Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
REVISÃO PRIMÁRIA:
P AT SUE
REVISÃO FINAL E DIAGRAMAÇÃO :
CINT HIA A.P.
O LEGAD O D E T IZIAN O
M áfi a c o mp ag n i
Liv ro 1
ESTA É UMA OBRA DE FICÇÃO. NOMES, PERSONAGENS, LUGARES E ACONT ECIMENT OS DESCRIT OS SÃO
PRODUT OS DA IMAGINAÇÃO DA AUT ORA. QUALQUER SEMELHANÇA COM FAT OS REAIS É MERA
COINCIDÊNCIA.
NENHUMA PART E DESTA OBRA PODE SER UT ILIZADA OU REPRODUZIDA POR QUAISQUER MEIOS EXIST ENT ES
SEM A AUT ORIZAÇÃO PRÉVIA E EXPRESSA DA AUT ORA. A VIOLAÇÃO DOS DIREIT OS AUT ORAIS É CRIME
ESTABELECIDO NA LEI N° 9.610/98, PUNIDO PELO ART IGO 184 DO CÓDIGO P ENAL.
T ODOS OS DI RE I T OS RE SE RVADOS
EDIÇÃO DIGITAL | CRIADO NO BRAS IL
SUMÁRIO
SINOPSE
PRÓLOGO
CAPÍTULO 01
CAPÍTULO 02
CAPÍTULO 03
CAPÍTULO 04
CAPÍTULO 05
CAPÍTULO 06
CAPÍTULO 07
CAPÍTULO 08
CAPÍTULO 09
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
CAPÍTULO 34
CAPÍTULO 35
CAPÍTULO 36
CAPÍTULO 37
CAPÍTULO 38
CAPÍTULO 39
CAPÍTULO 40
CAPÍTULO 41
CAPÍTULO 42
CAPÍTULO 43
EPÍLOGO
AMOR E OBSESSÃO
UMA TAÇA DE CHÁ
CONTATOS DA AUTORA
SINOPSE
Como filho mais velho e sucessor do título de seu pai, Tiziano Pellegrini foi doutrinado,
desde menino, para chefiar a Compagni, a maior máfia da Itália, com mãos de ferro.
Quando esse momento chegou, ele criou suas próprias regras e ficou conhecido em todo
submundo, não apenas por alavancar os negócios, mas também por ser implacável.
Agnes Sforza era uma moça religiosa e sonhadora, sedenta por viver uma história de amor
igual as dos livros que tanto amava ler. Infelizmente, as coisas não aconteceram como
sonhou e ela teve que remodelar seu futuro de acordo com suas possibilidades.
Por um acaso do destino, a doce jovem conheceu o pecado em forma de gente, mas será que
Agnes deixaria para trás todas suas convicções para entrar em um universo contrário a tudo
o que ela acreditava?
Não tinha ninguém no mundo que gostasse de uma festa mais do que
Tiziano Pellegrini. Quando não estava desempenhando o dever que lhe foi
incumbido desde jovem, ele certamente estaria marcando presença em algum
evento ou boate da famiglia, quase sempre acompanhado de lindas mulheres,
diversificando para não enjoar.
Todavia, não era por ser o mafioso mais influente e conhecido da Itália
que se dava tão bem com o sexo oposto, mas tão somente por ter se tornado
um homem lindo que, junto ao carisma que possuía, conseguia chamar a
atenção em todos os ambientes que entrava, como se um holofote o
acompanhasse o tempo todo.
As pessoas de seu convívio já estavam acostumadas com o ser
espaçoso e divertido que habitava a carcaça musculosa e repleta de
tatuagens, e sabiam que seu lado oculto era mostrado somente para os
traidores e inimigos de sua organização.
Tiziano não deixou que o sofrimento do passado influenciasse em sua
essência. Ele carregava marcas irreparáveis e seguia comandando a
organização com punhos de ferro, porém, esconder seus ferimentos era tão
natural para ele quanto matar. Com o tempo, convenceu-se de que essa era a
vida que teria e nunca poderia escapar dela. Por isso, manteve-se atento às
explicações do seu pai nos seus anos de aprendiz, no intuito de proteger o
irmão. A cruz que carregava por não ter conseguido cumprir a promessa que
fez a Simona ainda lhe pesava sobre os ombros.
Ele a eternizou para nunca se esquecer de manter o seu foco na
vingança contra aqueles que levaram sua irmã. A tatuagem de crucifixo preto
e cheio de espinhos, indo da nuca ao cóccix, foi feita aos quinze anos, idade
em que já havia matado mais homens que as mãos juntas poderiam
contabilizar. Depois dela, muitas outras tatuagens vieram e atualmente
preenchiam parte de seu corpo, cada uma com um significado diferente,
feitas em momentos distintos e memoráveis.
Ele era o Don mais distinto que já havia passado pela famiglia e, ao
contrário de todos os outros, não se vangloriava pelo número de homens que
matou ou pelos negócios estarem dando o maior lucro de todos os tempos,
pois, para ele, estar em ascensão não queria dizer nada, já que no fim sabia
que ninguém era insubstituível e, naquele meio, menos ainda.
— Vamos, pequenos — ordenou Tiziano aos seus seguranças.
Apesar de estar se sentindo bem naquele ambiente e de ter visto
algumas mulheres interessantes, não poderia ficar muito tempo no
aniversário de casamento de Paolo, pois tinha outro compromisso.
Ainda não acreditava que já fazia cinco anos que o casal de amigos
havia se casado. Gostou, contudo, de ter ido desejar felicitações e deixar um
presentinho singelo pelas bodas de madeira, além de pegar o telefone da
cantora que se apresentou na festa.
Logo estava de volta ao galpão onde um traidor da famiglia esperava
para que terminassem o trabalho que haviam começado, três dias atrás.
— Boa noite, Lauro. Acredita que estava com saudades, velho amigo?
— ironizou ao adentrar o grande galpão, já com a faca na mão.
Obviamente Tiziano possuía muitas armas de fogo à sua disposição,
mas a faca foi amor à primeira vista. Foi com ela que matou Alessandro e a
carregaria para sempre, como uma forma de nunca esquecer o dia em que a
maldade nasceu dentro de si.
— Vamos começar? — indagou, querendo iniciar o interrogatório.
— Nada ainda? — perguntou Edoardo, entrando no galpão algum
tempo depois.
— Ele poderia ter sido leal assim conosco, não é? — disse Tiziano,
rindo. — Posso contar em uma mão quantas pessoas já me traíram e ela
precisa ser muito burra para fazer isso.
— Ele é do tipo traidor leal — declarou o subchefe, passando a mão
pelos cabelos grisalhos.
O soldado já estava desfigurado, aproveitando o fiasco de respiração
ainda presente.
Tiziano era um homem paciente e sabia jogar, como ninguém, o jogo
sujo do submundo e Lauro ficaria sabendo, naquele minuto, quem era que
mandava.
— Podem vir — comandou Tiziano, sentando-se em uma cadeira e
acendendo um charuto.
No instante seguinte um outro soldado entrou carregando uma mulher
encapuzada.
— Torturar mulheres não está entre as minhas práticas preferidas, em
vez disso, eu as mato logo, mas posso abrir uma exceção. O que acha, vai
pagar para ver ou me falar para quem você se vendeu?
Quando viu o soldado tirar o capuz marrom, o homem arregalou o olho
que não estava inchado demais ao reconhecê-la.
E, como um milagre, o quase morto ganhou vida.
— Achou que eu não iria descobrir que era casado? Lauro, Lauro, não
tem como esconder algo assim da máfia, amigo, parece até que não me
conhece — falou, levantando-se, e posicionou a faca na jugular da moça
histérica. — Ela já perdeu o fio há muitos anos — declarou, referindo-se a
arma branca em sua mão. — Mas sabe de uma coisa? Assim fica melhor.
Deixa eu te mostrar.
— Por favor — implorou. — Ela não tem nada com isso.
— Isso se chama vida na máfia, meu caro. A partir do momento em
que resolveu me trair, deveria saber que eu iria até o inferno atrás de quem
te importa.
— Se você não a matar, eles vão...
— Se você não está preocupado — debochou, enfiando a faca na
garganta da mulher sem piedade —, quem sou eu, não é?
O silêncio foi quebrado pelos soluços do homem misturados com os
da mulher que se afogava no próprio sangue.
Tiziano sabia que dali ele não conseguiria mais nada.
— Podem terminar, pequenos, aqui já deu — declarou, limpando a
faca na blusa do rapaz amarrado no chão.
Edoardo se levantou e acompanhou seu Don em direção ao carro sem
demonstrar nenhum tipo de sentimento.
— Vamos passar no Mc Donalds no caminho — disse Tiziano,
tranquilamente.
O subchefe o olhou com as sobrancelhas erguidas.
— O que foi? Não tive tempo de comer. Quer ir comigo ou prefere
voltar para casa a pé?
Edoardo era o tipo de homem que prezava pelo silêncio, para ele, era
a melhor opção em qualquer ocasião; raramente se envolvia em brigas e não
tinha esposa ou qualquer parente próximo ainda vivo, segundo ele.
Por questão de logística, morava com Tiziano, na edícula que ficava
nos fundos da casa, de forma que parecia de serviço vinte e quatro horas por
dia, sete dias por semana.
Ele não ligava.
O subchefe era de uma pequena família do sul da Itália e suas
principais atuações na organização eram o tráfico de drogas via porto, pois
seu pai era despachante aduaneiro. Um dia, muito tempo atrás, contudo,
todos foram pegos em uma emboscada, menos Edoardo, que se destacava
bastante em suas atividades, chamando a atenção do Don, e em menos de
dois anos ocupava o segundo cargo mais almejado na organização, por puro
merecimento.
O homem acompanhou algumas das coisas que Tiziano passou, pelo
pouco que ele relatava, e sabia o peso que a casa de Vito representava a ele,
por isso o Don fez questão de sair de lá assim que foi nomeado chefe; não
aguentava mais as loucuras do pai, a submissão desenfreada da mãe e as
merdas do irmão mais novo.
Ao contrário dele, Leonello não aprendeu nada do que o pai quis lhe
ensinar e tinha sido expulso de casa algumas vezes. Vito, todavia, sempre o
fazia voltar, pois sabia da ameaça que ele representava para a organização,
caso ficasse solto pelo mundo.
Embora quisesse, Tiziano não pôde nomeá-lo como subchefe devido à
inconstância do rapaz, ele não tinha discernimento nem responsabilidade
para ocupar tal cargo e só causava dor de cabeça a todos. Ele sequer tinha
terminado os estudos e as únicas coisas que o animavam eram álcool, drogas
e mulheres.
Talvez por ser mais novo, Leonello sempre esteve em segundo plano
para Vito. Em sua revolta, não desejava fazer parte dos negócios da famiglia
e quando foi obrigado, acabou descontando toda a frustração no maldito pó
branco. Vito já havia perdido qualquer esperança de incluí-lo como membro,
então, pouco se importava com o vício do filho, para ele, quanto antes fosse
encontrado morto em uma vala, melhor. Ainda não entendia por que o pai
não fizera isso ele mesmo, só podia supor que mesmo a maldade dele tinha
limites.
Tiziano, ao contrário, tentava incansavelmente dar um rumo ao único
irmão que lhe sobrara. Aquela noite, de anos atrás, havia mudado a vida de
todos de uma maneira perturbadora. Cada um de sua forma e ele jurara a si
mesmo que jamais o deixaria na mão.
Deixando seus devaneios de lado, chegou a sua casa e deu de cara com
Antônia.
— Não posso nem transar em paz? — perguntou Tiziano.
— Não estou vendo ninguém com você.
— Está chegando — afirmou e deu um beijo na testa da prima e
conselheira.
— Vim para jantarmos, já comeu?
— Na verdade, sim, mas posso te fazer companhia.
— Ótimo, quero saber de Lauro.
— Então vem. Mas é pra comer rápido. Como disse... Tenho planos.
— Acho que vai me dar indigestão — falou a prima, séria como
sempre. Nem quando fazia uma brincadeira ela perdia o ar austero.
Antônia era a mulher mais poderosa da máfia. Desde a infância, ela e
Tiziano tinham uma ligação diferenciada e foi por confiar nela que ele a
colocou como sua conselheira assim que assumiu o cargo.
Alguns Capos ainda eram avessos à escolha do Don, mas com ele no
comando, algumas coisas haviam mudado e essa era uma delas. Seu pai foi o
primeiro a se opor, contudo, ele já não estava mais em seu estado normal,
oscilava momentos de lucidez e outros de total obscuridade.
Após alguns atentados e diversas ameaças na época em que ocupava o
cargo, Vito ficou paranoico com a própria segurança o que acabou afetando
diretamente sua saúde mental, fazendo-o tomar decisões infundadas e
prejudiciais à organização. Após muita pressão de seus capitães, ele cedeu o
lugar ao filho mais velho. Não esperava deixar o cargo tão cedo, contudo,
era isso ou enfrentar uma interdição, pois praticamente ninguém o respeitava
mais.
Quando sóbrio, Vito tentava se inteirar do que ocorria, mas Tiziano
não facilitava sua vida e o mantinha o mais longe possível. Sua presença, na
infância, já havia sido tóxica de mais e de forma alguma o manteria por perto
em sua vida adulta.
— Como assim ele não falou? Tinha que ter matado o filho ao invés da
esposa.
— Até no submundo existem regras e uma delas é não matar crianças,
acho que sabe disso — declarou observando a prima preparar um macarrão
como se tivesse em sua própria cozinha.
— Você sabe que isso é coisa dos Massimos e eles não tiveram
misericórdia de Simona, tiveram? Afinal, Alessandro não agiu sozinho, foi
somente uma ponte.
— Vingança é um prato que se come frio. Quem tem pressa, corre e se
fode.
— Você e suas tiradas...
— O único que entende o conceito é o Edoardo, ele, sim, sabe o que
quero dizer, por isso é o subchefe, não você.
— Comentário desnecessário.
— Nunca falo nada que não seja necessário. — Riu. — Ao invés de se
estranharem, deveriam fazer muito sexo.
Tiziano notava que sua conselheira e seu subchefe não eram fãs um do
outro e pouco se importava, desde que não transferissem essa animosidade
para o trabalho.
— Ele não faz meu tipo.
— Vou te dar um conselho, sabe que sou ótimo em aconselhamentos,
não é? Cai fora — disse o rapaz. — Pois Fabrizio é gay.
— Por isso nos entendemos — comentou ela, colocando o macarrão
ao alho e óleo no prato. — Além disso, não existe nenhuma cláusula dizendo
que não posso dar para o meu soldado.
— Verdade. A boceta é sua, pode dar para quem quiser.
— Vou me lembrar disso...
— Coloca logo um prato dessa gororoba pra mim — brincou com água
na boca.
— Sabia que não resistiria.
A campainha tocou um minuto antes da última garfada de Tiziano.
— A porta está aberta — ele gritou.
Sua casa era uma fortaleza e ninguém teria chegado até a porta sem
autorização, por isso só podia ser Virna. Sempre que estava sem paciência
para flertes, ligava para a moça. Conheceram-se em um dos bordéis da
famiglia e após um tempo, Tiziano resolveu tirá-la de lá, acomodando-a em
um apartamento próximo à sua casa. Isso já tinha seis meses e a única e
exclusiva obrigação da loira era estar disponível sempre que ele precisasse,
significando que não podia chegar perto de outro homem. O mesmo não se
aplicava a ele, é claro. Tiziano era um homem muito viril, mas às vezes
estava cansado demais para ir atrás de diversão, de modo que ter a loira ao
seu dispor era bem útil. Em troca, ela não precisava se preocupar com
nenhuma despesa.
A moça apareceu na cozinha usando um tubinho preto e muito
provavelmente sem nada por baixo, já que o tecido era fino e não havia
marca alguma de lingerie.
— Boa noite, Tiziano, Antônia.
— Pode ir esquentando a cama, lindinha, já estou indo — instruiu ele
com uma piscadela.
— Claro — retrucou com uma voz sexy.
A moça virou as costas e sumiu das vistas dos primos.
— Bom, sinto ter que ir... — começou, levantando-se —, mas o dever
me chama.
— Descarado, não vai arrumar sarna para se coçar, hein? Está saindo
de mais com ela.
— Eu saio com quem quiser, a quantidade de vezes que eu quiser,
então... Tchau, prima, e deixa minha cozinha limpa.
Com essas palavras Tiziano lhe deu as costas, deixando Antônia rindo,
pois se tinha alguém que conhecia bem o mafioso era ela.
CAPÍTULO 02
Cinco dias após ter sido alvejada, Antônia estava em casa, não na
dela, mas na de Tiziano que fez questão de acomodá-la até a recuperação
total da prima, com direito a cuidados de enfermagem vinte e quatro horas
por dia.
A moça deu sorte por estar viva e conseguindo se recuperar bem,
porque se não tivessem agido rápido, ela estaria a sete palmos do chão,
pagando sua conta em um submundo pior do que aquele em que viviam.
Os dias também foram intensos para quem não estava convalescendo
em um leito. O Capo dos Capos saía cedo e voltava tarde da noite na busca
pelo traidor. Por sorte, mantinha soldados e associados em cada canto da
Itália, entretanto, para sua infelicidade, ninguém soube lhe informar nada. O
único dado que possuía era o amassado na lataria da van branca e mais nada.
Se o seu sono já não era dos melhores, com o inimigo solto por aí ele
se tornou praticamente inexistente. Mas Tiziano nunca deixava se abater e se
havia algo que o rapaz tinha de sobra era paciência, ele sabia que, em algum
momento, vingaria a tentativa de assassinato de sua conselheira.
Em relação a Vito, o chefe baniu o velho de todos os assuntos
relacionados à famiglia, por ter descumprido a sua ordem, o que foi pouco
perto do que Tiziano desejava para ele. Contudo, como um bom subchefe,
Edoardo o convenceu de que não era o momento de entrar em uma guerra
interna na organização, pois ele ficara anos no poder e ainda tinha certa
influência, não sobre a maioria, mas o suficiente para dar mais dor de
cabeça para o filho.
Então decidiu guardar Vito em uma caixa dentro de seu cérebro para
cuidar em outro momento. Vinha acumulando caixas podres como aquela no
decorrer de sua existência e quando tivesse que acertar essa conta do mal,
não mediria esforços para sentir-se vingado, nem que tivesse que mandar o
próprio demônio de volta ao inferno com suas mãos.
Era a primeira vez, naquela semana, que Tiziano chegava em casa
antes das oito da noite.
Foi direto para o escritório rever alguns balanços de pagamentos das
boates pertencentes à Compagni e que foram erguidas exclusivamente para
lavagem de dinheiro, mas estavam lhe rendendo um lucro extremamente alto.
Ao menos uma coisa boa no meio da tempestade.
— Posso entrar? — perguntou Leonello, já com a cabeça para dentro.
Tiziano fez um gesto positivo e deixou a papelada de lado.
— Eu soube o que houve. Como está a Antônia?
— Querendo matar quem chega perto dela, então, acho que está bem.
Leonello riu, podia imaginar a prima querendo subir pelas paredes por
ter que ficar de repouso
— E já teve alguma novidade além da van?
— Não.
— Posso te ajudar em algo?
— Leonello...
— Estou limpo.
— Você já me falou isso antes.
— Mas agora é pra valer. Tem mais de dois meses que não uso nada.
Já passei pela fase mais crítica da crise de abstinência, agora é um dia de
cada vez.
— Não deveria estar internado?
Tiziano não queria demonstrar, mas estava emocionado por ouvir
aquilo. Esperava que, daquela vez, seu irmão conseguisse.
— Não. Eu tenho que conseguir me conter mesmo que esteja dentro da
fábrica de produção. Além disso, não estou sozinho, procurei ajuda de
especialistas. Vou te mostrar que sou capaz disso e de muito mais.
— Vamos ver. De qualquer forma, não vou te dar o cargo do Edoardo.
— Não quero o cargo dele... quer dizer, eu quero, mas vou lutar para
conquistá-lo.
— Está bem — falou, levantando-se e caminhando até o bar. — É a
última chance que te dou.
— Não vou precisar de outra.
— Ótimo. Quer? — perguntou, apresentando uma garrafa de The
Macallan.
— Não, parei também.
— Impressionante.
— Uma coisa leva a outra — deu de ombros —, prefiro não arriscar.
— Muito bem... Enfim, como estão as coisas em casa?
— Do mesmo jeito de sempre, Vito está louco por você tê-lo excluído
totalmente dos negócios e desconta em Ludovica.
