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INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO

AULA 10 – TEORIA DA LEI1


Vejamos o significado de “lei”, a partir de sua etimologia:

• do verbo latino legere, que significa “ler” – norma escrita, que se lê, em oposição às normas
costumeiras, que não são escritas.
• ligare, que significa “ligar”, “obrigar”, “vincular”. A lei obriga ou liga a pessoa a uma certa
maneira de agir .
• Eligere, que significa “eleger”, escolher, porque a lei é a norma escolhida pelo legislador
como o melhor preceito para dirigir a atividade humana.

Em suas origens, a palavra “lei” está ligada ao conceito de norma do comportamento


humano, isto é, à lei ética, moral ou humana e, especialmente, à lei jurídica. Mas há outra acepção
do vocábulo – leis físicas ou naturais. Ex.: Lei da gravidade, lei da propagação do som, etc. Todas,
porém, são “leis da natureza” e podem ser físicas ou morais. A lei física é o curso de todos os
fenômenos físicos da natureza e a lei moral é a regra das ações humanas.

Assim, vislumbramos numa ordem de generalidade decrescente, os três sentidos da


palavra “lei”:

• a lei em sentido universal, ou lei cósmica, que se aplica a todos os setores da natureza;
• a lei humana, ética, ou moral, que regulam o uso e o abuso de liberdade (respeito à
dignidade humana, dever de não mentir, solidariedade, etc.);
• a lei jurídica, constituída pelas normas de conduta impostas pela autoridade social2.
O vocábulo “lei jurídica”, em sentido amplo, abrange todas as normas jurídicas – a lei
escrita, o costume jurídico, a jurisprudência, etc. Como definir a lei em sentido jurídico? Existem
três acepções diferentes do termo “lei” no campo do direito:

• em sentido amplíssimo, como sinônimo de norma jurídica, incluindo quaisquer regras


escritas ou costumeiras;
• em sentido amplo, a palavra lei ou legislação é empregada para indicar quaisquer
normas jurídicas escritas, sejam as leis propriamente ditas, oriundas do Poder Legislativo,
sejam elas decretos, medidas provisórias, regulamentos, resoluções, portarias, ou outras
normas baixadas pelo Poder Executivo;

1
Aula com base em Hélio Capel
2
Somente esta última nos interessa para efeito dos presentes estudos.
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• e, em sentido estrito ou próprio, “lei” é apenas a norma jurídica aprovada


regularmente pelo Poder Legislativo; poder competente, conforme alguns autores.

Entendida a norma jurídica como conceito mais amplo do que a lei em sentido estrito,
nos prenderemos agora na análise da lei neste último sentido, para melhor compreendermos o
conceito de lei e suas características, para só depois classificarmos definitivamente todas as normas
jurídicas, onde de fato as leis e as normas jurídicas serão exemplificadas.

CONCEITO DE LEI EM SENTIDO ESTRITO:

É uma regra de direito geral, abstrata e permanente, proclamada obrigatória pela vontade da
autoridade legislativa competente e expressa de forma escrita.

Elementos integram esse conceito:

a) Elemento material: a norma jurídica é, em regra, uma norma de direito “geral”, “abstrata” e
“permanente”. A generalidade da norma jurídica consiste em que ela obriga a todos os membros da
sociedade que se achem igual situação jurídica. É dirigida a todos os homens residentes no País, a
todos os cidadãos de uma cidade, a todos os funcionários públicos, a todos os pais, a todos os
vereadores, enfim, é geral para alcançar todas as pessoas de um mesmo grupo.

a.1) Abstrata: não é destinada a um determinado caso concreto, mas sim, define normas de "dever-
ser", "dever-fazer", ou "dever-deixar-de-fazer" para o futuro, para várias situações possíveis. Dispõe
sobre ações ou situações definidas “abstratamente”, alcançando todos os eventos da mesma espécie
que ocorrerem no futuro. Exemplo: Art. 121 do Código Penal: Matar alguém, pena: 6 a 20 anos.

a.2) Permanente: A lei é uma norma permanente, isto é, tem continuidade no tempo e se aplica
indefinidamente aos casos ocorrentes, enquanto não for revogada ou não se esgotar o tempo de sua
vigência.

b) Elemento formal: é ainda necessário que esse preceito seja declarado obrigatório por decisão do
órgão legislativo competente. É esse, na terminologia jurídica usual, o aspecto “formal” ou
“orgânico” da lei. Mas qual é o órgão ou autoridade competente para exercer esse poder? Quem é o
legislador?

Para entender:

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No Brasil, a Constituição estabelece que “O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, que se
compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal” (art. 44). O art. 48 diz que cabe ao Congresso Nacional,
com a sanção do Presidente da República, dispor sobre todas as matérias de competência da União. Nos Estados,
as Assembleias Legislativas são as casas onde são elaboradas as leis estaduais, pelos Deputados Estaduais. Nos
municípios, o poder legislativo é exercido pelos vereadores, que elabora as leis municipais nas Câmaras dos
Vereadores.

c) Elemento Instrumental: sua forma escrita. A lei é sempre formulada num texto escrito dividido
em artigos, parágrafos e incisos e, muitas vezes, em capítulos, títulos, seções, etc. Por ser escrita,
distingue-se a lei do “costume jurídico”, que também é norma jurídica, mas não escrita. Veremos
mais adiante o que são os costumes jurídicos.

