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M4D #337

EDIÇÃO DE 24/10/2023

RESUMO
Economistas ao redor do mundo repetem
2007 e apostam em um pouso suave da
economia dos EUA, mesmo diante de um
quadro insustentável do endividamento público.
A China não tem cacife para repetir o pacote
robusto anunciado em outubro de 2008 para
conter os estragos da Grande Recessão. Cam-
pos Neto alerta que o setor público terá que
trabalhar o déficit público no enfrentamento do
enxugamento da liquidez nos mercados finan-
ceiros internacionais.
C O N D I Ç Ã O
D E M E R C A D O

RISCO CONSIDERÁVEL

RISCO CONSIDERÁVEL

Risco Baixo: As condições de que o investidor dê mais atenção à


mercado são muito favoráveis, gestão do risco através da redução
como quando a valoração não é da exposição, encurtamento de stops,
muito elevada, o price action e montagem de hedges ou outras
fundamentos são positivos e o técnicas defensivas.
sentimento não é de euforia. Este
ambiente permite que o investidor Risco Considerável: Quando a
esteja exposto em bolsa no limite assimetria de risco para estar
máximo de sua propensão ao risco. exposto em bolsa é desfavorável, e
a probabilidade de retorno é neutra
Risco Aceitável: As condições de ou negativa. Este ambiente requer
mercado permitem uma exposição que o investidor tenha uma postura
de assimetria favorável, normalmente defensiva, sendo bastante criterioso
com fundamentos e price action na escolha dos ativos, diminuindo ou
razoavelmente positivos. A nota da zerando sua exposição em bolsa ou
valoração e do sentimento podem utilizando outras técnicas defensivas.
variar. Este ambiente permite que o
investidor esteja exposto em bolsa Risco Elevado: Quando as condições
com posições relevantes, conforme de mercado são muito desfavoráveis
sua própria propensão ao risco. e o ambiente é muito arriscado,
normalmente quando os fundamentos
Risco Neutro: Quando há dimensões e o price action são negativos, podendo
e indicadores apontando para estar aliados a uma valoração elevada
direções diferentes, havendo pontos e sentimento de euforia. Este ambiente
positivos e negativos que se colidem. requer extrema cautela, sendo
O mercado pode ser seletivo, desaconselhável qualquer exposição
com poucas ações ou setores se em bolsa.
destacando. Este ambiente requer
I N S I G H T S
Sondagem da Bloomberg revela que os economistas ao redor do
planeta apostam em um pouso suave da economia dos EUA.

É prudente ter cautela com investidores de grande porte ao


comunicarem ao público as suas posições, uma vez que a história
frequentemente revela que o discurso deve ter interpretação ao
contrário.

Na quinta-feira, será divulgada a primeira prévia do PIB do terceiro


trimestre, o que pode desencadear volatilidade no mercado de
Treasuries.

O modelo econômico da China se esgotou e a chance é de


crescimento baixo com riscos de recessões periódicas como nos
países desenvolvidos.

O setor de commodities metálicas não escapará de uma economia


chinesa fraca.

Campos Neto fala o que economistas de Wall Street não se atrevem:


“Problemas estruturais na economia dos EUA podem ser responsáveis
pela alta do juro no mercado secundário”.

A expectativa de lucro operacional da carteira do S&P 500 nos


próximos 12 meses subiu na semana passada.

Mercados de ações dos EUA e do Brasil se aproximam da região de


sobrevenda, mas o potencial de uma reação dependerá de sinais do
mercado de ações nos EUA.

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I N S I G H T S
A seletividade no Nasdaq Composite impressiona mal com recorde
do número de ações com novas mínimas em 52 semanas nesta
segunda-feira, apesar da leve alta do índice no dia.

A reação dos mercados de ações no curto prazo poderá ser


temporária pela sinalização do DJIA.

Não há sentimento de pessimismo nos EUA no horizonte de médio


prazo, a julgar pelo VXSF, como também pelo indicador da AAII.

