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19 CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988

Promulgada no dia 5 de outubro de 1988, durante o governo do então presidente José


Sarney, a Constituição em vigor, conhecida por “Constituição Cidadã”, é a sétima adotada no
país e tem como um de seus fundamentos dar maior liberdade e direitos ao cidadão reduzidos
durante o regime militar e manter o Estado como república presidencialista.
As Constituições anteriores são as de 1824, 1891, 1934, 1937, 1946 e 1967. Das sete
Constituições, quatro foram promulgadas por assembleias constituintes, duas foram impostas -
uma por D. Pedro I e outra por Getúlio Vargas e uma aprovada pelo Congresso por exigência
do regime militar.
Na história das Constituições brasileiras, há uma alternância entre regimes fechados e
mais democráticos, com a respectiva repercussão na aprovação das Cartas, ora impostas, ora
aprovadas por assembleias constituintes. Abaixo, um resumo das medidas adotadas pelas
Constituições do país:

1ª - Constituição de 1824 (Brasil Império)


Apoiado pelo Partido Português, constituído por ricos comerciantes portugueses e altos
funcionários públicos, D. Pedro I dissolveu a Assembleia Constituinte em 1823 e impôs seu
próprio projeto, que se tornou a primeira Constituição do Brasil (constituição da mandioca).
Apesar de aprovada por algumas Câmaras Municipais da confiança de D. Pedro I, essa Carta,
datada de 25 de março de 1824 e contendo 179 artigos, é considerada pelos historiadores
como uma imposição do imperador.
Entre as principais medidas dessa Constituição, destaca-se o fortalecimento do poder
pessoal do imperador, com a criação do Poder Moderador, que estava acima dos Poderes
Executivo, Legislativo e Judiciário. As províncias passam a ser governadas por presidentes
nomeados pelo imperador e as eleições são indiretas e censitárias. O direito ao voto era
concedido somente aos homens livres e proprietários, de acordo com seu nível de renda,
fixado na quantia líquida anual de cem mil réis por bens de raiz, indústria, comércio ou
empregos. Para ser eleito, o cidadão também tinha que comprovar renda mínima proporcional
ao cargo pretendido.
Essa foi a Constituição com duração mais longa na história do país, num total de 65
anos.

2ª - Constituição de 1891 (Brasil República)


Após a proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, houve mudanças
significativas no sistema político e econômico do país, com a abolição do trabalho escravo, a
ampliação da indústria, o deslocamento de pessoas do meio rural para centros urbanos e
também o surgimento da inflação. Outra mudança foi o abandono do modelo do
parlamentarismo franco-britânico, em proveito do presidencialismo norte-americano.
O marechal Deodoro da Fonseca, proclamador da República e chefe do governo
provisório, e Rui Barbosa, seu vice, nomearam uma comissão de cinco pessoas para
apresentar um projeto a ser examinado pela futura Assembleia Constituinte. O projeto
escolhido vigorou como Constituição Provisória da República até as conclusões da
Constituinte.
As principais inovações dessa nova Constituição, datada de 24 de fevereiro de 1891, são:
 Instituição da forma federativa de Estado e da forma republicana de governo;
 Estabelecimento da independência dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário;
 Criação do sufrágio com menos restrições, impedindo ainda o voto aos mendigos e analfabetos;
 Separação entre a Igreja e o Estado, não sendo mais assegurado à religião católica o status de religião
oficial; e
 Instituição do habeas corpus (garantia concedida sempre que alguém estiver sofrendo ou ameaçado de
sofrer violência ou coação em seu direito de locomoção ir e vir ou permanecer, por ilegalidade ou abuso
de poder).
3ª - Constituição de 1934 (Segunda República)
Presidido por Getúlio Vargas, o país realiza nova Assembleia Constituinte, instalada em
novembro de 1933.
A Constituição, de 16 de julho de 1934, traz a marca getulista das diretrizes sociais e
adota as seguintes medidas:
 Maior poder ao governo federal;
 Voto obrigatório e secreto a partir dos 18 anos, com direito de voto às mulheres, mas mantendo
proibição do voto aos mendigos e analfabetos;
 Criação da Justiça Eleitoral e da Justiça do Trabalho;
 Criação de leis trabalhistas, instituindo jornada de trabalho de oito horas diárias, repouso semanal e
férias remuneradas;
 Mandado de segurança e ação popular.

Essa Constituição sofreu três emendas em dezembro de 1935, destinadas a reforçar a


segurança do Estado e as atribuições do Poder Executivo, para coibir, segundo o texto,
“movimento subversivo das instituições políticas e sociais”. Foi a Constituição que vigorou por
menos tempo no Brasil: apenas três anos.

4ª - Constituição de 1937
Em 10 de novembro de 1937, Getúlio Vargas deu um golpe de Estado e assumiu poderes
ditatoriais. Ele revogou a Constituição de 1934, dissolveu o Congresso e outorgou ao país, sem
qualquer consulta prévia, a Carta Constitucional do Estado Novo, de inspiração fascista, com a
supressão dos partidos políticos e concentração de poder nas mãos do chefe supremo do
Executivo. Essa Carta é datada de 10 de novembro de 1937.
Entre as principais medidas adotadas, destacam-se:
 Instituição da pena de morte;
 Supressão da liberdade partidária e da liberdade de imprensa;
 Anulação da independência dos Poderes Legislativo e Judiciário;
 Restrição das prerrogativas do Congresso Nacional;
 Permissão para suspensão da imunidade parlamentar;
 Prisão e exílio de opositores do governo;
 Eleição indireta para presidente da República, com mandato de seis anos.

Com a derrota da Alemanha na Segunda Guerra Mundial, as ditaduras direitistas


internacionais entraram em crise e o Brasil sofreu as consequências da derrocada do
nazifascismo. Getúlio Vargas tentou, em vão, permanecer no poder, mas a grande reação
popular, com apoio das Forças Armadas, resultou na entrega do poder ao então presidente do
Supremo Tribunal Federal (STF), José Linhares, após a deposição de Vargas, ocorrida em 29
de outubro de 1945.
O novo presidente constituiu outro ministério e revogou o artigo 167 da Constituição, que
adotava o estado de emergência, acabando também com o Tribunal de Segurança
Constitucional. Ao fim de 1945, as eleições realizadas para a Presidência da República deram
vitória ao general Eurico Gaspar Dutra, empossado em 31 de outubro de 1946, que governou o
país por decretos-lei, enquanto preparava-se uma nova Constituição.

5ª - Constituição de 1946
Essa Constituição, datada de 18 de setembro de 1946, retomou a linha democrática de
1934 e foi promulgada de forma legal, após as deliberações do Congresso recém-eleito, que
assumiu as tarefas de Assembleia Nacional Constituinte.
Entre as medidas adotadas, estão o restabelecimento dos direitos individuais, o fim da
censura e da pena de morte. A Carta também devolveu a independência ao Executivo,
Legislativo e Judiciário e restabeleceu o equilíbrio entre esses poderes, além de dar autonomia
a estados e municípios. Outra medida foi a instituição de eleição direta para presidente da
República, com mandato de cinco anos.
As demais normas estabelecidas por essa Constituição foram:
 Incorporação da Justiça do Trabalho e do Tribunal Federal de Recursos ao Poder Judiciário;
 Pluralidade partidária; direito de greve e livre associação sindical; e
 Condicionamento do uso da propriedade ao bem-estar social, possibilitando a desapropriação por
interesse social.

Destaca-se, entre as emendas promulgadas à Carta de 1946, o chamado ato adicional,


de 2 de setembro de 1961, que instituiu o regime parlamentarista. Essa emenda foi motivada
pela crise político-militar após a renúncia de Jânio Quadros, então presidente do país. Como
essa emenda previa consulta popular posterior, por meio de plebiscito, realizado em janeiro de
1963, o país retomou o regime presidencialista, escolhido pela população, restaurando,
portanto, os poderes tradicionais conferidos ao presidente da República.
Em 1964, o golpe militar derrubou João Goulart e conduziu o país a uma nova ditadura.

6ª - Constituição de 1967
O contexto predominante nessa época era o autoritarismo e a política da chamada
segurança nacional, que visava combater inimigos internos ao regime, rotulados de
subversivos. Instalado em 1964, o regime militar conservou o Congresso Nacional, mas
dominava e controlava o Legislativo. Dessa forma, o Executivo encaminhou ao Congresso uma
proposta de Constituição que foi aprovada pelos parlamentares e promulgada no dia 24 de
janeiro de 1967.
Mais sintética do que sua antecessora, essa Constituição manteve a Federação, com
expansão da União, e adotou a eleição indireta para presidente da República, por meio de
Colégio Eleitoral formado pelos integrantes do Congresso e delegados indicados pelas
Assembleias Legislativas. O Judiciário também sofreu mudanças, e foram suspensas as
garantias dos magistrados.
Essa Constituição foi emendada por sucessiva expedição de Atos Institucionais (AIs), que
serviram de mecanismos de legitimação e legalização das ações políticas dos militares, dando
a eles poderes extra-constitucionais. De 1964 a 1969, foram decretados 17 atos institucionais,
regulamentados por 104 atos complementares.
Um desses atos, o AI-5, de 13 de dezembro de 1968, foi um instrumento que deu ao
regime poderes absolutos e cuja primeira consequência foi o fechamento do Congresso
Nacional por quase um ano e o recesso dos mandatos de senadores, deputados e vereadores,
que passaram a receber somente a parte fixa de seus subsídios. Entre outras medidas do AI-
5, destacam-se:
 Suspensão de qualquer reunião de cunho político;
 Censura aos meios de comunicação, estendendo-se à música, ao teatro e ao cinema;
 Suspensão do habeas corpus para os chamados crimes políticos;
 Decretação do estado de sítio pelo presidente da República em qualquer dos casos previstos na
Constituição;
 Autorização para intervenção em estados e municípios. O AI-5 foi revogado em 1978.

7ª - Constituição de 1988 (Constituição Cidadã)


Em 27 de novembro de 1985, foi convocada a Assembleia Nacional Constituinte com a
finalidade de elaborar novo texto constitucional para expressar a realidade social pela qual
passava o país, que vivia um processo de redemocratização após o término do regime militar.
Datada de 5 de outubro de 1988, a Constituição inaugurou um novo arcabouço jurídico-
institucional no país, com ampliação das liberdades civis e os direitos e garantias individuais. A
nova Carta consagrou cláusulas transformadoras com o objetivo de alterar relações
econômicas, políticas e sociais, concedendo direito de voto aos analfabetos e aos jovens de 16
a 17 anos. Estabeleceu também novos direitos trabalhistas, como redução da jornada semanal
de 48 para 44 horas, seguro-desemprego e férias remuneradas acrescidas de um terço do
salário.
Outras medidas adotadas com a Constituição de 88 foram:
 Instituição de eleições majoritárias em dois turnos;
 Direito à greve e liberdade sindical;
 Aumento da licença-maternidade de três para quatro meses;
 Licença-paternidade de cinco dias;
 Criação do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em substituição ao Tribunal Federal de Recursos;
 Criação dos mandados de injunção, de segurança coletivo e restabelecimento do habeas corpus. Foi
também criado o habeas data (instrumento que garante o direito de informações relativas à pessoa do
interessado, mantidas em registros de entidades governamentais ou banco de dados particulares que
tenham caráter público).

Destacam-se ainda as seguintes mudanças; reforma no sistema tributário e na repartição


das receitas tributárias federais, com propósito de fortalecer estados e municípios; reformas na
ordem econômica e social, com instituição de política agrícola e fundiária e regras para o
sistema financeiro nacional; leis de proteção ao meio ambiente; fim da censura em rádios, TVs,
teatros, jornais e demais meios de comunicação; e alterações na legislação sobre seguridade e
assistência social.

Estrutura da
Constituição
Federal

ADCT (ato das


Preambulo
Parte disposições
carta de
Permanete constitucionai
itenções
s transitórias)

Vai dos titulos I a IX


Equivale ao indice de na parte permanete Regular a Transição Regular Situações
um livro tudo é norma Constitucional Temporárias
constitucional

CLASSIFICAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA VIGENTE

O seguinte critério de classificação é a junção dos métodos dos mestres Alexandre de Moraes e Manoel Gonçalves Ferreira
Filho.

Quanto à forma: ESCRITA

Constituição escrita é o conjunto de regras codificadas e sistematizadas em um único documento, caracterizando-se por ser a
lei fundamental de uma sociedade.

Escrita é a Constituição posta em um documento solene, reduzida à forma escrita, elaborada pelo órgão constituinte, resultante
de um processo de reflexão e materializada de uma só vez, num só ato. Daí sua vinculação às constituições dogmáticas.

Quanto à origem: PROMULGADA

A Constituição Brasileira vigente foi promulgada, isto é, fruto de um Poder Constituinte, composto de representantes do povo,
eleitos para o fim de a elaborar e estabelecer, através de uma Assembleia Constituinte.

Promulgada, pois, é a Constituição tida por democrática, aquela produzida pelo órgão constituinte composto de representantes
do povo.

Quanto à estabilidade: RÍGIDA

Rígidas são as Constituições somente alteráveis mediante processos solenes e com exigências de formas especiais, diferentes
e mais difíceis do que os determinados para criação das demais leis ordinárias ou complementares.

As Constituições rígidas são aquelas que necessitam de um processo formal, que lhes dificulta a alteração de seu texto,
estabelecendo mecanismos parlamentares específicos, quórum para a aprovação com maiorias especiais, competência restrita
para propor a sua alteração, além de limites temporais, circunstanciais e materiais para o funcionamento do poder de reforma.

Os elementos principais, que caracterizam a rigidez da Constituição de 1988, são:


1. a) a exigência de quorum de 3/5 para a alteração do texto através de emenda à Constituição, em dois turnos de
votação em cada casa legislativa;
2. b) a emenda poderá ser proposta pelo Presidente da República, por 1/3 dos membros da Câmara de Deputados ou
do Senado, ou por mais da metade das Assembleias Legislativas - que encaminharão a proposta aprovada pela
maioria relativa de seus membros;
3. c) a existência de barreiras, estabelecidas pelo artigo 60, parágrafo 4º, incisos I a IV, onde se proíbem emendas
tendentes a abolir a forma federativa de Estado, a democracia (voto direto, secreto universal e periódico), os direitos
individuais e suas garantias e a separação de poderes;
4. d) a existência de limites impostos ao poder constituinte derivado (o poder de reforma), durante a vigência do Estado
de Sítio, Estado de Defesa e Intervenção Federal.

Quanto ao modo de elaboração: DOGMÁTICA

A Constituição Brasileira vigente é dogmática porque é codificada e sistematizada num texto único. Sistematiza os dogmas ou
ideias fundamentais da teoria política e do Direito dominantes no momento.

Ela mostra-se como produto escrito e sistematizado por um órgão constituinte, a partir de princípios e ideias fundamentais da
teoria política e do direito dominante.

Registre-se, também o entendimento do mestre Manoel Gonçalves (2006, p.13) que, sabiamente relaciona e condiciona as
Constituições dogmáticas às Constituições escritas:

Como a Constituição escrita é sempre o fruto da aplicação consciente de certos princípios ou dogmas, enquanto a não-escrita
é produto de lenta síntese histórica, levando-se em conta a sua fonte de inspiração, as primeiras são também
ditas Constituições dogmáticas, e as últimas, Constituições históricas.

Quanto ao conteúdo: FORMAL

É o peculiar modo de existir do Estado, reduzido, sob forma escrita, a um documento solenemente estabelecido pelo Poder
Constituinte e somente modificável por processos estabelecidos pela própria Constituição.

