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PISCICULTURA

AULA 3

1 Prof. Rafael Dias Pinto


CONVERSA INICIAL

Para compreender a reprodução dos peixes, é necessário conhecer sua


biologia reprodutiva. Os peixes ocupam os mais diversos ambientes aquáticos,
mesmo as mais extremas temperaturas e altitudes. O sucesso da sobrevivência
nesses ambientes se deve, dentre outros fatores, às diferentes estratégias
reprodutivas apresentadas pelos diversos grupos de peixes existentes. O tipo de
desova, a presença ou não de cuidado parental, as fases do ciclo e outras
características podem diferir para cada espécie.

TEMA 1 – CARACTERÍSTICAS BIOLÓGICAS

1.1 Estratégias

As estratégias reprodutivas são as características biológicas que uma


espécie precisa manifestar para alcançar o sucesso reprodutivo. Algumas
espécies possuem caracteres sexuais secundários, que ficam mais visíveis na
época de reprodução como, por exemplo, protuberância na cabeça do salmão em
período reprodutivo (Figura 1).

Figura 1 – O salmão adulto é muito similar ao salmão juvenil; já no período


reprodutivo ele muda de cor e desenvolve protuberância

Crédito: Kalinin Ilya/Shutterstock.

De maneira geral, os peixes podem apresentar fecundação externa ou


interna, sendo a externa a mais comum entre grande parte das espécies. Na
fecundação externa, os peixes liberam seus gametas no ambiente, obtendo a
chance de fecundação por diferentes indivíduos e aumentando a diversidade
genética da prole. Já na fecundação interna, o processo de fecundação dos ovos

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disponíveis é quase total, com menor possibilidade de terem variabilidade
genética. Com relação ao desenvolvimento dos ovos, algumas espécies possuem
desenvolvimento direto, outras precisam passar por fases larvais (Figura 2).

Figura 2 – Embriões vivos com os ovos fecundados em desenvolvimento

Crédito: O Partime Photo/Shutterstock.

Os peixes, de acordo com suas características reprodutivas, podem ser


classificados em ovulíparos, ovíparos, ovovivíparos e vivíparos. Já com relação
aos cuidados com a prole, algumas espécies que não desenvolvem o cuidado
parental, outras cuidam apenas dos ovos e aquelas que cuidam dos filhotes por
um maior período de tempo. Ao avaliarmos o processo de migração dos peixes,
é comum para várias espécies realizarem a migração para reproduzirem-se
(espécies migradoras ou reofílicas). Porém, nem todas necessitam realizar esse
movimento, dispensando tais gatilhos ambientais para se reproduzirem.
Um ponto importante a ser avaliado são os gametas, afinal algumas
espéciessão dioicas e desenvolvem seus gametas em indivíduos diferentes.
Outras são hermafroditas, apresentando gametas femininos e masculinos em um
único indivíduo.
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A fecundidade de cada espécie é definida pelo número de ovócitos que
uma fêmea irá desovar. Assim, a fecundidade, o tempo de incubação e o período
de eclosão são características específicas e dependem da ocorrência de
condições ambientais favoráveis ao desenvolvimento das larvas (Figura 3).

Figura 3 – Larvas de peixe recém-eclodidas

Crédito: Константин Байдин /Adobe Stock.

Todas essas estratégias reprodutivas estão relacionadas entre si de forma


a maximizar o sucesso produtivo, por exemplo, algumas espécies que realizam
cuidado parental podem desovar ovócitos maiores, mas apresentam baixa taxa
de fecundidade. Por outro lado, as espécies de alta fecundidade não apresentam
cuidado parental, pois produzem ovócitos em número suficiente para garantir a
sucessão da espécie.
Muitas vezes a estratégia reprodutiva de liberar ovos maiores está
relacionada com o tempo de desenvolvimento dos filhotes (Figura 4), uma vez que
as espécies que possuem ovos maiores e com maior quantidade de vitelo
possuem tempo de desenvolvimento mais lento, e ovos em menor quantidade.
Cada espécie possui um determinado conjunto de características ambientais que
estimulam e maximizam o sucesso reprodutivo.

