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Fidel Joaquim Almeida Nota

Portefólio da Cadeira de Antropologia Cultural de Moçambique

Universidade pedagógica de Moçambique

Delegação de Manica

Curso de Licenciatura em Ensino de Electrónica com habilitações em manutenção de


Sistemas Electrónicos

Chimoio 2014
Fidel Joaquim Almeida Nota

Portefólio da Cadeira de Antropologia Cultural de Moçambique

Trabalho de investigação da cadeira de


Antropologia Cultural de Moçambique
Sob Orientação de dr. Cassene Fombe

Universidade pedagógica de Moçambique

Delegação de Manica

Curso de Licenciatura em Ensino de Electrónica com habilitações em manutenção de


Sistemas Electrónicos

Chimoio 2014
Índice
Cultura.........................................................................................................................................5
O que é cultura?...........................................................................................................................5
Pluralidade e diversidade de definições e abordagens..................................................................5
Características da cultura.............................................................................................................6
Dinamismo cultural......................................................................................................................7
Enculturação................................................................................................................................8
Desculturação...............................................................................................................................9
Interacção da Cultura com a Natureza , Sociedade e Civilização.................................................9
Etnicidade e identidade étnica....................................................................................................10
A Cultura Material.....................................................................................................................11
Linhas teóricas de organização do trabalho................................................................................12
Circulação- Riprocidade.............................................................................................................12
A reciprocidade..........................................................................................................................13
A redistribuição..........................................................................................................................14
Intercâmbio de mercado.............................................................................................................15
Modos de produção....................................................................................................................15
Quais as motivações para produzir, distribuir, trocar e consumir?.............................................16
Evolução dos sistemas alimentares em Moçambique (sul de Moçambique)..............................17
Parentesco e filiação...................................................................................................................17
Parentesco e consanguinidade....................................................................................................18
Parentesco e alianças matrimoniais............................................................................................19
Linhagem...................................................................................................................................20
A Família...................................................................................................................................21
Família e Parentesco..................................................................................................................23
Variável família patriarcal e família paulista..............................................................................24
Contexto Social..........................................................................................................................24
Autoridade..................................................................................................................................24
Unidade Doméstica....................................................................................................................24
Papel Social................................................................................................................................25
Modo de Reprodução.................................................................................................................25
A Análise da Prática: Valores de Família e suas Negociações num Órgão de Justiça................26
A Difusão dos “Direitos” e o Controle da “família”...................................................................26
Parentesco e filiação.................................................................................................................27
Parentesco e consanguinidade....................................................................................................27
Parentesco e alianças matrimoniais............................................................................................28
Descendência e filiação..............................................................................................................29
Tipos de filiação.........................................................................................................................30
A filiação indiferenciada............................................................................................................30
A filiação matrilinear (ou uterina)..............................................................................................30
Filiação patrilinear (ou Agnática)...............................................................................................30
Filiação bilinear (ou dupla filiação unilinear).............................................................................31
Consanguinidade........................................................................................................................31
Parentela.....................................................................................................................................32
A residência matrimonial...........................................................................................................33
1 Sistemas de atitudes................................................................................................................34
1.2 Impacto na organização social da sociedade........................................................................36
Impacto na organização política das sociedades.........................................................................36
Conclusão:..................................................................................................................................38
Bibliografia................................................................................................................................39
Introdução

No presente trabalho de investigação da Cadeira de Antropologia Cultural de


Moçambique farei o resumo de alguns tema que serão indispensáveis para a
aprendizagem e reflexão sobre os problemas do homem como ser sócio cultural.

Objectivos :Gerais

 Adquirir um conhecimento sócio-antropológico actualizado sobre


Moçambique;
 Analisar as principais áreas fundamentais de teorização da antropologia
no contexto moçambicano;
 Conhecer as linhas de força da realidade etnográfica de Moçambique e
da reflexão antropológica;
 Dominar as temáticas mais importantes da antropologia sobre
Moçambique.
Objectivos: Específicos

 Compreender a realidade social como um todo articulado;


 Conhecer processos e estruturas da construção social;
 Entender a pertinência do cultivo das relações mútuas entre a escola, família,
comunidade e sociedade;
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Cultura
Definir o que é cultura não é uma tarefa simples. A cultura evoca
interessesmultidisciplinares, sendo estudada em áreas como sociologia, antropologia,
história, comunicação, administração, economia, entre outras. Em cada uma dessas
áreas, é trabalhada a partir de distintos enfoques e usos. Tal realidade concerne ao
próprio carácter transversal da cultura, que perpassa diferentes campos da vida
quotidiana. Além disso, a palavra “cultura” também tem sido utilizada em diferentes
campos semânticos em substituição a outros termos como “mentalidade”, “espírito”,
“tradição” e “ideologia” (Cuche, 2002, p.203).

O que é cultura?
1. Cultura é uma construção social e histórica capaz de produzir umaidentidade
colectiva inscrita numa relação social com “o outro”, resultantede miscigenações
variadas;
2. Modos de vida que caracterizam umacolectividade;
3. Obras e práticas da arte, da actividade intelectual e do entretenimento;
4. Factor de desenvolvimento humano.

Em suma:
Cultura é um conjunto complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, lei,
costumes, e varias aptidões e hábitos adquiridos pelo homem como um membro de ma
sociedade. Inclui, pois todo o comportamento humano.

Pluralidade e diversidade de definições e abordagens


A temática da pluralidade cultural diz respeito ao conhecimento e á valorização das
características étnicas e culturais dos diferentes grupos sociais que convivem no
território nacional, às desigualdades socioeconómicas e a crítica às relações
discriminatórias e excludentes que permeiam a sociedade brasileira, oferecendo ao
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aluno a possibilidade de conhecer o Brasil como um país complexo, multifacetado


e algumas vezes paradoxal. (GONÇALVES, 2004, p.72)
.Elementos da cultura
Percebe-se então que existem vários elementos de cultura. As ideias que são os
conhecimentos, os saberes e as filosofias de vida. A crença que consiste em tudo aquilo
que se crê ou se acredita em comum. Os valores, ou seja, a ideologia e a moral que
determinam o que é bom e o que é ruim. As normas que englobam tanto as leis, os
códigos, como os costumes, aquilo que se fazem por tradição. As atitudes ou
comportamentos, isto é, maneiras de cultivar os relacionamentos com as pessoas do
mesmo grupo e com aquelas que pertencem a grupos diferentes. A abstracção do
comportamento, a qual consiste nos símbolos e nos compromissos colectivos. As
instituições que funcionam como uma espécie de controlo dos comportamentos,
indicando valores, normas e crenças. As técnicas ou artes e habilidades desenvolvidas
colectivamente

Características da cultura
Segundo texto de apoio a principal característica da cultura é chamada mecanismo
adaptativo: a capacidade de responder ou não de acordo com mudança de hábitos, mais
rápida do que uma possível evolução biológica. O homem não precisa, por exemplo,
desenvolver longa pelagem e grossas camadas de gordura sob a pele para viver em
ambientes mais frios.

Mecanismo cumulativo: As modificações trazidas por uma geração passam à geração


seguinte, de modo que a cultura transforma-se perdendo e incorporando aspectos mais
adequados à sobrevivência, reduzindo o esforço das novas gerações.
Nesta perspectiva e considerando a cultura como uma «realidade vitalmente humana»,
que modela o comportamento humano, ela apresenta certas características
fundamentais, que em resumo podemos destacar as seguintes:

A cultura é simbólica: toda realidade cultural pode ser considerada como um conjunto
de sistemas simbólicos, manifestados por meio de uma linguagem que é eminentemente
simbólica.
7

A cultura é social: a pessoa é formada pela cultura e o seu comportamento é pautado


pela cultura interiorizada, visto que a abertura do homem aos seus semelhantes
estabelece as relações sociais.

A cultura aprendida: este processo de enculturação é longo, podendo considerar-se


que dura toda a vida. As crianças aprendem a cultura através dos adultos e aprendem-se,
por exemplo, regras sociais e uma língua;

Acultura é partilhada; os indivíduos que vivem em conjunto numa sociedade


partilham cultura. As sociedades preservam a cultura tanto na forma de conhecimento
como nas descobertas científicas, nas obras de arte e nas tradições (feriados), etc.
A cultura é estável e dinâmica: a cultura é estável no sentido de conservação de seus
valores autênticos, que vão garantindo a identidade específica dum certo povo. Mas
também a cultura é, sobretudo, dinâmica no sentido da sua permanente vitalidade, que
se manifesta nos seus processos de evolução e de transformação, condicionados pelos
sinais dos tempos.

