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TÓPICOS DE HISTÓRIA GERAL

AULA 1

Prof. Osvaldo Luís Meza Siqueira


CONVERSA INICIAL

Esta disciplina tem por objetivo desenvolver conhecimentos e conceitos


fundamentais para o estudo da história, nos conduzindo por uma agradável
viagem pelo tempo e por diferentes épocas. Nesta aula, vamos conhecer o que
é história e as formas de organização e periodização do conhecimento histórico.
Vamos tratar da história da humanidade, começando pelo período chamado
Pré-História.

TEMA 1 – UM OLHAR PARA O PASSADO

A história estuda a trajetória da humanidade pelo tempo – como os seres


humanos pensaram, agiram e sentiram nas sociedades em que viveram. O
estudo da história, de forma reflexiva, é um importante meio para se
compreender o processo de formação e transformação das sociedades
humanas. O conhecimento compilado pelos historiadores, ao investigarem as
fontes históricas, leva o ser humano à compreensão do passado e do seu tempo,
fazendo-o perceber-se como agente de transformação.
Pensar a história, portanto, nos faz olhar para trás e investigar os vestígios
que sobreviveram ao tempo e que chegaram até nós como indícios de um
passado, os quais representam a matéria-prima do historiador. É na compilação
e interpretação desses vestígios que o historiador vai buscar o conhecimento e
o entendimento do passado. Essa ação caracteriza, fundamentalmente, o ofício
do historiador.
Os vestígios representam as fontes do conhecimento para o historiador e
derivam da ação do ser humano que constrói sua realidade social e
culturalmente.

Figura 1 – Pintura rupestre

Créditos: Asit Jain/Shutterstock.

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Figura 2 – Ruínas romanas

Créditos: S.Borisov/Shutterstock.

Figura 3 – Dança folclórica

Créditos: Cambuff/Shutterstock.

O historiador, em seu esforço por conhecer e interpretar o passado, se


alimenta desse acervo de vestígios – materiais ou imateriais – que englobam as
mais variadas ações e atividades humanas, pois o ser humano, por viver em
sociedade, atua sobre o meio e gera cultura. De acordo com Bergmann (1989),
a história tem por preocupação “possibilitar uma consciência histórica”, de tal
maneira que forneça uma identificação do indivíduo com o coletivo e dele mesmo
como agente do processo histórico.

TEMA 2 – FORMAS DE PERIODIZAÇÃO

Culturas diferentes têm formas diversas de pensar e periodizar o tempo.


A cultura representa o aspecto fundamental da vida em sociedade, nos conecta
com o grupo e a comunidade a que pertencemos e nos diz quem somos.

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Segundo Schneider (1980), “cultura é um sistema de símbolos e significados.
Compreende categorias ou unidades e regras sobre relações e modos de
comportamento”. Assim estudar uma cultura é estudar um código de símbolos
partilhados pelos membros de determinada comunidade.
Nesse sentido, o tempo pode ser compreendido das mais diversas
formas, dependendo da cultura em questão, sendo marcos relevantes de
temporalidade expressos por meio de diferentes crenças, tradições e
entendimento de mundo. Podemos destacar como exemplo dessa diversidade
os judeus, os muçulmanos e os cristãos, que apresentam diferentes formas de
marcar o tempo.
Para os judeus, os anos passaram a ser contados a partir do que eles
acreditam ser a criação de Adão, 2.448 anos antes do chamado Êxodo, ou seja,
da saída dos hebreus do Egito sob a liderança de Moisés. Para os muçulmanos,
o primeiro ano do calendário corresponde ao momento da fuga do profeta
Maomé de Meca para a cidade de Yatreb, denominada Hégira, que ocorreu no
ano de 622 do calendário cristão, o qual, por sua vez, tem o marco inicial no
nascimento de Jesus. Ainda poderíamos mencionar outros calendários, como o
hindu e o maia.
Em virtude do colonialismo europeu do século XV, a cultura cristã
espalhou-se pelos continentes, tornando-se hegemônica no mundo. Apesar
disso, as diversas culturas ainda mantêm, particularmente, seus costumes,
tradições e a maneira de contar e demarcar o tempo.
O calendário cristão ocidental em uso atualmente é o calendário
gregoriano, proposto pelo Papa Gregório, no século XVI. Esse calendário tem o
nascimento de Jesus como marco inicial e considera, a princípio, dois períodos:
antes de Cristo (a.C.) e depois de Cristo (d.C.).

Figura 4 – Calendário gregoriano

É importante ressaltar que, para alguns historiadores, por representar um


fato eminentemente cristão, a contagem caracterizada como antes e depois de
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Cristo é um erro, já que desconsidera o respeito à diversidade cultural, daí
optarem pela denominação antes da Era Comum (AEC) e depois da Era Comum
(EC). Outro aspecto também considerado para essa preferência é o fato de o
monge Dionísio, que no século VI determinou a data do nascimento de Cristo,
ter errado em seus cálculos. De acordo com esse provável erro, Cristo teria
nascido seis anos “antes de Cristo”.

TEMA 3 – DIVISÕES DA HISTÓRIA

Os historiadores, ao escreverem sobre a história (Historiografia),


procuram organizar o conhecimento de forma didática a fim de fornecer uma
forma adequada ao entendimento do passado da humanidade. A fase mais
remota sobre a qual a história tenta formar um conhecimento, baseando as
pesquisas apenas em vestígios de achados arqueológicos (de fósseis,
instrumentos, pinturas etc.), é a chamada Pré-História, período que se inicia após
o aparecimento dos primeiros seres humanos. A maior parte dos livros didáticos
apresenta o surgimento da escrita como a divisão entre Pré-História e História,
apesar de alguns historiadores já não utilizarem esse critério.

Figura 5 – Divisão entre Pré-História e História

Para melhor estudo, o período da Pré-História é comumente dividido em


três fases:

• Paleolítico ou Idade da Pedra Lascada: de aproximadamente 4 milhões


a 10.000 anos a.C.;
• Neolítico ou Idade da Pedra Polida: de aproximadamente 10.000 a
5.000 anos a.C.;
• Idade dos metais: de aproximadamente 5.000 a 4.000 anos a.C.

Nessa organização didática do conhecimento histórico, após o surgimento


da escrita, momento em que o ser humano passou a relatar por meio de alguma
forma de linguagem escrita suas próprias vidas e experiências, temos a História.

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É importante, aqui, fazermos uma ressalva em relação ao termo Pré-
História. Em síntese, Pré-História significa “antes da História”, considerando,
assim, que só haveria a possibilidade de ter História após o surgimento da
escrita. Essa concepção foi cunhada pelos primeiros historiadores do século XIX,
com base na visão tradicional histórica de que as únicas fontes confiáveis para
se fazer História eram os documentos escritos e oficiais. Sabemos, hoje, que
essa é uma visão ultrapassada e que todos os vestígios deixados pelos seres
humanos são fontes históricas riquíssimas.
Sendo assim, considerar que só é possível ter História havendo escrita,
não só coloca milhares de anos da humanidade numa era sem História – a
chamada Pré-História –, como colocará centenas de sociedades ao longo do
tempo (e até os dias de hoje) como povos sem História, por serem de cultura
oral, ou seja, que não desenvolveram escrita, ainda que tivessem suas próprias
e eficientes formas de se comunicar e registrar.
Então, sabendo que o conceito de Pré-História é equivocado, porque,
ainda hoje, o utilizamos na periodização da História? Provavelmente por uma
questão de conveniência; porém é preciso levar em consideração que nenhuma
periodização é neutra, e também entender os motivos pelos quais escolhemos
uma e não outra forma de periodizar.
Pensando, então, nessa periodização tradicional, após o surgimento da
escrita, de forma geral, segue-se uma periodização que divide a história em uma
linha cronológica de acontecimentos considerados relevantes para o mundo
ocidental.

• Idade Antiga: do aparecimento da escrita (4000 a.C.) à queda do Império


Romano do Ocidente em 476 d.C.;
• Idade Média: da queda do Império Romano ao domínio de Constantinopla
pelos turcos-otomanos, em 1453;
• Idade Moderna: do domínio de Constantinopla pelos turcos-otomanos à
Revolução Francesa, em 1789;
• Idade Contemporânea: da Revolução Francesa à atualidade.

Essa divisão quadripartite da história, de origem francesa, apesar de


ainda bastante utilizada, é considerada uma visão eurocêntrica, com apenas
acontecimentos europeus como marcos divisórios entre os períodos. Outro fator
de crítica também é o fato de basear todos os marcos em acontecimentos

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políticos. Nem todos os historiadores concordam com essa divisão tradicional
com base na história política e propõem outras divisões, como a dos modos de
produção. Com enfoque econômico e tecnológico, essa divisão não segue a
ordem cronológica da periodização, observando, apenas, como cada grupo
humano produz sua sobrevivência e riqueza ao longo do tempo.

TEMA 4 – PRÉ-HISTÓRIA

Acredita-se que os primeiros seres humanos a andar sobre a Terra


surgiram na África, mais especificamente na região subsaariana, há mais de três
milhões de anos. Todavia, descobertas recentes constataram a possibilidade de
terem surgido hominídeos há cerca de 7 a 10 milhões de anos.
Os primeiros grupos humanos dependiam inteiramente da natureza e
tentavam dominá-la desenvolvendo instrumentos cada vez mais elaborados,
feitos de pedras, ossos e pedaços de madeira. Organizaram-se, inicialmente, em
bandos para sobreviver, pois o ser humano, comparado a outros seres vivos que
habitam o planeta, é bastante frágil e indefeso, de modo que a formação em
grupos era a única forma de sobrevivência. Portanto, para um humano, desde o
primeiro momento de sua história, viver em sociedade tornou-se uma
necessidade fundamental.

Figura 6 – Evolução do ser humano

Créditos: Linda Bucklin/Shutterstock.