— Eu já passei da fase de ter pena. Ela está lá até hoje porque quer, já
ofereci ajuda, mesmo ela não sendo digna, mas sempre negou, prefere
continuar fazendo o papel de esposa submissa. Não sei o que acha que vai
ganhar com isso.
— Também não entendo Por falar nisso, será que não posso vir para
cá?
— De um garanhão solitário, a um homem morando com o irmão e a
prima? — perguntou, sentando-se novamente na poltrona, o gesto fazendo as
pedras de gelo tilintarem no cristal. — Estou indo de mal a pior mesmo.
Ele sempre apreciou o fato de morar sozinho e em quatro dias tudo
havia virado do avesso.
— Preciso recomeçar e lá... Bem, é impossível. Você sabe tanto
quanto eu.
Assim que tomou o poder, uma das primeiras coisas que Tiziano fez
foi abominar e proibir a violência contra as mulheres dentro da organização.
Contudo, dentro da casa do próprio pai – e de outras, ele tinha certeza –,
isso ainda acontecia e pior de tudo, não podia tomar uma atitude porque a
mãe se recusava a falar qualquer coisa contra o marido e sem o parecer da
vítima, ficava impossível pegar Vito.
Na verdade, ela nunca tinha falado nem para eles a respeito do que
passava com o marido, por esse motivo, ficavam de mãos atadas. Leonello
poderia falar, contudo, não tinha credibilidade alguma pela fama de drogado
que já carregava nas costas. Mas ele, melhor do que ninguém, sabia o que
acontecia naquela casa.
No dia em que Tiziano baniu Vito da chefia, viu o velho bater na
esposa como nunca antes, porém, estava tão chapado que não pôde fazer
nada. Aquele foi o estopim que o fez perceber que se continuasse como
estava, acabaria pior que a mãe e decidiu procurar ajuda. Desde então teve
várias recaídas, mas isso não o fez desistir.
Principalmente porque queria estar sóbrio na hora em que seu
progenitor fosse dar o último suspiro. Quando esse dia chegasse, seus filhos
estariam observando de camarote enquanto ele agonizava até a morte.
Tiziano ficou admirando o líquido dentro do copo enquanto pensava.
— Se você não tivesse cancelado meu dinheiro... — reclamou
Leonello.
— Cancelei porque você é irresponsável.
— Era.
— Sei — respondeu e após pensar um pouco mais, disse: — Pode vir.
E se isso realmente for sério, eu volto a liberar o dinheiro para você pode
ter sua casa.
— Ótimo. Eu tenho uma ideia para conseguirmos ao menos uma pista.
— Qual?
— Vamos ver as câmeras da cidade, pegamos a placa e batemos na
porta de todo maldito que produz placas falsas na Itália.
— Pode ser.
Leonello deu um sorriso vitorioso.
— É bom saber que está comprometido.
— Eu realmente estou, e fiquei a noite toda pensando em uma forma de
pegarmos os filhos da puta.
— Ótimo, colocaremos em prática.
O que Tiziano não falaria ao irmão era que teve exatamente a mesma
ideia há dois dias, deixaria Leonello pensar que havia partido dele, afinal,
não tinha ninguém que o Don gostaria de ter mais ao seu lado do que o
caçula. A missão de cuidar do único irmão ainda corria forte em suas veias e
morreria tentando tirá-lo do poço em que se afundara há tanto tempo.
— Agora me deixa em paz. Preciso terminar isso aqui hoje — falou,
dispensando o rapaz, que nem era tão rapaz assim, uma vez que tinha apenas
dois anos a menos que ele.
— Já estava indo e, hum, vou providenciar minha mudança agora
mesmo — avisou, já saindo do escritório.
Tiziano respirou fundo e estava prestes a tomar mais um gole de sua
bebida quando o celular tocou:
— Sim — atendeu, sem paciência.
— Sr. Pellegrini — cumprimentou a voz do outro lado.
— Olha só se não é minha beata favorita. A que devo a honra de uma
ligação?
— A Chiara me pediu para verificar com o senhor se o lote de vinhos
que foi enviado esta semana a um de seus estabelecimentos chegou como
esperado.
Tiziano sorriu quando percebeu a situação.
Eles nunca faziam aquele tipo de ligação aos clientes, afinal, a
organização era freguesa há anos e certamente ligar para verificar se a carga
chegou não fazia parte do pacote, ainda mais uma ligação feita por Agnes.
O sorriso se alargou ao pensar que tinha uma aliada, muito embora não
conseguisse entender por que Chiara havia feito aquilo.
— Tudo perfeito, melhor se você viesse junto.
— Suas cantadas são péssimas, já te falaram isso?
— Sim — respondeu, acendendo um charuto. — Mas eu compenso de
outras formas.
— Bom... Já que a carga estava certa... Tenha uma boa noite.
— Já? Queria saber quando podemos conversar pessoalmente?
— Já falei que não vou sair com você. Pare de insistir.
— Acho que está com medo.
— Só tenho medo do diabo.
— E não é a mesma coisa? — zombou e a ouviu suspirar. — Olha,
podemos fazer um combinado. Jantamos uma vez e se você não gostar, nunca
mais te procuro.
— Nunca mais é muito pouco.
— Agora pegou pesado — falou com falso pesar.
— Não foi isso que quis dizer... Olha, não me leve a mal, sou mais
agressiva com você do que gostaria, então o melhor...
— É sairmos — interrompeu. — Vamos aos fatos. Se você é agressiva
comigo, significa que fica nervosa na minha presença, se fica nervosa, é
porque gosta de mim, então por que não saímos? Ir jantar comigo um dia não
vai te levar para o inferno, tenho certeza de que Deus te dará esse day off
para compensar a boa menina que foi a vida inteira.
— Como sabe que fui uma boa menina a vida inteira?
— Hum, isso quer dizer que não foi? Me conte...
— Tchau, Sr. Pellegrini.
Sem saber, a beata estava usando a pior estratégia para mantê-lo
afastado, pois quanto mais difícil, mais se sentia atraído, como um ímã. Se
ela aceitasse esse jantar de uma vez, era provável que o Don perdesse a
vontade de ter o impossível e a deixasse em paz.
Mas o que ele não sabia era que, dentro da carcaça durona e arredia,
Agnes era uma mulher sensível que ainda batalhava com o luto pelo marido,
assassinado a sangue-frio cinco anos antes. Mesmo não querendo, sentia-se
traindo o falecido simplesmente por pensar em Tiziano. Sair com ele seria
atestar sua infidelidade e isso lhe era inadmissível, então, seguiria firme no
propósito de se manter longe daquele homem alto, forte e cheio de tatuagens.
Mas até quando conseguiria se segurar, ela não tinha certeza...
Agnes não era burra e percebeu que Chiara mandou que ela ligasse
para o homem de propósito, afinal, nunca tinha feito aquele tipo de pedido.
Seria um complô? Lembraria de ter uma conversa franca com a patroa em um
momento oportuno, pois realmente não tinha intenção alguma de se envolver
com o satanás.
Além disso, intensificaria suas orações, pedindo a Deus para livrá-la
daquele tipo de pensamento.
CAPÍTULO 09
Uma das qualidades de Tiziano como chefe era estar sempre um passo
à frente e preparado para qualquer situação, por isso, ver-se fora do controle
o deixava furioso.
Só não se sentia pior porque seu subchefe já estava acordado e
totalmente lúcido quando saiu do carro. Mas enquanto o via brigar com o
médico que queria obrigá-lo a tomar um remédio, ele se sentia em ponto de
ebulição.
Não precisava ser muito inteligente para saber que tudo estava vindo
de uma pessoa, restava descobrir quem era o desgraçado que achou que tinha
o direito de o desafiar daquela forma.
Assim que o médico saiu, não se deu ao trabalho de ir até o escritório
para explodir. Começou o esculacho ali mesmo, no meio da sala, e
direcionou toda a sua ira a Sandro, o atual chefe da segurança.
— Eu te pago muito bem e não somente para me proteger todos os
dias. Gasto milhares de euros todo mês para prever esse tipo de coisa —
despejou o homem, mantendo o controle da voz.
— Me desculpe, senhor, eu...
— Por que a verificação dos carros não foi realizada? Por causa da
sua irresponsabilidade nós perdemos dois homens!
Tiziano estava corado pela raiva, mas sabia que perder a cabeça não
ajudaria. Por isso, sacou a arma e apontou para o homem. Alguém deveria
ser responsabilizado e ninguém mais adequado para isso do que Sandro. O
próprio Don o havia tirado da quarentena e dado uma nova chance após o
incidente da festa. E como ele retribuiu?
Edoardo, que geralmente era mais ponderado, não se intrometeu, ficou
apenas observando enquanto Tiziano acertava um tiro fatal no peito no rapaz,
oferecendo-lhe, apesar de tudo, uma morte rápida como reconhecimento
pelos serviços prestados.
— Mande limpar essa sujeira — ordenou, virando as costas e
seguindo em direção ao escritório.
Antônia, assustada com o barulho do disparo, saiu de seu quarto,
encontrando um Leonello igualmente alarmado no meio no caminho.
— Fique aqui, eu vejo o que é.
— Jamais — respondeu a moça acompanhando o rapaz.
O primo, por vezes, se esquecia de que a moça poderia ser tão sádica
e letal quanto qualquer homem.
Ambos passaram pelo corpo que era carregado para fora da sala e
caminharam até o escritório, certos de que Tiziano estaria lá. Encontraram-
no virando um copo de uísque enquanto Edoardo falava algo
incompreensível.
— O que está acontecendo?
— Sofremos um atentado, dois dos nossos foram abatidos —
esclareceu o subchefe.
— Não é possível — afirmou Antônia, incrédula. —, mas por que
Sandro?
— Ele era chefe da segurança e falhou pela segunda vez — explicou
Tiziano.
— Fez muito bem — declarou Antônia, referindo-se a Sandro. — Isso
já está se tornando muito comum, não pode ficar assim.
— Tem alguém bem empenhado — constatou Leonello.
— Preciso pensar, então, se me derem licença eu agradeço.
— Mas...
— Por favor, Antônia. Já disse que quero ficar sozinho. Eu penso
melhor desta forma, você sabe.
O primeiro a se retirar foi Edoardo, impulsionado pelo toque do
celular que estava em seu bolso, seguido por Antônia e Leonello.
Ao se ver só, Tiziano sentou-se em sua cadeira, inclinou-se para trás e
fechou os olhos. A cabeça ainda latejava, mas pelo menos a boca havia
parado de sangrar.
Permaneceu naquela posição por vários minutos, em busca de alguma
luz. Era um homem que pensava friamente nas situações, a fim de encontrar
uma solução inteligente. Por isso, espairecer um tempo sozinho com seus
pensamentos lhe faria bem. Muito embora desejasse mesmo era que um
milagre acontecesse e o nome do miserável que estava tentando acabar com
sua vida surgisse como mágica.
Como sabia que aquilo não aconteceria, precisaria pensar, mas logo
percebeu que não conseguiria nada ali e pegando o celular em cima da mesa,
saiu.
— Aonde vai? — inquiriu Antônia.
— Não se preocupem. Volto mais tarde.
Saiu do casarão e entrou em seu esportivo, acelerando para longe de
tudo e todos, sendo seguido por seus fiéis escudeiros.
Quanto mais o carro se afastava, mais leve ele se sentia. Estar à frente
da organização estava lhe cobrando um alto valor, sua paz.
Mas não adiantava lamentar se, no fim das contas, ele próprio
determinou seu destino. Mesmo sabendo da responsabilidade que tinha nas
costas desde que nasceu, poderia ter fugido e reescrito o futuro de uma forma
diferente, contudo, havia Leonello, a quem jamais deixaria para trás. Além
disso, jamais seria hipócrita de dizer que não gostava do que possuía. Era a
vida que todo mundo almejava, pelo menos a parte boa dela.
Carros caros, casas em todo canto do mundo, viagens, roupas de grife,
equipamentos de última geração e tudo mais que o dinheiro poderia
proporcionar, fora o poder que tinha nas mãos. Mas a liberdade e a paz de
espírito eram coisas que jamais poderiam ser compradas e em meio ao luxo
em que vivia, ele começava a sentir falta do que nunca teve, e pior, jamais
poderia ter.
Chegou ao destino, que foi determinado no meio do caminho, e parou
em frente a uma pequena casa branca, como de boneca, localizada pouco
antes do início da plantação de uva.
Observou atentamente a tranquilidade do local e imaginou, visto que
era a hora do almoço, que ela estava em casa. Bateu na porta e aguardou.
— Tiziano! — disse Agnes, abismada.
— Não vai me convidar para entrar?
— Não.
— Já falei que não mordo, não precisa ter medo de mim.
Agnes ficou parada como uma estátua, pensando se liberaria ou não a
entrada do homem. Ela gostaria que essa decisão tivesse saído da sua boca
mais rápido, mas ficou tempo demais quieta, demonstrando o quanto estava
indecisa.
— Se não me deixar entrar, vou achar que realmente estava certo.
— Certo em relação a quê?
— Quem desdenha quer comprar.
— Você e seus ditados arcaicos — comentou, dando passagem para o
rapaz.
Como não trabalharia no período da tarde, a moça estava totalmente
informal, vestindo calça jeans e uma blusa, ambas justas, delineando as
curvas que, até então, Tiziano só havia imaginado.
Através da carcaça de homem poderoso, Agnes conseguia ver alguém
que precisava de um ombro amigo e ela fora a escolhida para tal papel.
— Quer um café?
— Claro. Nossa, estou impressionado — falou olhando em volta.
A bela moça abriu um sorriso, pois sua casa era pequena, porém,
muito bem cuidada e organizada, tinha muito orgulho do lar que montou.
— Se eu der dez passos consigo atravessar toda a sua casa —
declarou, dando passos largos e retificando o que havia acabado de falar: —
Não, na verdade, nove são o suficiente.
Isso a fez fechar a boca em uma linha fina e revirar os olhos.
— Achei que Paolo fosse mais generoso.
— Ele é maravilhoso.
— Assim fico com ciúmes.
— Não me desrespeite, por favor. Chiara é como uma irmã para mim
— reclamou, colocando o pó na cafeteira italiana.
— E eu?
— É muito insistente. Afinal, o que faz aqui? O que aconteceu com a
sua boca? — indagou após reparar no homem com mais calma.
— Nada de mais. Queria conversar com você — respondeu sentando-
se em uma cadeira.
— Pode falar.
— Problemas no trabalho, só queria uma conversa distraída, colocar
as ideias no lugar.
— Trabalha com o quê? Está tendo muitos dias ruins ultimamente...
Agnes, por diversas vezes, se remoeu para fazer essa pergunta, no
entanto, não queria parecer muito interessada, mas ele estava na sua casa e,
pelo jeito, tinha uma consideração por ela, mínima que fosse então não viu
problema em sanar a dúvida que pairava há muito tempo em sua cabeça.
— Se eu te falar, você não me verá mais como um príncipe.
Ela riu tão alto e de forma tão natural, que até o assustou. Foi a
primeira vez que viu um sorriso sincero por parte da moça. No mesmo
momento seu membro pressionou a calça jeans e sua cabeça se encheu de
fantasias, dando-lhe ainda mais certeza de que a queria em sua cama.
— Foi a melhor piada que já ouvi na vida — comentou, colocando
café em duas xícaras. — A meu ver, você é, no máximo, o Shrek.
— Já é alguma coisa. Sem açúcar, por favor — disse, quando ela lhe
fez menção de adoçar o café.
— Quem sabe você me conte um dia — disse ela, apoiando a bandeja
na mesa de centro e sentando-se à sua frente.
— Já sei, vamos fazer um trato. Eu te conto isso no dia que sair
comigo para jantar.
— Minha curiosidade não vai tão longe assim.
— Tem certeza? Garanto que não vai se arrepender de sair comigo.
— Está bem.
Tiziano quase cuspiu o café. Estava tão habituado à palavra não, que
ficou surpreso com a brusca mudança de opinião da moça.
— Calma, porque também tenho uma condição. Se eu aceitar, você vai
me deixar em paz de uma vez por todas.
— Minha presença é tão indesejável assim?
— Você não é indesejável, mas eu vejo algo ruim ao seu redor e não
quero me envolver.
— Quem falou em se envolver? Só quero uma noite agradável com
uma linda mulher.
— Você concorda?
— Sim, eu aceito sua condição — respondeu, tomando um gole do
líquido quente —, mas só porque sei que você não vai mais conseguir ficar
longe de mim depois dessa noite.
— Tiziano, vamos ser sinceros?
— Teve alguma vez que não fui?
Ela revirou os olhos e continuou:
— Eu tive um único homem na minha vida inteira, então, não existe
isso de ficar com alguém só por uma noite. Mas o principal é que não estou
interessada em complicações e você é uma complicação ambulante... Não
entendo toda essa insistência.
— Uau. Bom — começou, levantando-se e indo em direção à moça —,
em relação à definição que me deu, infelizmente eu tenho que concordar —
disse ao pé do ouvido dela sem nenhum remorso. — Mas quanto ao resto, eu
prometo que não vou fazer nada que você não queira, porém, devo confessar
que tenho esperanças de que repense e se permita viver.
Agnes fechou os olhos, sentindo em seu ser que, se realmente fosse
àquele encontro, cairia na teia de Tiziano e isso acabaria tirando sua paz.
Um outro lado seu, contudo, ficou lhe dizendo que não faria mal algum se
arriscar.
A verdade era que tinha milhões de motivos plausíveis para desistir
daquela ideia maluca, só que àquela altura já não era a razão que respondia
por seus atos, mas as emoções.
Isso, contudo, não a deixava cega. Conseguia enxergar que o jogo da
conquista instigava o rapaz e que, quanto mais o desprezava, mais o
instigava. Também estava ciente de que quando ele conseguisse o que queria,
perderia a graça e nunca mais a procuraria.
Pela segunda vez teve sentimentos agridoces em relação ao jogo que
estavam fazendo. Mesmo assim, após pensar um pouco, resolveu mudar de
tática. Sabia que com isso estava arriscando se machucar como nunca antes,
mas não conseguiu se conter e disse:
— Vamos hoje.
— Gosto assim. Esteja pronta às sete — disse e saiu, deixando Agnes
meio tonta, bastante incerta e ao mesmo tempo eufórica pelo que viria.
Enquanto rumava para casa, Tiziano percebeu que metade de sua raiva havia
se dissipado e sentia a cabeça um pouco mais no lugar. Mesmo sem saber,
Agnes conseguiu tirar parte do peso que sentia sobre os ombros.
De repente, se pegou sorrindo. Nunca imaginou que ao ir vê-la sairia
de lá com um encontro marcado. Ele era um ser naturalmente invasivo que
conhecia suas qualidades e apostava nelas para conseguir tudo o que queria,
mas precisava confessar que estava surpreso e muito satisfeito.
O caminho de volta pareceu mais rápido, como se sua energia tivesse
sido recarregada.
— Quero falar com você — disse Antônia, que esperava por Tiziano
no escritório.
Ele foi até o bar, encheu o copo com gelo e uísque, pegou um charuto
na gaveta e apreciou, por alguns segundos, aqueles que, nos últimos anos,
vinham sendo seu refúgio.
— Não queria voltar a esse assunto, mas estou realmente preocupada.
— Que assunto, Antônia?
— Edoardo.
Tiziano revirou os olhos e respirou fundo.
— Só me ouve... — ela pediu. — Ele está escondendo algo, eu tenho
certeza. Hoje, quando você saiu, eu o vi em outro telefonema. Não consegui
ouvir, mas achei suspeito. Por favor, rastreie as chamadas, pelo menos para
tirar um peso das minhas costas, não custa nada.
— Está bem.
— Sério?
— Sim.
Antes que ela respondesse, alguém bateu na porta.
— Entra — disse o Don.
— Senhor, posso dar uma palavrinha? — pediu um dos soldados,
causando estranheza em ambos.
— Volto depois — disse Antônia entendendo o olhar do chefe e saindo
da sala.
Contudo, permaneceu por perto na intenção de ouvir algo.
— Chefe, acho que deveria saber que na noite do ataque, um soldado
viu o Sr. Pellegrini no jardim uns trinta minutos antes.
— E?
— Disse que ele estava agindo de forma estranha, que parecia
desconfiado.
— Por que só estou sabendo disso agora? E por você em vez do
soldado que o viu?
— Ele é novo e ficou com receio porque é o seu pai, só que achei
importante avisar, por isso vim assim que soube.
— Traga-o aqui.
Aquela conversa o fez se lembrar de que tinha que pensar em alguém
para substituir o chefe da segurança, e o quanto antes, levando em
consideração a situação em que se encontravam.
