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ABSTRACT
This article aims at reflections on the international system based upon the combination of three
perspectives of analysis: realist theory, world-system theory and the geopolitical approach which could
help us to bring about the essential core of strategic and nacional interests of the great powers in an
environment of conflitc and competition. In addition, a introduction of the role the military and economic
central elites of contemporary State is mentioned as a importante dimension to think about how the
political units do behave in an anarchical world.
RESUMO
Este artigo objetiva uma reflexão sobre o sistema internacional baseado na combinação de três
perspectivas de análises: a teoria realista, a teoria do sistema-mundo e a abordagem geopolítica de modo
que possam estas análises servir para explicar o núcleo dos interesses nacionais e estratégicos das grandes
potências num ambiente internacional de competição e conflito. Além disso, a introdução do papel das
elites econômica e militar centrais de um Estado contemporâneo são destacadas como importante
dimensão para se pensar como as unidades políticas se comportam no mundo anárquico.
Apresentação
1
Advogado, Mestre em Relações Internacionais e Doutor em Ciência Política, com concentração de
pesquisa em Política Internacional, pela UFRGS.
Desvendar as grandes tendências do cenário mundial para o século vinte e um
significa o mais relevante esforço de análise em política internacional. Mas quais seriam
as grandes tendências do sistema internacional? Quais os impactos que teriam para a
natureza das relações internacionais para as próximas décadas, de forma a caracterizar a
maior parte do século XXI? A fim de tentar problematizar estas questões, se faz
necessário quatro grandes movimentos que são interdependentes2.
Em primeiro lugar, quando se fala em grandes tendências da política mundial,
estamos falando no núcleo analítico da estrutura do sistema de estados, que o eminente
cientista político estadunidense e principal expoente do realismo estrutural, Kenneth
Waltz3 reconheceu como sendo as grandes potências em termos de suas capacidades em
um cenário anárquico e de características hobbesianas 4. Desta forma, sejam quais forem
os debates e discussões acerca dos futuros ciclos hegemônicos de poder que
hipoteticamente venham a suceder ao atual, uma coisa parece cristalina como a água: a
manutenção das duas principais tendências sistêmicas: a polaridade em termos de
grandes potências e a descentralização do poder político mundial.
Em segundo lugar, e de forma indissociada da primeira grande tendência, na
lição dos grandes pensadores da escola marxista do sistema-mundo, as concepções de
Immanuel Wallerstein e Geovanni Arrighi acerca do papel dos ciclos de acumulação de
capital como fenômeno que tem acompanhado, desde as origens do sistema capitalista, a
formação e institucionalização do Estado nação e de suas principais estruturas
institucionais internas (burocracias militar e diplomática) responsáveis pelas relações
2
Stephen Van Evera, em sua clássica obra sobre metodologia em relações internacionais “Guide to
Methods for Students of Political Science, trata da importância do estuo do fenômeno das relações
internacionais (importante sub-área da ciência política) a partir da análise das relações de causa e efeito
entre os fenômenos internacionais que são objeto de observação empírica. Sob este prisma é que se faz
relevante o emprego das categorias das variáveis (independentes, dependentes, intervenientes e de
condição). A complexidade dos fenômenos de ordem econômica, social, estratégica, cultural e política
para um campo interdisciplinar por natureza como a política internacional requer, portanto, o emprego de
análise metodológica com o aporte das variáveis, de acordo com a dimensão do estudo que se queira
fazer, como, por exemplo, o estudo das relações entre elites que decidem os interesses estratégicos do
Estado, o que requer estudo teórico do debate agente-estrutura, emprego das teorias de explicação
sistêmica e estrutural combinadas com as perspectivas dos estudos de elites e das dinâmicas do processo
decisório interno às estruturas política, militar e diplomática – centros decisórios do Estado na política
internacional.
3
Kenneth Waltz foi o criador do realismo estrutural, fundado na análise da terceira imagem, a do sistema
internacional, a partir de suas obras clássicas, o Homem, o Estado e a Guerra, de 1959 e Teoria da Política
Internacional, de 1979. É considerado um dos quatro grandes expoentes do realismo político juntamente
com Hans Morgenthau, Raymond Aron e John Mearsheimer e certamente o pensador mais influente do
realismo estrutural.