A princípio, nas comunidades pré-históricas, existia uma forma de


apropriação coletiva dos bens necessários à sobrevivência, isto é, tudo era
compartilhado. A divisão do trabalho se dava naturalmente entre homem,
mulher, criança e idoso, de acordo com as possibilidades físicas de cada um. A

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cooperação era indispensável para a sobrevivência do grupo e,
consequentemente, do indivíduo.
O ser humano, quando comparado a outros seres vivos que habitam o
planeta, é frágil diante das forças da natureza. Outros animais possuem algum
tipo de “ferramenta” natural, própria de seu organismo, como dentes afiados,
garras fortes e longas, corpo recoberto por longos pelos ou carapaças, enfim,
“equipamentos” para sobreviver diante dos obstáculos naturais, por exemplo,
mudanças climáticas ou predadores. Esses mesmos animais, no entanto, não
conseguem criar recursos ou ferramentas. O ser humano, por sua vez, conta
com um “equipamento” muito especial, que lhe permitiu transformar a natureza,
superando obstáculos e criando para si próprio melhores condições de vida: o
raciocínio mais desenvolvido.
O ser humano tem capacidade de solucionar problemas e aperfeiçoar
soluções, com criatividade e inventividade, formular ferramentas, aparelhos,
máquinas e tudo o que considerar necessário para facilitar a vida em sociedade
e a sobrevivência no meio natural. É importante ressaltar, também, outro
equipamento da anatomia que foi fundamental para a aplicabilidade do que o
intelecto foi sempre capaz de criar: o polegar (ou dedo opositor), que desde o
início permitiu ao ser humano o movimento de pinça tão necessário para a
manipulação de objetos.
Como mencionado anteriormente, a Pré-História se refere a um período
anterior ao surgimento da escrita e, portanto, anterior ao que chamamos
convencionalmente de História, já que o ser humano ainda não registrava, por
intermédio da escrita, dados e informações sobre o mundo, o cotidiano e seus
costumes. No entanto, ele não deixava de ter um cotidiano cercado de
acontecimentos individuais e coletivos que permeavam sua vida e lhe
proporcionavam uma história.
A descoberta e o domínio da agricultura – chamada de Revolução
Agrícola – levaram o ser humano a passar de caçador, pescador e coletor (que
vivia em bandos nômades à procura de alimentos) à condição de agricultor e
pastor sedentário, produtor de sua própria sobrevivência.
Em uma economia produtora, a vida sedentária e mais segura de uma
aldeia tornou possível o crescimento da população, o desenvolvimento de uma
cultura mais elaborada e o aumento da complexidade da vida em sociedade, das
tarefas e das relações sociais.

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Veja, na Figura 7, a divisão didática da Pré-História, que estudaremos com
mais detalhes a seguir.

Figura 7 – Divisão do período da Pré-História

4.1 Paleolítico ou Idade da Pedra Lascada

Os primeiros grupos humanos eram caçadores, coletores e pescadores.


Sua subsistência dependia da caça, da pesca e da coleta de frutos e raízes. A
busca por meios de sobrevivência fez com que esses primeiros seres humanos
fossem nômades, mudando de um local para outro à procura de alimentos ou de
melhores condições climáticas.
Nessa fase, o ser humano aprendeu a manipular seus primeiros
instrumentos, como ossos e pedras, de forma bastante rudimentar (lascas de
pedra). Ainda se utilizava de abrigos naturais, como cavernas.
Uma das conquistas mais importantes desse período foi a descoberta e o
controle do fogo, que possibilitou a preparação de alimentos, a luta contra o
ataque de animais e o aquecimento durante o frio.

4.2 Neolítico ou Idade da Pedra Polida

Nessa época, surgiram novas condições (transformações ambientais e


novas técnicas) que permitiram ao ser humano o desenvolvimento da agricultura
(trigo, cevada) e a domesticação de animais (pecuária de bovinos, cabras ou
carneiros). À medida que as atividades agropastoris se desenvolviam, os grupos
humanos se tornaram sedentários (fixando-se à terra) e mais numerosos.
Surgem então as primeiras manifestações de vida espiritual e de organização
social. Esse período foi marcado por invenções, como instrumentos de pedra
polida, utensílios de cerâmica, tecelagem e construção de moradias.

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4.3 Idade dos Metais

Nessa fase, o ser humano desenvolveu a fundição de metais, como cobre,


bronze e ferro. A metalurgia possibilitou a produção de objetos mais resistentes
e de variadas formas. Desenvolveram-se, ainda, a escrita, a numeração, o
calendário e um sistema de pesos e medidas.
Toda a evolução tecnológica e cultural conquistada, até então, permitiu
um aumento populacional e provocou uma maior complexidade da vida em
sociedade, das tarefas e das relações sociais, o que levou à criação de cidades
e às primeiras civilizações.

TEMA 5 – HISTÓRIA

Como vimos, a partir do Período Neolítico houve um gradual aumento da


complexidade da vida em sociedade, levando ao surgimento de cidades, ao
aparecimento do Estado e das primeiras civilizações. Com um controle maior
sobre a natureza, foi possível produzir além do estritamente necessário à
sobrevivência do grupo, levando ao surgimento do excedente de produção
(sobra) e, com ele, à ideia de propriedade. O Estado seria então, o poder
instituído que agiria como defensor da propriedade privada e de seus detentores,
bem como árbitro entre as diferentes classes sociais que se formaram.
A civilização representaria, então, o estágio de maior complexidade de
vida em sociedade, em que já se tem uma cultura própria, um Estado constituído
com corpo administrativo e força militar, diferentes grupos sociais e divisão social
do trabalho, isto é, cada grupo produzindo de acordo com seu nível social. Há
acumulação de riqueza e exploração do trabalho de um grupo social sobre outro.
Poderíamos interpretar, ironicamente, que, ao nos tornarmos civilizados,
deixamos de ser cooperativos em nossa vida em sociedade para nos tornarmos
exploradores. Como vimos, a história, em uma linha cronológica de
acontecimentos, pode ser dividida nos seguintes períodos:

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Figura 8 – Períodos da História

5.1 Idade Antiga

Corresponde ao período inicial da história, relacionado ao surgimento das


primeiras civilizações na região denominada Crescente Fértil, que vai do Egito,
no nordeste da África, à região da Mesopotâmia, no Oriente Médio. Nessas
regiões, desenvolveram-se civilizações baseadas nos regimes de águas dos rios
Nilo, Tigre e Eufrates, e que tinham na agricultura sua principal atividade
econômica.

Figura 8 – Egito Antigo

Créditos: Bist/Shutterstock.

Este período também correspondeu às chamadas civilizações da


Antiguidade Clássica, Grécia e Roma, também consideradas civilizações de
modo de produção escravista, pois toda a produção de sobrevivência e riqueza
estava baseada na força do trabalho escravo.

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Figura 9 – Grécia Antiga

Créditos: Marzolino/Shutterstock.

5.2 Idade Média

Corresponde a um momento de transição entre a chamada Antiguidade e


a História Moderna. Durante esse período, que durou mil anos, ocorreu a
formação, consolidação e crise da sociedade feudal da Europa Ocidental, com o
consequente o surgimento do capitalismo.

Figura 10 – Castelo medieval

Créditos: Julia700702/Shutterstock.

Durante a Idade Média, ocorreu a consolidação da Igreja Católica não


apenas como força religiosa na Europa, mas também como força política,
passando a ditar a mentalidade da época.

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5.3 Idade Moderna

Corresponde ao período que se estende do século XV ao século XVIII,


marcando o final do feudalismo.

Figura 11 – Mona Lisa de Leonardo da Vinci

Créditos: Oleg Golovnev/Shutterstock.

Entre os temas de relevância desse período, temos:

• Absolutismo, ou formação das monarquias nacionais;


• Expansão marítima europeia;
• Renascimento cultural;
• Reforma religiosa ou protestante;
• Iluminismo;
• Revolução Industrial;
• Independência das colônias espanholas.

5.4 Idade Contemporânea

Período que se estende da Revolução Francesa, no século XVIII, até os


dias atuais. O capitalismo se consolida como sistema econômico, mas surge o

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socialismo e linhas de pensamento crítico à sociedade burguesa. Também
ocorreram conflitos de proporções mundiais.

Figura 12 – Guerra Fria

Créditos: Zapomicron/Shutterstock.

Entre os temas de relevância desse período, temos:

• Revolução Francesa;
• Imperialismo ou Neocolonialismo;
• Primeira Guerra Mundial;
• Revolução Socialista de 1917, na Rússia;
• Segunda Guerra Mundial;
• Guerra Fria;
• Nova Ordem Mundial.

NA PRÁTICA

A fim de desenvolver os conhecimentos trabalhados nesta aula, leia o


trecho do poema a seguir.

Leitura complementar
A idade da Terra

no início nem o início existia

o tempo era antes de antes

e depois ainda havia

um outro vazio maior

o vácuo incompleto

BEHR, N. Peregrino do estranho.


Brasília: Pau-Brasília, 2004, p. 13.
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Com relação ao poema anterior e aos múltiplos aspectos que ele suscita,
faça um apanhado do desenvolvimento humano em termos sociais e culturais
durante o período da Pré-História.

FINALIZANDO

Ao longo desta aula, buscamos compreender o que é história e qual a


função do historiador. Como vimos, a história tem a função primordial de
compreender o ser humano no tempo. Por meio de um olhar para o passado,
contemplamos as diferentes épocas da história, dos tempos anteriores ao
surgimento da escrita, chamados de Pré-História, aos períodos considerados
históricos. Nessa caminhada, observamos que a diversidade cultural cria olhares
diversos de entendimento de mundo e, também, de compreensão do passado e
de marcações do tempo.

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REFERÊNCIAS

BERGMANN, K. A história na reflexão didática. REVISTA BRASILEIRA DE


HISTÓRIA, São Paulo, v. 9, n. 19, set. 1989.

SCHNEIDER, D. American Kinship: A Cultural Account. Chicago: University of


Chicago Press, 1980.

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TÓPICOS DE HISTÓRIA GERAL
AULA 2

Prof. Osvaldo Luís Meza Siqueira


CONVERSA INICIAL

Para dar início à nossa caminhada pela História Geral, vamos começar
pela Antiguidade e pelo surgimento das primeiras civilizações. A partir das
comunidades agrícolas que se estabeleceram no período que se convencionou
chamar de pré-história, grandes civilizações passaram a se formar por volta de
7 mil anos atrás. A maioria desenvolveu-se nas proximidades de grandes rios,
aproveitando-se do regime de suas águas que favoreciam a fertilidade da terra
e a prática da agricultura. Assim, os vales dos rios Nilo, Eufrates e Tigre foram
primordiais para a formação das civilizações egípcia, suméria e babilônica na
região denominada Crescente Fértil (Figura 1), que compreende o Egito e a
Mesopotâmia no denominado Oriente Próximo. Pelas suas características, são
chamadas de sociedades agrárias ou férteis.