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Figura 4 – Ciclo de vida dos peixes. Sequência de estágios de desenvolvimento
da carpa cruciana (Carassius), peixe de água doce, desde o ovo até o animal
adulto

Crédito: Kazakova Maryia/Shutterstock.

Existem ainda alguns fatores que podem afetar as características


reprodutivas de peixes migradores e não migradores, entre eles o ambiente de
reprodução, o tipo de desova (parcelada ou não), cuidado parental, tipos de ovos
e necessidade de indução na reprodução em cativeiro.

Saiba mais

Vamos acompanhar o desenvolvimento dos ovos para larvas de peixes no


vídeo a seguir:
Shoma81. Fish caviar under the microscope, movement of embryos in fish
eggs, formation of embryos, as well as a heartbeat. Adobe Stock, S.d. Disponível
em: <https://stock.adobe.com/br/video/fish-caviar-under-the-microscope-
movement-of-embryos-in-fish-eggs-formation-of-embryos-as-well-as-a-
heartbeat/267241746>. Acesso em: 27 fev. 2023

1.2 Modificações do período reprodutivo

Ao longo do ciclo reprodutivo dos peixes, as gônadas podem passar pelos


seguintes estágios, conforme o fluxograma dos estádios de maturação gonadal
(Figura 5) e descritos a seguir:

I. Imaturo: pouco desenvolvidas e ainda em formação;


II. Repouso: tamanho reduzido, delgadas e translúcidas (normalmente ocorre
nos meses mais frios e secos do ano);
III. Maturação inicial: começo do processo de gametogênese (formação dos
gametas);

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IV. Maturação final: desenvolvidas e maduras, atingem seu maior peso e
volume (geralmente ocorre no período mais quente e chuvoso do ano);
V. Regressão: gônadas com células em atresia e redução de tamanho, ocorre
quando não há liberação dos gametas (comum em peixes migradores
mantidos em cativeiro);
VI. Esgotado: é o período posterior à reprodução após a eliminação dos
gametas, no qual há reorganização das gônadas que seguirão para a fase
de repouso

Figura 5 – Fluxograma dos estádios de maturação gonadal

Repouso Maturação

Maduro

Regressão Esgotado

Crédito: Rafael Dias Pinto.

Os principais hormônios envolvidos no desenvolvimento reprodutivo são


liberados pelo hipotálamo, hipófise e gônadas, havendo outros que atuam como
moduladores indiretos da reprodução. Basicamente a composição é formada
pelos seguintes hormônios: estimulador das gonadotrofinas (GnRH),
gonadotróficos (GtH), de crescimento (GH) e tireoidianos (T3).

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TEMA 2 – TIPOS DE REPRODUÇÃO

Para que uma produção de peixes possua viabilidade econômica, é


necessário que haja pleno domínio do pacote tecnológico de reprodução da
espécie, que, por sua vez, é baseada em aspectos da biologia básica do peixe.
Por essa razão, muitas vezes o foco das pisciculturas comerciais se concentra
em espécies exóticas como a tilápia, carpa e truta, as quais já possuem
informações de cultivo consolidadas.

2.1 Peixes migradores

O início do ciclo reprodutivo em peixes migradores é influenciado por uma


soma de aspectos ambientais como fotoperíodo, temperatura e fluxo de água.
Podem ocorrer ainda alterações nas condições sociais da população de peixes
que induzem um grupo ao processo de desova. Muitas espécies de peixes da
região de clima tropical e subtropical, como é o caso do Brasil, respondem a
alterações graduais da luminosidade e temperatura (Figura 6). Usualmente os
processos reprodutivos são regulados pelos ritmos endógenos do organismo,
porém para o processo ter início é necessário o gatilho ambiental.

Figura 6 – O dourado (Salminus brasiliensis) é um dos principais peixes


migradores do Brasil

Crédito: Cesar Machado/Adobe Stock.