Quanto à extensão ou finalidade: ANALÍTICA

Constituições que examinam e regulamentam todos os assuntos que entendam relevantes à formação, destinação e
funcionamento do Estado.

Constituição analítica, como a atual Constituição da República Federativa do Brasil, é aquela que traz no seu texto regras que
poderiam ser deixadas para serem tratadas em normas infraconstitucionais, pois a perspectiva de permanência destas normas
é inferior à da norma tipicamente constitucional.

Alguns pontos específicos marcam a diferença entre um texto sintético e um analítico, sendo características deste último:

1. a) maior detalhamento das normas referentes à organização e funcionamento do Estado;


2. b) maior relação de direitos fundamentais ou de direitos humanos, com um maior detalhamento de suas garantias
processuais, constitucionais e sócio-econômicas;
3. c) inclusão de regras que devido ao menor grau de abrangência de seus efeitos, e consequentemente maior
especificidade, tendem a uma menor permanência, exigindo o funcionamento dos mecanismos formais de reforma da
Constituição;
4. d) maior número de regras em sentido restrito (que regulam situações específicas), em relação a regras em sentido
amplo (que se aplicam a várias situações diferentes), em uma Constituição analítica.

Em uma Constituição analítica, quanto maior e mais detalhado for seu texto, menor será o espaço para os processos informais
de mudança constitucional, valorizando os processos formais de reforma constitucional, e consequentemente, de uma certa
maneira, a mudança constitucional, através da democracia representativa, em processos lentos e difíceis (no caso de uma
Constituição rígida).

O Brasil adotou uma Constituição analítica, que representou um passo significativo, no início da construção da democracia no
país. A Constituição de 1988 traz um amplo leque de direitos fundamentais e de garantias de várias espécies, representando
modelo de Constituição Social, que pode permitir a construção de um Estado efetivamente democrático.
Logo, conclui-se que a atual Constituição Federal Brasileira (1988) apresenta a seguinte classificação: escrita, promulgada
(democrática, popular), rígida, dogmática, formal e analítica.

2 APLICABILIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

Todas as normas constitucionais apresentam eficácia, o que é uma característica do


constitucionalismo contemporâneo em contraposição a ideias anteriores que apresentavam
um texto constitucional que apenas indicavam programas, exortações morais, declarações,
expressões políticas, promessas ou apelos sem, necessariamente, vínculos jurídicos.
Existem “diferentes graus de eficácia”, representados por três espécies de normas
constitucionais:
 Normas de eficácia plena,
 De eficácia contida e
 De eficácia limitada.

2.1 Normas de eficácia plena, contida e limitada.


Normas constitucionais de eficácia plena
A nossa Constituição Federal de 1988, embora apresente a tendência de “deixar ao
legislador ordinário a complementação de suas normas”, na maioria de seus dispositivos,
especialmente no que se refere à organização e limitação dos poderes do Estado, acolhe
normas de eficácia plena. Estas normas, são:
“aquelas que, desde a entrada em vigor da Constituição, produzem, ou têm possibilidade
de produzir, todos os efeitos essenciais, relativamente aos interesses, comportamentos e
situações, que o legislador constituinte, direta ou indiretamente, quis regular”.
Estas normas possuem aplicabilidade direta e imediata, não dependem de legislação
posterior para que possam operar de forma integral e “não podem sofrer restrições por parte do
legislador infraconstitucional”, mas podem ter seus interesses regulados, quando necessário.
Estas normas são consideradas completas e precisas na indicação das condutas que elencam
os deveres a serem cumpridos e os direitos a serem garantidos.
Em geral, estas normas são responsáveis pela criação de órgãos e atribuição de
competência aos entes federativos (como podemos ver, especialmente, nos Títulos III e IV
da CF), bem como, por exemplo, são normas que estabelecem proibições (art. 145, § 2º),
vedações (art. 19), isenções (art. 184, § 5º, I), imunidades (arts. 53 e 150, I a VI) ou
prerrogativas (art. 128, § 5º, I).
Outros exemplos são os artigos: 2º; 14, § 2º; 17, § 4º; 19; 20; 21; 22; 24; 28, caput; 30; 37,
III; 44, parágrafo único; 45, caput; 46, § 1º; 51; 52; 60, § 3º; 69; 70; 76; 145, § 2º; 155; 156; 201,
§§ 5º e 6º; 226, § 1º e 230, § 2º.

Normas constitucionais de eficácia contida


São, aquelas em que:
“o legislador constituinte regulou suficientemente os interesses relativos à determinada
matéria, mas deixou margem à atuação restritiva por parte da competência discricionária do
poder público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos de conceitos gerais nelas
enunciados”.

Embora tendo condições de produzir todos os seus efeitos quando da entrada em vigor
da CF, podem ter sua abrangência reduzida por normas infraconstitucionais posteriores,
sofrendo restrições em sua eficácia e aplicabilidade originais, ou até mesmo pela incidência de
outras normas constitucionais na previsão de situações especiais, como da decretação de
estado de defesa ou de sítio (arts. 136, § 1 º e 139: restringem o art. 5º, XVI), bem como por
motivos de ordem pública, bons costumes e paz social.
Enquanto não existir uma outra norma que venha a restringir a abrangência de tal norma
constitucional, esta terá aplicabilidade integral. Sua aplicação original e integral não depende
de intervenção do legislador, mas sua eficácia plena é passível de restrição por parte dele, por
exemplo, uma lei ordinária.
Em regra, estas normas são as que tratam de direitos individuais ou de entidades públicas
ou privadas, que são passíveis de limitação por uma lei futura, como o direito de greve no
art. 9º daCF, que foi restringido, conforme já previsto no § 1º, pela lei7.783/89, no que se refere
a serviços e atividades essenciais.
Outros exemplos são os artigos: 5º, XII (que trata do sigilo das comunicações, restringido
pela lei 9.296/96) e 5º, XIII (restringido pelo Estatuto da OAB, no que se refere ao exercício da
advocacia).

Normas constitucionais de eficácia limitada


São normas, de “eficácia relativa dependente de complementação legislativa”. É o que
considerou-se como uma tendência da Constituição de 1988. De imediato, no momento da
promulgação da CF, ou, como destaca Pedro Lenza, mesmo com a “introdução de novos
preceitos por Emendas à Constituição, ou na hipótese do art. 5º, § 3º que trata de tratados
internacionais de direitos humanos, não têm poder efetivo para produzir todos os seus efeitos.
São normas que apresentam “aplicabilidade indireta, mediata e reduzida, porque somente
incidem totalmente sobre esses interesses, após uma normatividade ulterior que lhes
desenvolva a aplicabilidade”.
Ele ainda observa que estas normas, não que não tenham eficácia, mas, na verdade,
possuem um mínimo efeito, pelo menos, vinculando o legislador infraconstitucional no sentido
de proporcionar que o interesse indicado por tal norma seja efetivado, estabelecendo um dever
ao legislador ordinário, condicionando a legislação futura sobre a matéria ao critério de
constitucionalidade, declarando nossa concepção de Estado e sociedade, inspirando o
ordenamento jurídico visando seus fins sociais, proteção de valores e busca do bem comum,
dando sentido à interpretação, integração e aplicação das leis, condicionando a atividade do
Poder Público e, principalmente, estas normas “possuem eficácia ab-rogativa da legislação
precedente incompatível”, destaca Novelino, e impedem “que o legislador edite normas em
sentido oposto ao assegurado pela Constituição”.
As normas de eficácia limitada possuem duas subespécies: normas de princípio
instituitivo (ou organizatório) e normas de princípio programático.

Normas de princípio instituitivo


Dependem da lei para organizar ou dar estrutura a entidades, órgãos ou instituições
previstas na Constituição. Possuem conteúdo organizatório e regulativo, indicando que uma
legislação futura deverá dar eficácia e aplicação efetiva ao dispositivo. Estabelecem esquemas
gerais para o legislador ordinário complementar o que foi iniciado, com critérios, requisitos,
condições e circunstâncias previstos na norma constitucional.
Podem ser normas impositivas, determinando obrigatoriamente a criação de uma
legislação integrativa para a matéria, ou normas facultativas/permissivas, indicando, sem
obrigar, o desenvolvimento de norma posterior que regule a situação envolvida.
Mas, estas normas são de pouca eficácia, pois não trazem nenhuma sanção específica
caso as determinações ou indicações não “saiam do papel”, e o legislador não poderá ser
constrangido a legislar, e, caso haja lei preexistente que não seja incompatível, esta lei não é
revogada, continua podendo ser usada no caso concreto, “aliviando a barra” do legislador.

Normas de princípio programático (2.2 Normas programáticas.)


São aquelas em que o legislador não regula nem direta nem indiretamente um interesse,
mas indica princípios que o Estado deve adotar como fim e objetivo. Elas impõem ao Estado
uma obrigação, mas não apontam, diferentemente das anteriores, com que meios os
resultados esperados deverão ser atingidos, elas “veiculam programas a serem implementados
pelo Estado, visando a realização de fins sociais (art. 6.º – direito à alimentação; 196 – direito à
saúde; 205 – direito à educação; 215 – cultura; 218, caput – ciência e tecnologia; 227 –
proteção da criança…) ”.
Localizadas especialmente nos Títulos VII e VIII da CF, o conteúdo delas traz esquemas
genéricos, diretrizes e programas de ação que preveem, inclusive, a interferência do Estado na
ordem econômico-social a fim de garantir a promoção da democracia, e se subdividem em três
subcategorias: normas programáticas vinculadas ao princípio da legalidade, referidas aos
poderes públicos e as dirigidas à ordem econômico-social em geral.
As vinculadas ao princípio da legalidade indicam que o programa previsto deverá ser
implementado por legislação futura, dependendo da atividade do legislador.
As referidas aos poderes públicos não mencionam legislação, e nem sempre precisam de
lei para os programas serem implementados, mas vinculam todo o Poder Público a uma
obrigação.
Já as dirigidas à ordem econômico-social postulam que qualquer conduta neste âmbito
praticada no sentido oposto ao da determinação constitucional será considerada
inconstitucional, uma violação ao Ordenamento Magno, passível de invalidação.

23 Princípios fundamentais.
Princípios Fundamentais na Constituição do Brasil é o termo referente a um conjunto
de dispositivos contidos na Constituição brasileira de 1988 destinados a estabelecer as bases
políticas, sociais, administrativas e jurídicas da República Federativa do Brasil. São as noções
que dão a razão da existência e manutenção do Estado brasileiro.
Sendo o Brasil um Estado democrático de direito, os princípios fundamentais se
apresentam como sendo os objetivos deste complexo sistema chamado direito.
Tais princípios apresentam-se entre os artigos 1º ao 4º, encampando uma gama
substancial de definições e objetivos a serem respeitados, mantidos e alcançados dentro de
todo território nacional.
O primeiro artigo da Constituição apresenta os fundamentos de existência e manutenção
do Estado:
 Soberania;
 Cidadania;
 Dignidade da pessoa humana;
 Os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
 Pluralismo político.

O segundo artigo apresenta a clássica divisão estatal em três poderes, idealizada


por Montesquieu:
 Executivo;
 Legislativo; e
 Judiciário.

No terceiro artigo relacionam-se os objetivos os quais a nação brasileira deve perseguir:


 Construir uma sociedade livre, justa e solidária;
 Garantir o desenvolvimento nacional;
 Erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
 Promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas
de discriminação

A seguir, no artigo quarto estão os princípios a serem utilizados pelo Brasil em


suas relações internacionais:
 Independência nacional;
 Prevalência dos direitos humanos;
 Autodeterminação dos povos;
 Não-intervenção;
 Igualdade entre os Estados;
 Defesa da paz;
 Solução pacífica dos conflitos;
 Repúdio ao terrorismo e ao racismo;
 Cooperação entre os povos para o progresso da humanidade;
 Concessão de asilo político.

24 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS.

São prerrogativas que os indivíduos têm em face do Estado Constitucional, onde o


exercício dos poderes soberanos não pode ignorar um limite para atividades, além do qual se
invade a esfera jurídica do cidadão.
São liberdades públicas de direitos humanos ou individuais que visam, num primeiro
momento, a inibir o poder estatal no sentido de proteger os interesses do indivíduo,
exonerando-o de seus deveres nesses campos.

3.1 Direitos e deveres individuais.


Direitos individuais homogêneos são aqueles que dizem respeito a pessoas que, ainda que
indeterminadas num primeiro momento, poderão ser determinadas no futuro, e
cujos direitos são ligados por um evento de origem comum. Tais direitos podem ser tutelados
coletivamente muito mais por uma opção de política do que pela natureza de seus direitos,
que são individuais, unidos os seus sujeitos pela homogeneidade de tais direitos num dado
caso. A defesa dos direitos individuais homogêneos teve início nos Estados Unidos em 1966,
através das chamadas "Class actions".

Direitos coletivos
Direitos difusos
Direitos de Grupos

3.1.1 Direitos sociais.


Direitos sociais são os direitos que visam a garantir, aos indivíduos, o exercício e usufruto
de direitos fundamentais em condições de igualdade para que tenham uma vida digna por meio
da proteção e garantias dadas pelo estado de direito.
Os direitos sociais foram conquistados ao longo de séculos, sendo a maioria deles
conquistada no século XX por meio da pressão de movimentos sociais e de trabalhadores.
Caracterizam-se por serem direitos fundamentais e necessariamente sujeitos à observância do
Estado. A demanda por direitos sociais teve origem no século XIX, com o advento
da Revolução Industrial. Eles foram, primeiramente, estabelecidos pelas
constituições Mexicana em 1917 e de Weimar em 1919, sendo positivados no âmbito
internacional em 1948 por meio da Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada
pela Assembleia Geral das Nações Unidas, e mais tarde detalhados no Pacto Internacional dos
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, em 1966.
O Pacto Internacional das Nações Unidas de 1966 foi adotado pelo Brasil em 1992 e refletiu-
se na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e na sua emenda
constitucional de 2010, resultando nos seguintes direitos definidos por seu Artigo 6º:
 a educação
 a saúde
 a alimentação
 o trabalho
 a moradia
 o transporte
 o lazer
 a segurança
 a previdência social
 a proteção à maternidade e à infância
 a assistência aos desamparados

A Declaração Universal dos Direitos Humanos e o Pacto Internacional de Direitos


Econômicos, Sociais e Culturais são mais abrangentes e ao mesmo tempo detalhados do que
os direitos previstos no Artigo 5º da Constituição Brasileira. Os demais direitos estão
positivados em outros artigos constitucionais e regulamentados por outros complexos
conjuntos de leis.
A emenda Constitucional Nº 90, de 15 de setembro de 2015 dá nova redação ao artigo 6º da
Constituição Federal, para introduzir o transporte como direito social.
A Constituição Federal afirma que a educação é um direito de todos e um dever do Estado e
da família, que visa ao pleno desenvolvimento da pessoa e seu preparo para o exercício da
cidadania. Sobre o direito à educação, o "Estatuto da Criança e do Adolescente" estabelece as
seguintes responsabilidades do Estado:
 Oferta do Ensino Fundamental, obrigatório e gratuito, e progressiva extensão da obrigatoriedade e
gratuidade para o Ensino Médio;
 Oferta de creche e pré-escola para as crianças de 0 a 6 anos;
 Oferta de ensino noturno regular para atender ao adolescente trabalhador;
 Atendimento especializado para portadores de necessidades especiais;
 Obrigatoriedade dos pais de matricular seus filhos na escola, definindo, como direito dos responsáveis,
participar da definição das propostas educacionais;
 Garantia de oferta de ensino de boa qualidade.