O nome de seu irmão lhe passou pela cabeça, no entanto, mesmo
achando que ele estava indo bem no processo de recuperação achava que
ainda era muito cedo para lhe incumbir tamanha responsabilidade. Não, o
caçula precisaria ter paciência até que estivesse apto para ocupar um cargo
de maior importância.
O soldado novato chegou e após quarenta minutos o questionando, ele
e o colega se retiraram, juntamente a Antônia, que fez questão de ouvir.
— Irmão — cumprimentou Leonello logo depois, entrando no
escritório.
— Sente-se.
— Alguma novidade?
— Talvez — disse e lhe contou o que acabara de saber.
— Eu não duvido nada que aquele filho da puta esteja por trás de tudo
o que anda acontecendo. Mas nós vamos pegar seus comparsas, sejam eles
quem forem.
— Ah, mas disso você pode ter certeza — falou com um sorriso
macabro no rosto.
— Mudando de assunto... A Antônia conversou com você sobre o
carcamano do seu subchefe?
— Se juntaram para fazer complô?
— Só temos uma opinião em comum e achamos que deveria ficar de
olho, só isso.
— Você nunca foi com a cara dele.
— E isso só me deixa mais desconfiado.
— Besteira, só não gosta de Edoardo porque ele ocupa o cargo que
era para ser seu, mas passou da hora de começar a separar as coisas,
Leonello, especialmente porque o único responsável por não estar nele é
você mesmo.
— Pode ser, mas ainda não consigo confiar, então, por via das
dúvidas, estou com a Antônia.
— Eu vou investigar, mas você ainda precisa amadurecer muito. Não
existe amizade verdadeira no nosso negócio. Quando o caldo engrossa, cada
um vai para o lado que lhe convém. Então, lembre-se que não importa de
quem você gosta ou não, o que interessa é a pessoa ser confiável e fiel ao
juramento feito à organização e aos seus irmãos. Um verdadeiro homem
feito, jamais trai sua organização.
— Sorte a sua que todos gostam de você.
— Eles gostam do que eu lhes proporciono, é diferente. Desde que
tomei o cargo, estão todos bem mais ricos. O que me deixa ainda mais
intrigado com tudo o que está ocorrendo.
— Sim, é estranho. Mas independentemente de quem for o traidor, a
punição tem que ser a mais severa possível, só pelos estragos que causou. Já
consigo pensar em algumas coisas...
— Então guarde-as para quando chegar a hora. Agora, vá sondar os
soldados, sem tocar no nome de Vito. Tenho certeza de que ele tem espiões
por aqui — disse Tiziano, levantando-se e dando a reunião por encerrada.
— Preciso ir me arrumar para sair.
Enquanto o chefe subia para o terceiro andar, Leonello saiu para fazer
o que lhe foi pedido.
Não era uma super responsabilidade, porém, não reclamaria. Juntaria
as migalhas até se reerguer.
CAPÍTULO 11
Imagino que devo ter sido a primeira mulher a deixar Tiziano Pellegrini
esperando. Não foi por mal, apenas quero que entenda que não estou
interessada e desista.
“Quem muito quer, nada ganha.”
Boa noite.
Será possível que não vou conseguir ter um minuto de sossego esta
noite?, pensou, chateado e desligou o aparelho.
Virna já estava sendo inconveniente, significando que seria necessário
dispensá-la de uma vez por todas.
Ficou irritando com esta insistência. Sempre fora sincero, deixava
claro, desde o começo, quais eram as suas intenções, mesmo assim elas
criavam o monstro da expectativa, alimentando-o diariamente com as ilusões
que os livros enfiavam em suas cabeças, o amor não existia e ponto final.
Tiziano nunca havia se apaixonado, de verdade, por ninguém, sempre
foi apenas sexo – e sempre nas suas condições –, mas elas sempre davam um
jeito de idealizá-lo como um príncipe que precisava ser resgatado da
escuridão.
Isso nunca aconteceria e por conta disso, teria achar uma mulher que
fizesse tudo que ele gostava, da forma que ele ordenava, pois Virna já era
carta fora do baralho.
Acendeu um charuto, para relaxar. O cheiro da fumaça se mesclou com
o aroma maravilhoso da comida que já havia impregnado o ar e o estragou
completamente. Que ideia idiota, o odor ficou péssimo e precisou abrir a
janela. Por sorte, estava chegando ao seu destino.
— Fique aqui e mande o outro carro se posicionar na parte de trás da
casa. Entre em contato caso veja qualquer coisa suspeita — ordenou Tiziano
para o motorista, que também era um soldado.
— Sim, chefe.
Tiziano desceu do carro e encontrou a porta entreaberta.
Franziu o cenho, achando aquilo estranho, e entrou, mesmo sem
convite.
— Boa noite — ouviu a voz melodiosa que não saía de sua cabeça.
Agnes se encontrava ao lado de uma mesa posta para dois, com cara
de quem sabia das coisas.
— Achou que eu ia cair naquela de ir até sua casa? O que pretendia?
Dizer que o motorista passou mal para eu ter que passar a noite lá?
Tiziano adorou a audácia da moça, não poderia dizer que ela não era
sagaz.
— Ele não iria passar mal, só iria embora mais cedo por um problema
familiar — confessou e voltou a olhar para a mesa. — Presumo que um
desses lugares é meu.
Agnes apontou para uma das cadeiras, autorizando-o a se sentar.
Ele se aproximou.
— Muito bom. Mas e se eu não viesse?
— Você se acha incrível e imprevisível, né? Pois saiba que é
justamente o oposto — declarou Agnes.
— E você acha que sabe mentir, mas é péssima nisso — constatou,
então mostrou a comida e o vinho: — Trouxe isso.
— Mas...
— Nada de mas — ele a interrompeu. — A Rita ficou algumas horas
preparando essa comida maravilhosa para a senhorita simplesmente não ir.
Você é uma beata sem coração.
E passando pela moça, foi em direção à cozinha.
Agnes sentiu o rosto pegar fogo, mas o seguiu.
— O que está fazendo?
— Vou desembalar nosso jantar.
— Mas eu fiz comida — declarou ela, finalmente.
— Então teremos um banquete.
Após suspirar dramaticamente, a anfitriã se rendeu e juntou-se a ele.
Enquanto ela ajeitava a comida nos pratos, o rapaz abria o vinho.
— O cheiro está maravilhoso.
— Pode ser, mas nenhum aroma se compara com o seu — galanteou,
chegando bem próximo e cheirando o pescoço da moça.
— Vamos? — chamou, desconsertada.
Agnes estava tensa, sem saber ao certo como se portar. No mesmo
momento em que parecia corajosa, desafiando Tiziano, sentia-se um bichano
acuado. Aquele homem era imponente e intimidador demais.
Somente aquela breve proximidade foi o suficiente para esquecer de
tudo que havia programado, começando pela parte de não beijá-lo, não
estava mais tão segura assim de que resistiria, afinal, um beijo não a
mandaria para o inferno. Ou mandaria?
— Você está bem? Parece um pouco aérea. É a minha presença? —
perguntou, sério.
— Na verdade, sim. Ainda não estou entendendo sua fixação nisso
tudo.
— Quero ser seu amigo.
— Amigo?
— Ficou decepcionada?
Agnes soltou uma risada nervosa.
— Você é ridículo... Quero dizer, claro que não.
Tiziano mudou de assunto, deixando-a mais tranquila e à vontade.
Logo, toda a tensão havia se dissipado e conversavam tranquilamente
sobre assuntos diversos.
Ao final do jantar, permaneceram à mesa, terminando a última taça de
vinho.
— Então... Vai me dizer no que trabalha? — ela quis saber.
— Vou sim, como te prometi, mas só quando eu for embora.
— Qual a diferença?
— Quero aproveitar o tempo que ainda tenho com você.
— Nossa, assim vou achar que é um mafioso — debochou, rindo alto.
— O mistério é a alma do negócio — respondeu ele após alguns
segundos, com uma piscadela.
— Sei — rebateu e se levantou, começando a recolher pratos e
talheres.
Tiziano a seguiu e quando ela se virou para voltar à sala, ele a
encurralou contra a parede. Ela arquejou, ele suspirou, porém, nenhum dos
dois avançou. Ficaram ambos parados, admirando-se mutuamente.
Ao redor, a única coisa se ouvia eram as respirações ofegantes,
embora Agnes tivesse certeza de que ele poderia ouvir as batidas de seu
coração, de tanto que galopava em seu peito.
— Nervosa? — inquiriu, pressionando levemente a mão no colo da
moça para sentir o quanto seu coração estava acelerado.
— Tire a mão daí — exigiu a jovem sem se mover.
Agnes vestia uma blusa branca rendada, com um decote em V e uma
calça preta justa. Nos pés, a moça fez questão de ficar descalça, pois a
verdadeira Agnes era assim, simples e livre para fazer suas próprias
escolhas.
Sentiu a necessidade de mostrar seu verdadeiro eu, para que o rapaz
não tivesse dúvidas de que ela não era como as grã-finas com quem
costumava sair.
— Sua pele parece uma seda — ele sussurrou.
Encabulada, a moça abaixou a cabeça.
— Você é uma caixinha de surpresa, não é? Por fora, uma leoa, mas
por dentro, não passa de um filhotinho tímido — provocou, levantando o
rosto da moça. — Vou te beijar — anunciou, deslizando a mão até a nuca,
agarrando os cabelos e puxando para si, acabando, por completo, com o
pequeno espaço que os separavam.
Tiziano invadiu a boca da moça sem delicadeza.
Ansiava sentir o gosto que tanto imaginou por tempos e não esperava
pela intensidade que veio somente de um beijo. Colou seu corpo no dela,
deixando evidente a ereção na barriga delicada da jovem.
Um não poderia sentir o quanto o outro estava molhado, mas era real o
desejo que somente suas peças íntimas tinham certeza.
As bocas eram como ímãs que não conseguiam se separar. Nunca,
Tiziano, apreciou tanto um beijo e apesar da vontade sólida de levá-la para
cama, se segu... Que se danasse o controle.
Quando fez menção de carregá-la o motorista entrou, atrapalhando
seus planos.
— Desculpe, senhor, mas temos uma emergência.
O rapaz respirou fundo e Agnes corou por completo, escondendo-se
por trás do corpo vultoso de Tiziano.
— Me desculpe por isso — falou se virando para sair.
— Espera — pediu a moça, chamando a atenção do homem. — Você
não me disse no que trabalha.
Não tinha mais o clima quente e descontraído de segundos atrás,
naquele momento, só havia tensão, pois a teoria de que talvez Tiziano fosse
uma pessoa ruim não era mais tão irreal assim.
— A noite não terminou, quem sabe no próximo encontro — declarou
deixando uma piscadela e saindo da casa.
CAPÍTULO 13
Não quero que entenda errado, nós nos beijamos, mas foi só isso. Tudo o que quero é a sua
amizade.
Oi, Agnes, vou mandar meu motorista te buscar. Já prepara esse cuzinho, que vou meter meu pau a
noite inteira.
Infelizmente não era a Agnes que ele desejava, mas para aliviar o
estresse, estava de bom tamanho.
Sem conseguir resistir, enviou uma provocação para sua Agnes, afinal,
não seria ele se não o fizesse.
Foi muito mais polido do que gostaria, porque se fosse sincero, falaria
que ela o estava deixando louco de tesão, a ponto de contratar uma prostituta
com o mesmo nome só para fingir que era ela quem estava em sua cama.
Fecharia os olhos, enquanto comia o segundo buraco apertado da
profissional enquanto gemia seu nome...
Mesmo com o sangue concentrado no meio das pernas, um filete de
bom senso soou em sua cabeça, interrompendo seus devaneios eróticos, e foi
capaz de parar e pensar. Havia acabado de chamar uma prostituta e enviado
uma mensagem para sua beata... Puta que pariu, desde quando se importava
com esse tipo de coisa?
Era o Tiziano que nunca havia se apaixonado e transava com quem
queria sem compromisso e ponto final.
O aparelho acendeu, mostrando que sua beata havia respondido:
Achei que iria adorar o presente. Que amizade é essa onde a pessoa nem liga para agradecer?
Acontece que eu gostei tanto que fui obrigada a varar a madrugada lendo.
Sabia que iria gostar. Você, geralmente, é previsível, mas tenho que admitir que fiquei surpreso
pelo seu gosto peculiar em ler sacanagem.
Chame como quiser, mas nunca julgue o livro pela capa. Ou pelo título.
Outra coisa, por acaso é fã também? Porque para saber o conteúdo, somente pelo nome é
impossível... A não ser que você tenha pesquisado. Foi isso?
É uma forma de me dizer para cair na real, por que contos de fadas não existem?
Realmente não existiam, mas ele ainda não iria quebrar a bolha em que
ela vivia, fazendo-a acordar para a cruel realidade, não tão cedo, deixaria
para depois.
Na verdade, os únicos e exclusivos motivos da escolha desse livro foram as cenas de sexo mesmo.
Não tem vontade de replicá-las?
Agnes permaneceu em sua casa tentando absorver tudo o que havia ocorrido.
Contudo, sabia que independentemente do que aconteceria depois, jamais se
arrependeria da decisão que tomou.
Durante aqueles momentos de paixão, viveu um turbilhão de sensações
que nunca imaginou algum dia experimentar.
Será que aquilo era uma regra ou a exceção?
Aquela era apenas uma das muitas perguntas que ficaram martelando
em sua cabeça. Perguntas estas que ela não sabiam se seriam sanadas.
Levaria tempo para o cheiro de Tiziano se dissipar do ambiente e
Agnes fez um pedido silencioso para que permanecesse ali, pois tê-lo em
seus braços foi a coisa mais incrível que já acontecera em sua vida.
— Agnes — chamou Chiara de sua varanda. — Você está bem?
Ela havia se deixado levar pelo momento sem perceber que seu
intervalo de almoço já havia acabado há mais de uma hora. Mesmo o casal
Castelli lhe dando total liberdade de horário, não gostava de se ausentar sem
uma boa explicação.
— Entra — solicitou Agnes, indo em direção à porta.
— Está tudo bem? — inquiriu desconfiada, entrando na sala.
— Tudo sim.
— Hmm! Vamos tomar um café?
— Claro.
Ambas foram para a cozinha e Chiara se sentou em uma das cadeiras
da bancada enquanto Agnes colocava a água no fogo e preparava a cafeteira.
— Então, como você está? — iniciou Agnes, sentando-se ao lado da
amiga.
— Estou ótima. E você, vai enrolar um pouco mais ou me contar como
foi?
— Como você sabe?
— Estou grávida, não cega.
O comentário a fez corar e após um suspiro, confessou:
— Foi incrível. Eu jamais pensei ser possível sentir as coisas que
senti hoje.
— Que mais? Quero saber tudo.
— Ele foi tão carinhoso e preocupado... Chi, eu nunca tinha chegado
ao orgasmo na vida e o Tiziano fez com que acontecesse duas vezes.
— Deve ter aprendido com o meu Paolindo.
As duas riram e Agnes foi preparar o café.
Ela adorava ver a paixão que existia entre o casal de amigos, com seus
olhares amorosos e apelidos carinhosos. Mesmo Paolo, sempre tão fechado
e polido na frente dos outros, deixava transparecer o quanto era louco pela
esposa.
Após dividir o líquido quente em duas xícaras, voltou a se sentar.
— E agora?
— Não sei. Senti que ele ficou um pouco perdido antes de ir embora.
Não sei se vai ter uma segunda vez.
— Você sabia das condições antes de mergulhar nessa, não é, minha
amiga? O que posso te aconselhar é para não esperar nada... Deixe as coisas
andarem no ritmo da correnteza.
— Eu sei... — disse, bebericando o líquido quente. — Me desculpe
pela ausência.
— Era seu período de almoço, não tem que se desculpar, fora que
você sabe que tem liberdade de horário, então não se preocupe. Só não deixe
Paolo ver essa sua cara de apaixonada — advertiu, rindo.
— Ei, vocês estão aí? — gritou o dito cujo do lado de fora.
— Vamos que ele deve estar doido atrás da gente. Não consegue ficar
dez minutos longe — declarou Chiara, divertida.
CAPÍTULO 20
Que tal nos vermos hoje? Quero tanto que topo até uma missa.
Já havia se passado quarenta e oito horas desde que o homem foi encontrado
desacordado e até aquele momento nem uma palavra havia sido dita.
Edoardo não conseguia ficar mais que vinte minutos acordado e
quando, por um milagre, estava alerta, dizia coisas sem sentidos. Era um
pouco desesperador, mas segundo os médicos, o rapaz estava melhorando e
logo poderia esclarecer todas as dúvidas que Tiziano ansiava em saber. Até
lá, contudo, a paciência teria que ser uma grande aliada.
O Don ia até o quarto que destinou ao amigo todos os dias e
acompanhava de perto a evolução de seu estado geral, mas sem forçar,
estava deixando as coisas acontecerem no tempo dele, com a calma que
somente Tiziano possuía.
Após visitar Edoardo, Tiziano seguiu para o escritório, pois havia
algo pendente que precisava resolver.
— Você está sempre fugindo — disse Tiziano assim que Agnes atendeu
ao telefone, sem ao menos dizer oi. — Pensou no que te falei?
— Sim — respondeu a moça.
— Então... O que me diz? — quis saber, ansioso.
Estava tomando um chá de cadeira enquanto aguardava uma resposta
para algo simples. Eles iriam continuar se vendo, sim ou não?
Isso porque nem mencionei o contrato de casamento ainda, pensou.
Quando isso acontecesse, aí sim, testaria sua paciência de monge.
Mas era algo em que pensaria muito bem a respeito antes de qualquer
decisão definitiva, pois mesmo com um contrato cheio de cláusulas bem
definidas, aquilo era algo sério, ainda que não acreditasse em casamento ou
amor.
— Sim.
— Sério? Não vou precisar nem insistir mais? Ou ficar te perturbando
na sua casa? — perguntou, rindo.
— Não, mas com uma condição.
— E qual seria essa condição? — perguntou, divertido, recostando-se
na cadeira.
— Na verdade, são duas... Mas só te falo a segunda se concordar com
a primeira.
— Estou escutando.
— Quero saber sobre seu trabalho. Tudo...
Agnes sabia que Tiziano Pellegrini não estava do lado dos mocinhos.
Mas mesmo querendo ouvir de sua boca tudo o que ele fazia, estava certa de
ainda iria querê-lo.
Continuava temente a Deus, e isso não mudaria jamais, porém, o que
passara a sentir pelo rapaz entrou como um tornado em sua vida, destruindo
tudo o que via pela frente e mesmo que ele não admitisse, ela sabia que o
mesmo acontecia em seu coração. Bastava tempo para colocar as coisas no
devido lugar.
— Se eu te contar e você me largar, terei que te matar.
— E se eu não largar? — perguntou, tentando manter a voz estável
após aquela ameaça.
— Então ficarei feliz em não ter que eliminar uma linda mulher como
você.
— Ótimo, então lá vem a segunda...
Tiziano estava até se divertindo vendo a mulher fazendo exigências
para o homem mais poderoso da Itália.
— Quero exclusividade.
— Exclusividade? — perguntou com a sobrancelha arqueada.
— Sim, porque se eu não tiver outro em minha, você também não terá.
Golpe baixo, pensou.
Mas só de ouvi-la falar em outro na sua cama, já ficava irritando,
então, teria que ceder pelos dias que ficassem juntos.
— Exclusividade então.
— Ótimo, agora tenho que ir.
— Vou mandar o motorista te buscar. Esteja pronta às oito, minha beata
— disse desligando o aparelho com um sorriso desenhado no rosto.
— Desculpe, chefe — falou Rita, aflita, entrando no escritório —, mas
o Edoardo acordou e está chamando o senhor.
Tiziano se levantou e seguiu direto para o quarto onde encontrou o
amigo acordado e o encarando fixamente.
— Saiam — ordenou aos seguranças e enfermeiros.
Quando estavam sozinhos, o Don se sentou em uma poltrona ao lado da
cama e esperou até que ele estivesse pronto para se abrir.
— Não sei por onde começar... — disse Edoardo com a voz rouca e
fraca.
— Pelo início, de preferência.
CAPÍTULO 24
Agnes ainda estava tentando digerir a conversa que teve com Tiziano,
pois tudo que ela tinha planejado, sobre não se envolver ou não cair na lábia
dele, já não valia de nada.
Quando foi trabalhar na vinícola ouvia, vez ou outra, o nome de
Tiziano em conversas específicas, sobre como ele era galanteador e outras
coisas relacionadas ao tema, mas nada a preparou para a visão dos céus que
teve quando o conheceu no casamento dos amigos.