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Um dos principais fatores que estimulam o desenvolvimento das gônadas
ao longo do ano é o fotoperíodo no intervalo de 24 horas. A alteração da
luminosidade está relacionada à latitude onde os peixes são cultivados: quanto
mais próximo da linha do Equador, menor a diferença de luminosidade ao longo
do ano. A variação de hora-luz por dia é percebida pela retina tendo como
consequência a liberação de hormônios que atuam no desenvolvimento gonadal.
Posteriormente haverá o estímulo de células germinativas e a produção dos
gametas, caracterizando o início do processo reprodutivo (Figura 7). No período
noturno, temos a ação da melatonina, que de forma complementar participa do
processo de reprodução.

Figura 7 – Fluxograma do desenvolvimento gonadal dos peixes migradores

Machos:

Liberação de
Espermatogênese Espermiogênese
gametas

Fêmeas:

Maturação Maturação
Repouso inicial ou ciclo avançada ou
pré-vitelogênico
vitelogênese

Maturação final Ovulação Desova

Crédito: Rafael Dias Pinto.

Com a aproximação do verão, o aumento da temperatura da água e o


metabolismo dos peixes pode sofrer alterações. Para grande parte dos peixes
tropicais a mudança da temperatura resulta em elevação dos processos
fisiológicos. O período quente e chuvoso está relacionado com o processo final
de maturação gonadal dos peixes tropicais e subtropicais. As chuvas acabam
alterando a composição química dos corpos hídricos e tais alterações estimulam
o desenvolvimento final da maturação gonadal.

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Durante o processo de maturação, algumas características morfológicas
podem influenciar na atratividade sexual e escolha de parceiros pelos peixes.
Também é comum a presença de feromônios liberados diretamente na água pelos
animais.

2.2 Reprodução artificial

O desenvolvimento de técnicas de indução hormonal contribuiu para o


aumento da produção de peixes ao redor do globo. Em nosso país as primeiras
pesquisas sobre reprodução e indução hormonal foram realizadas na década de
1930 no Nordeste brasileiro, com a técnica de hipofisação que utiliza o extrato
bruto de hipófise para indução hormonal dos peixes (Figura 8). Essa técnica é
utilizada em laboratórios de reprodução ainda hoje, mas também é possível
realizar a indução por meio de hormônios sintéticos que são mais eficientes e
possuem custo elevado.

Figura 8 – Injeção para estimular a fertilização dos ovos de peixe

Crédito: Pav Shcherbakov/Adobe Stock.

Conhecendo os fatores exógenos no desenvolvimento gonadal e os


estímulos reprodutivos das espécies migradoras, é possível compreender como

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as condições de cultivo podem afetar a reprodução, afinal não existe a fase de
migração. Dessa maneira, os peixes atingem a um grau de desenvolvimento
reprodutivo limitado, sem concluir a fase de maturação final dos ovócitos. Além
da limitação do espaço de cultivo, a restrição na disponibilidade de alimento, a
quantidade de animais estocados e o estresse no manejo podem induzir a
reabsorção de ovócitos pelos peixes, inviabilizando todo o processo de desova.
Em fazendas onde se realiza a reprodução de peixes, a seleção dos
reprodutores é vital para o sucesso do processo de indução hormonal e desova.
São critérios de avaliação das fêmeas o formato de abdômen e a papila genital.
Já nos machos uma simples compressão abdominal proporcionará a extração de
sêmen. Em muitos casos, para se estimar a qualidade dos ovos, é realizada uma
biopsia ovariana por meio de canulação intraovariana, na qual uma pequena
quantidade de ovos é coletada e avaliada em microscópio ótico (Figura 9). Nesse
procedimento, os técnicos responsáveis pelo processo podem observar
coloração, textura e tamanho diferenciado dos ovócitos maduros.

Figura 9 – Ovócitos de peixe prontos para serem avaliados em laboratório

Crédito: Waraporn Kraitavin/Shutterstock.