Os direitos sociais, apesar de expressos em diversas legislações nacionais, não estão


totalmente assegurados a todos. Alguns deles, inclusive, correm o risco de serem suprimidos
ou alterados significativamente, como os relacionados à previdência e ao trabalho, cujas
garantias estão sob debate e podem ser profundamente alteradas.

3.1.2 Direitos de nacionalidade.

Nacionalidade é um vínculo jurídico, de direito público interno, entre uma pessoa e um Estado.
A nacionalidade pressupõe que a pessoa tenha determinados direitos frente ao Estado de que
é nacional, como o direito de residir e trabalhar no território do Estado, os direitos de votar e de
ser votado, o direito de não ser expulso ou extraditado, o direito à proteção do Estado, dentre
outros.
A verificação da nacionalidade de uma pessoa é importante, pois permite distinguir entre
nacionais e estrangeiros, que têm direitos diferentes. Ademais, nos Estados que adotam o
critério da nacionalidade (lex patriæ) para reger o estatuto pessoal, a determinação da
nacionalidade da pessoa é imprescindível ao direito internacional privado. Por último, na
aplicação da proteção diplomática à pessoa no exterior, é essencial conhecer a sua
nacionalidade.
Por outro lado, a nacionalidade constitui certos deveres para a pessoa em relação ao
Estado como por exemplo, o serviço militar obrigatório em alguns países.
A nacionalidade de uma pessoa jurídica costuma ser a do Estado sob cujas leis foi
constituída e registrada.
A nacionalidade é uma relação de direito público interno; o corolário desta definição é o
princípio de que as questões relativas à aquisição ou perda de uma nacionalidade específica
são, via de regra, reguladas pelas leis do Estado cuja nacionalidade é reivindicada ou
contestada. Em outras palavras, cada Estado define, de maneira exclusiva, a sua própria
nacionalidade, a quem atribuí-la e de quem retira-la. Os eventuais tratados internacionais sobre
nacionalidade são aplicáveis apenas aos Estados que consentiram e a eles submeteram nos
termos do direito internacional. Evidentemente, uma vez que um Estado assuma um
compromisso juridicamente vinculante acerca de nacionalidade, no campo do direito
internacional, está obrigado a cumpri-lo.
A nacionalidade pode ser adquirida pela pessoa natural no momento do nascimento
(aquisição originária) ou posteriormente, por meio da naturalização, quer voluntária, quer
imposta (aquisição derivada ou secundária).

Nacionalidade Originária
A nacionalidade originária é atribuída no momento do nascimento e constitui-se na
principal forma de concessão da nacionalidade por um Estado podendo ser adquirida de duas
formas:
 jus sanguinis; ou
 jus soli.

Segundo a regra atribuidora de nacionalidade originária conhecida como jus


sanguinis (do latim “direito de sangue"), é nacional de um Estado o filho (a) de um nacional
daquele Estado, trata-se da nacionalidade por filiação (parentesco sanguíneo). A maioria dos
países que adotam o jus sanguinis como regra de atribuição de nacionalidade, estipula que
esta é transmitida tanto pelo pai quanto pela mãe (ambilinear). Todavia, alguns países como
o Líbano e a Síria adotam o jus sanguinis patrilinear (somente o pai transmite a nacionalidade).
O local do nascimento é irrelevante para esta regra, que é a mais utilizada pelos sistemas
legais europeus. Sua adoção é justificada por países de tradição emigratória sendo uma
maneira de manter o vínculo com o emigrante e sua família no exterior.
Já o jus soli ("direito do solo") estabelece como critério originário de atribuição de
nacionalidade o território em que o indivíduo nasceu. Segundo esta regra, não importa a
nacionalidade dos pais, apenas o local do nascimento da criança. Essa regra é
contemporaneamente a mais favorecida pelos países de imigração (como os das Américas),
que buscam acolher a família do imigrante e assimilá-la à sociedade local.
Os países adotam em seu direito uma ou outra forma de atribuição de nacionalidade
originária, preponderantemente, mas nenhum deixa hoje de atenuar a regra principal com
elementos de ambas as formas. Dessa maneira, um país europeu pode reconhecer a filiação
como critério principal da sua nacionalidade, mas contemplará também a possibilidade de
estendê-la, pelo menos em alguns casos, aos nascidos em seu território. Da mesma maneira,
um país americano que adote tradicionalmente o jus soli reconhecerá casos de atribuição de
sua nacionalidade aos nascidos no exterior de pai ou mãe seus nacionais.

Nacionalidade brasileira
A Constituição Federal de 1988 adota, para a concessão da nacionalidade brasileira
originária, critérios que mesclam aspectos de jus soli e jus sanguinis. Seu artigo 12 define que
são brasileiros natos:
a) os nascidos na República Federativa do Brasil (em território brasileiro), ainda que
de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país;
b) os nascidos no estrangeiro, de pai ou mãe brasileiro, desde que qualquer um deles
esteja a serviço da República Federativa do Brasil;
c) os nascidos no estrangeiro de pai ou mãe brasileiros que não estejam a serviço da
República federativa do Brasil, desde que sejam registrada em repartição brasileira
competente, (embaixada ou consulado brasileiro) ou venham a residir na
República Federativa do Brasil e opte a qualquer tempo depois de atingido a
maioridade, pela nacionalidade brasileira.
Por território brasileiro, entende-se:
1. espaço terrestre delimitado pelas fronteiras geográficas;
2. mar territorial;
3. espaço aéreo;
4. navios e aeronaves de guerra brasileiros;
5. embarcações comerciais brasileiras, ainda que em alto mar ou exercendo o direito de passagem
inocente pelo mar territorial estrangeiro, e
6. aeronaves civis brasileiras, ainda que em voo sobre espaço aéreo internacional ou estrangeiro.

Nacionalidade derivada
É adquirida mediante naturalização, definida como o ato pelo qual na forma da lei o
estrangeiro adquire a nacionalidade de outro país. Costuma ocorrer mediante solicitação,
escolha ou opção do indivíduo e por concessão do Estado cuja nacionalidade é solicitada.
Em tese, há casos de naturalização não diretamente solicitada e, por vezes, até mesmo
forçada. É exemplo do primeiro caso a chamada "grande naturalização" empreendida
pela constituição do Império do Brasil, que tornou brasileiros todos os
nacionais portugueses que mantiveram sua residência no país após a independência, em
1822.
A aquisição derivada da nacionalidade brasileira, ou seja, a concessão
de naturalização ao estrangeiro residente em território nacional, é regulada pelo Artigo 12, II,
da constituição brasileira, sendo sua concessão faculdade do Poder Executivo, por meio
de portaria do Ministro da Justiça, segundo o exposto no artigo 111 da lei n° 6.815 de 1980. A
Constituição federal prevê a aquisição da nacionalidade brasileira:
a) aos que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários de países de
língua portuguesa apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral; e
b) aos estrangeiros de qualquer nacionalidade residentes no Brasil há mais de quinze anos
ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a nacionalidade brasileira.

O ato de se conceder a naturalização ao estrangeiro é considerado um ato


de soberania estatal, sendo portanto, ato discricionário do chefe do Poder Executivo e far-se-á
mediante portaria do Ministro da Justiça. Assim entende o Supremo Tribunal Federal, já tendo
decidido que "não há inconstitucionalidade no preceito que atribui exclusivamente ao Poder
Executivo a faculdade de conceder naturalização". A satisfação das condições, exigências e
requisitos legais não assegura ao estrangeiro direito à naturalização. A outorga da
nacionalidade brasileira secundária a um estrangeiro constitui manifestação da soberania
nacional. A concessão da naturalização é uma faculdade discricionária do Poder Executivo
federal. Não há direito público subjetivo à naturalização. O Brasil não pode ser compelido a
concedê-la.
Só é considerado brasileiro naturalizado aquele que passar por todas as exigências
administrativas, já que a naturalização só produzirá efeito após a entrega do certificado pelo
magistrado competente, conforme descrito em lei. Tal entendimento é confirmado pelo STF,
que em decisão afirmou que "o brasileiro naturalizado não pode ser extraditado se não
antecede ao pedido a nulidade da naturalização, mediante o processo administrativo previsto
no art-112, parágrafos 2 e 3 da lei 6.815 não tem aplicação a hipótese em que baixada a
portaria ministerial de naturalização, esta não se consumou com a solene entrega do
certificado pelo juiz. No interregno, sem estar ainda investido na condição de brasileiro, o
naturalizando responde de acordo com a sua nacionalidade anterior." Enquanto não ocorrer tal
entrega, o estrangeiro ainda não é brasileiro, podendo inclusive ser extraditado do território
nacional.

A Constituição estabelece diferentes critérios para grupos diversos de estrangeiros que


requerem a naturalização. Tais grupos dividem-se em:
 Estrangeiros, excluídos os originários de países da língua portuguesa
 Estrangeiros originários de países de língua portuguesa, exceto portugueses residentes no Brasil
A naturalização referente aos portugueses residentes no Brasil é vista na CF 12º ss 1º,
que diz:
a) Aos portugueses com residência permanente no país, se houver reciprocidade em
favor dos brasileiros, serão atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro, salvos os
casos previstos nesta Constituição.

Quando se trata da concessão de nacionalidade brasileira derivada, além da Constituição


a lei 6815/90 também defina regras acerca da naturalização.
Na modalidade comum (Constituição Federal), requer-se do estrangeiro nascido em
país de língua portuguesa residência no Brasil por pelo menos um ano, capacidade civil e
idoneidade moral.
Aos nascidos em outros países (Lei 6815/90), exigem-se residência de, em regra,
quatro anos, capacidade civil, ler e escrever em português, boa conduta, emprego fixo ou
posse de bens e inexistência de denúncia, pronúncia ou condenação por crime doloso. A
concessão da nacionalidade comum é um ato soberano e discricionário do Estado brasileiro.

Conforme previsto no Estatuto dos Estrangeiros (Lei Nº 6.815, de 19 de agosto de 1980),


em seu artigo 112, são listados os seguintes requisitos:
1. Capacidade civil, segundo a lei brasileira;
2. Ser registrado como permanente no Brasil;
3. Residência contínua no território nacional, pelo prazo mínimo de quatro anos, imediatamente anteriores
ao pedido de naturalização;
4. Ler e escrever em língua portuguesa
5. Exercício de profissão ou posse de bens suficientes à manutenção própria e da família;
6. Inexistência de denúncia, pronúncia ou condenação no Brasil ou no exterior por crime doloso a que seja
cominada pena mínima de prisão, abstratamente considerada, superior a um ano; e
7. Boa saúde

Já na modalidade extraordinária, o estrangeiro de qualquer origem que resida no Brasil


há mais de 15 anos que conte com ausência de condenação penal terá direito subjetivo à
nacionalidade brasileira.

Polipatria e apatridia
Idealmente, para evitar conflitos jurídicos, cada pessoa deveria ter apenas uma
nacionalidade, sendo, portanto, súdito de apenas um Estado. Na prática, porém, podem ocorrer
casos de indivíduos com mais de uma nacionalidade (polipatria). Tais casos surgem quando
há uma concorrência positiva dos critérios de jus sanguinis e jus soli. Um exemplo hipotético é
o caso de nascimento, no Brasil (a lei brasileira adota o critério do jus soli como regra geral), de
um filho de pai italiano e mãe alemã (a Alemanha e a Itália adotam o critério do jus sanguinis):
o filho será brasileiro (jus soli), italiano (jus sanguinis) e alemão (jus sanguinis). Outro exemplo
hipotético é o nascimento, no Brasil, do filho de um casal de alemães: o filho será brasileiro,
porque nasceu no Brasil, e ao mesmo tempo alemão, porque descende de pais alemães.

O outro extremo é a apatridia: a concorrência negativa dos critérios de jus sanguinis e jus
soli. Por exemplo, sejam, por hipótese, as regras atribuidoras de nacionalidade do Uruguai e da
Itália apenas o jus soli e o jus sanguinis, respectivamente. O filho de uruguaios nascido em
território italiano não teria nem a nacionalidade uruguaia (pois não nasceu no Uruguai) nem a
italiana (não é descendente de italianos). Seria, neste caso hipotético, apátrida, ou seja, sem
nacionalidade.
A Convenção sobre o Estatuto dos Apátridas, de 1954, representa um esforço da
comunidade internacional no sentido de evitar ou mitigar a apatridia, ao estipular que os
Estados-membros devem conferir aos apátridas os mesmos direitos outorgados aos
estrangeiros.

Distinção entre brasileiro nato e naturalizado


A Constituição proíbe a distinção legal entre brasileiros natos e naturalizados, exceto
quanto aos casos nela previstos:

Dos cargos privativos de brasileiros natos:


1. Presidente e Vice-Presidente da República;
2. Presidente da Câmara dos Deputados;
3. Presidente do Senado Federal;
4. Ministro do Supremo Tribunal Federal;
5. Membros da carreira diplomática;
6. Cargos de oficial das Forças Armadas;
7. Cargos de Ministro de Estado da Defesa; e
8. Os seis cargos de membro do Conselho da República mencionados no art. 89, item VII, da Constituição
Federal.

Extradição de brasileiro naturalizado


Segundo prevê o art. 5º, inciso LI da Constituição Federal, após análise da solicitação de
Estado estrangeiro pelo Supremo Tribunal Federal (art. 102, alínea g), somente se admite duas
possibilidades de extradição de brasileiros, observadas as seguintes circunstâncias:
1. Deve ser naturalizado, e não nato;
2. A solicitação de extradição deve ser decorrente do cometimento de crime comum praticado antes de
haver sido formalizada a naturalização; e ou
3. No caso de comprovado envolvimento com o tráfico ilícito de entorpecentes, mesmo que posterior à
naturalização.

Em outras palavras esse inciso impede a extradição de qualquer brasileiro nato, seja qual
for o motivo da solicitação, atenção não confundir entrega com extradição.

Propriedade de empresa de rádio ou de televisão


A Constituição Federal também define que a propriedade de empresas jornalísticas, de
rádio ou TV é privativa de brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos.

Perda da nacionalidade brasileira


A perda da nacionalidade é de trato exclusivo da Carta Política de 88, temos apenas dois
casos previstos no texto constitucional que são aqueles elencados em seu artigo 12.
O primeiro é por decisão judicial, que cancelará sua naturalização quando o brasileiro
tenha realizado atividade prejudicial ao interesse nacional aponta-se como, o ato do
cancelamento, da naturalização válida. O processo judicial se inicia com o Ministro da Justiça,
por solicitação ou por qualquer cidadão por representação. A partir daí o Ministério Público
Federal, haja visto que todo processo se inicia na Justiça Federal, pede o inquérito policial, se
conhecer da requisição inicial e a tramitação passam a ser de acordo com a Lei 818/49,
submetendo o poder Executivo as decisões do Poder Judiciário (que será nesse caso concreto
ex nunc) pois aqui se tem um ponto fora da curva, o qual é, em se tratando de matéria de
soberania o Poder Executivo tem legitimidade para decidir.
Sendo que neste caso apenas o brasileiro naturalizado pode perder a nacionalidade por
praticar ato/atividade nociva ao interesse nacional.
O segundo caso é quando adquirir outra nacionalidade, exceto quando tem de haver pela
lei estrangeira o reconhecimento da nacionalidade originária ou quando para que se tenha
permanência no país estrangeiro ou exercício de direitos civis se imponha a naturalização
brasileira pela lei estrangeira.
Percebe-se que a perda da nacionalidade não é automática, pois prescinde de um ato
específico que em processo específico terá a perda. Em 1988 o verbete “por naturalização
voluntária” deixou de ser a única forma de perda de nacionalidade e não mais a vontade do
indivíduo importa e sim à vontade e interesse do Estado que é levado em conta. Então se o
Estado concede a naturalização ele perde a sua anterior e se o Estado estrangeiro não
conceder não há perda. Por fim, cumpre dizer que há uma divergência doutrinária quanto à
reaquisição da naturalização ao Estado Brasileiro. Quando se decreta a reaquisição de
nacionalidade brasileira o cidadão volta a ter a condição que perdeu, ou seja, se nato volta a
ser nato, e se naturalizado volta à condição de naturalizado.
A Constituição Federal de 1988, traz expressamente, em seu artigo 12, inciso II, alínea b
§ 4º:
"Será declarada a perda da nacionalidade do brasileiro que:
I - tiver cancelada sua naturalização, por sentença judicial, em virtude de atividade nociva
ao interesse nacional; (apenas brasileiros naturalizados)
II - adquirir outra nacionalidade, salvo nos casos: (natos e naturalizados)
a) de reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira;
b) de imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em
Estado estrangeiro, como condição para permanência em seu território ou para o exercício de
direitos civis."

