal Constitucional, a decisão foi proferida no dia 5 de maio e o recorrente deu
estranha a sua condenação “em custas de incidentes”; entrada ao recurso no dia 29 do mesmo mês, não obstante
entender que o recorrente não apresentou certidão de
1.4. Quanto às condutas concretas impugnadas e aos notificação.
direitos violados diz que:
1.4.1. A primeira conduta que pretende impugnar é 2.8. Pelo que entende que o recurso de amparo contra
a decisão do STJ vertida nos seus Acórdãos 60/2023 e esta decisão deve ser admitido e rejeitado o interposto
84/2023 de negar ao recorrente o direito constitucional contra o Acórdão 60/2023.
de acesso à justiça, o direito ao habeas corpus e à sua 3. Marcada sessão de julgamento para o dia 22 de junho,
liberdade, mesmo perante a posição assumida pelo TRS nessa data se realizou, com a participação dos Venerandos
de forma expressa, no seu Acórdão 37/2023, de que não Juízes-Conselheiros e do Senhor Secretário do TC, dela
considerou e não se pronunciou sobre o recurso impetrado decorrendo a decisão que se segue acompanhada dos
pelo recorrente e, consequentemente, também não o fundamentos articulados infra.
notificou, considerando contudo que este Acórdão 37/2023
tem o condão de suspender o prazo de vinte meses previsto II. Fundamentação
pela alínea d) do número 1 do artigo 279 do CPP;
1. Do ponto de vista constitucional, o recurso de amparo
1.4.2. A outra conduta que pretende impugnar seria é concebido como um direito fundamental de “requerer
o facto do STJ ter condenado o recorrente em custas de ao Tribunal (…) a tutela de (…) direitos, liberdades e
incidente pós-decisório, sendo certo que, mesmo sabendo garantias, constitucionalmente reconhecidos”, e também
que em virtude do princípio do esgotamento do poder como um meio “de tutela de direitos, liberdades e garantias”,
jurisdicional do tribunal não era possível alterar a decisão consagrando-se a sua dupla-natureza subjetiva e objetiva.
final, estava obrigado a suscitá-lo como condição sine qua
non de acesso ao Tribunal Constitucional em face das 1.1. Direito este que é delimitado materialmente, na medida
últimas decisões deste Egrégio Tribunal; o que violaria o em que destinado à proteção direta de apenas uma das
seu direito de acesso à justiça e à presunção da inocência; três categorias de direitos fundamentais previstas pela Lei
Fundamental. Seriam os denominados direitos, liberdades
1.5. A respeito do pedido de adoção de medida provisória e garantias, tanto os individuais, como os de participação
retoma esses mesmos fundamentos, acrescentando a política e de exercício da cidadania e, arguivelmente, os
fundamentação legal prevista pelo artigo 14 da Lei do Amparo. dos trabalhadores. É verdade que se estende para recobrir
1.6. Pede que o seu recurso seja admitido e julgado os direitos análogos a direitos liberdades e garantias ou
4 910000 000000

procedente por provado, concedendo ao recorrente o que portem caraterísticas específicas com dimensões
amparo constitucional dos seus direitos de acesso à justiça, individuais e civis como, respetivamente, os direitos de
ao habeas corpus e à liberdade sobre o corpo, com todas proteção judiciária (Acórdão 6/2017, de 21 de abril, Maria
as consequências constitucionais e legais, anulando os de Lurdes v. STJ, sobre pedido de desistência, Rel: JC
Acórdãos 60/2023 e 84/2023. Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 42,
2. Cumprindo o estabelecido no artigo 12 da Lei n.º 21 de julho de 2017, pp. 898-903, 5; Acórdão 9/2017, de
109/IV/94, de 24 de outubro, foram os autos com vista 8 de junho, Martiniano Oliveira v. STJ, Rel: JCP Pinto
ao Ministério Público para emitir o parecer sobre a Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 42,
admissibilidade do recurso, tendo-o feito o Exmo. Sr. 21 de julho de 2017, pp. 925-929, e); Acórdão 13/2017,
Procurador-Geral da República, o qual articulou os de 20 de julho, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto
seguintes argumentos: Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 47, 8 de
agosto de 2017, pp. 1024-1029, e); Acórdão 24/2017, de
2.1. Nos presentes autos o recorrente requer amparo dos 9 de novembro, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto
seus direitos constitucionalmente consagrados de acesso Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 78, 22
à justiça, ao habeas corpus e à liberdade, constituindo-se de dezembro de 2017, pp. 1692-1698, e); Acórdão 12/2018,
estes em direitos e garantias reconhecidos na Constituição de 7 de junho, CIMA v. STJ, Rel: JC Aristides R. Lima,
e suscetíveis de amparo constitucional; Decisão de admissibilidade, publicado no Boletim Oficial,
2.2. O recorrente estaria provido de legitimidade; I Série, N. 49, 20 de julho de 2018, b; Acórdão 16/2018,
de 28 de julho, Luigi Zirpoli v. TJCP, Rel: JCP Pinto
2.3. Diz que o recorrente impugna os Acórdãos 60/2023, Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 49, 20
de 13 de abril, notificado no mesmo dia, e 84/2023, de 5 de de julho de 2018, pp. 1298-1302, e); Acórdão 17/2018,
maio, mas não se encontraria data de notificação nos autos; de 26 de julho, Amândio Vicente v. TRS, Rel: JCP Pinto
2.4. Conclui que se lhe afigura suficientemente claro Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 51, 3 de
que o recurso interposto contra o Acórdão 60/2023, de 13 agosto de 2018, pp. 1328-1333, e); Acórdão 22/2018, de 11
de abril, revela-se extemporâneo, na medida em que foi de outubro, Martiniano v. STJ, sobre o direito de acesso
interposto muito aquém [seria além?] do prazo de vinte aos tribunais, Rel: JC José Pina Delgado, publicado no
dias determinados pela Lei do Amparo; Boletim Oficial, I Série, N. 76, 22 de dezembro de 2018, pp.
2.5. Afirma que, de acordo com a Lei do Amparo, a violação por 1824-1835, 2; Acórdão 3/2019, de 24 de janeiro, Ramiro
órgão judicial de direitos, liberdades e garantias fundamentais Rodrigues v. TRB, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no
constitucionalmente reconhecidos só pode ser objeto de recurso Boletim Oficial, I Série, N. 28, 13 de março de 2019, pp.
de amparo quando tenha sido expressa e formalmente invocada 480-486, e); Acórdão 36/2022, de 12 de agosto, Ramiro
no processo, logo que o ofendido dela teve conhecimento e Oliveira Rodrigues v. TRB, sobre violação do direito de
que tenha sido requerida a sua violação, contando-se o prazo acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva por não-
para interpor o recurso de amparo da data da notificação do admissão de recurso designado pelo recorrente amparo
despacho que recursar a violação praticada, pressuposto que ordinário por tribunal judicial, Rel: JC Pina Delgado,
parece falecer no recurso ora perscrutado. publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 2, 5 de janeiro
de 2023, p. 36-42, 2.1) e o direito à propriedade privada
2.6. Deste modo, assevera, “relativamente ao [A]córdão (Acórdão 30/2019, de 30 de agosto, Atlantic Global Asset
n.º 60/2023 é nosso parecer que o recurso de amparo Management v. PGR, sobre violação do direito à propriedade
constitucional interposto não deve ser recebido, devendo privada, da garantia de juiz, da iniciativa privada e dos
antes ser liminarmente rejeitado”. direitos à defesa, ao contraditório e de acesso às provas

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1477

da acusação, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim básico se deve manter dentro dos confins dos números 4 e
Oficial, I Série, N. 110, 29 de outubro de 2019, pp. 1766- 5 do artigo 17 da Constituição, ainda que parte do regime
1789); ou ainda para situações que envolvam camadas possa ser legitimamente fixado pelo legislador em razão
de proteção essenciais que remetam a certos direitos, da remissão à lei (“nos termos da lei”), desde que não se
liberdades e garantias como a vida ou a integridade atinja de modo ilegítimo as caraterísticas essenciais do
pessoal. Porém, fora desses casos, com a tendencial instituto impostas pelo próprio dispositivo constitucional
não-inclusão dos direitos económicos, sociais e culturais (“e com observância [obrigatória, diga-se] do disposto nas
e dos direitos de grupos vulneráveis que não portem alíneas seguintes (…)”.
caraterísticas de direitos, liberdades e garantias, e também 2. As exigências da peça de recurso de amparo são as
de princípios constitucionais objetivos, como, em diversos consagradas nos artigos 7º e 8º da Lei do Amparo e do
momentos, este Tribunal já decidiu (Acórdão 11/2017, Habeas Data, os quais impõem, respetivamente, que:
de 22 de junho, Maria de Lurdes v. STJ, sobre violação
do direito de constituir família por não reconhecimento 2.1. A petição seja:
de união de facto, Rel: JC Pina Delgado, publicado no 2.1.1. Interposta através de simples requerimento,
Boletim Oficial, I Série, N. 42, 21 de julho, pp. 933-950 e com indicação expressa de que o recurso tem a natureza
na Coletânea de Decisões do Tribunal Constitucional de de amparo;
Cabo Verde, Vol. III, Praia, INCV, 2018 (2017), pp. 423-
477, 20.1; Acórdão 29/2017, de 5 de dezembro, Ovídio 2.1.2. Devidamente fundamentada; e
de Pina v. STJ, Rel: JC Aristides R. Lima, publicado no 2.1.3. Entregue na Secretaria do Tribunal Constitucional.
Boletim Oficial, I Série, N. 6, 1 de fevereiro de 2018, pp.
75-93, 20.1; Acórdão 06/2018, de 22 de março, Adilson 2.2. Quanto ao que a lei designa de “fundamentação
Danielson v. STJ, Rel: JC Pina Delgado, Boletim Oficial, do recurso”, exige-se que o recorrente, através da peça,
I Série, N. 21, de 11 de abril de 2018, pp. 495-505, 2; 2.2.1. Identifique a entidade, o funcionário ou o agente
Acórdão 27/2018, de 20 de dezembro, Judy Ike Hills v. autor do ato ou da omissão, bem como os interessados a
STJ, sobre violação de garantia de inviolabilidade de que o provimento do recurso possa diretamente beneficiar
domicílio, de correspondência e de telecomunicações e ou prejudicar, havendo-os;
de garantia da presunção da inocência na sua dimensão
de in dubio pro reo, Rel: JC Pina Delgado, publicado no 2.2.2. Indique com precisão “o ato, facto ou a omissão”
Boletim Oficial, I Série, N. 11, 31 de janeiro de 2019, pp. que, na sua opinião, violou os seus direitos amparáveis;
146-178, 2.1.1). Por conseguinte, trata-se de um recurso 2.2.3. Indique com clareza quais deles terão sido vulnerados,
especialmente desenhado para proteger uma categoria “com a expressa menção das normas ou princípios jurídico-
especial de direitos que goza de regime de tutela mais constitucionais que entende terem sido violados”;
intenso: os direitos, liberdades e garantias. 2.2.4. Exponha resumidamente as razões de facto que
1.2. E que fica processualmente condicionado ao esgotamento fundamentam o pedido, bem como “formul[e] conclusões,
4 910000 000000

das vias ordinárias de recurso, opção da qual resulta um nas quais resumirá, por artigos, os fundamentos de facto
figurino constitucional que produz diversos efeitos. e de direito que justificam a petição”;
1.2.1. Desde logo, a conceção de que todos os tribunais 2.2.5. Esta deverá “terminar com o pedido de amparo
cabo-verdianos são tribunais de proteção de direitos, nos constitucional no qual se indicará o amparo que o recorrente
termos da sua respetiva jurisdição, cabendo efetivar essa entende dever ser-lhe concedido para preservar ou
tutela através dos processos ordinários desenhados pela lei, restabelecer os direitos, liberdades ou garantias violados”,
dos processos especiais previstos pela Constituição como devendo vir acompanhada dos “documentos que julgar
o Habeas Corpus ou o recurso contencioso administrativo, pertinentes e necessários para a procedência do pedido”.
ou daqueles que venham a ser definidos pelo legislador, 2.3. O objeto dessas disposições é determinar o modo de
nos termos do artigo 22, parágrafo sexto, segundo o interposição e definir a estrutura da peça processual, de
qual “[p]ara a defesa dos direitos, liberdades e garantias tal sorte que, de forma célere e simplificada, se permita
individuais, a lei estabelece procedimentos judiciais céleres ao Tribunal Constitucional identificar os elementos
e prioritários que assegurem a tutela efetiva e em tempo constitutivos da súplica para que possa decidir sobre a
útil contra ameaças ou violações desses mesmos direitos, sua admissibilidade, sobre eventuais medidas provisórias
liberdades e garantias” (Acórdão nº 36/2022, de 12 de agosto, aplicáveis e, subsequentemente, sobre o seu mérito.
Ramiro Oliveira Rodrigues v. TRB, sobre violação do direito
de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva por não- 2.3.1. De um lado, através da facilitação do acesso a
admissão de recurso designado pelo recorrente de amparo esses elementos que decorreriam do modo de organização
ordinário por tribunal judicial, Rel: JC Pina Delgado, 5.1.3). da peça e da entrega direta no Tribunal Constitucional;
1.2.2. E, em consequência, a subsidiariedade do recurso de 2.3.2. Do outro, pelo facto de se impor um determinado
amparo, recurso constitucional de natureza especial, ao qual conteúdo à mesma, na medida em que, do ponto de vista
só se pode lançar mão, depois de se explorar os mecanismos do número 1 do artigo 8º, primeiro, remete-se, através das
que correm perante os tribunais ordinários para que estes alíneas a) e b); para a identificação das condutas lesivas
possam conhecer e garantir a tutela desses mesmos direitos. (“ato, facto ou a omissão”) e para o órgão do poder público
ao qual podem ser imputadas (“a entidade, o funcionário
1.3. E caraterizado pelo seu informalismo, urgência ou o agente autor do ato ou da omissão”); segundo, por
e sumariedade, conforme decorre da alínea b) do artigo meio da alínea c), aos direitos, liberdades e garantias
20, segundo a qual ele “pode ser requerido em simples vulnerados por aquelas (“indicar com clareza os direitos,
petição, tem caráter urgente e o seu processamento deve liberdades e garantias fundamentais”) e às disposições
ser baseado no princípio da sumariedade”. onde estariam alojados ou os princípios de onde podem
1.4. Por conseguinte, está-se perante um direito ser inferidos (“com a expressa menção das normas ou
fundamental e um recurso constitucional desenhado princípios-constitucionais que entendem terem sido
especialmente para a proteção de direitos, liberdades e violados”); terceiro, nos termos do número 2 da mesma
garantias, que pode ser utilizado subsidiariamente quando disposição, à explicitação do amparo que se pretende para
os meios ordinários de tutela de direitos que correm os se remediar a eventual lesão (“a petição terminará com
seus trâmites perante os tribunais judiciais ou outros, o pedido de amparo constitucional no qual se indicará o
a existirem, falham. Tais caraterísticas impõem que a amparo que o recorrente entende dever ser-lhe concedido
própria lei de processo constitucional que desenvolve para preservar ou restabelecer os direitos, liberdades e
os procedimentos atinentes ao recurso de amparo seja garantias fundamentais violados”). A argamassa que
interpretada como uma lei restritiva de direito cujo figurino ligaria esses três elementos decorreria dos fundamentos

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1478 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

de facto e de direito que justificam a petição, como também Cópia:


se impõe apresentar, conforme o disposto nas alíneas d)
e e) do parágrafo primeiro da primeira disposição. Do acórdão proferido nos autos de Recurso de Amparo
Constitucional n.º 15/2023, em que é recorrente Hélder
2.3.3. A regra é que, do ponto de vista da articulação Manuel Duarte da Lomba e entidade recorrida o
da petição de amparo, deve haver o estabelecimento de Tribunal da Relação de Sotavento.
uma ligação lógica entre cada conduta impugnada, as
posições jurídicas decorrentes do(s) direito(s) que ela Acórdão n.º 109/2023
vulnera e o amparo adequado para a remediar através da (Autos de Amparo 15/2023, Hélder Manuel Duarte da
fundamentação. O que se tem verificado até agora é que Lomba v. TRS, Inadmissibilidade Por Não-Atributibilidade
na maior parte dos casos, isso é muito deficientemente de Condutas ao Órgão Judicial Recorrido e por Ausência
articulado, lançando-se para a peça de recurso, sem grande de Pedido de Reparação)
precisão e racionalização, uma pluralidade de condutas
a que globalmente se imputam violações de um conjunto I. Relatório
diversificado de direitos, e remetendo-se para amparos 1. O Senhor Hélder Manuel Duarte da Lomba interpôs
genéricos ou impossíveis. O Tribunal Constitucional desde recurso de amparo constitucional contra o Acórdão TRS
o Acórdão nº 10/2017, de 8 de junho, Adilson Danielson 40/2023, de 22 de março, com o qual não se conformou,
v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim relacionando para tanto argumentos que se podem
Oficial, I Série, N. 42, 21 de julho de 2017, pp. 929-933, sumarizar da seguinte forma:
b), tem tolerado a interposição de vários amparos que não
cumprem essas exigências qualitativas, considerando que 1.1. Quanto aos factos;
a disposição deve ser lida sempre de forma compatível ao 1.1.1. Na sequência do 1º interrogatório de arguido
direito constitucional ao amparo, no sentido de que “mais detido, por decisão do Tribunal da Comarca da Brava,
importante que o rigor formal é a inteligibilidade do que foi-lhe aplicada medida de coação de prisão preventiva
se expõe e se requer”. Mas, a duras penas, considerando e por isso encontra-se preso na Cadeia Central do Fogo;
a grande dificuldade que se tem para se compreender
o que se impugna, o que se pede e os fundamentos que 1.1.2. Após as diligências entendidas por convenientes
suportam as petições. A Corte Constitucional continuará – pelo Ministério Público (MP) e dedução de acusação,
transitoriamente – aberta a privilegiar as admissibilidades, foi julgado pelo Tribunal da Comarca da Brava que o
suprindo ela própria eventuais deficiências das peças, mas, condenou na pena de prisão de 8 anos pela prática de
depois de vários anos de prática do amparo em Cabo Verde, um crime de abuso sexual de criança, com penetração
é preciso entrar numa nova fase mais exigente, sustentada na forma continuada;
numa melhor qualificação. 1.1.3. Inconformado com tal sentença intentou recurso
2.3.4. Na situação vertente, o que se verifica é que para o Tribunal da Relação de Sotavento;
4 910000 000000

o recorrente, apesar de ter apresentado a sua peça na 1.1.4. Entretanto, estando ainda pendente o recurso
secretaria deste Tribunal, indicando expressamente que nesse tribunal, durante uma consulta efetuada pelo seu
se trata de um recurso de amparo, incluiu uma exposição mandatário aos autos no dia 16-01-2023, este constatou
das razões de facto que a fundamentam, mas não integrou que, na sua perspetiva, a instrução nos presentes autos
um segmento conclusivo onde resume por artigos de facto teria ocorrido com grave violação do art.º 35º, nº 6 e 7 da
e de direito que suportam os seus pedidos. CRCV e art.º 77º, nº 1, al. b) do CPP, porque o MP teria
2.3.5. Ora, se ainda seria possível contornar essa proferido acusação sem dar cumprimento ao disposto no
insuficiência, considerando que a partir do parágrafo 32 art.º 305º, nº 2, do CPP.
da sua peça arrola o que materialmente o pode substituir, 1.1.5. Por essa razão, no dia 17 de janeiro de 2023,
o facto é que a definição da primeira conduta suscita protocolou um requerimento no qual invocou a falta de
ao Tribunal muitas e fundadas dúvidas semânticas audiência prévia do requerente por parte do MP, antes
cuja elucidação é decisiva para se verificar se o recurso de deduzir acusação, por entender que tal omissão
é admissível. Neste sentido, para que esta prossiga é constituía nulidade insanável estatuída na alínea k) do
necessária obter a competente clarificação a partir de art.º 151º do CPP, devendo por isso “ser anulado todo o
uma melhor precisão da mesma pelo recorrente. processado e o processo remetido ao MP para os devidos
3. Sendo assim, é imperioso que promova o aperfeiçoamento efeitos”, propugnando ainda a sua soltura, por já teriam
do trecho em que formula a primeira conduta, tornando-o sido esgotados os prazos previstos no art.º 279º, nº 1, al.
mais inteligível e permitindo que esta seja melhor precisada a), b), e c) do CPP.
no seu significado e alcance. 1.1.6. O TRS indeferiu o recurso do requerente, no
III. Decisão essencial, recorrendo a argumentação segundo a qual o
arguido havia sido ouvido pelo juiz no ato de primeiro
Pelo exposto, nos termos do artigo 17 da Lei do Amparo interrogatório judicial e fundamentando no sentido de que
e do Habeas Data, os Juízes-Conselheiros do Tribunal a não audição do arguido antes da dedução da acusação
Constitucional decidem determinar a notificação do prevista pelo artigo 305, parágrafo segundo, do CPP, não
recorrente para: constituir nulidade insanável, mas antes uma invalidade
a) Apresentar as conclusões do seu recurso; que deve ser arguida, nos termos do número 2, alínea c),
do artigo 152º do mesmo diploma, até ao encerramento da
b) Precisar melhor a conduta que constrói no parágrafo ACP ou, caso não haja lugar a esta, até cinco dias, após
32 da sua peça. notificação do despacho que tiver encerrado a instrução.
Registe, notifique e publique. Na medida em que o despacho de acusação ocorreu no
dia 18 de fevereiro de 2022 e o recurso do recorrente
Praia, 26 de junho de 2023 invocando a nulidade do despacho de acusação ocorreu
José Pina Delgado (Relator) no dia 17 de janeiro, entrou quase um ano depois da data
Aristides R. Lima em que deveria ter requerido a declaração de nulidade.
João Pinto Semedo 1.2. Do ponto de vista da análise jurídica,
EStá conforme 1.2.1. É seu entendimento que essa fundamentação
“afronta e vulnera o direito constitucional de audiência
Secretaria Judicial do Tribunal Constitucional, aos 26 previsto no art.º 35º, nº 6 e 7 da CRCV, conjugado com art.º
de junho de 2023. — O Secretário, João Borges. 77º, nº 1, al. b), art.º 151º, al. d) e art.º 305, nº 2, do CPP”;