A cultura é universal e regional: a cultura é, antes de tudo, um fenómeno universal,


porque não há povos sem cultura, nem homens «incultos». Ela constitui um aspecto
comum a todas as sociedades. Por sua vez, a cultura é regional, entendida na sua forma
particular e contextual

Dinamismo cultural
A cultura pode ser dinâmica ou estável.
Ela é estável (identidade, tradição) enquanto se sublinha a tradição e a
institucionalização de padrões de comportamento. Tradição não significa repetição
(BOKA DI MPASI, 1986).
De acordo com (MARTINEZ, 2003;p.42), a cultura é dinâmica pois esta em constante
transformação, obedecendo os seguintes aspectos:
Lei da vida: a cultura munda, como um ser vivo (exemplo do corpo…); as mudanças
podem ser pequenas ou grandes, despercebidas ou violentas;
Mudanças despercebidas: a própria natureza de aprendizagem lhe determina uma
transformação lenta;
Mudanças violentas; encontros culturais; a mudança ocorre em razão de novas
necessidades provocadas pela situação.
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Enculturação
O processo cultural denominado pela Antropologia como endoculturação ou
enculturação é aquele por meio do qual os indivíduos aprendem o modo de vida da
sociedade na qual nascem, adquirem e internalizam um sistema de valores, normas,
símbolos, crenças e conhecimentos.
São, por assim dizer, condicionados a um padrão cultural. Endoculturação significa
interiorização, assimilação, apropriação, absorção, aprendizagem. É um processo social
que se inicia na infância mediado pela família, pelos amigos, posteriormente, a partir da
escola, da religião, do clube, do trabalho, do partido político e de tantos outros grupos
sociais.

A endoculturação acontece de forma sistemática, quando se dá através de mecanismos e


instituições que se utilizam de metodologias formais para a transmissão do
conhecimento e de forma assistemática, quando os indivíduos adquirem o conhecimento
a partir da experiência do quotidiano, sem que haja uma demarcação formal dos
ensinamentos.
Aculturação
A aculturação é o processo de troca e/ou fusão entre culturas. Através do contacto
prolongado ou permanente, duas ou mais culturas permutam entre si seus valores,
conhecimentos, normas, hábitos, costumes, símbolos, enfim, seus traços culturais. Nesse
processo, uma cultura se caracteriza como doadora e a outra como receptora, o que não
significa dizer que este seja um processo de via única, ou seja, quando em contacto,
todas as culturas podem sofrer mudanças, pois ocorre aí um processo de influxo
recíproco (ULLMANN, 1991).

a) Livre – Quando se dá de forma espontânea, pacificamente. Quando não há nenhum


tipo de dificuldade, confronto ou choque entre as culturas. Pode ocorrer através do que
chamamos de SINCRETISMO. No Brasil, o exemplo mais emblemático é o sincretismo
religioso: observa-se em nosso país uma religiosidade singular, pois a partir do contacto
de diversas matrizes culturais (nativos, africanos e europeus) temos a fusão de diversos
ritos e crenças. A Macumba, por exemplo, resulta da união de elementos do fetichismo
africano, do cristianismo, do espiritismo e também de rituais indígenas.
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b) Forçada – Quando é imposta por coerção, não há opção de escolha por parte da
sociedade que tem sua cultura suplantada. Podemos pensar em fatos do passado, como a
imposição do baptismo cristão aos índios na época da chegada do europeu ao Brasil.
Mas, hoje em dia, também temos exemplos de aculturação mediante violência:
c) Planejada – Quando a aculturação é previamente pensada, meticulosamente
elaborada com objectivos específicos a serem atingidos. Quando se planeja uma nova
função ou modificação na própria cultura ou em outra cultura. Um bom exemplo seria
as políticas públicas que visam promover transformações no modo de vida das pessoas.

Desculturação
Desculturacão é o processo da perda da identidade cultural de indivíduos ou grupos
sociais como resultado da degradação do tecido social em que a transmissão dos valores
morais e socioculturais fica afectada como consequência de factores tais como a
globalização e o urbanismo crescente.
Quando há uma mistura de culturas resultando na perda da originalidade da sua própria
cultura

Interacção da Cultura com a Natureza , Sociedade e Civilização


Natureza e cultura, apesar de serem conceitos diferenciados, comunicam-se sem
oposições. Nesse sentido, ao refutarmos os conceitos de cultura que a colocam em
oposição à natureza, compreendemos que a cultura é o “produto de emergências de
complexidades oriundas da natureza, não se distingue dessa última senão pela
singularidade, sempre eventual, de uma comunicação Hipe complexa e aberta,
consciente ou inconsciente. [...] É sobretudo.

A cultura é constituída pelo conjunto de textos produzidos pelo homem, não apenas
construções da linguagem verbal, mas também mitos, rituais, gestos, ritmos, jogos, entre
outros. Os textos da cultura são considerados, também, sistemas comunicativos que
obedecem às regras e normas preconizadas pela cultura vigente. O que não impede
culturas diferentes de se comunicarem. “A cultura é os macros sistema comunicativo
que perpassa todas as manifestações e como tal deve ser compreendido para que se
possam compreender assim as manifestações culturais individualizadas. A comunicação
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entre as diversas culturas permite que as criações do homem, como a música, o cinema,
as danças, os jogos e os brinquedos, atravessem fronteiras.

possuem normas específicas e independentes, mas que podem se alastrarem pelas


diversas sociedades, permitindo as trocas culturais.

 A passagem da ordem da natureza à cultura e a crítica à hierarquização cultural.


Ao recusar a ideia de que os homens tenham vivido somente em estado de
natureza, Lévi-Strauss (1976) compreende que até mesmo o homem de
Neandertal não pode ter sido caracterizado como vivendo em estado de natureza,
por já possuir cultura. Entretanto, para ele, não existem possibilidades de saber
em que momento os fatos naturais se transformam em culturais, mas somente
como eles.

Etnicidade e identidade étnica


Os conceitos de grupo étnico, identidade étnica e etnicidade têm uma complexa
trajetória teórica nas Ciências Sociais. As dificuldades podem ser constatadas nas
muitas coletâneas, em textos e estudos de caso publicados desde a década de 1970. A
unidade concreta de análise do grupo étnico tem sido definida por diferentes
combinações de características que vão da cultura comum à identidade étnica.

A etimologia do termo etnia situa-se na expressão grega ethnós, que significa povo.
Quanto ao termo étnico, procede do latim éthnicus. A partir do século XIX, o termo
passou a ser associado à terminologia raça como forma de distinguir as diferentes
populações humanas. Vários estudiosos propuseram, inclusive, a substituição do termo
raça pelo de etnia, embora essa proposição não tenha alterado as concepções
hierarquizados já consagradas pelo conceito de raça na distinção dos grupos humanos.
Essa perspectiva ajuda a formular uma possível

Segundo Frederich Barth (1998) afirma que os indivíduos têm de estar conscientes de
sua identidade étnica e com uma atuação dinâmica a seu favor. Isso significa que cada
indivíduo, dentro de um determinado contexto histórico e geográfico, contribui para a
etnicidade de seu grupo, servindo como ator da trama cultural. Nem sempre as pessoas
de um grupo participam da formação de sua identidade étnica conscientemente. Muito
do que aprendem a respeito de sua identidade étnica é inconsciente e faz parte de sua
educação desde seu nascimento.
11

A etnicidade é uma entidade relacional, pois está sempre em construção, de um modo


predominantemente contrastivo, o que significa que é construída no contexto de
relações e conflitos intergrupais. A forma contrastiva que caracteriza a natureza do
grupo étnico resulta de um processo de confronto e diferenciação. Tudo isso acentua a
natureza dinâmica da identidade étnica que se constrói no jogo de confrontos,
oposições, resistências, como também, e sobretudo, no jogo da dominação e submissão.
Barth também ressalta que o caráter contraditório da relação entre grupos étnicos
aparece mais claramente quando se trata de minorias em suas relações de sujeição para
com as sociedades que as envolvem.

Sendo assim, identidade étnica implica cultura. Cultura faz parte da identidade étnica de
um grupo, e tal identidade transcende os aspectos culturais deste, porque é influenciado
Culturalização entre estes dois conceitos, utilizando os processos históricos distintos
que os forjaram.

Nessa perspectiva, a concepção de cultura é entendida nas suas dimensões antropológica


e sociológica, não restrita aos aspectos puramente étnico/raciais, mas articulada a outras
categorias como nação, classe, gênero, religiosidade.