Herança do Tesouro dos EUA e do Fed: a situação peculiar e explosiva


de alto endividamento com juro real positivo.

A mídia divulga que os vigilantes apostam contra o Fed, mas não


poderia ser uma aposta em uma recessão?

Existe uma possibilidade real de 2023 ecoar os eventos de 2007,


quando a narrativa predominante apontava para um cenário de
pouso suave.

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I – FUNDAMENTOS ECONÔMICOS
ECONOMIA NORTE-AMERICANA

SONDAGEM DA BLOOMBERG REVELA QUE ECONOMISTAS APOSTAM


EM POUSO SUAVE

A taxa do Treasury de 10 anos, a referência para os preços dos ativos


em todo o mundo, subiu na manhã de segunda-feira para um pico de
5,02%, seu nível mais alto desde julho de 2007. Posteriormente, o ren-
dimento acelerou a queda depois que um grande investidor escreveu
na plataforma X que estava encerrando sua posição vendida em títulos
do Tesouro de longo prazo, alegando que a economia é mais fraca do
que os dados sugerem. Suas intenções reais são incertas. O rendimen-
to encerrou a sessão desta segunda-feira em 4,84%. No final de março
de 2020, esse mesmo investidor afirmou à CNBC que o inferno estava
chegando, quando ele já havia chegado. Foi o ponto mais baixo do mer-
cado no final de março, quando o seu alarme soou. Por ser midiático,
esse investidor pode ter conseguido seu intento, seja qual for, pelo me-
nos por um dia, mas nenhum investidor consegue manipular o mercado
por muito tempo. A experiência demonstra que investidores que estão
sob os holofotes da mídia financeira e operam volumes substanciais,
com exceções, obviamente, tendem a comunicar algo oposto ao que
realmente estão fazendo.

No entanto, o price action, especialmente do Dow Jones Industrial Ave-


rage, não contradiz a hipótese do grande investidor. No entanto, é im-
portante observar que o S&P 500 ainda não a confirmou. Essa con-
firmação poderia ocorrer se o índice caísse abaixo de sua importante
média móvel de 200 semanas, o que seria um sinal que contestaria a
tese do pouso suave. Por outro lado, o Federal Reserve foi infeliz ao
deixar claro que seu trabalho de conter a inflação será concluído por
meio do aumento das taxas de juros dos Treasuries no mercado secun-
dário. O termo “infeliz” é apropriado porque o mercado nunca realiza
um ajuste de maneira ordenada, mas sempre desordenada acompa-

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nhada inevitavelmente de overshooting (exageros), como tem ocorrido.

Uma sondagem realizada pela Bloomberg, divulgada na última sexta-


-feira, revela que a maioria dos economistas está apostando em um
pouso suave em 2024, ou seja, sem recessão neste ano. Os analis-
tas de ações, que mantêm contato direto com as empresas, também
compartilham a mesma visão. Em artigo na Bloomberg, os economistas
julgam que um mercado de trabalho ainda robusto continua a suportar
as despesas das famílias, apesar do peso dos elevados custos dos em-
préstimos e da inflação. As projeções de emprego para o próximo ano
foram revistas em alta, ajudando a explicar porque é que os economis-
tas consideram agora probabilidades iguais de uma recessão no próxi-
mo ano. No 3º trimestre o crescimento esperado é de 3,5%, seguido de
0,7%, 0,4%, 0,6%, 1,3% e, no último trimestre de 2024, 1,7%. Embora não
conste do artigo na Bloomberg, o economista Mohamed El-Erian es-
creveu na plataforma X que “A Bloomberg entrevistou economistas de
todo o mundo para reunir opiniões sobre três debates. O seu veredicto:
os bancos centrais não quebrarão as suas economias com pressa para
atingir as metas de inflação, o QE será usado com mais moderação no
futuro e a política fiscal corre o risco de contrariar o trabalho das auto-
ridades monetárias”.