Um bicho estúpido ficou voando loucamente no seu estômago quando
teve que se aproximar da mesa em que ele e Paolo conversavam, porém,
fingiu não se importar, apesar do olhar poderoso que lhe direcionava.
Convenceu-se de que ele lançava aqueles lindos olhos azuis para qualquer
coisa que estivesse usando vestido dentro do salão.
Com esse pensamento, simplesmente ignorou Tiziano e como punição,
pelas contemplações luxuriosas que teve com o rapaz, a moça sonhou com o
ex-marido naquela noite, a seu ver, era um claro sinal de que seus
pensamentos estavam indo longe demais.
Após a morte de Andrea, o tempo que passava lendo aumentou
consideravelmente, ela quase devorava um livro por dia, pois a única coisa
que a impedia de ler era o marido, e quando quis culpar alguém pelas
constantes aparições de Tiziano em seus pensamentos, apontou para autoras,
pois ninguém melhor para ser responsabilizada do que aquelas pessoas que
escreviam histórias maravilhosas com finais felizes.
Mal admitia aquilo para si, mas ao vê-lo pela primeira vez, sentiu que
foi amor à primeira vista, contudo, junto a esse sentimento tão lindo e puro,
veio algo a mais, um medo que não soube explicar, por isso optou pelo
distanciamento. Mas Tiziano era insistente e por mais que ela tentasse se
manter afastada, com o coração protegido, sabia que era questão de tempo
até se entregar, porque estava bem óbvio que o rapaz não iria parar enquanto
não conseguisse o que queria.
E lá estava ela, rendida a um amor que achou que seria platônico, mas
que estava se mostrando muito mais real do que poderia prever.
Mas isso tudo era em relação aos seus sentimentos, obviamente, mas e
os dele?
Ela não tinha um palpite, pois o rapaz possuía aquele jeito
descontraído, nunca falava que estava com problemas, mas ela conseguia ver
os sinais, como as constantes olheiras e o cheiro de bebida e cigarro já
impregnados nele.
A moça sabia que tudo girava em torno do seu trabalho, o qual ela
tinha apenas suspeitas a respeito do que era, porém, só iria ter a certeza
quando ouvisse da boca dele.
Ela queria, do fundo de seu coração, perdoar e passar por cima do que
ele que quer que ele tinha feito, mas ainda restava aquele medo de não ser
capaz de conviver com algo tão pesado, pois se ele realmente fosse quem ela
estava pensando, não tinha tanta certeza de que conseguiria relevar e seguir
em frente junto com ele.
— Oi, meu galã — disse Agnes para Andrea Mattia, que havia
acabado de chegar da escola.
— Oi, princesa — respondeu ele com um abraço apertado.
— Oi, senhorita — brincou Maria chegando logo atrás.
— Oi, minha pequena gênia. Como foram na aula?
— Ótimo. Não queria falar, mas o Andrea levou uma bronca da
professora hoje, porque estava andando de mãos dadas com uma menina.
— O quê? — perguntou, abismada.
— Você não consegue ficar calada mesmo, né? — retrucou o irmão. —
Não foi isso, quer dizer, não exatamente.
— Claro que foi. Vocês estavam se olhando igual o papai olha mamãe
e o tio príncipe à tia Agnes.
A mulher estava tomando água e cuspiu o líquido quando ouviu as
palavras da pequena. As duas crianças ficaram olhando, sem entender.
— Me desculpem... Vão tomar banho que sua mãe vai servir o jantar
de vocês. Vão, vão...
— Tudo que a senhorita quiser — falou o pequeno galanteador.
Os dois subiram as escadas com provocações e empurrões por todo
caminho.
Agnes pôde, enfim, rir da observação da ardilosa Maria Marietta e
limpar a bagunça de água que havia feito.
— O que foi? — perguntou Chiara, entrando na cozinha.
— Nada — respondeu sem jeito. — As crianças já chegaram e foram
tomar banho.
— Eu sei, dá para ouvir os dois se provocando lá do meu quarto —
declarou, rindo. — E você? Está maravilhosa. Sinto cheiro de Tiziano no ar
— palpitou despretensiosa.
— Pois é; ele vai mandar o motorista vir me buscar. Não vai mesmo
precisar de mim?
— Claro que não. Vá se divertir um pouco.
Naquele momento uma buzina soou no lado de fora.
— Vai lá, mulher, e aproveite!
— Pode deixar — disse, tímida, pegando a bolsa em cima do balcão e
saindo.
— Srta. Sforza — saudou o rapaz, abrindo a porta da Land Rover
preta e ela entrou.
O caminho foi tranquilo, exceto pela úlcera que se intensificava a cada
minuto que se aproximavam do destino.
Assim que o carro estacionou, Tiziano apareceu na porta de sua
fortaleza. Era tão lindo que chegava a ser ridículo.
— Bem-vinda, minha beatinha — saudou agarrado na moça.
O perfume dele era como uma injeção de endorfina, e ali, presa
naquele abraço, sentia que o mundo poderia desabar sobre eles que estava
tudo bem.
— Vamos entrar?
— Sim, claro, e pare de me chamar assim — repreendeu.
Tiziano a levou para a sala, enquanto o jantar não ficava pronto.
— Que bom que não me deu outro bolo, se não a Rita iria achar que
era pessoal.
Agnes riu sem jeito e se acomodou no grande sofá, mas só de senti-lo
perto, os pelos de seu braço já estavam eriçados.
Delicadamente, Tiziano passou os dedos sobre a penugem que revestia
seu braço.
— Adoro quando fica excitada só de ouvir minha voz. Me diga o que
você quer — pediu em um sussurro com uma mão na perna da moça.
— Você.
— Não. Quero saber exatamente o que e como você quer —
especificou, subindo chegando até a parte interna da coxa.
Agnes já não conseguia respirar normalmente, o coração estava
descompassado, porém, o que mais dava sinal de vida era seu sexo, já
ansioso para recebê-lo.
— Me toque — pediu um pouco sem jeito.
— Você pode melhorar — alegou, afastando a calcinha, indo ao
encontro de um clitóris excitado.
— Faça amor comigo, me come, me devore, me faça sua — suplicou
jogando a timidez para longe.
— Seu pedido é uma ordem — declarou Tiziano com um sorriso
debochado, pegou-a no colo e subiu até o segundo andar, para o quarto do
prazer, e fechou a porta atrás de si.
Foda-se, o jantar que esperasse, pensou e começou a tirar a roupa.
Quando Agnes se moveu para imitá-lo, ele a segurou.
— Não, eu gosto de fazer isso.
Tirou as botas da moça e, lentamente, subiu o vestido preto. Olhou
para Agnes, mas ela parecia absorta em um mundo paralelo.
Ao retirar a peça por completo, foi agraciado com um lindo conjunto
branco rendado.
— Se colocar uma asa em você, vai parecer um anjo de Deus, mas
com desejos lúbricos — disse, encostando todo o corpo no dela. — Gosto
assim — completou em seu ouvido.
No instante em que ela sentiu o membro duro fazendo pressão em sua
barriga, não pensou duas vezes e o tomou nas mãos. Com movimentos
firmes, começou a masturbá-lo, sem ter muita noção da quantidade força que
deveria empregar, estava apenas se deixando levar pelo desejo.
Assim que ele penetrou dois dedos no canal lubrificado e os gemidos
dos dois se unificaram.
De repente, os quadris de Agnes ganharam vida própria, estava
impossível se manter polida diante de tanto tesão. Os dedos longos entravam
e saíam sem a menor dificuldade e, sem perceber, Agnes estava totalmente
aberta para ele investir à vontade.
Mesmo a contragosto, ele parou o que estava fazendo e começou a
trilhar um caminho de beijos molhado, desde o pescoço até a boceta que
atormentava seus sonhos todas as noites.
— Nunca vou cansar de sentir seu gosto — disse, caindo de boca nela.
— Tiziano — ela gemeu, agarrada no lençol.
Os dedos já estavam brancos de tão forte que segurava o pano, como
se sua vida dependesse daquilo. Os olhos ainda permaneceram fechados,
para que pudesse desfrutar de todas aquelas sensações ao máximo.
Ele não se cansava, pois dar prazer para Agnes era como um vício e
vê-la tão entregue, satisfeita e feliz se tornava, cada vez mais, um caminho
sem volta.
Tiziano nunca acreditou em alma gêmea e toda essa baboseira, porém,
estava começando a ver de tudo aquilo sob uma nova perspectiva, pois
quando estavam ali, tão íntimos, ele sentia o quão ligados e perfeitos eram
um para o outro.
Os gemidos estavam mais intensos e o homem sabia que ela não
demoraria a gozar, por isso, rapidamente trocou a boca pelo pênis, que
estava latejando de excitação, e o movimento fez Agnes abrir os olhos, o que
o fez hesitar. Vendo aquilo, a moça iniciou movimentos com o quadril,
mostrando que queria mais, muito mais.
Ela queria senti-lo dentro de si e queria experimentar novas posições,
mas era muito tímida para pedir, contudo, ali, com o tesão falando por ela,
resolveu tomar uma atitude.
Parando os movimentos, segurou o quadril de seu parceiro para que
ele fizesse o mesmo, e se virou de costas.
Aquilo foi o suficiente para Tiziano entender e com um sorriso
travesso, ele a direcionou para que ficasse na posição correta.
— Apoie-se nas mãos, passa para os cotovelos... Isso, agora tenta
deixar o peito contra o colchão — explicou, segurando o quadril dela. — É
isso, que empinada gostosa.
Ia começar a meter, mas reparou que estava sem proteção.
Merda, onde estava com a cabeça? Olhou para a bunda da mulher,
excitada e pronta para ele.
Claro, bem ali, pensou.
Após encapar seu membro, entrou, bem devagarzinho, atento à
paisagem digna de quadro que estava tendo o privilégio de presenciar.
Agnes gemeu na primeira estocada e a cada gemido ela expressava as
descobertas sensoriais que Tiziano estava lhe proporcionando.
Não demorou para estar apoiada nos cotovelos, pois à medida que o
pau dele entrava e saía, mais necessidade sentia de empinar a bunda.
Estava começando a ficar bem difícil, para ele, se controlar. O tesão
estava em um nível estratosférico e quando sentiu a boceta dela se contorcer
e um grito poderoso sair de sua boca, Tiziano pôde mais segurar e encheu o
preservativo com sua porra.
Assim que ele saiu de dentro dela, ambos caíram satisfeitos na cama e
ficaram encarando o teto, esperando as respirações se normalizarem.
— Para quem é religiosa...
— Nem termine sua frase — alertou, divertida, arrancando uma risada
gostosa de Tiziano.
— Tizi.
Era a primeira vez que ela o chamava pelo apelido, embora já o
fizesse em pensamento.
O rapaz se virou para encará-la.
— Você é associado da máfia? — perguntou direta ao ponto.
— Não.
Agnes soltou o ar que estava preso no pulmão de alívio.
— Sou o chefe — declarou, também sem rodeios.
Ela engoliu em seco, mas não o afrontou, não teve coragem. Tiziano
estava sendo extremamente sincero, como ela pedira, e só naquele momento
entendeu por que evitou fazer a temida pergunta tantas vezes.
Só que em sua inocência, acreditava que ele fosse, no máximo, algum
associado, mas chefe? Aquilo jamais passou por sua cabeça. Estava sem
palavras e a tristeza que sentiu transbordou por meio de lágrimas.
— Vem aqui — disse o rapaz, puxando-a para si. — Não me orgulho
de ser o que sou, mas foi nessa família que nasci e eu não posso mudar o
passado.
— Mas pode mudar o futuro — disse em um sopro de voz.
— Não posso. Isso é o que sou.
Ela o encarou, com todo sentimento que carregava no peito, e percebeu
que mesmo sendo bombardeada com a verdade, seu íntimo ignorava o que
ele havia acabado de revelar. Só queria ficar dentro daquele abraço pelo
resto da vida.
— Vamos tomar um banho? — sugeriu limpando o rastro deixado
pelas lágrimas.
— Claro, vai indo que já vou — disse ela, levantando-se e viu Tiziano
fazer o mesmo e caminhar até o banheiro.
Olhando ao redor, franziu o cenho para a impessoalidade do local.
— Tiziano...
Ele parou e a encarou, aguardando pacientemente.
— Não é aqui que você dorme, é? Quer dizer, não tem armários, em
vez disso, tem um mastro bem no meio do quarto...
— Não, o meu fica lá em cima — respondeu, simplesmente.
— Hum! Está bem, já vou — respondeu com sorrindo forçado.
O peito de Agnes estava sangrando por mais de um motivo e o certo a
fazer era se vestir e sair do quarto que, ela adivinhou, ele usava para transar
com suas mulheres.
Ela estava com o homem mais poderoso da Itália, que poderia ter
qualquer mulher, e o fato de levá-la para seu quarto apenas mostrava que ela
não passava de mais uma entre tantas.
Constatar aquilo fez novas lágrimas descerem, prejudicando sua visão.
Mesmo assim pegou seu celular na bolsa e chamou um táxi. Não era de seu
feitio fugir de um problema, especialmente um que ela já previra, porém,
estava acima de suas capacidades manter aquele relacionamento.
Ela sabia que quando propôs que ficassem juntos, ele não a estava
pedindo em namoro – se é que um chefe da máfia namorasse –, mas ser
levada para o mesmo lugar onde ele transava com garotas de programa, a fez
cair na real e perceber que aquilo não tinha nada a ver com o que lia em seus
livros.
Foi por isso que se vestiu o mais rápida e silenciosamente que pôde e
saiu em disparada, deixando seu coração para trás.
CAPÍTULO 26
Por favor, não venha atrás de mim, porque não estou indo para a
vinícola, preciso de espaço.
Por que me bloqueou? Ainda não aprendeu que quando quero uma coisa eu
arrumo um jeito de conseguir?
Conversar por mensagem era coisa para jovens e Tiziano, no auge dos
seus trinta e seis anos, não tinha paciência para isso. Então pegou o telefone
e discou seu número.
Só que ela havia sido ligeira e desligou o aparelho antes que ele
ligasse.
Bom, se Agnes queria um tempo, ele respeitaria. Ela ainda teria uma
hora e meia até que ele chegasse à vinícola.
Tempo suficiente, refletiu e sem pensar duas vezes, largou todos em
sua casa e seguiu para vinícola.
Que se fodessem; ele não tinha que dar satisfação da sua vida para
ninguém.
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 32
Agnes acordou com um forte gosto metálico na boca. Sem nem mesmo
abrir os olhos, cuspiu para se livrar daquilo antes que vomitasse.
O caminho até o lugar onde estava foi longo, pelo menos para ela
pareceu uma eternidade, porém, a realidade era que estava em poder dos
sequestradores há quatro horas e não há dez, como parecia.
A felicidade que sentiu quando abriu os olhos no meio da noite e
achou que Tiziano havia voltado antes do previsto, se foi quando notou que o
perfume não era o mesmo. Mas antes que pudesse fazer alguma coisa, o
homem pressionou um pano em seu nariz e a última coisa que viu antes de
desfalecer foi o rosto do desconhecido iluminado pela luz da lua.
Desde então tinha acordado e dormido algumas vezes. Na primeira, se
viu trancada dentro de um porta-malas. Como não adiantava se desesperar,
pois dificilmente alguém a escutaria àquela hora da madrugada, optou por
ficar quieta.
O plano era ganhar tempo até Tiziano encontrá-la. Mas mesmo
pensando racionalmente, foi impossível evitar que algumas lágrimas caíssem
e só de pensar que sua razão a tinha alertado sobre o que poderia acontecer
inúmeras vezes, ficou furiosa consigo mesma por ter se deixado envolver
àquele ponto.
Ela estava arrependida? Não, jamais! Faria tudo de novo, pois, apesar
do medo que sentia, algo dentro de si lhe dizia que Tiziano a caçaria onde
quer que fosse.
Em meio a um milhão de pensamentos, estava cansada, desconfortável
e ligeiramente tonta. Os braços e pés estavam amarrados, mas algo
pressionando sua perna lhe chamou a atenção. Dedicou muitos minutos para
tentar afrouxar as cordas e, para sua sorte, a pessoa que a amarrou não havia
botado muita fé de que a moça tentaria se soltar.
Quando levou a mão até a coxa, não acreditou no que sentiu. Como
havia se esquecido?
Antes de dormir havia colocado o celular no bolsinho do pijama, para
que sentisse vibrar caso Tiziano ligasse. O fato de seu celular não ser tão
grande e de o shortinho ser bem folgado, acabou disfarçando e o
sequestrador não notou.
Imediatamente enviou uma mensagem para o rapaz, mas antes que
pudesse ter uma resposta, o carro parou.
Agnes, mais que depressa, escondeu o aparelho novamente, amarrou as
mãos (da forma que conseguiu) e voltou à posição original, fingindo que
estava desacordada.
— Viu? Não falei, babaca? — disse Giordano quando abriu o porta-
malas.
— Eu ouvi um barulho sim.
— Deve ter sido sua barriga enorme...
— Vai se foder — respondeu Costa, observando a moça no pequeno
espaço. — Olha só... Você amarrou ela igual sua bunda.
— Prendi do jeito que sei, não sou a porra de um marujo.
— Até uma criança amarraria melhor que você — falou virando
Agnes, sem delicadeza, para apertar a corda.
Após ficar satisfeito, virou-a novamente para prender as pernas e viu a
ponta do celular saindo do bolso.
— Puta que pariu, Giordano, seu imbecil... Ela estava com um celular
esse tempo todo.
— Será que ela acordou? — inquiriu o homem puxando-a pelo cabelo
para ver se ela emitiria algum som. — Acho que não — constatou.
— mas o que a gente faz?
— Só joga essa merda fora e pronto.
— Ele já deve ter rastreado... Puta que pariu, que merda —
desesperou-se Costa.
— Foda-se, joga no mato. Ainda faltam algumas horas para chegarmos
e, daqui, poderíamos ir para qualquer lugar, não tem como ele saber...
— Temos que avisar o Carrasco.
— Comeu merda? Quer morrer? Finge que nada aconteceu e ninguém
vai ficar sabendo.
— Não sei não. Se eles descobrirem...
— É só você manter essa boca fechada. O mais difícil nós
conseguimos, agora é só entregar a mercadoria e pronto. Vamos logo.
O homem pegou o aparelho e antes de se livrar dele, pisou repetidas
vezes em cima, para ter a certeza de que havia quebrado.
Foi difícil para Agnes se manter inerte quando, na verdade, queria
chorar devido a dor que sentia no couro cabeludo pelo puxão que levou.
Porém, não poderia reclamar, pelo contrário, sentia-se agradecida por estar
com dois idiotas que não conseguiram nem ao menos desconfiar de que ela
havia acordado e conseguido contato com Tiziano.
— Dá o cheirinho para ela... Só para garantir o restante do caminho —
ordenou o homem que arremessava o celular no meio do matagal.
E aquela foi a última coisa que Agnes ouviu antes de acordar ali, com
aquele gosto metálico.
Após colocar todo o sangue acumulado na boca para fora, abriu os
olhos e olhou ao redor.
— Oi, lindinha, desculpa por isso — disse apontando para a poça de
sangue no chão. — Você é mais pesada do que aparenta e um daqueles
idiotas te deixou cair.
— O que estou fazendo aqui?
Ganhar tempo, repetia para si.
— Você não sabe? — perguntou o rapaz que aparentava ter sua idade.
— Não.
— Seu namoradinho precisa aprender uma lição e nada melhor que
você para ensinar isso a ele.
— Sou mais uma entre tantas... Por que acha que eu tenho algum valor?
O rapaz se aproximou...
— Não tente me enganar, lindinha, porque não sou idiota. Sabemos
mais do que imagina...
— Quem são vocês?
— Somos muitos.
— Você sabe que ele virá atrás de mim e acabar com vocês, não é?
O rapaz se afastou dela rindo alto.
— Sabemos, linda, é justamente por isso que está aqui — declarou
dando uma piscadela. — Você é a nossa isca, estamos nos preparando para
recebê-lo em breve.
Agnes pensou em um palavrão, mas se conteve para não verbalizá-lo.
Aquele era o plano desde o começo e, para piorar, mandou uma
mensagem pedindo para ir socorrê-la. Que idiota, acabou ajudando os
babacas sem querer... E sem seu aparelho não tinha como se comunicar e
pedir para não ir.
Quase riu daquele pensamento. Ela não conhecia Tiziano há muito
tempo, mas sabia que ele iria atrás dela de qualquer jeito, com ou sem
mensagem, então só lhe restava rezar, pedir a Deus que acabasse tudo bem.
— Acho que devo até agradecer por ter aparecido na vida dele —
continuou o rapaz.