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1479

1.2.2. Alega que o artigo 151 al. k) do CPP, introduzido 2.4. Assim sendo, não resultando inequívoco que o
pela alteração de 2021, é legitimado, segundo o que teria recorrente teria legitimidade para interpor recurso de
ficado assente no preâmbulo desse diploma legal, pela amparo e não tendo sido esgotados todos os meios de
necessidade de se dar cabal cumprimento ao preceituado defessa de direitos, liberdades e garantias estabelecidas
no nº 6 do artigo 35º da Constituição da República, e que, pela lei do processo, afigurar-se-lhe-ia inviabilizada a
“por uma questão de coerência e alinhamento com esta admissibilidade do presente recurso.
novidade”, foi também alterada a redação do artigo 305,
nº 2, do CPP de 2015; 3. Marcada sessão de julgamento para o dia 11 de maio,
nessa data se realizou, com a participação dos Venerandos
1.2.3. Entende que “no CPP de 2021”, como o denomina, Juízes-Conselheiros e do Senhor Secretário do Tribunal
“o legislador quis e condicionou o instrutor do processo Constitucional.
à audição prévia do arguido, antes de ser proferid[o] o
despacho de acusação, oferecendo provas e requerendo 3.1. O julgamento culminou com a adoção do Acórdão
as diligências que se lhe afigurarem necessárias”. Logo, 97/2023, de 13 de junho, através do qual os juízes conselheiros
pela forma como se previu e impôs tal incumbência decidiram que o recorrente deveria ser notificado para
“oferecendo provas e requerendo as diligências que se aperfeiçoar a sua peça: a) Resolvendo o problema da
lhe afigurarem necessárias”, ela não é satisfeita com o sua identificação, apresentando os dados pertinentes; b)
1º interrogatório de arguido detido, porque se tratam Inserindo conclusões à sua peça; e, c) Precisando melhor
de duas diligências distintas e com objetivos diferentes, a(s) conduta(s) que pretende impugnar.
embora possam ser identificadas algumas semelhanças. 3.2. A decisão foi notificada ao recorrente no dia 14
Para fundamentar o seu posicionamento remete para de junho, às 16:44. Em resposta à mesma o recorrente
a doutrina e pelo defendido pelo Advogado João Felix protocolou uma peça de aperfeiçoamento do seu recurso,
Cardoso sobre essa questão em: Especial Complexidade no dia 16 de junho.
do Processo no Ordenamento Jurídico Cabo-Verdiano –
Iseditorial, 2021, p. 90; 3.3. Na peça acima referida foi identificado como
1.2.4. Defende que a tese que vinha sendo largamente recorrente o Senhor Hélder Manuel Duarte da Lomba e
defendida pelo Ministério Público de que a audiência antes foi inserida uma parte destinada às conclusões onde foi
da acusação não era obrigatória, mas sim facultativa, foi feita a exposição resumida, por artigos, os fundamentos
claramente ultrapassada com a alteração do CPP de 2021, de facto e de direito que justificam a petição;
tese atualmente interiorizada por esse mesmo MP, pelo menos 3.4. Identificou como condutas que pretende impugnar:
pelo que ficou patente nos Autos de Instrução nº 17/2021/2022;
3.4.1. Ter o Ministério Público da Comarca da Brava
1.3. Alega que, no caso em apreço, o “Ministério Público, proferido despacho de acusação contra o requerente,
concluiu, a instrução e proferiu o despacho de acusação, enquanto arguido, sem o ouvir previamente;
sem dar efetivo cumprimento ao direito de audiência do
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arguido previsto no art.º 35º, nº 6 e 7 da CRCV, e no artigo 3.4.2. Não ter o Tribunal da Comarca da Brava conhecido
77º, nº 1, al. b) do CPP, fulminando, aquela peça processual oficiosamente da nulidade da acusação por omissão do
com nulidade insanável nos termos do art.º 151º, nº[???,] direito/obrigação de audiência prévia do arguido, pelo
al. d) e k) e art.º 305º, nº 2” tendo em conta que, na data Ministério Público, antes da acusação;
em que foi proferida a acusação, já se encontrava em
vigor a Lei nº 122/IX/2021. 3.4.3. Não ter o Tribunal da Relação de Sotavento
atendido ao requerimento no qual o requerente solicitava
1.4. Pede que seja anulado o Acórdão TRS 40/2023, sejam que fosse conhecida a nulidade insanável da acusação
restabelecidos os direitos do recorrente ao contraditório, à por omissão do direito/obrigação de audiência prévia do
ampla defesa, à audiência, ao processo justo e equitativo e arguido, pelo Ministério Público, antes da acusação e,
à liberdade sobre o corpo e seja adotada medida provisória consequentemente, da nulidade da sentença do Tribunal
determinando a sua soltura imediata. da Comarca da Brava.
2. Cumprindo o estabelecido no artigo 12 da Lei do 4. Marcada nova sessão de julgamento para o dia 23
Amparo, foram os autos com vista ao Ministério Público de junho, nessa data se realizou, com a participação dos
para emissão de parecer sobre a admissibilidade do Venerandos Juízes-Conselheiros e do Senhor Secretário do
recurso, o qual, subscrito por sua Excelência o Senhor TC, dela decorrendo a decisão que se segue acompanhada
Procurador-Geral da República, no essencial, ofereceu dos fundamentos articulados infra.
argumentação no sentido de que:
2.1. Do que se alcança dos autos afigurar-se-ia que os II. Fundamentação
mesmos não teriam condições de admissibilidade por se 1. Do ponto de vista constitucional, o recurso de amparo
suscitarem dúvidas sobre a legitimidade do recorrente, é concebido como um direito fundamental de “requerer
pois que, compulsados os autos, não seria possível extrair ao Tribunal (…) a tutela de (…) direitos, liberdades e
do conteúdo do acórdão impugnado que o ora recorrente garantias, constitucionalmente reconhecidos”, e também
- Hélder Cristiano Andrade Vaz – teria sido interveniente como um meio “de tutela de direitos, liberdades e garantias”,
processual nos autos do processo ordinário a que se refere, consagrando-se a sua dupla-natureza subjetiva e objetiva.
porque quem constaria como recorrente seria o arguido
Hélder Manuel Duarte da Lomba; 1.1. Direito este que é delimitado materialmente, na medida
em que destinado à proteção direta de apenas uma das
2.2. Não obstante, acrescenta que, no caso em apreço, três categorias de direitos fundamentais previstas pela Lei
não lhe parece que se teriam esgotado todas as vias de Fundamental. Seriam os denominados direitos, liberdades
recurso ordinário permitidas pela lei do processo porque as e garantias, tanto os individuais, como os de participação
alegadas violações teriam ocorrido com a prolação do TRS; política e de exercício da cidadania e, arguivelmente, os
2.3. Que, assim sendo, tendo os arguidos sido condenados dos trabalhadores. É verdade que se estende para recobrir
pela Relação após a entrada em vigor da Lei 122/IX/2021, os direitos análogos a direitos liberdades e garantias ou
de 1 de abril, onde se incluiu a alínea i) do artigo 437 e que portem caraterísticas específicas com dimensões
tendo esse mesmo tribunal baixado as penas iniciais para individuais e civis como, respetivamente, os direitos de
penas inferiores a 8 anos de prisão, não confirmando a proteção judiciária (Acórdão 6/2017, de 21 de abril, Maria
decisão de primeira instância, afigurar-se-lhe-ia que a de Lurdes v. STJ, sobre pedido de desistência, Rel: JC
decisão desse órgão judicial seria suscetível de recurso Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 42,
para o STJ. 21 de julho de 2017, pp. 898-903, 5; Acórdão 9/2017, de

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1480 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

8 de junho, Martiniano Oliveira v. STJ, Rel: JCP Pinto termos da sua respetiva jurisdição, cabendo efetivar essa
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 42, tutela através dos processos ordinários desenhados pela lei,
21 de julho de 2017, pp. 925-929, e); Acórdão 13/2017, dos processos especiais previstos pela Constituição como
de 20 de julho, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto o Habeas Corpus ou o recurso contencioso administrativo,
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 47, 8 de ou daqueles que venham a ser definidos pelo legislador,
agosto de 2017, pp. 1024-1029, e); Acórdão 24/2017, de nos termos do artigo 22, parágrafo sexto, segundo o
9 de novembro, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto qual “[p]ara a defesa dos direitos, liberdades e garantias
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 78, 22 individuais, a lei estabelece procedimentos judiciais céleres
de dezembro de 2017, pp. 1692-1698, e); Acórdão 12/2018, e prioritários que assegurem a tutela efetiva e em tempo
de 7 de junho, CIMA v. STJ, Rel: JC Aristides R. Lima, útil contra ameaças ou violações desses mesmos direitos,
Decisão de admissibilidade, publicado no Boletim Oficial, liberdades e garantias” (Acórdão nº 36/2022, de 12 de agosto,
I Série, N. 49, 20 de julho de 2018, b; Acórdão 16/2018, Ramiro Oliveira Rodrigues v. TRB, sobre violação do direito
de 28 de julho, Luigi Zirpoli v. TJCP, Rel: JCP Pinto de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva por não-
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 49, 20 admissão de recurso designado pelo recorrente de amparo
de julho de 2018, pp. 1298-1302, e); Acórdão 17/2018, ordinário por tribunal judicial, Rel: JC Pina Delgado, 5.1.3).
de 26 de julho, Amândio Vicente v. TRS, Rel: JCP Pinto
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 51, 3 de 1.2.2. E, em consequência, a subsidiariedade do recurso de
agosto de 2018, pp. 1328-1333, e); Acórdão 22/2018, de 11 amparo, recurso constitucional de natureza especial, ao qual
de outubro, Martiniano v. STJ, sobre o direito de acesso só se pode lançar mão, depois de se explorar os mecanismos
aos tribunais, Rel: JC José Pina Delgado, publicado no que correm perante os tribunais ordinários para que estes
Boletim Oficial, I Série, N. 76, 22 de dezembro de 2018, pp. possam conhecer e garantir a tutela desses mesmos direitos.
1824-1835, 2; Acórdão 3/2019, de 24 de janeiro, Ramiro 1.3. E caraterizado pelo seu informalismo, urgência
Rodrigues v. TRB, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no e sumariedade, conforme decorre da alínea b) do artigo
Boletim Oficial, I Série, N. 28, 13 de março de 2019, pp. 20, segundo a qual ele “pode ser requerido em simples
480-486, e); Acórdão 36/2022, de 12 de agosto, Ramiro petição, tem caráter urgente e o seu processamento deve
Oliveira Rodrigues v. TRB, sobre violação do direito de ser baseado no princípio da sumariedade”.
acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva por não-
admissão de recurso designado pelo recorrente amparo 1.4. Por conseguinte, está-se perante um direito
ordinário por tribunal judicial, Rel: JC Pina Delgado, fundamental e um recurso constitucional desenhado
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 2, 5 de janeiro especialmente para a proteção de direitos, liberdades e
de 2023, p. 36-42, 2.1) e o direito à propriedade privada garantias, que pode ser utilizado subsidiariamente quando
(Acórdão 30/2019, de 30 de agosto, Atlantic Global Asset os meios ordinários de tutela de direitos que correm os
Management v. PGR, sobre violação do direito à propriedade seus trâmites perante os tribunais judiciais ou outros,
privada, da garantia de juiz, da iniciativa privada e dos a existirem, falham. Tais caraterísticas impõem que a
própria lei de processo constitucional que desenvolve
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direitos à defesa, ao contraditório e de acesso às provas


da acusação, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim os procedimentos atinentes ao recurso de amparo seja
Oficial, I Série, N. 110, 29 de outubro de 2019, pp. 1766- interpretada como uma lei restritiva de direito cujo figurino
1789); ou ainda para situações que envolvam camadas básico se deve manter dentro dos confins dos números 4 e
de proteção essenciais que remetam a certos direitos, 5 do artigo 17 da Constituição, ainda que parte do regime
liberdades e garantias como a vida ou a integridade possa ser legitimamente fixado pelo legislador em razão
pessoal. Porém, fora desses casos, com a tendencial da remissão à lei (“nos termos da lei”), desde que não se
não-inclusão dos direitos económicos, sociais e culturais atinja de modo ilegítimo as caraterísticas essenciais do
e dos direitos de grupos vulneráveis que não portem instituto impostas pelo próprio dispositivo constitucional
caraterísticas de direitos, liberdades e garantias, e também (“e com observância [obrigatória, diga-se] do disposto nas
de princípios constitucionais objetivos, como, em diversos alíneas seguintes (…)”.
momentos, este Tribunal já decidiu (Acórdão 11/2017, 2. As exigências da peça de recurso de amparo são as
de 22 de junho, Maria de Lurdes v. STJ, sobre violação consagradas nos artigos 7º e 8º da Lei do Amparo e do
do direito de constituir família por não reconhecimento Habeas Data, os quais impõem, respetivamente, que:
de união de facto, Rel: JC Pina Delgado, publicado no
Boletim Oficial, I Série, N. 42, 21 de julho, pp. 933-950 e 2.1. A petição seja:
na Coletânea de Decisões do Tribunal Constitucional de 2.1.1. Interposta através de simples requerimento,
Cabo Verde, Vol. III, Praia, INCV, 2018 (2017), pp. 423- com indicação expressa de que o recurso tem a natureza
477, 20.1; Acórdão 29/2017, de 5 de dezembro, Ovídio de amparo;
de Pina v. STJ, Rel: JC Aristides R. Lima, publicado no
Boletim Oficial, I Série, N. 6, 1 de fevereiro de 2018, pp. 2.1.2. Devidamente fundamentada; e
75-93, 20.1; Acórdão 06/2018, de 22 de março, Adilson
Danielson v. STJ, Rel: JC Pina Delgado, Boletim Oficial, 2.1.3. Entregue na Secretaria do Tribunal Constitucional.
I Série, N. 21, de 11 de abril de 2018, pp. 495-505, 2; 2.2. Quanto ao que a lei designa de “fundamentação
Acórdão 27/2018, de 20 de dezembro, Judy Ike Hills v. do recurso”, exige-se que o recorrente, através da peça,
STJ, sobre violação de garantia de inviolabilidade de
domicílio, de correspondência e de telecomunicações e 2.2.1. Identifique a entidade, o funcionário ou o agente
de garantia da presunção da inocência na sua dimensão autor do ato ou da omissão, bem como os interessados a
de in dubio pro reo, Rel: JC Pina Delgado, publicado no que o provimento do recurso possa diretamente beneficiar
Boletim Oficial, I Série, N. 11, 31 de janeiro de 2019, pp. ou prejudicar, havendo-os;
146-178, 2.1.1). Por conseguinte, trata-se de um recurso 2.2.2. Indique com precisão “o ato, facto ou a omissão”
especialmente desenhado para proteger uma categoria que, na sua opinião, violou os seus direitos amparáveis;
especial de direitos que goza de regime de tutela mais
intenso: os direitos, liberdades e garantias. 2.2.3. Indique com clareza quais deles terão sido
vulnerados, “com a expressa menção das normas ou
1.2. E que fica processualmente condicionado ao princípios jurídico-constitucionais que entende terem
esgotamento das vias ordinárias de recurso, opção da sido violados”;
qual resulta um figurino constitucional que produz
diversos efeitos. 2.2.4. Exponha resumidamente as razões de facto que
fundamentam o pedido, bem como “formul[e] conclusões,
1.2.1. Desde logo, a conceção de que todos os tribunais nas quais resumirá, por artigos, os fundamentos de facto
cabo-verdianos são tribunais de proteção de direitos, nos e de direito que justificam a petição”;

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1481

2.2.5. Esta deverá “terminar com o pedido de amparo amparo. Porém, a sua peça não cumpria na sua plenitude
constitucional no qual se indicará o amparo que o recorrente a forma prevista na lei, desde logo porque não foi feita a
entende dever ser-lhe concedido para preservar ou correta identificação do recorrente e, além disso, por não se
restabelecer os direitos, liberdades ou garantias violados”, ter indicado com a precisão necessária as condutas que se
devendo vir acompanhada dos “documentos que julgar pretendia impugnar e também por não ter incluído na mesma
pertinentes e necessários para a procedência do pedido”. um segmento conclusivo resumindo por artigos os fundamentos
de facto e de direito que suportavam os seus pedidos.
2.3. O objeto dessas disposições é determinar o modo de
interposição e definir a estrutura da peça processual, de 2.3.5. Assim sendo, o Tribunal julgou necessário
tal sorte que, de forma célere e simplificada, se permita determinar que fosse notificado o recorrente para suprir
ao Tribunal Constitucional identificar os elementos as deficiências da sua peça, resolvendo o problema da
constitutivos da súplica para que possa decidir sobre a identificação do recorrente, mediante apresentação de
sua admissibilidade, sobre eventuais medidas provisórias dados pertinentes, inserindo a parte conclusiva em falta e
aplicáveis e, subsequentemente, sobre o seu mérito. precisando melhor a(s) conduta(s) que pretende impugnar.
2.3.1. De um lado, através da facilitação do acesso a 2.4. O recorrente apresentou a sua peça de recurso no
esses elementos que decorreriam do modo de organização dia 16 de junho de 2023, cumprindo o prazo estabelecido
da peça e da entrega direta no Tribunal Constitucional; na Lei do Amparo e do Habeas Data para o efeito,
identificando-se como sendo o Sr. Hélder Manuel Duarte
2.3.2. Do outro, pelo facto de se impor um determinado da Lomba, incluindo na sua peça uma parte destinada
conteúdo à mesma, na medida em que, do ponto de vista às conclusões, resumindo por artigos os fundamentos de
do número 1 do artigo 8º, primeiro, remete-se, através das facto e de direito que suportam os seus pedidos e indicando
alíneas a) e b); para a identificação das condutas lesivas como condutas que pretende impugnar:
(“ato, facto ou a omissão”) e para o órgão do poder público
ao qual podem ser imputadas (“a entidade, o funcionário 2.4.1. Ter o Ministério Público da Comarca da Brava
ou o agente autor do ato ou da omissão”); segundo, por proferido despacho de acusação contra o requerente,
meio da alínea c), aos direitos, liberdades e garantias enquanto arguido, sem o ouvir previamente;
vulnerados por aquelas (“indicar com clareza os direitos, 2.4.2. Não ter o Tribunal da Comarca da Brava conhecido
liberdades e garantias fundamentais”) e às disposições oficiosamente da nulidade da acusação por omissão do
onde estariam alojados ou os princípios de onde podem direito/obrigação de audiência prévia do arguido, pelo
ser inferidos (“com a expressa menção das normas ou Ministério Público, antes da acusação;
princípios-constitucionais que entendem terem sido
violados”); terceiro, nos termos do número 2 da mesma 2.4.3. Não ter o Tribunal da Relação de Sotavento
disposição, à explicitação do amparo que se pretende para atendido ao requerimento no qual o requerente solicitava
se remediar a eventual lesão (“a petição terminará com que fosse conhecida a nulidade insanável da acusação
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o pedido de amparo constitucional no qual se indicará o por omissão do direito/obrigação de audiência prévia do
amparo que o recorrente entende dever ser-lhe concedido arguido, pelo Ministério Público, antes da acusação e,
para preservar ou restabelecer os direitos, liberdades e consequentemente, da nulidade da sentença do Tribunal
garantias fundamentais violados”). A argamassa que da Comarca da Brava.
ligaria esses três elementos decorreria dos fundamentos
de facto e de direito que justificam a petição, como também 2.4.4. Mais especificamente, dispondo a Constituição
se impõe apresentar, conforme o disposto nas alíneas d) que a tramitação do amparo deve ser baseada no princípio
e e) do parágrafo primeiro da primeira disposição. da celeridade, as condições para tanto devem começar a
ser criadas pelos próprios jurisdicionados apresentando
2.3.3. A regra é que, do ponto de vista da articulação devidamente as suas peças, calibrando a extensão da
da petição de amparo, deve haver o estabelecimento de sua argumentação, precisando os elementos nucleares do
uma ligação lógica entre cada conduta impugnada, as recurso em termos de identificação de conduta atribuível
posições jurídicas decorrentes do(s) direito(s) que ela a poder público, indicação dos parâmetros de escrutínio
vulnera e o amparo adequado para a remediar através da e definição do amparo pretendido, a tríade que compõe a
fundamentação. O que se tem verificado até agora é que estrutura vital deste recurso. Sendo certo que em relação
na maior parte dos casos, isso é muito deficientemente aos derradeiros, a legislação de processo constitucional
articulado, lançando-se para a peça de recurso, sem grande aplicável – neste caso, o artigo 24, parágrafo segundo,
precisão e racionalização, uma pluralidade de condutas da Lei do Amparo e do Habeas Data – permite a esta
a que globalmente se imputam violações de um conjunto Corte suprir deficiências de indicação de parâmetros e
diversificado de direitos, e remetendo-se para amparos amparos, além de ser um risco que, desnecessariamente,
genéricos ou impossíveis. O Tribunal Constitucional desde o recorrente não deve assumir, posto que se trata de ato
o Acórdão nº 10/2017, de 8 de junho, Adilson Danielson discricionário do Tribunal (note-se, num caso e no outro,
v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim a utilização da expressão “pode”) – que utilizará quando
Oficial, I Série, N. 42, 21 de julho de 2017, pp. 929-933, entender justificado e conveniente – isso, a) consome
b), tem tolerado a interposição de vários amparos que não sempre muito mais tempo; b) desvia a atenção individual
cumprem essas exigências qualitativas, considerando que dos juízes de outros aspetos da aferição de admissibilidade;
a disposição deve ser lida sempre de forma compatível ao c) aumenta a carga de esforço do Coletivo em arbitrar ele
direito constitucional ao amparo, no sentido de que “mais próprio parâmetros e amparos. E, d), no mínimo, pode
importante que o rigor formal é a inteligibilidade do que resultar no adiamento da apreciação do pedido de amparo,
se expõe e se requer”. Mas, a duras penas, considerando se não na sua inadmissão.
a grande dificuldade que se tem para se compreender
o que se impugna, o que se pede e os fundamentos que 2.4.5. Como foi acima referido, perante as deficiências
suportam as petições. A Corte Constitucional continuará – da sua petição inicial o recorrente foi notificado do
transitoriamente – aberta a privilegiar as admissibilidades, Acórdão 97/2023, de 13 de junho, Hélder Manuel Duarte
suprindo ela própria, eventuais deficiências das peças, mas, da Lomba ???/ Hélder Cristiano Andrade Vaz ??? v.
depois de vários anos de prática do amparo em Cabo Verde, TRS, Aperfeiçoamento por obscuridade na identificação
é preciso entrar numa nova fase mais exigente, sustentada do recorrente; ausência de conclusões e falta de precisão
numa melhor qualificação. na indicação das condutas impugnadas, Rel: JCP Pina
Delgado, para aperfeiçoar a sua peça, resolvendo o
2.3.4. Na presente situação, o requerente apresentou o problema da sua identificação, inserindo conclusões e
seu requerimento na secretaria do Tribunal Constitucional, precisar melhor a(s) conduta(s) que pretendia impugnar.
indicando expressamente que se tratava de recurso de Contudo, se em relação à questão da identificação e

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1482 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