A ideia de etnia deve ser introduzida em contextos sociais, políticos e econômicos, a fim
de situar e entender os fenômenos étnicos contemporâneos, tornando expressões como
movimentos étnicos, grupos étnicos, guerra entre etnias, etnia cigana, negra, afro-
americana, indígena, correntes em nosso cotidiano

A Cultura Material
A cultura material em Arqueologia, denomina-se de um conjunto de objectos - tecidos,
utensílios, ferramentas, adornos, meios de transporte, moradias, armas etc., que formam
o ambiente concreto de determinada sociedade.
Falar de CULTURA MATERIAL está relacionado com a finalidade que os objectos têm
para um povo numa cultura.
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Linhas teóricas de organização do trabalho


A literatura existente apresenta três linhas teóricas básicas a respeito de organização do
trabalho industrial, a saber:
a) Racionalização da tarefa do cargo;
b) Enriquecimento de cargos;
c) Grupos semi-autônomos.
Em fins do século passado e início deste, Taylor propôs o método da administração
científica, ou determinação científica da tarefa, em substituição "às regras pessoais
empíricas que vigoravam no processo", como a forma mais adequada para acabar com a
"vadiagem no trabalho" e aumentar a produtividade no setor de produção.
A racionalização da tarefa e do cargo baseia-se nas seguintes premissas:
a) "Existe uma maneira ótima de se desempenhar uma tarefa; para estabelecê-la, deve-se
examinar a realidade de forma científica." Para tornar operacional esta colocação, foi
desenvolvido um conjunto de técnicas, hoje consolidado no chamado estudo de tempos
e movimentos. A aplicação dessas técnicas implica, contudo, uma segunda premissa,
que é a seguinte:
b) "É necessário separar o planejamento da execução da tarefa." Isto porque, de acordo
com a concepção taylorista, "o operário, ainda o mais competente, é incapaz de
compreender esta ciência" .
Porém, na medida em que os elementos que planejam o trabalho não são aqueles que o
executam, e também que tal planejamento resulta numa maneira ótima de executar a
tarefa:

Circulação- Riprocidade

A antropologia económica é uma subdisciplina da antropologia sociocultural que estuda


os sistemas de produção, distribuição e consumo dos diferentes grupos humanos. A
economia faz parte da cultura no sentido em que o fim da cultura é a sobrevivência, a
reprodução e a continuidade dos grupos humanos. A economia pode entender-se
integrada em processos socioculturais, pois a produção realiza-se em famílias,
comunidades e sociedades. As relações sociais funcionam como relações económicas e
laborais (Godelier, 1974). Além mais, a distribuição, o intercâmbio e o consumo têm
funções e sentidos sociais e políticos.
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Diferentes culturas valorizam diferentes bens e serviços, algumas salientam a


cooperação económica e outras a concorrência. Umas culturas sublinham o consumo
como meio de aumentar o estatuto social, outras a generosidade e a doação de bens
como meio para adquirir prestígio.

De acordo com Karl Polanyi (1994), o intercâmbio é fundamental em economia. O


intercâmbio é a prática de dar e receber objectos e serviços com algum valor. Os
modelos de intercâmbio variam de cultura para cultura, e podem ser de vários tipos:
reciprocidade, redistribuição e mercado. As culturas humanas valorizam mais um tipo
de intercâmbio do que outro, ou na mesma cultura podem coexistir vários tipos de
forma articulada. Segundo Polanyi (1994) estes tipos de intercâmbio devem ser
pensados como actos sociais pautados culturalmente. São estes três tipos de
intercâmbio, modelos e não tipos de economia, pois em cada economia concreta pode
haver elementos dos três. A diferença do que afirmava Adam Smith na sua obra “A
riqueza das nações”, de que a troca tem a sua origem na tendência psicológica e
psíquica inata para intercambiar, Karl Polanyi (1994) afirma que a troca nasce das
instituições sociais.

A reciprocidade

As formas de intercâmbio recíproco acontecem em todas as culturas. Por exemplo, as


esposas não são pagas pelos seus esposos por estas lhes preparar o jantar. Outro
exemplo é o das “prendas” que damos a alguém. A expectativa neste tipo de
intercâmbio é o da correspondência e o retorno. Não é bem uma relação de altruísmo
puro. Sim que é uma relação semelhante às obrigações de parentesco e tem intensos
significados sentimentais, pessoais, mas também modelados pela cultura.

Este é só um tipo de intercâmbio, e pode haver outros tipos de intercâmbio dentro da


mesma cultura e protagonizado pelas mesmas pessoas. A reciprocidade é uma maneira
de controlar a sobre exploração da natureza, e também a desigualdade sócio -
económica.

O princípio de reciprocidade é: Trocar entre pessoas socialmente iguais, com vínculos


entre si, em sociedades ou grupos igualitários. A simetria social é muito importante
neste tipo de intercâmbio, mas também saber dar, receber e retribuir. Num sentido levi-
estrusiano a reciprocidade pode ser de dois tipos: restrita e generalizada. A primeira
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reduz o leque de trocadores e a segunda é uma reciprocidade geral praticada com um


leque de actores sociais mais alargado. .

A redistribuição

Esta forma de intercâmbio está geralmente associada a formas sociais assimétricas com
exercício de políticas coercitivas. Consiste em acumular produtos em um lugar central,
para logo ser distribuídos a produtores e não produtores. Os redistribuidores ganham
prestígio aos olhos dos redistribuídos.

Existe uma forma estrema de intercâmbio recíproco em sociedades igualitárias de


redistribuição não estratificada. Segundo este tipo de intercâmbio, o redistribuidor
trabalha mais que os outros, e fica com a porção mais pequena ou com nenhuma,
recebendo assim admiração por isso.

Exemplos etnográficos:

1. Os “semais” (Malásia central) (Dentan: 1968)

Nenhum deles diz “obrigado!” quando recebe a carne de outro caçador. O animal
caçado é distribuído em porções para todo o grupo. Dizer “obrigado” ou expressar
agradecimento implica: que es pouco generoso porque calculas quanto das e recebes, ser
rude e bronco, que não esperavas que os outros fossem tão generosos, que pensas
reparar o doado por obrigação.

2. O “potlach” (Tribus kwakiutl do Noroeste dos EUA e Canadá)

São festas de redistribuição entre as tribos com melhores e piores colheitas cada ano.
Aqui existe a obrigação da paridade, isto é, dar e receber devem ser proporcionais. Esta
obrigação é denominada “dádiva” por Marcel Mauss no seu “Ensaio sobre a dádiva”
(1923-24). A actividade económica movimenta assim uma série de actividades
socioculturais como são os rituais colectivos.

O “potlatch” era um ritual que se praticava na costa norte do Pacífico dos EUA, pelas
tribos “alingit” e “salish”, e pelos “kwakiutl” de Washington e a Columbia Britânica.
Era praticado em memória de uma pessoa falecida, para reconhecer o estatuto de um
membro da família ou para celebrar a criação de um “totem”. Nele encarnava-se a
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posição social dos seus participantes. Em 1885 foi proibido pelo governo canadiano e
legalizado de novo em 1950.

Intercâmbio de mercado

“O capital é a base do capitalismo, não da economia” (Bohannan e Bohannan, 1968:


118)

O mercado é para os antropólogos um lugar, um campo de interesses de uma


mercadoria ou serviço, e também a utilização de recursos com maximização do lucro,
sem outros fins sociais (Firth, 1967: 5).

E o mercado também é um tipo de intercâmbio no qual domina o dinheiro como valor


dos produtos do intercâmbio. Os preços dominam todas as formas de mercado. Os
preços dos bens e dos serviços são determinados por compradores e vendedores, mas
também pela Política Económica. Depois do pagamento não há quase obrigações entre
comprador e vendedor. O local de mercado, além de para intercambiar bens, também
pode servir como ponto de intercâmbio de informação, espaço de lazer e consumo.

O Princípio de mercado (economia capitalista mundial) é: máximo benefício, lei da


oferta e a procura – quanta mais escasseza mais cara e mais desejada é uma coisa-. Há
uma escolha de preços ou negociação entre comprador e vendedor e não é obrigatório o
encontro entre os dois.

Modos de produção

A economia é um sistema de produção, distribuição e consumo de recursos. Para a


antropologia, a economia é uma forma de cultura com perspectiva comparada.

Modo de produção: É a forma de organizar a produção, que depende dos factores de


produção (terra, trabalho, tecnologia e capital) e das relações sociais de produção,
através das quais desprega-se o trabalho para arrancar energia à natureza. Na
actualidade o factor de produção “tecnologia” está assente na importância da
informação e as suas tecnologias.

 Modo de produção capitalista: o dinheiro compra a força de trabalho.


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 Modo de produção pré-capitalista: baseado nas relações de parentesco, nas


obrigações familiares, na ajuda mútua na produção.

Universal da cultura: divisão sexual, de género e de idade no trabalho.

Meios ou factores de produção: terra, trabalho, tecnologia e capital. Há normas


culturais de aceso a eles, como por exemplo o parentesco ou o matrimónio. Exemplo de
Botswana: as mulheres “kung san” dividem áreas específicas de “baias” (árvores
frugais), e quando mudam de bando adquirem outra área para elas à qual têm todo o
direito.