Apesar da ressalva na pesquisa de que a política fiscal corre o risco de


complicar o trabalho dos bancos centrais, a trajetória do endividamen-
to dos EUA é insustentável. Existe a possibilidade de a agência Moody’s
equiparar a classificação de risco do país à da Standard & Poor’s e,
mais recentemente, à da Fitch. Curiosamente, economistas renoma-
dos não falam abertamente sobre esse tema, deixando a discussão
a cargo de analistas com menor visibilidade. Com emissões de novos
Treasuries pelo Tesouro no pipeline para cobrir as despesas públicas,
a incerteza dos players reside na dúvida sobre se haverá demanda a
preços correntes. Normalmente, os Treasuries serviriam como porto
seguro diante do risco de escalada no Oriente Médio. No entanto, como
observou Mohit Kumar, economista-chefe para a Europa da Jefferies:
“A economia dos EUA está indo bem, e com grandes emissões pelo
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Tesouro no horizonte, todos estão preocupados com quem irá adquirir


esses títulos”.

O Calendário Econômico da Bloomberg relatou que a mediana das ex-


pectativas dos economistas sondados para o crescimento da econo-
mia norte-americana no terceiro trimestre é de 4,2%, em taxa anuali-
zada em relação ao segundo trimestre. Uma possível explicação para
a discrepância entre as expectativas de crescimento da sondagem e o
que consta no Calendário Econômico da Bloomberg é que a sondagem
abrange um leque mais amplo de economistas, incluindo analistas de
outros países, enquanto o consenso se refere apenas aos analistas de
Wall Street. De qualquer maneira, os economistas ao redor do mundo
que esperam um crescimento no trimestre passado de 3,5% poderão
ser surpreendidos.

O modelo do Fed de Atlanta (GDPNow), que tem tido um histórico ra-


zoável nesta década, estima um crescimento de 5,4%. No entanto, é
importante observar que esse modelo ajusta a sua estimativa a cada
dado divulgado, e no passado, houve flutuações significativas. Diferen-
temente de alguns trimestres anteriores, no segundo trimestre, as os-
cilações nas estimativas do modelo GDPNow foram normais. A última
previsão antes da divulgação da primeira prévia do crescimento no se-
gundo trimestre foi de 2,4%, em comparação com 2,1% na terceira e
última revisão do PIB (estatística oficial), um desvio menor do que o
consenso naquela época.

Tem sido notável o fato de o modelo ter mantido uma taxa acima do
consenso durante todo o mês de outubro, com a menor estimativa
em 4,9% e a maior em 5,4%, em vigor desde 17 de outubro. A próxima
e última projeção do modelo será feita um dia antes da divulgação da
primeira prévia (quinta-feira).

Uma discrepância significativa entre o consenso no Boletim Econômico


e a primeira prévia, inclinando-se para o modelo do Fed de Atlanta que
prevê uma economia muito forte, poderá fortalecer as posições ven-

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didas (short) em bonds e adiar uma eventual correção nas taxas dos
Treasuries a longo prazo. Essa surpresa seria ainda mais impactante
para economistas em todo o mundo.

PERSPECTIVAS DE CRESCIMENTO MAIS MODESTAS PARA A CHINA

O modelo mercantilista chinês, caracterizado por superávits comer-


ciais, subsídios às empresas exportadoras e acumulação de reservas,
está à beira do esgotamento ou já se esgotou. Os formuladores de po-
lítica econômica da China aceitam em grande parte que a China deve
reequilibrar a sua economia para que o crescimento seja impulsionado
mais pelo consumo interno e menos pelo investimento. Mas assim que
a China começar a levar a sério a necessidade de reequilibrar a sua
economia, é pouco provável, na opinião de Michael Pettis – professor
de finanças na Universidade de Pequim -, que o crescimento anual do
PIB da China exceda 2 a 3% ao ano, em média, a menos que haja um
aumento substancial na taxa de crescimento do consumo. Pettis man-
tém essa previsão há algum tempo, e os sinais atuais parecem confir-
mar suas estimativas sobre o desempenho econômico da China. Tanto
é assim que, em setembro, Mohamed El-Erian questionou se a China
realmente pode se tornar a maior economia do mundo, embora Pet-
tis sempre tenha oferecido uma análise mais abrangente sobre esse
tema.