ausência de conclusões se pode admitir que foram junho, António Veiga e Outros v. PGR, Rel: JCP Pinto
supridas tais insuficiências, já no que tange à indicação Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 88, 16
com precisão das condutas impugnadas o recorrente não de setembro de 2021, pp. 2264-2270, c)).
logrou colmatar integralmente tais deficiências, porque,
pelo menos em relação à terceira conduta impugnada 4.3. Por fim, tratando-se de recurso referente a questão
utiliza um termo, “atender”, com significado ambíguo, suscitada em processo que corre os seus termos nos
que não permite saber se quer desafiar ato do órgão tribunais regulado pelo artigo 5º, parágrafo primeiro, o
judicial recorrido de não ter conhecido os argumentos prazo de interposição é de vinte dias contados da data de
que arrolou e/ou os pedidos que fez ou o facto de não ter notificação da decisão que se recusou a reparar a violação
considerado procedentes as suas alegações. Considerando praticada, e por força do artigo 1º da Lei do Amparo e do
que a primeira hipótese conduziria a uma via sem a mínima artigo 50 da Lei do Tribunal Constitucional, com suspensão
correspondência com o conteúdo do ato judicial impugnado, de contagem aos sábados, domingos e feriados, conforme
excecionalmente o Tribunal acolhe a segunda, sem, no remissão para o Código de Processo Civil.
entanto, deixar de aproveitar a ocasião para reiterar que o 4.3.1. No caso em análise, o recorrente foi notificado
aperfeiçoamento da indicação de condutas depende de elas do acórdão impugnado no dia 22 de março de 2023, às
serem inequivocamente precisadas através de terminologia 15:52, através de mensagem enviada ao seu mandatário
linguística e tecnicamente adequada, em moldes que não por correio eletrónico;
fiquem dúvidas sobre as pretensões do recorrente.
4.3.2. Tendo o seu recurso de amparo dado entrada na
3. Com essa observação, consegue-se depreender as secretaria do Tribunal Constitucional no dia 20 de abril do
condutas que pretende impugnar e a entidade que as mesmo ano, conclui-se que terá sido recebido em tempo,
terá empreendido, os direitos que entende terem sido por o dia 7 de abril ser feriado nacional, suspendendo nesse
violados e, genericamente, intui-se o amparo último que dia a contagem do prazo de 20 dias para a interposição
almeja obter, aspetos que serão avaliados adiante, se for do recurso, nos termos do artigo 5º da Lei do Amparo e
necessário. Isso porque diz que: do Habeas Data, conjugado com o disposto no artigo 137,
3.1. As condutas que pretende impugnar são as que número 2, do CPC.
se consubstanciam no facto de: 5. A construção adequada da peça ou o seu aperfeiçoamento
3.1.1. Ter o Ministério Público da Comarca da Brava permitem que o Tribunal Constitucional, antes de tudo,
proferido despacho de acusação contra o requerente, consiga identificar o centro nevrálgico do escrutínio de
enquanto arguido, sem o ouvir previamente; amparo – a conduta impugnada – que se constituirá no
objeto do recurso. Podendo materializar-se tanto num
3.1.2. Não ter o Tribunal da Comarca da Brava conhecido ato, como numa omissão, a conduta corresponde a um
oficiosamente da nulidade da acusação por omissão do comportamento de uma entidade à qual se imputa a
direito/obrigação de audiência prévia do arguido, pelo vulneração de um direito, liberdade e garantia. É a isso
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Ministério Público, antes da acusação; que se refere tanto o artigo 20 da Lei Fundamental quando
3.1.3. Não ter o Tribunal da Relação de Sotavento remete à “tutela dos seus direitos, liberdades e garantias
atendido ao requerimento no qual o requerente solicitava fundamentais (…)”, como o artigo 2º da Lei do Amparo,
que fosse conhecida a nulidade insanável da acusação quando se refere à “prática de factos ou à omissão de atos
por omissão do direito/obrigação de audiência prévia do ou factos”. Isso desde que em relação aos atos, nos termos
arguido, pelo Ministério Público, antes da acusação e, do artigo 2º, número 3, da Lei do Amparo e do Habeas Data,
consequentemente, da nulidade da sentença do Tribunal estes não assumam natureza legislativa ou normativa,
da Comarca da Brava. devendo o Tribunal Constitucional recusar qualquer
impugnação que ataque diretamente norma constante
3.2. Que violariam vários direitos fundamentais como de dispositivo legal ou equiparado, como, de resto, tem
o direito de audiência, o direito a um processo justo e feito ao recusar-se a admitir recursos de amparo que
equitativo e o direito à liberdade sobre o corpo; impugnam normas (Acórdão 35/2019, de 18 de outubro,
3.3. E por isso seria merecedor do amparo de anulação Alírio Barros v. TRS sobre indeferimento de recurso de
do Acórdão TRS 40/2023, de 22 de março, e de anulação fiscalização concreta da constitucionalidade por não
de todo o processado até a acusação do MP, inclusive, aplicação de norma impugnada, Rel: JC Pina Delgado,
determinando-se a audiência prévia do requerente pelo publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 110, 29 de outubro
Ministério Público antes de este proferir a acusação. de 2019, pp. 1813-1828, 2., Acórdão 11/2017, de 22 de
junho, Maria de Lurdes v. STJ, sobre violação do direito
4. Antes de continuar, cuida o Tribunal de verificar se de constituir família por não reconhecimento de união de
os pressupostos gerais de admissibilidade se encontram facto, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial,
preenchidos, caso seja necessário, ressaltando-se que: I Série, N. 42, 21 de julho, pp. 933-950 e na Coletânea
4.1. Por força do artigo 20, parágrafo primeiro, da de Decisões do Tribunal Constitucional de Cabo Verde,
Constituição da República, e do artigo 18, alínea a) Vol. III, Praia, INCV, 2018 (2017), pp. 423-477, 2.3.4,
da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Acórdão 15/2017, de 26 de julho, INPS v. STJ, sobre a
Tribunal Constitucional, é evidente que este tribunal é constitucionalidade do nº 2) do Art. 3º e o Art. 2º do DL
competente em razão da matéria, considerando que se 194/91, na interpretação que lhe foi dada pelo Presidente
imputa ao órgão judicial recorrido a violação de direito, do STJ, no sentido de que fixa um prazo de recurso de
liberdade e garantia; cinco dias, independentemente de se tratar de um litígio
decorrente de relação de trabalho estabelecida ou de litígio
4.2. O recorrente, na medida em que, nos termos do tendente à constituição de uma relação de trabalho, Rel:
artigo 20, parágrafo primeiro, se arroga ser titular de JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série,
posição jurídica com essa natureza, e de, conforme a N. 35, 6 de junho de 2018, pp. 844-856 e na Coletânea
parte final do número 1 do artigo 4º da Lei do Amparo e de Decisões do Tribunal Constitucional de Cabo Verde,
do Habeas Data, ser pessoa direta, atual e efetivamente Vol. IV, INCV, 2018 (2017), pp. 137-176, 2.2.1, Acórdão
passível de ser afetada pela conduta impugnada, já que, 22/2018, de 11 de outubro, Martiniano v. STJ, sobre a
tendo sido arguido em processo penal e tendo ficado violação do direito de acesso aos tribunais por decisão de
condenado a uma sanção criminal, possui legitimidade deserção de recurso, Rel: JC José Pina Delgado, publicado
processual ativa, atestando-se igualmente a legitimidade no Boletim Oficial, I Série, N. 76, 22 de dezembro de
passiva, o mesmo ocorrendo com a entidade recorrida que 2018, pp. 1824-1835, 5. e 6, Acórdão 29/2019 e Acórdão
praticou o ato ao qual se imputa a lesão dos direitos nos 39/2022, de 28 de outubro, Tecnicil Imobiliária e Alfredo
termos da orientação geral (v. Acórdão 29/2021, de 3 de de Carvalho v. PGR, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1483

no Boletim Oficial, I Série, N. 2, 5 de janeiro de 2023, pp. Sotavento – nos termos do artigo 3º, parágrafo primeiro,
42-49, ii), estabelecendo claramente a distinção entre o alínea b), da Lei do Amparo e do Habeas Data. Acrescendo
objeto de recursos de amparo e o objeto de recursos de que em relação às mesmas não estaria preenchido o
fiscalização concreta da constitucionalidade. Na medida pressuposto de se ter invocado a lesão do direito logo que
em que a aplicação de qualquer ato normativo poderá ser o recorrente dele tenha tido conhecimento.
impugnada através deste último recurso constitucional
dificilmente se pode considerar o dispositivo legal que 6.2.2. Em relação à terceira conduta – esta sim, imputável
exclui do objeto do recurso de amparo atos públicos como ao Tribunal recorrido – o recorrente alega que “[u]m outro
portador de um vício de inconstitucionalidade. facto, que violou direitos amparáveis do requerente, é
de o Tribunal da Relação de Sotavento, não ter atendido
5.1. No caso concreto, o recorrente apresenta como o requerimento do requerente no sentido de conhecer a
condutas lesivas: nulidade insanável da acusação por omissão do direito/
obrigação de audiência prévia do arguido pelo Ministério
5.1.1. Ter o Ministério Público da Comarca da Brava Público antes da acusação, e consequentemente, da
proferido despacho de acusação contra o requerente, nulidade da sentença do Tribunal da Comarca da Brava.
enquanto arguido, sem o ouvir previamente; O Tribunal recorrido não só conheceu da questão colocada
5.1.2. Não ter o Tribunal da Comarca da Brava conhecido no referido requerimento, como a analisou e decidiu como
oficiosamente da nulidade da acusação por omissão do questão prévia (fls. 18 e 19 dos autos), indeferindo-o na
direito/obrigação de audiência prévia do arguido, pelo parte respeitante à arguição de nulidade da acusação e,
Ministério Público, antes da acusação; consequente, soltura, argumentando no essencial que “[a]
não audição do arguido, antes da dedução da acusação,
5.1.3. Não ter o Tribunal da Relação de Sotavento prevista pelo nº 2, do artigo 305º do C. P. Penal, embora
atendido – no sentido de “provido” – o/ao requerimento no sendo obrigatória, não constitui nulidade insanável, mas
qual o requerente solicitava que fosse conhecida a nulidade sim constitui a nulidade prevista na alínea c), do nº 2,
insanável da acusação por alegada omissão do direito/ do artigo 152º, do mesmo diploma legal, nulidade esta
obrigação de audiência prévia do arguido, pelo Ministério sanável, que deve ser arguida nos termos da alínea c),
Público, antes da acusação e, consequentemente, da do n.º 3 do mesmo preceito legal, até ao encerramento da
nulidade da sentença do Tribunal da Comarca da Brava. Audiência Contraditória Preliminar (ACP) ou, não havendo
5.2. Dando-se por preenchida essa imposição legal que lugar a esta audiência, até 5 dias, após a notificação do
fixa o próprio objeto do recurso, caso ele seja admitido. despacho que tiver encerrado a instrução, ou seja, neste
caso, da dedução da acusação”.
6. E, além disso, é determinante para se identificar os
direitos potencialmente atingidos pela conduta lesiva, uma 6.2.3. Neste sentido, a única conduta que pode ser
etapa essencial para se verificar se a conduta em causa é atribuída ao TRS é esta, ficando as que não foram
passível de ser amparada, do que depende, de uma parte, imputadas ao órgão judicial recorrido excluídas desde
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de estar em causa posição jurídica dependente de direito, já, por serem, enquanto tais, inadmissíveis.
liberdade ou garantia ou direito que se pode beneficiar do 7. Um pedido de amparo de anulação do Acórdão TRS
regime de proteção desta categoria de direitos, e, da outra, de, 40/2023, de 22 de março, e de anulação de todo o processado
em potência, ser ato que pode ser diretamente atribuível ao até a acusação do MP, inclusive, determinando-se a
órgão judicial recorrido por este poder ter responsabilidade audiência prévia do requerente pelo Ministério Público
direta, imediata e necessária na sua violação, portanto de antes de este proferir a acusação, pode ser considerado
esta poder ser-lhe imputável de alguma forma. congruente com o que se estabelece no artigo 25 da Lei
6.1. No presente caso o recorrente invoca vários direitos, do Amparo e do Habeas Data.
que, por serem garantias fundamentais associadas à 8. Ademais, consideram-se pressupostos especiais
liberdade sobre o corpo e ao direito à proteção judiciária, aplicáveis às situações em que o recurso de amparo é
são passíveis de serem amparados; colocado contra conduta do poder judicial que ela seja
6.1.1. Daí, dar-se por preenchida essa exigência formal expressa e formalmente invocada no processo logo que
incontornável, seja pela sua localização sistemática, seja o ofendido tenha dela recebido comunicação, que se
pela sua natureza intrínseca de garantias associadas ao tenham esgotado as vias legais de recurso e que tenha
direito à liberdade sobre o corpo, ou de direitos análogos sido requerida reparação.
de proteção judiciária. 8.1. A lei coloca, deste modo, um ónus sobre o titular
6.1.2. Assim, dúvidas não persistirão de que são, do direito de suscitar a questão no processo logo que o
respetivamente, garantias fundamentais em matéria ofendido tenha tido informação sobre o ocorrido, uma
criminal ou direitos análogos a direitos, liberdade e exigência que depende de o recorrente ter tomado
garantias, logo amparáveis. conhecimento da violação, nomeadamente através de
comunicações judiciais ou de consultas aos autos, e de
6.1.3. Excluindo-se desse rol, naturalmente, as regras haver mecanismos processuais previstos para alegar o
do Código de Processo Penal elencadas na peça. que entender em sua defesa.
6.2. A determinação final da ocorrência de violação 8.1.1. Neste caso, a única conduta em avaliação para
imputável ao órgão judicial recorrido é feita na fase efeitos de admissibilidade só pode ter sido praticada pelo
de mérito. No momento de avaliação da presença dos TRS primariamente, porque foi este Tribunal que não deu
pressupostos e requisitos de admissibilidade basta que provimento ao requerimento do recorrente alegando que
o Tribunal avalie a possibilidade racional e abstrata de se tinha preterido obrigação de audição prévia do arguido
a conduta impugnada ser suscetível de ter sido praticada antes de o MP proferir acusação, conjugado com ratio
direta, imediata e necessariamente pela entidade recorrida. decidendi nos termos da qual a preterição desse dever
conduziria a nulidade passível de sanação, a qual, não
6.2.1. Neste particular, verifica-se que o recorrente imputa sendo arguida em tempo, ficaria convalidada.
explicitamente, a primeira conduta, ao Ministério Público
e, a segunda, ao Tribunal da Comarca da Brava. O que 8.1.2. Independentemente de questão de se saber se
desde logo impossibilita esta Corte de dar continuidade diligência preliminar não seria necessária, o que se
à análise de admissão de tais condutas, alegadamente enfrentará adiante, pode-se dizer que em relação à conduta
violadoras de direitos, liberdades e garantias, porque não especificamente imputável ao TRS, o recorrente alegou-a
foram atribuídas direta, imediata e necessariamente ao ato logo que dela teve conhecimento, ainda que trazendo
ou omissão do órgão recorrido – o Tribunal da Relação de diretamente a questão ao TC.

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1484 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

8.2. De outra parte, dispõe o artigo 6º que “o recurso de 20 de julho, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto
de amparo só poderá ser interposto depois de terem sido Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 47, 8 de
esgotados todos os meios legais e todas as vias de recurso agosto de 2017, pp. 1024-1029, esta Corte Constitucional
ordinário estabelecidas pela respetiva lei de processo”. tem sustentado a imprescindibilidade de se confirmar
que houve pedido de reparação, passando, já na fase de
8.2.1. A fórmula utilizada vai num sentido extremamente admissibilidade, a avaliar o cumprimento do disposto na
amplo porque referindo-se a meios legais abarca mecanismo alínea c) do número 1 do artigo 3 em conjugação com o
que seja idóneo assegurar a defesa de direitos e interesses disposto no artigo 6. Portanto, para haver esgotamento
legítimos seja ela pré-decisório, decisório ou pós-decisório; das vias ordinárias de recurso é preciso que se prove
ordinário, extraordinário ou especial. Do que decorre o ter invocado perante a instância recorrida a violação
efeito evidente de que, neste caso, por motivos evidentes, do direito alegadamente violado em termos percetíveis,
enquanto os mecanismos pré-decisórios de tutela através da que se tenha requerido a sua reparação, que a violação
submissão de requerimentos vários podem ser absorvidos não tenha sido reparada e que, no momento em que se
pela necessidade de recurso ordinário decorrente do requer o amparo ao Tribunal Constitucional, processos
segundo segmento da disposição, o facto de inexistirem paralelos, passíveis de garantir a tutela do direito, não
recursos ordinários disponíveis não isenta os titulares do estejam a tramitar em qualquer outra instância (Acórdão
direito de terem de utilizar qualquer via legal decisória 28/2020, de 24 de julho, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP
prevista na respetiva lei de processo, desde que ela seja Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
hábil a produzir o efeito de proteção do direito. Isso, na 139, 23 de dezembro de 2020, p. 2168-2172, d); Acórdão
medida em que preservado o poder jurisdicional do tribunal 57/2020, de 2 de dezembro, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP
recorrido em relação à questão colocada, por exemplo Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série,
uma nulidade, este possa revogar a sua própria decisão. N. 16, 12 de fevereiro de 2021, p. 565-573, d); Acórdão
8.2.2. Na situação concreta que temos em mãos, não 40/2021, de 14 de setembro, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP
sendo situação que legalmente permitisse mais um Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
recurso ordinário, por força do estabelecido no artigo 437, 100, 15 de outubro de 2021, p. 2571-2579, d); Acórdão
parágrafo primeiro, alínea i), do CPP, de acordo com a 45/2021, de 6 de outubro, Amadeu Oliveira v. STJ, Rel:
qual não seriam recorríveis os “acórdãos condenatórios JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série,
proferidos em recurso, pelas relações, que confirmem as N. 100, 15 de outubro de 2021, p. 2604-2610, d)).
decisões de primeira instância e apliquem pena de prisão Havendo, por motivos evidentes, flexibilidade para se
não superior a oito anos”, haveria que se verificar se o o fazer através de meios ordinários ou extraordinários,
recorrente, tendo a possibilidade de colocar a questão é exigência incontornável que se assim se proceda – e,
invocando o segmento do artigo 408, parágrafo segundo, talvez, sobretudo, nos casos em que a violação primária só
da lei de processo em causa – o Código de Processo Penal – pode ser atribuída ao último tribunal na cadeia decisória
não o fez. O preceito estabelece que “será lícito ao tribunal, – tanto nos casos em que se se lhe atribui uma violação
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oficiosamente ou a requerimento, suprir nulidades, retificar por ação, como uma violação por omissão. Nesta situação
erros materiais ou quaisquer omissões, inexatidões ou concreta, o que se observa é que
lapsos manifestos, esclarecer dúvidas existentes na decisão
e reformá-la quanto a custas”. Naturalmente, não se 8.3.1. É que não parece que tenha comprido o ónus de
colocando questão de ter havido erro material incidente confrontar o órgão recorrido com a sua própria violação,
sobre a própria decisão, a única causa que interessará pedindo a competente reparação, na medida em que a
seria a da supressão de nulidades, seja do processo, seja razão que serviu da ratio decidendi, e que sempre se
da decisão, seria decisivo verificar se era exigível esgotar imporia, é o facto de o tribunal recorrido ter entendido
esta via legal pós-decisória também. que a “não-audição do arguido, antes da dedução da
acusação, prevista pelo número 2, do artigo 305, do [do
8.2.3. Neste particular, pode-se dizer que o recorrente CPP], embora sendo obrigatória, não constitui nulidade
utilizou todas as vias ordinárias e legais previstas pela insanável, mas sim constitui a nulidade prevista na
lei de processo em causa para fazer valer os direitos de alínea c), do n.º 2, do artigo 152, do mesmo diploma legal,
sua titularidade que julga terem sido violados, na medida nulidade esta sanável, que deve ser arguida nos termos
em que não seria exigível atacar em sede de incidente pós- da alínea c), do número 3, do mesmo preceito legal, até
decisório as condutas ainda em apreciação pelo facto de isso ao encerramento da [ACP] ou, não havendo lugar a esta
ter o efeito de se atacar o próprio mérito da decisão. Assim audiência, até cinco dias, após a notificação do despacho
sendo, o Tribunal Constitucional dá por ultrapassada a que tiver encerrado a instrução, ou seja, neste caso, da
barreira do esgotamento de todas as vias legais disponíveis dedução da acusação. In casu, o despacho de acusação
na lei de processo da qual emerge o recurso de amparo, ocorreu no dia 18 de fevereiro de 2022, e o recurso do
deixando em aberto a possibilidade de isso gerar efeitos recorrente invocando a nulidade do despacho de acusação
sobre o preenchimento do pressuposto subsequente. ocorreu no dia 17 de janeiro de 2023, ou seja, quase um
8.3. Dispõe a lei que o pedido de amparo contra condutas ano após o prazo em que o recorrente deveria arguir tal
do poder judicial depende de ter “sido requerida reparação”, nulidade. Assim, com base no que foi dito supra é de se
condição essencial para, por um lado, garantir que os inferir o requerimento do arguido Hélder, no que respeita
tribunais judiciais, que também são órgãos de proteção à arguição da nulidade da acusação e consequente soltura”.
de direitos, possam reparar eventuais lesões que tenham 8.3.2. Os argumentos que o recorrente trouxe para
ocasionado, e, do outro, evitar que o Tribunal Constitucional contestar os fundamentos decisórios do órgão judicial
seja inundado de súplicas de amparo que pudessem ter recorrido a partir de 4.17, atribuindo aos mesmos as
sido resolvidas e ultrapassadas através da intervenção dos violações dos seus direitos tinham de ser colocadas
tribunais judiciais e garantir que quando ele intervenha todos antes ao órgão judicial recorrido para que ele as pudesse
os argumentos já tenham sido apresentados e discutidos apreciar e eventualmente reparar antes de trazer pedido
e a questão já esteja estabilizada e amadurecida. Sendo de amparo ao Tribunal Constitucional.
assim, tendo o Acórdão 11/2017, de 22 de junho, Maria
de Lurdes v. STJ, sobre violação do direito de constituir 8.3.3. Por conseguinte, era exigência incontornável que
família por não reconhecimento de união de facto, Rel: pedido de reparação dirigido ao TRS se seguisse ao ato
JC Pina Delgado, 1.2.2, assentado entendimento de que judicial impugnado na sequência da sua notificação ao
é mister verificar se uma imputação de vulneração de recorrente. Porém, tendo o mesmo recebido a notificação
direito que é submetida foi precedida da colocação da da decisão a seguir à sua prolação não alega, nem se
questão ao órgão judicial recorrido em moldes que este a depreende dos autos, que tenha pedido reparação no
pudesse apreciar e reparar, a partir do Acórdão 13/2017, concernente às três condutas assinaladas.

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1485

8.3.4. Destarte, não parece a este Tribunal que o do requerido. Mas, não será necessário discutir esta
pressuposto especial de pedido de reparação foi cumprido questão no âmbito dos presentes autos, posto que tendo
pelo recorrente, inabilitando esta Corte Constitucional a o Tribunal já fixado orientação no sentido de que existe
conhecer a questão no mérito (Acórdão 14/2018, de 28 de uma relação indissociável e instrumental entre o amparo
junho, Edmir de Barros e Outros v. STJ, Rel: JCP Pinto destinado a remediar situações de violação de direitos,
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 49, de 20 liberdades e garantias e as medidas provisórias requeridas
de julho de 2018, d); Acórdão 21/2018, de 16 de outubro, no âmbito dos mesmos autos (Acórdão 08/2019, de 14 de
Edmir Semedo v. Diretor da Cadeia Central da Praia e fevereiro, João Batista Delgado v. TJCP, Rel: JCP Pinto
Ministra da Justiça, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 29, de
no Boletim Oficial, I Série, N. 68, de 25 de outubro de 14 de março de 2019, p. 509-511, II.).
2018, d); Acórdão 04/2019, de 24 de janeiro, Eduina
Ferreira v. Tribunal Judicial da Comarca do Paul, Rel: 10.2. E tendo a mesma orientação sido adotada, sem
JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, qualquer desvio, pelos seguintes arestos: Acórdão 21/2018,
N. 28, de 13 de março de 2019, d); Acórdão 21/2019, de de 16 de outubro, Cleidir Semedo v. Diretor da Cadeia
27 de junho de 2019, Edgar Silva v. TRB, Rel: JCP Pinto Central da Praia e Ministra da Justiça, Rel: JCP Pinto
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 79, de Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 68, de
22 de julho de 2019, d); Acórdão 22/2019, de 27 de junho, 25 de outubro de 2018, p. 1648-1655; Acórdão 04/2019,
Elton Dias v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no de 24 de janeiro, Eduina Ferreira v. Tribunal Judicial
Boletim Oficial, I Série, N. 79, de 22 de julho de 2019, d); da Comarca do Paul, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado
Acórdão 25/2019, de 1 de agosto, Eder Yanick v. STJ, Rel: no Boletim Oficial, I Série, N. 28, de 13 de março de
JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, 2019, p. 484-490, d); Acórdão 22/2019, de 27 de junho,
N. 100, de 26 de setembro de 2019, d); Acórdão 40/2019, Elton Dias v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no
de 11 de outubro, António Veiga e Outros v. PGR, Rel: Boletim Oficial, I Série, N. 79, de 22 de julho de 2019,
JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, p. 1227-1232, d); Acórdão 40/2019, de 11 de outubro,
N. 6, de 14 de janeiro de 2020, d); Acórdão 44/2019, António Veiga e Outros v. PGR, Rel: JCP Pinto Semedo,
de 20 de dezembro, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 6, de 14 de
Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. janeiro de 2020, p. 121-131, d); Acórdão 44/2019, de 20
6, de 14 de janeiro de 2020, d); Acórdão 47/2019, de 31 de dezembro, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto
de dezembro, Admilson Tavares e Jeremias Montrond Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 6, de
v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim 14 de janeiro de 2020, p. 151-155, d); Acórdão 26/2020,
Oficial, I Série, N. 14, de 4 de fevereiro de 2020, d);
Acórdão 04/2020, de 14 de fevereiro, Arlindo Teixeira de 09 de julho, Vanda de Oliveira v. TJCSV, Rel: JCP
v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
Oficial, I Série, N. 25, de 3 de março de 2020, d); Acórdão 139, de 23 de dezembro de 2020, p. 2152-2157; Acórdão
28/2020, de 24 de julho, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP Pinto
4 910000 000000

07/2020, de 6 de março, Sanou Moussa v. STJ, Rel: JCP


Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 139,
86, de 23 de julho de 2020, d); Acórdão 26/2022, de 24 de 23 de dezembro de 2020, p. 2168-2172, d); Acórdão
de junho, Anilton Vieira e Leocádio da Veiga v. STJ, Rel: 57/2020, de 27 de dezembro, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP
JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
N. 94, de 28 de setembro de 2022, d)). 16, de 12 de fevereiro de 2021, p. 565-573, d); Acórdão
29/2021, de 03 de junho, António Veiga e Outros v. PGR,
9. Como se tem considerado em outras ocasiões, a Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim oficial N.
ausência de uma das condições de recorribilidade é 88, de 16 de setembro, p. 2264-2270, d); Acórdão 34/2021,
suficiente para conduzir à inadmissão do recurso, ficando de 11 de junho de 2021, Anilson Silva v. CSMJ, Rel: JCP
sem efeito útil qualquer inquérito sobre a presença ou Pinto Semedo, publicado no Boletim oficial N. 88, de 16
não das causas especiais de inadmissão previstas pelo de setembro, p. 2299-2305, d); Acórdão 40/2021, de 14
artigo 16, alínea e) e f), da Lei do Amparo e do Habeas de setembro, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo,
Data, nomeadamente as de manifestamente não estar publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 100, de 15 de
em causa violação de direitos, liberdades e garantias outubro de 2021, p. 2571-2579, III; Acórdão 41/2021, de
ou de o Tribunal já ter rejeitado, por decisão transitada
em julgado, recurso com objeto substancialmente igual. 14 de setembro, Alex Saab v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo,
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 100, de 15 de
10. Na sua petição de recurso o recorrente requereu ainda outubro de 2021, p. 2580-2590, III; Acórdão 45/2021,
que lhe fosse concedida medida provisória apresentando de 06 de 22 outubro, Amadeu Oliveira v. STJ, Rel: JCP
apenas alegações de forte probabilidade de existência do Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
direito, não apontando qualquer elemento que demonstrasse, 100, de 15 de outubro de 2021, p. 2604-2610, III, Acórdão
fundamentadamente, que da demora da adoção de medidas 51/2021, de 25 novembro, Pedro Veiga v. STJ, Rel: JCP
provisórias poderia resultar prejuízo irreparável ou de Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 5,
difícil reparação, ou a própria inutilidade do amparo, de 17 de janeiro de 2022, p. 95-99, III, Acórdão 56/2021,
articulando-as da seguinte forma: “[a]ssim, em 17.01.2023, de 06 de dezembro, Ognochukwo Barros v. STJ, Rel: JCP
apresentou um requerimento invocando a ocorrência Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 5,
de falta de audição prévia do requerente por parte do de 17 de janeiro de 2022, p. 121-126, III.; Acórdão 12/2022,
MP antes de deduzir acusação, o que consubstancia na de 8 de março, António Monteiro v. STJ, Rel: JCP Pinto
nulidade insanável prevista na alínea k), do art.º 151º. Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 30, de
do C. P. Penal devendo ser anulado todo o processado e 5 de abril de 2022, p. 909-916, III.; Acórdão 18/2022,
o processo remetido ao MP para os devidos efeitos, sem de 19 de abril, Ivan Jorge Fernandes v. STJ, Rel: JCP
prejuízo da soltura do mesmo por já ter sido esgotado os Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
prazos previstos no art.º 279º, n.º 1 al. a), b) e c) do CPP”. 65, de 1 de julho de 2022, p. 1590-1596, III; e Acórdão
10.1. Como fica evidente, o pedido de decretação de 39/2022, de 28 de outubro, Tecnicil Imobiliária v. PGR,
medidas cautelares limitou-se a argumentar no sentido Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I
da existência de um direito líquido e certo, sem dedicar Série, n.º 2, de 5 de janeiro de 2023, p. 42-49, III. 10.3,
o mínimo esforço a demonstrar a existência de danos será inócuo promover tal discussão. Do que decorre que a
irreparáveis ou de difícil reparação e muito menos a não-admissão do recurso de amparo prejudica a avaliação
descaraterizar os interesses públicos ou de particulares do pedido de decretação de medida provisória, o qual, em
que podiam ser invocados para justificar a não-concessão tais casos, deve ser, sem mais, liminarmente rejeitado.