Economia artesiana: as pessoas vêm o seu trabalho do princípio ao fim, identificam-se


com o seu produto e não se alienam.

Quais as motivações para produzir, distribuir, trocar e consumir?

-Capitalismo ocidental: maximizar os benefícios (racionalismo capitalista).

-Outros modos de produção: maximizar a riqueza, o prestígio, o prazer, o bem estar ou a


harmonia social.

Distribuição e trocas: Para os evolucionistas existiria uma evolução gradual e igual em


todas as culturas: caça → pastorícia → agricultura → indústria. Mas em realidade
coexistem hoje formas capitalistas com pré-capitalistas, ainda que o capitalismo seja
dominante. Coexistem formas de intercâmbio recíproco e redistributivo com formas de
intercâmbio próprias do mercado.

Reprodução social: Processo de reiteração das relações entre as classes sociais, algo
necessário para a continuidade do modo de produção (Willis, 2003).

Culturas do trabalho: “Conjunto de conhecimentos teórico-práticos, comportamentos,


percepções, atitudes e valores que os indivíduos adquirem e construem a partir da sua
inserção nos processos de trabalho e/ou da interiorização da ideologia sobre o trabalho,
todo o que modula a sua interacção social mais além da sua prática de trabalho concreta
e orienta a sua específica visão do mundo como membros de um colectivo determinado”
(Palenzuela, 1996: 13).
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Evolução dos sistemas alimentares em Moçambique (sul de Moçambique)


O sul de Moçambique, com uma população total de cerca de 4 milhões de habitantes,
distribuída em três províncias (Maputo, Gaza e Inhambane), é uma região onde as
pessoas têm mais ou menos os mesmos hábitos alimentares. Esta similaridade está
provavelmente ligada ao facto de que antes da fixação portuguesa em Moçambique,
durante o século XV, nesta região formou-se o segundo maior império da África, o
Império de Gaza. Este império foi constituído pelos Ngonis (um grupo populacional
Bantu do sul da África), que, como resultado de um conflito civil, foram empurrados
para aquela região. Os Ngonis, que eram guerreiros, ocuparam aquela região por volta
de 1820, dominando, para isso, os povos que ali estavam instalados (os Tsongas,
Mandaus, e Bitongas). A principal actividade económica dos Bantus era a agricultura de
sequeiro e a criação de animais voltados para a subsistência. No âmbito das diversas
estratégias de sobrevivência, que constituem os modos de vida da população, o uso dos
recursos naturais não estava apenas limitado ao cultivo da terra, mas incluía também a
caça e a colecta de produtos florestais e de plantas medicinais, entre outras actividades.
As principais culturas ligadas à alimentação Bantu incluíam os cereais (milho, sorgo,
arroz); as leguminosas (diversos tipos de feijões e amendoim); a batata-doce, o nhame, a
mandioca e uma variedade de vegetais (hortaliças). No entanto, desde a chegada dos
portugueses, no século XV, o País vem sofrendo profundas transformações políticas,
económicas e sociais, que afectam os sistemas alimentares.

o caso de Lourenço Marques (nome com que era conhecida a capital de Moçambique,
Maputo, durante o período colonial).

Parentesco e filiação
Dois indivíduos são parentes se um descende do outro (laços de filiação directa) ou se
ambos descendem ou afirmam descender dum (ou duma) antepassado(a) comum. Neste
caso, o parentesco entre os dois indivíduos quer seja real (quer dizer, que o laço social
que se estabelece assenta num laço biológico de consanguinidade) ou fictício (dizem-se
parentes, consideram-se e comportam-se como tal mesmo se, de facto, nenhum laço de
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consanguinidade existe entre um e outro) é determinado pelo facto de provirem ou


afirmarem provir -- de uma mesma filiação.Assim sendo, esta pode ser real ou mais ou
menos fictícia.Finalmente, a filiação, a um certo nível pode ser mítica e existir apenas
na consciência dos homens,mas isso é o essencial, na medida em que determina e
exprime um certo tipo de comportamento efectivo: por exemplo, entre todos aqueles
que de perto ou de longe afirmam compartilhar a mesma filiação existem formas de
solidariedade (entreajuda, cooperação ritual, etc.), mais ou menos institucionalizadas,
que constituem outros tantos factos sociais, observáveis por quem está de fora e que são
testemunho da realidade objectiva de um conjunto composto de indivíduos e de grupos
que podem não ser biologicamente aparentados, mas que nem por isso deixam de
constituir uma sociedade estruturada com base no modelo e expressa na linguagem do
parentesco.

Parentesco e consanguinidade
O parentesco é, pois, uma relação social; nunca coincide completamente com a
consanguinidade, quer dizer, com o parentesco biológico. Se o parentesco fosse
considerado no seu sentido biológico, cada indivíduo teria, efectivamente, um número
muito elevado de parentes no fundo, e desde que se rebuscasse suficientemente longe,
todos os membros de uma dada sociedade (sobretudo quando pequenas) seriam, pois,
parentes. Assim diluído, indiferenciado e generalizado, o parentesco não poderia ser
uma base de classificação dos indivíduos no seio de grupos de parentesco diferentes e
até opostos e, consequentemente, não poderia ser um princípio de organização social.
Para que o parentesco possa ser um princípio lógico de classificação é necessário que
nem todos os consanguíneos sejam reconhecidos como tal; que certas categorias destes
sejam excluídas do parentesco:quer porque se considere apenas uma linha de
ascendência com exclusão das outras (filiação unilinear em linha paterna ou materna)
quer porque se considerem as duas linhas, mas atribuindo-lhes funções distintas (dupla
filiação unilinear) quer enfim, porque se reconhece ao mesmo tempo o parentesco do
lado paterno e do lado materno (filiação indiferenciada ou bilateral ou, então,
cognática),tratando-os de modo idêntico..., mas neste caso, o parentesco já não tem uma
função claramente distintiva o os grupos sociais já não se distinguem em função de uma
filiação específica mas em função de outros critérios que não os do parentesco:
comunidade de residência, de posse de terra ou de funcionamento socioeconómico, por
exemplo.Convém notar, no entanto, que não existe filiação unilinear pura: todas as
19

sociedades admitem em certo modo o parentesco nas duas linhas; mas, em regime de
filiação unilinear, a tónica é posta numa das duas linhas, de modo que, neste aspecto, a
extensão do parentesco é muito mais importante: há um maior número de parentes que
são conhecidos como tal, porque o parentesco transmite-se de geração em geração, ao
passo que do outro lado vai caindo no esquecimento.O parentesco do lado não
predominante influi, além disso, no estatuto dos indivíduos (herança de bens,
transmissão de funções, ou ainda, valorização ou desvalorização do estatuto dos filhos,
em função do estatuto do cônjuge que não transmite o parentesco).Alguns autores
preferem, nestas condições, falar de sociedade "com predominância patrilinear" ou de
sociedades "com predominância matrilinear".

Parentesco e alianças matrimoniais


Enquanto os anglo-saxões distinguem os parentes por filiação dos parentes por
casamento ou por alianças matrimoniais; os franceses pelo contrário utilizam
unicamente o termo "parentes", não esclarecendo de qual das duas categorias se trata. É
de facto evidente que não se pode separar a filiação das alianças matrimoniais. Cl. Lévi-
Strauss, especialmente demonstrou que o parentesco constitui um sistema organizado
em redor duma "estrutura mínima" ou "átomo de parentesco", de que as alianças
matrimoniais são, do mesmo modo que a filiação um dado imediato. Com efeito todas
as sociedades conhecem a proibição do incesto. Esta proibição não é mais do que o
inverso negativo duma exigência positiva, duma prescrição universal: é preciso procurar
mulheres fora do grupo dos parentes.Como frisa Lévi-Strauss a proibição do incesto
"significa que, na sociedade humana, um homem não pode obter uma mulher senão
doutro homem que lhe cede uma filha ou uma irmã"O parentesco por alianças
matrimoniais é, portanto, um elemento exterior que se enxerta no parentesco
propriamente dito. É parte integrante do que se chama geralmente sistema de parentesco
ou, se se quiser recorrer à perspectiva estrutural delineada por Cl. Lévi-Strauss, "sistema
de parentesco-alianças", entendendo-se que sempre que se fala de "parentesco" em
geral, se incluem quer as relações de filiação (relativas a um ascendente comum) quer as
relações de alianças matrimoniais (geradas pela necessidade de casamento fora do grupo
de filiação).Por outras palavras, um grupo de filiação não pode existir e perpetuar-se a
menos que entre em alianças matrimoniais com outros grupos de filiação que lhe
forneçam as (as esposas). Neste sentido, o parentesco, na acepção escrita do termo
(laços de filiação), é função do parentesco por alianças matrimoniais.
20

Linhagem
Grupo de filiação unilinear em que todos os membros se consideram como
descendentes, quer em linha agnática (patrilinhagem) quer em linha uterina
(matrilinhagem),dum(a) antepassado(a) comum conhecido(a) e nomeado(a), e são, em
princípio, capazes de descrever as ligações genealógicas que os ligam uns aos outros de
forma a remontar ao antepassado por uma linha genealógica ininterrupta (mencionando
todos os graus intermédios).O termo linhagem pode ser considerado como um conceito
genérico: conforme as sociedades, ou mesmo no seio de uma dada sociedade, grupos de
extensão ou de funcionamento diferente podem ser considerados como linhagens.
Porque todos têm em comum o facto de se comporem de indivíduos ou de subgrupos
relacionados com um antepassado conhecido e nomeado (que pode ainda ser definido
como antepassado histórico por oposição ao antepassado mítico e legendário do clã).