4
Thomas Hobbes, filósofo contratualista inglês do século XVII. Seu pensamento acerca do conflito como
inerente à anarquia e instabilidade do estado de natureza influenciou decisivamente o pensamento realista
em política internacional.
exteriores, na construção, manutenção e eventual declínio de hegemonias das formações
estatais nos marcos da liderança do processo de acumulação de capital.
Em terceiro lugar, a necessária investigação acerca dos grupos ou frações de
grupos dentro e fora do Estado (mas articulados a este) que definem os objetivos
estratégicos dos principais Estados que têm capacidade de influenciar e caracterizar a
política internacional em termos de relações de poder nas dimensões política,
econômica e securitária: as frações de elites econômica, militar, diplomática e política
das grandes potências. Aqui um retorno aos preceitos do realismo clássico e da
contribuição do neorrealismo clássico é de grande ajuda.
Em quarto lugar, cumpre descrever o padrão de relações ambíguas entre as
grandes potências, caracterizadas pela concomitância de cooperação pontual com
rivalidades tanto do lado das alianças quanto pelo lado do (s) polo (s) adversários. A
política internacional é a política de poder dos principais atores do sistema. O sistema
internacional, por sua vez, é caracterizado pelo comportamento das grandes potências e
tem sido pautado por padrões de conduta que possuem certa dose de previsibilidade de
acordo com as principais escolas sistêmicas de análise da política internacional, o
realismo estrutural, centrado na dimensão estratégico-militar e a perspectiva do sistema
mundo de acordo a escola marxista, fundada em análise de economia política. Salvo
melhor juízo, compreendemos que o pensamento geopolítico fornece um quadro de
síntese de como os grandes estados centrais e seus polos contestadores atuam no plano
sistêmico a partir das escolhas estratégicas delineadas por suas elites.
Uma análise enriquecedora para melhor entender as dinâmicas e os processos
pelos quais as nações atuam não podem prescindir da noção de que as dimensões
político-militar e econômica não existem de forma separada na vida real das disputas
sistêmicas entre Estados Unidos e o bloco ocidental, de um lado, e o bloco euro-asiático
nucleado pela China e pela Rússia, de outro.
Além disso, o debate em torno da famosa “caixa preta” do Estado, onde se
encontram seus entes subnacionais, estudados na seminal obra O Homem, o Estado e a
Guerra, a partir do conceito de ‘imagens’ formulado por Waltz (WALTZ,1959, p.15),
necessita ser trazido à tona. São afinal e ao cabo, as elites dirigentes que definem e
redefinem, para o bem e para o mal, os grandes interesses estratégicos de seus estados e
são elas as responsáveis finais pela ascensão ou pela queda de suas hegemonias.
5
Principal nome do realismo clássico juntamente com Eric Carr e Raymond Aron entre os anos 1940 até
meados dos anos 1960. Autor do célebre clássico Politics Among Nations, publicado em 1948.
ideológica para um padrão mais complexo de convívio, de acordo e paralelamente às
próprias transformações históricas, sociais e econômicas do conjunto das demais
sociedades que compunham tanto o bloco capitalista quanto o socialista. Kenneth Waltz
viveu todas estas transformações e foi observador privilegiado dos grandes
acontecimentos que moldaram o relacionamento entre as duas superpotências na
segunda metade do século vinte e mormente, no período que se convencionou
denominar de distensão ou détènte, entre meados dos anos 1960 até o final do governo
Carter (1979-80)6.
Assim a transição das administrações Eisenhower para a de Kennedy 7, nos
Estados Unidos, e de Nikita Kruschev8 para a de Brejnev9, na União Soviética,
caracterizaram a primeira imagem, a dos estadistas. Da mesma forma, mudanças
estruturais dentro dos respectivos estados americano e soviético (padrão da segunda
imagem waltzoniana) foram a tônica que se seguiu nos tumultuados anos sessenta. De
um lado, a luta pelos direitos civis das minorias afro-americanas, a contestação
estudantil contra a Guerra do Vietnã e a contracultura; de outro, a consolidação da
estrutura burocrática do Partido Comunista da URSS 10, que se confundia com as
estruturas administrativas do Estado soviético, muito característico da era Brejnev e da
emergência de estratos de sociedade de consumo que se consolidava dentro da URSS e
da esterilização econômica e ideológica na sociedade soviética.