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1486 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

III. Decisão nos termos dos artigos 437, número 1, alínea i), e 470-
C, número 1, alínea c), do CPP, estando desta forma
Pelo exposto, os juízes do Tribunal Constitucional esgotadas as vias de recurso ordinário;
reunidos em plenário decidem não admitir o recurso
de amparo, ordenando o seu arquivamento, e negar a 1.1.9. A legitimidade do recorrente seria inquestionável,
concessão de medida provisória. pois é o visado pelo acórdão ora posto em crise e a
legitimidade do TRB, também seria pacífica, visto que
Registe, notifique e publique. foi a entidade que proferiu o referido acórdão.
Praia, aos 28 de junho de 2023 1.2. Quanto aos atos, factos ou omissões violadores dos
direitos, liberdades e garantias:
José Pina Delgado (Relator)
1.2.1. Diz que o recorrente foi julgado pelo Tribunal da
Aristides R. Lima Comarca da Boa Vista e condenado a uma pena de seis
João Pinto Semedo anos e seis meses de prisão;

Está conforme 1.2.2. Não se conformando, apresentou recurso para o TRB;

Secretaria Judicial do Tribunal Constitucional, aos 28 1.2.3. Entende que a decisão da primeira instância,
de junho de 2023. — O Secretário, João Borges. sufragada pelo tribunal recorrido, viola o princípio
constitucional da presunção da inocência, a um processo
–––––– justo e equitativo e à liberdade sobre o corpo, porque
concluiu pela ocorrência dos abusos com base apenas nas
Cópia: declarações da menor, sem qualquer prova ou elementos
que as corroborariam, numa situação em que o arguido
Do acórdão proferido nos autos de Recurso de Amparo negou terminantemente a prática dos factos;
Constitucional n.º 5/2023, em que é recorrente Djanine
Gomes Rosa e entidade recorrida o Tribunal da Relação 1.2.4. Porque os factos dados como provados tiveram
de Barlavento. apenas como suporte as declarações da ofendida que não
foram sustentadas – nem sequer indiciariamente – por
Acórdão n.º 110/2023 qualquer outro meio de prova, mesmo havendo parecer
do MP pugnando pela sua absolvição por falta de provas;
(Autos de Amparo 5/2023, Djanine Gomes Rosa v.
TRB, Não admissão por não esgotamento das vias legais 1.2.5. Entende que se o tribunal recorrido tivesse feito
de recurso). uma análise crítica das provas carreadas para os autos e
uma ponderação equilibrada das declarações da ofendida
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I. Relatório vs. declarações do arguido, ancorando-se no princípio


constitucional e legal da presunção de inocência, o teria
1. O Senhor Djanine Gomes Rosa, não se conformando absolvido da prática dos crimes de que vem condenado;
com o Acórdão TRB 218/2021-2022, que negou provimento
a recurso interposto contra decisão do Tribunal da 1.2.6. Ademais, teria sido o próprio acórdão recorrido
Comarca de Boa Vista, vem requerer amparo, por razões que, na sua fundamentação, haveria dito que a ofendida
que racionaliza da seguinte forma: teria dúvidas quanto à existência ou não das investidas
sexuais do recorrente;
1.1. Quanto à admissibilidade, diz que:
1.2.7. Pelo que, não existindo um juízo de certeza sobre
1.1.1. Ele foi notificado no dia 27 de julho de 2022; a prática dos factos, como o próprio acórdão recorrido
1.1.2. De punho próprio, depois dessa notificação, a 17 de reconheceria, deveria valer o princípio constitucional
agosto de 2022 dirigiu um requerimento/recurso ao STJ; e legal da presunção da inocência, de que é corolário o
princípio in dubio pro reo;
1.1.3. Este recurso, entregue na secretaria do STJ, foi
remetido ao TRB para a devida instrução; 1.2.8. Assevera que os factos dados como provados não
teriam sido presenciados nem pela ofendida, nem por
1.1.4. O mandatário judicial, em simultâneo e conhecedor qualquer das testemunhas ouvidas em audiência, e nem
da técnica, adequada interpôs recurso de amparo junto as testemunhas viram o arguido a praticá-los; assim, os
do Tribunal Constitucional no dia 25 de agosto de 2022, mesmos terão sido incorretamente dados por provados,
recurso este que não foi admitido, através do Acórdão e diz que em se tratando de crime de natureza pessoal,
48/2022, com fundamento de que estaria pendente aquele não poderiam relevar aqui quaisquer indícios;
requerimento/recurso de 17 de agosto de 2022; 1.2.9. Acrescenta que foi extrapolado o princípio da
1.1.5. Tal recurso, recebido pelo TRB, terá merecido do livre apreciação da prova ao dar-se absoluta relevância ao
mesmo despacho de não-admissão no dia 5 de setembro de depoimento da ofendida sem antes fazer-se um escrutínio da
2022, decisão esta notificada exclusivamente ao recorrente; existência de um móbil de ressentimento, inimizade, vingança,
afrontamento, interesse ou de qualquer outra índole;
1.1.6. Alicerçado no princípio da ampla defesa e no
direito a ser acompanhado por um mandatário ínsito 1.2.10. E que a condenação do recorrente teria resultado
no artigo 142, número 2, do CPP, requereu ao TRB a apenas de um juízo de maior probabilidade e não de uma
notificação do despacho que não admitiu o recurso do certeza absoluta sobre a sua culpabilidade, sendo certo
requerente, tendo recebido comunicação desse órgão que que é o próprio acórdão recorrido em várias passagens
não satisfez o seu pedido; a apresentar este raciocínio de forma expressa, quando
diz que se determinado facto não tenha ficado provado,
1.1.7. Considerando o prazo de 20 dias previsto para se tal não significaria dizer que não tenha ocorrido. Pois
interpor um recurso de amparo o mesmo estaria em tempo, que “[s]ustentar uma condenação com base na conclusão
haja em vista a existência do recurso para o TRB, cuja ‘volta-se a lembrar o recorrente que facto não provado
“recusa” lhe foi comunicado no dia 9 de janeiro de 2023; não é o mesmo que não acontecimento de facto, ou seja,
a não prova de um facto não que[r??] significar que não
1.1.8. O órgão que praticou o ato com o qual não se tenha acontecido, apenas quer dizer que o facto não se
conformou, tendo em conta a pena aplicada inferior a provou em julgamento, o que é diferente’ é ostensivamente
oito anos, é a última instância hierárquica de recurso arbitr[á]ri[o]”;

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1487

1.2.11. Sendo que seria irracional e arbitrário do ponto 2.10. Pois que “com a fundamentação apresentada pelo
de vista do processo penal dizer que a falta de prova não recorrente, fica claro, que não logrou demonstrar qualquer
implica necessariamente a não ocorrência de facto, mas facto com base no qual se possa sustentar para imputar
sim apenas falta de prova. ao Tribunal da Relação de Barlavento a violação dos seus
direitos constitucionais da presunção da inocência, a um
1.3. Nas suas conclusões retoma basicamente as mesmas processo justo e equitativo e a liberdade d[o] corpo[…],
questões; através do despacho datado de 9 de janeiro”;
1.4. Pede que o recurso de amparo seja admitido e 2.11. Arrematando que não obstante vir sendo esta a
julgado procedente, concedendo-se ao recorrente o amparo “interpretação assente do Egrégio Tribunal Constitucional
constitucional dos seus direitos à presunção da inocência, de que as causas de inadmissibilidade do recurso de
a um processo justo e equitativo e à liberdade sobre o amparo não devem ser tão rígidas, tão severas que possam
corpo, anulando a condenação imposta ao recorrente ou, legitimar a ideia de que se quer evitar a todo o custo o
se assim viesse a ser entendido, que se determine que o acesso dos cidadãos ao Tribunal Constitucional através do
TRB proceda à notificação do despacho de 9 de setembro recurso de amparo, parece-nos que no caso concreto, face
de 2022. a grande imprecisão entre o pedido e a fundamentação,
2. Cumprindo o estabelecido no artigo 12 da Lei do o recurso não deverá ser admitido, por não cumprir os
Amparo, foram os autos com vista ao Ministério Público requisitos previsto[s] no citado artigo 8º”;
para emissão de parecer sobre a admissibilidade do recurso, 2.12. Concluindo que “[d]este modo, tendo em atenção os
tendo-o feito, através de peça assinada pelo Digníssimo motivos supra expostos, somos de parecer que o recurso de
Senhor Procurador-Geral da República, formulada, no amparo constitucional interposto pelo recorrente, não pode
essencial, nos seguintes termos: ser recebido, por não cumprir com os requisitos exigidos
2.1. O recorrente requer amparo dos seus direitos na Lei de Amparo, devendo ser liminarmente rejeitado,
constitucionalmente consagrados de presunção da ao abrigo do disposto no artigo 16.º da mesma lei”.
inocência, a um processo justo e equitativo e a liberdade
sobre o corpo, constituindo estes em direitos e garantias 3. Marcada sessão de julgamento para o dia 4 de maio,
reconhecidos na Constituição e suscetíveis de amparo nessa data se realizou, com a participação dos Venerandos
constitucional; Juízes-Conselheiros e do Senhor Secretário do TC. Depois
de apreciada a conformidade formal e material da peça
2.2. Efetivamente o recorrente estaria provido de ficou prejudicada a análise de admissibilidade, lavrando-se
legitimidade, porquanto parece ser pessoa direta, atual no Acórdão 78/2023, de 12 de maio, Djanine Gomes Rosa
e efetivamente afetada pela decisão que não atendeu à v. TRB, Aperfeiçoamento por obscuridade na indicação do
sua pretensão; ato judicial impugnado e de identificação das condutas
cujo escrutínio pretende que o TC promova, Rel: JC
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2.3. Contudo, entende que a petição não cumpriria Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
os requisitos estatuídos nos artigos 3º, 5º e 8º da Lei do 59, 25 de maio de 2023, pp. 1334-1337, a necessidade de
Amparo; aperfeiçoamento da petição em razão da sua obscuridade.
2.4. Pois, “o recorrente refere que vem recorrer do 3.1. No essencial, decidiu-se, ao abrigo do artigo 17 da
despacho notificado no dia 09.01.2023, cuja cópia foi junta Lei do Amparo e do Habeas Data, “determinar a notificação
como doc. I a fls. 10 dos autos, ou seja, do despacho que do recorrente para: a) Identificar claramente qual o ato
[recusou??] notificar o seu mandatário do despacho que do poder público que pretende impugnar; b) Apresentar
não admitiu o recurso de amparo por ele interposto”; com o máximo de precisão possível a(s) conduta(s) cujo
escrutínio pretende que este Tribunal promova”.
2.5. Pelo que “[d]esta feita, afigura-se-nos que a decisão
impugnada (ou que deveria tê-lo sido) era o despacho que 3.2. Disso foi notificado o recorrente no dia 16 de maio,
recaiu sobre o requerimento de pedido de amparo por parte às 10:21, conforme consta da f. 69 dos autos;
do arguido, e, por conseguinte, os fundamentos invocados
para pedir amparo dos direitos eventualmente violados 3.3. No dia 18 de maio, o recorrente submeteu a peça de
e a reposição dos mesmos, tinham que recair sobre este f. 45 através da qual pretendeu operar o aperfeiçoamento
despacho, e não sobre qualquer outro”; nos termos requeridos.
2.6. Diz que, entretanto, como resulta dos autos, os 4. Marcada sessão final de julgamento para o dia 22
fundamentos aduzidos pelo recorrente recaíram todos de junho, nessa data se realizou, com a participação dos
sobre o Acórdão 47/2022 que confirmou a condenação Venerandos Juízes-Conselheiros e do Senhor Secretário do
do recorrente: TC, dela decorrendo a decisão que se segue acompanhada
2.7. Por essa razão, entende que o recorrente pretende dos fundamentos articulados infra.
aproveitar o prazo que tinha para impugnar aquele
despacho para trazer à apreciação uma decisão que já II. Fundamentação
não é passível de recurso de amparo por extemporâneo;
1. Conforme consta do relatório, o recurso foi objeto de
2.8. Precisamente porque o recurso de amparo contra a uma decisão de aperfeiçoamento, determinando-se que o
decisão de condenação seria intempestivo, pelo facto de a recorrente suprisse deficiências da petição que impediam
decisão ter sido prolatada em julho de 2022 e notificada o Tribunal Constitucional de avaliar a admissibilidade do
ao recorrente no dia 27 de julho de 2022, estando já recurso, no sentido de identificar claramente qual o ato do
ultrapassado o prazo de 20 dias para a interposição do poder público que pretendia impugnar e apresentar com o
recurso; máximo de precisão possível a(s) conduta(s) cujo escrutínio
pretendia que este Tribunal promovesse, condições sem
2.9. Por outro lado, recorrendo ao artigo 8 da Lei do as quais o processo, por motivos evidentes, não poderia
Amparo, defende que “a fundamentação do recurso e o avançar para os seus ulteriores trâmites.
pedido devem [ser??] consentâneos, isto é, não pode o
recorrente alegar a violação de um direito e pedir amparo 2. Antes de se prosseguir, é necessário apreciar questão
constitucional ocorrido através de uma decisão e apresentar prévia de se saber se a peça de f. 45 pode ser admitida e
outra decisão completamente distinta para fundamentar consequentemente se o presente recurso de amparo pode
o pedido, como sucedeu in casu”; ser conhecido.

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1488 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

2.1. Pela razão de que a admissibilidade das peças de 2.2.5. Se se considerar, com grande benevolência, que
aperfeiçoamento e a consequente possibilidade de a instância o Tribunal Constitucional pode extrair as condutas do
prosseguir estão sujeitas a um pressuposto temporal confuso trecho apresentado, haverá base para se dar
claramente fixado pelo artigo 17, parágrafo segundo, da continuidade ao inquérito de admissibilidade do recurso
Lei do Amparo e do Habeas Data segundo o qual “[n] de amparo, considerando estarem presentes três delas no
a falta, insuficiência ou obscuridade dos fundamentos trecho mencionado pelo recorrente no ponto 1.
de facto ou de direito, será o recorrente notificado para
suprir as deficiências, no prazo de dois dias”. O regime 2.2.6. Mais especificamente, dispondo a Constituição
também é integrado pelo artigo 16, alínea b), que dispõe que a tramitação do amparo deve ser baseada no princípio
que “o recurso não será admitido quando a petição não da celeridade, as condições para tanto devem começar a
obedeça aos requisitos estabelecidos nos artigos 7º e 8º” ser criadas pelos próprios jurisdicionados apresentando
e pelo número 2 da mesma disposição que reza que “[n] devidamente as suas peças, calibrando a extensão da
o caso da alínea b) do número anterior a petição só será sua argumentação, precisando os elementos nucleares do
rejeitada se a falta não for suprida no prazo a que se recurso em termos de identificação de conduta atribuível
refere o artigo 17º”. Além disso, ainda que tempestiva, a poder público, indicação dos parâmetros de escrutínio
encontra-se submetido à condição lógica do recorrente e definição do amparo pretendido, a tríade que compõe a
ter suprido as deficiências de sua petição nos termos estrutura vital deste recurso. Sendo certo que em relação
requeridos pela decisão de aperfeiçoamento. aos derradeiros, a legislação de processo constitucional
aplicável – neste caso, o artigo 24, parágrafo segundo,
2.2. Ora, no caso concreto, da Lei do Amparo e do Habeas Data – permite a esta
Corte suprir deficiências de indicação de parâmetros e
2.2.1. O recorrente foi notificado do Acórdão 78/2023, amparos, além de ser um risco que, desnecessariamente,
de 12 de maio, que lhe concedeu oportunidade de o recorrente não deve assumir, posto que se trata de ato
aperfeiçoamento no dia 16 de maio às 10:21, como deflui discricionário do Tribunal (note-se, num caso e no outro,
da f. 43 dos Autos; a utilização da expressão “pode”) – que utilizará quando
2.2.1.1. A peça de aperfeiçoamento deu entrada no dia entender justificado e conveniente – isso, a) consome
18 de maio (f. 45). sempre muito mais tempo; b) desvia a atenção individual
dos juízes de outros aspetos da aferição de admissibilidade;
2.2.1.2. Portanto, o recorrente apresentou a peça de c) aumenta a carga de esforço do Coletivo em arbitrar ele
aperfeiçoamento dentro do prazo de dois dias fixado pelo próprio parâmetros e amparos. E, d), no mínimo, pode
artigo 17 da Lei do Amparo. resultar no adiamento da apreciação do pedido de amparo,
se não na sua inadmissão.
2.2.2. Resta saber ainda se cumpriu a determinação do
Tribunal e aperfeiçoou a sua peça nos termos requeridos. 2.2.7. Assim, em todo o caso, dá-se por corrigida a peça
O recorrente tinha que identificar claramente qual o ato do o que permite a continuidade da instância.
4 910000 000000

poder público que pretendia impugnar e apresentar com o


máximo de precisão possível a(s) conduta(s) cujo escrutínio 3. No essencial, consegue-se depreender as condutas que
pretendia que este Tribunal promovesse. O mínimo que pretende impugnar e a entidade que as terá empreendido
se pode dizer é que não o fez muito claramente, porque, e intuir-se o amparo último que se almeja obter, aspetos
nos diversos parágrafos da sua peça de aperfeiçoamento que serão avaliados adiante, se for necessário.
menciona, “factos”, “decisões”, mas não chega a identificar 3.1. As condutas consubstanciadas:
os atos formais concretos, os quais, indevidamente, são
deixados para serem objeto de adivinhação pelo próprio 3.1.1. Nos factos que elenca nos pontos dois a sete da
Tribunal. sua peça;
2.2.3. Se se der de barato que acaba por ser possível 3.1.2. No facto de o TRB ter recebido o recurso interposto
proceder a essa identificação, os problemas ainda assim pelo arguido de punho próprio;
subsistem, nomeadamente porque se as condutas decorrentes
dos pontos 2 a 7 são insuscetíveis de serem admitidas 3.1.3. No facto de o TRB ter decidido esse mesmo recurso;
nesta fase porque dependem vitalmente de ser, primeiro, 3.1.4. No facto de o TRB ter notificado apenas o próprio
admissível, e, segundo, concedido, o que se alega no ponto arguido, recusando-se a notificar o seu mandatário.
1. Porquanto, se assim não for, a colocação da questão
sempre seria intempestiva, já que o recorrente já tinha 3.2. Contudo, destas, é de se afastar de pronto o
sido notificado da decisão a respeito do seu recurso desde escrutínio nos presentes autos das que constam do ponto
setembro de 2022 e manteve-se inerte sem sequer colocar 2 ao ponto 7 da sua peça de aperfeiçoamento, porque a
qualquer iniciativa processual que obstasse ao trânsito em sua sindicância só pode acontecer se antes o Tribunal
julgado da decisão. No fundo, seria somente se o Tribunal Constitucional reconhecer alguma violação pela prática
reconhecesse que algum motivo superveniente, resultante das outras condutas que eventualmente ultrapassasse a
de putativa violação de direito, pudesse ter o condão de questão do trânsito em julgado da decisão que confirmou
reabrir a possibilidade de se escrutinar o que o recorrente a sua condenação, e dependendo do percurso processual
alega nos pontos 2 a 7 da sua peça de aperfeiçoamento – subsequente e das iniciativas do recorrente.
remetendo aparentemente para o julgamento do recurso
ordinário – é que seria possível, através de outro recurso, 3.3. E também as consagradas nos pontos 3.1.2 e 3.1.3.
retomar essas questões. desta decisão, porque decorrem de notória expansão do
objeto do recurso através de peça de aperfeiçoamento, o que
2.2.4. Todavia, o mínimo que se pode dizer é que a não é permitido. Com efeito, o que se verifica da petição
formulação do ponto 1 é por demais obscura. O recorrente inicial é que a única questão levantada pelo recorrente
diz, no singular, que o ato do poder público que pretende decorreria do facto de ter, como diz, requerido ao TRB,
que seja sindicado é o facto de o TRB ter recebido o recurso “a notificação do despacho que não admitiu o recurso do
interposto pelo recorrente pelo próprio punho, recurso requerente” e desse órgão judicial ter respondido que
este remetido pelo STJ, pelo facto de o TRB ter decidido não podia satisfazer aquela pretensão por motivos que
e notificado somente o arguido e de ter-se recusado a desenvolve. Extrapola claramente o objeto da peça de
notificar o mandatário. Contudo, a fórmula corresponde aperfeiçoamento, cuja única finalidade era precisar as
a várias condutas e, assim colocada, é construída de condutas cujo escrutínio se solicitava e não se aproveitar
forma sobreposta e confusa, sem que o Tribunal consiga da oportunidade para apresentar outras novas. Até
efetivamente fixar o que pretende que se escrutine. porque fora devidamente assentado no Acórdão 60/2023,