Crédito: Xerography / Shutterstock.

TEMA 1 – CIVILIZAÇÕES MESOPOTÂMICAS

O território denominado pelos gregos de Mesopotâmia (terra entre rios)


compreendia uma estreita faixa entre os rios Tigre e Eufrates e estava
enquadrado no chamado Crescente Fértil, área que compreendia desde o Egito
até o Rio Tigre. Era uma extensa região que reunia condições naturais para que
grupos de agricultores lá se fixassem. Por volta de 4.000 a.C., surgiram os
primeiros núcleos urbanos na região, desenvolvendo um sistema hidráulico que
incluía desde canais de irrigação até o controle das cheias dos rios. Por ser uma
vasta área de planícies férteis, extremamente propícia à ocupação humana,
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atraiu diversos povos – como sumérios, acádios, amoritas, assírios e caldeus –
que, combatendo uns aos outros, sucederam-se no domínio da região.
De modo geral, eles realizavam atividades agropastoris e urbanas,
dedicando-se, principalmente, ao comércio. A maioria dos camponeses vivia em
regime de servidão, mas também havia escravos, caracterizados principalmente
pelos povos dominados.
No plano político, o rei era considerado um representante dos deuses e
sua autoridade estendia-se a todas as cidades. Ele era auxiliado por ministros e
sacerdotes, governando em nome das divindades.
Esses povos se destacaram na ciência, na arquitetura e na literatura.
Desenvolveram a astrologia e a astronomia, estudando os movimentos de
planetas e estrelas. Também avançaram no domínio da matemática (as quatro
operações e a raiz quadrada) e criaram um calendário com ano de doze meses
e semana de sete dias.
Foram atribuídos a eles, em especial aos sumérios, o surgimento da
primeira escrita conhecida, a cuneiforme (feita em argila mole com um estilete
em forma de cunha). Já aos amoritas atribui-se o primeiro código de leis escritas,
o chamado Código de Hamurabi, baseado na Lei de Talião, presente também na
Bíblia, que determinava que as punições deveriam ser equivalentes em medida
ao crime cometido (“Olho por olho, dente por dente”).

TEMA 2 – ANTIGO EGITO, “UMA DÁDIVA DO NILO”

A história da civilização egípcia ainda exerce grande fascínio e


curiosidade. Muito do que se sabe sobre o Egito Antigo está ligado à
preocupação de seus habitantes com a vida após a morte. Pirâmides e túmulos,
encontrados até hoje, ajudam os cientistas a conhecerem um pouco mais desse
povo, de sua vida, crenças e cotidiano.
O Egito – ilustrado na área vermelha do mapa da Figura 2, a seguir – está
situado no nordeste da África, em um território predominantemente desértico;
apesar disso, a área estava integrada, na Antiguidade, ao Crescente Fértil,
juntamente com a Mesopotâmia. Isso só foi possível por conta Rio Nilo, que
atravessa a região até desaguar no Mar Mediterrâneo, tornando as terras
desérticas do Saara que margeiam o rio em um extenso oásis de terras férteis e
cultiváveis.

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Nascendo em uma região chuvosa e de densas matas, o Nilo recebe boa
parte do resíduo orgânico das florestas. Durante as cheias, deposita em suas
margens detritos que fertilizam o solo, e quando as águas voltam ao leito normal,
as margens estão prontas para o cultivo.
Os egípcios logo aprenderam a se aproveitar das cheias do rio,
desenvolvendo em suas margens uma rica e organizada civilização. O grande
historiador grego Heródoto, considerando que essa civilização egípcia só existia
em função do rio, afirmou: “O Egito é uma dádiva do Nilo”. No entanto, não
podemos desconsiderar os esforços dos habitantes do Nilo que, conjugados às
potencialidades deste rio, permitiram que a agricultura fosse possível.

Crédito: Imagestockdesign / Shutterstock.

2.1 Evolução da civilização egípcia

Os primeiros grupos humanos que se instalaram junto ao Vale do Nilo


datam de 4.000 a.C. No princípio, eles estavam divididos em pequenas aldeias
independentes, mas a prática da agricultura e o crescimento da população
favoreceram a formação das primeiras cidades.
Por volta de 3200 a.C. ocorreu a unificação política do Egito. O poder
centralizou-se nas mãos de um único soberano, o faraó, considerado um deus
entre os homens. Segundo a mitologia egípcia, todo faraó era considerado um
Hórus na terra. O deus Hórus era filho do deus Osíris, primeiro governante do
Egito, que teve seu trono usurpado por Seth. Após a morte de Osíris, Hórus entra

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em uma disputa com Seth pelo trono, na qual perde um de seus olhos. Após a
contenda entre Hórus e Seth, um tribunal de deuses decide que o trono pertencia
a Hórus por direito e, por isso, todo faraó passou a ser associado a Hórus em
vida e a Osíris quando morto. A suposta linhagem divina tornava o faraó um ser
sagrado no Egito, e acreditava-se que seu sangue era composto pelos traços
divinos do deus.
O primeiro faraó inaugurou o período denominado dinástico. A partir de
então, os egiptólogos dividiram a história do Egito unificado em três períodos:
Reino Antigo, Reino Médio e Reino Novo.

2.2 Economia e sociedade

A economia egípcia era administrada pelo Estado, isto é, pelo faraó, e


tinha por base a agricultura, que dependia exclusivamente do regime de águas
do Nilo. A população camponesa pagava tributos tanto na forma de produtos
quanto de serviços e era submetida a um regime de servidão coletiva chamado
de corveia. O Estado se apropriava do excedente agrícola, explorava mão de
obra compulsória e sustentava uma poderosa burocracia. Durante o período das
cheias do Rio Nilo, as atividades agrícolas eram suspensas, e os camponeses,
requisitados para atuar nas obras de construção; depois, com o retorno das
águas ao leito do rio, voltavam para o trabalho agrícola.
O quadro social do Egito apresentava, em seu topo, o faraó e sua família,
seguido de um número de privilegiados composto por sacerdotes, burocratas
(civis e militares) e a nobreza. Na base da sociedade, encontravam-se artesãos,
camponeses e escravos, sendo estes uma minoria.

2.3 Cultura e religião

A vida cultural no Egito Antigo era pautada por uma profunda


religiosidade, acompanhada de muita técnica no campo artístico e grande
desempenho no campo científico. Desenvolveram a matemática e a astronomia
e criaram um calendário solar, dividindo o ano em 365 dias.
Como os egípcios acreditavam na imortalidade, os mortos eram
mumificados para que os corpos fossem preservados. Essa prática religiosa
favoreceu o desenvolvimento da anatomia, da medicina e até da química. A
construção de templos e das pirâmides (Figura 3), que deveriam abrigar o corpo

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e as riquezas do faraó depois da morte, contribuiu para o aperfeiçoamento da
arquitetura. A edificação das monumentais pirâmides de Gizé, túmulos dos
faraós da quarta dinastia (Quéops, Quéfren e Miquerinos), bem como da famosa
Esfinge, é datada do período do Reino Antigo, isto é, entre 2686-2181 a.C.

Crédito: Merydolla / Shutterstock.

Foi a partir da decifração da escrita hieroglífica, realizada pelo francês


Champollion, em 1822, que a história egípcia pôde ser mais bem estudada. O
primeiro documento decifrado foi a Pedra de Roseta, encontrada por soldados
franceses em 1798.
Uma das principais crenças dos egípcios em relação à vida após a morte
era a certeza de que o morto passaria por um julgamento diante do deus Osíris.
A cena do julgamento é uma passagem bem conhecida de conjunto de
encantamentos chamado de Livros dos Mortos e mostra o coração do falecido,
em uma balança, sendo pesado ao lado da pluma da deusa Maat, que
representava a justiça.

Crédito: Guido Vermeulen-Perdaen / Shutterstock.


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TEMA 3 – OS HEBREUS E A TERRA PROMETIDA

Outros grupos humanos também se fizeram presentes nas proximidades


da região do Crescente Fértil, por vezes até ocupando seus territórios. Mas como
não puderam contar, na maior parte do tempo, com a ajuda de grandes
extensões de terras férteis, tiveram que se dedicar a formas diferentes de
sobrevivência.
Esse foi o caso dos hebreus, cuja civilização desenvolveu-se na região da
antiga Canaã, atual Palestina, entre o Egito e a Mesopotâmia, numa área de
pouca fertilidade, cortada pelo Rio Jordão. Originariamente, viviam como
pastores nômades na Mesopotâmia, organizados em tribos ou clãs
independentes e chefiados por um patriarca ou chefe de família.
A história hebraica tem forte influência religiosa. Esse povo se diferenciou
dos demais por ter adotado uma religião monoteísta; acreditava que seu único
deus, Iavé ou Jeová, havia feito uma aliança com ele para protegê-lo em troca
de sua única adoração. De acordo com a Bíblia, o patriarca Abraão recebeu de
Iavé a incumbência de conduzir seu povo até a Terra Prometida (Canaã) por
volta de 2.000 a.C.
A doutrina fundamental da fé dos hebreus, o chamado judaísmo,
encontra-se no Pentateuco (ou Torá), conjunto de livros do Antigo Testamento
da Bíblia. Ela se baseia no monoteísmo, na crença da imortalidade da alma, no
juízo final e na vinda de um messias salvador. Esses princípios religiosos se
tornaram o principal legado hebraico para a cultura ocidental, influenciando
outras duas religiões: o cristianismo e o islamismo.

TEMA 4 – GRÉCIA ANTIGA

Da desintegração das comunidades agrícolas do período pré-histórico


originaram-se sociedades submetidas a um sistema de servidão coletiva imposto
por estados centralizados que se estabeleceram principalmente na região
oriental do Mediterrâneo, como vimos. Mas surgiram também outras sociedades
cuja principal característica era o predomínio das relações escravistas de
produção, tal como existiram na Grécia e em Roma; ali, a produção se baseava
no trabalho escravo sob o domínio de uma elite de grandes proprietários de
terras e escravos. Inicialmente, a escravidão era limitada aos prisioneiros de
guerra, e com o tempo desenvolveu-se, também, a escravidão por dívida.