2. VALIDADE, VIGÊNCIA E EFICÁCIA DA NORMA JURÍDICA


a) Validade
Para ser considerada válida a norma jurídica precisa ter sido inserida no sistema
normativo seguindo as exigências previstas para a Técnica da Formulação das normas jurídicas.
Uma lei só terá validade se houver sido submetida ao poder competente e passar por todos os
trâmites da normogênese, com a votação, promulgação e publicação da lei, na forma prevista na
Constituição Federal. Essa primeira análise é denominada de validade formal.
Além da validade formal, a norma jurídica necessita de que o seu conteúdo esteja em
sintonia com o sistema jurídico, ou seja, com as normas hierarquicamente superiores a ela, não
podendo, no caso brasileiro, ser contrária à Constituição Federal ou às Normas infraconstitucionais
superiores à norma que está se analisando. Esta é denominada como validade material.
De acordo com Maria Helena Diniz, “uma norma inferior só será válida se fundar em
uma superior, reveladora do órgão competente e do processo para sua elaboração. (...) promulgada
por um ato legítimo de autoridade, não tendo sido revogada.”.
Eis, segundo aquela autora, os requisitos necessários para se constatar a validade
formal:
1°) elaboração por órgão competente, legitimo, constituído para tal fim;
2°) competência ratione materiae do órgão, (a matéria objeto da norma deve estar contida na
competência do órgão);
3°) atenção e obediência aos processos ou procedimentos exigidos por lei para sua produção
(que nos EUA é chamado de due process of Law).

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Não se confunde validade formal e a validade material. Validade formal se verifica com
o cumprimento das exigências legais para o procedimento de criação da norma jurídica, enquanto
validade material sugere a sintonia do seu conteúdo como o sistema jurídico posto e
hierarquicamente constituído.
Diante disto, podemos afirmar que a norma jurídica só será válida se preencher todos os
requisitos da validade formal e estiver em sintonia com a validade material.

b) Vigência
O artigo 1° da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro institui que “salvo
disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de
oficialmente publicada”. A vigência é propriedade das regras jurídicas que estão prontas para
propagar efeitos, tão logo aconteçam, no mundo fático, os eventos que elas descrevem. Sendo
válida, a norma pode iniciar sua vigência, que é a aptidão para produzir seus efeitos no mundo
jurídico e no mundo fático.
Segundo Paulo de Barros Carvalho, “Viger é ter força para disciplinar, para reger,
cumprindo a norma seus objetivos finais”.
Não se confundem vigência e validade. Validade é a condição de estar a norma
integrada ao ordenamento jurídico, formal e materialmente. Vigência é a própria existência fática da
norma no universo jurídico, o que ocorre após sua publicação e, se for o caso, transcurso do período
da vacatio legis (vacância da lei, que estudaremos em ponto posterior).
Uma norma pode ser válida e não ser vigente, uma vez que pode está submetida a uma
condição suspensiva ou de vacância, ou, ainda, ter tido sua vigência encerrada. Por outro lado, a
validade sempre será pressuposto para a vigência, consequentemente todas as normas vigentes terão
que ser necessariamente válidas.
A norma será vigente quando puder ser exigida.

c) Eficácia
A eficácia está relacionada com a produção de efeitos. Paulo de Barros Carvalho divide este
instituto em Eficácia Técnica, Eficácia Jurídica e Eficácia Social.

EFICÁCIA TÉCNICA

quando a lei descreve fatos que, uma vez ocorridos, tenham aptidão de irradiar efeitos
jurídicos.
EFICÁCIA JURÍDICA
está presente quando os fatos jurídicos desencadeiam as consequências que o ordenamento
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prevê. Está relacionada com o fato de o Estado ter aparato jurídico para fazer a norma ser
cumprida. Isto é, se os agentes estatais têm condições de fazer a norma ser exigida.
EFICÁCIA SOCIAL
ocorre quando há produção concreta de resultados na ordem dos fatos sociais. A norma pode
ser válida, estar em vigência, mas não ter eficácia social. Isso pode ocorrer por dois motivos:
a) impossibilidade material ou ausência de condições (ex. norma que prevê obrigação de uso
de certo equipamento para certa atividade, mas que ainda não está disponível ou acessível a
todos os que devem observar, como aconteceu no início de exigências como a de ponto
eletrônico no trabalho ou de cadeirinha para criança no automóvel); b) por desobediência a
norma, quando a norma não tem sucesso, ou no popular, quando a norma “não pega” (ex.:
norma que prevê o fim das sacolinhas plásticas nos supermercados).