3.3 Direitos políticos

Cidadania
A cidadania (do latim,civitas,"cidade"), em Direito, é a condição da pessoa natural que,
como membro de um Estado, encontra-se no gozo dos direitos que lhe permitem participar da
vida política.
A cidadania é o conjunto dos direitos políticos, que lhe permitem intervir na direção dos
negócios públicos do Estado, participando de modo direto ou indireto na formação do
governo e na sua administração, seja ao votar (capacidade eleitoral ativa), seja ao ser votado
(capacidade eleitoral passiva).
A nacionalidade é pressuposto da cidadania, ser nacional de um Estado é condição
primordial para o exercício dos direitos políticos. Entretanto, se todo cidadão é nacional de um
Estado, nem todo nacional é cidadão os indivíduos que não estejam investidos de direitos
políticos podem ser nacionais de um Estado sem serem cidadãos.

No Brasil os direitos políticos são regulados pela Constituição Federal em seu art. 14,
que estabelece como princípio da participação na vida política nacional o sufrágio universal.
Nos termos da norma constitucional, o alistamento eleitoral e o voto são obrigatórios para os
maiores de dezoito anos, e facultativos para os maiores de dezesseis e menores de dezoito, os
maiores de setenta e aos analfabetos.
A Constituição proíbe o alistamento eleitoral dos estrangeiros e dos brasileiros conscritos
no serviço militar obrigatório, considera a nacionalidade brasileira como condição de
elegibilidade e remete à legislação infraconstitucional a regulamentação de outros casos de
inelegibilidade (lei complementar n. 64, de 18 de maio de 1990).

Os direitos políticos constituem um conjunto de regras constitucionalmente fixadas,


referentes à participação popular no processo político. Dizem respeito, em outras palavras, à
atuação do cidadão na vida pública do país.
No direito brasileiro, além do direito de voto em eleições, também constituem direitos
políticos o direito de voto em plebiscitos e referendos, o direito de iniciativa popular e o direito
de organizar e participar de partidos políticos.

Na ordem jurídica brasileira, a raiz constitucional de todos os direitos políticos pode ser
identificada no parágrafo único do art. 1° da CF/88, que dispõe: "Todo o poder emana do povo,
que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta
Constituição". Este dispositivo encontra subsequente especificação nos artigos 14, 15 e 16 da
Constituição (Título II, Dos Direitos e Garantias Fundamentais, Capítulo IV, Dos Direitos
Políticos). Observe-se que os direitos e garantias individuais e o voto direto, secreto, universal
e periódico constituem cláusulas pétreas da Constituição brasileira, não podendo ser objeto
de emenda (art. 60, § 4°, II e IV) .
As normas infraconstitucionais brasileiras mais importantes relativas a direitos políticos
são:
 Lei n.° 4.737, de 15.07.1965 (Código Eleitoral)
 Lei n.° 9.096, de 19.09.1995 (dispõe sobre partidos políticos)
 Lei n.° 9.614, de 30.09.1997 (estabelece normas para as eleições)
 Lei n.° 9.029, de 18.11.1998 (regulamenta a execução de plebiscitos, referendos e iniciativa popular)
 Lei Complementar n.° 64, de 18.05.1990 (estabelece casos de inelegibilidade), alterada pela Lei
Complementar n.° 81, de 13.04.1994.
 Lei Complementar n.° 135, de 2010 (a Lei da Ficha Limpa, emendada à Lei Complementar n.° 64, de
18.05.1990)

3.1.4 Direitos dos partidos políticos.

Os partidos políticos no Brasil existem desde a primeira metade do século XIX. Mais de
200 agrupamentos surgiram nesse período, porém nenhum deles durou muito. Não existem
partidos centenários no Brasil, como é comum, por exemplo, nos Estados Unidos, onde os
partidos Democrata (desde 1790) e Republicano (desde 1837) alternam-se no poder.
Frequentemente, os partidos brasileiros foram forçados a ter de começar, praticamente do
zero, uma nova trajetória: tais rompimentos ocorreram pela implantação da República, em
1889, que sepultou os partidos monarquistas; pela Revolução de 1930, que desativou os
partidos republicanos “carcomidos”; pelo Estado Novo (1937-1945), o qual vedou a existência
de partidos; e pelo Regime Militar de 1964, que confinou manu militari os partidos políticos a
um artificial bipartidarismo.
Alguns autores, como José Honório Rodrigues, consideram que o Brasil sempre foi
dominado por um só partido – o das classes proprietárias ou "o Partido do Patriciado"; o único
partido realmente governante da história nacional. Seus partidários, no poder desde os tempos
coloniais, quando monopolizaram o acesso às terras, à mão-de-obra e aos principais cargos
públicos, adaptam-se aos tempos, assumindo a forma e a feição necessária mais conveniente
ao momento. Ora conservadoras, ora modernizadoras, ora reacionárias, ora progressistas, é
sempre a mesma casta e seus descendentes, que prefere a conciliação ao conflito, que conduz
as coisas maiores no Brasil.
Para Rodrigues, nem na Independência deu-se o rompimento com a oligarquia que
governava o País, tendo mantido-se sempre uma continuidade histórica entre as diversas
sucessões de regimes políticos. Reconhecendo a existência de duas correntes de opinião, “a
tradicionalista e conservadora”, defensora do status quo, e a outra, a “mameluca”, mais popular
e radical, ele reconhece a vitória histórica da primeira.
Um caso que bem ilustra e corrobora essa tese é o de Afonso Arinos de Melo Franco, que
participou da redação da Constituição Federal de 1967. Seu avô, o Conselheiro Cesário Alvim,
foi um homem do Império e participou da redação da Constituição republicana de 1891. Afrânio
de Melo Franco (cuja esposa era da família do ex-Presidente Rodrigues Alves), seu pai, atuou
na Constituição de 1934, e ele, por sua vez, participou da redação da Constituição de
1967. Gustavo Franco, seu sobrinho, foi presidente do Banco Central, entre 1997-1999.

Império do Brasil
Até 1837, não se pode falar, a rigor, em partidos políticos no Brasil. Nesse ano, formaram-
se as duas agremiações que caracterizaram o Segundo Reinado, a dos Conservadores,
chamado Partido Conservador (saquaremas) e a dos Liberais, chamado Partido
Liberal (luzias).
Esses partidos, bem como o Partido Republicano Paulista, foram os partidos de mais
longa duração no Brasil.
Os conservadores defendiam um regime forte, com autoridade concentrada no Trono e
pouca liberdade concedida às Províncias. Os liberais inclinavam-se pelo fortalecimento do
Parlamento e por uma maior autonomia provincial. Ambos eram pela manutenção do regime
escravista, mas os liberais aceitavam a sua supressão, conduzida por um processo lento e
gradual que conduziria, enfim, à abolição da escravatura.
Naquela época, poucos votavam, pois o voto era hierárquico, baseado em no sufrágio
censitário, por meio do Decreto nº 3.029, de 9 de janeiro de 1881 (Lei Saraiva). As eleições
eram realizadas em dois turnos, a saber: as assembleias paroquiais escolhiam os eleitores das
Províncias, e estes, por seu turno, escolhiam os representantes da Nação e das Províncias.
Tanto conservadores como liberais pertenciam a mesma classe social, a dos proprietários de
terras, de bens e de escravos. Dentre os liberais, havia mais comerciantes, jornalistas e
populações urbanas em geral.

República Velha
O Manifesto Republicano foi assinado por Quintino Bocaiúva, em Itu/SP, em 3 de
dezembro de 1870, e provocou a fundação de um partido republicano. Sua primeira convenção
criou o Partido Republicano Paulista (PRP).
A república implantada a partir da Proclamação da República, em 15 de novembro de
1889, foi um golpe militar, obra de generais, e contou com escassa presença de republicanos
autênticos. No âmbito regional, mesmo assim surgiram partidos como o Partido Republicano
Paulista e o Partido Republicano Mineiro que foram importantes na aplicação da chamada
"Política dos Governadores", iniciada em 1894. A maior parte dos Partidos Republicanos dirigiu
os governos estaduais no período 1889-1930. Vale mencionar ainda o Partido Libertador
(1928) de Assis Brasil, no RS, ou o Partido Democrático, formado em 1926 por Antônio Prado,
em SP. A "Política dos Governadores" acabou por desestimular a formação de agremiações
nacionais (os Partidos Republicanos Federais/ Liberais e Conservadores pretendiam agregar
forças políticas no país inteiro, mas não foram adiante). Os partidos oposicionistas estaduais
tiveram pouco sucesso no período.
Assim, no âmbito federal foram apenas alguns agrupamentos que receberam o nome de
"partido político" mas tiveram vida efêmera, para atenderem circunstâncias especiais. Alguns
exemplos: Partido Republicano Federal (1893), de Francisco Glicério; Partido Republicano
Conservador (1910), de Pinheiro Machado e Quintino Bocaiúva; Partido Republicano Liberal
(1913), de Rui Barbosa e o Partido Democrático Nacional (1927) de Antônio Prado.
Apesar de haver a Lei nº 1.269 de 1904 que admitia a "representação das minorias"
apenas com a Reforma constitucional de 1926 é que tornou-se obrigatória.
Outra lei, a de nº 3.139 de 1916 atribuía às autoridades judiciarias a qualificação para as
eleições federais mas, apesar disso, as chamadas "mesas eleitorais" é que eram as
responsáveis pelas triagens de votos e "primeira fonte de fraudes eleitorais do período".
Esses partidos regionais favoreceram a adoção do coronelismo e de suas conhecidas
práticas: democracia e eleições "de fachada", com seus resultados sempre manipulados pelo
coronel local, pelo cabo-eleitoral e pelo curral eleitoral, com a função básica de garantir
resultados satisfatórios ao grupo governante.
Essas práticas, que feriam o princípio básico do sistema republicano, geraram a violência
política que eclodiu em vários movimentos, tais quais: o Tenentista (1922-27); a Revolução de
1923, no Rio Grande do Sul; e a Revolta de Princesa, na Paraíba (1928).
Tais partidos regionais conviveram, por alguns anos, com os partidos ideológicos
nacionais, como o Partido Comunista Brasileiro (PCB), fundado em 1922, e a Ação Integralista
Brasileira (AIB), de 1932.

Partidos ideológicos
O Brasil também acolheu as ideologias extremistas que surgiram depois da Primeira
Guerra Mundial, a saber: o comunismo e o fascismo. Em 1922, foi fundado o Partido
Comunista do Brasil (PCdoB), vinculado à Terceira Internacional Comunista, com sede
em Moscou e liderado por Luís Carlos Prestes. Dez anos depois, em 1932, foi a vez da
fundação da AIB, inspirada no movimento fascista italiano e no movimento Falange Espanhola,
comandada pelo chefe Plínio Salgado.
Ambos os partidos tentaram depor o regime de Getúlio Vargas, por meio de um golpe. O
PCdoB foi o principal articulador da frente que se escudou na Aliança Nacional
Libertadora (ANL) e foi responsável pela fracassada Intentona Comunista (por se considerar
um movimento revolucionário, é correto substituir-se por "Levante Comunista"), de 27 de
novembro de 1935, enquanto a AIB tentou assaltar o Palácio da Guanabara, em 12 de maio de
1938, para derrubar o governo do Estado Novo que os excluíra do poder.
No período pós Revolução de 1930, até o advento do Estado Novo, manteve-se o sistema
de partidos estaduais, com alguma maior fragmentação e representatividade dos partidos
oposicionistas, todos de caráter estadual. Apareceram a Liga Eleitoral Católica (LEC), em
dezenas de estados, sem organicidade nacional, porém, e partidos ligados à nova ordem
disputando espaço com as antigas legendas oligárquicas.

Partidos da república redemocratizada: 1945-1965


Após terem sido totalmente proibidos durante o Estado Novo (1937-1945), os partidos
políticos foram novamente legalizados em 1945. A vida política brasileira entre 1945 e 1964 foi
polarizada entre o principal partido antigetulista, a União Democrática Nacional (UDN), e os pró
Vargas: o Partido Social Democrático (PSD) e o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB).
O PSD abrigava as correntes mais conservadoras do getulismo, formada por proprietários
rurais e altos funcionários estatais, enquanto que o PTB, inspirado no Partido Trabalhista do
Reino Unido, reunia as lideranças sindicais e os operários fabris em geral. O partido rival,
a UDN, de cunhos liberal e antipopulista, congregava a alta burguesia e a classe média urbana,
defensora do capital estrangeiro e da iniciativa privada. Coube, então, à UDN o papel de ser a
principal promotora das impugnações das vitórias eleitorais da coligação PSD-PTB (1950-
1955), bem como a maior instigadora das tentativas de golpes contra Getúlio, Juscelino e
Jânio, que se sucederam, até a vitória do golpe militar de 1964. Carlos Lacerda, um jornalista e
dono de jornal opositor do trabalhismo de longa data, foi o mais destacado porta-voz do
antigetulismo.
O PCB teve breve duração legal, entre 1945 e 1947, e continuou a existir, na ilegalidade,
e outros partidos tiveram razoável representatividade, como o PSP ademarista, ou o PDC. Os
integralistas se reorganizaram, e seus ex-integrantes reagruparam-se, sob o nome de Partido
de Representação Popular (PRP), ainda liderado por Plinio Salgado.

Bipartidarismo no regime militar


Os partidos foram dissolvidos através do Ato Institucional n. 2, e o bipartidarismo no Brasil
foi logo após criado pelo Ato Complementar n° 4, baixado em 20 de novembro de 1965 pelo
então Presidente Castelo Branco.
A partir de 1965, somente era permitida a existência de duas associações políticas
nacionais, e nenhuma delas podia usar a palavra “partido”. Criou-se então a Aliança
Renovadora Nacional (ARENA), base de sustentação civil do regime militar, formada
majoritariamente pela UDN e alguns egressos mais conservadores do PSD, e o Movimento
Democrático Brasileiro (MDB), que tinha a função de fazer uma oposição "bem-comportada"
que fosse tolerável ao regime, porém abrigando os militantes do PCB, que estava na
ilegalidade, assim colaborando para a encenação da existência de uma "democracia" no Brasil
e se recusando a recorrer à luta armada, como fizeram as organizações de esquerda
clandestinas.
O regime militar permitia o sistema de cassações de mandatos, que usava amiúde para
se descartar dos seus adversários (4.682 perderam seus direitos políticos). Juntaram-se na
ARENA todas as lideranças direitistas, conservadoras, ex-udenistas, e até alguns fascistas;
enquanto os politicamente mais ao centro, os escassos trabalhistas sobreviventes dos
expurgos do regime, e todos aqueles que não foram convidados para entrar na ARENA se
inscreveram, misturados, no MDB. Esse congelamento da situação partidária no Brasil, manu
militari, prolongou-se por quase 20 anos.
Retorno ao pluripartidarismo
Em 1980, voltou a existir o pluripartidarismo sendo inicialmente criados cinco partidos
políticos, e o país tem dezenas de partido atuantes, sendo que atualmente há mais de 30
partidos políticos registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

3.2 "Direitos Fundamentais do Trabalho na Constituição de 1988."


