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Cultura das comunidades sinalizantes


Prof.ª Antonielle Martins

Descrição

Características das línguas de sinais e das comunidades surdas. Traços


culturais das comunidades surdas: literatura, humor e arte surda.
Variações linguísticas, regionalismo e padronização das línguas de
sinais.

Propósito

Compreender os conceitos relacionados às línguas de sinais e à


perspectiva da comunidade surda para tornar o mundo um lugar mais
acessível.

Objetivos
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Objetivos

Módulo 1

Línguas de sinais e comunidades surdas


Apontar equívocos e senso comum a respeito das línguas de sinais e
comunidades surdas.

Módulo 2

Aspectos das culturas surdas


Reconhecer aspectos importantes das culturas surdas, como arte,
literatura e humor.

Módulo 3

Padronização das línguas de sinais


Identificar as variações linguísticas e as contradições dos processos
de padronização das línguas de sinais.

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Introdução
Apresentaremos conceitos relativos às línguas de sinais e à
cultura das comunidades surdas.

As comunidades surdas são minorias linguísticas com artefatos


culturais riquíssimos, marcadas pela peculiaridade linguística.

As línguas de sinais são de modalidade visoespacial que, por


meio das mãos, em articulação com o corpo e a face, produzem
sinais e discursos complexos. Organizada espacialmente diante
da pessoa que produz a língua, por meio de um sistema
linguístico regrado, tem o mesmo status de qualquer outra língua.

No Brasil, temos a Língua de Sinais Brasileira (Libras),


reconhecida pela Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, como
meio legal de expressão e comunicação da comunidade surda
brasileira. Além dela, temos no país línguas de sinais indígenas e
de comunidades surdas locais.

A popular Lei de Libras é regulamentada pelo Decreto nº 5.626,


de 24 de abril de 2005, que institui a disciplina de Libras como
componente curricular obrigatório nos cursos de licenciatura,
fonoaudiologia e pedagogia, bem como disciplina optativa nos
demais cursos de instituições de ensino superior. Portanto, esse
decreto tem o intuito de disseminar a Libras e possibilitar que
você curse essa disciplina e tenha contato com aspectos
interessantes do povo surdo.

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1 - Línguas de sinais e comunidades surdas


Ao �nal deste módulo, você será capaz de apontar equívocos e senso comum a respeito das
línguas de sinais e comunidades surdas.

Linguagem de sinais é a língua dos


surdos-mudos?
Vamos começar nossos estudos com alguns questionamentos:

• A língua de sinais é universal?

• Ela é a mesma em todos os países?

• Todo surdo é mudo?

São exatamente essas questões – ou fatos que podem ser

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considerados interessantes a respeito das línguas de sinais e das


comunidades surdas – que veremos ao longo desse estudo.

Aqui temos dois equívocos frequentes de pessoas que não conhecem


as comunidades surdas e as línguas de sinais. Primeiro, o correto é
língua e não linguagem de sinais.

As línguas de sinais (QUADROS; KARNOPP, 2004) possuem todos os


níveis linguísticos existentes nas línguas orais, ou seja, fonologia,
morfologia, semântica, sintaxe e pragmática. Portanto, é tão língua
quanto a língua oral, apenas expressada e percebida por outra
modalidade.

Linguagem
Linguagem é uma capacidade humana. Nossa habilidade de produzir,
desenvolver e compreender gestos, músicas, artes em geral, além de língua,
é possibilitada pela capacidade da linguagem. Já a língua é um conjunto
organizado de elementos que possibilitam a comunicação. A língua surge
naturalmente nas sociedades e nos grupos humanos. As línguas ainda
podem ter diferentes modalidades, como a oral-auditiva, no caso das
línguas orais, ou visoespacial, no caso das línguas de sinais. Portanto, a
Libras é uma língua natural utilizada pela comunidade surda no Brasil.

Atenção!

Além de ser incorreto, do ponto de vista teórico, usar o termo


“linguagem de sinais” é pejorativo, já que diminui a língua de sinais,
como se por meio dela não fosse possível expressar conceitos

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como se por meio dela não fosse possível expressar conceitos


abstratos e complexos, levando à ideia equivocada de que a Libras é
apenas mímica, pantomima e gestos.

O segundo equívoco é o termo “surdo-mudo”. Trata-se de um termo


antigo, ainda muito difundido por meio de canais de comunicação. Veja
mais sobre isso a seguir:

Mudo Surdo

A mudez ou afonia é a Um surdo ou um


incapacidade total ou deficiente auditivo pode
parcial de produzir fala, aprender a falar
uma deficiência que
 frequentando um
nada tem a ver com a fonoaudiólogo e
surdez. fazendo fonoterapia, se
assim desejar.

Portanto, o termo correto é apenas “Surdo”, e com frequência escrito


com a primeira letra maiúscula, demarcando uma concepção cultural
das pessoas surdas em oposição a uma abordagem clínica e
normatizadora que tem o objetivo de consertar os corpos surdos
(SKLIAR, 1999). Temos aqui uma concepção sociológica, não clínica, do
indivíduo surdo.

Os Surdos possuem uma língua, que no caso brasileiro


é a Língua Brasileira de Sinais (Libras), adquirida
naturalmente, da mesma forma que pessoas ouvintes
aprendem a língua portuguesa.

No entanto, no caso das crianças surdas, temos uma peculiaridade, já

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que cerca de 95% dos bebês surdos nascem em famílias ouvintes que
não sabem língua de sinais e têm pouca ou nenhuma informação a
respeito das possibilidades de educação bilíngue para crianças surdas.

O bilinguismo surdo
Os indivíduos Surdos são uma minoria linguística e aprendem a língua
de sinais de forma natural quando entram em contato com seus pares,
isto é, com a comunidade surda sinalizadora. A língua da comunidade
ouvinte, que é majoritária, é aprendida como segunda língua – no caso
dos Surdos brasileiros, a língua portuguesa.

No entanto, por conta da falta de informações a respeito das


possibilidades linguísticas de uma criança surda, os pais tendem a optar
primeiramente por intervenções clínicas e tecnologia assistiva, e com
frequência proibir a língua de sinais.

Comentário

É um equívoco cometido por alguns profissionais da área da saúde


afirmar que a aquisição de uma língua de sinais prejudica a fala. Esse
argumento já foi refutado diversas vezes, já que a aquisição de uma
língua não atrapalha, de modo algum, a aprendizagem de outra.

Agora, observe a seguinte pergunta:

A linguagem de sinais resume-se ao alfabeto manual?

A resposta é não!

Você já viu uma lista do alfabeto com a respectiva soletração manual ou

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datilologia em Libras e pensou que, caso decorasse aquelas


configurações, conseguiria se comunicar plenamente com os Surdos?

Você pode ter respondido sim ou não. E não há problemas nisso porque
falta conhecimento sobre a relação entre o alfabeto e a língua de sinais.

O alfabeto manual, ou a soletração digital, é apenas um dos recursos


utilizados por sinalizantes das línguas de sinais. É um código que
representa as letras do alfabeto como um empréstimo linguístico.
Portanto, soletrar não é um meio com um fim em si mesmo.

Atenção!

Um ponto importante ressaltado por Gesser (2009) é que a soletração


digital, tanto na sua forma produtiva (do ponto de vista de quem
articula) quanto na receptiva (do ponto de vista de quem lê), pressupõe
que a pessoa seja alfabetizada.

Assim, como as crianças surdas que ainda não são alfabetizadas se


comunicariam?

O Surdo/ouvinte não alfabetizado (leitura/escrita) na língua oral da


comunidade ouvinte majoritária teria a mesma dificuldade que um
indivíduo iletrado para utilizar esse recurso.

Veja o alfabeto manual e aproveite para treinar seu nome em Libras:

Alfabeto manual.

Para a maioria das palavras e dos representantes no mundo real, existe

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Para a maioria das palavras e dos representantes no mundo real, existe


uma forma de expressão em língua de sinais que não requer o uso da
soletração digital. No entanto, esse recurso é importante em alguns
casos específicos na língua de sinais.

O alfabeto manual não é uma língua, e sim um código de representação


das letras alfabéticas. É, portanto, um empréstimo linguístico da língua
portuguesa ou de outra língua oral da comunidade ouvinte. Por
consequência, o alfabeto manual também não é universal, sendo, por
exemplo, o alfabeto manual da Língua Britânica de Sinais (BSL)
completamente diferente do alfabeto manual da Libras.

Casos especí�cos
Eis algumas situações em que o alfabeto manual se torna importante:

• Para expressar nomes próprios e de locais específicos;

• Quando o sinalizante não conhece o sinal apropriado;

• Para intercomunicação entre línguas orais e de sinais, quando o objetivo é

superar barreiras durante a comunicação;

• Para um ouvinte alfabetizado aprender alguma língua de sinais;

• Na sinalização de siglas como CPU, USB;

• Para terminologias específicas.

