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precoce possível.
Como posso ajudar meu paciente a melhorar seu desempenho e sua funcionalidade? No
baseado na reabilitação para adultos, hoje são reconhecidas suas peculiaridades e suas
diferenças. Com isso, ao longo do capítulo, esses pontos serão discutidos e alguns
Reabilitação Neuropsicológica
déficits adquiridos, visando ao mais alto nível de adaptação possível e melhor qualidade
de vida. Wilson (1989, 2008) a define como um processo em que pessoas com dano
comunidade para remediar ou minimizar os déficits cognitivos. Vale ressaltar que por
Heugten, & Ownsworth, 2017). É possível fazer uma diferenciação, apesar de muitas
vezes serem utilizados como sinônimos (Gindri et al., 2012). O termo reabilitação
alteradas por meio de treinos cognitivos (Ciccerone et al., 2011; Grindi et al., 2012;
Wilson, 2008). O termo reabilitação neuropsicológica, por sua vez, é mais amplo, uma
vez que além de buscar melhorar déficits cognitivos, enfatiza os aspectos emocionais,
intervenção.
demanda por reabilitação em adultos, em função dos soldados sobreviventes com lesões
intervir para remediar esses déficits cognitivos (Poser, 1996; Wilson, 2008). Médicos se
muitos conceitos se manterem, ao longo dos anos houve mudanças importantes no campo
(Baddeley et al., 2000), quando ocorreu maior compreensão e definição das abordagens.
teóricos para embasar a reabilitação e, com o avanço dos programas, foi possível propor
estratégias de repetição e prática estruturada das tarefas. Wilson (1997) aponta que o foco
uma lesão cerebral. Contudo, essa abordagem ainda não consegue acolher os problemas
Ben-Yishay (1978), Prigatano (1986) e Wilson (2002), é um dos modelos mais utilizados
holística para crianças (Marcantuono & Prigatano, 2008, Sant’Anna e Mello, 2017). Ao
disfunções cerebrais. Por mais que seja possível classificar as intervenções, é importante
ressaltar que os métodos não são excludentes entre si, sendo bastante comum o emprego
primeiro por sua especificidade e o segundo, consecutivamente, por seu maior potencial
de generalização para a vida real. A demanda e as metas do paciente, assim como, fatores
particularidades
terapeuta trabalha com a criança, sua família e com escola para compensar, restaurar ou
literal, diz respeito ao retorno a algum nível do estado anterior, restituindo uma condição
anterior. Assim, tal termo pode gerar uma confusão para muitos profissionais e para o
reabilitar, remediar os processos cognitivos que foram prejudicados após lesão cerebral,
ainda adquiridas pelo indivíduo ou que se encontram com desempenho abaixo em suas
tarefas diárias frente à demanda do ambiente. Tanto a reabilitação como a habilitação são
preventivas.
Rocca, 2018). Não há um único modelo que permita identificar em que idade e em que
por exemplo, adultos recrutam a região pré-frontal dorsolateral e córtex parietal, enquanto
as crianças ativam mais as regiões do núcleo caudado e a insula anterior (Scherf &
que o do adulto e ser mais suscetível a se recuperar de uma lesão, sabe-se que quanto
mais precoce a lesão, mais difícil tende a ser a recuperação, na medida em que
basais que, quanto mais cedo ocorrer a lesão, mais prejudicados serão. Isso significa que
quanto mais jovem a criança tiver uma lesão adquirida, principalmente lesões difusas ou
frisar que quanto mais cedo a detecção e a intervenção, maiores podem ser os benefícios
para cada faixa etária, para proporcionar intervenções adequadas para cada caso. Além
disso, sabe-se que escolaridade da criança, assim como a escolaridade dos pais (Ardila,
Rosselli, Matute, & Guajardo, 2005), tipo de escola (Casarin, Wong, Parente, Salles, &
Fonseca, 2012) e nível socioeconômico (Farah et al., 2006, Piccolo, Sbicigo, Grassi-
Oliveira, & Salles, 2014) também são variáveis necessárias a se considerar, uma vez que
(gerando conexões mais efetivas com melhores estratégias cognitivas delas decorrentes)
ou neuroplasticidade negativa (conexões menos efetivas com estratégias menos bem-
sucedidas).