É frequente a utilização de algumas práticas que permitem o êxito e maior


controle na reprodução induzida. No caso de indivíduos machos, devemos

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verificar o volume e as características do sêmen como o pH, a contagem e
motilidade de espermatozoides. Já para as fêmeas, o processo de canulação irá
avaliar tamanho, volume e homogeneidade dos ovócitos. A indução hormonal
realizada pela aplicação de hormônios é a técnica com maior eficácia para a
reprodução de peixes migradores tropicais mantidos em cativeiro.
Nas fêmeas, os hormônios devem ser capazes de promover a maturação
final dos gametas, porém o peixe deve se encontrar em um estágio de maturação
gonadal adequado para que responda à indução hormonal e ocorra a liberação
dos gametas. A indução irá garantir o rompimento do envelope folicular e
consequente liberação dos ovócitos maduros (desova). Em peixes machos, a
indução hormonal provoca um incremento no volume e fluidez de sêmen.
Inicialmente após o processo de coleta os espermatozoides encontram-se
inativos, quando em contato com a água eles são ativados aptos a fecundar os
ovócitos.
A hipófise é um produto comercializado por empresas especializadas, que
a retiram de peixes adultos sexualmente maduros (Figura 10).

Figura 10 – Hormônio de peixe para facilitar a reprodução de muitas espécies

Crédito: Nrien/Shutterstock.

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A hipófise é o local de acúmulo dos hormônios gonadotróficos em peixes
maduros. Após extraída, ela pode ser encontrada fresca, seca ou dessecada em
acetona. A praticidade de uso, o fácil manuseio e a disponibilidade no mercado a
tornam um produto de ampla utilização. Por outro lado, a variação na
concentração dos hormônios prejudica a padronização de dosagens em algumas
espécies. Outros hormônios também são utilizados atualmente na reprodução dos
peixes, porém o custo elevado desses produtos e a dificuldade da elaboração de
protocolos específicos para as diferentes espécies limita a sua utilização.
Para realizar o procedimento de indução hormonal, inicialmente é
necessário macerar completamente a hipófise e adicionar gotas de glicerina para
liquefazer a solução. Posteriormente poderá diluir o material em solução
fisiológica e realizar a aplicação com o uso de seringa e agulha. Devido à
complexidade da maturação final dos ovócitos, faz-se necessária a divisão da
dose hormonal a ser aplicada nas fêmeas. A 1ª dose indutora corresponde a 10%
da dose total e a 2ª dose final com os 90% restantes (Figura 11).

Figura 11 – Ovócitos de peixe disponíveis após a indução e extrusão

Crédito: Julie Clemenson /Shutterstock.

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O cálculo da dose hormonal a ser aplicada nos peixes é baseado na
espécie, peso do animal e o tipo de indutor utilizado. Após a aplicação da segunda
dose, deve-se iniciar a contagem das horas-grau, que é a soma da temperatura
da água nos tanques de maturação onde ficam alojados reprodutores.
Por meio desse cálculo é possível saber aproximadamente em quanto
tempo após a aplicação do agente indutor as fêmeas estarão aptas a desovar
(Tabela 1). O valor de horas-grau varia de acordo com cada espécie e entre
indivíduos da mesma espécie. Quando o valor estiver próximo ao de referência, a
qualidade dos ovócitos deve ser avaliada.

Tabela 1 – Valor de horas-grau ao longo de sete horas

A coleta dos ovócitos e do esperma deve ser realizada a seco, evitando-se


ao máximo qualquer contato com a água. Caso isso ocorra, os gametas serão
hidratados promovendo alterações na micrópila, estrutura de acesso à
fecundação.
Após o processo de extrusão e a ativação, o sêmen tem sua motilidade
diminuída com o tempo, e a capacidade de fecundação se torna reduzida. Os
gametas masculinos e femininos devem ser delicadamente misturados em um
recipiente adequado e posteriormente receber água para hidratação (Figura 12).

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Figura 12 – Reprodutor de peixes em coleta de sêmen

Crédito: Tanakornsar/Shutterstock.