Sinal NUNCA SOLETRADO e sinal NUNCA LEXICALIZADO.

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Temos ainda um processo em que um sinal começa com a soletração


manual e depois se transforma em um sinal lexicalizado. Podemos citar
como exemplo o sinal de NUNCA.

A Libras não é a língua portuguesa


sinalizada
Nenhuma língua de sinais segue a mesma estrutura da língua oral.

A língua de sinais tem estrutura


própria, e é autônoma, ou seja,
independente de qualquer língua
oral em sua concepção linguística.

(GESSER, 2009)

Do ponto de vista da sociolinguística, o fato de a comunidade surda


estar inserida e cercada pela comunidade ouvinte majoritária faz com
que as línguas de sinais estejam em contato direto com as línguas orais
– portanto, é natural ocorrerem empréstimos linguísticos.

Isso acontece com qualquer língua com que se esteja em contato.


Quantos empréstimos da língua inglesa nós, brasileiros, usamos no
nosso cotidiano? Várias, correto?

Portanto, mesmo que existam empréstimos linguísticos, como a

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Portanto, mesmo que existam empréstimos linguísticos, como a


soletração manual, isso não quer dizer que as línguas de sinais tenham
suas raízes históricas nas línguas orais. As línguas de sinais emergem
naturalmente em suas comunidades surdas.

A língua de sinais é universal?


Certamente uma das crenças mais frequentes em relação à língua de
sinais é que ela seria universal, que todos os surdos ao redor do mundo
se comunicariam com a mesma língua. Sabemos que as línguas orais
variam geograficamente.

Então, por que com as línguas de sinais seria diferente?

Seria muito interessante aprender uma língua de sinais e ser capaz de


se comunicar com todos os surdos do mundo, não é mesmo?

Mas isso não acontece. As línguas de sinais variam muito, até mesmo
dentro de um país ou estado, como veremos adiante.

Segundo Sofiato (2011), podemos citar como exemplos:

 Surdos franceses

Língua de Sinais Francesa (LSF)

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 Surdos norte-americanos

Língua de Sinais Americana (ASL)

 Surdos brasileiros

Língua de Sinais Brasileira (Libras)

Um fato interessante é que a Libras tem forte influência da LSF e


nenhuma influência da Língua Gestual Portuguesa (LGP), de Portugal.
Desse modo, podemos apenas determinar parentescos e influências
entre as línguas. A influência da LSF na Libras é apontada em vários
trabalhos acadêmicos, conforme Sofiato (2011) e Martins (2017).

Os registros históricos sobre a educação de surdos no Brasil mostram


que ela está presente desde a vinda do Surdo francês Eduard Huet para
fundar a primeira escola para surdos do país, o Instituto Nacional de
Educação de Surdos (INES), em 1857.

A influência da LSF sempre esteve presente na Libras. Aliás, também


teve forte influência na ASL por meio de Edward Miner Gallaudet, que foi
até a França observar como os surdos franceses eram ensinados. Em
homenagem a Gallaudet, temos a única universidade específica para
surdos no mundo, a Gallaudet University, onde a ASL é a língua de
instrução.

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As línguas de sinais são línguas naturais das comunidades surdas, ricas


e complexas, tão variáveis quanto as línguas orais. Como afirma Gesser
(2009), em qualquer lugar em que existam surdos existe língua de
sinais, e o que é universal é o impulso para comunicação dos indivíduos,
não a língua em si.

Seria possível nos cinco continentes termos apenas uma língua de


sinais?

É bem possível, na verdade, que as línguas de sinais tenham uma


quantidade maior de variação que lembre-se que, com a mudança das
línguas orais, já que não possuem registro gráfico difundido.

A língua de sinais tem gramática?


Sim! As línguas de sinais são naturais da comunidade surda e possuem
estrutura e gramática próprias.

Os estudos linguísticos das línguas de sinais começaram com William


Stokoe na década de 1960. Stokoe, considerado o pai da Linguística das
línguas de sinais, fez análise linguística da ASL por meio das
publicações seminais como:

• Estrutura da língua de sinais: um esboço dos sistemas de


comunicação visual dos surdos americanos (STOKOE, 1960);

• Um dicionário de línguas de sinais americanas sobre princípios


linguísticos (STOKOE; DOROTHY; CRONEBERG, 1965).

Essas obras foram fundamentais para o reconhecimento do status


linguístico das línguas de sinais, permitindo desenvolvimentos teóricos
e metodológicos de análise de línguas de sinais, de sua estruturação

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interna e gramática.

A língua de sinais, como afirmou Stokoe, tinha os mesmos parâmetros


linguísticos das línguas orais, sendo eles: fonologia, morfologia, sintaxe,
semântica e pragmática.

Apesar das diferenças de modalidade de realização e percepção


entre as línguas orais e as de sinais, estas seguem princípios de
organização estrutural semelhantes aos das línguas orais.

Stokoe analisou sinais da ASL em suas unidades mínimas e propôs três


parâmetros constitutivos independentes, como indicados a seguir.

Con�guração de mão
Forma que a mão e os dedos apresentam durante a articulação do sinal.

Localização
Lugar no corpo ou no espaço em que o sinal é articulado.

Movimento
Maneira como a mão se move no decorrer da articulação do sinal.

Posteriormente, mais dois parâmetros foram propostos por Battison


(1974) e Friedman (1975): a orientação da palma e os aspectos não
manuais.

Esses cinco parâmetros, portanto, são itens de composição fonético-


fonológica das línguas de sinais, e a presença deles forma o sinal. É
interessante lembrarmos que, enquanto nas línguas orais as expressões
faciais demarcam sentimentos e intensidades, nas línguas de sinais
temos expressões faciais gramaticais.

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Observe o sinal a seguir com os indicativos das unidades mínimas e


lembre-se de que, com a mudança de apenas um parâmetro, o
significado do sinal é completamente diferente.

Sinal DESCULPA.

Sinal TELEFONE.

No Brasil, os primeiros trabalhos sobre Libras são de Ferreira-Brito


(1995) e, posteriormente, Quadros e Karnopp (2004). Temos também,
lançado mais recentemente, um dicionário de Libras (CAPOVILLA et al.,
2017), com cerca de 14.500 entradas registradas.

A língua de sinais é apenas mímica/gestos e icônica?


Mais uma vez, a resposta é não! As línguas de sinais são naturais,
complexas, recombinativas, arbitrárias e também icônicas em certo
grau.

Para compreendermos melhor, vamos retomar os conceitos de língua e

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iconicidade:

Língua 

Para Saussure (1969), considerado o pai da Linguística, a língua,


ou signo linguístico, é uma convenção entre os membros de uma
comunidade e estabelece significado e significante. Um som, por
si só, não possui nenhum significado. No entanto, se ele existe
dentro de uma língua, esse som passa a ter significado por meio
de uma convenção. Portanto, para Saussure, a relação entre a
forma do referente e a forma das unidades básicas da língua
falada, ou seja, palavras e morfemas, é essencialmente arbitrária.
Isso significa dizer que não há necessariamente uma relação
natural entre a língua (imagem acústica ou som) e o sentido a
que ela remete (significante, representante no universo).

Iconicidade 

Iconicidade é a propriedade linguística contrária à arbitrariedade


e se caracteriza pela semelhança, em certos signos linguísticos,
entre a forma (do sinal ou da palavra) e a “coisa” representada no
universo. Iconicidade também existe nas línguas orais e ocorre,
por exemplo, em onomatopeias, como “atchim” e “tique-taque”, e
palavras onomatopaicas, como “sussurrar” e “zumbido”.

Segundo Taub (2001), que é uma importante pesquisadora das


línguas de sinais, a iconicidade é comum nas línguas orais e nas
sinalizadas, e está presente em todos os níveis da estrutura
linguística, incluindo desde morfologia e sintaxe até itens lexicais
singulares.

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Mas e a língua de sinais? É só icônica?

Veja os seguintes sinais retirados do Dicionário da língua de sinais do


Brasil, o maior dicionário impresso de língua de sinais do mundo!

Sinal CASA.

Certamente, mesmo sem ser fluente em Libras, você consegue


reconhecer esses sinais.

Agora observe este:

Sinal ARBRITÁRIO.

Segundo Martins (2017), se as línguas de sinais fossem constituídas


apenas de elementos icônicos, mímicos, pantomímicos e pictóricos, o
significado deveria ser imediatamente compreendido por observadores
ingênuos. Se esse fosse o caso, as línguas sinalizadas não teriam o
mesmo status das línguas faladas.