A China tem a maior relação entre investimento e PIB do mundo. Tam-


bém tem um dos encargos de dívida que mais cresce na história. Estes
não são independentes. Com montantes crescentes de investimento
direcionados para projetos cujos benefícios econômicos são inferiores
aos seus custos, o aumento do peso da dívida da China é uma conse-
quência direta desta porcentagem de investimento muito elevada.

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Figura – PIB, Total Social Financing (TSF) e relação Dívida Pública e PIB – Fonte:
People´s Bank of China/ National Bureau of Statistics/ Michael Pettis (projeção
2023).

Para maior clareza, na figura acima, o TSF abrange tanto o financia-


mento indireto por meio do sistema bancário quanto o financiamento
direto por meio de ações e títulos de renda fixa no mercado de capi-
tais, deixando de fora as entradas de fluxo estrangeiro.

O investimento não produtivo, ou seja, aquele que não resulta em ren-


da superior ao gasto, levou a um rápido aumento da dívida em relação
ao PIB na China. Embora tenha impulsionado o crescimento econômico
passado e presente a patamares superiores aos de muitos outros pa-
íses, o crescente endividamento torna insustentável essa trajetória.

Em teoria, a China poderia resolver o problema da dívida associado a


níveis elevados de investimento através da implementação de políticas
que resultem em um aumento acentuado da produtividade do investi-
mento. Há anos que isso é proposto, por exemplo, através da reorien-
tação do investimento para o setor tecnológico, mas até agora não ob-
teve sucesso, e é improvável que o alcance algum dia, segundo Pettis.

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Dado que os desequilíbrios da China são profundos, o número limitado


de alternativas, através das quais podem ser resolvidos o problema do
endividamento, exige uma redução significativa da dependência da Chi-
na do investimento para estimular o crescimento sustentado.

O crescimento da economia na maioria dos países desenvolvidos é im-


pulsionado principalmente pelo consumo e pelo investimento (com as
exportações líquidas geralmente com pouca importância). A China é
diferente. O investimento aumentou de 24% do PIB em 1990 para 40%
em 2002 - a China ingressou na OMC em 2001 - e para 47% em 2010,
em grande parte direcionado ao mercado imobiliário. Depois diminuiu
para 43% em 2019 e manteve-se entre 43% e 44% durante o período
da pandemia. No reequilíbrio, a China deverá provavelmente aproximar
os níveis de investimento de 20% do PIB, típicos das economias alta-
mente intensivas em capital. Para o Banco Mundial, para alcançar um
crescimento sustentado, a China precisa seguir o caminho desafiador
de reequilibrar a sua economia em três dimensões: primeiro, a reorien-
tação da demanda externa para a demanda interna e do investimento
e do crescimento liderado pela indústria para uma maior dependência
do consumo e dos serviços domésticos.

Embora quase todos os formuladores concordem com a necessidade


de um papel mais importante do consumo, existem restrições políticas
significativas ao reequilíbrio, que sempre tornaram muito difícil para os
países que seguiram um modelo de desenvolvimento orientado para o
investimento semelhante ao da China. Isto porque depois de décadas
durante as quais o investimento cresceu mais rapidamente do que o
PIB e este cresceu mais rapidamente do que o consumo, a relação en-
tre os dois (investimento e consumo) deve ser invertida. Conforme a
tese de Pettis, durante pelo menos as próximas duas décadas, o con-
sumo poderá crescer mais rapidamente do que o PIB, e o PIB, por sua
vez, cresça mais rapidamente do que o investimento. Essa é a alterna-
tiva mais viável para a China alcançar o reequilíbrio.