A organização de elementos comuns ou especiais que dão feição própria a determinada
ciência não é exclusiva da ciência jurídica. No que diz respeito ao Direito, uma ordem jurídica
não é feita de normas de direito unicamente justapostas. É a conexão sistemática de normas
específicas com as demais normas que compõem um ordenamento ou ramo jurídico que vem a
ser caracterizada como um sistema de direito.
Segundo Bernd Rüthers, o conceito de sistema é utilizado com significações diversas. De
um lado, cuida-se de uma ordenação formal de sistema (sistema externo) quando se realiza a
divisão formal da matéria jurídica (por exemplo, o direito do trabalho, o direito público etc.). A
contraparte do sistema externo é o sistema interno, denominação que se deve a Philipp Heck,
mediante o qual é considerada a ordenação material consistente num sistema de valores. Essa
ordenação confere sentido ao todo, na medida em que se procura compreender o conjunto da
ordem jurídica como uma unidade livre de contradições.
Também Karl Larenz, dissertando acerca da conexão das normas jurídicas entre si, refere
que “toda a interpretação de uma norma tem de tomar em consideração, como vimos, a cadeia
de significado, o contexto e a sede sistemática da norma, a sua função no contexto da
regulação em causa”. O autor desenvolve extenso exame tanto do sistema externo quanto do
sistema interno. Em relação a este último, cuida da importância que os princípios jurídicos
exercem na sua formação, pondo ênfase na circunstância de haver um “jogo concertado, não
totalmente ‘pré-programado’, dos diferentes princípios de igual peso nos diferentes graus de
concretização”. Dada essa concertação, o autor deixa claro que o sistema interno é um sistema
“aberto” que permite alterações nesse jogo concertado dos princípios, do seu alcance e
limitação recíproca, como também a descoberta de novos princípios. E quanto aos princípios
em apreço, o autor arremata: “Os ‘princípios abertos’ e as bases de valoração neles expressas
constituem os pontos de referência centrais para o ‘sistema interno’ do Direito, sistema que
pretende trazer à luz uma Jurisprudência que se orienta a valores e ao mesmo tempo procede
sistematicamente”5.
O exame que ora se empreende, relativo aos direitos fundamentais do trabalho enquanto
expressão de um sistema especial, tem como pressuposto a sua categorização principiológica
e valorativa, em consonância com as formulações doutrinárias relativas ao sistema interno. De
fato, os direitos fundamentais do trabalho da Constituição de 1988 integram, em sentido amplo,
uma ordenação jurídico-objetiva de valor e, em sentido estrito, constituem decisões jurídico-
objetivas de valor. Cada norma jusfundamental do trabalho em particular está ancorada em
base axiológica comum. De outro lado, o caráter aberto do referido sistema deriva tanto dos
termos do § 2º do art. 5º quanto do caput do art. 7º, ambos da Constituição. Presentes esses
pressupostos é que se prossegue no
exame desse sistema especial de modo a identificar seus principais elementos, estes
dirigidos a fornecer diretivas para a efetivação dos referidos direitos fundamentais.

SIGNIFICADO HISTÓRICO E CONCEITO DE DIREITO FUNDAMENTAL


Qual será o significado da presença de determinados direitos no rol dos direitos
fundamentais de uma constituição? A indagação para nós brasileiros por certo se justifica
porque nossa tradição constitucional nos fala da importação, a partir de ordenamentos
constitucionais estrangeiros, de direitos fundamentais classicamente identificados como
individuais. Isso se confirma, por exemplo, pelo exame das “Garantias dos Direitos Civis e
Políticos” da Constituição outorgada de 1824 e da “Declaração de Direitos” da primeira
constituição republicana, de 1891. Em confronto com a realidade à qual supostamente
dirigidos, esses direitos mais se assemelharam a um ornamento agregado às regras de
organização do poder político, relativamente ao qual ocuparam posição secundária. Em lugar
de conquistas do povo reunido em assembleia constituinte, retrataram simples outorga ou
concessões formais dos donos do poder, sem maior consequência do ponto de vista normativo.
Nem os padrões políticos imperiais se dobraram à Constituição de 1891.
A prevalente dimensão retórica, em detrimento da força normativa, que as constituições
assumiram em nossa vida constitucional em parte se deve à importação acrítica de institutos
jurídicos e políticos, em desconexão com nossa experiência histórica. Ainda assim, o
conhecimento do direito comparado é útil para a presente análise, a qual busca identificar o
significado da positivação dos direitos fundamentais nas constituições do mundo ocidental nos
últimos
A Carta de 1824 foi outorgada pelo imperador após a dissolução da comissão
encarregada de redigir o projeto. A de 1891 teve projeto elaborado pela “Comissão dos
Cinco”, com o retoque final de Ruy Barbosa, recém-convertido ao credo republicano. Das
constituições do século XX, anteriores à de 1988, a de 1946 foi a única que partiu do
trabalho de comissão ampliada. Mesmo à Assembleia Constituinte de 1987-8 foi
apresentado anteprojeto da designada “Comissão de Notáveis”, presidida por Afonso
Arinos. Entretanto, a Assembleia acabou por dispensá-lo e elaborou projetos próprios por
meio de suas comissões e subcomissões, os quais, no entanto, continham alguns
dispositivos daquele anteprojeto.
Os direitos fundamentais individuais, segundo a noção que acerca deles foi desenvolvida,
encontram sua fonte nas declarações de direitos que se seguiram às revoluções norte-
americana e francesa do final do século XVIII. O Bill of Rights do Povo de Virginia, de 1776, e
sobretudo a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, na França, são o
embrião dos direitos fundamentais do indivíduo que as constituições passaram a incorporar.
Seu significado consiste em reforçar situações ou posições individuais, especialmente no
terreno da liberdade e da propriedade, que ficariam imunes à intervenção do soberano, a não
ser em hipóteses previamente autorizadas na própria regra asseguradora do direito. Por isso é
que os direitos fundamentais clássicos são qualificados como direitos de defesa ou de
liberdade.
A constituição política e jurídica do Estado Moderno que emergiu das referidas revoluções
impôs deveres ao soberano, o qual não mais podia dispor arbitrariamente acerca dos direitos
de súditos, como sucedia no até então vigente Estado de Polícia, próprio do período do
absolutismo monárquico. No Estado Moderno há cidadãos, aos quais “não se dá nem se retira
direitos”, como ocorria no Estado de Polícia. No Estado de Direito, os direitos ou são devidos,
ou indevidos, e ao exercente de poder estatal chamado a decidir a esse respeito cabe justificar
decisões num ou noutro sentido.
É sabido que os direitos fundamentais clássicos acabaram por não contemplar entre seus
beneficiários populações desprovidas de bens ou posições que pudessem defender na nova
ordem social e econômica que foi sendo gestada pari passu com a nova ordem política. A
propósito, vale recordar que os direitos fundamentais reconhecidos nas constituições que se
seguiram ao período revolucionário francês deveriam servir não só à defesa de posições do
indivíduo em face do soberano. Também visavam resguardar ao cidadão a prerrogativa de
fazer uso desses direitos para transformar estruturas estamentais injustas da velha ordem. Mas
não foi isso que se viu com a consolidação do poder econômico e político pela classe
burguesa. De fato, grandes segmentos populacionais de países europeus, desprovidos de
educação e de outros bens vitais, a não ser a própria força de trabalho, tiveram de iniciar longo
caminho de lutas dirigido ao reconhecimento de direitos sociais em geral e do direito do
trabalho em particular, o qual converteram em seu estatuto jurídico, de modo a assegurar o
fornecimento de prestações materiais dirigidas a prover existência digna e promover maior
igualdade material, promessa revolucionária descumprida.
Já no século XX, ainda no mundo europeu, a Constituição de Weimar foi pioneira no
reconhecimento de direitos fundamentais sociais, dando origem ao constitucionalismo social
que influenciou e influencia até o presente o ordenamento jurídico-constitucional, não só da
Alemanha, mas também de outros países europeus e da América Latina, como é o caso do
Brasil.
Enquanto herdeiras do constitucionalismo social de Weimar de 1919, como também da
Constituição mexicana de 1917, as constituições brasileiras, a partir da de 1934, passaram a
contemplar preceitos e direitos sociais, muito embora sem caráter fundamental. O tardio
reconhecimento formal e o enorme déficit que experimentamos no terreno da efetivação dos
direitos sociais e do trabalho no Brasil resultam do desenrolar de nossa própria história,
marcada pelo domínio colonial, por séculos de escravidão e pela ausência, até o limiar do
século passado, de sociedade com capacidade de se afirmar em face dos poderes estatais. Na
medida em que também entre nós a urbanização, a industrialização e o consequente
surgimento de organizações empresariais e de trabalhadores influenciou as relações
socioeconômicas nas cidades, a legislação, ainda que editada por meio de decretos-leis, veio
para regrar os conflitos que essa realidade ocasionou.
Entretanto, é a Constituição de 1988 que introduz alterações no significado dos direitos
fundamentais no Brasil. Na configuração constitucional compatível com o Estado Democrático
e de Direito afirmado no art. 1º, o constituinte estabeleceu mudanças estruturais e de conteúdo.
No que diz com a estrutura da Constituição, os direitos fundamentais passam a se situar no
Título II, portanto, na sua abertura. Tem isso o sentido de evidenciar que os direitos
fundamentais são princípio constitutivo, e não mero princípio organizativo do Estado brasileiro.
A estrutura da atual Constituição, mais do que mera ordenação tópica de matérias, traduz a
superação do formato constitucional clássico. O tradicional eixo gravitacional da Constituição
desloca-se da precedência da organização estatal para a primazia da sociedade; da
organização das esferas do poder político, para os direitos fundamentais. Assim, os direitos
fundamentais assumem anterioridade em face dos órgãos estatais. Esses devem não só ob-
servância formal àqueles direitos, mas estão vinculados à sua efetivação, pois eles não se
prestam como simples adorno da ordem jurídico-constitucional.
Do ponto de vista de seu conteúdo, a alteração de maior relevo da Constituição de 1988
foi o reconhecimento de direitos fundamentais sociais. Dentre esses direitos arrolados no art.
6º, a atenção do presente artigo volta-se aos direitos do trabalho previstos nos arts. 7º e
seguintes. Esses direitos, além de traduzirem concreção do próprio direito ao trabalho do art.
6º, são concreções de valores, objetivos e princípios que figuram, expressa ou implicitamente,
tanto no preâmbulo12 e no Título I quanto nos Títulos VII e VIII, concernentes à Ordem
Econômica e Financeira e à Ordem Social da Constituição. Enquanto os direitos fundamentais
clássicos são posições jurídicas que preservam o sujeito da ingerência indevida do Estado, a
Constituição de 1988 inova ao incorporar direitos dos trabalhadores na categoria dos direitos
fundamentais, tendo como destinatários (obrigados) principais o empregador ou tomador do
trabalho, obrigados a fornecer prestações materiais em contraprestação pelo trabalho.
De par com esse dever de prestação, há também o dever de não discriminar fixado, por
exemplo, nos incisos XXX a XXXII do art. 7º, além de assegurado no princípio/regra que é a
dignidade da pessoa (art. 1º, III). De sua parte, também o Estado é destinatário (obrigado) de
alguns direitos elencados no art. 7º, como por exemplo, os de natureza previdenciária e os
relativos a normas de proteção ao mercado de trabalho da mulher (inciso XX) e normas de
proteção à saúde, higiene e segurança (inciso XXII). E quanto às prestações devidas pelo
empregador ou tomador dos serviços, o Estado continua destinatário (obrigado) desses
direitos, mas sua prestação consiste em assegurá-los quando violados ou não fornecidos pelos
destinatários diretos. No exercício de todas essas tarefas o Estado possui deveres de proteção.
Diversamente do que expressaram nas constituições anteriores, os direitos fundamentais
da atual constituição, especialmente os direitos sociais e coletivos, foram resultado de intensa
mobilização da sociedade civil dos anos 80 do século passado. O porquê da atribuição de
caráter jusfundamental, pelo constituinte de 1987-88, a série de direitos do trabalho constitui
fato histórico ao qual o intérprete e aplicador devem permanente atenção. Em sua dimensão
política e social, não se cogita da “outorga ou concessão” de direitos fundamentais. Ao
contrário, eles resultaram de intensa participação e de mobilização social sem precedentes no
país. De outro lado, o estatuto jurídico que a Constituição de 1988 atribui aos direitos sob
exame possui sentido integrador, na medida em que os reconhece e integra aos direitos
fundamentais em geral porque essenciais à vida e ao desenvolvimento e consolidação da
personalidade do sujeito em sociedade livre, justa e solidária15. Os direitos fundamentais do
trabalho destinam-se a promover a igualdade material e proporcionar “liberdade real” que os
direitos clássicos não asseguraram ao não proprietário.
Portanto, segundo concepção emergente da categorização adotada pela Constituição de
1988, os direitos fundamentais não se destinam a assegurar exclusivamente posições
subjetivas, de defesa do indivíduo em face do Estado. Isso continua a valer para direitos
individuais que têm como destinatário (obrigado) o Estado. Já os direitos fundamentais do
trabalho têm como principal destinatário (obrigado) imediato o empregador ou tomador de
trabalho prestado por pessoa física, cabendo ao titular, no exercício do direito de ação (de
defesa), demandar os deveres de proteção que remanescem com o Estado. Direitos
fundamentais, então, são posições jurídicas de indivíduos e coletividades assim reconhecidos
na Constituição os quais têm como destinatários (obrigados) quer o Estado, quer o empregador
ou tomador de serviços prestados por pessoas naturais. Se violados, cabe sua defesa frente ao
Estado.
É certo que essa nova qualificação normativa impõe mudança na dogmática jurídica, está
dirigida a encontrar os meios mais eficazes à efetivação dos direitos fundamentais. Para essa
finalidade, o elemento genético presente no reconhecimento dos direitos fundamentais sociais
e do trabalho há de ser considerado por quem encarregado de sua interpretação e aplicação.