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Comentário

Ainda segundo a autora, a iconicidade de um sinal não decorre


simplesmente da semelhança entre a forma e o significado desse sinal,
mas de um processo sofisticado em que os recursos fonéticos dos
sinais permitidos pela língua são construídos em analogia com a
imagem associada ao referente. Esse processo envolve uma quantidade
substancial de trabalho conceitual, que inclui seleção de imagem,
mapeamento conceitual e esquematização de itens para se enquadrar
nas regras da língua. A iconicidade só existe por meio de esforços
mentais dos seres humanos, e depende das nossas associações
conceituais naturais e culturais.

A arbitrariedade da relação entre significante e significado é que


permite a recombinação generativa entre as unidades mínimas
abstratas que compõem a assim chamada “fonologia” das línguas de
sinais. Em sinais icônicos transparentes, algum aspecto da forma física
do sinal se assemelha à imagem sensória concreta do referente desse
sinal. Assim, sinais icônicos transparentes podem representar
analogicamente apenas referentes mais concretos.

Sinal CASA.

Há um paradoxo interessante sobre a iconicidade das línguas de sinais.


Klima e Bellugi (1979) e Martins (2017) conduziram estudos explorando
sistematicamente como a iconicidade poderia facilitar a compreensão
de sinais por ouvintes ingênuos nessa língua. Temos duas observações,
em parte, contraditórias entre si:

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em parte, contraditórias entre si:

Quando expostos a Quando expostos aos


sinais e a informações mesmos sinais, mas na
dos significados desses ausência de informação
sinais, e solicitados a acerca dos significados
atribuir uma nota para desses sinais, e
avaliar o grau de solicitados a adivinhar-
iconicidade desses lhes o significado, esses
sinais, observadores mesmos observadores
ingênuos tendem a  ingênuos tendem a
atribuir notas elevadas, atribuir a esses sinais
e a buscar, nos sinais, significados díspares e
aspectos que inadequados.
justifiquem, em maior
ou menor grau, a sua
forma a partir de seu
significado.

Esses estudos revelam que a maioria absoluta dos sinais é muito opaca,
apesar de ser vista, quase sempre, como bastante icônica. Interessante,
não é mesmo?

A língua de sinais é ágrafa?


Mais uma vez: não!

Então as línguas de sinais possuem uma escrita única e difundida?

Também não. Vejamos:

A escrita é uma representação da língua falada ou

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sinalizada por meio de símbolos gráficos; portanto, o


sistema de escrita é um conjunto de símbolos.

Até pouco tempo atrás, as línguas de sinais eram consideradas uma


língua sem escrita.

Veja a seguir mais sobre a origem da escrita de sinais no mundo:

França

A primeira tentativa de escrita de sinais de que se tem registro é a do


francês Roch-Ambroise Auguste Bébian, que publicou uma obra
chamada Mimographie.

Roch-Ambroise Auguste Bébian


O professor da Guadalupe Roch-Ambroise Auguste Bébian (1789-1839) é
uma figura essencial na história da surdez. Considerado por seus
contemporâneos surdos como o primeiro professor ouvinte que dominava
perfeitamente a linguagem de sinais, Bébian foi também professor dos
pioneiros do movimento associativo de surdos, o primeiro teórico de um
modelo bilíngue para escolas para surdos e o primeiro a demonstrar que os
signos dos surdos podem ser escritos a partir da análise de suas formas.

Fonte: Oviedo (2009).

Estados Unidos

Nos Estados Unidos, há o sistema de notação de William Stokoe (1960)


– sim, o mesmo que fez a descrição fonético-fonológica das línguas de
sinais. Também nos Estados Unidos temos o sistema de escrita de
línguas de sinais mais difundido, o Signwritting (SW), baseado em um
sistema para grafar coreografias.

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Grafia do sinal CASA em SW.

Os sistemas são como alfabetos e podem ser usados para grafar


qualquer língua de sinais. Na imagem anterior, temos um exemplo da
grafia do sinal casa em SW. Preste atenção na transparência do
sistema.

Alemanha

Na Alemanha, há o Sistema de Notação de Hamburgo (HamNoSys)


desde a década de 1980.

Brasil

No Brasil, temos a Escrita das Línguas de Sinais (ELiS), o primeiro


sistema de transcrição criado no país por Mariângela Estelita Barros.

Escrita das Línguas de Sinais


ELiS é a sigla para Escrita das Línguas de Sinais. Esse sistema de escrita
foi criado por mim, em 1998, em dissertação de mestrado. Anos depois,
durante meu doutorado, realizei verificação teórica e prática do sistema, em
pesquisa que contou com a participação de vários surdos adultos, fluentes
em Libras, alunos do curso de Letras/Libras.

Fonte: Barros (2008).


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Desmiti�cando a Libras e os Surdos


No vídeo a seguir, a professora Antonielle Martins nos ajuda a
desmitificar a Libras e os Surdos. Vamos assistir!

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Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

Vimos no começo do primeiro módulo que linguagem se refere a


um processo de comunicação por meio de mecanismos que
transmitem todo tipo informações. Portanto, qualquer conjunto de
sinais/signos pode ser considerado linguagem – uma placa de
carro, músicas, gestos e assim por diante. Estudamos que o correto
é língua de sinais, não linguagem de sinais.

Qual das sentenças abaixo é uma justificativa correta para essa


afirmação?

A As línguas de sinais são padronizadas.

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As línguas de sinais têm estrutura complexa e são


B
naturais.

A linguagem leva em conta a complexidade das


C
línguas.

D As línguas de sinais ainda não são reconhecidas.

A língua de sinais é universal, ou seja, todos os


E Surdos ao redor do mundo se comunicariam com a
mesma língua.

Parabéns! A alternativa B está correta.

Diferentemente de linguagem, o conceito de língua remete


especificamente a um código verbal, um conjunto de léxico que
corresponde a significados dentro de um grupo social. As línguas
de sinais possuem todos os níveis linguísticos existentes nas
línguas orais, ou seja, fonologia, morfologia, semântica, sintaxe e
pragmática – portanto, são línguas naturais e complexas.

Questão 2

Chamamos de “surdo oralizado” o indivíduo com perda auditiva que


se comunica oralmente e faz leitura orofacial. É comum pessoas
que nasceram ouvintes perderem a audição com o tempo. Temos
os “surdos sinalizantes”, que se comunicam por meio da Libras. Já

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o termo “surdo-mudo” é antiquado, ainda muito utilizado por


pessoas que não conhecem a comunidade surda.

Nesse contexto, analise as afirmativas a seguir.

I) Mudez é uma consequência da surdez.


II) Surdos podem ser oralizados com fonoterapia.
III) A mudez ou afonia é a incapacidade total ou parcial de produzir
fala.

Das afirmativas anteriores:

A Somente III é verdadeira.

B Somente I é falsa.

C Somente II é verdadeira.

D II e III são falsas.

E I e II são verdadeiras.

Parabéns! A alternativa B está correta.

Afonia ou mudez não tem nenhuma relação com a surdez. A


pessoa ter deficiência auditiva ou surdez não significa que ela seja
muda. Na verdade, é muito raro que uma pessoa surda seja

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também muda. O que acontece é que, por conta da falta de


feedback auditivo, surdos congênitos precisem de treinamento
clínico para articular a fala e fazer leitura orofacial, caso desejem.

2 - Aspectos das culturas surdas


Ao �nal deste módulo, você será capaz de reconhecer aspectos importantes das culturas
surdas, como arte, literatura e humor.

Cultura surda
Apesar de ser bastante utilizado, o termo “cultura” nem sempre é bem
compreendido, pois sua abrangência por vezes não é clara.

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Em geral, o senso comum atribui prestígio somente à cultura erudita,


reconhecendo o seu valor estético, e a trata como única forma válida de
cultura, como se fosse mais desenvolvida.

No entanto, cultura abrange o conjunto de hábitos, conhecimentos e


crenças de um povo.

Em nosso estudo, vamos partir do que é cultura para a Sociologia, já que


essa ciência tem como premissa que “é por meio da cultura que
buscamos soluções para nossos problemas cotidianos, interpretamos a
realidade e produzimos novas formas de interação social” (SILVA et al.,
2017, p. 60).

Pensamos em cultura como o produto da interação de


indivíduos que compartilham valores, experiências e
visões semelhantes. Não é possível afirmar que há
culturas inferiores ou superiores, visto que tal
conceituação é advinda de preconceitos e visões de
mundo há muito ultrapassados. Acreditamos numa
visão sociológica, em que todos os artefatos culturais
tenham valor.

A fim de que isso possa ser explorado, é necessário que respeitemos


valores, tradições, costumes e práticas dos povos, sem exceção, e
deixemos de lado estereótipos e classificações sem fundamento. Esse
conjunto de conhecimentos e ações é transmitido de geração a geração
através de interações que podem ocorrer nas atividades do cotidiano ou

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através de interações que podem ocorrer nas atividades do cotidiano ou


em festividades especiais.