Após a mistura dos gameta, hidratação e fecundação, os ovos formados


devem ser transferidos para as incubadoras, as quais são estruturas que
proporcionam condições controladas para o desenvolvimento das larvas, obtendo-
se melhores taxas de eclosão e sobrevivência. Entre os principais fatores que
podem levar ao insucesso da indução hormonal, estão a ausência de técnicas de
reprodução da espécie alvo, qualidade do extrato de hipófise, erros durante a
administração do hormônio ou na coleta dos gametas.

2.3 Hipofisectomia

Ao longo de todo o procedimento de hipofisectomia devemos atentar às


melhores práticas de bem-estar animal, evitando que os peixes sofram traumas
ou sofram. Os indivíduos devem ser insensibilizados com a utilização de gelo para
que então possam ser abatidos e terem a hipófise extraída. Para a extração
devemos efetuar um corte na região superior da cabeça do peixe, local onde a
hipófise fica localizada.

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Figura 13 – Localização da glândula pituitária nos peixes

Crédito: Smiles Ilustras.

Aproximadamente após 10 horas após a extração, as hipófises estarão


prontas para serem utilizadas na indução. São necessários em torno de 500
peixes doadores em fase de reprodução, usualmente carpa comum, para a
produção de uma gama de hipófise seca.

TEMA 3 – LARVICULTURA E ALEVINAGEM

Esse é o processo da criação de peixes que demanda de mão de obra


altamente capacitada e infraestrutura condizente com as espécies que desejam
ser reproduzidas. Existe também uma grande diferença na larvicultura e
alevinagem entre peixes marinhos e água doce, uma vez que nos ambientes de
água salgada a complexidade de relações e gatilhos ambientais é mais ampla.

3.1 Aspectos gerais

O período de incubação varia para cada espécie e em função da


temperatura da água de cultivo. Locais com temperaturas elevadas resultam
numa diminuição do tempo de eclosão e na aceleração no desenvolvimento das
larvas. Alguns cuidados com a qualidade da água de abastecimento das

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incubadoras são essenciais, principalmente para a manutenção dos níveis de
oxigênio dissolvido e das partículas em suspensão. O manejo das incubadoras
exige atenção do produtor, sobretudo com a necessidade de limpeza logo após a
eclosão das larvas. Esse procedimento é necessário devido à elevada quantidade
de sujeira provenientes dos ovos (Figura 14).

Figura 14 – Incubadora para ovos de peixes já fecundados

Crédito: Vladimir Mulder/Shutterstock.

As larvas recém-eclodidas possuem saco vitelínico, que garante a


sobrevivência enquanto ainda não são capazes de se alimentar. A formação do
sistema digestivo varia e usualmente não está completamente formado no
momento da eclosão da larva. O momento da primeira alimentação das larvas
requer grande atenção, pois determinadas espécies aceitam a ração inerte como
primeiro alimento; outras necessitam de alimento vivo e posterior treinamento para
aceitar ração.
A manutenção e alimentação das larvas na incubadora pode durar até 10
dias. Já a fase de alevinagem, é realizada em viveiros escavados, quando os
peixes ainda merecem uma atenção especial, em relação à quantidade de
refeições diárias e cuidados com possíveis predadores. O ciclo de vida entre ovos

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e peixe adulto está descrito na Figura 15.

Figura 15 – Ciclo de vida dos peixes de ovos a larvas, alevinos e peixes adultos

Crédito: Designua/Adobe Stock.

TEMA 4 – REPRODUÇÃO, LARVICULTURA E ALEVINAGEM DE TILAPIAS

Atualmente a tilápia é o peixe mais produzido no Brasil, estando presente


na maior parte dos estados brasileiros e tem uma reprodução mais simples
quando comparada a outras espécies de peixes cultivados. Vamos conhecer os
principais aspectos da biologia reprodutiva desta importante espécie.