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1489

de 26 de abril, Amadeu Oliveira v. STJ, Inadmissão ato, como numa omissão, a conduta corresponde a um
Por Ausência de Pedido de Reparação, Rel: JCP Pina comportamento de uma entidade à qual se imputa a
Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 57, 22 vulneração de um direito, liberdade e garantia. É a isso
de maio de 2023, pp. 1254-1260, 2.3.5, que “a menos que que se refere tanto o artigo 20 da Lei Fundamental quando
expressamente consagrado, a peça de aperfeiçoamento remete à “tutela dos seus direitos, liberdades e garantias
não é substitutiva da petição de recurso. Complementa-a fundamentais (…)”, como o artigo 2º da Lei do Amparo,
apenas nos segmentos abrangidos pela decisão que quando se refere à “prática de factos ou à omissão de atos
determinou a sua correção. Portanto, deve cingir-se ao ou factos”. Isso desde que em relação aos atos, nos termos
objeto fixado pelo Tribunal, posto que tudo o que disser do artigo 2º, número 3, da Lei do Amparo e do Habeas Data,
a mais é inócuo e não pode ser considerado”. De resto, estes não assumam natureza legislativa ou normativa,
em circunstâncias em que uma delas não teria, a priori, devendo o Tribunal Constitucional recusar qualquer
o condão de ser admitida, uma vez que aparentemente impugnação que ataque diretamente norma constante
já era do conhecimento do mandatário que havia sido de dispositivo legal ou equiparado, como, de resto, tem
interposto recurso ordinário pelo recorrente. feito ao recusar-se a admitir recursos de amparo que
impugnam normas (Acórdão 35/2019, de 18 de outubro,
3.4. Por conseguinte, a única conduta que se mantém Alírio Barros v. TRS sobre indeferimento de recurso de
em análise: fiscalização concreta da constitucionalidade por não
3.4.1. É a que se refere ao facto de o TRB ter notificado aplicação de norma impugnada, Rel: JC Pina Delgado,
apenas o próprio arguido, recusando-se a notificar o seu publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 110, 29 de outubro
mandatário, a qual supostamente de 2019, pp. 1813-1828, 2., Acórdão 11/2017, de 22 de
junho, Maria de Lurdes v. STJ, sobre violação do direito
3.4.2. Vulneraria o direito à ampla defesa e o direito de constituir família por não reconhecimento de união de
a um advogado; facto, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial,
I Série, N. 42, 21 de julho, pp. 933-950 e na Coletânea
3.4.3. E pretensamente justificaria amparo que não de Decisões do Tribunal Constitucional de Cabo Verde,
se identifica. Vol. III, Praia, INCV, 2018 (2017), pp. 423-477, 2.3.4;
Acórdão 15/2017, de 26 de julho, INPS v. STJ, sobre a
4. Antes de prosseguir, cuida o Tribunal de verificar se constitucionalidade do nº 2) do Art. 3º e o Art. 2º do DL
os pressupostos gerais de admissibilidade se encontram 194/91, na interpretação que lhe foi dada pelo Presidente
preenchidos, ressaltando-se que: do STJ, no sentido de que fixa um prazo de recurso de
4.1. Por força do artigo 20, parágrafo primeiro, da cinco dias, independentemente de se tratar de um litígio
Constituição da República, e do artigo 18, alínea a) decorrente de relação de trabalho estabelecida ou de litígio
da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do tendente à constituição de uma relação de trabalho, Rel:
Tribunal Constitucional, é evidente que este tribunal é JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série,
4 910000 000000

competente em razão da matéria, considerando que se N. 35, 6 de junho de 2018, pp. 844-856 e na Coletânea
imputa ao órgão judicial recorrido a violação de direito, de Decisões do Tribunal Constitucional de Cabo Verde,
liberdade e garantia; Vol. IV, INCV, 2018 (2017), pp. 137-176, 2.2.1, Acórdão
22/2018, de 11 de outubro, Martiniano v. STJ, sobre a
4.2. O recorrente, na medida em que, nos termos do violação do direito de acesso aos tribunais por decisão de
artigo 20, parágrafo primeiro, se arroga ser titular de deserção de recurso, Rel: JC José Pina Delgado, publicado
posição jurídica com essa natureza, e de, conforme a no Boletim Oficial, I Série, N. 76, 22 de dezembro de
parte final do número 1 do artigo 4º da Lei do Amparo e 2018, pp. 1824-1835, 5. e 6, Acórdão 29/2019 e Acórdão
do Habeas Data, ser pessoa direta, atual e efetivamente 39/2022, de 28 de outubro, Tecnicil Imobiliária e Alfredo
passível de ser afetada pela conduta impugnada, goza de Carvalho v. PGR, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado
de legitimidade, já que arguido em processo penal no no Boletim Oficial, I Série, N. 2, 5 de janeiro de 2023, pp.
qual foi condenado a pena de prisão e no âmbito do qual 42-49, ii), estabelecendo claramente a distinção entre o
se terá praticado o ato impugnado, o mesmo ocorrendo, objeto de recursos de amparo e o objeto de recursos de
no polo passivo, com a entidade recorrida que pode ter fiscalização concreta da constitucionalidade. Na medida
praticado o ato que se impugna (v. Acórdão 29/2021, de 3 em que a aplicação de qualquer ato normativo poderá ser
de junho, António Veiga e Outros v. PGR, Rel: JCP Pinto impugnada através deste último recurso constitucional
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 88, 16 dificilmente se pode considerar o dispositivo legal que
de setembro de 2021, pp. 2264-2270, c)). exclui do objeto do recurso de amparo atos públicos como
portador de um vício de inconstitucionalidade.
4.3. Por fim, tratando-se de recurso referente a questão
suscitada em processo que corre os seus termos nos 5.1. No caso concreto, por motivos já assinalados, a
tribunais regulado pelo artigo 5º, parágrafo primeiro, o única conduta que continua em discussão é a que se
prazo de interposição é de vinte dias contados da data de consubstancia no facto de, alegadamente, o TRB se ter
notificação da decisão que se recusou a reparar a violação recusado a notificar o mandatário com o argumento de que
praticada, e por força do artigo 1º da Lei do Amparo e do já havia notificado o recorrente que subscreveu a peça.
artigo 50 da Lei do Tribunal Constitucional, com suspensão
de contagem aos sábados, domingos e feriados, conforme 5.2. Não comportando essa atribuição natureza
remissão para o Código de Processo Civil. normativa, dá-se por preenchida essa imposição legal que
fixa o próprio objeto do recurso, caso ele seja admitido.
4.3.1. No caso em análise, o que se observa é que o
ato impugnado data de 9 de janeiro de 2023, tendo sido 6. E, além disso, é determinante para se identificar os
comunicado ao recorrente no mesmo dia; direitos potencialmente atingidos pela conduta lesiva, uma
etapa essencial para se verificar se a conduta em causa é
4.3.2. Neste sentido, tendo dado entrada à sua peça na passível de ser amparada, do que depende, de uma parte,
secretaria deste Tribunal no dia 8 de fevereiro, a mesma de estar em causa posição jurídica dependente de direito,
pode ser tida por tempestiva. liberdade ou garantia ou direito que se pode beneficiar
do regime de proteção desta categoria de direitos, e, da
5. A construção adequada da peça ou o seu aperfeiçoamento outra, de, em potência, ser ato que pode ser diretamente
permitem que o Tribunal Constitucional, antes de tudo, atribuível ao órgão judicial recorrido por este poder ter
consiga identificar o centro nevrálgico do escrutínio de responsabilidade direta, imediata e necessária na sua
amparo – a conduta impugnada – que se constituirá no violação, portanto de esta poder ser-lhe imputável de
objeto do recurso. Podendo materializar-se tanto num alguma forma.

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1490 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

6.1. No caso concreto, o recorrente invoca expressamente 8.2.1. A fórmula utilizada vai num sentido extremamente
o direito à ampla defesa e o direito a advogado. amplo porque referindo-se a meios legais abarca mecanismo
que seja idóneo assegurar a defesa de direitos e interesses
6.2. Apesar da imprecisão na sua definição, consegue-se legítimos seja ela pré-decisório, decisório ou pós-decisório;
observar que são garantias associadas à liberdade sobre ordinário, extraordinário ou especial. Do que decorre o
o corpo e são ambas amparáveis. efeito evidente de que, neste caso, por motivos evidentes,
6.3. A determinação final da ocorrência de violação enquanto os mecanismos pré-decisórios de tutela através da
imputável ao órgão judicial recorrido é feita na fase submissão de requerimentos vários podem ser absorvidos
de mérito. No momento de avaliação da presença dos pela necessidade de recurso ordinário decorrente do
pressupostos e requisitos de admissibilidade basta que segundo segmento da disposição, o facto de inexistirem
o Tribunal avalie a possibilidade racional e abstrata de recursos ordinários disponíveis não isenta os titulares do
a conduta impugnada ser suscetível de ter sido praticada direito de terem de utilizar qualquer via legal decisória
direta, imediata e necessariamente pela entidade recorrida. prevista na respetiva lei de processo, desde que ela seja
hábil a produzir o efeito de proteção do direito. Isso, na
6.3.1. Neste caso concreto, em relação à única conduta medida em que preservado o poder jurisdicional do tribunal
ainda em apreciação já que, por motivos antes explicitados, recorrido em relação à questão colocada, por exemplo
nos presentes autos não é possível escrutinar as que uma nulidade, este possa revogar a sua própria decisão.
remotamente foram imputadas ao acórdão que confirmou
a sua condenação, fica claro que se trata de um ato 8.2.2. Na situação concreta que temos em mãos, em
que pode ser atribuído ao TRB, na medida em que este relação à conduta impugnada, sendo verdade que não
órgão, através da sua secretaria, recusou-se a notificar havia vias ordinárias de recurso para serem esgotadas,
o mandatário de uma decisão judicial. é muito duvidoso que não pudesse explorar outros meios
de reação processual para obter a tutela que pretendia.
6.3.2. Assim sendo, admite-se que a conduta acima Através de requerimento submeteu pedido ao TRB, mas
referida imputada ao tribunal recorrido pode ser amparável, não foram os Juízes-Desembargadores desse alto Tribunal
na medida em que direta, imediata e necessariamente que responderam. Antes, recebeu uma comunicação da
passível de ter sido perpetrada pelo Tribunal da Relação secretaria não acompanhada de qualquer despacho a
de Sotavento. informar-lhe que ela não poderia satisfazer o seu pedido
em razão de motivos que arrola;
7. Como já se tinha mencionado, nem na peça de
interposição do recurso, nem na peça de aperfeiçoamento 8.2.3. Tratando-se de um ato de secretaria, o recorrente,
o recorrente explicita qualquer amparo que pretendesse perante a recusa de se notificar o seu mandatário, poderia
obter deste Tribunal para se reparar os dois direitos sempre dirigir reclamação ao Juiz-Relator e, ficando
alegadamente violados pela conduta concreta do TRB de se insatisfeito com a resposta obtida, à própria conferência.
recusar a notificar o mandatário do recorrente de decisão Porque, não estando esta questão específica regulada
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tirada na sequência de um recurso ordinário. Isto mesmo pelo Código de Processo Penal, estar-se-ia perante um
depois de o recorrente ter sido convidado a determinar vazio normativo, o qual, nos termos deste instrumento
corretamente o seu pedido de amparo. Porém, mais uma jurídico codificador, deve ser integrado, primeiro, com
vez, e de forma evitável, tem de ser o Tribunal a intuir recurso à aplicação analógica de outras normas nele
que o recorrente pretenderá que se declare a violação expostas; segundo, na ausência de respostas endógenas,
dos direitos de sua titularidade, a nulidade do acórdão às normas de processo civil; terceiro, faltando tanto uma
impugnado e as medidas necessárias a restabelecê-los, quanto a outra, aos princípios gerais de processo penal.
conforme a conduta impugnada. Isso na medida em que o artigo 26 do CPP dispõe que
“nos casos omissos, quando as disposições deste Código
8. Ademais, consideram-se pressupostos especiais não puderem aplicar-se por analogia, observar-se-á as
aplicáveis às situações em que o recurso de amparo é normas do processo civil que se harmonizem com o processo
colocado contra conduta do poder judicial que ela seja penal e, na falta deles, aplicar-se-ão os princípios gerais
expressa e formalmente invocada no processo logo que do processo penal”;
o ofendido tenha dela recebido comunicação, que se
tenham esgotado as vias legais de recurso e que tenha 8.2.4. Ora, de uma análise do CPP não se consegue
sido requerida reparação. encontrar qualquer regime jurídico ou norma especial
8.1. A lei coloca, deste modo, um ónus sobre o titular que se possa aplicar analogicamente, do que decorre que
do direito de suscitar a questão no processo logo que o haveria que se recorrer às normas de processo civil. E
ofendido tenha tido informação sobre o ocorrido, uma o facto é que o Código de Processo Civil no artigo 154,
exigência que depende de o recorrente ter tomado parágrafo terceiro, dispõe claramente que “[d]os atos dos
conhecimento da violação, nomeadamente através de funcionários de secretaria judicial cabe sempre reclamação
comunicações judiciais ou de consultas aos autos, e de para o juiz”. Tratando-se de um tribunal colegial, tal
haver mecanismos processuais previstos para alegar o poder é reservado ao Juiz-Relator, na medida em que o
que entender em sua defesa. artigo 613, parágrafo primeiro, reza que “o juiz a quem o
processo for distribuído fica sendo o relator, competindo-
8.1.1. Neste caso, a conduta em avaliação para efeitos lhe deferir todos os seus termos até final”. Portanto,
de admissibilidade resulta de ato praticado pelo TRB de dessa comunicação da secretaria do TRB recusando-se a
se recusar a notificar o arguido por razões que explicita notificar o mandatário cabia ainda reclamação dirigida
e que foi consumada no dia 9 de janeiro de 2023; ao Eminente Juiz-Relator;
8.1.2. O recorrente manifestou a sua inconformação 8.2.5. Mais: de uma eventual decisão do Juiz-Relator,
um mês depois, trazendo o presente recurso de amparo. na hipótese de indeferimento do pedido do recorrente,
Independentemente de se saber se não seria de se exigir ainda cabia dirigir eventual inconformação que se siga
diligência preliminar, o que se retomará adiante, o facto à conferência, pois, nos termos do disposto no artigo 618,
é que pode dizer-se que manifestou a sua inconformação, “quando a parte se considere prejudicada por qualquer
assim que dela tomou conhecimento. despacho, que não seja de mero expediente, pode requerer
que sobre a matéria do despacho recaia um acórdão”;
8.2. De outra parte, dispõe o artigo 6º que “o recurso
de amparo só poderá ser interposto depois de terem sido 8.2.6. Longe de tais normas não se harmonizarem com
esgotados todos os meios legais e todas as vias de recurso o processo penal, se ajustam ao mesmo, nomeadamente
ordinário estabelecidas pela respetiva lei de processo”. ao princípio constitucional da recorribilidade geral de

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1491

decisões em matéria penal explicitado no artigo 35, Cópia:


parágrafo sétimo, da CRCV;
Do acórdão proferido nos autos de Recurso de Amparo
8.2.7. Contudo, o recorrente nem alega, e muito Constitucional n.º 1/2023, em que é recorrente Manuel
menos traz qualquer elemento aos autos que pudessem Monteiro Moreira e entidade recorrida o Tribunal da
demonstrar que tenha manifestado a sua inconformação Relação de Sotavento.
com esse ato da secretaria do TRB e que, na sequência,
tenha solicitado a intervenção da conferência, através Acórdão n.º 111/2023
de uma reclamação;
(Autos de Recurso de Amparo 1/2023, Manuel Monteiro
8.2.8. Destarte, não parece a este Pretório que o Moreira v. TRS, Rejeição liminar de pedido de aclaração
pressuposto especial de esgotamento das vias ordinárias e de reforma do Acórdão 103/2023, por manifesta falta
legais de recurso foi cumprido pelo recorrente, inabilitando de fundamento)
esta Corte Constitucional a conhecer a questão no mérito
(Acórdão 49/2020, de 5 de novembro, Rel: JCP Pinto I. Relatório
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 16, 12 de
fevereiro de 2020, pp. 520-523, d); Acórdão 50/2020, de 6 1. O Senhor Manuel Monteiro Moreira, depois, de no
de novembro, António Ferreira v. TRB, JCP Pinto Semedo, dia 20 de junho de 2023, pelas 16:04, ter sido notificado
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 16, 12 de fevereiro do Acórdão 103/2023, de 19 de julho, Manuel Moreira v.
de 2021, pp. 524-527, d); Acórdão 28/2020, de 24 de julho, TRS, Inadmissão por Não Atributabilidade de Condutas
Alex Saab v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Impugnadas ao Ato Recorrido e por Ausência de Pedidos
Boletim Oficial, I Série, N. 139, 23 de dezembro de 2020, de Reparação, Rel: JC Pina Delgado, ainda não publicado,
pp. 2168-2172, d); Acórdão 57/2020, de 2 de dezembro, no dia seguinte, às 16:04, protocolou junto à Secretaria
Alex Saab v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no pedido de aclaração e reforma, justificando-o com uma
Boletim Oficial, I Série, N. 16, 12 de fevereiro de 2021, pp. narrativa que se resume da seguinte forma:
565-573, d); Acórdão 45/2021, de 6 de outubro, Amadeu 1.1. Sem apresentar qualquer trecho do acórdão reclamado
Oliveira v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no que pretende ver aclarado, o recorrente produz libelo
Boletim Oficial, I Série, N. 100, 15 de outubro de 2021, destinado a insurgir-se contra o Tribunal Constitucional,
pp. 2604-2610, d); Acórdão 40/2021, de 14 de setembro, acusando este órgão judicial de se agarrar a formalismos,
Alex Saab v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no mesmo quando confrontado com violações graves e
Boletim Oficial, I Série, N. 100, 15 de outubro de 2021, insanáveis da Constituição perpetradas pelos tribunais
pp. 2571-2579, d); Acórdão 56/2021, de 06 de dezembro, ordinários; na sua dicção, reconhecendo a violação de
Ognochukwo Barros v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, direitos, mas exigindo o pedido de reclamação enquanto
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 5, de 17 de ato autónomo, com o clímax argumentativo a ser atingido
janeiro de 2022, pp. 121-126, d); Acórdão 18/2022, de 19
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quando brada que, para o Tribunal Constitucional, custa


de abril, Ivan Jorge Fernandes v. STJ, Rel: JCP Pinto menos o atropelo aos direitos fundamentais do que garantir
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 65, de o formalismo.
1 de julho de 2022, pp. 1590-1596, d); Acórdão 39/2022,
de 28 de outubro, Tecnicil Imobiliária v. PGR, Rel: JCP 1.2. O que ainda contrariaria a jurisprudência anterior
Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, n.º 2, do Tribunal que considerou que o pedido de reparação
de 5 de janeiro de 2023, pp. 42-49, d); Acórdão 48/2022, não era exigível, posição que sugere ter sido alterada
de 12 de dezembro, Djanine Gomes Rosa v. TRB, Rel: JCP essencialmente após a mudança do seu Presidente;
Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
2, 5 de janeiro de 2023, pp. 50-55, d)). 1.3. Entende que a exigência de formalismos numa
democracia que ainda nem sequer tem 40 anos e possui
9. Como se tem considerado em outras ocasiões, a prática constitucional de 5 a 8 anos deixa a todos atónitos,
ausência de uma das condições de recorribilidade é coisa que não acontece nem em Estados de Direito de 500
suficiente para conduzir à inadmissão do recurso, ficando anos e prática constitucional de 200, onde não se exige
sem efeito útil qualquer inquérito sobre a presença ou perfeição, ao contrário das imposições do TC.
não das causas especiais de inadmissão previstas pelo
artigo 16, alínea e) e f), da Lei do Amparo e do Habeas 1.4. Por fim, pergunta: “tendo a questão da inexistência
Data, nomeadamente as de manifestamente não estar da gravação ponderada e pronunciada em 1ª instância,
em causa violação de direitos, liberdades e garantias como pode o TC considerar que [o] TRS pronunciou sobre
ou de o Tribunal já ter rejeitado, por decisão transitada isso como pioneira?”; questão que ele próprio responde,
em julgado, recurso com objeto substancialmente igual. dizendo não se estar perante caso em que o TRS se
pronunciou em primeira instância, pelo que a decisão
III. Decisão deveria ser reformada admitindo-se o recurso de amparo.
Pelo exposto, os juízes do Tribunal Constitucional 2. A peça foi distribuída no dia 21 de junho de 2023
reunidos em plenário decidem não admitir o recurso de ao JCR.
amparo, por não aperfeiçoamento da peça de recurso de
amparo nos termos exigidos, ordenando o seu arquivamento. 2.1. Este, depois de analisar a questão, no dia 23 de junho,
proferiu despacho de marcação de conferência destinada
Registe, notifique e publique. à apreciação do pedido para o dia 30 do mesmo mês,
Praia, 28 de junho de 2023 2.2. Data em que efetivamente se realizou e em que se
José Pina Delgado (Relator) adotou a decisão acompanhada da fundamentação que
se articula em seguida.
Aristides R. Lima
II. Fundamentação
João Pinto Semedo
1. Não é novidade que a Corte Constitucional admite a
Está conforme existência de incidentes pós decisórios das suas decisões
quando estão em causa interesses subjetivos. Entretanto,
Secretaria Judicial do Tribunal Constitucional, aos 28 existem condições que se devem verificar para que o
de junho de 2023. — O Secretário, João Borges. pedido possa ser conhecido, e que serão afloradas adiante.

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1492 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

2. Posto isto, impõe-se verificar se o requerimento é de 2019, pp. 493-499; Acórdão 47/2020, 29 de outubro,
admissível e se os pedidos de aclaração e de reforma Alex Saab v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no
podem ser conhecidos. Boletim Oficial, I Série, N. 3, 12 de janeiro de 2021, pp.
88-90; Acórdão 4/2022, de 10 de fevereiro, Adair Batalha
2.1. Os critérios para a admissibilidade de incidentes v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim
pós-decisórios, em especial os que se reportam ao instituto Oficial, I Série, N. 21, 22 de fevereiro de 2022, pp. 345-346.
da aclaração das decisões judiciais, têm sido cada vez
mais densificados pela Corte Constitucional. Assim, este 2.2. No caso concreto, naturalmente dúvidas não
Pretório tem estabelecido balizas específicas – decorrentes subsistirão em relação à competência e legitimidade e
da natureza especial do processo constitucional e da mesmo a tempestividade está assegurada na medida
suscetibilidade de se fazer um uso abusivo dessa espécie em que o recorrente, tendo sido notificado do Acórdão
de reação processual – que devem ser respeitadas sob 103/2023, no dia 20 de junho, às 16:04, enviou a peça
pena de indeferimento liminar ou de não conhecimento em que suscitou o incidente pós-decisório no dia 21 de
dos pedidos. junho também às 16:04, portanto, dentro das 24 horas
estabelecidas pela Lei.
A principal decisão que conheceu desse tipo de incidente
em sede de um recurso constitucional foi o Acórdão nº 2.3. Dito isso, os requisitos especiais que devem acompanhar
9/2018, de 3 de maio, INPS v. STJ, Rel: JC Pina Delgado, pedidos de aclaração e de reforma manifestamente não
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 35, de 6 de junho, estão presentes, de tal sorte a conduzir a situação em que
pp. 856-869, o qual, apreciando um pedido de fiscalização o requerimento é desprovido de qualquer objeto.
concreta da constitucionalidade, reconheceu a possibilidade
de suscitação de incidentes de aclaração de decisões do 3. No concernente ao pedido de aclaração, o que se encontra
próprio Tribunal Constitucional, mas condicionou a sua na desconexa redação apresentada, longe de conter qualquer
admissibilidade, além da exigência de preenchimento identificação de textos, integra, outrossim, um discurso,
dos pressupostos gerais de competência, legitimidade em tom bastante áspero e nos limiares da urbanidade,
e tempestividade, à identificação, pelo Requerente, de que visa essencialmente manifestar a discordância do
trecho do aresto que padeceria de vício de obscuridade ou recorrente com essa decisão que não admitiu o seu recurso
ambiguidade. Abrindo ainda a faculdade de o Tribunal de amparo, entre outros fundamentos, porque não dirigiu
Constitucional rejeitar liminarmente todo e qualquer pedido o devido pedido de reparação à entidade que praticou o
de aclaração que seja manifestamente procrastinatório, ato, conforme exige a lei.
seja desprovido de qualquer base ou fundamento ou 3.1. O único segmento que aparentemente se afasta
que diga respeito a passagens irrelevantes do texto do do longo rol de agravos contra o Tribunal Constitucional
acórdão que não tenham impacto sobre a decisão. Mais apresentados pelo recorrente é o trecho em que formula
tarde, estendeu-se esse mesmo entendimento a pedidos de pergunta de acordo com a qual “tendo a questão da
aclaração formulados no âmbito de recursos de amparo no inexistência da gravação ponderada e pronunciada em
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Acórdão 5/2019, de 7 de fevereiro, Ike Hills v. STJ, Rel: 1ª instância, como pode o TC considerar que [o] TRS
JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, pronunciou sobre isso como pioneira?”;
N. 28, de 13 de março de 2019, pp. 493-499.
3.2. Porém, paradoxalmente, considerando tratar-se
A necessidade imperiosa de se identificar o trecho de de um pedido de aclaração, sustentado em situação em
um acórdão tem, de resto, sido jurisprudência firme desta que o recorrente mantém dúvidas sobre parte integrante
Corte em qualquer tipo de processo em que se aplicam as de acórdão, nomeadamente pela sua obscuridade ou
mesmas normas do Código de Processo Civil por remissão, ambiguidade, aqui tem tanta certeza sobre o que leu que
conforme interpretação ajustada à natureza especial do se prontificou a responder, dizendo não se estar perante
processo constitucional, nomeadamente exposta no Acórdão caso em que o TRS se pronunciou em primeira instância,
02/2017, de 15 de fevereiro, Rel: JC Aristides R. Lima, pelo que a decisão deveria ser reformada admitindo-se
PSD v. CNE, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 10, o recurso de amparo.
de 27 de fevereiro de 2019, pp. 265-266, 13, um processo
eleitoral, exigindo-se a indicação da obscuridade ou da 3.3. Por conseguinte, apesar de parecer não entender a
ambiguidade; no Acórdão 5/2019, de 7 de fevereiro, Ike diferença entre uma conduta praticada em primeira instância
Hills v. STJ, Rel: JC Pina Delgado, 3.2.3, proferido em pelo TRS e uma conduta perpetrada originariamente pelo
autos de recurso de amparo, impondo a identificação do TRS, tão convictamente formulou o seu entendimento que
trecho alegadamente portador de vícios, e no Acórdão seguramente nenhuma valia terá qualquer esclarecimento
47/2020, de 29 de outubro, Saab v. STJ, Rel: JCP Pinto que o Tribunal lhe podia prestar, os quais, pelos vistos,
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 3, de 12 muito lhe seriam úteis.
de janeiro de 2021, pp. 88-90, 3, também decorrente de um 4. Em relação ao pedido de reforma, atendendo que se
recurso de amparo, em que o Tribunal explicitou de forma limita a lançar um anátema sobre a decisão do TC sem
clara essa exigência comum. Como se veio a considerar qualquer fundamentação de facto e de direito, o mesmo
depois, “[a] indicação do trecho ao qual se imputa o vício se passa, sobretudo por utilizar uma prosa a todos os
de ambiguidade ou de obscuridade é decisiva até para se títulos rasa, vazia, desrespeitosa e desprovida de sentido.
evitar que requerentes que pedem aclaração apresentem
considerações genéricas e indeterminadas a respeito do 4.1. Uma autêntica catilinária que resolveu dirigir a
acórdão atribuindo ao Tribunal posições e fundamentos esta Corte Constitucional. Só que, ao contrário de Marco
que resultam de meras perceções ou pretensões e sem Túlio Cícero, As catilinárias, texto original e tradução,
que tenham qualquer correspondência textual com o teor Amílcar Carletti (trad.), São Paulo, LEUD, 2020, passim,
da decisão” (Acórdão 42/2021, de 20 de setembro, Alex o eterno mestre da retórica, que dominava o verbo e, bem
Saab v. STJ, referente a pedido de aclaração do Acordão ou mal, agiu para defender a sua República e as suas
39/2021, Red. JC Pina Delgado; JC Aristides R. Lima e instituições contra demagogos e populistas, o discurso
JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, que se revela através da peça que teve a audácia de
N. 100, de 15 de outubro, pp. 2590-2593, 2). protocolar para abutere patientia nostra é pouco claro e
é utilizado para atacar de forma vil este Tribunal com
Quanto a decisões de admissibilidade de recurso de acusações e falsidades que, sob as vestes da indignação
amparo fê-lo nos seguintes arestos: Acórdão 10/2019, do homem comum, pretendem simplesmente intimidar
de 14 de fevereiro, João Baptista Delgado v. Tribunal as instituições a conceder-lhe tratamentos privilegiados
Judicial da Comarca do Paul, Rel: JCP Pinto Semedo, à margem da lei. Se são estes os tempora e mores que
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 28, 13 de março temos de aturar, que assim seja!