Partindo desse pressuposto, lançamos uma questão:

Existe uma cultura surda?

Pode ser questionado que o fato de os Surdos utilizarem a mesma


língua não lhes assegure nem proporcione outra cultura além daquela
do local em que vivam. Contudo, os Surdos contam com uma história de
lutas e conquistas que os une como sujeitos com características
subjetivas bastante específicas decorrentes de sua experiência de
interação com o mundo pela visualidade e pela língua de sinais.

A cultura surda traz em si elementos


importantes que a identificam,
constituem-na e a colocam no rol
das diferentes culturas que
perfazem o panorama das posições
da modernidade tardia. Os espaços
das culturas são regidos por tramas
de poder. Cada cultura é, em si
mesma, autoridade.

(PERLIN, 2006, p. 138)

Para Gladis Perlin, primeira doutora surda do Brasil na área dos estudos
surdos (deaf studies), subárea dos estudos culturais, existe sim uma

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cultura dos surdos que é fruto da sua forma de ver o mundo. Veja alguns
desses aspectos a seguir.

Visualidade 

A vivência surda é muito visual. A visão é o principal sentido de


contato com o mundo, de apreensão e significação das
informações.

Linguístico 

As línguas de sinais, de modalidade visoespaciais, são as línguas


naturais para as pessoas surdas. A língua de sinais é tão
complexa quanto qualquer outra. Não se trata de uma versão em
sinais de uma língua oral como o português, nem de simples
gestos ou mímica. Em salas de aula, eventos públicos ou mesmo
na televisão, deve ser feita a tradução entre a língua oral e a de
sinais por um intérprete.

Família 

Ligada ao nascimento de filhos surdos em lares ouvintes e de


filhos ouvintes em lares surdos, ou mesmo de filhos surdos em
lares surdos. Nesse âmbito, muitas questões ligadas à
aceitação, à superproteção e à concepção sobre a surdez são
discutidas.

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Comunidade surda 

Composta por Surdos e por ouvintes militantes da causa, como


professores, familiares, intérpretes, amigos, entre outros.

Associações e organizações 

Centros cuja importância se manifesta, por exemplo, na


possibilidade de o Surdo interagir com outras pessoas surdas, o
que favorece a construção da sua identidade, a possibilidade de
aprender a língua de sinais, as lutas sociais do segmento por
vezes abraçadas nessas organizações etc.

Literatura surda 

A literatura para Surdos é a arte que abarca produções literárias


em língua de sinais produzidas ou adaptadas por pessoas
surdas.

Artes visuais 

Englobam o teatro surdo e as artes plásticas.

Criações e transformações materiais 

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Exemplificadas pelas soluções alternativas para as pessoas


surdas, como campainhas luminosas, telefones adaptados,
dispositivos de vibração (relógios, celulares) em substituição ao
despertador etc.

Existem vários aspectos que demarcam a existência da cultura surda. O


mês de setembro, chamado de Setembro Azul, é um marco importante
para comunidade surda, já que contém várias datas importantes como
veremos a seguir:

Setembro Azul
O Setembro Azul é destinado a reflexões sobre as conquistas da
comunidade surda, bem como à conscientização sobre acessibilidade
linguística. Nessa época do ano, ocorrem festas, congressos e
manifestações por mais escolas bilíngues para surdos e mais
acessibilidade linguística.

 6/9 a 11/9

Esses dias relembram um triste marco histórico


para a comunidade surda, o Congresso de Milão, de
1880, onde as línguas de sinais foram proibidas e a
educação de surdos passou a ser oralista.

 23/9

Dia Internacional das Línguas de Sinais.

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 26/9

Dia Nacional do Surdo, data escolhida por conta da


fundação da primeira escola de surdos do país, o
Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES).

 30/9

Dia do Tradutor, dia de homenagear os intérpretes


de Libras, profissionais de extrema importância
para a acessibilidade dos surdos.

Identidades surdas
A comunidade surda não é homogênea; existe outro conceito muito
presente trazido por Perlin (2006) que merece nossa atenção: as
identidades surdas. Segundo ela, não existe apenas uma forma de ser
surdo e de se entender como tal. Vejamos a seguir quais são essas
identidades.

De transição

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Refere-se aos Surdos que, após alguns anos vivendo sem


conhecimento sobre a língua de sinais nem contato com a
comunidade surda, aprendem a comunicar-se em uma língua
visoespacial.

Flutuantea

Refere-se aos Surdos que se expressam através da maneira de


ser ouvinte, vivem e interagem na sociedade buscando ser
ouvintes./p>

Refere-se aos casos em que o Surdo não se enxerga como bem


compreendido pelos ouvintes, criando assim um sentimento de
subalternidade.

Inconformada

Híbrida

Nesta identidade, incluímos os Surdos que nasceram ouvintes e


perderam a audição ainda na infância. Essas pessoas utilizam a
comunicação através da língua oral e também da língua de
sinais.p>

São os Surdos que utilizam a língua de sinais, participam da


comunidade surda e têm orgulho de sua história, sua cultura e
suas manifestações sociais.p>

Surda

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É fato que entendemos que as pessoas surdas de identidade surda são


aquelas que se sentem à vontade com a sua diferença e, por isso,
apresentam a surdez não como perda da audição. Também é fato que
jamais poderemos nos referir às demais identidades como menores ou
inferiores.

Comentário

A comunidade surda é heterogênea; os indivíduos Surdos são


atravessados por diversas questões. Surdos podem ser filhos de pais
Surdos ou ouvintes, podem usar aparelho auditivo ou ter implante
coclear, podem ser oralizados ou não, e assim por diante.

Subgrupos da comunidade surda


Existem outras características que também unem os Surdos em
subgrupos menores dentro da comunidade surda. Podemos citar
diversas relações de identificação que extrapolam a questão do ser
surdo em um mundo ouvinte.

Como exemplo de agrupamentos de surdos com outras características,


estão:

Religiosidade 

Podemos citar os surdos espíritas, testemunhas de Jeová,


católicos e evangélicos.

Identidade de gênero e orientação sexual 

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Comunidades surdas que se encontram em associações e que


também participam de paradas de diversidade. Nesses
subgrupos, as questões relativas às necessidades específicas
desses sujeitos são apresentadas e debatidas.

Esportes 

A prática de esportes também é muito presente nas


comunidades surdas pelo mundo, estimulando a organização de
jogos intermunicipais, estaduais, nacionais e internacionais. A
XXIV Surdolimpíadas de Verão, um evento internacional,
acontecerá no Brasil, na cidade de Caxias do Sul-RS, entre os
dias 5 e 21 de dezembro de 2021.

As manifestações culturais surdas são criações coletivas ou individuais


relacionadas ao sistema artístico ouvinte e suas produções. Nisso,
vemos o fato de que as expressões poéticas configuram um grande
polissistema, constituído por sistemas menores independentes como o
da arte surda.

A literatura surda
Outro exemplo de uma atividade produtiva surda é a literatura surda,
que costuma utilizar adaptações de contos famosos para a cultura
surda, apresentando personagens surdos. Nesses contos, a experiência
visual é enfatizada, bem como a valorização da língua de sinais e da

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visual é enfatizada, bem como a valorização da língua de sinais e da


surdez. Existem também produções originais produzidas por autores
surdos e que não são adaptações.

Essa literatura serve como meio de identificação e representatividade


para seus leitores – apresentando histórias em que a narrativa sobre a
surdez não é vista como uma perda, mas sim uma diferença, ajuda a
construir no imaginário uma visão positiva de si. Os autores se utilizam
também de estratégias da semiótica para destacar o uso das mãos e a
visualidade, pois o objetivo é marcar a presença da visualidade e da
Libras como empoderadoras, não como deficit.

É possível afirmar que os Surdos são seres biculturais,


já que, além da cultura surda, experienciam a cultura
de seu país, da comunidade ouvinte majoritária. Por
meio das mais diversas relações sociais, todos
compartilhamos da cultura de nosso país – na música,
na dança, nas tradições e nos mais variados produtos
culturais.

Isso também inclui as pessoas surdas que interagem nesse grande


sistema cultural brasileiro.

O polissistema literário brasileiro inclui o sistema literário surdo, que


busca protagonizar a experiência vivida por pessoas que nasceram no
país e compartilham com os ouvintes de muitos traços culturais.
Portanto, não se limita apenas a adaptar contos, mas a ajudar a interagir

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e a transformar através de um diálogo entre a tradição e a necessidade


de ver-se representado.

Veja, a seguir, alguns exemplos de obras infantis para a literatura surda.

Patinho surdo

Fala de um patinho que nasceu em um lugar com patinhos


ouvintes. O ápice da história é o momento em que ele encontra
patos surdos e aprende a “Língua de Sinais da Lagoa”. Esse
livro é uma adaptação que relaciona a experiência prévia à
língua de sinais com a ideia de exclusão, apresentando a
possibilidade de aceitação e pertencimento.