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Nas sociedades surgidas na Grécia e em Roma, a divisão em classes
envolvia, de um lado, os homens livres (grandes proprietários e pequenos
produtores), e, de outro, os escravos. Paralelamente, a expansão escravista
impulsionou o crescimento do comércio, que levou ao surgimento de uma classe
intermediária formada por grandes comerciantes, artesãos e armadores.
O território que hoje chamamos de Grécia já foi o centro de uma rica
civilização na Antiguidade. Era conhecido por Hélade, pois foi habitado pelos
helenos (povos indo-europeus provenientes da Ásia: aqueus, jônios, eólios e
dórios). O nome Grécia originou-se da palavra graeci, um dos povos que
habitaram primitivamente a região.
A ocupação humana no território grego aconteceu por volta de 2.000 a.
C., dando origem a uma das mais importantes civilizações da Antiguidade, pois
legou boa parte de sua cultura para a formação das civilizações ocidentais.

Crédito: Astudio / Shutterstock.

A Grécia Antiga não se constituiu em um Estado único, com apenas um


governo; era, na verdade, um conjunto de cidades-Estado independentes (pólis)
e rivais, das quais se destacaram, principalmente, Atenas e Esparta. O mar e as
montanhas dão ao território grego um aspecto fragmentado geograficamente, o
que, provavelmente, foi o que facilitou a fragmentação também política. Apesar
da independência, as cidades-Estado gregas mantinham características
culturais únicas (língua e religião), que identificavam essa civilização.

8
A pobreza do solo influenciou decisivamente a história da Grécia Antiga.
A baixa produtividade forçou os gregos a buscarem alimentos em outras regiões.
E como a presença do mar era uma constante, o litoral extremamente recortado
e a proximidade das ilhas contribuíram para o desenvolvimento da navegação,
oferecendo amplas possibilidades de conquista de outras regiões mais
produtivas, cujos habitantes podiam ser subjugados à condição de escravos,
utilizados principalmente na agricultura, mas também nas minas e nas oficinas
de artesãos das cidades onde comerciantes enriqueciam à custa dos escravos
como mercadoria.
As origens da civilização grega estão profundamente ligadas ao povo que
viveu na Ilha de Creta. Anteriores aos gregos, os cretenses se fixaram ali por
volta de 3600 a.C., de onde iniciaram ligações com o Egito, a Ásia Menor e a
própria Grécia, dominando o comércio. Sua cultura era brilhante e acabou se
fundindo a uma outra civilização, dos chamados aqueus, dando início à
civilização creto-micênica, pois a principal cidade dos aqueus era Micenas.
Inicialmente, a população grega organizou-se em pequenas comunidades
agropastoris, chamadas genos (comunidades gentílicas). Eram grandes famílias,
lideradas por um patriarca. Com o crescimento da população, a produção
coletiva se tornou insuficiente, e os chefes de família e seus descendentes
diretos passaram a se apropriar das melhores terras, formando-se uma
aristocracia rural.
Os indo-europeus chegaram em sucessivas levas. Primeiro foram os
aqueus, depois vieram os jônios (que fundaram a cidade de Atenas), os eólios
(que fundaram a cidade de Tebas) e, por fim, os dórios (que fundaram a cidade
de Esparta).
Com o decorrer dos séculos, os gregos expandiram seus domínios e
fundaram muitas colônias, ocupando vastas regiões que se estendiam pelo sul
da França, sul da Itália (denominada Magna Grécia) e norte da África, o que
acabou levando a choques de interesses com outros povos, como os persas nas
chamadas Guerras Médicas, e, até mesmo, entre as próprias cidades gregas,
como entre Atenas e Esparta na denominada Guerra do Peloponeso. Após
muitas guerras, as cidades-Estado gregas acabaram sendo invadidas,
inicialmente, pelo exército da Macedônia, comandado por Felipe II, pai de
Alexandre Magno e, mais tarde, por aquele que viria a se tornar o maior império
da época, Roma.

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Dentre as pólis gregas, Atenas, por suas contribuições para nossos
tempos atuais, tem um destaque especial na História. Foram os atenienses que
nos deixaram como legados a democracia e o conceito de participação do
indivíduo nos assuntos da cidade, a chamada cidadania. Em 506 a.C., Clístenes,
denominado o “pai da democracia”, assumiu o governo, baseando-se em
princípios de igualdade política e de participação de todos nas decisões do
governo (o princípio da isonomia). Porém, foi durante o governo de Péricles (461
a 429 a.C.) que a democracia ateniense atingiu a plenitude. As decisões
governamentais eram tomadas em uma assembleia popular, a Eclésia, realizada
ao ar livre, na qual todos os cidadãos do sexo masculino e com mais de 18 anos
podiam participar.

Crédito: Sven Hansche / Shutterstock.

É importante ressaltar que, apesar de todos os que eram cidadãos


poderem participar, a cidadania não era estendida à totalidade dos elementos da
sociedade. Ficavam de fora de direitos políticos mulheres, estrangeiros e
escravos, o que fazia da democracia ateniense um sistema patriarcal, elitista e
escravista.
Outra importante contribuição foi a filosofia. Até por volta do século VII
a.C., os gregos explicavam sua origem e a realidade em que viviam por meio da
mitologia, que, repleta de elementos simbólicos e sobrenaturais, buscava
explicar as ações humanas mediante a interferência dos deuses. A passagem
do mito à razão na cultura grega foi lenta e gradual. A princípio, essas duas
formas de entender e explicar o mundo coexistiram e interagiram; porém, a
crença na razão humana para interpretar e compreender o desconhecido levou
os gregos à investigação intelectual do mundo e suas coisas.

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No século VI a.C., surgiram os sofistas, que buscavam explicações mais
realistas para a existência humana; eles foram, de certa forma, os precursores
dos grandes filósofos gregos, que despontaram no século IV a.C. A filosofia
grega exerceu grande influência no pensamento racionalista ocidental. Podemos
destacar entre os principais nomes: Sócrates, que foi um grande questionador
(acusado de renegar os deuses, foi condenado à morte); Platão, que fundou a
Academia de Atenas e escreveu, entre outras obras, A República; e Aristóteles,
considerado o “pai da lógica”.

TEMA 5 – ROMA ANTIGA

Não existem documentos escritos sobre a fundação de Roma. Pesquisas


indicam que ela pode estar ligada às tribos italiotas dos sabinos e latinos que se
instalaram na região do Lácio, fundando várias aldeias. Entretanto, de acordo
com a tradição lendária, relatada pelo poeta romano Virgílio, Roma teria sido
fundada em 753 a.C. por dois gêmeos, Rômulo e Remo, netos do Rei Numitor,
de Alba Longa, e descendentes de Enéias, herói de Troia. Depois de fundar a
cidade, os dois irmãos disputaram o poder de reiná-la. Rômulo acabou matando
Remo e tornou-se o primeiro rei de Roma.

Crédito: Croato / Shutterstock.

Como vimos, a Grécia permaneceu ligada à concepção de fragmentação


política por meio de pólis independentes. Já Roma partiu para a construção de
um grande império unificado. A base de sua economia também era a mão de
obra escrava, e para manter e ampliar o sistema escravista teve que desenvolver

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uma política expansionista que trouxesse mais terras e escravos para a
agricultura. Em cada região conquistada, parte das terras era transformada em
terra pública, o ager publicus, que ficava nas mãos da aristocracia escravista.
Os diferentes grupos sociais na Roma Antiga estavam divididos conforme
podemos ver no Quadro 1.

Quadro 1 – Grupos sociais na Roma Antiga

Patrícios Latifundiários que compunham a nobreza local; eram os cidadãos


romanos.
Plebeus Comerciantes, artesãos e agricultores livres; eram a maioria da
população, a base do exército e não gozavam de direitos políticos.
Clientes Homens livres associados aos patrícios. Prestavam-lhes serviços.
Escravos Prisioneiros de guerra; eram considerados propriedade.

Da mesma maneira que na Grécia, em Roma o escravo realizava


inúmeros trabalhos, nos mais diversos setores: agricultura, artesanato,
comércio, minas, pedreiras e serviços especializados como o de músico e
professor. Ocorreram várias revoltas de escravos, inconformados com sua
situação e com a exploração a que eram submetidos.
A história de Roma pode ser dividida em três períodos, de acordo com a
sua organização política: Monarquia ou Realeza (753-509 a.C.); República (509-
27 a.C.); e Império (27 a.C.-476 d.C.). Vamos abordar brevemente cada um
deles.

5.1 Monarquia

As informações sobre Roma no período da Monarquia ainda estão ligadas


às lendas. Apenas sabemos que os quatro primeiros reis eram italiotas, e os três
últimos, etruscos. No ano de 509 a.C., descontentes com as medidas adotadas,
que beneficiavam os plebeus, os patrícios depuseram o rei etrusco Tarquínio,
implantando um governo republicano. O Senado, composto somente por
patrícios, tornou-se o órgão de maior poder na política romana.

5.2 República

Os patrícios passaram a controlar os altos cargos do governo. Dois


cônsules, com mandato de um ano, eram eleitos para o comando do exército e

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a administração da cidade. Em caso de graves crises políticas, nomeava-se o
ditador, um magistrado que governava com plenos poderes por, no máximo, seis
meses.
Como os plebeus não gozavam de direitos políticos, o Senado, após a
pressão exercida por esse grupo, criou o cargo de tribuno da plebe, cujo mandato
era de um ano. Os primeiros foram os irmãos Graco – Tibério e Caio. Tibério foi
eleito tribuno da plebe em 133 a.C., tentou melhorar as condições da população,
propondo uma espécie de reforma agrária, mas foi combatido pelos patrícios e
assassinado. Caio foi eleito tribuno da plebe dez anos depois e propôs uma série
de reformas: por intermédio da Lei Frumentária, o trigo deveria ser vendido
abaixo do preço aos plebeus e as terras deveriam ser redistribuídas. Novamente,
a oposição dos patrícios foi violenta, Caio entrou em luta com a aristocracia e,
cercado, pediu que um escravo o assassinasse.
A resistência às reformas dos irmãos Graco como tribunos da plebe não
conseguiu impedir que algumas leis surgissem em favor da população; porém, a
crise econômica por que passava a maioria da população romana, comparada
aos privilégios dos patrícios, estabelecia um clima de tensão social. A
superpopulação empobrecida de Roma criava uma situação insustentável, e
para tentar controlar o problema, o governo instituiu a chamada política do pão
e circo: distribuição gratuita de trigo aos plebeus e ingressos gratuitos nos
espetáculos de circo. Era uma forma de manter o povo ocupado, evitando
rebeliões.
Contudo, o antagonismo entre patrícios e plebeus não chegou a prejudicar
a ascensão da República romana, que expandiu, extraordinariamente, seu
território por intermédio de conquistas militares.
Entre 400 a.C. e 270 a.C., os romanos conquistaram toda a Península
Itálica. Em seguida, o expansionismo voltou-se para o Mediterrâneo Ocidental,
rica área dominada por Cartago, ex-colônia fenícia fundada no norte da África.
O conflito entre romanos e cartagineses, provocado pela disputa do controle do
comércio no Mediterrâneo, denominou-se Guerras Púnicas (entre 264 e 146
a.C.), pois os romanos chamavam os cartagineses de puni. Foram três grandes
conflitos, e ao final da guerra os romanos derrotaram os cartagineses, tomaram
seus domínios e destruíram completamente sua cidade.