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Apesar de os formuladores estarem debatendo o aumento da partici-


pação do consumo no PIB, até o momento, há uma escassa discussão,
pelo menos em público, sobre as principais restrições a tais políticas.
Aumentar a parcela do rendimento familiar no PIB, por definição, im-
plica em reduzir a parcela de rendimento das empresas e do governo.
Isso resulta em ganhadores e perdedores, incluindo os governos locais
(províncias), e o desafio reside na aceitação desse impacto. O peso do
rebalanceamento será suportado pelos setores da economia que se
beneficiaram desproporcionalmente do crescimento chinês nas últimas
três décadas.

Embora um crescimento muito mais lento do PIB seja provavelmente


inevitável para a China, o mesmo não é necessariamente verdade para
o crescimento do consumo das famílias chinesas. O reequilíbrio da Chi-
na exigiria que o crescimento do investimento diminuísse muito mais do
que o crescimento do PIB, o que significa que tanto o crescimento do
consumo como o crescimento do rendimento das famílias diminuiriam
muito menos. O que pode parecer um ajuste brutal para a economia
da China não precisa ser um ajuste brutal para o povo chinês.

A forma como ocorre o reequilíbrio tem implicações para a economia


global. À medida que o crescimento do PIB da China diminui, a maior
parte desse declínio será impulsionado por uma diminuição ainda mais
rápida – ou mesmo uma contração – no crescimento do investimento.
Os setores das economias chinesa e global que dependem fortemente
do crescimento do investimento chinês, incluindo metais e matérias-pri-
mas industriais, suportarão o peso de um ajuste chinês – neste caso
a Vale poderia ser incluída. Os setores das economias chinesa e global
que dependem fortemente do consumo chinês, incluindo os produtos
agrícolas, serão muito menos afetados.

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Vale a pena recordar que a maioria dos precedentes históricos de na-


ções que buscam o reequilíbrio experimentou uma expressiva redução
na taxa de crescimento do rendimento das famílias, e, consequente-
mente, no consumo. Este é o risco para a China, ou seja, seguir o pa-
drão histórico de outros países.

Mas a única alternativa da China ao reequilíbrio é manter a parcela


extraordinariamente elevada do investimento em relação ao PIB, como
atualmente, muitos deles sem o retorno para servir a dívida, e o resul-
tado seria o aumento muito rápido e insustentável do peso da dívida
do país. Então, é impossível manter indefinidamente uma parcela de
investimento tão elevada. A China precisa reequilibrar sua economia
para controlar a dívida. Sem um crescimento do consumo muito mais
rápido, impulsionado por transferências de renda substanciais e politi-
camente controversas, a matemática é incontestável: a única maneira
de reequilibrar envolve um crescimento do PIB muito mais lento.

Em termos concretos, Pettis sugere, em primeiro lugar, que as refor-


mas fiscais deveriam ter como objetivo a criação de um sistema fiscal
mais progressivo, enquanto simultaneamente fortalecem as redes de
segurança social, bem como os gastos em saúde e educação da po-
pulação. Isso ajudaria a reduzir as economias preventivas das famílias,
apoiando, assim, o reequilíbrio em direção ao consumo interno, ao mes-
mo tempo que reduziria a desigualdade de renda entre as famílias.

Em segundo lugar, após o reforço das medidas antimonopólio voltadas


para as plataformas digitais e a imposição de várias restrições aos
serviços de consumo online, as autoridades poderiam considerar dire-
cionar sua atenção para as barreiras remanescentes à concorrência
no mercado de forma mais ampla, a fim de estimular a inovação e o
crescimento da produtividade.

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Uma abertura mais ampla do setor de serviços protegidos, por exem-


plo, poderia melhorar o acesso a serviços de alta qualidade e apoiar o
reequilíbrio em direção a empregos de maior valor no setor de serviços,
que é um foco especial do relatório do Banco Mundial.

Em terceiro lugar, um sistema bancário mais robusto contribuiria para


mitigar os riscos morais (moral hazard), reduzindo assim os compro-
missos entre a flexibilização da política monetária e a gestão do risco
financeiro. A resolução das distorções no acesso ao crédito - refletidas
em diferenciais persistentes entre mutuários privados e estatais - po-
deria apoiar a transição para um crescimento mais impulsionado pela
inovação e liderado pelo setor privado.