(KARNOPP; ROSA, 2005)

Cinderela surda

Nessa adaptação, a Cinderela e o príncipe são surdos e, em vez


de perder o sapatinho de cristal, a personagem principal perde
uma das luvas. A escolha da luva se dá para fazer uma
referência às mãos, amplamente utilizadas pelos surdos para
se comunicar.

(HESSEL; ROSA; KARNOPP, 2005)

Tibi e Joca

Uma produção original, que conta a história de um surdo


nascido em uma família de ouvintes até o seu encontro com a

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língua de sinais.

(BISOL, 2001)

Humor surdo
Dentro do sistema da literatura surda, podemos também falar do humor
surdo e das piadas com personagens surdos. Essas anedotas são muito
frequentes em encontros de surdos, tanto nos formais
(congressos/fóruns de educação) como nos informais (associações de
surdos).

Fica clara a ideia de surdez constituída como diferença, não como


limitação. Ao trazer o humor para as suas vidas, os contadores tratam
de si mesmos com leveza e possibilitam que os interlocutores, da
mesma forma, consigam compreender que não existe luto por serem
surdos. Veja o exemplo de uma piada para crianças:

Exemplo

Um homem trabalhava em uma floresta. Ele cortava árvores.


E procurava árvores grandes para cortar.
Quando encontrava alguma, usava seu machado para cortá-las. E então
ele gritava:
– Madeira! – E a árvore caía no chão.
Um dia ele encontrou uma árvore enorme, e começou a cortá-la.
Ele gritou para árvore, mas a árvore não caiu.
Ele chamou um médico que entendia de árvores, que, após examiná-la,
percebeu que ela era surda.
Então o lenhador chamou um intérprete, que falou para a árvore, em
Libras:

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– Madeira. – E ela caiu!

Nas piadas, outro fator que fica evidente é o “ganho surdo”, devido à
possibilidade de comunicar-se em uma língua desconhecida para a
maioria e a perda sofrida pelos ouvintes por não se comunicarem por
meio dela. São denominados “ganhos surdos” (do inglês deaf gain) as
relações que se dão com o mundo através da visualidade e os
benefícios que isso pode trazer. Aqui a desvantagem não é do surdo, e
sim do ouvinte, que desconhece os aspectos culturais relativos à
visualidade.

Na anedota surda, podem ser trazidas a diferença e as experiências


difíceis vivenciadas pelos surdos como meio para o humor. Inclusive o
elemento religioso é representado em sátiras de cura da surdez. Rir de si
mesmo, do sagrado e do outro é uma forma de criar uma relação de
proximidade.

Vejamos exemplos de humor surdo nas piadas a seguir.

O Wal�e

Em um café, dois amigos conversam sentados a uma mesa, enquanto


na outra, um rapaz acompanhado por uma garota come seu lanche
fazendo um enorme barulho com os talheres e também ao mastigar!

Ao fim do lanche, o rapaz faz vários sinais com as mãos, em libras,


dizendo “Este foi o melhor waffle que comi na vida!”.

A garota, ao compreender a mensagem, diz em voz baixa e

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A garota, ao compreender a mensagem, diz em voz baixa e


constrangida: “Todos aqui notaram!”.

“Todos aqui notaram!”


O humor se dá no fato do ganho surdo quanto a não se perturbar pelo
barulho dos talheres no prato: enquanto os ouvintes estão claramente
incomodados, o surdo nem se deu conta e somente desfrutou da refeição.

Na aula de mergulho

Professor: Seu marido é surdo? Não tenho certeza se poderemos fazer


isso.
Esposa: O que você quer dizer?
Professor: Eu preciso me comunicar com ele embaixo d’água e ele não
pode ouvir!
Esposa: Como você se comunica embaixo d’água com pessoas que
podem ouvir?
Professor: Bem, nós usamos sinais manuais para... não, peraí!
Professor: Dã! Desculpa!

O desa�o da inclusão
Com o passar dos anos (BAUMAN; MURRAY, 2014), diversos
questionamentos surgiram sobre por que lutar pelo direito à diferença
para se contrapor às práticas educacionais e médicas com visão
negativa da surdez – pela valorização da diferença, pela necessidade de
lutar e pela preservação do que é visto como falta pela maioria.

Nessa busca por uma autocompreensão da subjetividade surda, foi


possível observar diversos ganhos com a aquisição da língua de sinais,
por exemplo:

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por exemplo:

• Crianças surdas: Percepção de ganho com sua experiência visual;

• Crianças ouvintes de famílias ouvintes: Vantagens cognitivas,


como a possibilidade de desfrutar de mais de uma cultura, e ter
acesso a duas modalidades de língua.

Toda a materialidade concernente à compreensão do que significa ser


surdo e o que isso gera é fruto do trabalho de Paddy Ladd quanto aos
deaf studies no Reino Unido e seu trabalho de “descolonizar” os
trabalhos de pesquisa sobre a surdez:

A pesquisa de Paddy Ladd inaugura


um amplo e multifacetado campo
teórico investigativo que se propõe
dar protagonismo à mentalidade
surda (deaf way) e sua história de
resistência.

(TERCEIRO; FERNANDES, 2019)

Na continuidade de visões sobre os ganhos surdos, há alguns autores


que citam os seguintes exemplos:

 Exemplo 1

A possibilidade de não ouvir barulhos e conversas


em locais tumultuados.

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 Exemplo 2

A questão da visão periférica, aguçada em


indivíduos surdos.

 Exemplo 3

As diferentes perspectivas sobre o mundo.

Ao falarmos de ganhos surdos, não estamos jamais tentando diminuir


ou negar as dificuldades encontradas pelas pessoas surdas por viverem
em uma sociedade predominantemente ouvinte. Sabe-se que a falta de
comunicação enfrentada por muitos surdos com suas famílias pode
causar-lhes muitos problemas, até mesmo na vida adulta.

A visão de diferença e não de deficiência é capaz de nos ajudar a


perceber que existem, sim, alguns ganhos na experiência da visualidade,
e até mesmo no fato de não ser exposto a tudo que os ouvintes são sem
poderem escolher.

O que se propõe aqui não é falar apenas sobre a Libras ou o que será
preciso em relação às práticas educativas necessárias ao atendimento
bilíngue. Na verdade, visamos a uma inclusão que atenda a todas as
problemáticas das diferença dos sujeitos. Tem-se uma língua, uma
cultura e diversas identidades que necessitam ser contempladas.

Atualmente, os mais variados grupos sociais estão lutando por sua

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Atualmente, os mais variados grupos sociais estão lutando por sua


representatividade na arte, na mídia e no meio acadêmico – e isso inclui
os surdos. O processo de autonomia, contrário ao de assujeitamento,
requer manifestações de todas as ordens porque, nesse momento, não
se quer ocultar e sim mostrar as especificidades concernentes a cada
um. Com o advento da tecnologia e das mídias sociais, temos um gama
de produções surdas, com protagonismo surdo.

Saiba mais

Podemos citar dois canais interessantes no YouTube: Porta dos Surdos


e o canal do youtuber Leo Venturino. São excelentes fontes para
aprender Libras!


Narrativas surdas
No vídeo a seguir, a professora Antonielle Martins nos apresenta um
pouco da sua vivência com as culturas surdas. Vamos assistir!

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Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

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Questão 1

A comunidade surda não é homogênea. Os surdos são


atravessados por várias outras questões sociais e individuais. As
questões individuais estão fortemente relacionadas à idade da
perda auditiva, a processos de escolarização, à utilização ou não de
aparelhos auditivos, e assim por diante. Os surdos se identificam
entre si especialmente por conta da língua em comum – no caso
dos surdos brasileiros, a Libras. A partir do que nos apresenta
Gladis Perlin, assinale a alternativa correta da correspondência
identidade-característica.

I) Identidade de transição
II) Identidade inconformada
III) Identidade híbrida
IV) Identidade surda

( ) Surdos que não se sentem compreendidos por ouvintes e têm


sentimento de subalternidade.
( ) Surdos que depois de um tempo vivendo sem língua de sinais
encontram a comunidade surda.
( ) Surdos que perderam a audição e se comunicam em língua de
sinais e língua oral.
( ) Surdos que utilizam língua de sinais e se orgulham da
comunidade surda.

A I, IV, III, II

B IV, III, II, I

C III, IV, I, II

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D II, I, III, IV

E I, II, III, IV

Parabéns! A alternativa D está correta.

