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Teoria geral do direito

Hans Kelsen: a Teoria Pura do Direito


Positivismo jurídico normativista

• A Escola da Exegese é uma das primeiras faces do


juspositivismo, mas não a principal.
• Enquanto a Escola da Exegese estuda lei específica, o
Positivismo do século XX busca uma teoria científica do direito.
• Vamos ver as transformações até chegarmos a essa visão
pretensamente científica.
Evolução do positivismo
 A (não) interpretação pregada pela
Escola da Exegese se mostrou inviável

 Impossibilidade da perfeição material

 Impossibilidade da perfeição formal

 Na prática, os juízes se deparavam com


casos em que a resposta não era clara na
lei.

 Especialmente com o avanço da


revolução industrial.
Métodos de interpretação

Os juristas (positivistas) começaram a desenvolver métodos de


interpretação.

a) Método gramatical: interpretação literal das expressões e


termos do texto legal
b) Método lógico-sistemático: também conhecido como holístico.
 A norma não deve ser considerada isoladamente, mas como
parte de um conjunto de normas.
 Interpreta-se a norma considerando que ela é parte de um todo.
c) Método histórico:
 Considera-se o contexto histórico em que a lei foi produzida.
 Utilizam-se documentos históricos para isso (como a
exposição de motivos de uma lei ou as minutas do debate)
d) Método teleológico:
 Interpreta-se a norma conforme a finalidade para a qual ela
foi produzida.
O que a interpretação busca?

 Quando se permite a interpretação, surgem duas


correntes distintas sobre qual é o sentido que o
intérprete deve procurar
 a) Vontade do legislador (mens legislatoris)

 b) Vontade da lei (mens legis)


Vontade do legislador (corrente
subjetivista)
 Preponderância da
vontade subjetiva do
legislador sobre
outros sentidos
possíveis
 O sentido da lei é
estático (não varia
com o tempo)
Vontade da lei (corrente objetivista)
 O sentido da norma é objetivo (independe
da vontade de quem a escreveu)
 O ato legislativo passa a estar incluído na
ordem jurídica global, em constante
mudança
 Isso faz com que a lei se desprenda do autor
e ganhe sentido próprio.
Hans Kelsen

 Nasceu em 1881, em Praga (Império Austro-


Hungaro)
 Foi professor da Universidade de Viena (1919 a
1929)
 Juiz (1921 a 1930)
 Até que perdeu sua cadeira (por ser social
democrata e judeu) e fugiu para os Estados
Unidos (lecionou até 1952).
 Morreu em 1973, na California (92 anos)
Hans Kelsen

 Principais obras:
 Anteprojeto de Constituição da Austria (que inspirou o
controle concentrado de constitucionalidade na Constituição
Austríaca de 1920)
 Essência e Valor da Democracia (1929)
 Teoria pura do direito (1934)
 Teoria geral do direito e do Estado (1945)
 O problema da justiça (1953)
 2ª edição da “Teoria pura do direito” (1960)
Pretensão de Hans Kelsen

 Criar uma ciência do direito


 Objeto de estudos: direito
 Carácter verificável do direito: norma jurídica

Visão estrutural do direito


Pretensão de universalização
Exclui o conteúdo e a formação
do direito (processo legislativo)
Metodologia de Hans Kelsen (a “pureza”)
 Teoria pura do direito
Exclui, da análise, questões políticas,
filosóficas, morais, psicológicas etc.
≠ Teoria do direito puro
Não nega a influencia da moral no direito,
apenas a ignora em seu estudo
Sociedade

Direito

Política Moral
Direito e moral
• Não nega uma relação entre direito e moral.
• A moral aparece na fundamentação do direito
• Mas não deve ser considerada pela teoria.
• A relação é puramente acidental
• Visão formalista do direito:
• O direito pode ter qualquer conteúdo
Objeto de estudos da teoria pura

 Objeto de estudos: O direito


 Ordem social coativa voltada à conduta humana
 Estudar o direito é estudar a norma jurídica

 Objetivo da teoria: conhecer seu objeto


 “O que é e como é o direito?”
 Não “como deve ser o direito?”
Estudo dos fatos
 O estudo dos fatos é colocado em segundo plano
 Sentido dos fatos
 Sentido subjetivo X sentido objetivo

 É a norma que empresta ao fato o significado de “fato


jurídico”
O que é uma norma jurídica?
 Norma como “dever-ser”: o termo “norma”
implica que algo deve ser ou acontecer…
 …que os seres humanos devem se conduzir de
determinada maneira.
 Fazem isso com uma estrutura “se A é, deve ser B”
A - referência fática à qual a norma atribui
sentido
B - sanção (consequência)
Prescrição, sanção e coerção
• O direito é definido a partir do critério da coação
• Norma imperativa x sanção x coerção
• Prescrição (preceito primário): imperativo (dever-ser),
estabelece obrigação ou proibição
• Sanção (preceito secundário): consequência atribuída ao
descumprimento do dever-ser
• Faz parte do conteúdo das normas jurídicas
• Coerção: meio pelo qual se fazem valer as normas
jurídicas
• Garantem a eficácia da norma
• A vigência da norma depende de uma eficácia mínima
Funções da norma
 As normas podem
 Obrigar
 Proibir
 Permitir
 Conceder poderes ou competências
Mas o que faz uma norma ser jurídica?