— Agradeça me soltando.
Ele riu novamente.
— Não tão rápido... Você é nossa melhor chance de conseguir o que
queremos há tanto tempo.
— Por favor... Eu não tenho nada com isso — implorou Agnes.
— Tem sim, minha cara. Se não quisesse problemas, não deveria ter se
metido com um filho da puta como aquele... Bom, vou te deixar descansar um
pouco, pois logo, logo teremos grandes emoções.
E se virou em direção à saída.
Estava escuro e mal conseguia observar os detalhes em volta. A única
luz provinha de uma fraca lamparina localizada ao lado da porta.
Antes de a fechar lá dentro com cinco guardas, o homem se virou e
falou:
— A propósito, meu nome é Samuele — disse dando uma nova
piscadela. — Lembre-se disso.
Esse nome era familiar, porém, não fazia ideia a quem pertencia e para
ele ter falado, Agnes chegou à conclusão de que deveria ser alguém
conhecido em busca de vingança ou algo parecido. Isso ou ele tinha certeza
de que ela não sobreviveria para contar a alguém.
Suspirou pesadamente. Estava chateada por não poder fazer nada e
angustiada por saber que Tiziano apareceria ali a qualquer momento.
Ficou a sós com os cinco soldados mal-encarados.
Nem para ser os dos dois idiotas que a tinham levado para lá,
pensou, com eles, talvez conseguisse algo.
Mesmo assim tentou puxar assunto algumas vezes, arrancar alguma
informação, contudo, não obteve sucesso, ficou falando sozinha, até que
desistiu e resolveu economizar energias para o que estava por vir.
Dentro do casarão, sentado no sofá, Samuele falava tranquilamente ao
telefone, com a lareira acessa ao fundo, os pés sobre a mesa de centro e uma
taça de vinho na mão.
— Ela já está aqui, pode se tranquilizar.
— Não precisa me aconselhar, moleque. Tudo o que quero é que cuide
bem dessa vagabunda, pois, com os rastros que deixamos, ele deve aparecer
aí em, no máximo, setenta e duas horas.
— Estamos prontos, Carrasco.
— Eu quero só ver, você sabe como ele é cheio de armações.
— Não dessa vez, estamos na frente dele e com algo que ele deseja.
— Por falar nisso... Já teve notícias da Antônia?
— Não — vociferou, apertando a haste da taça. — Ele a pegou, tenho
certeza.
— Ótimo, assim podemos negociar...
— Vamos trocar a Agnes pela Antônia?
— Deixaremos ele pensar que sim, para no fim matarmos os dois.
— Não podemos colocar minha irmã em risco — disse preocupado.
— Ela ficará bem... Os acontecimentos não poderiam ter sido mais
sincronizados. Perfeito! — comemorou.
— Com todo respeito, estou preocupado com minha irmã. Ela...
— Ela sabe se cuidar, quem vê pensa que você não a conhece,
Samuele.
O rapaz tirou os pés da mesa e assumiu uma posição ereta,
demonstrando sua raiva e nervosismo, mas o Carrasco não poderia ver e
mesmo se pudesse, não estaria nem aí.
— Fica aí com seus pensamentos sórdidos — declarou sem
preocupação. — E se acontecer qualquer coisa fora do planejado... Já sabe,
não é? Estou observando as câmeras.
Desligaram a chamada, mas Samuele ainda estava apreensivo. Sua
irmã sempre foi um assunto delicado em sua vida. Muitos jamais
entenderiam a ligação que tinham. E se ele havia entrado naquela vida e feito
papel de idiota perante todos por anos, foi por ela e para ela. E continuaria
fazendo.
CAPÍTULO 33
— Ela já sabe que você vai mandá-la para outro país? — indagou
Edoardo para Tiziano que olhava o jardim de sua casa através da janela do
escritório.
Quando chegaram em casa, pouco antes do amanhecer, as emoções
estavam escrachadas. Depois do que passaram, não havia mais espaço para
mentiras ou jogos entre eles, somente o mais puro e sincero sentimento sendo
descoberto e explorado por ambos em momentos ternos e outros de puro
desejo e desespero.
O medo de perdê-la foi real e palpável de todas as maneiras e não
poderia arriscar sentir aquilo novamente. Então, enquanto velava o sono da
amada, pensou que se ela continuasse ali, jamais ficaria segura. Foi quando
teve a ideia de mandá-la para outro país.
Somente ele iria saber a localização dela, até que conseguissem
resolver os problemas com os traidores da organização. Ela era seu ponto
fraco e todos sabiam disso, não poderia deixá-la à mercê dos inimigos.
Proteger a vida dela era sua nova missão.
— Não — respondeu, sorvendo o último gole de café de sua xícara.
— É, meu irmão, vai ser uma tarefa difícil convencê-la — previu
Leonello.
— Eu sei, mas vai ser melhor assim. Quando essa confusão acabar,
trago ela de volta.
Leonello riu sem humor.
— Isso nunca vai acabar — afirmou Edoardo, externando os
pensamentos do rapaz.
— Dessa vez sou obrigado a concordar com ele — disse o caçula a
contragosto.
Ele e Edoardo ainda não conseguiam se dar bem. Com o tempo, o
convívio melhorou, pois o subchefe via o esforço do irmão caçula para
vencera dependência, porém, a confiança era algo difícil de se construir.
E após a chegada de sua filha o clima havia ficado ainda mais tenso.
— Vou conversar com ela, tenho certeza de que entenderá... — afirmou
mais para si mesmo. — Enfim... Não quero que me levem a mal, mas nem
vocês saberão onde ela estará.
Leonello levantou as mãos em sinal de agradecimento e Edoardo
acenou afirmativamente com a cabeça.
— E a Antônia? — perguntou o subchefe olhando para Tiziano, mas a
pergunta era para Leonello.
— Eu estou aqui, Edoardo — chamou atenção o rapaz. — Quando
quiser saber alguma coisa que esteja sob a minha jurisdição, é só me
perguntar. E respondendo seu questionamento, ela vai sobreviver... Pelo
menos, por enquanto. Colocamos Samuele em outro local, mas é hoje que a
festa vai começar.
— Leonello, vamos agir com inteligência. Precisamos ter calma e
paciência, porque tenho certeza absoluta de que Samuele vai falar em pouco
tempo. Mas antes, vamos encaminhá-los para nosso outro galpão.
— Por que, chefe? — inquiriu Edoardo.
— Ontem, quando estava conversando com Samuele na sala, ele olhou
para um ponto no alto da parede, era uma câmera... Domenico não conseguiu
rastreá-la, mas tenho certeza de que o cabeça estava observando tudo e o
galpão onde eles estavam é bem conhecido, por isso, neste exato momento,
Michele, Davide, cada um com uma equipe, estão levando os dois,
separadamente, para outro lugar — declarou tranquilamente ainda em pé.
— Filhos da puta.
— Bom... Vou conversar com a Agnes e espero vocês lá fora em uma
hora.
Tiziano se retirou e subiu as escadas até seu quarto.
Agnes ainda estava dormindo com o lençol de seda dourado cobrindo
apenas parte de seu quadril.
Ele ficou ali, admirando-a, igual à porra de um cachorro babão.
Os pulsos e as pernas da moça ainda possuíam as marcas da corda e o
canto esquerdo de sua boca estava maculado por um corte.
Dos males o menor, disse a si mesmo diante do que poderia ter
acontecido.
Sentou ao seu lado e começou a afagar seus cabelos longos.
— Bom dia — Agnes cumprimentou, espreguiçando-se.
— Boa tarde — falou divertido. — Assim vai ser difícil conversar...
— falou, apontando para o corpo completamente nu, depois que o lençol
escorregou para o lado.
Agnes se considerava uma nova mulher. Abriu a visão para todos os
assuntos da sua vida, se permitiu arriscar, errar e tentar de novo se fosse
necessário, mas nunca desistiria ou passaria vontade.
Tiziano era seu grande aliado, lhe ensinava e mostrava tudo o que o
mundo poderia fornecer de bom e de ruim também.
A antiga Agnes jamais dormiria pelada ou pior, instigaria ao ponto de
ver seu companheiro em brasa.
— Posso ao menos me arrumar antes?
— Claro, mas se continuar a me provocar assim, vai ser difícil
concentrar uma quantidade de sangue suficiente na cabeça de cima.
— Controle seus instintos — provocou.
Agnes se sentou na cama, fez uma prece rápida, sob o olhar de Tiziano,
e foi ao banheiro pentear seus cabelos, escovar os dentes e colocar, ao
menos, um roupão.
Em menos de quinze minutos estava de volta, Tiziano permanecia na
sacada deixando o sol esquentar um pouco a pele.
— Está tudo bem? — perguntou a moça.
Tiziano sentou em uma das cadeiras dispostas na sacada e puxou a
moça para seu colo.
— Acho que não tem uma forma branda de falar, então serei direto.
Acho que aqui você ainda corre riscos... Penso que seria melhor você ficar
fora por um tempo.
— Fora? Como assim? Sozinha?
— Você sabe que não posso ir, mas irei te ver sempre que puder... Só
até as coisas esfriarem por aqui.
— Ir para aonde?
— Para um lugar que somente eu saberei. Também enviarei meu
soldado mais leal, o Michele, para cuidar de você.
— Meu lugar é ao seu lado.
— Se algo te acontecer... — disse acarinhando o rosto da moça. —
Jamais vou me perdoar. Você aceitou viver minha vida, indo contra tudo o
que acreditava, não é justo eu te colocar nessa posição de perigo.
— Eu sabia quando aceitei...
— Eu sei, mas essa não é sua vida, entende?
— Agora é — afirmou correspondendo ao carinho. — Mas se você se
sente mais seguro assim, tudo bem, eu vou. Mas quero que saiba que será por
um tempo determinado, somente até as coisas se tranquilizarem por aqui.
— Dois meses, no máximo, e tudo estará resolvido.
— Sem nem um minuto a mais... Outra coisa, uma visita a cada quinze
dias, nada mais do que isso.
— Você é boa demais pra mim sabia disso, minha beata? — declarou
apertando a bunda da moça.
— Será que algum dia poderemos ser um casal normal? — inquiriu
Agnes, esperançosa.
— Normal? Não, mas poderemos tentar chegar o mais próximo
possível disso. É o suficiente?
— Estar com você é tudo o que importa e se para isso vou ter que te
dividir com a organização, assim será. Mas posso escolher onde irei passar
os dois meses sabáticos? — perguntou divertida.
— Claro que sim, exceto por Ibiza.
Agnes fez beicinho, com um falso pesar.
Tiziano a fitou sério.
— Só você pode brincar com as pessoas? — inquiriu, deixando uma
piscadela maliciosa e entrando no quarto.
— Ei... Desde quando você é desaforada assim?
O rapaz a seguiu para dentro e após fazerem sexo debaixo do chuveiro,
chegou ao local combinado, com trinta minutos de atraso, onde Edoardo e
Leonello já o aguardavam.
Seguiram para o novo galpão onde Antônia e Samuele os esperavam
presos, um ao lado do outro.
A moça permanecia com o olhar esnobe e tinham que admitir que a
vagabunda era dura na queda, não deixava se abater mesmo suportando dias
das mais variadas torturas. Já o rapaz, estava com o olhar amedrontado que
se intensificou assim que os três entraram no cômodo.
— Boa tarde — disse Tiziano, animado. — Vamos direto ao assunto,
está bem? Samuele, priminho querido, seja bem-vindo.
O Don se aproximou de Antônia, retirou a faca do cós da calça e se
abaixou, mirando a arma branca na mão de sua ex-conselheira.
— Vou te explicar como vai ser a brincadeira... A cada pergunta que
eu fizer e você mentir ou não responder, vou arrancar um dedo dela. Está
bem? Devo avisá-lo de que sou bom nisso.
Leonello se sentou próximo, divertindo-se internamente com o
espetáculo, enquanto Edoardo permanecia com o olhar impassível,
observando de longe.
— Vamos lá... Quem está por trás de tudo isso? Sim, por que vocês
não acham que eu vou acreditar que orquestraram toda essa merda sozinhos,
não é?
Samuele estava com os olhos arregalados, olhando para Antônia que
fazia uma negativa com a cabeça.
— Você pode ter até tentar, primo, mas não faz parte desse mundo —
observou Leonello com um sorriso torto.
Tiziano pressionou a faca e extraiu o primeiro dedo da prima, o
arremessando, propositalmente, em cima de Samuele.
O garoto gritou e se contorceu mais que Antônia.
— Ainda tem dezenove chances e eu tenho todo o tempo do mundo.
Mirou no próximo dedo e pressionou o fio contra a pele úmida e
gelada da mulher.
— De quem vocês recebem ordens? — perguntou novamente.
— Do Carrasco, do Carrasco — expeliu aos berros.
— Tudo bem, imbecil, mas quem é o Carrasco? — inquiriu Leonello
sem paciência.
— É o Vito — disse, ainda chorando. — Pelo amor de Deus... É o
Vito.
— E surpreendendo um total de... Zero pessoas — debochou Tiziano
olhando para o irmão mais novo depois para Edoardo, que já estava ao
telefone mandando soldados para a casa de Vito.
— Ele prometeu a chefia para Antônia.
— Cala a boca — esbravejou a prima.
— Cala você, vagabunda — censurou Leonello.
— O que mais? — incentivou Tiziano pressionando daquela vez, a
mão inteira da moça.
— Nós iriamos matá-lo depois... — assumiu por fim desesperado.
— Não disse que seria moleza?
— Eu sempre soube que aquele desgraçado era meu pai, porque antes
de morrer minha mãe me deixou uma carta — confessou a moça em um
fiasco de voz. — Quando ele me sondou com a proposta eu aceitei, também,
como uma forma de me vingar dele.
Leonello riu sem humor.
— Não deu muito certo, não é?
— Sabíamos do risco — admitiu Samuele.
— Se vingar dele? — inquiriu Tiziano. — Você sempre foi ambiciosa
e, até certo ponto, eu achava isso um ponto positivo, mas jamais imaginei
que fosse tão burra a ponto de me trair. Se queria se vingar era só ir lá e
meter um tiro na cara dele, mas se prestar a esse papel? Vocês estão em um
nível abaixo da estupidez.
— Vamos? — incentivou Leonello, já se levantando. — Seria bom
pegar o Vito com nossas próprias mãos... Posso acabar com ele?
— Pode, estou tentando ser um homem melhor mesmo — gracejou
Tiziano, ouvindo uma gargalhada do caçula.
— Me mata no lugar dela, por favor... Ela é o amor da minha vida.
— Vão viver esse amor no inferno então — falou o caçula
empunhando sua arma.
Atirou primeiro na cabeça de Antônia e viu Samuele se jogar ao chão,
desistindo, de viver.
— Ela conseguiu enganar vocês direitinho, seus otários — afirmou
Samuele logo antes da bala perfurar seu crânio.
Os três homens se entreolharam.
— Merda — esbravejou Tiziano. — Tem alguma coisa nessa história
que eles não falaram.
— Ele deve ter falado da Antônia, não? — especulou Edoardo, se
aproximando.
— Não — concordou Leonello. — Também acho que tem algo a mais.
— Vamos logo — apressou Tiziano. — Temos que pegar Vito o quanto
antes.
CAPÍTULO 35
Carrasco
10 notificações.
— Esse desgraçado não era mesmo o mandante, não que ele não
tivesse merecido essa morte, mas...
— Calma, vamos pedir para Domenico rastrear.
— Claro, ele não ia ter capacidade de pensar nisso tudo, mas... Quem?
— Ainda tem os Massimos e alguns nomes influentes que gostavam da
forma que Vito gerenciava, todos eles são suspeitos...
— Vamos até o Domenico — ordenou.
— Não é melhor trocar de roupa? — perguntou vendo o quanto
Leonello estava desgrenhado e sujo de sangue dos pés à cabeça.
— Foda-se, vamos assim mesmo.
No caminho, o celular de Leonello tocou e o rapaz atendeu no viva-
voz, já que era ele quem estava conduzindo.
— O quê? — atendeu sem humor.
— Sr. Pellegrini, precisamos de alguém da família aqui no hospital,
tem uma papelada para assinar... — declarou o médico da famiglia.
O rapaz suspirou.
— Deixa que eu vou — afirmou Edoardo, querendo ser útil naquele
momento.
— Obrigado — disse sem jeito. — Assim que eu deixar isso com o
Domenico, vou direto pra lá.
— Claro — respondeu.
— Sr. Pellegrini — chamou o médico ainda na linha. — O senhor está
aí?
— Dez minutos — sentenciou desligando o telefone.
Leonello o deixou no hospital, enquanto ia pessoalmente levar o
aparelho para o hacker. Estavam, um a um, eliminando as peças daquele
tabuleiro xadrez, para, enfim, chegarem até a rainha.
CAPÍTULO 41
Clicou na foto, para reconhecer de quem era o número e aquele não era
um bom momento para ver a foto de Carmela de biquíni na praia e ainda se
colocando à disposição.
Achou melhor não responder por ora.
Logo em seguida o subchefe lhe encaminhou a foto de uma folha de
papel que ele encontrou em cima da cama de sua mãe, que dizia:
HÁ HÁ HÁ!
Maldita!
A vida de Leonello, a partir daquele momento, teria somente um
propósito, colocar as mãos em Ludovica, pois se ela achou que iria armar
um circo, influenciar um monte de cabeça fraca e sair empune, estava muito
enganada.
A hora dela chegaria e como diria seu irmão, a paciência era uma
virtude. Bom, ele teria que treinar mais isso para ser um Don pelo menos
parecido com Tiziano.
Quando o barco parou no píer do casarão, sentiu uma nostalgia
enorme. Lembrava-se vagamente de já ter estado ali em algum momento
quando era viciado.
Estava exatamente como se recordava, contudo, fora não estava ali
para admirar a paisagem ou tomar um banho de mar, por isso, seguiu para
dentro da casa e foi recepcionado por Michele.
— Cadê ela?
— No quarto, dei o último sedativo há algumas horas, logo ela acorda
— informou o soldado.
— Vou lá esperar.
— Sim, senhor.
Leonello subiu as escadas e se acomodou na poltrona. Ficaria ali o
tempo que fosse necessário.
Estava com tantas coisas na cabeça que ao se olhar refletido no
espelho próximo à onde estava sentado, não se reconheceu.
Roupa desgrenhada, barba por fazer, cabelo bagunçado e profundas
olheiras... Poderia, facilmente, ser confundido com um zumbi. Não percebeu
quando fechou os olhos e não soube por quanto tempo permaneceram
daquela forma.
Acordou assustado quando uma mão gelada caiu sobre a sua.
Quando abriu os olhos, deu de cara com Agnes abaixada ao seu lado,
segurando sua mão. O estado dela não estava muito diferente do seu, exceto
que os olhos da jovem estavam bem vermelhos, parecendo duas pimentas.
Leonello a abraçou, consolando-a. Naquele momento, nada não
precisou ser dito, o aconchego de seu abraço foi mais significativo que
milhões de palavras.
Ficaram ali, perdidos em lembranças e tristeza por alguns minutos.
Agnes tomou a iniciativa de se afastar para falar algo, mas quando
abriu a boca não saiu som algum.
— Tudo bem — disse o rapaz. — Estou aqui para te apoiar, você
nunca vai ficar desamparada, te dou minha palavra.
— Duas vezes — comentou finalmente.
Leonello não estava entendendo o que ela queria dizer, franziu o cenho
em confusão.
— Já é a segunda vez que fico viúva.
— Nossa, eu não sabia, você... Ele...
— Tudo bem — falou ela limpando as lágrimas. — Talvez,
futuramente, eu entenda tudo isso, mas agora... É impossível, só vejo dor.
Leonello não era bom em consolar ninguém, muito menos sentimental,
mas via sofrimento em cada pedaço dela e aquilo o comovia.
— Ele te amava.
— Eu sei e o que adiantou? Não consegui fazer com que saísse desse
mundo.
— Nascer na máfia é como ser marcado com ferro, nunca sai de nós
— esclareceu pegando as mãos dela. — Não temos escolha...
— As pessoas sempre têm escolhas.
— Não a gente — discordou. — Mesmo quando você sai, ela, de
alguma forma, volta.
— Ele merecia ser amado... — falou com mais lágrimas brotando nos
olhos.
— Ele foi, e me conforta saber que me irmão conheceu o amor antes
de morrer.
— Queria ter mostrado mais, porque o amor é algo lindo de ser
vivido, uma bênção de Deus.
Terreno perigoso, pensou ele.
Deus sempre fora um tabu em sua vida. Sofria há tanto tempo que
nunca acreditou nEle, afinal, se fosse tão bom assim, porque deixou que
tantas coisas ruins acontecesse com eles?