OS DIREITOS FUNDAMENTAIS E SUA DIMENSÃO SUBJETIVA E OBJETIVA


Funções clássicas dos direitos fundamentais
Quando se fala de direitos fundamentais clássicos normalmente pensa-se em direitos
subjetivos públicos que asseguram ao respectivo titular uma pretensão jurídica. Essa pretensão
historicamente foi associada a uma ação que o indivíduo possuía para fazê-los valer se
violados ou sob a ameaça do Estado. A compreensão dos direitos fundamentais como o
correspondente exclusivo de um direito individual vincula-se à noção que passaram a deter em
sua fase de consolidação sob o Estado liberal do século XIX. É fácil compreender a razão da
prevalência inicial da dimensão defensiva desses direitos, se ponderados os fatos históricos. A
superação da dominação colonial nos EUA e das estruturas estamentais na França, essas
apoiadas no absolutismo monárquico, fez emergir sociedade na qual súditos se convertem em
cidadãos, conforme já destacado. Afirma-se, pois, esfera privada que exige a contenção de
intervenções do monarca nos direitos de liberdade, propriedade e de crença, entre outros,
reconhecidos nas declarações de direitos das constituições. Dentre os direitos fundamentais de
natureza procedimental, o direito de petição e de ação constitui instrumento processual
destinado a garantir a defesa contra intervenções não autorizadas.
Os direitos fundamentais em seu sentido clássico exerceram suas funções nas relações
entre o indivíduo e o Estado. Nesse terreno, é conhecida a obra e doutrina do publicista alemão
Georg Jellinek (Sistema dos Direitos Subjetivos Públicos), na qual desenvolve a conceituação
de diversas posições que o indivíduo podia assumir frente ao Estado. Trata-se da doutrina dos
quatro status (negativus, positivus, activus e passivus). Sob a perspectiva negativa, os direitos
fundamentais conferiam ao indivíduo o direito subjetivo público de exercer a defesa de espaços
vitais, de liberdade ou de outros bens jurídicos frente a intervenções, restrições ou violações
provenientes do Estado. O direito subjetivo público consistente na ação em juízo
instrumentalizava a proteção em face dessa conduta estatal. Do ponto de vista de sua função
positiva, Jellinek definiu que os direitos fundamentais clássicos asseguravam certas prestações
a cargo do Estado, v.g., o fornecimento de estruturas (polícia, exército, judiciário) voltadas a
garantir o exercício dos direitos. No status positivus identifica-se o embrião das prestações
materiais sociais que hoje em dia são objeto dos direitos fundamentais sociais a cargo do
Estado. O terceiro dos status, o activus, se vinculava aos direitos que o indivíduo possuía de
participar da vida política, vale dizer, do direito de votar e de ser votado. Já o último dos status
citados relaciona-se não a direitos, mas a deveres que o indivíduo possuía na ordem estatal. A
doutrina dos quatro status ainda constitui referência para a compreensão dos direitos
fundamentais, embora sua elaboração seja tributária do constitucionalismo tardio desenvolvido
no final do século XIX na Alemanha. Suas limitações resultam das circunstâncias históricas.
A compreensão de direito fundamental como correspondente exclusivo de um direito
subjetivo passível de proteção via judicial revelou-se insuficiente para proteger enormes
segmentos populacionais desprovidos de bens, de educação ou de segurança; também não
impediu que a origem racial de determinados grupos sociais fosse motivo para discriminações.
Sintetizando, a concepção individualista de dignidade prevalecente sob o Estado liberal acabou
por se revelar falha e incapaz de impedir que vastos segmentos populacionais fossem
arrastados para situações existenciais indignas.
A catástrofe humana produzida pelas grandes guerras do século passado exigiu
mudanças do próprio direito. A hipertrofia da dimensão jurídico-subjetiva dos direitos
fundamentais de nada serviu para milhões de pessoas empobrecidas ou objetos da
perseguição genocida de estados totalitários. Esse fato, aliado ao positivismo legalista
prevalente, colocou a legitimação do direito em xeque.

Funções jurídico-objetivas dos direitos fundamentais


Muito embora no constitucionalismo do pós-guerra a dimensão subjetiva dos direitos
fundamentais continuasse preponderante, o desenvolvimento jurídico-constitucional a partir de
então passou a incorporar dimensão objetiva dos direitos fundamentais, vale dizer, os direitos
fundamentais também passaram a ser vistos como expressão de uma ordenação jurídico-
objetiva de valor. Direitos fundamentais, portanto, não são exclusivamente portadores de um
direito subjetivo, mas também expressam uma ordem jurídico-objetiva determinada por valores
e princípios jurídicos que obrigam os exercentes das funções estatais. Mas não é só isso.
Ciente de que a liberdade dos indivíduos era posta em risco, não tanto pela ação ou omissão
do Estado, mas pela intervenção de poderes sociais e econômicos privados, o direito
constitucional evoluiu no sentido de impor deveres de proteção ao Estado, ao mesmo tempo
em que reconhecia direitos de proteção aos indivíduos. Finalmente, a ordenação jurídico-
objetiva de valor vista em seu conjunto de valores, princípios, direitos e garantias fundamentais
passa a ser referência normativa consoante a qual todo o ordenamento infraconstitucional deve
se pautar.

Função de proteção
Dentre as funções jurídico-objetivas que a dogmática constitucional moderna reconhece
nos direitos fundamentais em geral, sem dúvida, a proteção é a mais importante. A
insuficiência da função clássica de defesa assim se revelou na medida em que se percebeu
que riscos aos direitos fundamentais de liberdade, de igualdade ou não discriminação não se
originam exclusivamente do poder do Estado. A afirmação do poder econômico e social privado
por intermédio de corporações, grupos econômicos, organizações ou associações de
interesses setoriais impõe riscos ao desenvolvimento com liberdade e igualdade de condições
que a teleologia do sistema de valores constitucionais oportuniza às pessoas.
Primeiro ramo da ciência jurídica moderna a propor a ultrapassagem do conceito de
igualdade formal para a igualdade material, graças ao conteúdo ético que a questão social viria
a propor para o direito civil contemporâneo à revolução industrial, para o Direito do Trabalho
não constitui novidade a norma consistente no princípio da proteção, essa dirigida a reparar a
desigualdade material entre o prestador e o tomador do trabalho. A norma em apreço histo-
ricamente foi fundamento desse ramo do direito, e obteve desdobramento nos princípios em
geral que regem o Direito do Trabalho.
Diante do rumo que tomou o direito constitucional moderno, observa-se a atualidade do
princípio da proteção. Mas sua base não repousa mais no direito infraconstitucional. A partir da
Constituição de 1988, com o trânsito do núcleo do Direito do Trabalho da CLT e da legislação
do trabalho de matriz infraconstitucional para a Constituição, o princípio em apreço passou a
ter fundamento constitucional. Isso, ademais, é confirmado pelas referências que a proteção
obtém no art. 7º da Constituição, a começar pelo seu inciso I17.
A função jurídico-objetiva em apreço possui significado especial enquanto proteção em
face de riscos oriundos de organização econômica e social cada vez mais dependente da
técnica e da competição, por isso mesmo causando agravos e doenças de variada tipologia
aos indivíduos em geral e aos trabalhadores em particular. É por isso que a função jurídico-
objetiva traduzida na proteção possui um lugar essencial na dogmática mais atualizada dos
direitos fundamentais em geral e do trabalho em particular. Ela passa a constituir referência
necessária ao intérprete e aplicador quando confrontado com a efetivação desses direitos que,
de par com as prestações materiais tradicionalmente oriundas da relação de emprego ou
trabalho, atualmente também envolvem reparações oriundas de acidentes e doenças do
trabalho, reparações essas dirigidas a proteger quem vive do trabalho, e bem assim de seus
direitos de personalidade.
3.2.2 A irradiação dos direitos fundamentais no ordenamento infraconstitucional
A irradiação de eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas decorre do fato
de a Constituição ter assumido centralidade nos sistemas jurídicos contemporâneos. Nesse
sentido, os direitos fundamentais incidem em domínios nos quais classicamente não se
cogitava pudessem incidir, de sorte que passam a ser referência para a interpretação e
aplicação das regras do ordenamento infraconstitucional. Como tal, exercem função jurídico-
objetiva que transcende a ideia de que direitos fundamentais correspondem exclusivamente a
um direito subjetivo.
Em razão do estatuto jurídico que extenso rol de direitos do trabalho alcançou na
Constituição de 1988, a dogmática jurídica voltada a esses direitos fundamentais, aos direitos
do trabalho e respectivos institutos que se encontram na legislação infraconstitucional, às
cláusulas normativas e também às cláusulas dos contratos de trabalho haverá de se orientar a
partir do núcleo do Direito do Trabalho agora situado na Constituição. De par com a vinculação
direta que os direitos fundamentais do trabalho ensejam nas relações de emprego e de traba-
lho, tema a que voltarei adiante, em seu conjunto também irradiam eficácia no ordenamento
infraconstitucional em geral, valendo como diretriz interpretativa para o aplicador do direito
confrontado com relações marcadas pela assimetria.
A eficácia irradiante mantém relação estreita com a função de proteção, na medida em
que também voltada a proporcionar liberdade e igualdade ao indivíduo vulnerável frente a
forças econômicas e sociais que exercem poder. O legislador democraticamente eleito possui
legitimidade para conformar relações sociais de forma assimétrica nos limites da Constituição,
contanto que isso não implique privilégios nem resulte em cidadãos sem defesa ou
desprotegidos18.
3.2.3 Interpretação conforme aos direitos fundamentais
Há um terceiro elemento jurídico-objetivo dos direitos fundamentais – a interpretação
conforme aos direitos fundamentais – que vem a ser um subcaso ou espécie de interpretação
conforme a Constituição. Por meio dessa objetivação jurídica afirma-se a necessidade de a
legislação infraconstitucional ser interpretada em consonância com os direitos fundamentais se
o texto da prescrição jurídica sob interpretação contiver mais de uma norma passível de
aplicação a um caso concreto19. A doutrina constitucional costuma referir essa possibilidade a
hipóteses em que presentes cláusulas gerais ou conceitos jurídicos indeterminados. A escolha
da norma aplicável deverá corresponder àquela que melhor expresse os direitos fundamentais
e os princípios e valores neles concretizados, conforme já reiterado no presente trabalho.
A interpretação conforme aos direitos fundamentais não permite que a determinação
prescrita no texto sob interpretação possa ser transposta. Ou seja, quando a diretiva expressa
nos direitos fundamentais pede uma nova determinação do preceito infraconstitucional sob
interpretação, para que com eles possa ser afirmada sua conformidade, não será mais
hipótese de interpretação conforme, mas de inconstitucionalidade da prescrição jurídica
infraconstitucional.

4 – OS TITULARES DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO TRABALHO


Já sustentei em outro momento que a titularidade do direito fundamental social ao
trabalho pertence a todos os trabalhadores, ou seja, não só a empregados. A consequência
que disso emerge é a de que todo aquele que mobiliza seu trabalho em favor de pessoa física
ou jurídica para auferir contraprestação voltada a assegurar o sustento pessoal e da família
encontra-se protegido pela regra inserta no caput do art. 7º da Constituição.
Dada a norma contida no caput do art. 7º da Constituição, também quem trabalha em
proveito de outrem, ainda que não com a subordinação, a não eventualidade e o salário
próprios de empregado, em princípio é titular de direitos fundamentais arrolados nos vários
incisos do referido art. 7º. As dificuldades hermenêuticas residem na definição de quais desses
direitos estão garantidos a quem trabalha sem a condição de empregado.