Linhagem e organização de linhagem:pode-se contrapor as "linhagens concretas",


directamente observáveis no terreno, às "linhagens mais vastas, que não podem ser
directamente observáveis por não constituírem formas concretas de grupo" mas que
"podem voltar a ter significado e vida em determinadas situações" distingue deste
modo, quatro tipos de linhagens: a máxima, a maior, a menor e a mínima, sendo só esta
última uma forma concreta de agrupamento ou de grupo solidário permanente.Mas,
quando duas ou mais linhagens mínimas cooperam, deixam de se referir ao seu
antepassado particular (em função do qual se opõem umas às outras, ou pelo menos
estabelecem a sua independência e especificidade) mas remontam ao antepassado mais
afastado, que lhes é comum, constituindo-se, assim, por um certo tempo, numa
linhagem menor a mesma maneira, a um nível superior desta organização piramidal,
duas ou mais linhagens menores podem fundir-se numa linhagem maior,quando
resolvem cooperar entre si e/ou opor-se a uma outra linhagem maior

Linhagem e segmentação:tratando-se de um "triângulo cujo antepassado é o vértice e


em que a base aumenta em cada geração, a linhagem não pode ser um grupo
permanente. Crescendo continuamente o número de descendentes, chega um momento
em que a linhagem deve cindir-se" uma parte da linhagem constitui-se em unidade
autónoma, que prefere, daí em diante, referir-se a um ascendente mais próximo que o
antepassado original comum, um ascendente que, portanto,lhe é exclusivo. Este
21

segmento destacado da linhagem original pode por sua vez, tornar-se ao fim de algumas
gerações, numa nova linhagem verdadeiramente autónoma.

Linhagem e grupo solidário de filiação: Para que uma linhagem possa ser considerada
como uma unidade social concreta,é não só necessário que seja um grupo de filiação
unilinear de genealogia contínua mas também “que possua uma estrutura de autoridade,
que constitua, face aos seus vizinhos, uma unidade indivisa,e que tenha um certo
número de actividades políticas, económicas ou rituais, levadas a cabo em comum por
todos os membros do grupo ou em seu nome por todos os seus representantes".

Linhagem e exogamia: A linhagem é uma unidade estritamente exogâmica, pelo menos


quando corresponde a um grupo orgânico e salvo as devidas excepções; todas as
mulheres provenientes da linhagem são consideradas como "irmãs", com as quais são,
portanto, formalmente proibidas as relações sexuais e o casamento.A linhagem, pois,
faz frequentemente parte duma unidade exogâmica mais extensa. Mas é geralmente, a
este nível que se decidem os casamentos e se pratica a política das alianças
matrimoniais.

A Família
A família é uma instituição central da vida moderna. A família está em tudo e em todo o
lugar: há o direito de família, a educação familiar, o planeamento familiar, a Pastoral
familiar, a terapia familiar, a agricultura familiar, a medicina de família.Existem
profissionais para descobrir a nossa genealogia familiar que são capazes de descobrir
nossas mais longínquas filiações familiares, há testes modernos para descobrir a nossa
verdadeira família através do estudo de nossos genes, uma vasta literatura sobre família
e revistas e livros de auto-ajuda com importantes conselhos de como “viver em família”
e ter uma vida familiar saudável e perfeita. Há também núcleos de estudo sobre família,
programas assistenciais estatais para auxílio da família (como por exemplo, a bolsa
família), além de uma imensa produção de imagens sobre o assunto na literatura,
cinema e televisão: quem não lembra da família profanada, retratada por Nelson
Rodrigues? Ou do sucesso da sagrada família do seriado a “Grande Família”, que em
2005 fez 33 anos de existência na Rede Globo? Eu gostaria de reter esse título - “A
grande família” - para falar desse fenómeno da centralidade que a família assume na
vida moderna. Efetivamente, existe uma “grande família” – mas aqui não me refiro ao
22

seu tamanho, mas a dimensão de grandeza e importância que a família passa a ter na
vida de todos nos. Temida ou amada, sacralizada ou profanada, a família e celebrada a
ponto de que parece ser, a um só tempo, a causa e a solução de praticamente todos os
nossos problemas.Mas o que e família? Que família e essa que todos falamos, tratamos,
pensamos,idolatramos, profanamos ou celebramos? Existe “uma” família? Ou são
vários tipos de família? E possível falar em família no singular? Para tentar abarcar
essas questões, vou abordar alguns aspectos da perspectiva antropológica sobre família
e parentesco, também tendo como subsídios algumas situações encontradas durante o
período de minha pesquisa de doutorado, a respeito do processo de mudanças legais
introduzidas com a promulgação Doutora em Antropologia Social. Pesquisadora
associada ao Núcleo de Antropologia e Cidadania da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (NACI/UFRGS) e professora da UNIFRA (Santa Maria).Do Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA), no que se refere especificamente as politicas socio-
educativas. Através dessa pesquisa, pude interagir com alguns mecanismos
institucionais dos órgãos de justiça, assim como presenciar as relações entre agentes
jurídico-estatais e juízes, defensores e promotores públicos, técnicos de
atendimento,funcionarios administrativos – e os adolescentes e seus familiares ou
responsáveis. O que me interessa problematizar nesse encontro, para uma plateia tao em
contacto com a questão do adolescente infractor, diz respeito a qual o modelo de família
que informa – mesmo que implicitamente - nossas acções em relação a essas pessoas e
como esse modelo interage e tem sentido para as pessoas que estamos trabalhando. O
meu intuito e trazer ao debate a diversidade dos modos de ser e estar em família,
ampliando nossa visão para alem do "ideal" que geralmente orienta nossas acções. As
questões que desejo introduzir para nossas reflexões são: ate que pontos estão
assumindo como regra e norma o nosso próprio modelo familiar ou um modelo "ideal",
com pouco significado para as pessoas com quem estamos interagindo? Ate que ponto a
fixação no "ideal" ou "modelo hegemónico" não acaba limitando as nossas próprias
alternativas de intervenção, no trabalho com os adolescentes e suas famílias? Sem
duvida, ao colocar essas questões não estou sugerindo que tudo e valido, bom e deve ser
corroborado - o que significaria um relativismo radical e ingénuo frente aos problemas e
questões que são parte do cotidiano do trabalho com os jovens e suas famílias
23

Família e Parentesco
E é justamente uma atenção para a prática da vida social que tem caracterizado a
antropologia enquanto uma disciplina. A antropologia nasceu no berço do humanismo
iluminista do seculo XIX e tem se caracterizado pelo objectivo de reflectir a respeito de
diferentes modos de vida, de práticas sociais e de concepção de mundo. Fazemos isso
através do método etnográfico, que brevemente pode ser descrito como a produção de
conhecimento sobre as culturas humanas e a vida social através da descrição e
interpretação de praticas, valores e saberes de populações situadas local e
temporalmente. Diferentemente da maior parte das ciências, a antropologia não parte da
experiencia ocidental como o centro e a norma, mas busca entender cada contexto
estudado dentro de um mais amplo escopo de experiencias e formações sociais da
historia humana (Spencer e Barnard, 2002).Especificamente na questão da família, a
antropologia - como um saber comparativo e contextualizado - visa contribuir no debate
através da problematização de sua diversidade, estudando suas práticas, valores e
sentidos em contextos determinados, sem perder de vista que a família e também uma
categoria histórica, socialmente articulada e envolvida em lutas por definição de seus
significados legítimos.Esta posição tem alguns sentidos que eu gostaria de sublinhar:

a) Que a família e um produto social, não e um dado natural ou universal e não pode ser
pensada no singular, pois há uma pluralidade de modos de família;
b) Enquanto uma categoria social, a família articula e fundamenta um conjunto de
discursos na intersecção entre poder e de saber que fundamentam acções e projectos
com sentidos específicos e dirigidos para grupos diversos da população;
c) Um modo interessante de pensar a família e: de um lado, inseri-la como uma
categoria social formada em contextos sociais, políticos e económicos específicos que
contextualizam um conjunto de discursos hegemónicos sobre a família e, de outro lado,
também levar em conta os sentidos elaborados pelos próprios agentes das práticas de
família diversas, não completamente abarcados pelo modelo hegemónico. Para a
antropologia o que e produtivo e justamente descobrir como as noções de “família” são
construídas na prática, suas consequências e significados particulares em contextos
específicos.
24

Variável família patriarcal e família paulista

Contexto Social
Estrutura económica de base agraria, latifundiária e escravocrata;
Descentralização administrativa local,dispersão populacional;
Poucas mulheres brancas;
Sociedade do tipo paternalista,onde havia o primado das relações de caracter pessoal.
Influencia: de dentro (família) para fora (sociedade).Zona urbana em formação, com
enfase na mobilidade espacial;
Maior número de mulheres brancas. Sociedade paulista concentrou uma trama
complexa de relações fora do âmbito familiar. Influencia: de fora (sociedade) para
dentro (família).
.