No plano da terceira imagem, por sua vez, a passagem dos anos cinquenta para
os sessenta irão caracterizar diversos acontecimentos nos campos militar, tecnológico,
econômico e diplomático e que serão importantes para mais adiante no texto ao
estabelecer um paralelo das transformações complexas que tem caracterizado o começo
da terceira década do século XXI, também caracterizada por uma nova Guerra Fria. É
nesta dimensão de análise que a obra de Waltz e da escola do realismo estrutural centra
suas análises sobre o Estado e a política internacional.
6
O objetivo do artigo não é o de fazer análise descritiva da história das relações internacionais do período
da Guerra Fria (1947 a 1991). Todavia alguns recortes históricos são necessários a fim de estabelecer um
padrão de comparação e demonstrar a recorrência de determinados fenômenos que se fizeram presentes
no ciclo de ascensão e consolidação da hegemonia dos Estados Unidos no sistema internacional e o atual,
de declínio relativo de Washington.
7
Respectivamente, presidentes dos Estados Unidos entre 1952 a 60 e 1961-63.
8
Líder soviético de origem ucraniana, governou de 1953 a 64.
9
Líder soviético de origem ucraniana, governou de 1964 a 82.
10
URSS: União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Foi o Estado socialista cujo núcleo de poder era a
Federação da República da Rússia, com capital em Moscou, criado por Vladimir Lênin, seu primeiro
líder. Foi a segunda superpotência militar do mundo. Surgiu em 1922 como resultado da Revolução
socialista russa de 1917 que derrubou o Império russo e durou até 1991, quando foi desmembrada, após
crises e revoluções resultantes das reformas da era Gorbachev, o último líder soviético.
Naquele momento histórico de vinte anos entre as duas obras waltzonianas, o
padrão de relações internacionais sofreria profundas mudanças dentro da ordem do
sistema bipolar. Da emergência da crise entre Leste e Oeste pautada pela crise dos
mísseis de Cuba em 1962, que quase levou o mundo à beira de uma confrontação entre
as forças da OTAN e do Pacto de Varsóvia até invasão soviética do Afeganistão, em
1979, o sistema passara por grandes transformações, tornando mais complexa a análise
de relações internacionais.
Dois fenômenos importantes nos anos sessenta, irão condicionar o padrão de
relações entre as superpotências a partir de então. No plano estratégico e militar, os
arsenais termonucleares e os vetores de longa distâncias a partir de plataformas
terrestres, aéreas e navais da URSS, os ICMB11, adquirem paridade de poder para com
os similares sistemas de armas dos Estados Unidos, consolidando o equilíbrio nuclear e
convencional em termos estratégicos entre as duas maiores potências militares do
planeta em meados da década de sessenta.
Além disso, no plano da economia das relações internacionais, o
aprofundamento do envolvimento militar norte-americano no conflito da Indochina, na
segunda metade dos anos sessenta, acabou por sobrecarregar financeiramente a
economia norte-americana. Tal fator não pode ser dissociado da dimensão militar uma
vez que a crescente complexidade dos sistemas de armas produzidos por empresas
privadas contratantes do Departamento de Defesa dos EUA (Pentágono) exigiam cada
vez mais recursos do Estado americano para financiar a produção bélica tendo as suas
forças armadas como principais consumidoras, num sistema que se desenvolvera no
curso da Segunda Guerra Mundial e se consolidara ao longo da primeira fase da Guerra
Fria nos anos 1950 e início dos 60.
Desta maneira, o núcleo central do denominado complexo militar-industrial era
sensível às questões de ordem econômica e na medida em que os custos do
envolvimento americano no Vietnã drenava recursos da sua economia, isso também
afetava a sua competitividade frente aos aliados competidores europeu e japonês que
passavam a competir pelos novos mercados emergentes do Terceiro Mundo, como
11
Míssil balístico intercontinental, com capacidade de atingir alvos em distâncias acima dos 5.500 km,
dotados de ogiva nuclear. Ao tempo da Guerra Fria, apenas URSS e EUA possuíam estas capacidades.