3. CLASSIFICAÇÕES
I) Quanto à hierarquia: vimos na aula 8

II) Quanto à obrigatoriedade: Com base na sua força obrigatória, as leis podem ser

a) Leis Imperativas: (CF Art. 5º II) Possuem obrigatoriedade absoluta. Vale dizer, mandam
ou proíbem de modo incondicionado – não podem deixar de ser aplicadas. Podem nos
obrigar a fazer algo (imperativa positivamente) ou a não fazer algo (proibitiva). Podem
Assim ser subdivididas em:

Imperativas propriamente ditas ou Proibitiva


Imperativas positivamente.

Ex.: Regime obrigatório de separação de bens “Não podem alistar-se como eleitores os
(CC/2002) estrangeiros e, durante o período do serviço
militar obrigatório, os conscritos.” (Constituição
Federal, art. 14, § 2º).

b) Leis Dispositivas: Também denominadas indicativas, são as que se limitam a permitir


determinado ato ou a suprir a manifestação da vontade das partes. Podem ser subdivididas
em:

Permissivas: Supletivas

Corresponde ao Direito Faculdade. Ela nos Suprem a falta de manifestação da vontade das
permite fazer algo mas não nos obriga. “É partes. Só se aplicam quando os interessados não
lícito aos nubentes, antes de celebrado o disciplinarem suas relações. Ex.: “Efetuar-se-á o
casamento, estipular, quanto aos seus bens o pagamento no domicílio do devedor, salvo se as
que lhes aprouver” (CC, art. 1.639). “O partes convencionarem diversamente, ou se o
consumidor pode desistir do contrato no contrário resultar da lei, da natureza da
prazo de 7 (sete) dias a contar de sua obrigação ou das circunstâncias.” (CC, art. 327).
assinatura ou do ato do recebimento do
produto ou serviço, sempre que a contratação
de fornecimento de produtos ou serviços
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ocorrer fora do estabelecimento comercial,


especialmente por telefone ou a domicílio”
( Código de Defesa do Consumidor, art. 49).

III) Quanto à sanção

Perfeitas Imperfeitas Mais que perfeitas Menos que perfeitas


São aquelas cuja Ao contrário da Sua violação acarreta Aquelas cuja violação
sanção consiste na perfeita, não prevê nulidade do ato e não provoca a
nulidade automática anulação do ato nem ainda a imposição de nulidade do ato, mas
ou na possibilidade qualquer outra uma pena ou castigo. traz uma penalidade
de anulação do ato penalidade quando são Ex.: Bigamia para o ato. Ex.: viúvo
praticado contra sua violadas. Não são (a) que casa-se antes
disposição. Violando dotadas de sanção, da partilha
uma lei perfeita o ato apenas visam orientar
praticado é nulo 3 . ou dificultar
Ex.: Contrato de algo determinados atos.
ilícito. Ex.: Direito à
educação, saúde, ...

IV) Quanto à natureza de suas disposições


Materiais e Processuais (também vimos na aula 8).

V) Quanto à sua aplicabilidade

Auto Aplicáveis Dependentes de Regulamentação


Vem completas, com todos os requisitos Será dependente de regulamentação quando
exigidos para que produza os efeitos tácita ou expressamente seu texto assim exigir.
esperados. Apresentam todos os requisitos Ex.: Licença-paternidade.
necessários para sua vigência imediata ou
no prazo legal Ex.: descanso remunerado do
trabalhador previsão CF.

VI) Quanto à sistematização

Leis Avulsas, esparsas ou Leis codificadas ou Códigos: Consolidação


extravagantes:
Nas leis esparsas ou avulsas Constituem um corpo orgânico É a reunião de forma
não existe nenhum tipo de de normas sobre determinado organizada de leis esparsas já
sistematização, o que campo do direito. Ex.: Código existentes em um único
dificulta sua utilização. São Civil, Código Penal, etc.. volume. Esse momento
editadas isoladamente. Ex.: também se presta para a
Lei de falências. criação de novos direitos.

3
Ato nulo x ato anulável
- Ato nulo não produz efeito nunca.
- Ato anulável produz efeito enquanto não anulado.

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Como se vê, é um meio


caminho entre a lei avulsa e o
Código. Atualmente no Brasil
só existe uma consolidação: a
Consolidação das Leis de
Trabalho.

VII) Quanto à esfera do poder público onde se origina (competências previstas na CF/88)
LEIS FEDERAIS LEIS ESTADUAIS LEIS MUNICIPAIS
São elaboradas no São aquelas preparadas nas Têm sua origem nas Câmaras
Congresso Nacional, poder assembleias legislativas de Municipais ou Câmaras de
Legislativo. Valem para todo cada Estado. São válidas e Vereadores, valem
o território Nacional. aplicáveis somente no Estado exclusivamente no município
onde foram discutidas, onde foram aprovadas. A Lei
votadas e aprovadas. A Lei Municipal não pode contrariar
Estadual não pode contrariar a a Lei Estadual nem a Lei
Lei Federal. Federal.

Para refletir: Pense na validade, vigência e eficácia na charge abaixo e disserte sobre:

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