De acordo com Gladis Perlin, temos algumas identidades surdas


passíveis de classificação. Surdos oralizados ou sinalizadores
podem, por vezes, sentir-se inferiores aos ouvintes, configurando-se
como uma identidade inconformada. Pessoas podem perder a
audição depois de já terem a língua oral adquirida e optar por
aprender a língua de sinais também, o que Perlin chama de
identidade híbrida. Surdos podem demorar algum tempo para entrar
em contato com a comunidade surda e passar por um período de
identidade de transição. Outros surdos se sentem felizes com o fato
de serem surdos e têm orgulho da língua de sinais.

Questão 2

Pela ótica da Sociologia e de pesquisadores da área dos estudos


surdos, a comunidade surda se configura em uma minoria
linguística, com histórias de lutas e conquistas que se une
enquanto sujeitos com características específicas decorrentes de
sua experiência de interação com o mundo. Sobre os artefatos
culturais surdos, analise as alternativas a seguir.

I) A literatura surda serve como um meio de identificação e


representatividade para os seus leitores.
II) É possível afirmarmos que os surdos são seres biculturais.

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II) É possível afirmarmos que os surdos são seres biculturais.


III) Humor não faz parte da cultura surda, pois é pejorativo.
IV) A literatura surda tem produções originais ou adaptações de
clássicos.

Qual alternativa está correta?

A I, II, IV

B I, II, III, IV

C I, II, III

D I, IV

E II, IV

Parabéns! A alternativa A está correta.

Vimos que o traço mais importante da cultura surda está


relacionado à língua de sinais e ao histórico de luta das
comunidades surdas. É possível afirmar que os surdos são seres
biculturais – já que, além da cultura surda, experienciam a cultura
de seu país, da comunidade ouvinte majoritária – e seres bilíngues.
A literatura surda, bem como o humor surdo, são artefatos culturais
importantes que valorizam a diferença surda e as línguas de sinais.

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3 - Padronização das línguas de sinais


Ao �nal deste módulo, você será capaz de identi�car as variações linguísticas e as
contradições dos processos de padronização das línguas de sinais.

Língua e sociedade
Para compreendermos a variação linguística e a padronização,
precisamos nos atentar para a língua em suas relações com a
sociedade. Essas relações são estudadas pela Sociolinguística. E você
sabe o essa área significa?

Sociolinguística é o ramo da Linguística que estuda a


língua como um fenômeno social, tendo como seu

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expoente os estudos de William Labov (2008)

Labov, desde meados dos anos 1960, levantou discussões acerca da


pluralidade e heterogeneidade da língua nos seus estudos seminais.
Como língua e sociedade são fortemente correlacionadas, a língua varia
no espaço geográfico, no decorrer do tempo, e nos diferentes espaços
sociais, bem como nas diferentes situações comunicativas.

Exemplo

Percebemos no cotidiano essas variações por meio dos sotaques de


indivíduos de outros estados, de uma palavra que uma pessoa mais
velha utiliza e que não conhecemos, da formalidade de um tribunal do
júri, e assim por diante.

Anteriormente, vimos que as línguas de sinais não são universais e


variam geograficamente – surdos franceses utilizam a Língua de Sinais
Francesa (LSF), surdos norte-americanos utilizam a Língua Americana
de Sinais (ASL), e assim por diante, certo? Este é o primeiro tipo de
variação que notamos: existem línguas diferentes no mundo.

Pensamos primeiramente nas “grandes línguas” associadas a grandes


civilizações ou impérios. Isso nos remete à relação de língua e poder
político.

O mandarim é língua nativa de quase 1 bilhão de pessoas. Para termos


uma ideia, se juntarmos o mandarim às outras sete línguas mais faladas
no mundo (inglês, espanhol, hindi/urdu, árabe, russo, bengali e
português), chegaremos a uma porcentagem entre 40% e 45% da
população mundial.

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Assim:

• 45% falam oito línguas;


• Outros 50% falam trezentas línguas;
• A minoria, 5%, fala mais de 6 mil línguas restantes.

Antes da tecnologia da escrita e das grandes civilizações, cada grupo ou


tribo tinha a sua própria língua; portanto, havia muito mais línguas no
mundo, mesmo com uma população bem menor.

Isso também acontece com as línguas de sinais. Segundo pesquisa


publicada por Johnston (2006), a população de surdos nativos e
sinalizadores na Austrália está diminuindo muito. Isso por conta do
controle da rubéola, do mapeamento genético, do implante coclear e
das políticas de inclusão. Com essa medida, a comunidade surda
australiana pode diminuir a ponto de a Língua de Sinais Australiana
(Auslan) desaparecer.

Saiba mais

Antes da colonização portuguesa do Brasil, imagina-se que havia


aproximadamente 1.175 línguas indígenas. Atualmente, temos cerca de
180 e dezenas estão ameaçadas de extinção.

No Brasil, temos um fenômeno frequente que chamamos de


regionalismo. Por se tratar de um país continental – cuja riqueza
cultural é impressionante, constituída pela mistura de várias
nacionalidades da Europa, África e, ainda, dos povos autóctones, sem
falar da gama de empréstimos linguísticos, especialmente da língua
inglesa –, o regionalismo é muito frequente, sendo o dialeto uma de
suas formas de expressão.

Por exemplo, qual palavra está correta: macaxeira, aipim

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ou mandioca?

Todas. Mas, caso você utilize a palavra macaxeira no sul do Brasil, pode
não ser compreendido.

O fato de variarem dentro da mesma língua mostra o quanto as línguas


naturais são orgânicas e vivas. A língua circula entre as pessoas e não
pode estar “presa” em dicionários e gramáticas. Quando essa variação
vai além do “sotaque” e de algum léxico, é chamada de:

Dialeto 

Dialetos são variedades de uma língua falada por comunidades


geograficamente definidas. O dialeto às vezes é entendido como
uma forma menos importante e complexa da língua, como uma
língua inferior. No entanto, para a Linguística, o dialeto é apenas
uma variante regional, uma variedade da língua com a mesma
complexidade da língua-padrão. Portanto, linguisticamente
falando, cada dialeto é uma língua, mesmo que política ou
socialmente o dialeto esteja sempre vinculado ou subordinado a
uma língua-padrão.

Segundo Amorim e Di Santi (2019), a concepção de uma língua-padrão


surge na tentativa de unificação política dos Estados centrais modernos
com o objetivo de apagar a diversidade linguística regional e social dos
cidadãos com seus dialetos.

A padronização da língua está especialmente relacionada à tecnologia


da escrita e se dá por meio da elaboração de instrumentos normativos,
como as gramáticas e os dicionários.

Resumindo

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Portanto, devemos compreender que, quando nos referimos à norma


padrão, não nos referimos exatamente a uma variedade da língua, e sim
a um abstrato construto histórico-social e cultural usado como
referência para que se promova um processo de uniformização da
língua.

Partindo da perspectiva da norma padrão, temos a:

Norma culta 

Tida como a variedade de uso corrente entre falantes que vivem


em meio urbano e com escolaridade superior, com forte
influência da mídia. É um termo mais abrangente que língua-
padrão, pois refere-se não só ao padrão que é para além do
regional, mas também às variedades cultas informais de cada
região. Assim, norma culta pode ser tanto formal quanto
informal.

A língua-padrão pode ser considerada a variável linguística mais


difundida, aquela língua utilizada nos telejornais, por exemplo,
geralmente entendida por todos os falantes da língua. É a variante da
língua utilizada neste texto, frequentemente a forma usada na educação
formal e a mais amplamente utilizada pela mídia.

Apesar de existir a chamada norma culta ou língua-padrão, quando ela


está na “boca do povo”, a língua falada não deve ser tida como certa ou
errada, caso contrário isso se configura, frequentemente, como
preconceito linguístico. Sabemos que cada indivíduo tem sua história e
seu contexto cultural, e o objetivo principal da língua é a comunicação.

Você já percebeu que mesmo sem conhecimentos

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Você já percebeu que mesmo sem conhecimentos


metalinguísticos a respeito de sintaxe ou morfologia
da língua portuguesa conseguimos formar frases
compreensíveis?

Sabemos também, de forma automática e intuitiva, que o tipo de


linguagem que usamos para nos comunicar com nossos avós, médicos
ou em situações que demandem mais formalidade é diferente da forma
que nos comunicamos com nossos amigos do bairro. Esse processo
por vezes é automático e saudável; afinal, ficaria estranho chamar um
amigo de senhor, não é mesmo?

Portanto, alternar entre padrões linguísticos é adequado e devemos


atentar para a pertinência de cada um deles.

E nas línguas de sinais, como ocorrem as variações linguísticas.

A Libras varia tanto quanto as línguas orais, certo? A grande maioria dos
estudantes de Libras, já desde o início, costuma ouvir que existem
regionalismos nessa língua. Muitos ficam desapontados pelo fato de
não haver uma língua de sinais única, uniforme e utilizada em todos os
países; outros compreendem que isso está presente nela como está em
seu próprio idioma.