Autoridade
Dependência da autoridade paterna e solidariedade entre os parentes. Hierarquia
interna.Pai importante, na medida em que a absorção da bastardia dependia da posição
socio-economica ocupada pelo pai. Por outro lado, nem sempre as mulheres se
adequavam aos padrões tradicionalmente aceitos.

Unidade Doméstica
Família e componentes de diversas origens,que mantinham diferentes tipos de relações
com o dono da casa, sua mulher e prole legítima. Congrega esposa e concubina,filhos e
bastardos.Nem sempre os membros de uma mesma família permaneciam unidos sob
mesmo teto, pois a maior parte dos filhos, quando casavam, constituíam sua família
num domicilio diferente; indivíduo solteiro cercava-se de escravos e agregados.
Celibato e concubinato eram práticas comuns,mas a absorção do concubinato era mais
aparente que real.
Estrutura Núcleo central: acrescido de membros subsidiários.Apesar da manutenção
das relações familiares e de laços de solidariedade,nao eram comuns a presença de
familiares, amigos ou afilhados junto as famílias locais.Também era incomum a
incorporação de membros subsidiários.
25

Papel Social
Concentrava em seu seio as funções económico-sociais, alem de solucionar os
problemas de acomodação socio-cultural da população livre e pobre. Relações de ordem
afectiva,embora nas áreas de lavouras a falta do trabalho escravo estimulasse outros
tipos de relações de parentesco ou de trabalho.

Modo de Reprodução
Verticalmente, através da miscigenação e horizontalmente, pelos casamentos com elite
branca.Verticalmente,através de casamentos consanguineos.Os casamentos se
realizavam dentro de um mesmo grupo socio-economico e racial.Para a autora, as
características do formato da família paulista e da família patriarcal eram diferentes,
embora ainda na família paulista eram fortes as relações de solidariedade entre os
parentes, amigos ou afilhados. Os casamentos da família paulista,preferencialmente
consanguíneos, são um exemplo de que, a despeito das modificações, as sociedades de
parentes continuaram a actuar no meio urbano. O valor da família continuava em
evidência, mesmo que o formato da família fosse diverso. Conclui Samara: “E evidente,
portanto, que a família patriarcal deixou na sociedade resquícios da sua organização, o
que não significa que possa ser considerada ainda como o único modelo institucional e
valido que sirva para caracterizar a sociedade brasileira de modo geral”.

Modelos Contemporâneos: Grupos Populares X Camadas Medias Para iluminar a


temática da diversidade da família, gostaria de explicitar a seguir duas variações
culturais contemporâneas em torno de modelos de família no Brasil: o modelo de
família associado aos grupos populares e o modelo de família associado as camadas
medias da população brasileira, chamando a atenção para a hegemonia do modelo
nuclear e afectivo no contexto atual.Resumidamente, o modelo de família que
geralmente e associado aos grupos populares tem como um dos seus elementos
fundamentais a “circulação de crianças”, conceituada por Fonseca (1995 a e 1995 b)
como a pratica em que as funções familiares são estendidas para alem da família
conjugal e compartilhadas entre diversas unidades domesticas que se dividem
complementarmente para parir, educar, sustentar, garantir uma identidade social,
patrocinar, oferecer um espaço de sociabilidade, etc. A família e, alem de afecto,
esforço, investimento e o resultado de quem trabalha, come, dorme e brinca junto. Há
também um irrelativizado reconhecimento da diferença complementar de seus membros
26

(tanto em termos de género, quanto sobre o eixo geracional) e um comprometimento em


produzir pessoas relacionais destinadas a integrar outras e idênticas unidades familiares
(Duarte, 1995

A Análise da Prática: Valores de Família e suas Negociações num Órgão de Justiça


Para poder continuar reflectindo sobre a problemática dos modelos hegemónicos X
diversidade dos formatos de família, quero trazer um pouco da minha experiencia no
trabalho de campo antropológico realizado junto a diversos órgãos do sistema de justiça
juvenil no Rio Grande do Sul, que realizei entre os anos 2001 e 2004, especificamente
trabalhando com a questão das medidas socio-educativas (Schuch, 2003 e 2005). Meu
objectivo nesse momento e expor alguns paradoxos que se encontram colocados no
momento em que há uma pratica efectiva de intervenção judicial em vidas de pessoas
com contextos sociais e culturais diversificados e muitas vezes diferentes daqueles que
vivenciamos. Caso tomemos a questão hegemonia do modelo nuclear X diversidade de
práticas e concepções de família como algo absolutamente problemático analiticamente
– na medida em que expõe questões relacionadas a relação entre cultura e poder - tais
questões são ainda mais difíceis para quem tem que lidar com a diferença
cotidianamente: para quem,uma Pergunta critica a procura das origens da universalidade
da dominação masculina, feita por Michele Perrot e citada por Mariza Correa (1999) no
seu artigo contra a crença de Bourdieu na universalidade da dominação masculina, mas
que podemos amplia-la como uma crítica a busca de universais. Não somente tem que
tratar de reflectir sobre tais problemáticas, mas também tem que intervir na realidade,
estabelecendo relações de confronto e negociação de significados com os adolescentes e
suas famílias – como e o caso das pessoas que trabalham nos programas de intervenção
jurídica. E no intuito de também tentar contribuir para esse desafio diário de
estabelecimento de programas destinados aos adolescentes autores de ato inflacional
que faco essas colocações, tentando, mais uma vez, afirmar a importância da análise da
prática efectiva dos relacionamentos e interacções sociais como possibilidade de criação
de novas alternativas, em detrimento da fixação em um “ideal” ou modelo
“hegemónico”.

A Difusão dos “Direitos” e o Controle da “família”


Ao trabalhar nas diversas instâncias de atendimento ao adolescente infractor e suas
famílias, o que me impressionou foi a relevância que a família assume como potencial
27

causa ou solução para as questões relacionadas a infracção. Obviamente, a família e


fundamental como apoio social, afectivo e moral para todas as pessoas. Caso lembremos
a definição de Schneider (1992) do parentesco como um tipo de “fazer” que se define
como um conjunto de práticas que instituem relacionamentos de vários tipos, na
negociação da reprodução da vida, fica ainda mais evidente a importância do parentesco
– em sua elaboração ampla e expansão para além dos grupos de sangue – para o
desenvolvimento das pessoas. Mas uma abordagem histórica vai nos informar que a
família enquanto valor moral tem crescido imensamente as suas responsabilidades na
vida social contemporânea nos últimos 50 anos – época da progressiva implantação das
legislações de defesa e protecção dos “direitos”. Especificamente com relação ao direito
da criança e do adolescente, vemos que esses passam a serem portadores de “direitos
especiais” devem ser protegidos e atendidos na particularidade de suas condições
ontológicas.

Parentesco e filiação

Dois indivíduos são parentes se um descende do outro (laços de filiação directa) ou se


ambos descendem ou afirmam descender dum (ou duma) antepassado(a) comum. Neste
caso, o parentesco entre os dois indivíduos -- quer seja real (quer dizer, que o laço social
que se estabelece assenta num laço biológico de consanguinidade) ou fictício (dizem-se
parentes, consideram-se e comportam-se como tal mesmo se, de facto, nenhum laço de
consanguinidade existe entre um e outro) -- é determinado pelo facto de provirem -- ou
afirmarem provir -- de uma mesma filiação.