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Após vencer Cartago, os romanos dirigiram seu imperialismo sobre
Grécia, Macedônia, Egito e regiões da Ásia Menor. Por fim, o Mar Mediterrâneo
foi inteiramente controlado e chamado de mare nostrum (nosso mar).
À medida que a expansão territorial prosseguia, alguns generais
conquistadores começaram a tentar estabelecer o controle sobre Roma, o que,
por fim, acabou levando ao estabelecimento do Império.

5.3 Império

O primeiro imperador romano foi Otávio Augusto, sobrinho do grande


general e ditador Júlio César, assassinado por uma conspiração do Senado.
Esse período pode ser dividido em dois momentos diferentes:

• Alto Império – corresponde ao momento de apogeu de Roma e de maior


expansão territorial;
• Baixo Império – corresponde ao momento de declínio e queda de Roma.

Crédito: Peter Hermes Furian / Shutterstock.

Apesar da prosperidade e da paz no primeiro período do Império, a vida


política com os sucessores de Otávio Augusto foi bastante agitada. Vários
imperadores controversos, como Calígula e Nero, contribuíram para o
enfraquecimento de Roma.
Com o tempo, o gigantismo do Império acabou por dificultar a
administração. As fronteiras se tornavam vulneráveis à invasão de bárbaros,
povos vindos do norte e do leste europeus que começaram a ocupar,

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gradativamente, os territórios conquistados pelos romanos. Some-se a isso uma
crise econômica causada pela retração do comércio, a ineficiência de uma
sequência de imperadores e o advento do cristianismo, que contribuiu para minar
importantes bases de sustentação do Império.
Nessa segunda metade da história do Império, merecem destaque alguns
imperadores: Diocleciano, criador da Tetrarquia, que dividiu a administração
entre quatro generais com a finalidade de obter estabilidade interna, mas sem
sucesso; Constantino, que transferiu a capital de Roma para Bizâncio
(Constantinopla), antiga colônia grega; e, por fim, Teodósio, que em 395 dividiu
o Império em duas partes: o Império Romano do Ocidente, com capital em Roma,
e o Império Romano do Oriente, com capital em Constantinopla (hoje Istambul,
na Turquia).

Crédito: Sidhe / Shutterstock.

O Império do Ocidente chegou ao fim no ano de 476, quando a tribo


bárbara dos germânicos hérulos, chefiada por Odoacro, derrubou o Imperador
Rômulo Augusto. Apenas o Império do Oriente sobreviveu e durou por mais mil
anos, durante toda a Idade Média (até 1453), quando a cidade de Constantinopla
caiu nas mãos dos turcos-otomanos.
Entretanto, não apenas o Império Romano do Ocidente chegou a seu
término em 476, mas também a Antiguidade. Um novo período da História
começava a partir de então, a Idade Média.

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NA PRÁTICA

Considerado o “pai da História”, o viajante grego Heródoto teve uma vida


invejável: observando e colhendo informações sobre as grandes civilizações de
sua época, percorreu os lugares mais interessantes da Antiguidade e viu de perto
monumentos, costumes, nações e cidades, das quais só ouvimos falar graças a
relatos como os que ele deixou.
Heródoto descreveu a população egípcia trabalhando em 550 a.C. da
seguinte forma:
“Eles extraem os frutos da terra com menor labor do que qualquer outro povo...
porque estão livres do trabalho de desatar a terra com arado, ou com enxada,
ou qualquer outro processo que o homem empregue para obter colheitas de
cereais; quando o rio entende de irrigar os campos e depois retira as águas, cada
homem semeia seu lote e lança os porcos; depois que as sementes estão bem
enterradas pelo patinhar dos porcos, eles os retiram e esperam o tempo da
colheita...”.

Considerando o texto de Heródoto, faça as seguintes interpretações:

1) Por que extraem frutos da terra com menor labor do que qualquer outro povo?
2) Qual a melhor condição para que o egípcio comece a semear a terra?

FINALIZANDO

Vimos, nesta aula, que a partir das comunidades agrícolas que se


estabeleceram no período da pré-história, grandes civilizações começaram a se
formar nas proximidades de grandes rios, aproveitando-se do regime de suas
águas para a prática da agricultura em grandes extensões de terras férteis.
Assim os vales dos rios Nilo, Eufrates e Tigre foram primordiais na região
denominada de Crescente Fértil, que compreende o Egito e a Mesopotâmia.
Mas também vimos que outras civilizações se estabeleceram em outras
regiões não tão favorecidas, como foi o caso dos hebreus, e outras sociedades
cuja principal característica era o predomínio das relações escravistas de
produção. Isso ocorreu na Grécia e em Roma, onde a produção se baseava no
trabalho escravo sob o domínio de uma elite de grandes proprietários de terras
e escravos.

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REFERÊNCIAS

ANDERSON, P. Passagens da Antiguidade ao feudalismo. São Paulo:


Brasiliense, 1974.

AYMARD, A.; AULOYER, J. O Oriente e a Grécia Antiga: as civilizações


imperiais. In: CROUZET, M. História Geral das Civilizações. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 1998.

______. Roma e seu Império: as civilizações da unidade romana. São Paulo:


Difel, 1988.

COULANGES, F. A Cidade Antiga. São Paulo: Hemus, 1975.

FUNARI, P. P. Antiguidade clássica: a história e a cultura através dos


documentos. São Paulo: Unicamp, 1995.

GRIMAL, N. História do Egito Antigo. Rio de Janeiro: Forense Universitária,


2012.

PEREIRA, M. H. R. Estudos de História da Cultura Clássica: cultura grega.


Lisboa: Gulbenkian, [s.d.].

PINSKI, J. 100 textos de História Antiga: textos e Documentos. São Paulo:


Contexto, 1991.

ROSTOVTZEFF, M. História de Roma. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,


1983.

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TÓPICOS DE HISTÓRIA GERAL
AULA 3

Prof. Osvaldo Luís Meza Siqueira


CONVERSA INICIAL

Olá! Anteriormente, estudamos a Antiguidade e tivemos uma visão das


primeiras civilizações estabelecidas pela humanidade – mesopotâmicas, egípcia
e, por fim, as chamadas civilizações clássicas, Grécia e Roma. Agora, vamos
analisar o período que se convencionou chamar de Idade Média, compreendido
entre a queda do Império Romano do Ocidente em 476 e a tomada da cidade de
Constantinopla, capital do Império Romano do Oriente (chamado de Império
Bizantino), pelos turcos otomanos em 1453.

TEMA 1 – DIVISÃO DO PERÍODO MEDIEVAL

O período da Idade Média (denominação criada pelos renascentistas e


iluministas, na que chamamos Idade Moderna), caracterizou-se, principalmente,
pelo desenvolvimento do sistema feudal na Europa Ocidental, que
descentralizou o poder político e estabeleceu uma economia basicamente
agrária de subsistência. Já no Oriente, tivemos uma diversidade de formações
políticas e econômicas, como o grande Império chinês no Extremo Oriente, o
advento da civilização islâmica na Arábia no século VII (que conquistou diversos
territórios, formando inicialmente califados e mais adiante dinastias locais); sem
falar no Império Bizantino, herdeiro do Império Romano no Oriente cristianizado
(em território grego e limítrofes entre a Europa Ocidental, Oriental e a Ásia.
Portanto, as características feudais, nessa fase da Idade Média, valem apenas
para a Europa Ocidental.
O período medieval pode ser dividido em:

• Alta Idade Média (século V ao século XI) – nesse período se deu a


formação e consolidação do feudalismo, por meio da interação entre três
elementos básicos: a civilização romana, a chegada dos povos “bárbaros”
(chamados assim pelos romanos), principalmente os germânicos, e o
fortalecimento do cristianismo.
• Baixa Idade Média (século IX ao século XV) – nesse período, se deu
tanto o auge quanto a crise do sistema feudal, a formação de novas
dinâmicas sociais e econômicas, principalmente por meio do surgimento
do capitalismo comercial, maior laicização do saber e do poder político.

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TEMA 2 – ALTA IDADE MÉDIA

A partir do século III, com a crise do Império Romano, os chamados povos


bárbaros migraram para as regiões do Império em busca de terras e de melhores
condições de sobrevivência. Segundo a visão dos romanos, todos os povos que
viviam fora de seu império e que não falavam o latim ou o grego eram
considerados bárbaros, isto é, não civilizados, conforme os padrões da cultura
romana. Eram de diferentes origens, com um modo de vida e uma organização
social e econômica próprias, que viviam ao norte e ao leste da Europa e da Ásia.
Os romanos sempre tiveram contato com eles, e foi a partir do século I da
era cristã que tais contatos se intensificaram. Inicialmente, a chegada desses
povos foi pacífica, tornaram-se colonos, comerciantes e artesãos à procura de
novas terras ou soldados mercenários que prestavam serviços ao exército
romano. Porém, por volta do século III, a presença dos bárbaros passou a
acontecer de forma violenta, pois a fragilidade de Roma havia tornado seus
domínios vulneráveis às invasões. Muitos desses povos se revoltaram contra a
dominação romana e/ou estavam sendo pressionados por outros a deixarem o
seu território (caso do avanço dos hunos, vindos da Ásia).