Por fim, a China deve acelerar a mudança de sua matriz energética


para fontes menos poluentes. O crescimento da produtividade na Chi-
na nas últimas quatro décadas de reforma e abertura foi liderado pelo
setor privado. A margem para futuros ganhos de produtividade deve
ser alcançada através da difusão de tecnologias e práticas modernas
entre as pequenas empresas privadas, o que exigirá condições de con-
corrência equitativas com as empresas estatais.

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Figura – Exportações nominais do Brasil em US $ bi (escala à esquerda) e


exportações e importações nominais da China em US $ bi (direita) – Fonte:
Funcex/ Fedgraph.

A adesão da China à OMC em dezembro de 2001, com o apoio dos EUA,


permitiu ao país ter acesso a novos parceiros comerciais e a tarifas
mais favoráveis do que antes da adesão. Desde então, as exportações
chinesas aumentaram significativamente, o que também impulsionou
as importações. O Brasil se beneficiou do crescimento econômico chi-
nês, mas agora a China se encontra em uma encruzilhada.

Para este editor, é improvável que a China siga as recomendações de


Pettis de forma estrita. Portanto, o cenário mais provável envolve uma
desaceleração do crescimento chinês, agravada pelo aumento contí-
nuo da dívida, e, na pior das hipóteses, recessões periódicas, algo fre-
quente nos Estados Unidos, que tem experimentado uma recessão a
cada década.

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CAMPOS NETO FALA EM PROBLEMAS ESTRUTURAIS NA ECONOMIA DOS


EUA

Em um evento realizado na sede do Estadão, com o apoio do Broad-


cast, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, abordou
o aperto da liquidez global devido aos juros mais altos nos EUA, desta-
cando que isso pode afetar as economias emergentes de forma mais
severa. Campos Neto fez um apelo ao Congresso para que aprove me-
didas visando a reverter o déficit das contas primárias. Ele observou
que o dever de casa se tornou um pouco mais desafiador devido à
liquidez mais restrita, e enfatizou que, com a redução dos fluxos de
capital em direção aos mercados emergentes, o mercado está mais
exigente em relação ao ajuste das contas públicas.

Conforme relatado pelo Infomoney, Campos Neto também teria men-


cionado que, em sua avaliação, “entre os diversos motivos possíveis
para o aumento das taxas de juros nos Estados Unidos, está se conso-
lidando uma interpretação menos favorável e mais estrutural”.

Campos Neto mantém contatos com agentes e investidores influen-


tes, e sua declaração destoa do que, geralmente, um economista com
alta visibilidade na mídia financeira nos EUA diria. A causa subjacente,
evidentemente, é a insustentabilidade do endividamento público do Te-
souro dos EUA.

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Figura 3 – Evolução da expectativa da inflação até outubro de 2025 e a meta


fixada pelo CMN.

Após o discurso de Campos Neto, a curva de juros a termo no merca-


do doméstico inverteu o seu movimento, deixando de cair para fechar
o dia com uma leve alta. As projeções para a taxa Selic nas reuniões
do comitê no início de novembro e meados de dezembro permanece-
ram inalteradas nesta segunda-feira, apesar de uma ligeira redução
na mediana das estimativas dos analistas para a inflação em 2023. A
precificação no mercado futuro continuou sendo um corte de 50 pon-
tos-base no início de novembro e de 25 pontos-base em dezembro, o
que resultaria em uma taxa de 12% ao final do ano. Esses números con-
trastam com a previsão de 11,75% dos analistas consultados na pesqui-
sa Focus.

Embora seja uma estatística com atraso, o IBC-Br apresentou uma que-
da em agosto com uma intensidade superior à expectativa dos analis-
tas, conforme dados da Refinitiv. Esta queda pode, em parte, explicar
a manutenção das projeções de crescimento econômico para 2023
abaixo do carregamento estatístico (carry-over ou carrego) de 3,0%.