Parentesco e consanguinidade
O parentesco é, pois, uma relação social; nunca coincide completamente com a
consanguinidade, quer dizer, com o parentesco biológico. Se o parentesco fosse
considerado no seu sentido biológico, cada indivíduo teria, efectivamente, um número
muito elevado de parentes No fundo, e desde que se rebuscasse suficientemente longe,
todos os Membros de uma dada sociedade (sobretudo quando pequenas) seriam, pois,
parentes. Assim diluído, indiferenciado e generalizado, o parentesco não poderia ser
uma base de Classificação dos indivíduos no seio de grupos de parentesco diferentes e
até opostos e, consequentemente, não poderia ser um princípio de organização social.
28

Para que o Parentesco possa ser um princípio lógico de classificação é necessário que
nem todos os consanguíneos sejam reconhecidos como tal; que certas categorias destes
sejam excluídas do parentesco:

Quer porque se considere apenas uma linha de ascendência com exclusão das outras
(filiação unilinear em linha paterna ou materna) quer porque se considerem as duas
linhas, mas atribuindo-lhes funções distintas (dupla filiação unilinear),

Quer, enfim, porque se reconhece ao mesmo tempo o parentesco do lado paterno e do


lado materno (filiação indiferenciada ou bilateral ou, então, cognática),Tratando-os de
modo idêntico..., mas, Neste caso, o parentesco já não tem uma função claramente
distintiva o os grupos sociais já não se distinguem em função de uma filiação específica
mas em função de outros critérios que não os do parentesco: comunidade de residência,
de posse de terra ou de funcionamento socioeconómico, por exemplo.

Alguns autores preferem, nestas condições, falar de sociedade "com predominância


patrilinear" ou de sociedades "com predominância matrilinear".

Parentesco e alianças matrimoniais


Enquanto os anglo-saxões distinguem os parentes por filiação dos parentes por
casamento ou por alianças matrimoniais (affines); os franceses, pelo contrário, utilizam
Unicamente o termo "parentes", não esclarecendo de qual das duas categorias se trata.
É, de facto, evidente que não se pode separar a filiação das alianças matrimoniais. Lévi-
Strauss, especialmente, demonstrou que o parentesco constitui um sistema organizado
em redor duma "estrutura mínima" ou "átomo de parentesco", de que as aliança
Matrimoniais são, do mesmo modo que a filiação, um dado imediato. Com efeito, todas
as sociedades conhecem a proibição do incesto. Esta proibição não é mais do que o
inverso negativo duma exigência positiva, duma prescrição universal: é preciso procurar
mulheres fora do grupo dos parentes. Como frisa Lévi-Strauss a proibição do incesto
"significa que, na sociedade humana, um homem não pode obter uma mulher senão
doutro homem que lhe cede uma filha ou uma irmão parentesco por alianças
matrimoniais é, portanto, um elemento exterior que se enxerta no parentesco
propriamente dito. É parte integrante do que se chama, geralmente, Sistema de
parentesco ou, se se quiser recorrer à perspectiva estrutural delineada por Cl. Lévi-
Strauss, "sistema de parentesco-alianças", entendendo-se que, sempre que se fala de
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"parentesco" em geral, se incluem quer as relações de filiação (relativas a um


ascendente comum) quer as relações de alianças matrimoniais (geradas pela necessidade
de casamento fora do grupo de filiação).

Nestas condições, é fácil compreender que "os laços estabelecidos sobre a dupla noção
parentesco-alianças são os laços-tipo e fornecem modelos para a interpretação de todas

as relações sociais" (P. Mercier). Parentesco por filiação e parentesco por alianças
matrimoniais fornecem, pois, modelos, princípios de organização e de expressão
simbólica aos participantes na vida social, por um lado, e, por outro, modelos e
princípios de interpretação aos teóricos autóctones, assim como ao investigador. Há
interesse em se dedicar à análise do sistema de parentesco sob um triplo aspecto: como
expressão directa de certas relações sociais (em especial, as relações entre
parentes),como modo de expressão metafórica das relações sociais (por exemplo,
políticas) directamente decalcadas sobre as relações de parentesco, Como modo de
formulação e de interpretação ideológica mais ou menos consciente de relações cuja
natureza real nem sempre corresponde à linguagem (utilizada) para as descrever e
explicar (por exemplo, as relações de produção).

Descendência e filiação
Sistemas de Filiação

Segundo Claude Rivière (2007:64), citando Rivers “A filiação entende-se como o


conjunto de regras que definem a identidade social da criança em relação aos seus
ascendentes e que determina a hierarquia dos membros da família, a forma de herança
dos bens, a transmissão de cargos e funções, até a distribuição da autoridade nas
sociedades tradições”.
30

Tipos de filiação

A filiação indiferenciada
A filiação indiferenciada, dita ainda bilateral ou cognática corresponde à modalidade
que conhecemos na nossa sociedade e grosso modo à maioria das sociedades ocidentais.
Nas culturas onde se pratica a filiação indiferenciada, ego pertence indiferenciadamente
à linhagem do seu pai e da sua mãe e desde logo às quatro linhagens ascendentes da
linha recta. Sendo assim, a terminologia do parentesco patrilateral e matrilateral é
exactamente a mesma em ambos os lados, como se viu nos diferentes tipos de
nomenclatura. Outro aspecto, consiste em as relações de parentesco de ego serem
idênticas tanto com o lado paterno como com o lado materno.

A filiação matrilinear (ou uterina)


Nas sociedades onde se pratica a filiação matrilinear, ego pertence ao grupo de
parentes maternos. Nestes sistemas, o laço de parentesco é exclusivamente transmitido
pelas mulheres. Assim, só a irmã de ego transmite a qualidade de pertença ao grupo, o
irmão embora tenha a mesma pertença não pode por consequência transmitir. Tal, não
significa que ego não reconheça os seus parentes paternos. A linha de parentesco
paterna é naturalmente reconhecida mas esta tem um papel de parentesco secundário.

Para dar um exemplo, volto a citar as ilhas Trobriand, onde os filhos de uma mulher
pertencem ao seu clã, exclusivamente. Assim, os filhos do filho perdem este estatuto e
passam a pertencer ao clã da esposa e não ao seu (Malinowski.1929). Nestes sistemas,
um homem está reduzido ao papel de marido da mãe dado não ter nenhuma função na
atribuição do estatuto parental aos filhos. Assim, o parentesco biológico relativamente
ao pai é ignorado e simultaneamente o de pai social, cujo papel é desempenhado pelo
irmão da mãe. O pai desempenhará este mesmo papel em relação aos filhos da sua irmã.

Filiação patrilinear (ou Agnática)


A filiação patrilinear, apresenta uma configuração diametralmente inversa à
matrilinear. A descendência faz-se exclusivamente pelos homens. Uma mulher não tem
31

qualquer papel na atribuição da pertença parental do filho. Porém, contrariamente ao


sistema matrilinear, a mulher não concilia os papéis de mãe biológica e mãe social da
mesma forma.

Os muçulmanos são caracteristicamente patrilineares, o que significa que os filhos de


um casal têm o estatuto de pertença ao grupo de parentes do pai.

Filiação bilinear (ou dupla filiação unilinear)


A filiação bilinear ou dupla filiação unilinear, combina os dois sistemas unilineares,
patri-matrilinear, e cada uma das duas linhas preenche um papel diferente da outra. Ou
seja, reconhece o parentesco do lado paterno e materno mas cada um deles com uma
finalidade distinta. Segundo R. Fox (1986), um sistema bilinear funciona se cada uma
das duas linhas exercer uma função distinta.

Consanguinidade
Universalmente são aceite os seguintes símbolos:

Homem

Mulher

=O ou casamento

A linhagem consiste num conjunto de indivíduos tendo em comum um (ou uma)


ancestral comum fundador, do qual se reclamam, em virtude de uma regra de filiação
unilinear:
32

 Agnática – linhagem patrilinear,

 Uterina – linhagem matrilinear,

Geralmente a linhagem constitui um grupo local (patri ou matrilocal) cuja unidade


social tem por principio a autoridade jurídica, o património, a exogamia, o culto e a
solidariedade. Por exemplo, na sociedade Ashanti do Gana a linhagem é considerada
como uma “pessoa” (Fortes, 1950) e cada indivíduo representa a linhagem e é
responsável pelos actos dos restantes membros.

A linhada, esta representa um segmento de linhagem de indivíduos primogénitos e


benjamins, independentemente da regra de filiação e da linha, recta ou colateral pela
qual o parentesco é estabelecido. Assim, num sistema indiferenciado, a linhada de ego
consiste nos seus descendentes, solteiros ou casados com exclusão dos conjugues.
Porem, por sua vez, ele, e os seus próprios descendentes, pertencem à linhada do seu pai
(ou da sua mãe) ao mesmo titulo que os seus irmãos e irmãs.

O clã, os seus membros dizem-se aparentados uns aos outros por referência a um
ancestral comum, mas na realidade são geralmente incapazes de estabelecer o laço que
afirmam ter com o ancestral epónimo, contrariamente, como se viu, à linhagem, ter uma
base territorial local ou encontrar-se disperso pela regra da exogamia. Seja como for, o
clã é dotado de um espírito de solidariedade e funciona como um todo em acto.