Atualmente, em nível estratégico, ou seja, a capacidade de entrega de bombas termonucleares em mísseis
hipersônicos como o Sarmat, ou o mais veloz existente, da ordem de 6.000 km/h o Kinzhal, capaz de
atingir alvos de até 2.000 km, tornando praticamente os sistemas de defesa russo virtualmente
invulneráveis ao passo que tornam os sistemas dos oponentes vulneráveis a um ataque. Esta capacidade
ofensiva de um sistema de armas estratégico, segundo analistas militares como Andrei Martyanov, teria
tornado a Rússia desde meados da década passada a primeira potência militar do mundo.
efeito da reconstrução econômica destes países que foram destruídos pelo conflito de
1939-45.
Isto implica reconhecer que as variáveis econômica e militar – a par das
especificidades reais de cada uma e de teorias específicas em ciências humanas para
com análises específicas – não podem ser entendidas separadamente quando tem-se em
conta as estratégias de competição e de luta pelo poder entre as grandes potências do
sistema, como será visto mais detidamente no tópico a seguir. De todo o modo, a junção
da lógica das duas variáveis – equilíbrio estratégico entre as duas superpotências e
aumento do polo competidor no plano econômico, como efeito tanto de relativo declínio
econômico da principal economia do mundo – os Estados Unidos – e da recuperação
dos chamados aliados-rivais europeu e nipônico, trariam novas tendências ao sistema
bipolar que caracterizava o sistema internacional desde a ascensão hegemônica dos
Estados Unidos à condição de líder do sistema e do ciclo de acumulação de capital
desde 1945.
Estas tendências, que permitiram no curso do final dos anos sessenta e começo
dos anos setenta desengajar os Estados Unidos do custoso conflito na Indochina, iriam
estar na base das primeiras mudanças estruturais que permitiriam por toda a década de
setenta a coexistência pacífica com o bloco socialista e na erosão do padrão fordista-
keynesiano12 de acumulação. As transformações operadas pelo fim da paridade entre o
ouro e o dólar e pelos aumentos dos preços do petróleo dos governos Nixon e Carter
estaria na origem da reestruturação econômica e financeira que caracterizariam o fim da
Guerra Fria como sistema e o próprio fim do bloco soviético.
Estas ações do Estado americano em consonância com as demandas de suas
corporações financeiras e do petróleo promoveriam o aprofundamento da globalização
econômica e financeira que passariam a ter contornos estruturais para a transição do
ciclo estadunidense para o ciclo de acumulação asiático que ora caracterizam os anos 20
do século XXI, pautados pela continuidade do declínio econômico norte-americano, de
consolidação da Revolução Tecnológica na Economia, de transição para a
multipolaridade, mas também sob a égide do neoliberalismo.
12
John Maynard Keynes, importante economista britânico que teve um papel político importante para a
retomada da economia dos EUA nos anos 30 quando o Estado passou a intervir na economia para a
partir de políticas sociais e de estímulo ao crescimento econômico pela demanda foram responsáveis
pela recuperação dos efeitos da depressão e abandono do receituário liberal clássico de não intervenção
estatal nos assuntos econômicos. Participou das medidas políticas econômicas do Presidente Franklin
Roosevelt (1933 – 45).
Tendo em conta este contexto internacional da época, a tentativa da teoria de
relações internacionais, como toda a ciência social, de promover a busca pela
generalização e abstração em termos de construção teórica acerca do comportamento
previsível do Estado no plano externo, independentemente de sua natureza jurídica ou
político-ideológica no plano interno, cumpriria determinadas características, a mais
importante delas a busca pela manutenção da sua existência.
Assim, a sobrevivência de uma unidade política é o maior objetivo estratégico a
ser perseguido por suas elites dirigentes por meios instrumentais variáveis e
complementares, a depender dos desafios apresentados pelo contexto: cooperação,
alianças, balanço de poder, uso da dissuasão militar (convencional e nuclear) e recurso
ao uso da força (guerras).
Nesse sentido, Waltz desenvolveu sua teoria a partir dos complexos fenômenos
acima descritos. Buscando no nível de análise sistêmico, o das relações entre os
Estados, a causa primeira para explicar a racionalidade dos resultados das ações em
política internacional, irá buscar tratar de como agem as grandes potências em termos da
distribuição de suas capacidades.