2.1 Instalação dos povos bárbaros

Dentre os povos bárbaros, os germânicos foram os que mais


contribuíram para a desintegração do Império Romano do Ocidente e para a
formação do feudalismo. Dedicavam-se à guerra, à caça, ao pastoreio e, a partir
do século II, abandonaram a vida nômade, passando a praticar a agricultura.
Desenvolveram a metalurgia, principalmente para a fabricação de armas e
carros de combate, pois a guerra era parte integrante de sua vida – toda a
população masculina participava do exército. Os guerreiros juravam lealdade a
seu chefe (rei), e esse juramento, chamado de comitatus, foi um dos elementos
da organização política do sistema feudal.
Os germânicos se espalharam por diversas regiões do antigo Império do
Ocidente e fundaram vários reinos. A principal característica dos novos reinos foi
a mistura de elementos germânicos com os da cultura latino-romana.
O cristianismo foi incorporado por esses novos reinos, e as línguas
bárbaras se misturaram ao latim, dando origem aos idiomas falados até hoje na
Europa como francês, italiano e espanhol.

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Entre os reinos que se formaram, podemos principalmente destacar os
que estão dispostos no Quadro 1.
Quadro 1 – Reinos

Reino dos Francos Estabeleceu-se na região da Gália (atual território da França)


Reino dos Visigodos Estabeleceu-se na Península Ibérica
Reino dos Ostrogodos Estabeleceu-se na Península Itálica
Reino dos Anglo-saxões Estabeleceu-se na região da atual Inglaterra

Figura 1 – Europa Ocidental

Crédito: Maxx-Studio / Shutterstock.

Merece principal destaque o Reino Franco, que se formou e se


desenvolveu na Europa Central sob o comando de duas dinastias: a Merovíngia
(séculos V a VIII); e a Carolíngia (séculos VIII a IX). A dinastia Carolíngia foi a
mais importante e duradoura, transformando-se em um grande império,
principalmente sob o comando de Carlos Magno. No Natal de 800, o Papa Leão
III o coroou como o novo Imperador do Ocidente na Igreja de São Pedro, devido
ao fato de ele ter restaurado, com suas conquistas, grande parte do antigo
Império Romano do Ocidente, mas, principalmente, por ter levado o cristianismo
aos povos dominados. Porém, com sua morte – e após grande disputa entre
seus herdeiros –, o império se fragmentou, levando ao definitivo processo de
feudalização da Europa.

2.2 Formação e consolidação da Igreja Católica

Durante a crise do Império Romano, houve finalmente o reconhecimento


de liberdade de culto aos cristãos por meio do Edito de Milão em 313, pelo
Imperador Constantino. Depois, no Concílio de Niceia (325), foram estabelecidos

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o primado da Igreja Romana sobre a cristandade e importantes dogmas da
doutrina. Ainda no século IV, se escolheram os textos que compuseram o Novo
Testamento. Tudo foi escrito em grego (Cristo significa “o ungido” em grego) e
depois traduzido para o latim por São Jerônimo no século V. Durante os séculos
seguintes, os monges copistas (Figura 2) reproduziram esses textos a mão e
também os do chamado Velho Testamento que, juntos, compõem hoje a Bíblia.

Figura 2 – Monges copistas

Crédito: Morphart Creation / Shutterstock.

Foi o Imperador Teodósio, no Império Romano do Oriente, que em 380


elevou o cristianismo à religião oficial dos romanos. Esse reconhecimento
significou a tentativa de buscar uma nova forma de manter e dar continuidade ao
poder de Roma. Começava, a partir de então, a aliança política entre os chefes
dos cristãos (bispos, patriarcas) e os líderes políticos, o que resultou na
sobrevivência do cristianismo mesmo após a queda de Roma. Finalmente, em
455, o bispo de Roma se tornou o chefe de toda a Igreja, ocasião em que foi
escolhido como papa Leão I, considerado como primeiro sucessor do apóstolo
Pedro.
No Império decadente, a Igreja se apresentou como uma força paralela
dentro do Estado Romano. Foi crescendo em poder, arrecadando enormes
riquezas recebidas por doações de seus fiéis, que se tornavam cada vez mais
numerosos e diversos entre a população.
A Igreja organizou-se, copiando a forma administrativa e hierárquica do
Império, e passou a se denominar Católica, isto é, universal. Em meio à
desorganização provocada pelas invasões bárbaras e pela crise do Império,
praticamente apenas ela conservou sua identidade institucional.
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Durante a Idade Média, a Igreja concentrou praticamente toda a cultura
intelectual, e a maior parte da população era analfabeta (tanto nobres quanto
camponeses). Valendo-se de sua influência religiosa e prerrogativa de liderança
sobre os cristãos, exerceu controle sobre a sociedade, submetendo todos a uma
mentalidade que colocava Deus como o centro de todas as coisas (teocentrismo)
e que tudo acontecia conforme Sua vontade, passando a considerar como
"infiéis" ou "hereges" todos aqueles que não seguissem seus ditames ou
tentassem desviar o credo romano.

2.3 Feudalismo

O desmoronamento, século após século, do que ainda restava da


civilização romana no Ocidente fragmentou a Europa em diversos reinos e
governos locais. Com o surgimento dos reinos bárbaros, a noção de Estado e de
governo centralizado apagou-se progressivamente ao longo dos séculos. As
grandes propriedades rurais dos romanos (as vilas) levaram à formação dos
feudos de economia essencialmente agrária, em que a terra era a principal fonte
de riqueza. O processo se acentuou principalmente após a queda do império de
Carlos Magno, auxiliado também pelas divisões administrativas que o imperador
havia criado (dividindo territórios e poderes a duques, condes e marqueses).
A produção se concentrou no feudo, e a posse de grandes extensões de
terras tornou-se sinônimo de fortuna e poder. Os grandes proprietários de terras,
chamados de senhores feudais, transformaram seus domínios em unidades
autossuficientes (numa economia de pura subsistência).
Os feudos não só concentraram a atividade agrícola, mas, também, a
indústria caseira e a criação de animais. Normalmente, eram compostos por um
castelo, residência do senhor feudal e seus familiares; pela vila, onde moravam
os servos; por uma capela; e, ainda, por celeiros, fornos, açudes e pastagens
(Figura 3). Esse modelo de economia rural de subsistência, sem preocupação
de gerar excedentes, desestimulou o comércio e tornou o uso de moedas quase
inexistente durante um longo período dentro da Idade Média.

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Figura 3 – Terras de um feudo

Crédito: Complot / Shutterstock.

Com a descentralização do poder político, as leis se estabeleceram


mediante costumes que eram transmitidos oralmente (lei consuetudinária), à
maneira dos povos germânicos. Isso fazia com que em cada propriedade rural
os senhores governassem impondo leis e padrões morais de acordo com
conceitos próprios.
O quadro social se apresentava dividido entre os senhores feudais, que
eram grandes proprietários rurais, e seus dependentes, os camponeses
(lavradores da terra) que não possuíam terras próprias e eram obrigados a
trabalhar e produzir nas terras do senhor, em troca de moradia e subsistência.
Tratava-se, grosso modo, de uma sociedade estamental, pois não havia
mobilidade social, já que as terras pertenciam à nobreza e apenas eram
concedidas de nobre para nobre ou por herança.
Basicamente, a sociedade feudal se idealizava com base em três
posições hierarquicamente ordenadas (listadas abaixo e ilustradas na Figura 4):

• Oratore: os que rezavam, referente ao clero católico;


• Bellatore: os que combatiam, referente aos nobres e cavaleiros;
• Laboratore: os que trabalhavam, referente aos servos camponeses.

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Figura 4 – Estamentos sociais da Europa feudal

Crédito: Ivector / Shutterstock.

TEMA 3 – IMPÉRIO BIZANTINO

A cidade de Bizâncio (atual Istambul) foi inicialmente uma colônia grega.


Situada entre a Europa e a Ásia, no Estreito de Bósforo, tornou-se rota
obrigatória de passagem de caravanas de mercadores entre o Oriente e o
Ocidente. Sua localização privilegiada e estratégica a fez alvo de disputas entre
os povos desde a Antiguidade. Por muitas vezes foi invadida e dominada,
inclusive pelos romanos, que acabaram por integrá-la a seu Império.
Em 330, o Imperador Constantino transferiu a capital do Império para
Bizâncio e mudou seu nome para Constantinopla (Figura 5). Mais tarde, em 395,
o Imperador Teodósio dividiu o Império em duas partes: Império Romano do
Ocidente, com capital em Roma; e Império Romano do Oriente, com capital em
Constantinopla.

Figura 5 – Constantinopla

Crédito: Metehan Bahadir / Shutterstock.

O Império Romano do Ocidente não conseguiu deter as invasões,


principalmente dos germânicos, e se desfez em vários reinos bárbaros em que
se estruturaria a sociedade feudal. Já o Império Romano do Oriente resistiu e se
manteve, dando origem à chamada civilização bizantina.

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Originalmente, os domínios do Império Bizantino se estendiam pela
Península Balcânica, Ásia Menor e norte da África, mas, posteriormente, foram
conquistadas regiões do sul da Europa e do norte da África, localizadas mais ao
Ocidente. Esse império alcançou grande desenvolvimento comercial marítimo e
terrestre, tornando-se a mais rica e urbanizada região da Europa Medieval. Além
de comercializar, Constantinopla fabricava artigos de luxo de excelente
qualidade como joias, tecidos finos e trabalhos em ouro e marfim.
O Império Bizantino atingiu seu apogeu no governo de Justiniano (527 a
565, século VI), tanto na expansão territorial, reconquistando terras perdidas
pelo Império do Ocidente, quanto na produção econômica e cultural. Seus
domínios alcançaram a Península Ibérica, áreas do norte da África e a Península
Itálica.
A religião predominante era o catolicismo, porém, diante da elevada
diversidade étnica e do espírito cosmopolita de sua população, o culto cristão
passou a assumir características próprias, diferenciando-se da Igreja oficial
romana. Com o tempo, surgiram diferentes correntes religiosas internas que
questionavam alguns dogmas cristãos. Esses questionamentos originaram as
chamadas heresias, ou seja, crimes contra a fé católica por discordarem da
doutrina oficial da Igreja em Roma.
Os interesses políticos e as diferenças de dogmas e de rituais provocaram
uma série de atritos entre Roma e Constantinopla. Finalmente em 1054, deu-se
o rompimento, o chamado Cisma do Oriente, originando duas Igrejas distintas:
Igreja Católica Apostólica Romana, com sede em Roma, comandada pelo papa;
e Igreja Cristã Ortodoxa Grega, com sede em Bizâncio, comandada pelo
patriarca de Constantinopla (Figura 6).