4.1 Utilização de hapas

A tilápia é um peixe que apresenta estratégia de desova parcelada, sendo


possível a reprodução natural no ambiente de cultivo. Geralmente os animais

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podem ser acondicionados em dois sistemas para reprodução: hapas ou tanques
escavados (Figura 16).

Figura 16 – Utilização de hapas para manutenção de reprodutores de tilápias

Crédito: Tanakornsar/Shutterstock.

As hapas são fixadas dentro de viveiros escavados. Os peixes


permanecem nas hapas por 15 dias e ao final deste período, os reprodutores são
coletados (Figura 17). Após a captura, é verificado se as fêmeas estão com ovos
na boca. Caso estejam, os ovos são retirados e levados para incubadoras.

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Figura 17 – Ovos na boca da tilápia fêmea prontos para serem coletados

Crédito: TL23 Photo/Shutterstock.

4.2 Coleta e incubação de ovos

Ao longo do processo de reprodução da tilápia, pode ser realizada a coleta


de nuvens de larvas. Em comparação com a coleta de ovos diretamente da boca
da fêmea, há maior mortalidade das larvas por predação e menor eficiência no
processo de reversão sexual. Os ovos retirados da boca das fêmeas devem
permanecer nas incubadoras até a eclosão das larvas, que sairão das
incubadoras através do fluxo de água e se acumularão em bandejas (Figura 18).

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Figura 18 – Ovos de tilápia em incubação no sistema de bandejas

Crédito: O Partime Photo/Shutterstock.

Nas incubadoras, o fluxo de água deve ser regulado de forma constante,


com o intuito de simular o movimento natural da água que ocorre na boca da
fêmea. O estágio de maturação dos ovos pode ser observado por meio da sua
coloração. Os mais jovens possuem uma coloração amarelo-clara e os mais
próximos da eclosão são escuros.
Os ovos que chegam às incubadoras imaturos permanecem por períodos
de até a eclosão. Por sua vez, as larvas ainda permanecem estocadas nas
bandejas até que haja o consumo do saco vitelínico. Encerrada essa etapa, as
larvas seguem para o processo de reversão sexual.

4.3 Produção de alevinos revertidos

A tilápia possui algumas características zootécnicas distintas, como


maturação precoce e elevada capacidade reprodutiva, podendo conduzir o cultivo
a um quadro de superpopulação e baixo crescimento, fato prejudicial para os
sistemas de produção. Recentemente foram desenvolvidas técnicas para a

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obtenção de populações monossexo masculinas de tilápia, pois os machos da
espécie crescem mais rapidamente (Figura 19).

Figura 19 – Larvas de tilapia recém eclodidos em fase de reversão sexual

Crédito: O Partime Photo/Shutterstock

No Brasil, atualmente a adição de hormônios masculinizantes fornecidos


juntos à ração é o método mais utilizado para a formação de populações
monossexo. Muitos estudos têm sido realizados no intuito de conseguir
desenvolver comercialmente a produção de supermachos por meio de manejo
genético, sem a utilização de hormônios.
Para realizar o processo de reversão sexual, é necessário que as larvas
coletadas nas hapas ou tanques de alvenaria sejam classificadas por tamanho
para entrarem no processo de reversão sexual. Em larvas com tamanho superior
ao recomendado, a eficiência da reversão será menor. Quando o processo é bem
conduzido, as taxas de reversão podem alcançar de 97% de eficiência. No
processo de reversão sexual, deve-se utilizar ração em pó com mais de 40% de
proteína bruta acrescida de 40 a 60 mg do hormônio masculinizante 17-α-
metiltestosterona por kg de ração. Depois de feita a mistura, a ração deve ser
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colocada para secagem por um período de 24 horas. Após a reversão, os animais
podem ser comercializados para a recria.