— Eu sei o que você está pensando, era o mesmo que ele pensava —
acrescentou a moça caminhando até a varanda, parando no batente e se
encostando.
— Nossa criação foi... Diferente.
— Sei disso — falou olhando compadecida para o rapaz. — Mesmo
assim eu agradeço. Esses últimos meses foram maravilhosos e sei que jamais
vou encontrar alguém como seu irmão, que me fazia rir e ficar furiosa na
mesma medida em questão de segundos. Jamais vou amar como o amei.
Mesmo tendo sido por pouco tempo, foi o suficiente para ser eterno.
— Posso imaginar — concordou, observando a moça, admirando sua
maturidade —, e tenho certeza de que você também foi única para ele.
Agnes de aproximou e pegou na mão do rapaz.
— Eu espero que você tenha sabedoria quando encontrar um amor,
pois esse sentimento é puro demais para deixá-lo partir por falta de interesse
ou medo. Tenho certeza de que ele está em um lugar ótimo, melhor que o
nosso, e apesar de sentir que morri um pouco também, vou cumprir meu
papel aqui na terra, independentemente do tempo que ainda tenho. Mas
passarei o restante dos meus dias com saudades, o desejando ao meu lado
com todo meu amor, imaginando o quanto nossa vida teria sido
maravilhosamente perturbada e contando os minutos para reencontrá-lo.
Agnes iniciou mais um ciclo de choro e nada, nem ninguém, conseguia
acalmá-la. Era algo triste de se ver, como se seu coração tivesse sido
arrancado do peito.
CAPÍTULO 43
Ficar sozinha naquela ilha já não era mais um problema para Agnes.
Com o passar do tempo, ela se ambientou completamente e começou a
apreciar sua própria companhia.
Percebeu que se sentia muito amada na vinícola, porém, lá não era seu
lar. Foi ali que encontrou o que procurava.
Michele a ensinou a pilotar o barco e ia toda semana ao centro buscar
mantimentos e qualquer outra coisa que precisava. Conseguia se virar muito
bem, porém, Leonello insistiu que Rita fosse morar com ela para ajudar com
a casa e outras coisas.
A mulher era muito reservada, contudo, podia-se dizer que estavam
começando a criar um vínculo ao conversarem sobre a vida pessoal da
governanta, afinal eram somente as duas fazendo companhia uma para outra.
Uma vez por mês recebia a visita de Leonello e da família Castelli.
Apesar de Tiziano ter aberto uma conta no nome de Agnes, dias antes
do leilão, e ter lhe deixado dinheiro suficiente para cem vidas, Leonello
queria estar presente e não apenas porque prometeu cuidar da moça, mas
porque eram a única família um do outro e já haviam criado um laço de
irmandade muito forte nos últimos meses.
Ele conseguia ver muito de Simona em Agnes, por isso, com ela,
conseguiu ser quem realmente era, e não o Don que precisou se tornar.
— Bom dia, Rita — saudou Agnes, animada.
— Bom dia, querida, que animação boa.
— Sim... Vai ser muito bom receber as pessoas que amo.
Tinha noites que a moça não dormia chorando com as lembranças de
Tiziano, mas estava em um processo e para ela, não tinha problema nenhum
em viver o luto, afinal a saudades seria eterna, então aprendeu a conviver
com a nostalgia.
— Que bom, senhora.
— Já falei para não me chamar assim — disse a moça após pegar uma
maçã da fruteira. — Os quartos estão prontos?
— Estão, acabei de terminar.
— Que ótimo, obrigada, Rita. Bom, vou até o centro buscar algumas
coisas. Quer algo em especial?
— Sozinha? Melhor não — disse olhando para minha barriga.
— Estou grávida, não doente.
Agnes estava com seis meses de gestação e toda semana Leonello
mandava um médico ir visitá-la acompanhado de aparelho de ultrassom e o
rapaz sempre voltava com amostras de sangue da moça.
Ela queria ter o bebê na ilha, por isso, já havia conhecido até uma
parteira que morava no centro e a velha senhora estava preparada para ser
chamada a qualquer momento, por sorte o marido era pescador, então
poderia estar no casarão em pouco tempo.
Mas Rita não escapou de uma aula sobre parto, afinal, nada era muito
garantido quando se dependia do mar. No início das aulas, a governanta
ficou horrorizada e fugiu das explicações; só voltou depois de Agnes
convencê-la com todo seu carisma.
Estava mantendo uma gestação muito saudável e sendo muito bajulada
por seus amigos.
Descobriu que estava grávida no dia que soube da morte de Tiziano.
Após sua menstruação atrasar alguns dias, foi até o centro com Michele e
comprou um teste de gravidez na única farmácia da ilha.
Quando viu que dera positivo, foi do céu ao inferno em questão de
segundos, mas logo percebeu que aquele bebê fora enviado por Deus para
que ela não desistisse de seguir seu propósito. Também foi depois disso que
decidiu ficar naquela casa, que era tão importante para Tiziano. Era lá que
tinha o santuário que ninguém conhecia, mas onde conseguia se sentir mais
próxima de seu amor.
— A maré está alta e não há previsão de chuva, não se preocupe —
pediu, rindo depois de receber um olhar reprovador da governanta.
Chegou ao vilarejo minutos depois e ao contrário da primeira vez em
que esteve ali, já conhecia a todos pelo nome, assim como todos a
conheciam.
Comprou todos os mantimentos que estavam em sua lista, em especial,
o antiácido que não poderia ficar sem. Para garantir, comprou dois, porque
aquele menino levado gostava de fazer a mamãe ficar com refluxo terrível.
Rapidamente voltou para casa, pois já estava quase na hora dos
convidados chegarem. Era a primeira vez que conseguiria reunir a todos:
Chiara, Paolo, as crianças e Leonello. até mesmo Edoardo estava a caminho.
Rita a aguardava, no deck, sentada no banco de ferro.
— Achou que eu ia fugir? — brincou descendo do barco com as
sacolas.
— Não, mas sabia que viria cheia de coisa... Me dá aqui.
— Acredita que o Sr. Giovanni quis se separar? — disse Agnes
ajeitando a corda da embarcação.
— Se separar? — perguntou pegando todas as sacolas para si.
— Sim.
— Velho safado — observou Rita.
Agnes riu, pois a governanta era bem radical em certos assuntos,
lembrando sua mãe em certos momentos.
— Se não estavam felizes... Qual o problema? Temos sempre que ir
em busca da nossa felicidade, Rita.
— Depois de velho? — inquiriu a mulher entrando pela cozinha. —
Coitada da esposa dele...
— Nunca é tarde para recomeçar — falou em uma voz saudosista e
uma onda de melancolia a atingiu.
— Nosso coração só pertence a uma pessoa, minha filha — disse a
senhora tocando no peito da jovem. — Se você conseguir recomeçar é
porque não tinha encontrado seu verdadeiro amor.
Uma lágrima escorreu do rosto da moça, mas ela logo a limpou.
— Bom... Vamos começar a preparar esse almoço? — disse para
mudar de assunto.
— Claro — anuiu Rita depositando um beijo em sua testa.
Fizeram o almoço juntas e logo o assunto foi deixado de escanteio,
pois Rita estava realmente chocada com o fato de o velho Giovanni ter se
separado de dona Brígida.
Estavam no meio crise de risada quando Agnes ouviu o barulho do
motor de um barco.
Animada, apressou-se em ir receber a todos no deck.
Chiara foi a primeira a descer, e depois de lhe dar um abraço
apertado, lhe acarinhou a barriga amorosamente.
— Que saudade de vocês — anunciou a amiga.
— Nós também — respondeu Agnes com a mão no ventre.
Em seguida, as crianças desceram frenéticas e a moça as agarrou,
demorando no abraço, tentando matar as saudades que sentia dos dois.
— Tia, você está bem gorda, né? Parece a mamãe antes dos pestinhas
nascerem — observou Maria Marietta.
Todos riram.
— Você é muito indiscreta mesmo. Ela está linda — cortejou Mattia.
— A tia está um pouco acima do peso mesmo — brincou Agnes
enquanto a pequena fazia uma careta para o irmão.
— A gente pode ir brincar no quintal?
— Claro que podem.
O casal de gêmeos saiu correndo em direção ao gramado, onde Agnes
havia instalado uma casinha de boneca, um balanço e um escorrega.
Por fim, Paolo desceu trazendo os bebês gêmeos, Piero e Amaele.
— Meu Deus... Como eles estão lindos — falou Agnes, apaixonada.
— E você? Como está? — inquiriu Paolo sempre preocupado.
— Estou bem — disse com um sorriso lindo.
— Dá licença para eu cumprimentar meu sobrinho — falou Leonello
abrindo passagem e se abaixando na frente da cunhada, sem escutar seu
cumprimento. — Olha quem chegou — disse ele para a barriga. — Exato,
seu tio preferido. Trouxe o marshmallow que eu sei que você adora.
— Você sabe que está ridículo falando sozinho, não é? — observou
Paolo olhando com o cenho franzido.
— Não liga, Leo — intrometeu-se Chiara —, ele também fazia isso.
— A cada dia que passa, o respeito se acaba um pouquinho mais —
observou o vinicultor, rabugento, indo em direção à casa.
— Oi, Agnes, como você está? — perguntou Edoardo sempre contido.
— Bem, obrigada por perguntar... Vamos entrar, pessoal? — chamou
no exato momento em que alguns soldados saíram de dentro do barco
carregando mais de dez caixas.
— O que é tudo isso?
— Presentes — respondeu Leonello.
— Que exagero — advertiu a moça. — Para que tanto?
— Você mora no meio do nada, precisa de reservas. Levem lá para
dentro — indicou aos soldados e a guiou para dentro.
O clima durante o almoço foi descontraído, preenchido com muita
risada.
Pouco depois de comerem, as crianças acabaram dormindo, cansadas
de tanto correr. Os gêmeos também estavam descansando no carrinho.
— Agnes, estava pensando em fazer a cerimônia de batismo dos bebês
aqui. Você se incomodaria?
— Está maluca? Seria uma honra — disse sinceramente feliz.
— Ótimo que concordou, porque em duas daquelas caixas já tem tudo
que precisamos — declarou Chiara com um sorriso convencido. — Vou
começar a arrumar tudo hoje, quero que seja no nascer do sol.
— Não seria no pôr do sol?
— Não... No nascer mesmo.
— Está bem, teremos que acordar bem cedo, hein?
— Sim, todos nós, já que vai ser a madrinha.
— Que honra. Mas e a madrinha do Piero?
— Vai chegar amanhã bem cedo.
— Ainda bem que concordei, né? — brincou Agnes caindo na
gargalhada. — Você é terrível, já veio com tudo armado.
— Claro, quero batizá-los antes de o Gianni nascer.
— Nossa, acho que nem tenho um vestido decente para usar.
— Eu também pensei nisso.
Agnes cerrou os olhos.
— Tem alguma coisa que você não pensou?
— Acho que não... Trouxe roupa para minhas duas madrinhas; iguais,
diga-se de passagem, assim como para os padrinhos. Quanto a comida, eu já
tinha falado com a Rita. Nós teremos um belo café da manhã.
— Mas, lindo, se bem te conheço — completou Agnes.
Chiara começou a arrumar o gramado para o batizado enquanto Rita
fazia uma deliciosa pizza caseira para jantarem e Paolo ficou incumbido de
olhar as quatro crianças, o que quase o deixou louco.
A noite terminou com todas as barrigas cheias e a promessa de uma
linda cerimônia, logo pela manhã, o que motivou que todos fossem dormir
cedo.
Agnes colocou o celular para despertar antes das cinco e por causa da
gravidez, foi difícil se obrigar a levantar.
Chiara já havia deixado seu traje separado e quando o colocou e se
olhou no espelho, ficou emocionada. Malditos hormônios que tinham que
agir apenas por se ver de branco, cor tradicional das madrinhas.
Depois de se recompor, desceu as escadas e encontrou todos na sala.
— Uau, nunca vi tanta gente reunida a essa hora — brincou juntando-
se a eles.
— A madrinha me ligou, está chegando com o padre — anunciou
Chiara animada. — Pega um que eu pego outro — completou, referindo-se
aos bebês.
— Vamos? — chamou Leonello tomando a frente.
Chiara realmente havia arrasado na decoração. Estava tudo lindo e
simples, com flores para todos os lados e uma linda casinha de madeira onde
o padre abençoaria os dois lindinhos.
Será que ela havia levado aquilo na mala também?
Encontrava-se sentada quando ouviu o som do motor do barco.
— Finalmente... Vou lá buscá-la — anunciou Paolo.
— Bem na hora, o sol está quase saindo.
Olhou para o horizonte onde o céu ganhava nuances amarelados. Logo,
um alaranjado sutil, mas muito brilhante, começou a se destacar na medida
em que o astro-rei despontava na linha entre o céu e o mar.
Agnes estava hipnotizada. Ainda que morasse ali, não era muito
acostumada a se levantar àquela hora. Muito embora achasse que jamais de
acostumaria com tamanha beleza.
Leonello parecia estar no mesmo transe, assim como Edoardo.
Maria e Mattia já tinham se livrado do mal humor matutino e não
largavam os brinquedos nem por um decreto divino. Então Chiara havia
desistido de chamá-los, tê-los perto somente na hora da foto já estava de
bom tamanho.
— Vamos começar, pessoal? — chamou Paolo ao seu lado.
— Vamos — falou Agnes, levantando-se.
Quando se virou, ela achou que estivesse alucinando e sua vista
escureceu.
Não tinha ideia de quantos segundos perdeu a noção de tempo e
espaço, mas quando tomou consciência novamente, estava sendo amparada
por ele.
— Tiziano? — falou com um misto de sentimentos.
Olhou ao redor para ter certeza de que todos viam a mesma coisa.
Edoardo parecia atônito e ao mesmo tempo inconformado. Já Leonello
tinha um sorriso malicioso no belo rosto. Paolo e Chiara também sorriam,
mas era de pura felicidade.
Tiziano, por sua vez, não conseguia tirar os olhos da barriga de sua
garota.
— É meu, né? — quis confirmar.
— Seu desgraçado — bradou ela aos prantos, dando seguidos tapas no
peitoral do rapaz. — Como você pôde fazer isso comigo? Tem ideia do
quanto eu sofri? Do quanto chorei?
— Calma — falou ele segurando suas mãos. — Depois que você foi
raptada eu percebi que nunca estaria segura e não poderia viver com esse
perigo te rondando, você não merecia essa vida.
— Por que não falou comigo? Por que tanto tempo?
— Não pude, por favor, me entenda, nem o Leonello sabia onde eu
estava. Fiquei esses meses como nômade, pulando de país em país para não
ser reconhecido, afinal, Ludovica ainda está por aí.
— Não vou sentir pena de você... Fiquei aqui sozinha, chorando sua
ausência quase todas noites desde...
— O que são algumas noites comparadas a vida que teremos juntos, e
o melhor, sem máfia ao nosso redor.
— Vocês armaram isso?
— Só assim para sair da máfia, lembra? — deu de ombros. — Só
Leonello sabia que eu estava vivo, mas nem com ele eu tinha contato.
Precisava sumir de verdade.
Agnes limpou as lágrimas que não paravam de descer e Tiziano a
pegou no colo em um abraço carregado de saudade.
— Todas as noites eu sonhava com seu cheiro, louco para voltar, mas
não podia.
— Como eu senti sua falta — admitiu, permitindo-se relaxar e
agradecer por Deus ter operado um milagre. — E, é claro que é seu, idiota.
— Não acredito que vou ser pai — falou como se só tivesse se dado
conta naquele momento. Acariciou a barriga quando o bebê chutou. — Eu
nunca mais vou embora — afirmou, ajoelhando-se e dando um beijo no
ventre de sua garota.
— Ei... Me desculpem, mas já deu o tempo e o sol já praticamente
nasceu por completo. Vamos começar? — sugeriu Chiara com lágrimas nos
olhos.
— Claro... Ei, você vai ser meu par? — perguntou Agnes animada. —
Ainda não estou acreditando que está comigo de novo.
— Eu te amo e nunca mais vou precisar ir embora — afirmou dando
outro beijo apaixonado nela.
— Eu também. Acho que te esperaria pelo resto da vida, mesmo sem
saber se você iria voltar.
— Eu contava com isso — falou o rapaz acariciando seu rosto.
Todos tomaram seus lugares.
— Vamos, minha beata?
— Vamos — falou com um grande sorriso estampando o rosto. — Mas
não pense que ainda não temos muito o que conversar...
O padre se posicionou no lugar e Agnes notou algo de estranho.
Quando se virou para trás estavam todos sentados nas cadeiras,
emocionados.
Parecia um... Casamento!
Quando se deu conta, já era tarde, estava no altar improvisado, com
sua mão grudada na de Tiziano e o olhar profundo do rapaz nela. Aquele
olhar pelo qual se apaixonou, com uma mistura de paixão, ironia e entrega,
tudo junto naquele mar azul.
De mãe solo, viúva pela segunda vez e mulher convicta de que viveria
para o filho, passou a ser a criatura mais realizada do mundo.
Eles começariam do zero e escreveriam um novo começo.
EPÍLOGO
FIM
OUTROS LIVROS DA AUTORA
AMOR E OBSESSÃO
(L I VRO Ú N I CO )
Quando adolescente, Lucy Allen se apaixonou perdidamente por Hector Bullock, mas após uma
grande decepção, ela deixou tudo para trás e foi em busca de seus sonhos. Hector, por sua vez,
tinha inúmeras responsabilidades e não pôde se dar ao luxo de fazer o mesmo.
Muitos anos se passaram, ambos se tornaram profissionais bem-sucedidos, mas seus corações
nunca esqueceram o amor de sua juventude. E isso se torna visível quando eles se reencontram.
Contudo, antes de poderem viver esse amor, precisarão contar com a ajuda da destemida Amber
Carter, uma investigadora linha dura que não descansará enquanto não resolver os crimes que
surgiram em sua pacata cidade.
– DISPONÍVEL NA AMAZON –
TRECHO DO LIVRO
Prólogo
Sammy Witkin ainda era bastante jovem e por causa disso, ela e
Trinity Lewis era linda e vinha de uma família com grande poder
aquisitivo. Seu pai fora o diretor de uma das maiores fábricas da cidade e
era visto como um homem respeitável e honrado.
Até que tudo ruiu.
Há alguns meses ele fora preso por desvio de dinheiro. Estava viciado
em jogos de azar e essa foi a maneira que encontrou para conseguir pagar
suas dívidas e, assim, poder jogar mais.
Quando isso veio à tona, ela perdeu o pai, a casa onde morava e toda a
estrutura familiar na qual crescera, regada a muita ostentação. E não teria
volta. Após o escândalo, seus pais se separaram de forma nada amigável e,
sem ter onde morar, ela e a mãe tiveram que ir para a casa da avó materna.
Tudo isso, infelizmente, gerou outras consequências. A mudança
brusca em seu estilo de vida afetou seriamente a saúde mental de Trinity,
cuja principal característica era a presunção. Muito por conta da inversão de
valores de seus pais, que, para evitar qualquer confronto, sempre lhe deram
o que queria. Devido a isso, sua adaptação a essa nova realidade estava
sendo muito mais difícil.
Já a mãe da jovem, Beatrice, não pudera se dar ao luxo de apenas se
sentar em um canto e lamentar. Ela precisou arrumar um emprego e tudo o
que conseguiu foi uma vaga de garçonete em um restaurante no centro da
cidade.
Sua ‘cegueira intencional’ e a despreocupação para com o futuro
estavam lhe cobrando um alto preço e o arrependimento lhe visitava todos os
dias ao se olhar no espelho pela manhã.
Mas o que mais a assustava era enxergar que havia criado um monstro,
um lindo monstro cheio de vontades que se recusava a aceitar o que o pai
fez, que culpava a mãe, que fora tão vítima das circunstâncias quanto ela, e
continuava querendo viver como antes.
E tudo só piorou depois que Hector, com quem a garota namorara por
mais de um ano, terminou o relacionamento. Não apenas porque ele lhe
serviria de escada para que voltasse ao topo novamente, mas porque, sem
que quisesse, acabara se apaixonando loucamente por ele. Do jeito dela, é
claro.
Porém, quando Hector Bullock se envolveu com Trinity, ela se
mostrara doce e agradável, mas depois de algum tempo aquela máscara
começou a cair e o rapaz, que era extremamente educado e gentil, logo
percebeu a incompatibilidade que havia entre eles. E mesmo com a garota
usando o problema do pai para chamar sua atenção e fazê-lo sentir pena
dela, ele resolveu dar um fim a algo que já não estava funcionando há muito
tempo.