Figura 6 – Padre ortodoxo

Crédito: Vladimir Sviracevic / Shutterstock.


9
A influência cultural de diferentes povos, ao mesmo tempo que acabou
dando moldes a um cristianismo próprio, também fez da cultura bizantina a mais
brilhante de toda a Europa durante a Idade Média. A arte, predominantemente
religiosa, reunia, harmoniosamente, características gregas, romanas e orientais,
com destaque para os mosaicos (Figura 7) e as pinturas em vitrais.

Figura 7 – Mosaico bizantino

Crédito: Ben Bryant / Shutterstock.

O Estado e a Igreja patrocinavam a construção de grandes templos


religiosos, que tinham como marca arquitetônica o uso de uma cúpula (ou
abóbada) arredondada, significando uma espécie de “coroa” sobre o altar. As
igrejas construídas durante o reinado de Justiniano representavam a
grandiosidade das construções religiosas, sendo o grande destaque a Catedral
de Santa Sofia (Santa Sabedoria), conforme podemos ver na Figura 8.

Figura 8 – Imagem da Igreja de Santa Sofia

Crédito: Alexanton / Shutterstock.

Nos anos finais da Idade Média, a posição estratégica de Constantinopla


despertou a cobiça por parte do Império Turco Otomano, levando à queda da
10
cidade perante as tropas dessa nova potência do Oriente em 1453. Sob o
domínio dos turcos otomanos, Constantinopla ganhou a denominação de
Istambul.
A queda de Constantinopla foi considerada um importante marco na
história do Ocidente para a historiografia e passou a demarcar a divisão entre a
Idade Média e a Idade Moderna.

TEMA 4 – CIVILIZAÇÃO ÁRABE MUÇULMANA

Durante a Alta Idade Média, enquanto o feudalismo se estruturava no


Ocidente e o Império Bizantino se fortalecia, surgiu durante o século VII, no
chamado Oriente Médio, a civilização islâmica (muçulmana) na Península
Arábica (Figura 9).

Figura 9 – Península Arábica

Crédito: Weredragon / Shutterstock.

Maomé, considerado o profeta do islamismo, segundo a crença, teria


recebido as revelações da nova fé do Anjo Gabriel, que lhe anunciou a existência
de um único Deus (a palavra Allah do idioma árabe significa Deus).
Por colocar em risco o poder dos coraixitas (os guardiões do santuário
dos ídolos da Caaba, em Meca) com a nova fé, Maomé foi perseguido e teve
que fugir para a cidade de Yatreb em 622, acompanhado de seus seguidores e
sendo recebido pelas autoridades locais, que aceitaram a sua pregação. Esse
fato deu início ao calendário muçulmano, ficando conhecido como Hégira (fuga).
Mais tarde, em homenagem a Maomé, a cidade passou a ser chamada de

11
Medina (cidade do profeta), onde o profeta conseguiu converter um grande
número de seguidores.

Figura 10 – Cidade de Meca

Crédito: Reedi / Shutterstock.

Em 630, Maomé retornou a Meca. Vencendo seus inimigos coraixitas,


transformou a cidade em um grande centro de peregrinação e de irradiação da
fé islâmica. Dois anos depois, ele faleceu, mas deixou sua crença difundida,
fazendo com que a unificação religiosa trouxesse consigo uma unificação política
das diversas tribos árabes.
Os seguidores de Maomé, após a morte dele, reuniram seus
ensinamentos no Corão ou Alcorão (a leitura) – livro sagrado do islamismo que
serve como um código de justiça, de moral e de normas sociais.
Os chamados khalifas (sucessores de Maomé) iniciaram uma sequência
de conquistas territoriais, as quais permitiram aos árabes dominarem o Oriente
Médio, norte da Índia e da África, regiões da Ásia Central, ilhas do Mediterrâneo
e parte da Península Ibérica.
Os árabes tinham certa tolerância com relação aos povos conquistados,
sobretudo de outras religiões, principalmente em se tratando de cristãos e
judeus, considerados por eles como povos protegidos; porém, aqueles que se
convertiam ao Islã passavam a usufruir privilégios, como isenção de impostos e
acesso a cargos públicos.
Entretanto, a grande extensão alcançada pelo Império Árabe e a
diversidade étnica e socioeconômica dos povos conquistados, aliadas às
rivalidades e ambições dos khalifas, provocaram o enfraquecimento e a

12
fragmentação do Império. Isso fez surgir vários califados independentes, entre
os quais o de Córdoba (Espanha) e do Cairo (Egito).

TEMA 5 – BAIXA IDADE MÉDIA

Foi durante a chamada Baixa Idade Média, que se estendeu do século XI


ao século XV, que a Europa Ocidental presenciou o auge do feudalismo, mas
também a sua decadência (a partir da crise do século XIV) e o surgimento de
uma nova ordem econômica, política e social: a capitalista.

5.1 As cruzadas

Como sabemos, foi na Palestina que Jesus Cristo viveu, fez sua
peregrinação e foi crucificado em Jerusalém, cidade que se tornou sagrada para
toda a cristandade. Porém, desde o século VI os territórios considerados
consagrados pelos cristãos estavam em posse do islã. Então, em 1095, o Papa
Urbano II, no Concílio de Clermont, convocou todos os cristãos a lutarem contra
os muçulmanos a fim de reconquistar a Palestina, a chamada Terra Santa e,
principalmente, Jerusalém. Ao todo, foram oito cruzadas (em nome da cruz)
organizadas pela cristandade europeia ao longo de 200 anos em que ondas
sucessivas de milhares de peregrinos armados, aventureiros, guerreiros,
cavaleiros medievais e exércitos liderados por reis se lançaram ao Oriente
Médio, conforme ilustrado na Figura 11.

Figura 11 – Cruzados rumo ao Oriente

Crédito: Vuk Kostic/ Shutterstock.

As motivações que levaram à ocorrência das cruzadas não se limitaram


apenas ao caráter religioso, por mais que possa parecer, pois também foram
determinadas por aspectos políticos, econômicos e sociais.
13
Na Idade Média, a Igreja Católica consolidou sua influência e poder sobre
a Europa Ocidental; porém, por meio das cruzadas, criou um mecanismo com o
qual também poderia expandir seu domínio para o restante da Europa e da Ásia
Ocidental, principalmente, na busca de refazer a unidade cristã, rompida com o
Cisma do Oriente de 1054.
As cruzadas também surgiam como uma solução para o grande
crescimento populacional. Nobres feudais sem direito a terras na Europa, filhos
de servos excluídos dos feudos, entre outros, formavam uma grande massa de
desocupados, mercenários e miseráveis que saqueavam pelas estradas e viviam
marginalizados. Estes, envoltos por fervorosa fé ou ambição, acabaram por se
somar aos exércitos que rumaram ao Oriente a fim de resgatar a Terra Santa.
Portanto, mesmo com o significativo sentimento religioso que motivou as
cruzadas, não podemos considerá-lo como o único fator determinante.
No princípio, os cruzados conseguiram reconquistar Jerusalém (Figura
12), cometendo um violento massacre que não poupou nem sequer os cristãos
que viviam na cidade sagrada – conforme um relato da época, as ruas foram
cobertas de sangue”. Porém, alguns anos depois, em 1187, os muçulmanos se
reestruturaram ao sul, no Cairo (Egito), e, liderados pelo sultão Saladino,
retomaram a cidade para não mais perdê-la.

Figura 12 – Cidade de Jerusalém

Crédito: Meunierd / Shutterstock.

Finalmente, em 1291, o islã retomou definitivamente o último pedaço da


Terra Santa ainda em poder dos cristãos. Apesar do fracasso militar que
representou, as cruzadas contribuíram para as profundas transformações
europeias que marcaram o fim do sistema feudal.
14
5.2 Renascimento comercial e urbano a partir dos séculos XI/XII

Por meio das cruzadas, os europeus tiveram contato com outro universo
cultural, com outras formas de vida e com produtos até então quase
completamente desconhecidos para eles. Estamos nos referindo às chamadas
especiarias (Figura 13) como variados tipos de temperos (gengibre, pimenta do
reino, canela, cravo, mostarda e noz moscada), artigos de luxo como perfumes,
essências, tecidos finos como seda, porcelanas, almofadas, tapetes, joias e
inúmeros outros produtos que passaram a ter grande aceitação entre a
população europeia acostumada com móveis rústicos, camas desconfortáveis,
tecidos grosseiros, alimentação desprovida de temperos e utensílios simples e
grosseiros.

Figura 13 – Especiarias do Oriente

Crédito: Milos Batinic / Shutterstock.

O Mar Mediterrâneo se tornou, então, palco das principais rotas marítimo-


comerciais entre o Oriente e o Ocidente. Isso beneficiou muito as cidades
italianas como Veneza (Figura 14) e Gênova, por seu posicionamento geográfico
privilegiado no Mediterrâneo, transformando-as nos mais importantes centros
comerciais, que distribuíam os produtos orientais para todo o continente
europeu. Fora do Mediterrâneo, no norte da Europa, as atividades comerciais
também se desenvolveram, e Flandres passou a dominar o comércio em todo o
Mar do Norte.

15
Figura 14 – Veneza

Crédito: Pascal Lagesse / Shutterstock.

Com o tempo, formou-se uma extensa rede de vias terrestres, e no


cruzamento dessas vias se organizavam feiras, que eram, a princípio,
itinerantes, indo de lugar em lugar, vendendo as tão desejadas especiarias
(Figura 15). Inúmeras pessoas se voltaram para novas atividades econômicas,
como o artesanato e, principalmente, o comércio. Migrando para os antigos
centros urbanos onde poderiam desenvolver suas atividades, provocaram o
crescimento das velhas cidades e o surgimento de novas, transformando, aos
poucos, a vida rural da Idade Média em vida urbana.
Também para os servos, que viviam uma dura realidade nos feudos,
migrar para as cidades tornou-se uma forma de melhorar suas miseráveis
condições de vida. Por fim, o crescente desenvolvimento comercial europeu fez
reis e senhores feudais e até cidades passarem a cunhar as próprias moedas.