5 – A VINCULAÇÃO DO EMPREGADOR OU TOMADOR DO TRABALHO AOS


DIREITOS FUNDAMENTAIS
O interesse do tema em destaque resulta da previsão de direitos fundamentais do
trabalho na nossa Constituição (art. 7º e ss.) que têm como sujeitos vinculados empregadores
ou tomadores de trabalho alheio. No direito constitucional do pós-guerra evoluiu-se não só no
que diz com a incorporação da já referida dimensão jurídico-objetiva na dogmática dos direitos
fundamentais, como também com o reconhecimento de possível vinculação de terceiros, ou
particulares, aos direitos fundamentais. Como já visto, a concepção de direitos fundamentais
não mais se cinge à defesa de espaços vitais do indivíduo em face do Estado, mas incorpora a
proteção a ele devida em face de violações praticadas por forças econômicas e sociais de
poder.
Antes de prosseguir no exame da específica vinculação do empregador ou tomador do
trabalho aos direitos fundamentais, considera-se necessário precisar melhor a diretriz já posta
em relevo no item 2, qual seja, a de que os entes estatais encontram-se vinculados não só
formalmente aos direitos fundamentais, mas também em sentido material e funcional. O
legislador, no exercício do dever de legislar e da faculdade de emendar a Constituição, deve
observância aos direitos fundamentais tanto ao impor restrições autorizadas como na tarefa de
conformação àqueles direitos carentes de configuração. Em qualquer das hipóteses, o núcleo
essencial dos direitos fundamentais exige preservação. A esse tema retornar-se-á no item
seguinte, quando do exame da conformação e restrição a direitos fundamentais do trabalho.
De sua vez o Executivo, sobretudo em sua atuação administrativa, está vinculado aos
direitos fundamentais. Conforme já destacado neste texto, no Estado Democrático de Direito
constituído pela Constituição de 1988 os direitos fundamentais possuem precedência em face
do Estado e de seus órgãos, que lhes devem observância. Em segundo lugar, no sistema
constitucional brasileiro em princípio não cabe à Administração Pública restringir direitos
fundamentais por meio de decretos; ao contrário, cabe-lhe executar as leis em conformidade
com os direitos fundamentais. Finalmente, a “fuga para o direito privado”, expressão utilizada
pelos alemães para caracterizar a opção estatal por formas privadas de atuação, como bem
lembrado por Ingo Sarlet22, não exclui a vinculação estatal aos direitos fundamentais. A
lembrança é de extrema valia em vista da opção da Administração Pública pela terceirização
de serviços públicos, além de utilizar práticas de gestão pública que não observam regras e
princípios que a vinculam, como admissões sem prévia aprovação em concurso público. Essas
escolhas não atenuam a sua responsabilidade, como sistematicamente sustenta nas ações
trabalhistas. Ao revés, no que tange à opção pela terceirização, cresce o seu dever de
vigilância para impedir a violação de direitos fundamentais nas relações de trabalho e de
emprego; e quanto à violação de regras e princípios constitucionais quando da contratação, em
lugar de levar à exclusão de direitos fundamentais do trabalho, deveria determinar a
responsabilização pessoal dos administradores que assim procedem, como, aliás, determina o
art. 37, § 2º, da Constituição. Nessa linha – e agora já mencionando a vinculação do Judiciário
aos direitos fundamentais – os juízes do trabalho possuem o encargo de fazer valer os direitos
fundamentais, de interpretar e aplicar a legislação infraconstitucional e as cláusulas contratuais
em conformidade com os valores e princípios concretizados nos direitos fundamentais em geral
e nos direitos fundamentais do trabalho em particular.
Cabe, agora, examinar a vinculação dos empregadores e tomadores de serviços aos
direitos fundamentais do trabalho. Para a adequada compreensão do sentido da discussão
acerca do tema é necessário situá-lo sob perspectiva histórica para, na sequência, examinar o
particular caso dos direitos fundamentais do trabalho de nossa Constituição e possíveis
desdobramentos para a dogmática respectiva.
A discussão em apreço remonta à doutrina e jurisprudência alemã do início da segunda
metade do século passado, no contexto da já reportada mudança que se operou na
compreensão dos direitos fundamentais. Embora a doutrina, inclusive a brasileira, costume pôr
ênfase em decisão paradigmática do Tribunal Constitucional alemão (caso Lüth) como
referência para a doutrina da eficácia dos direitos fundamentais frente a particulares, em
realidade foi no âmbito do direito do trabalho alemão, por meio da atuação do presidente do
Tribunal Federal do Trabalho, Hans Carl Nipperdey, que tomou forma e conteúdo a tese de que
os direitos fundamentais também vinculavam particulares – os empregadores. A origem dessa
doutrina encontra-se na Constituição de Weimar, cujo art. 118, alínea 1, frase 2, reconhecia a
livre manifestação do pensamento no quadro das relações econômicas e de trabalho. O art.
159, frase 2, protegeu a liberdade de coalizão também contra restrições privadas. O que, em
síntese, o Tribunal Federal do Trabalho acabou por firmar, no contexto do debate acerca da
liberdade de coalizão dos trabalhadores, é que essa liberdade não tinha como destinatário, ou
obrigado exclusivo, o Estado, mas também a força de poder contraposta ao polo laboral, qual
seja, a organização empresarial. O Tribunal fixou, por conseguinte, que também o poder
econômico e social devia observância ao direito fundamental dos trabalhadores assegurado no
art. 9º da Lei Fundamental de 1949.
Foi a partir das decisões do Tribunal Federal do Trabalho que se desenvolveu o debate
acerca da possibilidade da eficácia dos direitos fundamentais se revelar não só na indiscutível
defesa de posições jurídicas frente ao Estado, mas também em face de terceiros (Drittwirkung),
eficácia esta também designada de horizontal (em oposição à vertical, contra o Estado), e que
entre nós costuma ser designada como eficácia em face de particulares23. A controvérsia que
então se estabeleceu é se essa eficácia era direta ou indireta. As decisões do Tribunal
Constitucional alemão acabaram por desautorizar o entendimento do Tribunal Federal do
Trabalho, o qual se inclinava pela eficácia direta dos direitos fundamentais em face de
terceiros. O que prevalece no direito alemão é o entendimento de que, fora exceções em geral
referidas ao citado art. 9º e à dignidade da pessoa, os direitos fundamentais não valem
diretamente no direito privado, embora este seja moldado por aqueles24.
A vinculação dos particulares aos direitos fundamentais tem sido objeto de vários estudos
doutrinários no Brasil25. O que se verifica do ponto de vista normativo é que a Constituição de
1988, ao incorporar extenso rol de direitos fundamentais do trabalho em seu catálogo,
responde, no plano normativo, à evolução da doutrina e jurisprudência constitucional mais
moderna, a qual percebeu uma inflexão quanto ao possível violador dos direitos fundamentais
– o Estado –, identificando em corporações e forças econômicas e sociais situadas na
sociedade poder capaz de comprometer o exercício de direitos fundamentais nas relações de
trabalho e de emprego. A vinculação direta, imediata, dos empregadores ou tomadores de
trabalho, portanto, não constitui exceção, mas sim a regra em nossa ordem constitucional
porque em geral os direitos assegurados nos contratos de trabalho correspondem àqueles que
a Constituição arrola nos arts. 7º a 11.
Finalizando, o significado da eficácia dos direitos fundamentais em face de terceiros ou
particulares deve ser compreendido, antes de tudo, no fato de ajudarem a garantir liberdade e
igualdade dos indivíduos frente a organizações econômicas e corporações que usufruem de
posições dominantes na sociedade industrial e tecnológica de hoje.
Alguns aspectos próprios da dogmática jusfundamental pertinente aos direitos
fundamentais clássicos, e que dizem com a sua garantia, seu usufruir pelos titulares e a
proteção contra intervenções indevidas serão objeto de atenção na sequência.
6 – GARANTIAS, CONFORMAÇÃO E RESTRIÇÕES AOS DIREITOS
FUNDAMENTAIS DO TRABALHO
Uma vez estabelecido que os direitos fundamentais do trabalho valem diretamente nas
relações de emprego e de trabalho, evidencia-se a sua similitude com os direitos fundamentais
clássicos. Diante disso, a dogmática jurídica desenvolvida para tornar efetivos estes direitos
por certo é útil para contribuir à efetivação daqueles, seja no que diz respeito às suas
garantias, seja no que respeita à atuação do legislador que em princípio deve dar conformação
e eventualmente impor restrições a esses direitos. Entretanto, a relação indivíduo- Estado não
é idêntica à relação trabalhador-empregador ou tomador de serviços, de sorte que adequações
são necessárias. De fato, conformação e restrição a direitos fundamentais do trabalho podem
provir tanto do legislador quanto dos próprios empregados e empregadores nas hipóteses em
que autorizados, conforme adiante será visto. Em qualquer caso, a atuação do juiz não está ex-
cluída. Por exemplo, em hipóteses nas quais colisões de direitos fundamentais não previstas
venham a exigir a imposição de restrições, ou também quando se trata de verificar a
necessidade, adequação e justiça de restrições. Em causa está a observância da
proporcionalidade26.
6.1 Garantias
A doutrina em geral qualifica as garantias fundamentais como instrumentos voltados a
assegurar os direitos em face dos poderes públicos. Também dedica atenção às denominadas
“garantias institucionais”, dirigidas a excluir da disposição do legislador determinadas
instituições públicas ou privadas (por exemplo, a manutenção do serviço público ou da
propriedade, respectivamente), garantias essas que, no entanto, não assegurariam direito
subjetivo individual27. Ingo Sarlet vê isso com reservas, indagando se não haveria alguma
garantia institucional que não possa gerar direito subjetivo individual ou mesmo titularidade
coletiva. O autor cogita de classificação dos direitos fundamentais que abarcasse garantias
institucionais fundamentais28.
Presente essa controvérsia, considera-se que a proteção dos direitos fundamentais
sociais contra a erosão de seu conteúdo normativo por meio da ação do constituinte derivado
constitui, se não uma garantia fundamental clássica, uma garantia institucional fundamental.
Em primeiro lugar, porque ditos direitos integram o rol das cláusulas pétreas, sujeitos, portanto,
à blindagem do art. 60, § 4º, IV, da Constituição. Segundo, porque não se justifica a
controvérsia acerca da inclusão dos direitos sociais entre as cláusulas pétreas com base em
26 Não é lugar, aqui, para se estender acerca do princípio ou postulado da
proporcionalidade, dos seus elementos constitutivos (necessidade, adequação e justiça em
sentido estrito), de sua referência para a integração, interpretação e aplicação do direito, de
sua evolução histórica. Quanto a essa última, entretanto, é importante referir que sua fonte
mais remota encontra-se no Capítulo V da Ética a Nicômaco, de Aristóteles, obra na qual o
filósofo menciona ser a justiça uma espécie de proporção e que implica uma distribuição de
porções sob medida, segundo o que é devido a cada qual. Na doutrina nacional há exame
abrangente por MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 2. ed. São
Paulo: Saraiva, 2008, p. 321 e ss.
O direito de ação “quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho” (art. 7º, XXIX,
da CF) consiste em garantia especial que a Constituição atribuiu ao direito de ação em geral
assegurado no inciso XXXV do art. 5º. Isso só reforça a importância que o constituinte reservou
aos créditos dos trabalhadores, devendo, com maior razão, ser estrita a interpretação a ser
conferida à restrição ao direito fundamental em apreço fixada nesse mesmo inciso XXIX
mediante a regra da prescrição. Sem excetuar outras garantias previstas no texto
constitucional, as ações coletivas, como a substituição processual do art. 8º, III, e bem assim o
mandado de segurança coletivo e o mandado de injunção previstos no art. 5º, LXX e LXXI,
todos da Constituição, contemplam conjunto de normas voltadas à proteção efetiva dos direitos
fundamentais do trabalho.
6.2 Conformação
Ao cumprir a tarefa de conformar direitos fundamentais o Estado não busca
eventualmente impedir procedimentos abrangidos pelo âmbito de proteção de um direito
fundamental, mas abrir ao titular possibilidades de fazer uso desses direitos. Essa conformação
ou configuração diz respeito a direitos fundamentais com âmbitos de proteção normativos.
Diversamente do que ocorre com direitos como a vida, a dignidade, a liberdade de emitir uma
opinião ou pensamento, que preexistem às prescrições jurídicas, os direitos fundamentais com
âmbito de proteção normativo carecem de desdobramentos em normas constitucionais ou
infraconstitucionais nas quais o seu conteúdo obtenha conformação29. De outro lado,
consoante os doutrinadores germânicos citados, há direitos fundamentais que carecem de
conformação só parcial30.
Assim como os direitos clássicos de propriedade e de sucessão exigem configuração
infraconstitucional, também os direitos fundamentais sociais e do trabalho muitas vezes
requerem essa providência, de modo que o “fazer uso” desses direitos se viabilize. A tarefa, em
princípio, pertence ao legislador, o qual, contudo, não está autorizado a esvaziar o núcleo
essencial do direito fundamental em causa. De outro lado, parece incontestável que,
paralelamente ao legislador, as próprias partes interessadas nessa conformação possam fazê-
lo por meio de cláusulas oriundas de convenções e acordos coletivos de trabalho (art. 7º, XXVI,
da CF). Entretanto, aqui não é um dos poderes do Estado – o legislador – que conforma, com
caráter geral, o direito. A atuação dos próprios interessados, com a participação do obrigado
direto, em geral com mais poder em face do representante dos titulares do direito, justifica
atenção especial do Judiciário, de sorte que o exercício da autonomia coletiva não acabe por
esvaziar o núcleo essencial do direito fundamental sob conformação, ou mesmo que por seu
intermédio venha a se promover a discriminação de um trabalhador em face do outro.
Uma particular observação que se insere na perspectiva das adequações acima referidas,
quando se trata da conformação que direitos fundamentais do trabalho devem obter em países
como o Brasil, diz com o tratamento diverso que o legislador pode dispensar aos
empregadores e tomadores de trabalho em consonância com o poderio que dispõem em face
do empregado ou prestador do trabalho. Se em atenção ao princípio da não discriminação os
direitos fundamentais do trabalho devem valer em qualquer relação de emprego ou trabalho,
nem por isso há como ignorar a realidade brasileira, na qual não poucos pequenos e
microempresários desenvolvem atividade econômica com o concurso de força de trabalho
alheia. O legislador tem dispensado tratamento diferenciado em situações que envolvem a
conformação de direitos fundamentais relativos à retribuição do trabalho ou mesmo ao ônus de
provar a sua duração (arts. 58, § 3º, e 74, § 2º, da CLT). Na eventual conformação de outros
direitos fundamentais, o postulado da proporcionalidade há de reger a tarefa do legislador, com
atenção aos princípios fundamentais do Título I e aos princípios gerais da atividade econômica
do art. 170, ambos da Constituição.
6.3 Restrições
Quando se fala em restrição a direitos fundamentais pode sobrevir a ideia de que, ao fim
e ao cabo, eles estariam sujeitos ao esvaziamento de seu âmbito de proteção (entendido como
a esfera vital protegida pela norma jusfundamental) ou âmbito normativo (entendido como o
objeto de proteção recortado da realidade vital pela norma jusfundamental)31. Embora possa
parecer estranho, a restrição autorizada pela própria regra atribuidora de direito fundamental
tem em vista a garantia do seu exercício por todos. Isso porque o aspecto relacional é ínsito
aos direitos fundamentais e, portanto, relativizável. Do exercício simultâneo desses direitos por
titulares diversos podem derivar colisões e, por isso, a necessidade de limitações ao seu
âmbito de proteção de modo a permitir o exercício simultâneo por todos. Quanto às espécies
de restrições possíveis, a doutrina refere aquelas em que há reserva legal qualificada ou
simples. Na primeira hipótese, a própria prescrição jusfundamental estabelece os contornos a
serem observados pelo legislador ao estabelecer as restrições por meio de lei. Na hipótese da
reserva legal simples, amplia-se o espaço do legislador para estabelecer as restrições.
De outro lado, ainda que não previstas na regra atribuidora do direito, restrições também
podem se mostrar necessárias se o exercício de um direito fundamental implicar colisão com
bens constitucionais ou comunitários considerados relevantes para a vida em comum. Nesse
caso, a imposição de restrição pelo legislador ou juiz somente é admissível de modo
excepcional e com a devida justificação.
Aos direitos fundamentais do trabalho aplicam-se as mesmas regras válidas para a
admissão de restrições a direitos clássicos, observada a ressalva já feita no subitem anterior no
que diz com a preservação do núcleo essencial.
Especial referência deve ser feita a possíveis restrições oriundas de cláusulas normativas
previstas em convenções e acordos coletivos. A perspectiva de crescente incremento da
autonomia privada coletiva no contexto da economia globalizada reclama adequada
hermenêutica de cláusulas normativas dirigidas a restringir direitos fundamentais sociais.
Similarmente à reserva legal, também essas restrições devem observância ao que se pode
denominar de reserva normativa. Em primeiro lugar, isso diz respeito às hipóteses em que o
art. 7º da Constituição Federal autoriza o estabelecimento de restrições por meio de normas
coletivas, ou seja, as que envolvem restrição ao princípio da irredutibilidade salarial (inciso VI),
à duração do trabalho por meio da compensação de horários e a redução da jornada (inciso
XIII) e ao limite da jornada de trabalho em turnos de revezamento (inciso XIV). Em segundo
lugar, quanto aos limites a serem observados na atividade interventiva, sem dúvida haverão de
serem levados em conta o âmbito de proteção do direito fundamental em causa e, por
consequência, o respeito ao seu núcleo, como também ao postulado da proporcionalidade. A
respeito reitera-se o que se referiu no início deste item.
Por fim, a jurisprudência trabalhista, de modo majoritário, tem zelado pela preservação do
núcleo dos direitos fundamentais passíveis de restrição pelos entes coletivos32.
7 – A JURISDIÇÃO DOS JUÍZES DO TRABALHO
É sabido que no Brasil o exercício da atividade estatal dirigida à solução de conflitos do
trabalho inicialmente consistiu em atividade administrativa do Ministério do Trabalho. Mas a
Justiça do Trabalho, criada em 1941, passou, a partir da Constituição de 1946, a ser o ramo do
Judiciário encarregado de conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre
empregados e empregadores, competência essa mantida no art. 142 da Constituição de 1967
e na Emenda Constitucional nº 01/69.
Em sua redação original, a Constituição de 1988 estabelecia em seu art. 114 que
“Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os conflitos individuais e coletivos entre
trabalhadores e empregadores (...). A Emenda Constitucional nº 45/04 confere a redação atual
ao art. 114 e estabelece em seu caput e inciso I a regra geral de competência, verbis:
“Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: I – as ações oriundas da relação de
trabalho (...) (grifei)”. Só no inciso III, que trata da competência para dirimir conflitos de
representação sindical, há menção a empregadores.
O alargamento da competência é visível, mas o que pode não ser percebido à primeira
vista é que a competência do juiz do trabalho se articula com a regra do caput do art. 7º, a qual
define que “são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à
melhoria de sua condição social:”. As regras de competência fixadas pela Emenda
Constitucional nº 45/04 retratam não só a ampliação da competência da Justiça do Trabalho,
agora encarregada de processar e julgar ações oriundas da relação de trabalho e outras ações,
conflitos de competência, execuções e outras controvérsias decorrentes da relação de
trabalho, consoante incisos do art. 114. O que essas regras evidenciam é que a atuação da
Justiça do Trabalho diz respeito à efetivação do direito fundamental ao trabalho do art. 6º e,
naturalmente, das respectivas concreções efetivadas nos arts. 7º a 11, todos da Constituição,
bem como de princípios e valores constitucionais já mencionados em itens anteriores. É no
conjunto dessas normas (regras, princípios e valores) que o juiz do trabalho deve encontrar,
prioritariamente, a fonte normativa que presidirá o exercício de sua competência33. Só em
modo residual encontrará na CLT (por exemplo, nos pressupostos da relação de emprego dos
arts. 2º e 3º) e na legislação infraconstitucional esparsa, mesmo de outros ramos do direito,
substância normativa que contribua para dirimir os conflitos sujeitos a seu exame.
A Justiça do Trabalho é, portanto, o ramo do Judiciário que exerce jurisdição especial não
só porque os conflitos que lhe cabe dirimir são oriundos da relação de trabalho, mas também
porque as pretensões que estão na base dessa relação vinculam-se diretamente a direitos aos
quais o poder constituinte conferiu proteção jusfundamental e que estão elencados nos arts. 7º
a 11 da Constituição. Essa vinculação continua direta em relação a direitos fundamentais
sociais que obtêm conformação por meio de cláusulas estipuladas em normas coletivas, cujo
reconhecimento é direito fundamental assegurado no art. 7º, XXVI, da Constituição. Como já
visto no item 6.2, as normas coletivas seguem as mesmas diretivas válidas para a legislação
quando, por seu intermédio, há conformação de direito fundamental. De outro lado, as
obrigações contratuais não correspondentes a direitos fundamentais do trabalho ainda assim
encontram-se sob o influxo do conteúdo normativo de base axiológica inerente a cada um
desses direitos e à ordenação jurídico-objetiva de valor que conforma o conjunto dos direitos
fundamentais, consoante destacado ao se tratar da irradiação de sua eficácia no ordenamento
infraconstitucional.
O melhor catálogo de direitos fundamentais pouco serve se inexiste possibilidade de se
protegê-los eficazmente. Só em tempos recentes o sentido da Constituição de 1988 começa a
ser apreendido por novas gerações de juristas e pela própria sociedade. A jurisprudência, a
começar pelo Supremo Tribunal Federal, inicialmente manteve-se distante do sentido
axiológico que conforma os direitos fundamentais em geral e os sociais em particular. A análise
da juris
33 Não é lugar, aqui, para tratar do modo de aplicação das regras, princípios e valores
na atividade de concreção judicial. A respeito das duas primeiras normas citadas, exame
aprofundado é feito nas obras de Robert Alexy (Teoria dos direitos fundamentais [Trad.:
Virgílio Afonso da Silva]. São Paulo: Malheiros, 2008) e de Humberto Ávila (Teoria dos
princípios – Da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 10. ed. São Paulo: Malheiros,
2009). Ávila traz aportes novos e importantes ao debate concernente à aplicação de regras
e princípios, entre outros ao referir que também regras são passíveis de ponderação, ou
que não necessariamente as regras devam ceder diante de um princípio contrário, neste
último caso quando em colisão regra constitucional e princípio de matriz infraconstitucional.
Já quanto aos valores reconhecidos na nossa Constituição, possuem eles natureza similar
aos princípios jurídicos, passíveis de ponderação entre si e em confronto com regras e
princípios. Entretanto, os princípios expressam conceitos deontológicos, ao passo que os
valores situam-se no plano axiológico. É necessário sublinhar que esses valores são
normas, de modo que a fundamentação das decisões judiciais por eles orientadas deve
observância àqueles assim reconhecidos pelo ordenamento. prudência dos tribunais do
trabalho das duas décadas passadas, por seu turno, revela apego à hermenêutica
tradicional, que orientava sua atuação a partir de regras infraconstitucionais ou da CLT para
interpretar regras de categoria jusfundamental da Constituição de 1988, em procedimento
que encontra similar histórico na conduta dos juristas alemães em face da Constituição de
Weimar, consoante reportado no item 2. supra, nota de rodapé 10. Exemplo disso foi a
Súmula nº 310 do TST, cancelada em vista de julgamentos do STF a ela contrários34.
Referida Súmula, além de firmar que a norma constitucional não assegurava a substituição
processual, somente a reconheceu nos limites fixados em leis infraconstitucionais. O STF
acabou por reconhecer ampla substituição processual pelo art. 8º, III, da Constituição em
julgamento realizado em junho de 2006. Outro exemplo encontra-se na Orientação
Jurisprudencial nº 84 da SDI-I do TST, a qual faz depender de legislação regulamentadora a
proporcionalidade do aviso-prévio prevista no art. 7º, XXI, da Constituição. Dita OJ também
está a caminho do cancelamento em vista da recente decisão do STF a respeito da eficácia
do aviso-prévio proporcional35. Em sentido oposto, de interpretação da lei em consonância
com o quadro dos direitos fundamentais, vale destacar recente alteração na Súmula nº 369,
a qual agora prevê estabilidade também para 07 suplentes de dirigentes sindicais. Com a
nova redação, o TST harmoniza a regra do caput do art. 522 e do § 3º do art. 543 da CLT
com o art. 8º, VIII, da Constituição.
O STF possui o dever de dar a palavra final em tema de interpretação constitucional.
Entretanto, os juízes do trabalho também são “juízes constitucionais”. A eles compete fazer
valer direitos fundamentais no constante contato que, por seu intermédio, o Judiciário mantém
com os titulares e destinatários (obrigados) desses direitos nos lugares mais distantes do país.
Mas não é só isso: também o controle difuso da constitucionalidade das leis, a sua interpre-
tação conforme aos direitos fundamentais e a atribuição de eficácia irradiante dos direitos
fundamentais nos contratos de trabalho dizem respeito à atuação
34 Também jurisprudência de tribunais regionais do trabalho e doutrina específica
defendiam a substituição processual. Exemplo doutrinário é a obra de Ben-Hur Silveira
Claus (Substituição processual trabalhista. São Paulo: LTr, 2003).
35 O direito fundamental social traduzido na garantia do “mínimo existencial” é, por
exceção, direito subjetivo que deriva do princípio do Estado Social. Via de regra, não obtém
o tratamento devido nas decisões dos tribunais do trabalho que aplicam a alíquota do
imposto de renda sobre a soma dos créditos trabalhistas deferidos em ações judiciais. A
esse respeito escrevi em ocasião anterior (Direitos fundamentais sociais – Efetivação no
âmbito da democracia participativa, cit., p. 110). No julgamento do RE 614.406, com
repercussão geral reconhecida, mas ainda por ser finalizado, há indicativo de que também
no caso em apreço prevalecerá interpretação da legislação infraconstitucional no quadro
dos direitos fundamentais, de modo que o cálculo de eventual imposto tome em
consideração o crédito trabalhista devido a cada mês do contrato, e não o regime de caixa.
de todos os graus de jurisdição do trabalho. Consoante destacado neste texto, o princípio
da proteção supera sua matriz infraconstitucional originária para adquirir maioridade
constitucional, em sintonia com a função jurídico-objetiva de maior relevo na atual
dogmática dos direitos fundamentais. Portanto, cabe à própria Justiça do Trabalho ocupar a
dianteira em hermenêutica compatível com o sistema especial de direitos fundamentais do
trabalho e os valores e princípios que se encontram em sua base, de modo a tornar efetivos
os direitos fundamentais do trabalho. No exercício dessa competência ela é parte essencial
do referido sistema especial.