Ele havia tentado terminar algumas vezes antes, porém, a jovem
voluntariosa sempre ameaçava tirar a própria vida e ele acabava
retrocedendo em sua decisão. Mas toda paciência e bondade têm limites e a
de Hector já havia acabado. Não estava feliz e se recusava a continuar com
alguém tão instável e menos ainda a se responsabilizar por suas loucuras.
Apesar da boa situação financeira de sua família, ele nunca se
acomodou ou se vangloriou do que possuía. Fora criado com alto senso de
dever e uma grande noção a respeito do certo e do errado adquiridos tanto
da mãe, enquanto esta estava viva, quanto do pai que, aliás, sempre fora seu
espelho.
Era por causa dele que iria estudar engenharia civil. Queria seguir os
passos do homem que sempre foi um exemplo de dedicação e humildade,
nunca deixando que o dinheiro interferisse em seu caráter.
Mas para seguir com seus objetivos, não poderia ficar com uma
pessoa superficial como Trinity, por mais bonita e gostosa que ela fosse.
Desde que haviam terminado – ainda que a ex continuasse marcando
terreno –, ele já havia conhecido e até mesmo ficado com algumas garotas,
mas nenhuma delas fizera seu coração acelerar como havia acontecido com
Lucy.
Hector ficou fascinado por ela. Seu sorriso doce e olhar sedutor
cravaram fundo em seu coração e, mais do que isso, sentiu como se já a
conhecesse há uma eternidade. Ficou imensamente frustrado quando a ex
chegou e atrapalhou aquela que estava sendo a melhor interação que tivera
em meses.
Exatamente por isso, foi atrás do e-mail dela, queria surpreendê-la e
deixar claro que estava interessado.
Assim que conseguiu, dois dias depois, ele mandou uma mensagem que
foi recebida quando Lucy estava em seu quarto lendo um livro.
No momento em que ouviu o alerta de notificação em seu computador,
anunciando a chegada de um novo e-mail, ela se levantou e foi até a
escrivaninha.
E quando viu quem era o remetente, precisou se sentar, pois
imediatamente sentiu as pernas ficarem meio bambas e o coração acelerar a
ponto de quase conseguir ouvi-lo em meio ao silêncio em que se encontrava.
Está mais interessada em saber como consegui seu e-mail do que no assunto que quero
conversar?
O que faço com você, Lucy Allen?
Agora sim. Só tem um problema, não dá pra falar por e-mail, você vai ter que sair comigo pra
saber.
Ele realmente desejava vê-la novamente. Constatar aquilo fez uma luz
de agitação piscar em seu coração.
Com mãos suadas, deixou o diário de lado e escreveu uma resposta
evasiva, não queria parecer tããão interessada.
Ótima tentativa.
Que bom que aceitou, quero muito que a gente se conheça melhor.
Te pego na sua casa amanhã às 8 da noite.
Um beijo.
As coisas estavam acontecendo tão rápido que ela mal podia acreditar.
Toda a sua programação do dia seguinte já estava planejada e sair com
Hector certamente não estava no script.
Optou por não responder ao último e-mail com medo de parecer
entusiasmada demais, contudo, ela queria esse encontro, queria demais. E o
amplo sorriso em seu rosto era prova disso.
Estava louca para o sol dar lugar a lua o quanto antes.
Mas até lá, tinha muita coisa para fazer. Seu dia estava realmente cheio
dos compromissos que sua mãe planejara. Além de irem ao salão de beleza,
as duas foram fazer algumas compras e, para arrematar, tomaram um sorvete
no fim da tarde. Todas aquelas atividades ajudaram bastante para que o
tempo passasse um pouco mais depressa.
Contudo, antes de dormir, voltou a se perguntar como ele havia
descoberto seu e-mail e, mais importante, onde ela morava, uma vez que não
lhe pediu o endereço. Aquilo, entretanto, não a preocupou, sabia que no dia
seguinte lhe arrancaria todas as informações, embora já tivesse uma ideia de
com quem ele estivera conversando.
Era dessa forma carinhosa que seu dia começava desde que ela e
Hector trocaram números de telefone.
Eles estavam em perfeita sintonia e se viam sempre que suas agendas
de estudos permitiam. Faltando uma semana para o final do ano letivo,
ambos estavam em fases decisivas de suas vidas.
Hector, em seus recém-completados vinte anos, iniciaria o curso de
engenharia e pretendia fazer administração, também; queria estar bem
preparado para herdar a empresa da família quando o pai se aposentasse. Já
Lucy, no auge dos seus dezesseis anos, não via a hora de começar a
faculdade assim que as férias de verão acabassem.
As provas finais e os trâmites necessários para o ingresso nas novas
instituições de ensino, tomavam bastante tempo de ambos, pois a dedicação
aos estudos era uma das coisas em comum, contudo, eles sempre davam um
jeito de se ver e já planejavam como fariam para se encontrar futuramente,
afinal, eles iriam para estados diferentes a fim de realizar seus sonhos e isso
já pesava um pouco no ânimo do casal apaixonado.
E foi com o coração apertado que digitou:
Eu também.
Mas vamos resolver isso hoje à noite, pqna, tenho uma pergunta p te fazer.
Hahaha. Não!
E não adianta me pressionar pq só vou falar pessoalmente.
Tudo bem.
Até mais tarde.
Hector tinha um sorriso no rosto quando colocou seu aparelho celular
sobre a mesa de cabeceira. Na verdade, era assim que todos o viam há quase
dois meses, desde que seu relacionamento com Lucy engatou.
Felizmente Trinity havia desaparecido. Nada de visitas inoportunas,
ligações ou mensagens. Hector a conhecia muito bem e achava aquela atitude
muito estranha, mas não ousava nem questionar. Preferia pensar que sua ficha
havia caído e a ex-namorada estava seguindo sua vida.
Esperava estar certo, mas bem no fundo havia uma pontinha de
preocupação, tinha medo do que Trinity aprontaria quando descobrisse sobre
ele e Lucy.
Sorriu, bastava evocar nome dela para que seu humor mudasse.
Cada vez que se encontravam, algumas barreiras eram ultrapassadas e
a intimidade entre os dois aumentava. Sabia que sua garota era virgem e
nunca forçaria a barra, todavia, estava cada vez mais difícil se segurar e
sabia que o mesmo acontecia com ela.
Quando a noite chegou, ambos estavam ansiosos. Hector por causa do
que pretendia propor e Lucy porque sempre que ia se encontrar com ele
ficava uma pilha de nervos.
Daquela vez ela optou por uma roupa mais descontraída, maquiou-se
levemente e passou seu perfume preferido e tão elogiado por ele.
— O que acha de vermos um filme hoje? — perguntou Hector, com o
carro ainda parado em frente à casa da moça.
— Perfeito! — exclamou Lucy alegremente.
— Ótimo, porque eu queria te levar para a minha casa, mas meu pai
não vai estar lá — avisou e esperou sua reação.
— Sua casa? — indagou ela, pigarreando.
— Sim. Mas foi apenas uma sugestão, se você não se sentir à vontade
com isso, nós podemos ir a outro lugar — sugeriu, mesmo a contragosto.
— Hum, não, não tem problema, vamos para a sua casa — respondeu,
subitamente nervosa, mas decidida.
Aquela seria a primeira vez que estariam sozinhos, exceto dentro do
carro, entre suas idas e vindas ao centro da cidade.
— Tem certeza de que está tudo bem? — perguntou ele, preocupado
com o silêncio dela.
— Tenho, sim. O que iremos assistir?
— Bom, eu adoro cinema e tenho um grande acervo de DVDs para
escolhermos. Estou certo de que encontraremos algo que vai nos agradar.
Lucy aquiesceu, sentindo-se um pouco mais segura. Tinha certeza de
que Hector nunca a pressionaria a nada, embora achasse que ele não
precisaria fazer isso. A interação entre eles estava cada dia mais íntima e ela
se sentia arder sempre que ele a beijava.
Interrompeu o fluxo de pensamentos quando atravessaram os portões
de uma imensa propriedade. Ela sabia que ele era abastado, mas pela casa
que via a sua frente, constatou que era muito além do que poderia imaginar e
a cada passo que dava lá dentro ela ficava mais encantada com o que via.
Eles chegaram a uma sala de TV onde havia sofás superconfortáveis e
a maior TV que ela já vira. Em uma parede havia uma estante com os DVDs
anteriormente mencionados. Hector a guiou até lá, indicou a parte onde
estavam os lançamentos que nem ele havia assistido ainda, mas a deixou à
vontade para escolher o que quisesse.
Enquanto ela fazia isso, foi à cozinha e em pouco tempo o barulho de
milho estourando e o cheiro delicioso e característico tomava a casa.
Hector voltou da cozinha com um grande pote, além de duas latas de
refrigerante, e se acomodou ao lado de Lucy que já havia escolhido um
suspense. Adorava esse gênero e acompanhada seria perfeito.
Por vários minutos o casal assistiu ao filme e comeu as pipocas como
se não estivessem se dando conta de quem estava ao lado, contudo, a tensão
que sempre havia entre eles foi aumentando, tornando-se quase palpável e
quando, como num filme, suas mãos se encontraram dentro do pote de
pipoca, foi impossível continuar fingindo.
Eles se olharam e na mesma hora Lucy soube o que iria acontecer. E
mais importante, viu que ansiava por aquilo. Já fazia algum tempo que se
achava pronta para seguir em frente, se entregar a Hector, senti-lo dentro de
si...
Parecendo notar sua determinação, ele colocou o pote sobre a mesa de
centro e, sem pressa, aproximou o rosto do dela.
Foi Lucy quem tomou a iniciativa de colar os lábios nos dele e no
instante seguinte estavam se beijando alucinadamente. E por mais que não
fosse do feitio de Hector forçar uma situação, o desejo que aflorava da pele
deles era tangível demais, ainda assim, obrigou-se a perguntar:
— Tem certeza de que quer continuar?
— Mais que tudo — ela disse e ele percebeu que era verdade.
Antes de prosseguir e fazer aquilo que ansiava há tantos dias, Hector
respirou fundo e disse:
— Lembra da pergunta que queria te fazer? — Lucy balançou a
cabeça, mesmo com ele segurando seu rosto com ambas as mãos. — Quer
ser minha namorada?
O sorriso que ela deu foi mais que suficiente para ele saber o quanto
se alegrara com aquela pergunta, mas ele queria ouvir.
— Sim, é o que eu mais quero — externou e mais uma vez iniciou o
beijo.
Naquele interlúdio, o ruído ofegante de suas respirações era
interrompido apenas pelo som vindo da Tv.
— Eu te desejo tanto... — declarou Lucy, surpreendendo até a si
mesma.
Sem hesitação, Hector a pegou no colo e a carregou escada acima em
direção ao seu quarto. Sabia de sua responsabilidade a partir daquele
momento, mas não conseguiria voltar atrás. Desejava aquela garota mais que
tudo.
Depois de fechar a porta com o pé, ele a colocou, delicadamente,
sobre sua cama e ficou admirando a boca marcada por seus beijos, os olhos
enevoados de desejo e nunca a achou tão linda.
Sem pressa, começou a tirar-lhe as roupas, aproveitando para deixar
beijos suaves em cada parte que era desnudada. Quando terminou, achou que
o zíper de sua calça fosse explodir, tamanho o desejo que sentia. Sua
vontade era se despir e logo em seguida se enterrar nela, mesmo sabendo
que depois disso estaria perdido. Mas não poderia. Aquela era a primeira
vez de sua garota e ele faria o máximo para que fosse perfeito.
Deitou-se sobre ela novamente e a beijou devagar, porém,
ardentemente. Contudo, sem que ele esperasse, Lucy começou a tirar sua
camisa de dentro da calça e a tocar a pele quente de suas costas. Sem
conseguir se conter, ele gemeu e esfregou a ereção contra o seu centro,
fazendo-a ofegar.
Aquilo não demorou muito, pois as mãos de Lucy saíram de suas
costas e começaram a desafivelar seu cinto (com uma destreza que
surpreendeu a ambos) para, em seguida, abrir sua calça.
O aroma que exalava do corpo masculino era afrodisíaco e a estava
enlouquecendo.
Sem pensar, enfiou a mão dentro da cueca dele e tirou seu pênis para
fora. O prazer que aquilo causou o fez emitir um rosnado gutural que pareceu
atravessar a coluna de Lucy, fazendo-a estremecer.
De repente, o peso de Hector sobre o seu corpo sumiu e ela o viu de
pé à sua frente, arrancando as roupas desesperadamente. Teve que sorrir
quando percebeu que as mãos dele tremiam quando tentou colocar a
camisinha e se sentiu muito poderosa.
Fechou seus olhos quando ele voltou para cima dela e correspondeu ao
beijo voraz que ele lhe deu. E quando o pau dele começou a avançar, ela não
sentiu o medo que esperava, pelo contrário, embora soubesse que iria doer,
o desejo que estava sentindo era muito maior.
Acabou que não doeu tanto assim, Hector foi muito cuidadoso e após
alguns minutos de espera, começou a entrar e sair de dentro dela com
movimentos suaves até Lucy entrar em seu ritmo.
Isso, contudo, durou pouco; eles estavam extremamente excitados e a
energia que emanava daquele contato a atingiu em cheio e ela simplesmente
se entregou ao prazer que ele a fazia sentir.
As arremetidas de Hector se tornaram mais vigorosas e Lucy se sentiu
bem mais ousada, e quando o clímax chegou, o prazer que eles sentiram foi
muito além do que poderiam imaginar.
— Você é maravilhosa — disse ele, puxando-a contra si.
— Você que é extraordinário — rebateu e ganhou um beijo quase
reverente na boca.
Eles permaneceram naquela posição por muito tempo, apenas curtindo
a companhia um do outro.
De repente o celular de Hector começou a tocar e ele decidiu ignorar,
principalmente porque não costumava atender a chamadas de números
privados, mas depois de o aparelho continuar tocando mesmo após duas
recusas, achou por bem aceitar. Seu pai estava na rua e poderia ter algo a ver
com ele.
Apenas aquele pensamento o amedrontou e foi com certa urgência que
atendeu. Antes não o tivesse feito, pois a voz do outro lado da linha era a
última que desejava escutar, ainda mais depois do que vivera com Lucy.
— O que você quer, Trinity?
Quando ele falou o nome dela, Lucy mal pôde acreditar que o momento
mais importante e maravilhoso de sua vida estava sendo interrompido por
aquela cobra.
Fazia tanto tempo que não ouvia o nome dela que já havia até se
esquecido. O que a acalmou foi ver que Hector não parecia nada feliz com
aquilo também.
— Bom, mas eu não tenho mais nada para conversar com você. Adeus
— disse, incisivo, e desligou o celular, visivelmente irritado.
— Me desculpe por isso, Lucy.
— Tudo bem. Não é sua culpa.
— Eu sei, mas já deveria ter te alertado que ela é uma pessoa difícil,
só não falei porque a Trinity nunca mais me procurou. Achei que finalmente
tinha seguido sua vida.
Ela entendia, tinha visto a forma como a garota agiu na festa.
— Eu percebi que ela ainda te considera uma propriedade dela.
— Sim. Tento não ser grosseiro, mas já estou de saco cheio.
— Imagino, mas o que ela queria?
— Conversar comigo.
— Sobre o quê? — quis saber, mesmo correndo o risco de parecer
enxerida.
— Não sei. Aliás, sei, sim. Ela deve estar querendo fazer mais um de
seus dramas para que eu volte com ela, mas isso não vai acontecer,
especialmente agora. — Hector se aproximou de Lucy e após esquadrinhar
seu rosto com o que (meu Deus!) parecia muito com amor, beijou-a
delicadamente. — Por favor, tenha um pouco de paciência, uma hora ela vai
se cansar.
Mal ela terminou de anuir e ele voltou a beijá-la, desta feita,
apaixonadamente.
O celular voltou a apitar, indicava uma mensagem, que só foi vista por
Hector no dia seguinte, mas que simplesmente acabou com seu mundo:
ANOS DEPOIS...
Aquele era um dia típico de verão: sol quente, nada de nuvens no céu e
um vento fresco para equilibrar a temperatura.
Perfeito para um churrasco, pensou Hector enquanto estacionava em
frente à entrada da casa onde viveu sua vida inteira.
Apesar de não morar mais com o pai, fazia questão de visitá-lo todo
domingo, mesmo falando constantemente com ele durante a semana.
Saiu de seu SUV carregando as cervejas que ficara de levar e chegou
no quintal a tempo de ver Ronald distribuindo os hambúrgueres, as salsichas,
os legumes e as espigas de milho na churrasqueira.
— Bom dia, pai. Como está? — saudou Hector, abraçando-o.
— Tudo ótimo, meu filho, espero que esteja com fome.
— Faminto, mas não tem pressa — ponderou e lhe ofereceu uma long
neck.
Abriu a própria cerveja, acomodou-se em uma das cadeiras de jardim
e ficou apreciando a vista deslumbrante que tinha dali. A propriedade era
ladeada por árvores de ambos os lados e por um lago que cortava os fundos.
Era um belo cenário e ele nunca se cansava de apreciá-lo.
— Está tudo certo para reunião com os Dunlap? — questionou o
homem mais velho.
— Amanhã às 9h. Eles vão fechar conosco, tenho certeza. Você sabe
que foi indicação dos Rey, certo? — observou Hector.
— Sim, eles sempre nos trazem boas indicações, mas todo o mérito é
seu. Você fez um ótimo trabalho com eles.
— De todos nós, pai — amenizou, pois acreditava muito no trabalho
em equipe.
— E a mudança? Em que pé anda? — perguntou seu pai.
— Caminhando.
Hector nunca teve planos de sair de Port Yeil, mas a empresa que
passara a conduzir depois que o pai se aposentou começara a gerar ainda
mais lucros do que antes devido às inovações que conseguiu criar para a
corporação ancestral e que acabaram chamando a atenção de grandes
empresas de outros estados. E foi esse crescimento que o estimulou a fazer
planos para uma possível expansão. Todavia, para conseguir atender a essas
novas empresas, uma filial no estado que mais gerava dinheiro ao país seria
necessária e ele contava com a ajuda do pai e do melhor amigo, Rick, para
que tudo desse certo.
— O apartamento está quase pronto, mas houve um contratempo com a
parte elétrica do escritório — continuou e deu de ombros. — Obra é assim
mesmo, não é?
— Disso nós entendemos.
— Com certeza.
— Mas não vamos falar de trabalho hoje, quero saber de você. Achei
que iria trazer aquela moça — comentou o pai, sentando-se ao seu lado e
deixando a grelha quente fazer seu trabalho.
— Mia? Não estamos mais juntos — respondeu, pegando outra cerveja
para si.
— Ela não era mulher para você, meu filho. E quanto a Trinity,
continua no seu pé? — quis saber Ronald.
Hector respirou fundo e tomou um gole considerável de sua bebida
antes de responder:
— Vira e mexe recebo uma mensagem ou e-mail dela. Eu bloqueio,
mas ela sempre encontra uma forma de entrar em contato comigo.
— Meu Deus, essa moça precisa se tratar de verdade.
— Já nem sei quantas vezes falei isso a ela... Hoje eu só ignoro —
disse e soltou um suspiro cansado. — Acho que essa mudança vai ser boa
por conta disso também. Ela não vai atrás de mim em Nova York.
— Bom, só pelo que ela fez a você já precisaria estar internada, isso
sim — asseverou o pai, revoltado. — Não sei como a mãe dela não tomou
uma atitude.
— Beatrice nunca teve controle sobre a filha. Trinity sempre fez o que
quis a vida inteira e eu até tinha pena no começo, mas depois vi que o
problema estava no caráter dela.
— Então a mãe também precisa de ajuda.
— Sim, mas suponho que já seja tarde — respondeu Hector. — A vida
dela mudou do vinho para a água quando o marido foi preso e as coisas só
pioraram desde então.
— Com certeza — concordou, levantando-se para ver os
hambúrgueres na churrasqueira. — Mas você não tem um relacionamento
sério há anos e algo me diz que não é apenas por causa da marcação serrada
de Trinity.
Hector deu de ombros, não gostava de falar a respeito desse aspecto
de sua vida.
— Tudo bem... não vamos mais falar de coisas ruins — disse Ronald,
rindo. — Mas eu fico preocupado com você, meu filho.
— Preocupado por quê? Trinity não me engana mais, pai.
— Não sobre Trinity — falou, retirando os legumes que já estavam
prontos.
— Não me venha com essa conversa de que eu preciso arrumar
alguém.