No caso do Brasil, com sua vasta extensão territorial, seria ainda mais
difícil pensarmos em uma uniformidade linguística. Assim como no
português brasileiro, a Libras possui características vinculadas à sua
regionalidade decorrente de aspectos geográficos e culturais. Visto que
aqui existem diversas culturas, em estados com hábitos bem singulares,

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aqui existem diversas culturas, em estados com hábitos bem singulares,


não é possível evitar a variação linguística, nem “contorná-la”. De Norte
a Sul, existem danças, tradições, culinária e outros artefatos culturais
que não pertencem ao folclore de outras partes do país, o que influencia
também o léxico da região.

A variação linguística em Libras é um assunto muito complexo e


apresenta diversas questões que devem ser analisadas. Compreender
as variações linguísticas da língua de sinais requer uma visão histórica
sobre os surdos enquanto minoria linguística, já que a Libras é uma
língua de resistência da comunidade surda (MACHADO; WEININGER,
2018).

Esses são exemplos de variações lexicais regionais da Libras. Enquanto

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Esses são exemplos de variações lexicais regionais da Libras. Enquanto


o primeiro sinal “Branco” é utilizado em São Paulo, o segundo é utilizado
em vários estados, e o último somente no Rio Grande do Sul.

Existe um sinal melhor do que o outro?

Não! Mas existe um sinal que é amplamente utilizado, que nesse caso é
o segundo sinal.

Os processos de variação linguística são naturais e estão presentes em


todas as línguas, tanto orais como de sinais.

Exemplo

Quando aprendemos inglês, sempre nos apresentam as variações norte-


americana e britânica como se fossem somente essas as opções.
Porém, mesmo dentro do que chamamos norte-americano ou britânico,
há várias diferenças de sotaque e léxico.

Em razão do exposto, precisamos compreender que, do ponto de vista


linguístico, os regionalismos, os dialetos e as variações não são
consequências da “falta de instrução”.

Todas as variedades de uma língua têm o mesmo valor, nenhuma é


melhor do que a outra.

Já do ponto de vista social e político, há uma variedade considerada


melhor, que é a variedade padrão de uma língua e a norma culta.
Quando alguém vai aprender inglês ou qualquer outra língua estrangeira,
normalmente quer aprender a variedade padrão.

O respeito à diversidade linguística deve estar presente nas conversas,


nos momentos de troca e nas práticas de ensino. A linguagem
apresenta-se em diferentes momentos, dentro de situações
comunicativas e, por isso, todas as suas manifestações são válidas.

Atenção!

Todas as outras formas de variações linguísticas presentes nas línguas

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orais acontecem também nas línguas de sinais. Podemos citar as


variações linguísticas entre os surdos nas associações de surdos e os
surdos acadêmicos, bem como as variações entre surdos jovens e
surdos mais velhos e em diferentes situações comunicativas.

Vimos que os processos de padronização da língua estão atrelados


especialmente à tecnologia de escrita em dicionários, obras didáticas e
obras literárias. Apesar dos sistemas de notação (escrita) das línguas
de sinais, nenhum deles é difundido. Assim, podemos ter uma
variabilidade ainda maior no léxico das línguas de sinais do que nas
línguas orais.

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Tomemos como exemplo a palavra “abacaxi”, registrada no Dicionário


da Língua de Sinais do Brasil (CAPOVILLA et al., 2017):

Ela apresenta seis sinais referentes!

O excesso de variação lexical pode gerar alguns desafios,


especialmente em relação a questões terminológicas específicas.
Vejamos o exemplo a seguir.

Se temos seis sinais de Libras diferentes para


“membrana plasmática” e precisamos traduzir a prova
do ENEM a fim de torná-la acessível aos surdos, qual
dos sinais devemos utilizar? O ENEM é uma prova
nacional. Por essa razão, alguma padronização da
língua se faz necessária.

Processos de padronização pressupõem no mínimo uma gramática


prescritiva com as regras e estruturas da linguagem, que recomenda
uma em prol de outra, e um dicionário padrão que apresente o
vocabulário.

No caso da Libras, podemos citar duas obras de extrema importância,


que não almejam padronização linguística em si, mas apresentam léxico
representativo da Libras e descrições linguísticas pertinentes: Dicionário
da língua de sinais do Brasil (CAPOVILLA et al., 2017), e Língua de sinais
brasileira: estudos linguísticos. (QUADROS; KARNOPP, 2004).

Exemplo

Inúmeras inovações tecnológicas vêm impulsionando a propagação do


conhecimento produzido pelos grupos de pesquisas. Podemos citar as

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pesquisas no campo da linguagem da Universidade Federal de Santa


Catarina (UFSC), as quais influenciam as demais pesquisas no Brasil.

Os termos utilizados nas produções acadêmicas muitas vezes não


possuem sinal – os sinais criados em salas de aula ou por
pesquisadores podem integrar o léxico da Libras. Essas iniciativas
podem gerar discussões sobre tentativas de padronização.

Podemos perguntar: os sinais criados em outras localidades devem ser


descartados?

Não! Mas, quando uma entidade com maior alcance cria sinais e divulga
as suas produções, isso faz com que a escolha lexical seja feita pelos
termos criados por ela.

Comentário

Além da tecnologia, a participação em eventos faz com que aconteça a


difusão dos sinais, principalmente para aquelas áreas em que a
terminologia é muito específica. Para os surdos e profissionais
intérpretes, a procura por glossários terminológicos específicos
acontece sempre que um aluno surdo ingressa em uma área de estudos
para a qual ainda não existem sinais oficiais.

Com as novas políticas de inclusão, muitos surdos ingressaram em


universidades e cursos técnicos e profissionalizantes. Assim, a
necessidade de traduzir as aulas ocorre, fazendo com que os intérpretes
procurem aprender a terminologia. Atualmente, pela facilidade de
difusão do conhecimento, muitos grupos compartilham seus termos
locais, possibilitando que essa lacuna seja preenchida por seus colegas
surdos/intérpretes de outras regiões.

Apesar de não existir qualquer restrição quanto à utilização de sinais


locais, os surdos e ouvintes sempre optam pela utilização de sinais
produzidos em contextos acadêmicos. Dessa forma, as apresentações
poderão ser mais bem compreendidas por pessoas de estados

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diferentes e criar certa uniformidade, pelo menos em relação à área de


estudo.

Atenção!

Os pesquisadores têm se atentado à relevância de evitar a dominação


da língua portuguesa sobre a língua de sinais. Como muitos sinais
apresentam marcas ligadas ao alfabeto manual, por exemplo, são
realizadas novas discussões, e novos termos são criados.

A relação binária “ouvinte ou surdo” e “língua oral ou língua de sinais”


gera muitos conflitos decorrentes do desejo surdo de protagonizar a sua
própria história. Por isso, os sujeitos surdos têm o papel principal na
produção de terminologia.

Tradutores e professores surdos,


bem como intérpretes de LS,
utilizam sinais dialetais próprios,
sendo que a padronização é mais
facilmente percebida só com o uso
de sinais mais direcionados
especificamente a determinada área
de conhecimento (por exemplo:
morfologia, fonologia, sintaxe etc.),
por causa dos conteúdos
eminentemente linguísticos dos
textos-base.

(AVELAR, 2008, p. 374)

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Padronização de sinais
Apesar da busca por uma padronização dos sinais, mesmo em
produções acadêmicas na plataforma educacional virtual, o uso de
sinais regionais não deve deixar de ser utilizado (AVELAR, 2008). No
entanto, acontece um movimento “natural” de pesquisar e utilizar
aqueles sinais específicos aos conteúdos da área de tradução.

Assim como nas línguas orais, a opção consciente ou não pela


utilização de sinais gera algumas dificuldades para os tradutores-
intérpretes de Libras, profissionais imprescindíveis para a acessibilidade
linguística das pessoas surdas, que por vezes desconhecem o signo
apresentado.

Dica

Em situações como a que acabou de ler, a solução é solicitar o auxílio


de colegas durante a tradução. Outra solução é pesquisar e registrar as
diferenças dialetais, como uma estratégia de antecipação ao que
poderia representar um problema.

Já vimos que língua e sociedade se relacionam fortemente, certo? E que


poderes políticos e sociais atravessam essas relações. Podemos então
questionar:

Como deveria acontecer um processo de padronização das línguas de


sinais, já que são consideradas línguas minoritárias?

Processos de padronização são questionáveis e conduzem


normalmente à discussão do que é a norma de uma língua. Eles, por
vezes, servem para controlar a variação dialetal inerente aos sistemas
linguísticos.

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linguísticos.

Outro questionamento inerente aos processos de padronização das


línguas de sinais são os interesses políticos que permeiam o processo.

A quem interessa esse processo? Quem lidera esse processo?