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1493

4.2. Já sobre o que seria processualmente correto e devidamente representados por profissionais do foro ao
idóneo nada há, considerando que o recorrente sequer se abrigo da proverbial fórmula: “com o douto suprimento
dá ao trabalho de tentar construir uma situação em que de Vossas Excelências”;
legalmente se pudesse justificar um pedido de reforma de
acórdão, nos termos do artigo 578 do Código de Processo 4.4. Se o Tribunal fosse realmente rigoroso nunca
Civil. O que é revelador de todos os problemas que estão na aceitaria as determinações manifestamente insuficientes
base deste requerimento. Pois, em última instância, sem dos amparos que se requer e as mal-alinhavadas indicações
que se tenha, uma única vez, contestando a necessidade de dos parâmetros violados, que, se limitam a remeter para
o Tribunal Constitucional condicionar a admissibilidade uma norma constitucional, a citá-la textualmente sem o
de um amparo à existência de um pedido de reparação, mínimo esforço de definição do modo como a conduta concreta
traz-se um longo e desconexo discurso, o que demonstra, vulnera posição jurídica resultante do direito invocado,
mais do que tudo, uma inaptidão extrema para se envolver como se questões que envolvem normas constitucionais
em contenciosos constitucionais; com textura aberta possam ter um resultado hermenêutico
objetivo e pré-determinado;
4.2.1. Em qualquer país do Mundo, e não só naqueles
que magicamente já têm Estados de Direito há quinhentos 4.5. Mas, o nível de desleixo, ou, quiçá, a convicção de que
anos! – uma tese revolucionária do recorrente de que os pode peticionar da forma como bem entender, são tamanhos
estudiosos da Constituição, ainda, não se deram conta! que o recorrente reclama do formalismo do Tribunal e
–, somente advogados especialistas em Direito Público traz uma peça em que, primeiro, não assinala o acórdão
e em Direito Constitucional litigam perante a jurisdição de que pede aclaração e reforma; segundo, não indica
constitucional com os seus próprios instrumentos e qualquer trecho desse acórdão a que imputa obscuridade
conhecimentos. Os demais, ou contratam esses advogados ou ambiguidade e que quer ver aclarado; terceiro, não
especializados, jurisconsultos ou professores de Direito ou, traz à colação nenhum documento constante dos autos
alternativamente, recorrem a consultores que dominam que o Tribunal por lapso manifesto não tenha tomado em
a matéria para lhes ajudar a delinear a estratégia de consideração e que por si só implicaria decisão diversa
defesa desde o início, contemplando eventuais recursos da proferida que legitimasse a sua reforma; quarto, nem
constitucionais, e auxiliando-os a montar as peças de sequer se dá ao trabalho de indicar os dispositivos legais
forma técnica e linguisticamente adequada. Poupando-os, que fundamentam o seu pedido de aclaração e reforma
assim, de terem os recursos que patrocinam inadmitidos de acórdão, sendo certo que nem a Lei do Amparo, nem a
por razões que podiam evitar e de se exporem a situações Lei do Tribunal Constitucional, preveem a possibilidade
menos cómodas e edificantes para a sua imagem e de isso acontecer, o que somente pode ocorrer mediante
reputação profissionais. a remissão que tanto uma como a outra fazem para o
Código de Processo Civil.
E a razão é por demais evidente, haja em vista que todos
sabem que as condições que habilitam ao conhecimento 4.6. De resto, é só na sequência de tais premissas é
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de qualquer questão constitucional são exigentes, o que que se pode conceber os dizeres absurdos do recorrente
faz que aqueles que ainda não as dominem tenham na peça que suscita o pedido de reforma, sugerindo que
dificuldades de litigar com eficácia perante tais jurisdições o Tribunal “considera que há uma flagrante violação da
especiais. Ao contrário da pérola de sabedoria constitucional Constituição, mas, por um dedo de formalidades decide
comparada lançada pelo ilustre requerente, invetivando deixar esse cidadão na cadeia” (para 5). Além da total
o Tribunal por se apegar a formalismos para não admitir ausência de fundamentação, na medida em que não se dá
o seu recurso, e estabelecendo implicitamente paralelo ao trabalho de pôr em discussão o trecho em que se lavrou
com outros sistemas constitucionais que possuem queixas tal entendimento, recorre a uma inverdade manifesta, não
constitucionais, se ele se desse ao trabalho de estudar havendo qualquer indicação textual que o Tribunal tenha
um pouco mais saberia imediatamente que os índices de considerado haver no caso concreto flagrante violação da
inadmissão dos dois principais – o Verfassungsbeschwerde Constituição. Tal assertiva só pode se justificar ou por
teutónico e o recurso de amparo espanhol – ultrapassam má-fé ou por manifesto desconhecimento sobre o modo
os 95%. Se se analisar os últimos dados disponíveis do de funcionamento do recurso de amparo, posto desafiar
Tribunal Constitucional espanhol verifica-se que dos toda a lógica um Tribunal se pronunciar sobre o mérito
6.572 amparos suplicados em 2021, 6.439 não foram de um pedido – a alegada violação de direito ou, como diz
admitidos (Tribunal Constitucional, Memória 2021, Madrid, o recorrente, a flagrante violação da Constituição – se não
Imprensa Nacional del Boletín Oficial del Estado, 2021, admite o recurso por ausência de pedido de reparação.
quadro 15); na Alemanha, já em 2022, das 4.645 queixas
constitucionais, um total de 4.354 não foram admitidas 4.7. O sistema funciona, quando todos fazem o seu
(Jahresbericht 2022, Karlsruhe, Bundesverfassungsgericht, trabalho profissional, integral e diligentemente, não
2023, pp. 53-54). com facilitismos, nem com súplicas de aligeiramento das
exigências impostas pela própria lei e que, no caso da
4.3. E neste caso este é o principal problema, pois, ao mesma, não conduzem a qualquer novidade interpretativa.
invés de, primeiro, garantir que todos os pressupostos Como o próprio Acórdão 103/2023, de 19 de julho, Manuel
e requisitos de admissibilidade do seu recurso estejam Moreira v. TRS, Inadmissão por Não Atributabilidade de
preenchidos, prefere tentar contornar o dever de colocar a Condutas Impugnadas ao Ato Recorrido e por Ausência de
questão concreta que atribuiu ao órgão judicial recorrido, Pedidos de Reparação, Rel: JCP Pina Delgado, 8.4.2, que
trazendo-a ao TC sem protocolar o pedido de reparação infundadamente o recorrente ataca, o condicionamento
imposto pelo artigo 3º, parágrafo 1º, alínea c) da Lei do da existência de pedido de reparação, além de decorrer
Amparo e do Habeas Data, apelando a uma mistela de da lei, tem sido reiterado sistematicamente em vários
tentativa de intimidação do Tribunal Constitucional com acórdãos desde 2018. Aparentemente, não lê os arestos
palavreado grandiloquente e o recurso a uma filosofia do de que pede aclaração e muito menos conhece ou sequer
coitadismo e da menoridade e mediocridade intelectuais, verifica a jurisprudência que cita, confundindo ainda a
que tem no seu bojo a ideia de que por sermos um país regra que impõe o pedido de reparação com circunstâncias
novo, por termos uma jurisdição constitucional autónoma excecionais em que este pode ser dispensado.
de oito anos, este Pretório é obrigado a dar um jeitinho
para relevar o não-cumprimento das exigências impostas 4.8. O ilustre recorrente dá a entender que ignora a
pela lei para se admitir um recurso, mais do que já faz, lei, não encaminhando a sua estratégia processual de
quando esta ainda o permite, amiúde tendo de ajustar moldes a assegurar que o Tribunal Constitucional pudesse
as peças, racionalizar a fundamentação das alegações, conhecer o seu recurso, não acompanha a jurisprudência,
encontrando nas entrelinhas as intenções de recorrentes não mostra dominar as particularidades do sistemas

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1494 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

de precedentes que usa como base do labéu que lança a dos acórdãos de admissibilidade do Tribunal Constitucional,
esta Corte, não se refere a casos, não os distingue uns argumentando que o mesmo viola, segundo se conseguiu
dos outros, preferindo, sem qualquer demonstração, perceber, o princípio da igualdade.
apresentar generalidades retóricas como “temos várias
decisões”; em “vários arestos idênticos”; uma “nova era”, 1.2. Alega que o Tribunal Constitucional, com base
sem se preocupar em consubstanciar minimamente o que no artigo 618 do CPC, decidiu não admitir o seu recurso
alega, indicando estas outras decisões. de amparo, ordenando o seu arquivamento, por não
esgotamento de todas as vias legais de defesa de direitos,
4.9. Reitera-se que se trata de uma jurisdição especializada liberdades e garantias.
que exige um certo tipo de conhecimentos, expertises,
precisão e compromisso para nela se litigar. 1.3. A seu ver, terá havido errada aplicação do artigo 618
do CPC, tendo em conta o disposto no artigo 635, número 1,
5. A entrega de um requerimento de aclaração e reforma conjugado com as nulidades que se encontram no artigo 577
de acórdão sem se assinalar qual é o acórdão reclamado, e 629, todos do CPC, não tendo o Tribunal Constitucional,
sem determinação concreta do seu objeto e indicação de ao invés, abraçado a sua própria jurisprudência, segundo
dispositivos legais legitimantes, é inadmissível. a qual, “a justiça material prevalece sobre a justiça
formal[”]” admitindo o seu recurso de amparo;
5.1. Principalmente em caso em que o recorrente se
insurge veementemente contra aquilo que ele próprio 1.4. Defende que, contrariamente ao decidido, através
denomina de formalismo do Tribunal, pois mesmo sabendo das peças protocoladas no processo, foi observado o
que este tem imposto o cumprimento das condições de pressuposto formal de esgotamento dos meios de defesa
forma exigidas por lei, apresenta uma peça de pedido dos direitos fundamentais previsto no artigo 6º da Lei do
de aclaração e reforma sem o mínimo sentido, não Recurso de Amparo e do Habeas Data;
indicando nem o acórdão reclamado nem o trecho de que
pede aclaração, nem o fundamento da reforma, o que se 1.5. Por isso, entende que o Acórdão 84/2023 prolatado
aproxima do absurdo e não pode ser tolerado. pelo Tribunal Constitucional é nulo, por erro na aplicação
de normas de processo relativas ao Direito Constitucional
5.2. Fica claro que este pedido de aclaração/reforma de Processual, da Lei do Recurso de Amparo e do Código de
acórdão sendo desprovido de sentido, padecendo de falta Processo Civil, integrando ainda a nulidade da alínea b)
total de objeto, deve ser liminarmente rejeitado. do nº 1 do artigo 577 do CPC.
III. Decisão 1.6. Conclui, solicitando que se declare a nulidade
Pelas razões expostas, os Juízes do Tribunal Constitucional do acórdão desafiado, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do
rejeitam liminarmente o incidente de aclaração e de artigo 25º da Lei do recurso de Amparo, com as suas
reforma do Acórdão nº 103/2023, de 19 de julho, por consequências legais.
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ausência de objeto. 2. Marcada sessão de julgamento para o dia 30 de junho,


Registe, notifique e publique. nessa data se realizou, com a participação dos Venerandos
Juízes-Conselheiros e do Senhor Secretário do TC, dela
Praia, 3 de julho de 2023 decorrendo a decisão que se segue acompanhada dos
fundamentos articulados infra.
José Pina Delgado (Relator)
II. Fundamentação
Aristides R. Lima
1. Como em arestos anteriores, é importante reiterar
João Pinto Semedo que o Tribunal já havia assentado entendimento sobre
Está conforme a arguição de nulidades das suas decisões, sobretudo
as adotadas em processos de recurso constitucional de
Secretaria Judicial do Tribunal Constitucional, aos 3 fiscalização concreta ou de amparo:
de julho de 2023. — O Secretário, João Borges.
1.1. Recuperando a posição geral desenvolvida no
–––––– Acórdão 09/2018, de 3 de maio, Rel. JC Pina Delgado,
INPS v. Presidente do STJ, Pedido de Aclaração e de
Cópia: Reforma do Acórdão, Rel: JC Pina Delgado, publicado
no Boletim Oficial, I Série, N. 35, de 6 de junho de 2018,
Do acórdão proferido nos autos de Recurso de Amparo pp. 856-869, assentando, em sede de fiscalização concreta
Constitucional n.º 3/2021, em que é recorrente Antero da constitucionalidade, que, sendo possível que os seus
Maria Gomes de Oliveira e entidade recorrida o próprios acórdãos padeçam de vícios, nada obsta que
Supremo Tribunal de Justiça. conheça tais desafios; ainda que, em se tratando de um
recurso especial, o Tribunal pode não os conhecer no
Acórdão n.º 112/2023 mérito caso não venham acompanhados de fundamentação
(Autos de Amparo 3/2021, Antero Maria Gomes Oliveira bastante, tenham propósitos meramente protelatórios ou
v. Supremo Tribunal de Justiça, Indeferimento liminar de sejam manifestamente inviáveis.
pedido de nulidade do Acórdão 84/2023, por suscitação 1.2. E foi articulando posições em outras decisões tiradas,
manifestamente intempestiva) já em arestos de admissibilidade em autos de amparo,
I. Relatório nomeadamente através do Acórdão 10/2019, de 14 de
fevereiro, J.B. Delgado v. Tribunal Judicial da Comarca
1. O Senhor Antero Maria Gomes Oliveira, segundo do Paul, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim
alude, vem ao abrigo das disposições conjugadas da Oficial, I Série, N. 29, de 14 de março de 2019, pp. 519-
primeira parte do nº 3 do artigo 577 e do 595 do CPC, 521; do Acórdão 11/2019, de 28 de fevereiro, E.B. Whanon
arguir a nulidade do Acórdão 84/2023, de 31 de maio, Ferreira v. Tribunal Judicial da Comarca do Paul, Rel:
ancorando-se nos fundamentos que abaixo se sumariza: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série,
N. 29, de 14 de março de 2019, pp. 521-523; do Acórdão
1.1. Suscita como questão prévia a inconstitucionalidade 19/2019, de 11 de abril, Obire v. STJ, Rel: JCP Pinto
do número 2 [seria o nº 3] do artigo 16 da Lei do Amparo, Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 46, de 24
que fixa o prazo de vinte e quatro horas para a impugnação de abril de 2021, pp. 838-839, e em arestos relacionados a

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1495

processos de fiscalização concreta da constitucionalidade os requisitos especiais associados à causa de nulidade


como o Acórdão 36/2021, de 30 de julho, Alex Saab v. invocada cuja redação é formulada, com as devidas
STJ, Arguição de Nulidade do Acórdão 30/2021, de 29 adaptações, no sentido de que seria nulo o acórdão “(…)
de junho, sobre solicitação de cumprimento de pedido quando não especifique os fundamentos de facto e de
de adoção de medidas provisórias dirigido ao Estado de direito que justificam a decisão”, estão preenchidos.
Cabo Verde pelo Comité de Direitos Humanos das Nações Respetivamente, de, por um lado, atestar a presença dos
Unidas, por alegadamente o Tribunal Constitucional requisitos de competência, legitimidade e tempestividade,
ter conhecido de questão que não devia conhecer e por e, do outro, verificar se o requisito inerente à causa de
o Tribunal ter alegadamente deixado de se pronunciar nulidade invocada – a apresentação de uma conexão entre
sobre questão que devia, Rel. JC Pina Delgado, publicado a decisão e a omissão de fundamentação – se releva na
no Boletim Oficial, I Série, N. 88, de 16 de setembro de argumentação do requerente, na medida em que a este
2021, pp. 2306-2309 (número do Acórdão corrigido pela cabe o ónus de a estabelecer.
Retificação nº 149/2021, de 17 de setembro, publicada no
Boletim Oficial, I Série, N. 89, de 17 de setembro de 2021, 2.1. Em relação à presença dos pressupostos gerais de
pp. 2319-2321); o Acórdão 38/2021, de 30 de julho, Alex competência, legitimidade e tempestividade,
Saab v. STJ, Arguição de Nulidade do Acórdão 37/2021,
de 9 de agosto, referente a despachos do Juiz-Relator de 2.1.1. Sem mais considerações, pode-se concluir que
admissão da intervenção processual do Ministério Público os dois primeiros estão preenchidos, haja em vista o que
como interveniente contrainteressado no processo principal dispõe os artigos 575, parágrafo segundo; 577, parágrafo
e de admissão de junção de nota diplomática e mandado terceiro, e 589, parágrafo primeiro, todos do CPC, legislação
remetidos pelo Ministério Público, por ter conhecido de aplicável por remissão;
questão de que não podia tomar conhecimento, Rel. JC
Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 2.1.2. No que diz respeito à tempestividade, tendo em conta
88, de 16 de setembro de 2021, pp. 2316-2317; do Acórdão que o recorrente foi notificado, através do seu mandatário,
47/2021, de 13 de outubro, Alex Saab v. STJ, Referente por via eletrónica, do Acórdão 84/2023, no dia 5 de junho
a Arguição de Nulidade do Acórdão 39/2021, de 30 de de 2023, às 15h22mn, e o seu requerimento só viria a dar
agosto, por alegadas nulidades na tramitação processual, entrada na secretaria do Tribunal Constitucional, enviado
nulidades do acórdão e violação de princípios jurídicos, pela mesma via, no dia 20 de junho pelas 14h12mn,
Red. JC Pina Delgado; JC Aristides R. Lima; JCP Pinto é evidente que o presente incidente pós-decisório foi
Semedo; publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 88, protocolado fora do prazo estabelecido para o efeito.
de 15 de outubro de 2021, pp. 2619-2636; e do Acórdão
5/2022, de 10 de fevereiro, Alex Saab v. STJ, Red: JCP 2.1.3. O prazo que impede o trânsito em julgado de
Pinto Semedo; JC Pina Delgado; JC Aristides R. Lima; uma decisão negativa de admissibilidade de amparo está
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 88, de 16 de estabelecido no artigo 16, parágrafo terceiro, da Lei do
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setembro de 2021, pp. 346- 348, que também aplicaram por Amparo e do Habeas Data, em 24 horas. E, a menos que
remissão as mesmas regras do Código de Processo Civil. exista motivo justificante, é dentro desse intervalo de
tempo que se tem de atuar para se obstar à cristalização
1.3. Dessa jurisprudência firme e neste momento da decisão;
consolidada ressalta o entendimento de que esta Corte
não é refratária a que nulidades dos seus próprios 2.1.4. O artigo 233, parágrafo sexto, do Código de Processo
acórdãos sejam arguidas. Porém, considerando ser um Civil, dispõe claramente que “a notificação por transmissão
Tribunal Especial, a que a Lei Fundamental atribui eletrónica presume-se efetuada na data de sua expedição”.
diretamente uma função constitucional, pela sua natureza, Tendo o recorrente sido notificado do Acórdão objeto de
intervém subsidiariamente quando uma pessoa não tiver arguição de nulidade no dia 5 de junho às 15h22mn,
obtido a tutela de direitos perante os outros tribunais. qualquer incidente pós-decisório que pretendesse suscitar
Realizando-se tal intervenção no quadro de um processo teria que ser protocolado até às 15h22mn do dia 6 de
– o constitucional – sobre o qual esta Corte tem poderes junho. Tendo a peça dado entrada no dia 20 de junho, é
de conformação, e constatando-se que, na maior parte evidente que foi largamente ultrapassado o prazo previsto
das vezes, as arguições de nulidade têm funcionado como para protocolar qualquer incidente pós decisório, como de
um isco quase irresistível ao improbus litigator para resto tem sido o entendimento do Tribunal Constitucional
tentar utilizar o instituto para finalidades espúrias que (Acórdão 11/2019, de 28 de fevereiro, E.B. Whanon Ferreira
prejudicam o desenrolar normal do processo com objetivos v. Tribunal Judicial da Comarca do Paul, Rel: JCP Pinto
meramente dilatórios, somente se aprecia as alegações Semedo, publicado no Boletim oficial, I Série, N. 29, de
que se refiram claramente a causas de nulidade previstas 14 de março de 2019, pp. 521-524; Acórdão 5/2023, de 18
pelo Código de Processo Civil. De acordo com a sua aceção de janeiro, Pedro Rogério Delgado v. TRS, Rel: JCP Pinto
natural e nos termos dos seus requisitos inerentes, Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 25, de
interpretados e ajustados conforme a natureza própria 13 de março de 2023, pp. 689-690; Acórdão 6/2023, de
do processo constitucional, na medida em que aquele é 18 de janeiro, Pedro Rogério Delgado v. TRS, Rel: JCP
desenhado, como o Tribunal já tinha entendido, para dar Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
vazão a pretensões meramente subjetivas ao passo que 25, de 13 de março, pp. 690-691; Acórdão 7/2023, de 18
este é composto também por uma dimensão objetiva de de janeiro, António José Pires Ferreira v. TRB, Rel: JCP
defesa da Constituição e do seu regime de proteção de Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N 25,
direitos. Por isso, desde sempre, assentou entendimento de 13 de março de 2023, pp. 691-693; Acórdão 69/2023, de
de que “qualquer recurso ao Código de Processo Civil 5 de maio, Rui Santos Correiav. TRS, pedido de aclaração
além de pressupor um vazio regulatório nos diplomas do Acórdão 52/2023, Rel: JCP Pina Delgado, publicado
que regulam o processo constitucional, depende de uma no Boletim Oficial, I Série, N. 57, de 22 de maio de 2023,
necessária adaptação à natureza pública do processo pp. 1293-1294; Acórdão 70/2023, de 5 de maio, Valter
constitucional e aos valores constitucionais que persegue” Furtado v. STJ, Não conhecimento de pedido de aclaração
(Acórdão 6/2017, de 21 de abril, Maria de Lurdes v. STJ, do Acórdão 19/2023 por colocação intempestiva, Rel: JCP
Pedido de Desistência, Rel: JC Pina Delgado, publicado Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
no Boletim Oficial, I Série, N. 27, de 16 de maio de 2017, 57, 22 de maio de 2023, pp. 1294-1296).
pp. 659- 668), 3.1.2).
2. Antes de este Tribunal pronunciar-se sobre o 2.2. Na sua peça o requerente suscita como questão
mérito da impugnação dirigida ao Acórdão 84/2023, de prévia a inconstitucionalidade do número 3 do artigo 16
31 de maio, deve verificar se os pressupostos gerais e da Lei do Amparo que fixa o prazo de vinte e quatro horas