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II – VALORAÇÃO
Conforme dados do IBES/Refinitiv, a projeção da mediana do lucro
operacional para a carteira do S&P 500 nos próximos 12 meses subiu
0,18% na semana passada. No entanto, é importante destacar que, se
incluíssemos as ‘Magnificent-7’ do cálculo do lucro operacional do S&P
500, a situação seria diferente.

Figura 4 – Expectativa dos lucros operacionais em 2023 no gráfico à esquerda


(preto), 2024 (verde), lucro nos próximos doze meses (azul) da carteira do S&P 500;
gráfico à direita mostra o múltiplo do S&P 500 – Fonte: IBES/ Refinitiv/ QUAD.

Os lucros esperados para os anos completos de 2023 e 2024 tiveram


recuos mínimos. O crescimento do lucro operacional de um ano para
o outro aumentou de 12,0% para 12,4%, indicando claramente uma ex-
pectativa de um cenário de pouso suave em 2024.

As ações da empresa japonesa Nidec sofreram a sua maior queda em


mais de 12 anos após divulgar lucros trimestrais nesta segunda-feira
(horário do Japão) que ficaram aquém das estimativas, evidenciando
a fraqueza nos setores globais de veículos elétricos e eletrônicos. A
Nidec, um fornecedor crucial para fabricantes de veículos elétricos e
eletrônicos, incluindo a Tesla e a Apple, registrou um aumento no lucro
operacional do trimestre de setembro que ficou abaixo das projeções,
com um crescimento de 7,6%. Além disso, a receita teve um crescimen-
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to quase nulo no mesmo período. Esse desempenho fraco da Nidec


reflete as dificuldades enfrentadas em um mercado automobilístico
enfraquecido, o que também foi evidenciado pelas recentes projeções
mais modestas de crescimento da Tesla e suas indicações de desafios
futuros.

III – PRICE ACTION


O índice S&P 500 está tão seletivo que um mero recuo nesta segun-
da-feira de -0,17% correspondeu a quedas de 365 papéis da carteira
versus altas de 137 ações. O mesmo se pode afirmar sobre o Nasdaq
Composite, que reportou um número recorde desde junho do número
de papéis registrando novas mínimas nas últimas 52 semanas. O Nas-
daq 100 (NDX) também encostou em um suporte, mas não muito for-
te, em torno de 14.500 pontos. Tecnicamente, esta sobrevenda sugere
uma reação temporária, a julgar pela fraqueza do DJIA, cujo fecha-
mento nesta segunda-feira se situou 4,8% abaixo de um suporte mais
robusto.

Por outro lado, o RHL de 20 semanas do S&P 500 se aproximou da re-


gião de sobrevenda de 20%. No entanto, se o mercado de Treasuries
não cooperar e seguir com as taxas de longo prazo em alta, o mercado
poderá achar fundo somente quando a sobrevenda deste indicador
atingir o intervalo entre 10% e 16%.

O RHL de 20 semanas do Ibovespa está em 25,5%. Se, da mesma for-


ma, o mercado de Treasuries se estressar, não seria uma surpresa
que a queda fosse estancada somente quando esse oscilador atingisse
cerca de 15%.

A proximidade da região de sobrevenda do S&P 500 e do Ibovespa


sugere, pelo menos, uma reação a partir de algum momento de no-
vembro. O que se discutiria é o potencial dessa alta, que dependerá
do nível em que o S&P 500 atingirá em seu pior momento, algo que só
saberemos ex-post. Em 2008, por exemplo, após o S&P 500 ter viola-

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do a sua média móvel de 200 semanas em quase 2%, a reação durou


dois meses e o potencial de recuperação não foi atrativo. Portanto, o
desempenho do mercado de ações dependerá das ‘Magnificent-7’ e
do mercado de Treasuries.

IV – CONCLUSÃO
Reza o Postulado n° 5 do M4D: “a taxa de erro na classificação de risco
de uma exposição no mercado se reduz na proporção do número de
atributos não redundantes do mercado, cujas sinalizações sobre o risco
de uma exposição estejam alinhadas. Os atributos não redundantes do
mercado são os indicadores das quatro dimensões do mercado”.