De acordo com a perspectiva de análise privilegiada por Waltz pode-se perquirir
acerca dos motivos da ascensão de Hitler ao poder nos anos trinta e de sua política de
alianças, balanceamentos e, afinal, anexações e guerras. Pode –se refletir acerca da
decisão de Roosevelt13 de entrar no conflito mundial em 1941 ou das razões de Stálin 14
em aderir aos aliados contra a Alemanha ou aos motivos de Churchill 15 de aceitar a
aliança temporária como socialismo soviético. Independentemente dos sistemas político
e ideológicos dos atores em questão, existe um padrão comum a todas estas grandes
potências: manter os recursos necessários à sua sobrevivência16.
A sobrevivência da unidade política em um ambiente anárquico é a condição
última sem a qual fenecem os interesses particulares de grupos e indivíduos internos a
13
Presidente dos Estados Unidos entre 1933 e 1945.
14
Secretário Geral do PC e líder supremo da URSSS entre 1922 e 1953.
15
Sir Winston Churchill, primeiro ministro britânico de 1940 a 1945.
16
Hitler necessitava garantir, num primeiro momento, acesso da Alemanha aos recursos econômicos e
humanos para a indústria alemã e para isso necessitava ocupar militarmente a Europa como condição de
avançar no processo de acumulação de capital alemão, cujo principal rival era o capitalismo dos Estados
Unidos. Este assim como o Reino Unido estavam unidos na necessidade de garantir o equilíbrio europeu
formando aliança temporária com o gigante soviético contra o poderoso estado nazista. Cumpre lembrar
que a Alemanha e a Rússia soviética naquele momento representavam a precisavam estar separadas pois
sua aliança ou a absorção desta última pela primeira representaria o pesadelo geopolítico para os anglo-
saxões. Por fim, da parte das autoridades soviéticas, a aliança temporária para com os estados capitalistas
anglo-saxões representava uma necessária forma de balanceamento e contenção do agressor alemão, em
uma genuína luta pela sobrevivência.
cada tipologia de formação histórico-social, sejam quão distintas forem estas. Assim,
ainda que não fossem aqueles os líderes nomeados, mas outros e o tempo histórico fosse
outro, poderia se afirmar com boa base de segurança que na iminência de um conflito
militar ou de competição econômica, o resultado tenderia a ser similar.
A partir de uma rica análise erudita, o pensador alerta que, embora importantes
fenômenos complexos como sistema político, o papel dos estadistas e fatores
domésticos e de ordem econômica não eram o escopo de sua análise, dentro da grande
tradição realista17.
Assim, em essência, afirma Waltz, fossem quais fossem as características da
economia, dos líderes em questão e da ideologia ou do regime partidário ou político de
uma nação em particular, tanto Estados Unidos, como União Soviética agiriam de igual
modo em termos de perseguir o equilíbrio de poder e fazendo uso dos meios como as
alianças e formas de atingir o balanço de poder para preservar a segurança e a defesa
dos seus interesses geopolíticos centrais. Um exame racional acerca dos custos e
vantagens palpáveis, por exemplo, esteve nos cálculos do Conselho de Segurança
Nacional do Presidente Kennedy por ocasião da crise dos mísseis18.
O realismo estrutural de Waltz reconhece o terceiro nível de análise como aquele
que explica de forma mais abrangente e de forma racional o comportamento das
unidades que compõe o sistema interestatal. Para o autor, o nível sistêmico internacional
17
Waltz não nega a importância que por ventura possam ter os interesses particulares de estadistas, chefes
de estado ou de instituições permanentes como militares e chancelaria possuam na conformação do
núcleo duro dos interesses centrais. Apenas ressalta que existem interesses inquestionáveis quando se
analisa o plano sistêmico das relações internacionais, que é o de garantir a sobrevivência do ator estatal.
Assim, pode-se inferir que independentemente de como são decididos e formados os interesses em
determinadas conjunturas, ou das frações de elites que são hegemônicas na condução das relações
exteriores de um país, ao fim e ao cabo, estes dirigentes precisarão garantir a independência e a existência
de suas instituições que personificam o Estado no plano internacional, independentemente da ideologia,
dos interesses principais que são representados naquele dado momento ou da qualidade (ou falta) de
determinada liderança política.