A falta de resposta deixou os pensamentos do homem mais velho bem
explícitos.
— Ah, pai, não começa. Estou solteiro porque quero, prefiro ficar sem
ninguém a colocar outra louca em minha vida e estou feliz assim.
— Feliz? Tem certeza?
Outro silêncio constrangedor se formou.
Hector recostou-se no encosto da cadeira e apoiou a long neck no
joelho sentindo-se incomodado com o rumo da conversa.
— Quando foi a última vez que tentou entrar em contato com a Lucy?
— perguntou-lhe o pai, ainda de costas, virando os milhos.
Mesmo depois de tantos anos, ouvir o nome dela ainda lhe afetava. O
anúncio da gravidez de Trinity causou grandes mudanças na vida de todos os
envolvidos. Após aquela revelação, Lucy e Hector tentaram, com muito
afinco, ficar juntos e ela aguentou muita coisa em nome do amor que sentia
por ele, mas, por fim, o peso em seus ombros foi grande demais e ela não
conseguiu mais dividir o namorado com a ex obsessiva que, por estar
carregando um filho dele, se achava no direito de interferir de todas as
formas possíveis.
Diante disso, Hector não pôde culpá-la quando, dois meses depois, a
garota que amava terminou tudo e se mudou para outra cidade a fim de dar
seguimento ao sonho de se tornar médica.
— Não sei — respondeu.
Mas ele sabia. Mesmo ciente de que não devia, Hector tentou entrar
em contato com Lucy inúmeras vezes depois que ela se foi, mas sempre
recebia uma resposta evasiva, arredia, o que deixava bem claro a falta de
vontade de manter qualquer vínculo com ele.
E como sofreu com aquilo.
Inquieto, levantou-se da cadeira e foi assumir o comando da
churrasqueira.
Ronald ocupou seu lugar à mesa e pôs-se a examinar o filho.
O fato de aquele homem, sempre controlado, se mostrar tão
melindrado com o assunto não o fez recuar. Já queria ter tido aquela
conversa há muito tempo e achava que a hora havia chegado, mesmo que isso
o chateasse.
— Você tentou explicar o que aconteceu?
— Claro que sim, pai, mas não fez diferença, depois de um ano e meio
ela já tinha seguido com sua vida, talvez já até estivesse com outra pessoa, e
eu não quis forçar a barra — expôs Hector servindo dois pratos.
— Filho — começou Ronald colocando a mão sobre a do rapaz que
acabara de se sentar à sua frente —, mesmo que não tenha solicitado eu vou
te dar um conselho. A vida é curta demais para não irmos atrás do que nos
faz feliz. Se eu soubesse que sua mãe iria nos deixar tão cedo, eu teria feito
muitas coisas diferentes... Só Deus sabe a falta que ela me faz e a última
coisa que eu quero é que você tenha os mesmos arrependimentos.
Ele fez uma pausa para respirar e não deixar a emoção que o acometia
sempre que falava da falecida esposa transbordar em seus olhos.
— Depois de todo esse tempo, o certo seria te pedir para esquecer seu
amor de adolescência e ir adiante, mas seguindo o exemplo de todos os
homens da família, você só vai amar de verdade uma vez. Isso é bom quando
a gente encontra a pessoa certa na hora certa, mas se torna um verdadeiro
martírio quando o amor chega na hora errada, como aconteceu com você.
“Se estivesse realmente feliz, eu não falaria nada, mas isso não é
verdade. Aos trinta e três anos você é um homem bem-sucedido que realizou
seus sonhos profissionais com maestria, mas existe uma lacuna em seu
coração. Então, tudo o que eu peço é que vá atrás dessa moça e veja se ela
realmente seguiu com a vida, se realmente é tarde demais.
— E se for tarde demais? Eu não sei se estou preparado para vê-la
feliz ao lado de outro homem — disse Hector, externando seu maior medo.
— Isso é uma possibilidade, mas eu o conheço bem o bastante para
saber que se deixar as coisas como estão irá se arrepender depois. Enquanto
esse assunto não for resolvido em sua vida você nunca será feliz por
completo.
Aquelas palavras o fizeram parar para refletir. O pai era um homem
sábio que sempre o direcionou de maneira discreta, tentando ao máximo não
interferir em suas escolhas, especialmente quando elas entravam no âmbito
pessoal. Quando começou a namorar tudo o que lhe falou foi para nunca se
deixar cegar pela paixão e jamais esquecer de usar camisinha. Mesmo não
gostando de Trinity, ele só deu sua opinião quando Hector terminou tudo e
isso porquê este lhe deu abertura para tanto.
Mas o assunto Lucy era um tabu que não entrava em pauta há anos.
Só que Hector não tinha ideia de que a motivação do pai para falar
tudo aquilo veio da doença que acabara de descobrir. Estava com câncer na
próstata e apesar de o médico ter lhe dado grandes esperanças de cura, a
sensação de finitude iminente deixou Ronald um pouco mais ousado. O
sofrimento do filho o afetava imensamente, não achava justo que ainda
tivesse que pagar um preço tão alto por uma escolha ruim na adolescência e
se sentiu no dever de tentar reparar aquela situação.
Após terminarem o almoço, resolveram ir até a trilha que percorriam
quando Hector era criança e que, na época, parecia assustadora, mas que se
tornara inofensiva depois que ele crescera e percebera que a “floresta” que
existia nos fundos de sua casa era composta por apenas algumas dezenas de
árvores.
Apesar do medo que o menino Hector sentia, ainda se lembrava com
muito apreço das histórias que seu pai lhe contava nesses programas de pai e
filho e de como era bom ser recebido pela mãe quando retornavam.
Quando ficou um pouco mais velho, sua atividade favorita era fazer
aquele caminho com a antiga moto que ele e o pai haviam concertado.
Recordava-se com muita nitidez da mãe nervosa, pedindo ao marido que
jogasse a maldita coisa fora, o que acabou acontecendo quando Hector bateu
numa árvore. O acidente lhe rendeu apenas cinco pontos na cabeça, mas a
frágil motocicleta ficou bem acabada e foi abandonada de vez.
Ao passar pelo pinho silvestre no meio da trilha, ficou chocado ao ver
que a marca da batida continuava ali.
— Eu estou com câncer, meu filho — soltou Ronald e viu seu garoto
estacar no mesmo instante.
— Quando o senhor descobriu? — perguntou depois de se recobrar do
choque.
— Há pouco tempo.
— Por que não me contou antes? — exigiu Hector, a voz quase
falhando.
— Porque eu estou bem, não queria preocupá-lo antes da hora, fiquei
com receio de isso interferir nas decisões que precisaria tomar na empresa.
— A empresa que se dane, o que me interessa é você.
Ronald sorriu com a ferocidade do filho, era recompensador saber que
havia criado um homem tão valoroso.
— Não fique preocupado, o médico me deu um prognóstico muito bom
— disse em tom tranquilizador antes de voltar a caminhar. — Vou operar
para retirar o tumor e depois fazer o que for preciso.
— O senhor não podia ter me escondido algo tão sério! — alegou
Hector, aborrecido, indo atrás do pai.
— Não escondi, apenas omiti até saber o que realmente estava
acontecendo — explicou. Então parou e olhou sério para o filho. — Mas
isso me fez refletir a respeito de algumas coisas — ponderou o velho senhor.
— Preciso que me prometa algo.
— Pai, o senhor sabe que não gos...
— Prometa — insistiu Ronald.
— Está bem. O que é?
— O que eu mais quero nessa vida é te ver feliz e sei que seu coração
está com aquela moça, então, quero que prometa que vai resolver esse
assunto.
Hector aproveitou o restante do trajeto até a mansão para pensar. Uma
promessa feita pelos Bullock tornava-se uma dívida inegociável e caso se
comprometesse, teria que cumprir.
— Está bem, pai, eu prometo — disse, por fim, já imaginando o que
precisaria fazer para realizar o desejo do pai.
Capítulo 5
A vida da Dra. Lucy Allen não era nada regrada. Por ter se colocado
disponível para qualquer emergência, muitos de seus plantões não tinham
dias nem horários específicos. Mas já estava habituada, aquela era a
realidade que escolhera e prezava muito por ela.
A nova vida que construiu para si em New Rondy não foi exatamente
como ela e Alyssa haviam planejado enquanto adolescentes. Claro que ela
foi a algumas festas, mas em vez de ficar até tarde vendo filmes e comendo
guloseimas ou fofocando até não poder mais, passou a grande maioria de
suas noites estudando.
Os primeiros anos longe dos pais e de tudo o que conhecia foram
desafiadores, porém, após muita dedicação e apoio remoto deles, estava
colhendo os frutos de tantas abdicações.
O mesmo se aplicava a eles. Nora e Harry já tinham mais de 40 anos
quanto tiveram a filha e foram muito dedicados a ela em seus anos de
formação. Foram extremamente amorosos e com o dinheiro que juntaram
puderam transformar seu sonho de ser médica em realidade. Mas ambos
eram fascinados pelo mar, então, após a aposentadoria, venderam a casa
onde moraram a vida toda, compraram um veleiro de quarenta pés e o
transformaram em lar.
Desde então já conheceram vários lugares extraordinários e estavam
plenos, vivendo um sonho em alto mar.
Lucy os admirava demais pela coragem de se aventurarem em uma
empreitada como aquela e só rezava para que permanecessem saudáveis,
pois seu maior medo era de que um deles passasse mal estando longe da
costa.
Obviamente tentaram arrastar a filha para uma temporada e após muita
insistência ela aceitou passar suas primeiras férias com eles. Mas apenas
dois dias a bordo foram o suficiente para Lucy ver que não nascera para o
mar e desde então ficava ansiosa pelos dias que passavam com ela, mesmo
que se falassem por telefone toda semana.
Apesar da saudade, após o primeiro ano tudo ficou mais fácil, a
despeito da rotina atribulada que a mantinha bastante ocupada.
Graças a Deus ela tinha Alyssa. Sua melhor amiga foi um pilar
essencial naquela transição. Embora houvesse alguns desentendimentos, com
ela Lucy se sentia em casa.
As duas moravam no mesmo condomínio, com quatro andares de
diferença. No início até tentaram viver juntas, mas o apartamento era
pequeno demais para o temperamento inconsequente de Alyssa e logo ambas
perceberam que, se quisessem continuar amigas, precisariam se separar.
Contudo, suas sextas-feiras eram reservadas a outra. Elas comiam
pizza, bebiam refrigerante, cerveja ou vinho, dependendo do quão difícil
havia sido a semana, e jogavam conversa fora. Mas nos dois dias seguintes
Lucy quase não via a amiga, pois ela caía no mundo. A vida de Alyssa
sempre fora intensa e não mudou nem quando estavam na faculdade e nem
depois que foram contratadas pelo hospital onde fizeram residência.
— E você e o Trent. Como estão? — perguntou Alyssa que se
encontrava sentada no chão de pernas cruzadas e uma fatia de pizza na mão.
— Está tudo bem, mas você sabe como ele é. Qualquer coisa é motivo
para uma cena — respondeu Lucy bebendo o último gole de seu vinho.
— Olha, eu sou ciumenta e não escondo de ninguém, mas não sei como
você aguenta aquele insuportável.
— Ele foi bom comigo quando cheguei no hospital.
— Se fosse assim era para eu estar namorando o John.
— Que John?
— O tiozinho da faxina que foi um amor comigo no meu primeiro dia
lá no hospital. Quase entrei na sala da reunião, onde a diretoria se reunia,
mas ele me avisou que era melhor não fazer aquilo. Sábio tio John, tem
minha eterna gratidão.
Lucy riu, Alyssa sempre a divertia.
— Mas falando sério, isso não é motivo para se ficar com alguém,
Lucy.
— Talvez não, só que estou tão ocupada com os plantões e o curso,
que não tenho ânimo nem para pensar nisso — tentou se justificar. — Mas a
verdade é que fiquei acomodada — desabafou a moça voltando a se servir
do vinho.
— Quer saber o que eu acho? — disse Alyssa pegando outro pedaço
de pizza.
— Não — respondeu Lucy, rindo.
— Acho que você nunca superou o Hector — opinou, deixando claro
que não possuía filtro algum entre seu cérebro e a boca, nem quando se
tratava da melhor amiga.
Lucy suspirou, sempre que tinha uma oportunidade, Alyssa cutucava
aquela ferida, não por maldade, ela simplesmente não se conformava de a
história ter terminado da forma como terminou e não deixava a amiga
esquecer.
Não que precisasse, mesmo quando tudo o que queria na vida era um
lugar para se encostar e poder dormir um pouco, Hector estava em seus
pensamentos.
— Por que você sempre tem que falar dele? Passado é passado.
— Não, minha amiga — afirmou e suas feições mostravam que falava
sério. — Hector está no seu passado por tudo o que viveram, mas, com
certeza continua no seu presente e estará no seu futuro. Eu sei disso porque
sou vidente, você sabe.
— Não importa o que sinto. O que importa são os fatos.
— Seu amor é um fato, Lucy — disse Alyssa.
— A Trinity e o filho deles também. — O olhar de Lucy, ao dizer
aquelas palavras, transpareceu a dor que ainda carregava. — Chega de falar
dele, Lis, além de me machucar, não adianta nada. Eu segui com minha vida
e ele certamente seguiu com a dele juntamente com a vaca loira e o filho.
— Eu nunca engoli muito bem essa história, quer dizer, eu não acho
impossível que a vaca loira tenha mentido, por isso sempre achei que algo
não estava certo.
— Pois para mim sempre foi certo, como dois mais dois são quatro.
— Por que tem tanta certeza?
— Porque eles fizeram o exame de DNA logo que a criança nasceu e
deu positivo.
— Cacete, Lucy, como é que eu nunca soube disso? — perguntou
Alyssa, indignada.
— Deixa essa história pra lá, por favor. Vamos ver nosso filme.
Alyssa viu que os olhos da amiga estavam marejados e se arrependeu
de ter ido tão a fundo no assunto, mesmo sabendo que ele ainda a abalava. E
não era para menos, a noite maravilhosa que ela e Hector tiveram acabou se
tornando seu pesadelo e, consequentemente, o início do fim para o
apaixonado casal.
Só ela sabia o quanto aqueles primeiros dias foram difíceis para Lucy
e sentia muito por ter trazido tudo à tona.
Para deixar o clima mais descontraído, Alyssa colocou uma comédia,
sem romance, para elas assistirem e em pouco tempo, com as risadas e os
novos assuntos, ela viu a amiga relaxar.
Naquela noite elas não ficaram muito tempo juntas. No dia seguinte
ambas teriam plantão, de forma que dormir cedo não era uma opção, mas
uma obrigação para que conseguissem se sustentar por longas horas salvando
vidas de desconhecidos.
— Amanhã vou estar na enfermaria, mas vou dar um pulo na
emergência para almoçarmos juntas. O que acha? — perguntou Alyssa
segurando o elevador.
— Claro. Vamos sim — respondeu Lucy, apoiada na porta.
— Se o Dr. Hollywood quiser ir junto, tudo bem — falou Lis em tom
irônico e avesso ao mesmo tempo.
Lucy revirou os olhos.
— Até hoje não consigo entender sua implicância.
— Não sei exatamente. Mas não acho que ele seja uma boa pessoa. —
Ela deu de ombros. — A verdade é que nosso santo nunca bateu.
— Não põe a culpa no santo, isso é coisa sua — falou Lucy.
— Ei, não coloque tudo em cima de mim, a antipatia é mútua.
Era verdade, refletiu Lucy. Alyssa e Trent não se davam bem e não
escondiam isso de ninguém. Nunca houve um motivo em especial para essa
animosidade, eles simplesmente não eram compatíveis e só mantinham o
mínimo de cortesia no trabalho ou quando Lucy reclamava demais, o que
acontecia com bastante frequência.
Sua amiga não o chamava de Dr. Hollywood como elogio, mas para
deixar bem claro o quanto desprezava sua altivez.
Lucy não sabia se Trent percebia isso, ele era tão metido, que
provavelmente pensava que o apelido fora dado como uma forma de
enaltecer sua beleza e inteligência, pois, sim, ele era lindo e brilhante, mas
havia tantos pontos negativos que ela já não conseguia enxergá-lo com os
mesmos olhos.
Suspirando profundamente, Lucy resolveu encerrar a conversa para
evitar o estresse.
— Tchau, Lis.
— Tchau. Mas é sério, pode levar o metidinho se quiser, eu vou me
comportar — continuou Alyssa. — Calma, cacete — esbravejou quando o
elevador começou a apitar sinalizando a demora no fechamento das portas.
— Ele está em uma conferência em Nova York. Chega amanhã à noite.
— Que pena — disse, com fingido tom de lástima, e começou a rir.
— Você é terrível — admoestou Lucy antes de as portas do elevador
se fecharem. — Até amanhã! — gritou, rindo.
Mas depois que arrumou tudo e foi se deitar, um pouco da melancolia
que a acompanhava há muitos anos voltou e a última imagem em sua mente
antes de dormir foi a do rapaz que havia roubado seu coração anos atrás.
– AMOR E OBSESSÃO –
UMA TAÇA DE CHÁ
(L I VRO Ú N I CO )
O destino reservou a Chiara Grassi duas infelizes surpresas que fizeram sua vida mudar de um
dia para outro. O amor pela cozinha e por sua família, contudo, deu-lhe forças para não se
entregar à tristeza.
Esperando deixar as amarguras para trás, ela decidiu recomeçar em um novo lugar. Porém, não
contava com Paolo, dono da Vinícola Castelli, e seu mais novo vizinho. Lindo e misterioso, ele
mexeu com seus sentimentos mais profundos, forçando-a a reconsiderar várias decisões que
havia tomado.
O que ela não sabia era que Paolo também possuía feridas na alma e um grande muro em volta
do coração que ele não estava disposto a derrubar.
O que será que o destino reservou para estes dois corações feridos?
– DISPONÍVEL NA AMAZON –
TRECHO DO LIVRO
Capítulo 1
— Não vou te dar esse prazer, quero que você apodreça na cadeia
Me perdoe, Iaiá, não quis ser inconveniente, mas compreenda, minha obrigação como
repórter é apurar os fatos e você estava lá, é a principal peça em toda essa história devido ao
que aconteceu com sua mãe.
Quero te dar voz para falar tudo o que está sentindo.
Se mudar de ideia, sabe onde me encontrar.
Se tivesse alguma coisa para fazer seu dia piorar, ela desconhecia.
Jogou o aparelho de volta na bancada, apoiou as mãos na pia e chorou
copiosamente. Quando, por fim, se acalmou, levantou a cabeça e lavou o
rosto na água fria, numa tentativa de se recompor antes de sua irmã voltar à
cozinha.
O celular acendeu novamente, mas daquela vez era Mona, sua amiga
de infância.
— Oi, Mona — atendeu secando o rosto com uma toalha de papel.
— Oi, amiga. Meus pêsames. Me desculpe não ter ido ao enterro, não
consegui voo em cima da hora. Essas minhas viagens de trabalho são uma
droga!
— Tudo bem, amiga e obrigada.
— Como você está?
— O que você acha? — respondeu sem paciência. — Desculpa, estou
um pouco nervosa, acabei de brigar com o Cesare.
— Brigaram por quê? — perguntou, curiosa.
— Deixa isso para lá, nem vale a pena.
— Tudo bem. O que acha de almoçarmos semana que vem? Assim
poderemos conversar.
— Claro. Por que não?
— Está bem, então. Eu te ligo, pode ser?
— Pode, me avisa quando voltar.
— Tá bom. Ah, mamãe mandou um beijo e pediu para falar que sente
muito.
— Eu agradeço.
— Beijos, amiga, fica bem.
intrigada, a amiga não parecia bem. Contudo, não estava com forças para
pensar nos problemas alheios, ela iria, só por aquela noite, ser egoísta e
Por volta das dezoito horas, estava tudo em seu devido lugar e,
daquela vez, depois de jantar, tomou um banho relaxante e dormiu cedo para
trabalho depois das férias forçadas e ela estava com um bom pressentimento
[1]
Marca brasileira de charuto que está entre as cinco melhores do mundo.
[2]
Uma bebida alcoólica, popular na Europa, usada diretamente na xícara para adoçar o café expresso.
[3]
O brandy é uma bebida destilada elaborada a partir de uvas ou outras frutas
[4]
Nino é pai de um dos principais personagens de Amor e Obsessão, um livro da autora
completamente independente deste.
[5]
Música tradicional Italiana.
[6]
Nome italiano, pronuncia-se Kiara.
[7]
Marca de molho de pimenta extremamente ardida.
[8]
Semelhante ao sistema de calefação.