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1496 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

para a impugnação dos acórdãos de admissibilidade do Cópia:


Tribunal Constitucional argumentando que o mesmo
viola o direito ao recurso. Do acórdão proferido nos autos de Recurso de Amparo
Constitucional n.º 46/2022, em que são recorrentes Osvaldo
2.2.1. Como ficou assentado no Acórdão 101/2023, de 15 Rodrigues Oliveira e Ramiro Rodrigues Oliveira, e entidade
de junho, Autos de Recurso de Amparo 24/2022, Herdeiro recorrida o Supremo Tribunal de Justiça.
de Marie Margueritte Lopes v. 1º JFTJCSV, Indeferimento Acórdão n.º 113/2023
Liminar de Arguição de Nulidade do Acórdão 57/2023 por
colocação intempestiva de incidente pós-decisório, Rel: JCP (Autos de Amparo 46/2022, Osvaldo Rodrigues Oliveira e
Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 69, Ramiro Rodrigues Oliveira v. Supremo Tribunal de Justiça,
22 de junho de 2023, pp. 1389-1390, mesmo considerando Indeferimento liminar de pedido de nulidade do Acórdão
que o recorrente pretende viabilizar o incidente de nulidade nº 85/2023, por suscitação manifestamente intempestiva)
invocando possível inconstitucionalidade de norma que I. Relatório
fixa o prazo que impede o trânsito em julgado de decisão
que não admite recurso de amparo em vinte e quatro 1. Os Senhores Osvaldo Rodrigues Oliveira e Ramiro
horas, a situação específica não requer que o Tribunal Rodrigues Oliveira, segundo apontam, vêm ao abrigo
se posicione sobre a possibilidade de um interveniente das disposições conjugadas da primeira parte do nº 3 do
processual arguir preventivamente a não-aplicação dessa artigo 577 e do 595 do CPC, arguir a nulidade do Acórdão
norma por incompatibilidade com preceitos da própria 85/2023, de 31 de maio, ancorando-se nos fundamentos
Constituição. que abaixo se sumariza:
2.2.2. Pela simples razão de que, mesmo que se parta 1.1. Suscitam como questão prévia a inconstitucionalidade
do princípio de que não se pode utilizar as balizas de um do número 2 [seria o nº 3] do artigo 16 da Lei do Amparo,
prazo que está a ser desafiado por inconstitucionalidade – o que fixa o prazo de vinte e quatro horas para a impugnação
de vinte e quatro horas previsto pelo artigo 16, parágrafo dos acórdãos de admissibilidade do Tribunal Constitucional,
terceiro, da Lei do Amparo e do Habeas Data –, para argumentando que o mesmo violaria, segundo se conseguiu
inviabilizar a suscitação da questão, na sua ausência, perceber, o princípio da igualdade.
seria aplicável o prazo geral de cinco dias determinado 1.2. Alegam que o Tribunal Constitucional, com base
pelo artigo 145 do Código de Processo Civil. no artigo 618 do CPC, decidiu não admitir o seu recurso
de amparo, ordenando o seu arquivamento, por não
2.2.3. Considerando que o recorrente protocolou o seu esgotamento de todas as vias de recurso ordinário.
incidente no dia 20 de junho, fê-lo onze dias úteis depois
de ter sido notificado, portanto muito além de qualquer 1.3. A seu ver, terá havido errada interpretação e
prazo legal aplicável. aplicação do artigo 618 do CPC, tendo em conta o disposto
no artigo 635, número 1, conjugado com as nulidades
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2.2.4. Mesmo que, porventura, fosse de se recorrer ao que se encontram no artigo 577 e 629, todos do CPC,
prazo de dez dias previsto para a interposição de recursos por tal norma não caber no incidente especial do recurso
de fiscalização concreta da constitucionalidade, nos termos de amparo “não especificado” destinado à proteção dos
do artigo 81, parágrafo primeiro, da Lei do Tribunal direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos;
Constitucional – e nem é! –, ainda assim a colocação do 1.3.1. Entendem que o Acórdão 85/2023, de 31 de maio,
seu recurso teria ocorrido fora do prazo. é nulo, por o Tribunal Constitucional ter fundamentado
2.2.5. Não sendo aceitável suscitar-se a questão onze a sua decisão com a aplicação do artigo 618 do CPC, ao
dias depois, como fez o recorrente, com fulcro na espúria invés das disposições conjugadas das normas adjetivas da
ideia de se tratar de um recurso ordinário com prazo de alínea c) do nº 1 e do nº 2 do artigo 3º da Lei do Recurso de
trinta dias. Amparo, com a agravante de ainda integrar a nulidade
por falta de especificação de facto e de direito, ao não
2.3. Nestes termos, perante um caso em que se requer determinar os princípios e regras jurídicas em que se
uma nulidade que pura e simplesmente não existe e cujos apoiou para tomar tal decisão.
fundamentos apresentados são de difícil compreensão, já 1.4. Concluem, solicitando que se declare a nulidade
que o recurso de amparo que protocolou não foi admitido do acórdão desafiado, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do
por não esgotamento das vias legais de defesa dos artigo 25º da Lei do Recurso de Amparo, com as suas
direitos, liberdades e garantias, conclui-se que o pedido do consequências legais.
requerente não pode ser atendido por ser manifestamente
intempestivo. 2. Marcada sessão de julgamento para o dia 30 de junho,
nessa data se realizou, com a participação dos Venerandos
III. Decisão Juízes-Conselheiros e do Senhor Secretário do TC, dela
decorrendo a decisão que se segue acompanhada dos
Pelo exposto, os Juízes Conselheiros do Tribunal fundamentos articulados infra.
Constitucional, reunidos em plenário, decidem indeferir
liminarmente o pedido de declaração de nulidade do Acórdão II. Fundamentação
84/2023, de 31 de maio, por suscitação intempestiva do 1. Como em arestos anteriores, é importante reiterar
mesmo. que o Tribunal já havia assentado entendimento sobre
a arguição de nulidades das suas decisões, sobretudo
Registe, notifique e publique. as adotadas em processos de recurso constitucional de
Praia, 3 de julho de 2023 fiscalização concreta ou de amparo:
1.1. Recuperando a posição geral desenvolvida no
José Pina Delgado (Relator) Acórdão 09/2018, de 3 de maio, Rel. JC Pina Delgado,
INPS v. Presidente do STJ, Pedido de Aclaração e de
Aristides R. Lima Reforma do Acórdão, Rel: JC Pina Delgado, publicado
João Pinto Semedo no Boletim Oficial, I Série, N. 35, de 6 de junho de 2018,
pp. 856-869, assentando, em sede de fiscalização concreta
Está conforme da constitucionalidade, que, sendo possível que os seus
próprios acórdãos padeçam de vícios, nada obsta que
Secretaria Judicial do Tribunal Constitucional, aos 3 conheça tais desafios; ainda que, em se tratando de um
de julho de 2023. — O Secretário, João Borges. recurso especial, o Tribunal pode não os conhecer no

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1497

mérito caso não venham acompanhados de fundamentação pretensões meramente subjetivas ao passo que este é
bastante, tenham propósitos meramente protelatórios ou composto também por uma dimensão objetiva de defesa
sejam manifestamente inviáveis. da Constituição e do seu regime de proteção de direitos.
Por isso, desde sempre, assentou entendimento de que
1.2. E foi articulando posições em outras decisões tiradas, “qualquer recurso ao Código de Processo Civil além de
já em arestos de admissibilidade em autos de amparo, pressupor um vazio regulatório nos diplomas que regulam
nomeadamente através do Acórdão 10/2019, de 14 de o processo constitucional, depende de uma necessária
fevereiro, J.B. Delgado v. Tribunal Judicial da Comarca adaptação à natureza pública do processo constitucional e aos
do Paul, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim valores constitucionais que persegue” (Acórdão 6/2017, de
Oficial, I Série, N. 29, de 14 de março de 2019, pp. 519- 21 de abril, Maria de Lurdes v. STJ, Pedido de Desistência,
521; do Acórdão 11/2019, de 28 de fevereiro, E.B. Whanon Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série,
Ferreira v. Tribunal Judicial da Comarca do Paul, Rel: N. 27, de 16 de maio de 2017, pp. 659- 668), 3.1.2).
JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série,
N. 29, de 14 de março de 2019, pp. 521-523; do Acórdão 2. Antes de este Tribunal pronunciar-se sobre o mérito da
19/2019, de 11 de abril, Obire v. STJ, Rel: JCP Pinto impugnação dirigida ao Acórdão 85/2023, de 31 de maio,
Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 46, de 24 deve verificar se os pressupostos gerais e os requisitos
de abril de 2021, pp. 838-839, e em arestos relacionados a especiais associados à causa de nulidade invocada cuja
processos de fiscalização concreta da constitucionalidade redação é formulada, com as devidas adaptações, no sentido
como o Acórdão 36/2021, de 30 de julho, Alex Saab v. de que seria nulo o acórdão “(…) quando não especifique
STJ, Arguição de Nulidade do Acórdão 30/2021, de 29 os fundamentos de facto e de direito que justificam a
de junho, sobre solicitação de cumprimento de pedido decisão”, estão preenchidos. Respetivamente, de, por um
de adoção de medidas provisórias dirigido ao Estado de lado, atestar a presença dos requisitos de competência,
Cabo Verde pelo Comité de Direitos Humanos das Nações legitimidade e tempestividade, e, do outro, verificar se
Unidas, por alegadamente o Tribunal Constitucional o requisito inerente à causa de nulidade invocada – a
ter conhecido de questão que não devia conhecer e por apresentação de uma conexão entre a decisão e a omissão
o Tribunal ter alegadamente deixado de se pronunciar de fundamentação, “por falta de especificação de facto e
sobre questão que devia, Rel. JC Pina Delgado, publicado de direito” – se releva na argumentação do requerente,
no Boletim Oficial, I Série, N. 88, de 16 de setembro de na medida em que a este cabe o ónus de a estabelecer.
2021, pp. 2306-2309 (número do Acórdão corrigido pela 2.1. Em relação à presença dos pressupostos gerais de
Retificação nº 149/2021, de 17 de setembro, publicada no competência, legitimidade e tempestividade,
Boletim Oficial, I Série, N. 89, de 17 de setembro de 2021,
pp. 2319-2321); o Acórdão 38/2021, de 30 de julho, Alex 2.1.1. Sem mais considerações, pode-se concluir que
Saab v. STJ, Arguição de Nulidade do Acórdão 37/2021, os dois primeiros estão preenchidos, haja em vista o que
de 9 de agosto, referente a despachos do Juiz-Relator de dispõe os artigos 575, parágrafo segundo; 577, parágrafo
admissão da intervenção processual do Ministério Público terceiro, e 589, parágrafo primeiro, todos do CPC, legislação
4 910000 000000

como interveniente contrainteressado no processo principal aplicável por remissão;


e de admissão de junção de nota diplomática e mandado 2.1.2. Já no que concerne à tempestividade, é notório
remetidos pelo Ministério Público, por ter conhecido de que o presente incidente pós-decisório é extemporâneo,
questão de que não podia tomar conhecimento, Rel. JC tendo em conta que os recorrentes foram notificados,
Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. através do seu mandatário, por via eletrónica, do Acórdão
88, de 16 de setembro de 2021, pp. 2316-2317; do Acórdão 85/2023, no dia 5 de junho de 2023, às 15h19mn, e o
47/2021, de 13 de outubro, Alex Saab v. STJ, Referente seu requerimento só viria a dar entrada na secretaria
a Arguição de Nulidade do Acórdão 39/2021, de 30 de do Tribunal Constitucional, enviado pela mesma via, no
agosto, por alegadas nulidades na tramitação processual, dia 20 de junho pelas 14h12mn;
nulidades do acórdão e violação de princípios jurídicos, 2.1.3. O prazo que impede o trânsito em julgado de
Red. JC Pina Delgado; JC Aristides R. Lima; JCP Pinto uma decisão negativa de admissibilidade de amparo
Semedo; publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 88, está estabelecido no artigo 16, parágrafo terceiro, da Lei
de 15 de outubro de 2021, pp. 2619-2636; e do Acórdão do Amparo e do Habeas Data, em 24 horas. E, a menos que
5/2022, de 10 de fevereiro, Alex Saab v. STJ, Red: JCP exista motivo justificante, é dentro desse intervalo de tempo
Pinto Semedo; JC Pina Delgado; JC Aristides R. Lima; que se tem de atuar para se obstar à cristalização da decisão;
publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 88, de 16 de
setembro de 2021, pp. 346- 348, que também aplicaram por 2.1.4. O artigo 233, parágrafo sexto, do Código de
remissão as mesmas regras do Código de Processo Civil. Processo Civil, dispõe claramente que “a notificação por
transmissão eletrónica presume-se efetuada na data de
1.3. Dessa jurisprudência firme e neste momento sua expedição”. Tendo os recorrentes sido notificados
consolidada ressalta o entendimento de que esta Corte não do Acórdão objeto de arguição de nulidade no dia 5 de
é refratária a que nulidades dos seus próprios acórdãos junho às 15h19mn, qualquer incidente pós-decisório
sejam arguidas. Porém, considerando ser um Tribunal que pretendessem suscitar teria que ser protocolado
Especial, a que a Lei Fundamental atribui diretamente até às 15h19mn do dia 6 de junho. Tendo a peça dado
uma função constitucional, pela sua natureza, intervém entrada no dia 20 de junho, é evidente que foi largamente
subsidiariamente quando uma pessoa não tiver obtido a ultrapassado o prazo previsto, como de resto tem sido
tutela de direitos perante os outros tribunais. Realizando-se o entendimento do Tribunal Constitucional (Acórdão
tal intervenção no quadro de um processo – o constitucional 11/2019, de 28 de fevereiro, E.B. Whanon Ferreira v.
– sobre o qual esta Corte tem poderes de conformação, Tribunal Judicial da Comarca do Paul, Rel: JCP Pinto
e constatando-se que, na maior parte das vezes, as Semedo, publicado no Boletim oficial, I Série, N. 29, de
arguições de nulidade têm funcionado como um isco quase 14 de março de 2019, pp. 521-524; Acórdão 5/2023, de 18
irresistível ao improbus litigator para tentar utilizar o de janeiro, Pedro Rogério Delgado v. TRS, Rel: JCP Pinto
instituto para finalidades espúrias que prejudicam o Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 25, de
desenrolar normal do processo com objetivos meramente 13 de março de 2023, pp. 689-690; Acórdão 6/2023, de
dilatórios, somente se aprecia as alegações que se refiram 18 de janeiro, Pedro Rogério Delgado v. TRS, Rel: JCP
claramente a causas de nulidade previstas pelo Código Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N.
de Processo Civil. De acordo com a sua aceção natural e 25, de 13 de março, pp. 690-691; Acórdão 7/2023, de 18
nos termos dos seus requisitos inerentes, interpretados de janeiro, António José Pires Ferreira v. TRB, Rel: JCP
e ajustados conforme a natureza própria do processo Pinto Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N 25,
constitucional, na medida em que aquele é desenhado, de 13 de março de 2023, pp. 691-693; Acórdão 69/2023, de
como o Tribunal já tinha entendido, para dar vazão a 5 de maio, Rui Santos Correiav. TRS, pedido de aclaração

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1498 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

do Acórdão 52/2023, Rel: JCP Pina Delgado, publicado Cópia:


no Boletim Oficial, I Série, N. 57, de 22 de maio de 2023,
pp. 1293-1294; Acórdão 70/2023, de 5 de maio, Valter Do acórdão proferido nos autos de Recurso de Amparo
Furtado v. STJ, Não conhecimento de pedido de aclaração Constitucional n.º 19/2023, em que é recorrente Amadeu
do Acórdão 19/2023 por colocação intempestiva, Rel: JCP Fortes Oliveira e entidade recorrida o Supremo
Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. Tribunal de Justiça.
57, 22 de maio de 2023, pp. 1294-1296).
Acórdão n.º 114/2023
2.2. Na sua peça, os requerentes suscitam como questão
prévia, a inconstitucionalidade do número 3 do artigo (Autos de Amparo 19/2023, Amadeu Fortes Oliveira
16 da Lei do Amparo, que fixa o prazo de vinte e quatro v. STJ, Aperfeiçoamento por obscuridade na indicação
horas, para a impugnação dos acórdãos de admissibilidade da conduta impugnada)
do Tribunal Constitucional, argumentando que o mesmo
viola o direito ao recurso. I. Relatório
2.2.1. Como ficou assentado no Acórdão 101/2023, de 15 1. O Senhor Amadeu Fortes Oliveira interpõe recurso
de junho, Autos de Recurso de Amparo 24/2022, Herdeiro de amparo constitucional aparentemente contra o Acórdão
de Marie Margueritte Lopes v. 1º JFTJCSV, Indeferimento STJ 31/2023, de 2 de março, e despacho anterior datado
Liminar de Arguição de Nulidade do Acórdão 57/2023 por de 10 de fevereiro, da lavra da JCR, que terão procedido
colocação intempestiva de incidente pós-decisório, Rel: JCP ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva,
Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 69, 22 pois os mesmos padeceriam de “várias nulidades/
de junho de 2023, pp. 1389-1390, mesmo considerando que inconstitucionalidades”. Fá-lo através de uma longa peça
os recorrentes pretendem viabilizar o incidente de nulidade de leitura muito difícil e que se tenta, no limite, resumir
invocando possível inconstitucionalidade de norma que fixa o da seguinte forma:
prazo que impede o trânsito em julgado de decisão que não admite
recurso de amparo em vinte e quatro horas, a situação específica 1.1. Inicia com um intróito em que:
não requer que o Tribunal se posicione sobre a possibilidade de
um interveniente processual arguir preventivamente a não- 1.1.1. Explicita o amparo que pretende obter e
aplicação dessa norma por incompatibilidade com preceitos 1.1.2. Requer a adoção de medidas provisórias,
da própria Constituição; nomeadamente porque diz estar em prisão preventiva
2.2.2. Pela simples razão de que, mesmo que se parta há mais de vinte meses e por poderem ser decretadas
do princípio de que não se pode utilizar as balizas de um outras medidas de coação, que identifica;
prazo que está a ser desafiado por inconstitucionalidade – o
de vinte e quatro horas, previsto pelo artigo 16, parágrafo 1.1.3. Explicita um conjunto de direitos fundamentais que
terceiro, da Lei do Amparo e do Habeas Data –, para considera terem sido violados; as entidades supostamente
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inviabilizar a suscitação da questão, na sua ausência, prejudicadas com o provimento do recurso de amparo e
seria aplicável o prazo geral de cinco dias determinado peças processuais em que terá invocado tais violações.
pelo artigo 145 do Código de Processo Civil;
1.2. Segue por um segmento de introdução e de
2.2.3. Considerando que os recorrentes protocolaram contextualização, no qual:
o seu incidente no dia 20 de junho, fizeram-no onze dias
úteis depois de terem sido notificados, portanto muito 1.2.1. Desenvolve um relato fático do processo referente
além de qualquer prazo legal aplicável; à sua condenação pelo TRB;
2.2.4. Mesmo que, porventura, fosse de se recorrer ao 1.2.2. Apresenta um enquadramento e o que designa
prazo de dez dias previsto para a interposição de recursos de nulidades, as quais remetem à composição do STJ
de fiscalização concreta da constitucionalidade, nos termos e pedidos que fez para reparar o que considera serem
do artigo 81, parágrafo primeiro, da Lei do Tribunal violações do direito de defesa;
Constitucional – e nem é! –, ainda assim a colocação do
seu recurso teria ocorrido fora do prazo; 1.2.3. Recupera os fundamentos apresentados pelo TRB
2.2.5. Não sendo aceitável suscitar-se a questão onze dias e pelo STJ para decretar/manter a medida de coação de
depois, como fizeram os recorrentes, com fulcro na espúria ideia prisão preventiva e discute-os em seguida, esmiuçando
de se tratar de um recurso ordinário com prazo de trinta dias. questões como a livre apreciação da prova pelo Tribunal, o
que entende remeter à inexistência de nexo de causalidade;
2.3. Nestes termos, perante um caso em que se requer à alteração de provas na condenação; a dito falacioso
uma nulidade inexistente e cujos fundamentos foram impedimento de o STJ funcionar regularmente; a factos
apresentados de forma ambígua, já que o recurso de que deviam ter sido dados por provados em relação ao
amparo que protocolaram não foi admitido por não seu processo; argumentos sobre cláusulas de exclusão da
esgotamento das vias de recurso ordinário, conclui-se ilicitude e da culpa; e a nulidade do acórdão condenatório
que o pedido dos requerentes não pode ser atendido por do TRB por alegada violação de incompetência territorial;
ser manifestamente intempestivo.
III. Decisão 1.2.4. Traz à baila argumento de violação da excecionalidade
e subsidiariedade da prisão preventiva, reitera a
Pelo exposto, os Juízes Conselheiros do Tribunal necessidade de se adotar medidas provisórias urgentes,
Constitucional, reunidos em plenário, decidem indeferir juntando argumentos relacionados aos efeitos que a
liminarmente o pedido de declaração de nulidade do Acórdão manutenção da privação da sua liberdade tem gerado, da
85/2023, de 31 de maio, por suscitação intempestiva do mesmo. difícil reparação desses prejuízos, do risco de inutilidade
Registe, notifique e publique. superveniente do amparo;
Praia, 3 de julho de 2023 1.3. Por fim, apresenta segmento conclusivo em que:
José Pina Delgado (Relator)
1.3.1. Reitera o que designa de “grosseiras nulidades
Aristides R. Lima e invalidades”;
João Pinto Semedo
1.3.2. Destaca questões prévias referentes a violações
Está conforme “do juiz natural”;
Secretaria Judicial do Tribunal Constitucional, aos 3
de julho de 2023. — O Secretário, João Borges. 1.3.3. Alega ter havido omissão de pronúncia;

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I Série — n o 75 «B.O.» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023 1499

1.3.4. Destaca trechos sobre “o risco de recidiva em 2.2. No seu entendimento, os direitos invocados seriam
relação ao crime de ofensa à pessoa coletiva” e o “perigo de amparáveis, o recorrente estaria provido de legitimidade,
fuga à condenação no crime de atentado contra o Estado”; o mesmo terá esgotado os meios ordinários de defesa dos
seus direitos fundamentais, e o recurso mostrar-se-ia
1.3.5. Roga ao Tribunal Constitucional que aprecie tempestivo;
um conjunto de questões, alega ter havido contradição
insanável da fundamentação e retoma a sua argumentação 2.3. Sendo assim, promove no sentido de o recurso “ser
sobre as causas de exclusão da ilicitude. admitido por estar provido de todos os pressupostos de
admissibilidade”.
1.4. Dirige um conjunto de pedidos ao Tribunal
Constitucional, nomeadamente de: 3. No dia 23 de junho foi marcada sessão de julgamento
1.4.1. Revogação do Acórdão STJ 31/2023; para o dia 30 de junho,