assume um papel ainda mais relevante (Santos, 2005). Há estudos mostrando que quando
Stancin, & Wade, 2010). Para que os pais possam incentivar e ajudar seus filhos, o
terapeuta precisa fornecer suporte à família. Assim, é importante que, durante o processo
possam expor como vêm se sentindo (culpa, raiva, tristeza, luto pela perda, negação) e
psicoeducação parental, que visa a ensinar aos pais sobre a etiologia da doença, sobre as
habilidades e as dificuldades cognitivas de seu filho, bem como a ensinar estratégias para
que possam estimulá-lo. Devido a estas novas responsabilidades, a família precisa ser
preparada e habilitada pelo terapeuta para que juntos possam melhor ajudar na
recuperação da criança.
assim como os pais, os professores precisam receber um suporte. Diante dos resultados
a criança mais gosta, os programas de televisão, os desenhos infantis, livros, bem como,
respeitar a natureza lúdica, utilizando jogos e brincadeiras que ela se identifica, pode
que devemos considerar ao planejar uma intervenção infantil: (1) adequação ao nível de
conhecimento dos sistemas cognitivos; (6) pilar central na família, com estabelecimento
de uma forte parceria com os familiares; (7) transdisciplinaridade, com cooperação entre
Re(h)abilitação Neuropsicológica
tratamento é individualizado, planejado com base nos déficits, nas habilidades e nos
aspectos ambientais em que a criança está inserida. Com isso, não há um guia ou uma
receita de bolo.
Uma das formas de planejar a re(h)abilitação é com base nos modelos de saúde e
doença que possibilita uma análise lógica e sistemática dos problemas clínicos. A
os estados, condições e causas dos problemas de saúde e tem sido amplamente utilizada
Battistella & Brito, 2002). No Brasil, há alguns estudos propondo o uso da CIF para o
Neste sentido, alguns centros de reabilitação utilizam o sistema SMART (do acróstico da
T - timed). De acordo com esse sistema as metas precisam ser – específicas, mensuráveis,
sua rotina diária” também pode ser considerada inadequada, pois o uso da agenda pode
organizar para entregar os temas de casa” é uma meta específica, paciente e familiares
la, tanto quanto permite avaliar a eficácia da intervenção (Covre, 2017; Wilson, Evens,
Gracey, & Bateman 2009). Pode, ainda, motivar os envolvidos, direcionando seu foco e
para alcançá-las e, com isso, um plano de tratamento é montado. Determina nessa etapa
organização para entrega dos temas de casa, o clínico pode propor treino cognitivo para
ambiente, com organização de uma rotina ou inclusão de calendário, pode orientar os pais
sobre como ajudar seu filho nessa tarefa, oferecendo reforços positivos quando a
- Psicoeducação – essa técnica visa a educar paciente e familiares acerca das dificuldades
conscientização e aceitação dos déficits (Gindri et al., 2012). Para isso, diferentes
materiais podem ser utilizados tais como folhetos, livros, filmes, etc. Na reabilitação
infantil, há algumas ferramentas disponíveis, como por exemplo, o livro para crianças
- Restauração ou habilitação da função cognitiva por meio de treino - essa técnica visa a
específicos. Contudo, destaca-se que propor vários exercícios sem uma organização e
propósito, possivelmente não gerará generalização e transferência para o cotidiano. A
abordagem baseada em tentativas por ensaio e erro não é ética nem cientificamente
embasada. Assim, antes de iniciar os jogos e exercícios, indica-se que seja realizada uma
que é a função cognitiva alvo de estimulação e onde, como e porque utilizar as estratégias
que serão ensinadas. É recomendado criar um contexto lúdico, com o uso de narrativas,
livros, filmes ou fantoches. Dessa forma, é possível que haja um maior engajamento por
parte do paciente, uma vez que imagens visuais e histórias infantis possibilitam que a
uso de jogos, exercícios e materiais lúdicos. Para isso, pode utilizar jogos já disponíveis
importante que os recursos sejam utilizados de maneira sequencial, que sejam repetidas
(inicia-se com tarefas mais fáceis para mais complexas). Após a finalização de cada
paciente e ajudar a criança a refletir sobre o que foi trabalhado, por meio de perguntas e
o paciente possa transferir o que aprendeu para situações do cotidiano, além de estimular
sua efetividade (Klingberg et al., 2005; Thorell, Lindqvist, Bergman Nutley, Bohlin, &
transferência são ainda inconclusivos, uma vez que parecem não favorecer a transferência
de ganhos para outras áreas e situações (Melby-Lervåg, Redick, & Hulme, 2016).