TEMA 5 – TRANSPORTE DE LARVAS E ALEVINOS

O transporte de larvas e alevinos é um processo extremamente delicado,


sendo passível de grandes mortalidades, caso não seja feito de forma adequada.
Deve-se considerar: distância em relação ao destino final de entrega, tempo
médio de viagem, tamanho médio dos animais que serão estocados e dia e hora
de sua expedição.
O primeiro passo para realizar o transporte de larvas e alevinos consiste no
procedimento de depuração, onde a ração é suspensa 48h antes do momento da
captura para transporte. É recomendável que o manejo para transporte seja
realizado em horários do dia com temperaturas amenas (manhã).

Figura 20 – Caminhão para o transporte de peixes vivos

Crédito: Tonytao/Shutterstock.

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5.1 Cilindro de oxigênio

O sistema de oxigenação da água deve ser acionado e monitorado logo no


início do manejo de transporte. Os peixes só devem ser acondicionados a caixa
quando a concentração for superior a 5 mg/L. Durante os primeiros minutos após
o manejo, é comum a necessidade de se elevar a quantidade de oxigênio injetado,
pois os animais ficam inicialmente agitados, demandando maior quantidade de
oxigênio.
Existe a necessidade de se realizar um acompanhamento da concentração
de oxigênio em intervalos de 1 hora, evitando valores de oxigênio fora da
referência para espécie.

5.2 Sacos e caixas de transporte

O próximo passo é a escolha do sistema de transporte. A escolha


geralmente depende do tamanho das larvas e alevinos e da distância a ser
percorrida. Larvas e alevinos de peixes podem ser transportados de diferentes
formas.

5.2.1 Sacos plásticos

Embalagens com volume de 60 litros recebem 20 litros de água, onde


primeiramente os peixes são colocados para, receberem gás oxigênio puro até
completar o volume do saco (Figura 21).

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Figura 21 – Sacos de transporte para peixes

Crédito: Keung/Shutterstock.

5.2.2 Caixas de transporte

O equipamento deve ser abastecido com água limpa, similar a água


utilizada no ambiente natural do peixe para evitar problemas relacionados à
aclimatação.

5.3 Utilização de insensibilizadores

A última etapa do transporte de peixes consiste na finalização com o


procedimento de aclimatação dos animais no destino final. Muitos problemas com
mortalidade de larvas e alevinos estão mais relacionados à incorreta aclimatação
do que ao transporte em si.
Antes de retirar os animais da estrutura de transporte, é necessário que se
faça uma mistura gradual da água de transporte com a água da estrutura de cultivo
que receberá os animais. Essa mistura deve durar em torno de 30 minutos, com
a adição aos poucos da água da estrutura de cultivo no saco ou caixa de
transporte. Depois de aclimatados, os animais podem ser liberados em seu tanque
de destino (Figura 22). Entre os piscicultores é frequente a aplicação de

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substâncias para realização do transporte, sendo o sal de cozinha e o eugenol
as mais comuns.

Figura 22 – Passos para se aclimatar peixes

Crédito: Davi Souza.

FINALIZANDO

A reprodução de peixes é muito influenciada por fatores ambientais,


principalmente temperatura e luminosidade. Cada espécie possui um conjunto
de características reprodutivas que devem ser conhecidas, chamadas de pacote
tecnológico e que são fundamentais para o sucesso da reprodução.
Ao conhecermos aspectos da biologia básica como tipo de fecundação,
desenvolvimento embrionário e cuidado parental, o manejo de ovos e larvas é
facilitado. Ao longo do processo de extrusão e coleta de ovos e sêmen, deve-se
evitar ao máximo o contato com a água para garantir posteriormente altos níveis
de fertilização.

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REFERÊNCIAS

GODINHO, H. P. Estratégias reprodutivas de peixes aplicadas à aquicultura:


bases para o desenvolvimento de tecnologias de produção. Revista Brasileira de
Produção Animal, v. 31, n. 3, p. 351-360, 2007.

KUBITZA, F. Tilápia: tecnologia e planejamento na produção comercial. 2. ed.


Jundiaí: Fernando Kubitza. 2011..

WOYNAROVICH, E.; HORVÁTH, L. A propagação artificial de peixes de águas


tropicais. Brasília: FAO/CODEVASF/CNPQ, 1983.

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