1.4.2. Decretação da sua soltura imediata; 3.1. Um dia anterior à realização da mesma deu
entrada peça intitulada “Informação sobre factos jurídicos
1.4.3. Revogação da medida de coação de prisão supervenientes”, através da qual o recorrente reiterou
preventiva, por, a) alegadamente não haver provas ou interesse processual na continuidade da instância;
indício no sentido de demonstrar que: o “[a]rguido agiu
como Deputado Nacional, nessa qualidade e por causa das 3.2. A sessão realizou-se no dia 30 de junho, com a
funções do Deputado; o arguido violou os seus Deveres de participação dos Venerandos Juízes-Conselheiros e do
titular de Cargo Político; as supostas violações dos seus Senhor Secretário do TC, dela decorrendo a decisão que
Deveres de Deputado foram violações graves; o Arguido se segue acompanhada dos fundamentos articulados infra.
desviou das funções de Deputado; o Arguido tenciona ou
existe o risco d[e o] Arguido voltar a cometer os mesmos II. Fundamentação
factos supostamente criminosos; não houve coação ou 1. Do ponto de vista constitucional, o recurso de amparo
impedimento contra o STJ. Ou o Tribunal Constitucional é concebido como um direito fundamental de “requerer
que continuam livre para voltar a julgar os processos do ao Tribunal (…) a tutela de (…) direitos, liberdades e
Sr. Arlindo T§eixeira, quanto mais não seja por aplicação garantias, constitucionalmente reconhecidos”, e também
das regras da CONTUMÁCIA; não existe indício ou prova como um meio “de tutela de direitos, liberdades e garantias”,
de que a intenção do recorrente fosse ‘o firme propósito consagrando-se a sua dupla-natureza subjetiva e objetiva.
de destruir o poder judicial o poder judicial e destruir
também o Estado de Direito Democrático’ sendo esta 1.1. Direito este que é delimitado materialmente, na medida
afirmação ou presunção, um absurdo total”; b) por ter em que destinado à proteção direta de apenas uma das
sido supostamente decretada em violação do Nº 3 do três categorias de direitos fundamentais previstas pela Lei
artigo 261 do CPP que proíbe a sujeição do arguido a Fundamental. Seriam os denominados direitos, liberdades
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qualquer medida de coação “quando houver fortes razões e garantias, tanto os individuais, como os de participação
para se querer que o arguido Amadeu Oliveira agiu ao política e de exercício da cidadania e, arguivelmente, os
abrigo de causas de exclusão (...)” que enumera; c) por dos trabalhadores. É verdade que se estende para recobrir
ser “grosseiramente inadequada, desproporcional e os direitos análogos a direitos liberdades e garantias ou
desnecessária”, daí podendo ele, no seu entender, ficar que portem caraterísticas específicas com dimensões
sujeito a outras medidas de coação que identifica; individuais e civis como, respetivamente, os direitos de
proteção judiciária (Acórdão 6/2017, de 21 de abril, Maria
1.4.4. Reitera o pedido de decretação de medidas de Lurdes v. STJ, sobre pedido de desistência, Rel: JC
provisórias. Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 42,
1.5. Apresenta provas; alega haver documentos 21 de julho de 2017, pp. 898-903, 5; Acórdão 9/2017, de
constitucionais de conhecimento oficioso do Tribunal 8 de junho, Martiniano Oliveira v. STJ, Rel: JCP Pinto
Constitucional e requer que, ao abrigo “do disposto no nº 1 Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 42,
do artigo 486, em conjugação com o artigo 488, ambos do 21 de julho de 2017, pp. 925-929, e); Acórdão 13/2017,
CPP e o número 8 do artigo 211 da CRCV”, se peça ao STJ de 20 de julho, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto
cópia integral dos Autos de Processo de Reclamação Crime Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 47, 8 de
N. 04/STJ/2016, e um conjunto de áudios referentes aos agosto de 2017, pp. 1024-1029, e); Acórdão 24/2017, de
depoimentos de testemunhas que indica no âmbito dos 9 de novembro, Arlindo Teixeira v. STJ, Rel: JCP Pinto
Autos de Recurso Crime N. 04/STJ/2023. Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 78, 22
de dezembro de 2017, pp. 1692-1698, e); Acórdão 12/2018,
1.6. Anexa: procuração forense; peça intitulada Reexame de 7 de junho, CIMA v. STJ, Rel: JC Aristides R. Lima,
dos Pressupostos de Prisão Preventiva; um despacho da Decisão de admissibilidade, publicado no Boletim Oficial,
lavra da JCR; uma reclamação/suprimento de nulidades I Série, N. 49, 20 de julho de 2018, b; Acórdão 16/2018,
e omissões, e o Acórdão 31/2023. de 28 de julho, Luigi Zirpoli v. TJCP, Rel: JCP Pinto
2. Cumprindo o estabelecido no artigo 12 da Lei n.º Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 49, 20
109/IV/94 de 24 de outubro, foram os autos com vista de julho de 2018, pp. 1298-1302, e); Acórdão 17/2018,
ao Ministério Público para emissão de parecer sobre a de 26 de julho, Amândio Vicente v. TRS, Rel: JCP Pinto
admissibilidade do recurso, tendo-o feito o Digníssimo Sr. Semedo, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 51, 3 de
Procurador-Geral Adjunto, o qual articulou os seguintes agosto de 2018, pp. 1328-1333, e); Acórdão 22/2018, de 11
argumentos: de outubro, Martiniano v. STJ, sobre o direito de acesso
aos tribunais, Rel: JC José Pina Delgado, publicado no
2.1. O recorrente, como tem sido hábito, aproveita Boletim Oficial, I Série, N. 76, 22 de dezembro de 2018, pp.
para trazer à colação questões outras que nada têm a 1824-1835, 2; Acórdão 3/2019, de 24 de janeiro, Ramiro
ver com o acórdão recorrido e que já tinha sido objeto Rodrigues v. TRB, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no
de pronunciamento “por parte dest[e] egrégio Tribunal Boletim Oficial, I Série, N. 28, 13 de março de 2019, pp.
em outros arestos”, mas que, em síntese, o recorrente 480-486, e); Acórdão 36/2022, de 12 de agosto, Ramiro
advoga que terão sido violados vários dos seus direitos Oliveira Rodrigues v. TRB, sobre violação do direito de
constitucionais, requerendo nas conclusões a revogação acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva por não-
da medida de prisão preventiva por haver fortes razões admissão de recurso designado pelo recorrente amparo
para crer que o arguido terá agido ao abrigo de causa de ordinário por tribunal judicial, Rel: JC Pina Delgado,
exclusão da ilicitude e por ser grosseiramente inadequada, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 2, 5 de janeiro
desproporcional e desnecessária; de 2023, p. 36-42, 2.1) e o direito à propriedade privada

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1500 I Série — n o 75 «B.O» da República de Cabo Verde — 13 de julho de 2023

(Acórdão 30/2019, de 30 de agosto, Atlantic Global Asset e garantias, que pode ser utilizado subsidiariamente
Management v. PGR, sobre violação do direito à propriedade quando os meios ordinários de tutela de direitos que
privada, da garantia de juiz, da iniciativa privada e dos correm os seus trâmites perante os tribunais judiciais ou
direitos à defesa, ao contraditório e de acesso às provas outros, a existirem, falham. Tais caraterísticas impõem
da acusação, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Boletim que a própria lei de processo constitucional que desenvolve
Oficial, I Série, N. 110, 29 de outubro de 2019, pp. 1766- os procedimentos atinentes ao recurso de amparo seja
1789); ou ainda para situações que envolvam camadas interpretada como uma lei restritiva de direito cujo figurino
de proteção essenciais que remetam a certos direitos, básico se deve manter dentro dos confins dos números 4 e
liberdades e garantias como a vida ou a integridade 5 do artigo 17 da Constituição, ainda que parte do regime
pessoal. Porém, fora desses casos, com a tendencial possa ser legitimamente fixado pelo legislador em razão da
não-inclusão dos direitos económicos, sociais e culturais remissão à lei (“nos termos da lei”), desde que não se atinja de
e dos direitos de grupos vulneráveis que não portem modo ilegítimo as caraterísticas essenciais do instituto impostas
caraterísticas de direitos, liberdades e garantias, e também pelo próprio dispositivo constitucional (“e com observância
de princípios constitucionais objetivos, como, em diversos [obrigatória, diga-se] do disposto nas alíneas seguintes (…)”.
momentos, este Tribunal já decidiu (Acórdão 11/2017,
de 22 de junho, Maria de Lurdes v. STJ, sobre violação 2. As exigências da peça de recurso de amparo são as
do direito de constituir família por não reconhecimento consagradas nos artigos 7º e 8º da Lei do Amparo e do
de união de facto, Rel: JC Pina Delgado, publicado no Habeas Data, os quais impõem, respetivamente, que:
Boletim Oficial, I Série, N. 42, 21 de julho, pp. 933-950 e 2.1. A petição seja:
na Coletânea de Decisões do Tribunal Constitucional de
Cabo Verde, Vol. III, Praia, INCV, 2018 (2017), pp. 423- 2.1.1. Interposta através de simples requerimento,
477, 20.1; Acórdão 29/2017, de 5 de dezembro, Ovídio com indicação expressa de que o recurso tem a natureza
de Pina v. STJ, Rel: JC Aristides R. Lima, publicado no de amparo;
Boletim Oficial, I Série, N. 6, 1 de fevereiro de 2018, pp.
75-93, 20.1; Acórdão 06/2018, de 22 de março, Adilson 2.1.2. Devidamente fundamentada; e
Danielson v. STJ, Rel: JC Pina Delgado, Boletim Oficial,
I Série, N. 21, de 11 de abril de 2018, pp. 495-505, 2; 2.1.3. Entregue na Secretaria do Tribunal Constitucional.
Acórdão 27/2018, de 20 de dezembro, Judy Ike Hills v. 2.2. Quanto ao que a lei designa de “fundamentação
STJ, sobre violação de garantia de inviolabilidade de do recurso”, exige-se que o recorrente, através da peça,
domicílio, de correspondência e de telecomunicações e
de garantia da presunção da inocência na sua dimensão 2.2.1. Identifique a entidade, o funcionário ou o agente
de in dubio pro reo, Rel: JC Pina Delgado, publicado no autor do ato ou da omissão, bem como os interessados a
Boletim Oficial, I Série, N. 11, 31 de janeiro de 2019, pp. que o provimento do recurso possa diretamente beneficiar
146-178, 2.1.1). Por conseguinte, trata-se de um recurso ou prejudicar, havendo-os;
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especialmente desenhado para proteger uma categoria


especial de direitos que goza de regime de tutela mais 2.2.2. Indique com precisão “o ato, facto ou a omissão”
intenso: os direitos, liberdades e garantias. que, na sua opinião, violou os seus direitos amparáveis;
1.2. E que fica processualmente condicionado ao 2.2.3. Indique com clareza quais deles terão sido
esgotamento das vias ordinárias de recurso, opção da vulnerados, “com a expressa menção das normas ou
qual resulta um figurino constitucional que produz princípios jurídico-constitucionais que entende terem
diversos efeitos. sido violados”;
1.2.1. Desde logo, a conceção de que todos os tribunais 2.2.4. Exponha resumidamente as razões de facto que
cabo-verdianos são tribunais de proteção de direitos, nos fundamentam o pedido, bem como “formul[e] conclusões,
termos da sua respetiva jurisdição, cabendo efetivar essa nas quais resumirá, por artigos, os fundamentos de facto
tutela através dos processos ordinários desenhados pela lei, e de direito que justificam a petição”;
dos processos especiais previstos pela Constituição como
o Habeas Corpus ou o recurso contencioso administrativo, 2.2.5. Esta deverá “terminar com o pedido de amparo
ou daqueles que venham a ser definidos pelo legislador, constitucional no qual se indicará o amparo que o recorrente
nos termos do artigo 22, parágrafo sexto, segundo o qual entende dever ser-lhe concedido para preservar ou
“[p]ara a defesa dos direitos, liberdades e garantias restabelecer os direitos, liberdades ou garantias violados”,
individuais, a lei estabelece procedimentos judiciais devendo vir acompanhada dos “documentos que julgar
céleres e prioritários que assegurem a tutela efetiva e pertinentes e necessários para a procedência do pedido”.
em tempo útil contra ameaças ou violações desses mesmos 2.3. O objeto dessas disposições é determinar o modo de
direitos, liberdades e garantias” (Acórdão nº 36/2022, de 12 interposição e definir a estrutura da peça processual, de
de agosto, Ramiro Oliveira Rodrigues v. TRB, sobre violação tal sorte que, de forma célere e simplificada, se permita
do direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efetiva por ao Tribunal Constitucional identificar os elementos
não-admissão de recurso designado pelo recorrente de amparo constitutivos da súplica para que possa decidir sobre a
ordinário por tribunal judicial, Rel: JC Pina Delgado, 5.1.3). sua admissibilidade, sobre eventuais medidas provisórias
1.2.2. E, em consequência, a subsidiariedade do recurso aplicáveis e, subsequentemente, sobre o seu mérito.
de amparo, recurso constitucional de natureza especial,
ao qual só se pode lançar mão, depois de se explorar os 2.3.1. De um lado, através da facilitação do acesso a
mecanismos que correm perante os tribunais ordinários esses elementos que decorreriam do modo de organização
para que estes possam conhecer e garantir a tutela desses da peça e da entrega direta no Tribunal Constitucional;
mesmos direitos. 2.3.2. Do outro, pelo facto de se impor um determinado
1.3. E caraterizado pelo seu informalismo, urgência conteúdo à mesma, na medida em que, do ponto de vista
e sumariedade, conforme decorre da alínea b) do artigo do número 1 do artigo 8º, primeiro, remete-se, através das
20, segundo a qual ele “pode ser requerido em simples alíneas a) e b); para a identificação das condutas lesivas
petição, tem caráter urgente e o seu processamento deve (“ato, facto ou a omissão”) e para o órgão do poder público
ser baseado no princípio da sumariedade”. ao qual podem ser imputadas (“a entidade, o funcionário
ou o agente autor do ato ou da omissão”); segundo, por
1.4. Por conseguinte, está-se perante um direito meio da alínea c), aos direitos, liberdades e garantias
fundamental e um recurso constitucional desenhado vulnerados por aquelas (“indicar com clareza os direitos,
especialmente para a proteção de direitos, liberdades liberdades e garantias fundamentais”) e às disposições

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onde estariam alojados ou os princípios de onde podem 2.3.6. Por motivos óbvios, que têm sido reiterados
ser inferidos (“com a expressa menção das normas ou sistematicamente (Acórdão 30/2023, de 20 de março,
princípios-constitucionais que entendem terem sido Amadeu Oliveira v. STJ, Aperfeiçoamento por Obscuridade
violados”); terceiro, nos termos do número 2 da mesma Quanto ao Amparo Pretendido e por Falta de Junção de
disposição, à explicitação do amparo que se pretende para Documentos Essenciais à Aferição de Admissibilidade
se remediar a eventual lesão (“a petição terminará com do Amparo, Rel: JCP Pina Delgado, publicado Boletim
o pedido de amparo constitucional no qual se indicará o Oficial, I Série, N. 37, 11 de abril de 2023, pp. 931-933,
amparo que o recorrente entende dever ser-lhe concedido 2.3.6. Acórdão 42/2023, de 3 de abril, Aperfeiçoamento por
para preservar ou restabelecer os direitos, liberdades e Ausência de Discriminação de Condutas que Atingiram
garantias fundamentais violados”). A argamassa que cada Recorrente; por Não-Precisão dos Amparos que cada
ligaria esses três elementos decorreria dos fundamentos um Almeja Obter e por Falta de Junção de Documentos
de facto e de direito que justificam a petição, como também Essenciais à Aferição de Admissibilidade do Amparo, Rel:
se impõe apresentar, conforme o disposto nas alíneas d) JCP Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série,
e e) do parágrafo primeiro da primeira disposição. N. 44, 21 de abril de 2023, pp. 1034-1037, 2.3.6. Acórdão
53/2023, de 11 de abril, Aperfeiçoamento por Falta de Junção
2.3.3. A regra é que, do ponto de vista da articulação de Documentos Essenciais à Aferição de Admissibilidade
da petição de amparo, deve haver o estabelecimento de do Amparo; por Obscuridade na Definição das Condutas
uma ligação lógica entre cada conduta impugnada, as Impugnadas; por Falta de Indicação dos Amparos Concretos
posições jurídicas decorrentes do(s) direito(s) que ela que Almeja Obter, Rel. JCP Pina Delgado, publicado
vulnera e o amparo adequado para a remediar através da no Boletim Oficial, I Série, N. 45, 24 de abril de 2023,
fundamentação. O que se tem verificado até agora é que pp. 1100-1103, 2.3.6. Acórdão 54/2023, de 11 de abril,
na maior parte dos casos, isso é muito deficientemente Manuel Monteiro Moreira v. TRS, Aperfeiçoamento por
articulado, lançando-se para a peça de recurso, sem grande Falta de Junção de Documentos Essenciais à Aferição de
precisão e racionalização, uma pluralidade de condutas Admissibilidade do Amparo; por Obscuridade na Definição
a que globalmente se imputam violações de um conjunto das Condutas Impugnadas; por Falta de Indicação dos
diversificado de direitos, e remetendo-se para amparos Amparos Concretos que Almeja Obter, Rel: JCP Pina
genéricos ou impossíveis. O Tribunal Constitucional desde Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 45, 24
o Acórdão nº 10/2017, de 8 de junho, Adilson Danielson de abril de 2023, pp. 1103-1106, 2.3.7. Acórdão 59/2023,
v. STJ, Rel: JCP Pinto Semedo, publicado no Boletim de 26 de abril, Dénis de Jesus Delgado Furtado v. STJ,
Oficial, I Série, N. 42, 21 de julho de 2017, pp. 929-933, Aperfeiçoamento por obscuridade na identificação das
b), tem tolerado a interposição de vários amparos que não condutas impugnadas; por deficiência na identificação
cumprem essas exigências qualitativas, considerando que das entidades alegadamente responsáveis pela prática
a disposição deve ser lida sempre de forma compatível ao dos factos; por não explicitação do modo como a suposta
direito constitucional ao amparo, no sentido de que “mais violação de direitos de terceiros repercute sobre os direitos
importante que o rigor formal é a inteligibilidade do que
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do recorrente e por falta de junção de documentos essenciais


se expõe e se requer”. Mas, a duras penas, considerando à aferição de admissibilidade do amparo, Rel: JCP Pina
a grande dificuldade que se tem para se compreender Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 57, 22
o que se impugna, o que se pede e os fundamentos que de maio de 2023, pp. 1251-1253, 2.3.6. Acórdão 61/2023,
suportam as petições. A Corte Constitucional continuará – de 26 de abril, Dénis de Jesus Delgado Furtado v. STJ,
transitoriamente – aberta a privilegiar as admissibilidades, Aperfeiçoamento por obscuridade na identificação das
suprindo ela própria eventuais deficiências das peças, mas, condutas impugnadas e por falta de junção de documentos
depois de vários anos de prática do amparo em Cabo Verde, essenciais à aferição de admissibilidade do amparo, Rel:
é preciso entrar numa nova fase mais exigente, sustentada JCP Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série,
numa melhor qualificação. N. 57, 22 de maio de 2023, pp. 1260-1263, 2.3.5. Acórdão
2.3.4. Na situação vertente, pode-se dizer que, no geral, 77/2023, de 12 de maio, Hélio dos Santos Abreu v. STJ,
o recorrente, além de ter apresentado a sua peça na Aperfeiçoamento por Falta de Junção de Documentos
secretaria deste Tribunal, indicando expressamente que Essenciais à Aferição de Admissibilidade do Amparo; por
se trata de um recurso de amparo, incluiu uma exposição Obscuridade na Definição das Condutas Impugnada, Rel:
das razões de facto que a fundamentam e integrou um JCP Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série,
segmento conclusivo resumindo por artigos os fundamentos N. 59, 25 de maio de 2023, pp. 1330-1333, 2.3.5. Acórdão
de facto e de direito que suportam os seus pedidos. 79/2023, de 12 de maio, António Furtado Tavares v.
STJ, Aperfeiçoamento por Não-Junção de Documentos
2.3.5. Agora, com a exceção desses aspetos, o recurso Essenciais à Aferição de Admissibilidade do Recurso,
está muito longe de preencher as exigências do artigo Rel: JCP Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I
8º da Lei do Amparo do Habeas Data. Normalmente, Série, N.59, 25 de maio de 2023, pp. 1337-1340, 2.3.5.
costuma-se dizer que o que abunda não prejudica. Neste Acórdão 98/2023, de 14 de junho, Braime Hilique Semedo
caso, contudo, a extensão da peça, as suas inúmeras Tavares v. STJ, Aperfeiçoamento por Deficiente Indicação
partes, as subpartes e os apartes, impediram o Tribunal da(s) Conduta(s) Impugnada(s); falta de especificação do
de identificar de forma clara e inequívoca a(s) conduta(s) amparo pretendido e Omissão de Junção de Documentos
que o recorrente pretende impugnar e o órgão ao qual as Essenciais à Instrução do Pedido, Rel: JCP Pina Delgado,
atribui. Aqui chegados, não se pode olvidar que existem publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 69, 22 de junho
razões objetivas para a Constituição e a LAHD, imporem de 2023, 1369-1372, 2.3.8. Acórdão 99/2023, de 14 de
que o recurso de amparo seja impetrado através de simples junho, Pedro dos Santos da Veiga e outros v. Tribunal
petição/requerimento. A finalidade é garantir que a sua da Relação de Sotavento, Aperfeiçoamento por Falta de
apreciação será célere e, sobretudo, para preservar a sua Indicação de Conduta em Segmento Decisório do Acórdão
inteligibilidade, nomeadamente para que, no espírito de Impugnado; Ausência de Autonomização das Peças de
quem aprecie a peça não fique qualquer dúvida sobre o Amparo; Deficiências na Formulação dos Amparos e
objeto da mesma. Naturalmente, o Tribunal consegue Omissão de Junção de Documentos Relevantes, Rel: JCP
intuir que as eventuais condutas integram o acórdão Pina Delgado, publicado no Boletim Oficial, I Série, N. 69,
recorrido. Contudo, a partir disso é literalmente impossível 22 de junho de 2023, 1372-1377, 2.3.6), se se justificar, na
precisar o que está especificamente a impugnar. Sendo sua perspetiva, que o Tribunal Constitucional considere, no
assim, decisivo será que, sem a necessidade de recuperar quadro do juízo que constitucional e legalmente pode fazer
toda a argumentação já expendida, clarifique as condutas neste tipo de processo, outros elementos de ponderação,
constantes da sua peça que submete a escrutínio desta além dos que justificadamente já juntou, deverá carreá-
Corte Constitucional. los para os autos. A Lei do Amparo e do Habeas Data é

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autossuficiente nesta matéria, cabendo, à luz do artigo 8, III. Decisão


número 3, ao recorrente de amparo constitucional obter e
juntar os documentos que julgar pertinentes e necessários Pelo exposto, nos termos do artigo 17 da Lei do Amparo
para a procedência do pedido, além dos que, ao abrigo e do Habeas Data, os Juízes-Conselheiros do Tribunal
do artigo 17, parágrafo segundo, do mesmo diploma Constitucional decidem determinar a notificação do
especial de processo constitucional, o Tribunal determine recorrente para identificar com a máxima precisão possível
a junção, o que não é o caso. Partindo do princípio de qual é (são) a(s) conduta(s), facto(s) ou omissão(ões) que
que se referia ao artigo 486, parágrafo primeiro, e 488, está a imputar ao ato judicial recorrido e que pretende
do CPC, e não do CPP, estas disposições, além de não que o Tribunal escrutine.
poderem ser aplicadas pelo facto de não haver qualquer Registe, notifique e publique.
omissão regulatória da lei de processo constitucional
especial aplicável que autorize o Tribunal Constitucional Praia, 3 de julho de 2023
a elas recorrer, sendo normas moldadas para processos
de partes, não se aplicam a uma circunstância em que a José Pina Delgado (Relator)
entidade que estará na posse dos documentos não é uma
parte, nem tampouco um terceiro, mas um órgão de um Aristides R. Lima
poder público que processualmente figura como entidade João Pinto Semedo
requerida. Neste caso, um tribunal, cujos documentos
e certidões podem ser acedidos e obtidos nos termos da Está conforme
lei. Por conseguinte, desde já, não se pode satisfazer os
dois pedidos de obtenção de elementos constantes do Secretaria Judicial do Tribunal Constitucional, aos 3
requerimento de recurso. de julho de 2023. — O Secretário, João Borges.
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II ISS
ÉÉRR
IEIE

BO
B OL
LEET
T II M
M
OFICIAL
OFICIAL suportes digitais suportes impressos

Registolegal,
Registo legal,nºnº2/2001,
2/2001,de
de21
21de
deDezembro
Dezembrode
de2001
2001 25 px 6 mm

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sujeitos publicação nana
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II Série Oficial devem
do Boletim Oficial devem
obedecer obedecer
as normas as normas constantes
constantes no artigo28º
no artigo 28ºee29º
29º do
do Decreto-lei
Decreto-lei nº 8/2011, de 31 de
nº 8/2011, deJaneiro.
31 de Janeiro.

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