3.2.1 Sistema Estatal de Proteção.


3.2.2 Inspeção do Trabalho.
3.2.3 Justiça do Trabalho.
3.2.4 Ministério Público do Trabalho.
4 Organização político-administrativa do Estado.
4.1 Estado federal brasileiro, União, estados, Distrito Federal, municípios e territórios.
5 Administração Pública.
5.1 Disposições gerais.
5.1.2 Servidores públicos.
6 Poder Executivo.

6.1 Atribuições e responsabilidades do Presidente da República

O Presidente é a autoridade máxima em uma República Presidencialista, com origem no latim,


o termo Presidente significa “sentar à frente”, tendo em vista que presidir coloca o indivíduo em
uma condição diferenciada posicionando-se em um posto de destaque para que represente
sua liderança.

Quando se trata de Chefia de Estado, há vários cargos que podem representar o administrador
máximo, dependendo do tipo de regime político adotado. Em uma democracia que se vale
do Presidencialismo, o Presidente é o governante supremo. Neste caso, o posto político é
resultado da autoridade superior dentro do Poder Executivo, o que concilia as funções de chefe
de estado e chefe de governo.
O Presidente, contudo, pode existir em um governo e não ser a autoridade máxima é o que
acontece no caso do parlamentarismo. Desta forma, cabe ao Presidente a condição de ser
apenas o Chefe de Estado, neste caso a função de chefe de governo é desempenhada
pelo Primeiro Ministro em exercício.

Na democracia direta, o Presidente é eleito através do voto do povo, na indireta, a população


vota para formar um colégio eleitoral que após eleito, será encarregado de decidir quem
ocupará o cargo de Presidente para o próximo mandato.

No Brasil, para concorrer ao cargo de Presidente da República, é preciso que o candidato seja
cidadão, brasileiro nato com, com no mínimo, 35 anos de idade, deve ser eleitor e estar em
pleno exercício dos direitos político, possuir domicílio eleitoral no país, além de estar,
necessariamente, filiado a algum partido político e não ser réu em nenhum processo
no Supremo Tribunal Federal.

Normalmente, a eleição presidencial é realizada a cada quatro anos e os eleitores elegem o


presidente e o vice-presidente da República. Se ambos os cargos ficarem vagos nos dois
primeiros anos de mandato, uma eleição popular é realizada no prazo de noventa dias. Se
ambas as vacâncias ocorrerem nos últimos dois anos, o Congresso Nacional deve realizar
uma eleição indireta dentro de trinta dias para eleger o presidente e o vice.

Na falta dos dois, a linha sucessória passa pelo, Presidente da Câmara dos Deputados, o
Presidente do Senado e o Presidente do Supremo Tribunal Federal.

Entretanto, estes três últimos apenas substituem temporariamente o presidente, não cabendo-
lhes a sucessão em definitivo.
O vice-presidente e as outras pessoas listadas na linha de sucessão, de acordo com a ordem
constitucional de preferência, também atuam como presidente interino quando o titular está sob
incapacidade, suspenso devido a um processo de impeachment, ou quando viaja para o
exterior.
No Brasil, quando o titular do cargo morre, renúncia, é afastado do cargo ou simplesmente
sucedido, o vice-presidente assume, e o cargo de vice-presidente permanece vago até as
próximas eleições.
Porém ser presidente tem seus bônus e ônus, o cargo de presidente implica a seu ocupante
determinadas atribuições que em regra são indelegáveis.

Estas atribuições não são taxativas e sim exemplificativas (Art. 84, CF):
I. nomear e exonerar os Ministros de Estado;
II. exercer, com o auxílio dos Ministros de Estado, a direção superior da
administração federal;
III. iniciar o processo legislativo, na forma e nos casos previstos nesta Constituição
(pode criar projeto de Lei);
IV. sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos (são atos
do Poder Executivo, cuja função principal é regulamentar a Lei, que lhe é superior)
e regulamentos para sua fiel execução;
V. vetar projetos de lei, total ou parcialmente (só pode vetar por dois motivos:
inconstitucionalidade “veto jurídico” ou por ser contrário ao interesse público “veto
político”);
VI. dispor, mediante decreto, sobre (*atribuição DELEGÁVEL*): organização e
funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa
nem criação ou extinção de órgãos públicos; extinção de funções ou cargos
públicos, quando vagos;
VII. manter relações com Estados estrangeiros e acreditar seus representantes
diplomáticos (função como Chefe de Estado);
VIII. celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do
Congresso Nacional (função como Chefe de Estado);
IX. decretar o estado de defesa e o estado de sítio;
X. decretar e executar a intervenção federal (é a retirada da autonomia do ente
federativo. União, Estados e DF. A União poderá intervir diretamente em município
se este faz parte do território federal.);
XI. remeter mensagem e plano de governo ao Congresso Nacional por ocasião da
abertura da sessão legislativa, expondo a situação do País e solicitando as
providências que julgar necessárias;
XII. conceder indulto (perdão coletivo concedido por decreto pelo presidente) e comutar
penas (transformar ou abater penas), com audiência, se necessário, dos órgãos
instituídos em lei (*atribuição DELEGÁVEL*);
XIII. exercer o comando supremo das Forças Armadas, nomear os Comandantes da
Marinha, do Exército e da Aeronáutica, promover seus oficiais-generais e nomeá-
los para os cargos que lhes são privativos (em resumo, chefiar e comandar as
Forças Armadas com auxílio do Ministro da Defesa);
XIV. nomear, após aprovação pelo Senado Federal, os Ministros do Supremo Tribunal
Federal e dos Tribunais Superiores, os Governadores de Territórios, o Procurador-
Geral da República, o presidente e os diretores do banco central e outros
servidores, quando determinado em lei;
XV. nomear, observado o disposto no art. 73, os Ministros do Tribunal de Contas da
União;
XVI. nomear os magistrados, nos casos previstos nesta Constituição, e o Advogado-
Geral da União;
XVII. nomear membros do Conselho da República, nos termos do art. 89, VII;
XVIII. convocar e presidir o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional;
XIX. declarar guerra, no caso de agressão estrangeira, autorizado pelo Congresso
Nacional ou referendado por ele, quando ocorrida no intervalo das sessões
legislativas, e, nas mesmas condições, decretar, total ou parcialmente, a
mobilização nacional (estado de alerta de uma iminente guerra);
XX. celebrar a paz, autorizado ou com o referendo do Congresso Nacional;
XXI. conferir condecorações e distinções honoríficas (dar medalhas);
XXII. permitir, nos casos previstos em lei complementar, que forças estrangeiras
transitem pelo território nacional ou nele permaneçam temporariamente;
XXIII. enviar ao Congresso Nacional o plano plurianual, o projeto de lei de diretrizes
orçamentárias e as propostas de orçamento previstos nesta Constituição;
XXIV. prestar, anualmente, ao Congresso Nacional, dentro de sessenta dias após a
abertura da sessão legislativa, as contas referentes ao exercício anterior;
XXV. prover (e desprover/demitir) e extinguir os cargos públicos federais, na forma da lei
(*atribuição DELEGÁVEL*);
XXVI. editar medidas provisórias com força de lei, nos termos do art. 62;
XXVII. exercer outras atribuições previstas nesta Constituição (comprova que estas
atribuições não são taxativas, mas sim exemplificativas).

Existem 3 exceções de atribuições que podem ser delegáveis para 3 pessoas que são:
Ministro de Estado (Economia, Educação, etc),
Procurador-Geral da República ou para o
Advogado-Geral da União:
Art. 84, VI– dispor, mediante decreto, sobre:
organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de
despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos;
Pode haver a extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos;
Art. 84, XII – conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos
instituídos em lei;
Art. 84, XXV, 1ª parte – prover (e desprover/demitir) os cargos públicos federais, na forma
da lei. Controle de constitucionalidade dos decretos em regra, os decretos não ferem a
constitucionalidade.

O problema não é a inconstitucionalidade, mas sim a ilegalidade. Exceções: Decreto


autônomo – não regulamenta uma lei superior (ex.: ADIN 1.590/SP); Inconstitucionalidade por
arrastamento – Se a lei é inconstitucional, o decreto que a regulamenta também é (ex.: ADIN
2.947/RJ) Características do Veto de Projetos de Lei Expresso – O silêncio configura sanção;
Motivado – Esclarecer as razões do veto; Supressivo – Não pode acrescentar texto; Total ou
parcial – Pode vetar a lei inteira ou parte dela, impedido de vetar palavras isoladas; Superável
ou relativo – O Congresso Nacional pode rejeitar o veto presidencial no prazo de 30 dias em
sessão conjunta, pelo voto secreto da maioria absoluta. Atribuições do Vice-Presidente
Substituir o Presidente na sua saída temporária ou definitiva (sucessão); Integra o Conselho da
República e de Defesa Nacional; Pode ser convocado pelo Presidente para missões especiais;
Suas atribuições estarão previstas em Lei Complementar (que ainda não existe);

7 Poder Legislativo
7.1 Estrutura.
7.2 Funcionamento e atribuições.
7.3 Processo legislativo.
7.4 Fiscalização contábil, financeira e orçamentária.
7.5 Comissões parlamentares de inquérito.
8Poder Judiciário.
8.1 Disposições gerais.
8.2 Órgãos do Poder Judiciário.
8.2.1 Organização e competências, Conselho Nacional de Justiça.
8.2.1.1 Composição e competências.
9Funções essenciais à Justiça.
9.1 Ministério Público, Advocacia Pública.
9.2 Defensoria Pública.

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