18
Graham Allison, na clássica obra The Essence of Decision, descreve, sob a perspectiva do processo de
tomada de decisão os interesses em jogo e as demandas específicas dos sub-grupos dentro do centro
decisório do governo naquele momento, em especial, de um lado setores importantes do complexo militar
industrial representados pela Força Aérea e de outro, as demandas do Departamento de Estado, o
Secretário de Justiça Robert Kennedy (irmão do Presidente) e o próprio Presidente assim como o papel do
Secretário de Defesa Robert MacNamara. Apesar das diferenças de objetivos setoriais, o que fica claro é
que algum tipo de consenso e acordo sobre os interesses centrais acaba sempre prevalecendo. No caso a
constatação de que no perigoso jogo de disputa com os soviéticos, as vantagens estratégicas dos
americanos superavam os custos de uma guerra nuclear, na medida em que os soviéticos não possuíam
suficiente poder de retaliação naquele momento contra a segurança do território dos EUA, o famoso
missile gap. Além dos estudos de tomada de decisão, dentro mesmo da escola realista irão emergir novos
estudos ao longo das décadas trazendo à tona a contribuição da escola neorrealista clássica assim como a
escola da análise de política externa para a compreensão das dinâmicas para o que Waltz denomina de
primeira e segunda imagens das relações internacionais. Mas em todo o caso, o padrão de explicação
geral é em essência o mesmo: a aferição racional de custos, possibilidades e vantagens em termos sempre
de assegurar a sobrevivência e a estabilidade nas relações entre as potências.
de análise é um domínio singular e autônomo de outras dimensões de análise como a
econômica, a social, etc. (WALTZ, 1979, p. 79). Acima de tudo, o autor se preocupa em
demonstrar como as estruturas da política internacional são criadas e como afetam as
unidades, isto é, os Estados.
Conforme a lição de Waltz, a estrutura é um sistema compostos por unidades
caracterizadas pela polaridade que estabelecem entre si dado o sistema anárquico e as
capacidades que possuem (WALTZ, 79, p.114W). As capacidades são os atributos que
diferenciam as grandes potências das demais unidades do sistema. Da mesma forma que
o realismo clássico utiliza a noção de recursos de poder, o realismo estrutural entende
por capacidades os atributos e recursos econômicos, naturais, humanos, tecnológicos e
militares de que a unidade dispõe e que acabam por condicionar o padrão de polarização
ou relações pautadas nas dinâmicas do conflito e da competição entre as nações.
John Mearsheimer19, discípulo de Waltz, por sua vez, também afirma que a
busca pela sobrevivência deve consistir no objetivo central do Estado, no entanto, difere
ao afirmar que os atores estatais preferem estratégias de cunho ofensivo na disputa por
interesses. Assim, tanto pela manutenção do status quo quanto pelo lado das potências
revisionistas, o recurso à guerra ofensiva entre as grandes potências tem sido o padrão
histórico de competição. Além disso, a capacidade de promover, sustentar, suportar e
vencer guerras em larga escala caracterizaria um Estado como grande potência.
32
Guerra por procuração. É quando uma grande potência, a fim de diminuir os custos econômicos,
políticos e militares, opta por se utilizar de um terceiro ator num conflito com seu oponente estratégico.
padrão de relações entre elas. A previsibilidade no campo das ciências sociais sempre é
problemática em razão do relativo grau de certeza que o histórico de padrões de
conflitos entre as nações tem revelado no curso das décadas e mesmo dos séculos.
Afinal, sempre é lembrado que ninguém pareceu perceber o fim da União Soviética em
1991, fato que, à época chocou historiadores, sociólogos e cientistas políticos. Da
mesma forma, toda a análise acerca do debate acerca do declínio americano e a
ascensão chinesa, por mais que seja baseada em dados cientificamente analisados,
sempre pode surpreender.
Todavia, deve ser assinalado que o que é difícil prever é o grau de intensidade
do declínio do ciclo norte-americano paripassu ao avanço do ciclo chinês. Paralelamente
e interdependente desta lógica, deve ser apontada a importância da aliança estratégica
da China – terceira potência militar e em vias de se tornar a principal potência
econômica do mundo - com a Rússia que, conforme os estudos de Andrei Martyanov
(MARTYANOV, 2018, pp.14-40), analista militar russo-ucraniano que vive nos
Estados Unidos e que pesquisa as forças armadas russa e norte-americana se prefigura
como a principal potência militar do sistema, além de possuir o maior potencial
estratégico energético em termos de gás e petróleo do mundo 33. Assiste-se, no campo
geopolítico aos ventos da mudança que parecem soprar na direção leste, da Eurásia...
Conclusão
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