Parentela
A parentela consiste no grupo de parentes consanguíneos que ego reconhece como tal.
Nos casos em que a linha genealógica de descendência é indiferente – o que acontece na
maioria dos casos – a parentela é dita bilateral. Porém, existem sociedades em que o
recrutamento dos membros da parentela é feito numa única linha, agnática ou uterina.
33

A residência matrimonial
Em Portugal, em meio especialmente rural, é comum a residência ser de tipo matrilocal
entre aldeias, sempre que eventuais impeditivos não se interponham. Porem, outros
tipos de residência existe no nosso País, os quais também – sempre que os elementos
favoráveis ao modelo cultural estão presentes – tendem a realizar-se por força de
emergência da estrutura social local antiga, mais ou menos ainda existente.

A partir da experiência no terreno, os antropólogos elaboram uma tipologia dos modelos


de residência matrimonial. Foram observados os seguintes modelos principais ou tipos
de residência que são:

 Residência patrilocal, é aquela em que a mulher instala-se na casa dos pais do


seu marido.

 Residência virilocal, é aquela em que a mulher vive na casa do seu marido, uma
casa vizinha dos pais deste.

 Residência matrilocal, é aquela em que o marido vive com a mulher na casa


dos pais desta.

 Residência uxorilocal, é aquela que o marido vai viver com a sua mulher nas
proximidades, habitat distinto da casa dos pais da mulher.

 Residência bilocal, o casal tem liberdade de viver em casa dos pais de um ou de


outro dos cônjuges, podendo a escolha ser ditada pela riqueza, pelo estatuto
respectivo das famílias ou pelas preferências.

 Residência avuncolocal, o casal vai viver com um tio materno do marido nas
proximidades.

 Residência neo-local , o casal escolhe o domicílio onde bem entende, em lugar


diferente daquele em que cada um vivia antes do casamento.

 Ambilocal, o casal reside alternadamente no grupo do marido e no grupo da


mulher.

 Residência alternada

 Residência duolocal ou natolocal


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Nas residências matrilocal e avanculocal, são os parente em linha feminina e a sua


família que vivem juntos. O avunculato consiste numa relação particular entre o tio e o
filho da irmã. Esta relação corresponde ao conjunto de direitos e obrigações que o tio
materno tem para com o filho da irmã, assim como o tipo de tratamento que é
reconhecido entre eles.

1 Sistemas de atitudes
Atitude é uma norma de procedimentos que leva há um determinado comportamento. É
a concretização de uma intenção ou propósito.

Atitude é comportamento habitual que se verifica em circunstâncias diferentes. As


atitudes determinam a vida anímica de cada indivíduo, as atitudes são patenteadas
através das reacções repetidas de uma pessoa. Este termo tem particular aplicação no
estudo do carácter, como indicação inata ou adquirida, relativamente estável, para sentir
e actuar de forma determinada.

As atitudes consiste em um valor de crenças com certa estabilidade no tempo, de um


indivíduo ou grupo que o predispõe a sentir e reagir de uma determinada forma perante
dados estímulos. Por exemplo um determinado comportamento pode ser classificado
como atitude feminina ou atitude de homem.

Atitude pode culminar em uma determinada postura corporal. Uma atitude ameaçadora
é uma postura corporal que expressa agressividade e pode ser um mecanismo de defesa
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ou de intimidação. Estes tipos de atitudes é comum nos seres humanos e em varias


outras espécies do reino animal.
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1.2 Impacto na organização social da sociedade


Parentesco é forma de aquisição de laços e relações de identificações que existe entre
seres humanos a partir de um “eu” de referência. Distingue se o parentesco por
afinidade, através do casamento, o parentesco sanguíneo por descendência.

Associada ao conceito de descendência esta a aquisição de privilégio e de posição social


através da sucessão, como é ocaso dos títulos da nobreza nos regimes monárquicos, e
aquisição de bens matérias por morte através de herança.

A descendência pode ser patrilinear, através de um casamento masculino, matrilinear a


partir de um ascendente feminino, duplo unilinear, de ambos progenitores mais com
objectivos diferente, e omnilinear ou bilateral, quando existe uma mistura de linhas
ascendentes. Os laços parentais podem ainda ser adquiridos como um direito através de
figura da adopção em que o reconhecimento social se sobrepõe as relações de
saguinidade.

As relações de parentesco são o fundamento da família, que é de forma de organização


social por excelência não só entre seres humanos mais também entre muitos animais e
plantas.

O parentesco é muitas vezes entendido como uma forma de estabelecer relações


pessoais e sentimentos de grupo ou corporação é também uma forma de reivindicar o
direito. Algumas qualidades e obrigações são culturalmente atribuídos as relações
parentesco como é o caso da solidariedade entre irmãos ou economicamente educar os
filhos pelos pais.

Impacto na organização política das sociedades


A antropologia política remete para o todo social ou seja para as propriedades gerais que
nele operam e o organizam, atravessando assim todos os elementos da organização
social a que o antropólogo social normalmente presta atenção.

Todos os membros de uma sociedade estão sujeitos ao sistema político que a regula,
embora nem todos participem, directa e especificamente, nos seus diferentes níveis
enquanto particularmente responsáveis por um órgão de poder. No entanto, todos eles
estão, de facto, implicados no sistema político, directa ou indirectamente, em posição
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dominante ou secundária, se considerarmos que um sistema político consiste numa rede


complexa de relações sociais na qual se inscreve o binómio governantes/governados.

A noção de sistema político foi introduzido por M. Fortes e E. E. Evans-Pritchard. H. S.


Maine, evidenciou, desde muito cedo a existência de sociedades cuja organização
politica assenta no parentesco e não no território. Ou seja, a existência de sociedades de
sem Estado, paralelamente, as sociedades com Estado. Mais tarde, R. Lowie, rejeitará
todos os esquemas evolucionistas que envolviam a questão da origem de Estado, e às
sociedades fundadas na organização parental acrescentou outros tipos: as organizações
fundadas nos grupos etários, na idade e no sexo.

Foram, de facto, H. J. Maine (1861) e mais tarde L. H. Morgan (1877), os primeiros a


evidenciar o facto dos laços de parentesco constituírem a arquitectura social das
sociedades se Estado. Em relação às sociedades sem estado, estes autores confirmavam,
no seguimento de autores anteriores, que estas se subdividiam, por sua vez, em
pequenas sociedades nas quais a organização politica e a organização do parentesco são
decalcadas uma da outra e sociedades nas quais a organização politica corresponde ao
modelo da organização linhagística

Do ponto de vista tipológico, Fortes e EvansPritchard (1940) salientaram três grandes


modelos de organização:

 As sociedades de dimensão muito reduzidas em que a estrutura politica se funde


completamente na organização parental, na medida em que ela abarca o conjunto
das relações de parentesco da totalidade do grupo,
 As sociedades linhagísticas, onde a organização politica se modela na linhagem
reflectindo uma estreita coordenação entre os dois sistemas, os quais conservam
porém a sua distinção e autonomia,
 As sociedades com Estado cuja organização se apoia num aparelho
administrativo, etc. Estas últimas, contrariamente às primeiras, são ditas assim
por possuírem um governo e aparelho administrativo especializado, um aparelho
judicial, agentes de administração politica, etc.
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Conclusão:
Após o término do trabalho o término do trabalho conclui que o a cultura é um
conjunto complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, lei, costumes, e
varias aptidões e hábitos adquiridos pelo homem como um membro de ma sociedade.
Inclui, pois todo o comportamento humano.Tambem Antropologia contribui
intensivamente para a construção duma sociedade intercultural através da valorização da
diversidade do património cultural de Moçambique compreendendo que o conjunto
destes valores é uma das maiores riquezas do país
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Bibliografia

BERNARDI, Bernardo. Introdução aos estudos Etno-Antropológicos. Perspectivas do


Homem., Edições 70, Lisboa 1974.

DURKHEIM, E. As formas elementares da vida religiosa. São Paulo: Martins Fontes,


1996

EVANS-PRITCHARD, E.E. História do Pensamento Antropológico. Perspectivas do


Homem. Ed. 70, Lisboa, 1981

GOLDMAN, Lucien. A criação Cultural na Sociedade Moderna: Para uma Sociologia


da Totalidade. Ed. Presença, Lisboa, 1976.

JUNOD, Henri. Usos e Costumes dos Bantu. 2. Ed. Lourenço Marques, 1974.

LANGA, Adriano. Questões Cristãs à Religião Tradicional Africana. Braga, Ed.


Franciscana, 1992

LECLERC, G.. Antropologie et colonialisme. Paris, Ed. Estampa, 1973.

MARTINEZ, Pe. Francisco Lerma, Antropologia Cultural, Seminário Maior Sto.


Agostinho da Matola, S/Ed.,

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