Mateer, 2005), que foi desenvolvido para crianças de 4 a 14 anos de idade com objetivo
assombrada) (Santos, Toffoli, Cardoso, Drumond, & Rosa, 2006) consciência fonológica
Frison, & Casarin, 2012). O Pedro no Acampamento, por exemplo, é formado por 10
jogos que visam aperfeiçoar algumas habilidades cognitivas, como atenção, percepção,
funções executivas, linguagem oral e escrita. É indicado para crianças a partir de 5 anos
em Escolares com ênfase nas funções executivas (PENcE) (Cardoso & Fonseca, 2016),
suficiente para estimular as funções cognitivas e gerar melhoras no cotidiano. Por isso, a
(Capítulo 8), funções executivas (Capítulo 9), teoria da mente (Capítulo 10), habilidades
exemplo, pode ser fornecido mais tempo para realização da atividade, quando se trata de
paciente (Nery-Barbosa & Barbosa, 2017). Por exemplo, quando uma criança apresenta
objetivos no local, especificando o espaço que irá realizar as tarefas da escola na ausência
para que possa utilizar para estudos e anotar prioridades ou tarefas do dia ou da semana;
adquirir pastas ou arquivos para que a criança possa utilizar para organizar seus materiais,
extinção, reforço, role-playing) (Pontes & Hubner, 2008). Por exemplo, quando um
reforçado. Para utilizar essas técnicas, fundamental, previamente, realizar uma análise
Com essa análise, fica claro o foco da intervenção e as técnicas mais apropriadas para o
paciente (Lopes & Dalmaso, 2017). Se, por exemplo, os fatores antecedentes estiverem
1
Programa de reforço sistemática em que se premia com pontos ou fichas cada vez que o
paciente apresentar o comportamento desejado.
modifiquem os estímulos antecedentes (por exemplo, modelagem e fading); já se os
Quadro 1.
habilidades, sem acelerar, mas sim tentando garantir o desenvolvimento ótimo esperado
para cada faixa etária, sendo considerada uma intervenção em nível primário de atenção
à saúde neuropsicológica. Esse tipo de intervenção também pode ter importante papel
prejuízos no futuro.
estudos e, de maneira geral, foi possível verificar que as habilidades cognitivas, mais
no contexto escolar onde essa intervenção normalmente ocorre, uma vez que é um
momento, optou-se por apenas citar o nome e referência de cada um dos programas, uma
vez que ao longo dos capítulos da Seção 2 da presente obra eles serão apresentados com
mais detalhes.
Quadro 2.
Considerações finais
aspectos emocionais.
intervenção bem detalhado com as metas, estratégias e técnicas que serão utilizadas, é
imprescindível que haja uma parceria entre terapeuta, paciente, familiares e escola. Sabe-
se que o engajamento da família e da escola, em conjunto com estratégias adotadas pelo
como também em medidas de desfecho para intervenção. Além disso, é importante cada
vez mais normatizar programas com seus registros, ou seja, verificar o que é esperado de
evolução de cada sessão para cada faixa etária, nível educacional e no final de cada
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