Hanna Eichmann (2009), por meio de entrevistas com professores


surdos e análises teóricas, faz uma crítica aos processos de
padronizações que por vezes são impostos e liderados por ouvintes.

Atenção!

Segundo os resultados da pesquisa, os principais interessados nesse


processo de padronização das línguas de sinais são os ouvintes,
especialmente aqueles aprendizes de língua de sinais como segunda
língua, já que os surdos, em sua maioria, não têm nenhuma dificuldade
de compreender as variações linguísticas.

A autora faz a distinção entre dois tipos de processos de padronização


linguística, como podemos ver a seguir.

Padronização imposta “de cima para baixo” 

Carrega a noção de intenção, intervenção deliberativa em uma


língua, formando uma variante que incorpora as características
de uma língua-padrão. Desse modo, uma língua-padrão não
surgiria naturalmente, mas de forma intencional.

Padronização natural 

Carrega a noção de processo espontâneo pelo fato de as línguas


se transformarem naturalmente com o tempo.

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Pela ausência de um código escrito difundido, as línguas de sinais


possuem uma grande variação, especialmente a lexical. Sendo assim,
os processos de padronização são naturais e por vezes passíveis de
intervenções. Quando feitos como intervenção, devem ser examinados
com cuidado e procedidos com muito respeito aos direitos linguísticos e
ao protagonismo dos surdos em relação à própria língua.


Processo de padronização da língua
No vídeo a seguir, a professora Antonielle Martins comenta sobre limites
e possibilidades linguísticos da língua de sinais. Vamos assistir!

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Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

Estudamos que a língua-padrão pode ser considerada a variável


linguística mais difundida e entendida por todos os falantes da
língua. No entanto, variações linguísticas ocorrem em todas as

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língua. No entanto, variações linguísticas ocorrem em todas as


línguas e são fenômenos naturais que mostram sua organicidade;
no Brasil, o regionalismo é muito comum.

Assinale a afirmativa correta sobre o tema.

A O regionalismo é mais frequente na língua inglesa.

Dialetos são variedades de uma língua falada por


B
comunidades geograficamente mal definidas.

A língua varia no espaço geográfico, no decorrer do


C tempo e nos diferentes espaços sociais, bem como
nas diferentes situações comunicativas.

As línguas possuem relação superficial com a


D
sociedade.

O regionalismo, apesar de comum, é um fenômeno


E determinado por determinadas regiões visando
manter a uniformidade.

Parabéns! A alternativa C está correta.

Vimos no texto que variação linguística é objeto de estudo da


Sociolinguística, tendo como seu expoente os estudos de William
Labov. Nos estudos seminais do autor, fica claro que língua e
sociedade são fortemente correlacionadas. Por conta dessa

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sociedade são fortemente correlacionadas. Por conta dessa


correlação, a língua varia no espaço geográfico, no decorrer do
tempo, e nos diferentes espaços sociais, bem como nas diferentes
situações comunicativas. O regionalismo é um fenômeno natural,
muito comum no Brasil por conta da riqueza cultural e extensão
geográfica.

Questão 2

O estudo de Eichmann (2009) faz críticas pertinentes aos


processos de padronizações que por vezes são impostos e
liderados por ouvintes. A autora diferencia dois tipos de
padronização linguística. Sobre essa diferenciação, analise as
afirmações:

I. As línguas se transformam naturalmente com o tempo; sendo


assim, há uma padronização espontânea.
II. Padronizações podem ser impostas de “cima para baixo”.
III. Nos processos de padronização, o protagonismo surdo deve ser
respeitado.
IV. A única padronização possível acontece naturalmente.

Está correto o que se afirma em:

A I, II e IV.

B I, II, III.

C III e IV.

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D I e IV.

E IV somente.

Parabéns! A alternativa B está correta.

A afirmação IV está incorreta pois a ausência de código escrito


difundido das línguas de sinais faz com que alguma padronização
deliberada se faça necessária – como vimos no exemplo do ENEM,
uma prova que atinge todo o país e necessita de escolhas lexicais
adequadas. Portanto, quando os códigos escritos são inseridos
deliberadamente em certo contexto, devem ser procedidos com
cuidado e respeito aos direitos linguísticos e ao protagonismo dos
surdos em relação à própria língua.

Considerações �nais
Nos conteúdos aqui apresentados, compreendemos os conceitos
relativos às comunidades surdas e às línguas de sinais. No caso dos
surdos brasileiros, a língua utilizada é a Língua de Sinais Brasileira
(Libras). Vimos que as línguas de sinais não são universais, mas línguas
complexas que surgem naturalmente nas comunidades surdas. As
línguas de sinais possuem gramática própria e todos os níveis

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linguísticos existentes nas línguas orais, ou seja, fonologia, morfologia,


semântica, sintaxe e pragmática. Portanto, possuem o mesmo status
das línguas orais e sua peculiaridade mais importante é o fato de serem
línguas visoespaciais, isto é, expressas pelo corpo no espaço e
compreendidas visualmente. Estudamos que é uma língua
recombinativa e arbitrária, apesar de ter presente a iconicidade.

Entramos em contato com o universo da cultura surda, com artefatos


culturais riquíssimos como a literatura surda, o humor surdo e assim por
diante. As identidades surdas são diversas e heterogêneas,
atravessadas pela cultura ouvinte. Nesse sentido, temos uma percepção
sociológica dos indivíduos surdos e não clínica e normatizadora, que se
preocupa apenas com reabilitação e grau de perda auditiva.

Por conta da enorme variabilidade das línguas de sinais, o que as torna


complexas, vivas e orgânicas, estudamos também o desafio dos
processos de padronização das línguas de sinais.

Esperamos que a história da comunidade surda inspire você a lutar por


uma sociedade mais acessível e inclusiva, e que o conteúdo aqui
disponibilizado lhe seja útil caso receba um aluno surdo em sala de aula
ou encontre uma pessoa surda na sua trajetória de vida.

Explore +
Compare diferentes línguas de sinais do mundo por meio da plataforma
Spreadthesign na web. O banco de dados reúne 400.000 sinais de
diferentes línguas de sinais ao redor do mundo.

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Para compreender melhor os desafios das pessoas surdas, assista ao


vídeo Os surdos têm voz, estrelado pelo artista surdo Leonardo Castilho.

Você pode conhecer um pouco mais sobre o francês Eduart Huet no


vídeo Manuário – E. Huet, da TV INES. Pesquise na web.

Você pode conhecer um pouco mais sobre o educador norte-americano


E. M. Gallaudet no vídeo Manuário – Gallaudet, da TV INES. Pesquise na
web.

Você pode conhecer um pouco mais sobre o educador norte-americano


William Stokoe no vídeo Manuário – William Stokoe, da TV INES,
pesquise na web.

Conheça o org/brazil/ e descubra as múltiplas possibilidades do


sistema de escrita da língua de sinais.

Para saber mais sobre sociolinguística, leia o livro de graduação de


Letras/Libras da UFSC escrito pelo professor Leland McCleary.

A inclusão escolar não atende às especificidades linguísticas das


crianças surdas. Assim, a comunidade surda brasileira luta por escola
bilíngue específica para surdos. Para saber mais sobre políticas
linguísticas e educação de surdos, leia o artigo Educação bilíngue para
surdos e inclusão segundo a Política Nacional de Educação Especial e o
Decreto nº 5.626/05, de Ana Claudia Balieiro Lodi.

Referências
AMORIM, L. M.; DI SANTI, B. T. Norma padrão, norma culta e hibridismo
linguístico em traduções de artigos do New York Times. In: Cadernos
de Tradução, Florianópolis, v.39, n.3, p.111-131, set. 2019.

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AVELAR, T. F. Entrevista com tradutores surdos do curso de


Letras/Libras da UFSC: discussões teóricas e práticas sobre a
padronização linguística na tradução para língua de sinais. In:
QUADROS, R. M.; STUMPF, M. R. (Orgs.) Estudos surdos. Petrópolis:
Arara Azul, 2008. IV.

BARROS, M. E. ELiS – Escrita das línguas de sinais: proposta teórica e


verificação prática. 2008. 192f. Tese (Doutorado em Linguística) –
Centro de Comunicação e Expressão, Universidade Federal de Santa
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Sign Language Studies, n. 5, p. 1-19, 1974.

BAUMAN, H. L.; MURRAY, J. J. Estudos surdos do século 21: “Deaf gain”


e o futuro da diversidade humana. Curitiba: Editora UTFPR, 2014.
(Educação de Surdos em Debate).

BISOL, C. Tibi e Joca: uma história de dois mundos. Porto Alegre:


Mercado Aberto, 2001.

CAPOVILLA, F. C.; RAPHAEL, W. D.; TEMOTEO, J. G.; MARTINS, A. C.


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