Para a classificação do risco de uma exposição no médio prazo na


compra no mercado de ações as notas das dimensões price action,
sentimento e fundamentos econômicos deveriam ser positivas. Nos ca-
pítulos finais de um mercado-touro, não é incomum ser suficiente no-
tas positivas apenas do price action e do sentimento no início de uma
reação, geralmente associadas a uma trajetória de recuperação com
baixo volume. No quadro abaixo todas as notas foram mantidas em
relação ao relatório anterior.

Figura 5 – Notas das dimensões – Fonte: QUAD.

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A nota do price action do Ibovespa foi elevada de negativa para neu-


tra, mas com um viés negativo, devido à proximidade da região de so-
brevenda. Ao contrário do S&P 500, o Ibovespa não possui ‘Big Techs’
para sustentar o benchmark nacional. Apenas os setores financeiro e
de energia evitaram o aprofundamento das perdas no Ibovespa. Uma
reação se aproxima, mas o seu potencial terá que ser avaliado poste-
riormente. Com as informações disponíveis, parece que apenas o setor
de energia teria potencial, mas, como foi evidenciado nesta segunda-
-feira, membros do governo criaram uma reserva de retenção de lu-
cros com o argumento de que a sociedade também deveria desfrutar
do desempenho da Petrobras. Por outro lado, a perspectiva da eco-
nomia da China tem se tornado cada vez mais sombria. Dificilmente,
esse país poderá repetir o robusto pacote de investimentos anunciado
em outubro de 2008, sob pena de agravar ainda mais a alavancagem
presente na economia.

No que diz respeito ao S&P 500, em algum ponto no futuro, os preços


das ações rotuladas como as ‘Magnificent-7’ atingirão um teto, uma
vez que há limites para a valorização e para a seletividade. O senti-
mento dos investidores americanos está longe de ser pessimista, como
indica a média móvel de 21 dias do VXST, que acompanha a volatilidade
implícita das opções do índice S&P 500 com 9 dias para o vencimento.
Atualmente, esse indicador se encontra em um nível intermediário, si-
tuando-se entre o pessimismo e o otimismo.

A história nos ensina que níveis elevados de endividamento público cos-


tumam ser ajustados por meio da inflação, acompanhada de repres-
são financeira (juros reais negativos). No entanto, a situação atual é
peculiar, pois tanto o Tesouro quanto o Federal Reserve têm contri-
buído para uma realidade atípica: juros reais positivos, mesmo com a
inflação ainda relativamente distante de sua meta. Além disso, há os
desafios como bancos regionais fragilizados, um mercado imobiliário
estagnado e alavancagens ocultas que só virão à tona em caso de uma
crise financeira mais severa.

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M4D#337
Edição de 24/10/2023

A mídia financeira tem divulgado a ideia de que os vigilantes, expressão


usada para se referir aos principais operadores no mercado de títulos
do Tesouro, estão apostando contra o Federal Reserve ao precificar
três reduções de 25 pontos-base em 2024, com a primeira prevista
para junho. No entanto, ninguém mencionou a possibilidade de que eles
estejam, na verdade, precificando uma recessão, uma hipótese que
também deve ser considerada. Essa tese se fortalecerá caso o S&P
500 atinja a sua média móvel de 200 semanas que, pela experiência, é
uma das mais importantes no mercado de ações dos Estados Unidos.

Quem viveu os anos de 2007 sabe que as notícias sobre um pouso sua-
ve eram frequentes entre economistas, incluindo membros do Federal
Reserve, inclusive o presidente do banco central. No entanto, diante de
tantos e graves desequilíbrios na economia, foi nesse momento que a
chamada Lei de Murphy se manifestou: “Se algo pode dar errado, dará
errado”.

CLIQUE PARA ACESSAR A ENCICLOPÉDIA DOS INDICADORES DA QUAD

JARBAS A. GAMBOGI BRUNO SANDRI


Analista CNPI-T 2715 Analista CNPI 2349

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