 Pensando numa lei. O que


faz ela ser jurídica?
É o fato de que um certo
grupo de pessoas decidiu
que determinado texto se
transformaria em texto
legal?
O que faz uma norma ser jurídica
 ParaKelsen, essa não pode ser a
resposta, porque um “dever-ser”
Norma
jamais pode derivar de um “ser”,
mas apenas de outro “dever-ser”.
 Emoutras palavras: uma norma não
pode derivar de um fato, apenas
de outra norma (superior). Norma
 Isso porque os fatos só têm importância
na medida em que tem sentido objetivo
atribuído por uma norma.
Vigência e validade das normas (o
que é direito?)
 É direito toda a norma jurídica que é válida
 A validade corresponde a aspectos formais (autoridade
competente, processo legislativo etc.), não ao conteúdo
 Não existe norma jurídica inválida.
 Se é jurídica, é válida; se é inválida, não é uma norma
jurídica.
O que faz uma norma ser válida?
 O fato de que uma norma superior concede competência à
quem a produziu.
 Ex.:quem dá autoridade para o contratante fazer um
contrato?
E para o legislador criar uma lei?
 Mas o que faz com que a norma superior seja válida?
Fontes do direito
 Por fonte do direito, entende-se toda norma superior em
relação à norma inferior cuja produção ela regula.
 Portento temos uma multiplicidade de fontes do direito:
 Leis
 Costumes
 Decisões judiciais
 Contratos
 Obs.: sentido não jurídico de fonte
 A fonte do direito é sempre um norma jurídica
superior que determina e conforma a criação de
uma norma inferior
 Isso resulta em um sistema escalonado de normas
a que se denomina ordenamento jurídico
Ordenamento jurídico
(“pirâmide de Kelsen”)

Fundamenta Aplica
Constituição

Fundamenta Normas gerais Aplica

Fundamenta Normas individuais Aplica

Atos executórios
 O ordenamento jurídico é um sistema escalonado de normas
 As normas superiores fundamentam as normas inferiores.
 De outro ponto de vista, as normas inferiores
aplicam/executam as inferiores.
 Portanto, as normas superiores dão unidade às inferiores.
As fontes e a questão da validade

 Uma lei é válida se produzida nos termos da


Constituição
 Autoridade competente e procedimento adequado

 Uma decisão judicial é válida se tomada nos termos da


lei
 O ato executivo é do âmbito do ser, portanto, não se
fala em validade
O ato executivo (ser) corresponde ao dever-ser
(ao direito) se feito nos termos da lei.
O que fundamenta a unidade dessa
pluralidade de normas?
 Se o direito é constituído por várias fontes, o que dá
unidade a todas elas?
 A Constituição?
 Mas o que dá unidade às várias normas constitucionais?
 E o que fundamenta a Constituição?
 Direito natural? Vontade do legislador? Vontade do povo?
 Um dever-ser só pode derivar de outro dever-ser, nunca de
um ser.
 Além disso, a ideia é trazer uma teoria pura do direito
 Por isso, o fundamento deve vir do próprio direito
O fundamento do direito
 O que dá unidade às normas é fato de que todas
elas são fundamentadas, em última instância,
pela mesma norma: a norma fundamental.
Ordenamento jurídico:
Norma
Fundamenta fundamental Aplica

Fundamenta Aplica
Constituição

Fundamenta Aplica
Normas gerais

Fundamenta Aplica
Normas individuais

Atos executórios
A norma fundamental hipotética
 Não é posta (positivada)
 Sefosse, dependeria de uma outra norma para
dar fundamento
 Sua validade é pressuposta
É o pressuposto de que devemos obedecer o
direito
A norma fundamental hipotética
 A norma fundamental não deriva do ordenamento
jurídico (é o ordenamento que deriva dela)

 A norma fundamental não tem conteúdo material,


seu conteúdo é meramente formal.

Direitos
Naturais
Unidade formal do ordenamento
 Jusnaturalistas: unidade material do ordenamento
 Ordenamento estático (unidade pelo conteúdo
material)
 Juspositivistas: unidade formal do ordenamento
A unidade não está no conteúdo, mas na competência
da autoridade (ordenamento dinâmico).
 Porisso, o conteúdo não importa para saber se uma
norma é jurídica ou não, apenas a validade (a forma).
A resposta de Kelsen sobre o que faz uma norma ser
jurídica é que ela remete (direta ou indiretamente) à
norma fundamental.
Interpretação (moldura de Kelsen)
 Ficou superada a concepção da Escola da Exegese de que o
direito poderia ser absolutamente claro e independer de
interpretação.
 Para Kelsen, a aplicação de uma norma superior é sempre
um ato de interpretação (não é possível aplicação sem
interpretação)
 Fala-se em interpretar/aplica a norma
 Essa interpretação é um ato de contemplação de uma
norma já posta, não a criação de conteúdo jurídico
 O juiz não produz, mas reproduz o direito.
Moldura de Kelsen
 Não é possível chegar a um único sentido da
norma
 O texto normativo estabelece uma moldura
de possíveis significados de uma norma
jurídica
O direito não pode limitar, de forma absoluta,
sua própria aplicação
 Qualquer opção pela vontade do legislador ou
vontade da norma seria decorrente de “política
jurídica”.
Quem é competente para interpretar

 Interpretação
Ilegítima: cientista do direito,
cidadão
Legítima: aquele designado pela
norma superior
Constituição → legislador
Lei → Juiz
Poder discricionário do juiz
 Como o juiz faz a interpretação legítima, cabe a
ele escolher o sentido do texto dentro da
moldura.
 Portanto, a aplicação/interpretação é ato de
vontade do juiz
O juiz tem o poder discricionário para determinar o
sentido da norma.
Discricionariedade como
decorrência lógica da teoria pura
 Assimcomo a norma fundamental, a moldura é
a forma como Kelsen evita de entrar em
questões alheias ao direito.
 Nocaso, o que leva o juiz a decidir por uma
interpretação possível, e não por outra.
Problema da interpretação
como ato de vontade
 Um dos grandes méritos do positivismo é a segurança
jurídica.
 Com as ideias de Kelsen sobre interpretação, essa
segurança é perdida.

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