Figura 15 – Feira medieval

Crédito: Mauro Rodrigues / Shutterstock.


16
Após séculos de existência do sistema feudal, em que a economia era
praticamente de subsistência, o renascimento do comércio provocou um
aumento na circulação de moedas, e o capitalismo comercial começou a tomar
corpo.
Os centros urbanos, que surgiam em pontos estratégicos para o comércio,
estavam preocupados com sua defesa e ergueram muros, constituindo os
chamados burgos, o que permitiu usar tal palavra para se referir às cidades
medievais; consequentemente, seus moradores passaram a ser chamados de
burgueses. Essa burguesia, ligada, geralmente, ao comércio, passou a
representar uma nova classe social, na maioria dos casos enriquecida, tornando
a acumulação de capital a principal fonte de riqueza em lugar da terra, como fora
no feudalismo.
Assim, no transcorrer da Idade Média acompanhamos a consolidação da
sociedade feudal da Europa Ocidental, bem como sua dinâmica e
transformação, com o surgimento das práticas que viriam a estabelecer o
capitalismo moderno.

NA PRÁTICA

Leia o texto, relativo à vida de Godric de Finchale, que viveu na Europa


do século XI.

“[Godric] decidiu não seguir a vida de lavrador. […] Aspirando à vida de


mercador, começou a seguir o modo de vida do vendedor ambulante,
aprendendo primeiro como ganhar em pequenos negócios e coisas de preços
insignificantes; e então, sendo ainda um jovem, o seu espírito ousou a pouco e
pouco comprar, vender e ganhar com coisas de maior preço. Primeiro viveu
como um mercador ambulante por quatro anos, andando a pé e carregando
fardos muito pequenos; depois […] começou a lançar-se em viagens mais
atrevidas e a ir por mar, junto à costa, até as terras estrangeiras que ficavam à
volta. Negociou em mercadorias variadas e no meio destas ocupações aprendeu
muito da sabedoria do mundo, […] porque trabalhava não apenas como
mercador, mas também como marinheiro. […] Nas terras onde encontrava certas
mercadorias raras e por isso mais preciosas, transportava-as para as partes
onde eram menos familiares e cobiçadas pelos habitantes a preço de ouro. Fez
desta maneira muitos lucros com todas as suas vendas e reuniu avultados bens

17
com o suor do seu rosto, visto que vendia caro num lugar as mercadorias que
tinha comprado noutro por um preço inferior.” (Espinosa, 1972)

Explique por que, nesse período, era possível que jovens como Godric
não seguissem a vida de lavrador.

FINALIZANDO

Nesta aula, estudamos o período medieval em diferentes momentos – a


Alta e a Baixa Idade Média – e como se deu a formação e consolidação da
sociedade feudal a partir do estabelecimento dos reinos bárbaros e do processo
de feudalização, mediante o desmantelamento do Império construído por Carlos
Magno.
Como vimos, foi nesse período que a Igreja Católica se apresentou como
uma força, que ao longo do período, determinou a mentalidade, ditando a
maneira de pensar, sentir e agir.
Observamos que a partir do século XII profundas transformações
começaram a acontecer, levando a sociedade feudal – que praticava uma
economia basicamente agrária de subsistência – a uma nova realidade voltada
ao excedente de produção, consolidando, passo a passo, o caminho que levaria
à chamada Idade Moderna.

18
REFERÊNCIAS

ANDERSON, P. Linhagens do Estado Absolutista. São Paulo: Brasiliense,


2017.

______. Passagens da Antiguidade ao feudalismo. São Paulo: Brasiliense,


1974.

AYMARD, A.; AULOYER, J. Roma e seu Império: as civilizações da unidade


romana. São Paulo: Difel, 1988.

DUBY, G. (Org.). História da vida privada: da Europa Feudal à Renascença.


São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

______. Guerreiros e camponeses. Lisboa: Estampa, 1993.

ESPINOSA, F. (Org.). Antologia de textos clássicos medievais. Lisboa: Sá da


Costa,1972.

LE GOFF, J. Para um novo conceito de Idade Média: tempo, trabalho e cultura


no Ocidente. Lisboa: Estampa, 1993.

______. A civilização do Ocidente Medieval. Bauru: Edusc, 2005.

RUCIMAN, S. A Queda de Constantinopla. Rio de Janeiro: Imago, 2002.

SONN, T.; SOUSA, M. H. R. R. de. Uma breve história do islã. São Paulo:
Editora José Olympio, 2018.

19
TÓPICOS DE HISTÓRIA GERAL
AULA 4

Prof. Osvaldo Luís Meza Siqueira


CONVERSA INICIAL

Nesta aula, vamos estudar a Idade Moderna, período da história que se


estende do século XV ao século XVIII. Como vimos anteriormente, no decorrer
da Baixa Idade Média teria ocorrido um processo de decadência do feudalismo,
originado pelo renascimento do comércio, das cidades e pelo surgimento da
burguesia, a partir do século X. A centralização do poder levou ao absolutismo
monárquico e ao surgimento do Estado moderno, que marcou o auge do
chamado antigo regime, mas também de seu processo de declínio com base em
uma nova mentalidade humanista e racional, que, da Renascença, levaria ao
pensamento crítico e revolucionário do Iluminismo.

TEMA 1 – MONARQUIAS NACIONAIS

A decadência do sistema feudal, o desenvolvimento do comércio e o


crescimento das cidades caracterizaram o processo de passagem da Idade
Média para a Idade Moderna. Essas transformações, ocorridas na Europa
Ocidental, provocaram mudanças sociais e políticas: o fortalecimento da
burguesia (composta por artesãos e comerciantes) e a centralização do poder
político nas mãos dos reis, o que levou à formação das monarquias nacionais.
A formação das monarquias nacionais resultou da aliança entre a
burguesia, que tinha interesse em derrubar as rígidas estruturas do sistema
feudal, e o rei, que pretendia centralizar o poder em suas mãos. Durante o
período feudal, a Europa estava dividida em diversos reinos, porém o poder
político apresentava-se descentralizado nas mãos dos senhores feudais. Os reis
tinham o poder de direito, mas nem sempre o exerciam de fato. No final da Idade
Média, esse domínio local da nobreza feudal passou a representar um grande
obstáculo para o crescimento das cidades e para o desenvolvimento do
comércio, pois não havia uma unificação de moeda e os impostos eram
regionalizados, dificultando a expansão das atividades comerciais.
Para eliminar esse obstáculo, a burguesia buscou apoio no rei, pois
somente um governo centralizado poderia unificar leis e moedas, além de
estabelecer fronteiras legais e organizar o comércio internacional. Por sua vez,
o rei beneficiava-se com os recursos financeiros da burguesia. Assim, a união
do poder econômico da burguesia com o poder político dos reis possibilitou o

2
desenvolvimento de diferentes monarquias nacionais em toda a Europa
Ocidental.
Os Estados modernos (ou monarquias nacionais) começaram a nascer na
segunda metade do século XV em Portugal, Espanha, França e Inglaterra. No
Estado moderno, existe uma identificação entre o Estado e o monarca,
restringindo-se liberdades e direitos individuais, praticando-se o autoritarismo e
até a violência. Em fins do século XVII, a França foi o país onde o absolutismo
conheceu seu apogeu, por meio do rei Luís XIV, que, caracterizando a estreita
ligação entre soberano e Estado, afirmou: “o Estado sou eu”.

Figura 1 – Rei Luís XIV

Crédito: Everett Art/Shutterstock.

Vários intelectuais procuraram elaborar e defender teses que pudessem


legitimar ideologicamente a existência de soberanos absolutos, com plenos
poderes sobre tudo e todos, como forma de fortalecimento do Estado. Entre
esses pensadores, podemos destacar Nicolau Maquiavel, Jean Bodin, Thomas
Hobbes e Jacques Bossuet.

1.1 Mercantilismo

Ao contrário do feudo, a base econômica da maioria dos Estados


nacionais era o comércio. A riqueza não estava mais ligada à posse da terra,
mas sim ao acúmulo de metais, com os quais se poderia cunhar moedas e
incrementar a atividade comercial. O poder de um Estado nacional moderno era
3
medido pela quantidade de metais acumulados. Portanto, as atividades
econômicas tinham por objetivo enriquecer o Estado e, para isso, foi adotado um
conjunto de práticas essenciais ao regime absolutista, que se caracterizaram
basicamente pela intervenção do Estado na economia.
Essas práticas diferenciavam-se de acordo com cada Estado europeu;
porém, de maneira geral, podemos identificar alguns princípios básicos do
mercantilismo, como:

• Balança comercial favorável: exportar o máximo e importar o mínimo;


• Protecionismo: incentivar o comércio e a indústria internos, evitando
importar mercadorias – para isso, aumentavam-se as taxas alfandegárias;
• Metalismo: procurar acumular metais no país;
• Colonialismo: buscar colônias que pudessem fornecer, principalmente,
metais preciosos;
• Monopólio: as colônias só poderiam comercializar com suas respectivas
metrópoles.

TEMA 2 – EXPANSÃO MARÍTIMA EUROPEIA

Figura 2 – Caravela portuguesa

Crédito: Michael Rosskothen/Shutterstock.

As novas monarquias nacionais passaram a incentivar e a financiar as


navegações, pois tinham interesse em conquistar terras e expandir as atividades
comerciais, aumentando seu poder. Por sua vez, a burguesia também tinha
grande interesse na expansão comercial, o que significava aumento de seus
lucros.
O primeiro país a lançar-se no Oceano Atlântico em busca de um novo
caminho para o comércio foi Portugal, seguido da Espanha e, posteriormente,
da Inglaterra, da França e da Holanda.
4
2.1 Navegações portuguesas

O pioneirismo português nas grandes navegações deveu-se,


fundamentalmente, ao fato de o país ter sido o primeiro a centralizar o poder em
torno de uma monarquia nacional, a qual estava aliada a uma poderosa classe
de ricos comerciantes.
O foco mercantil e o litoral estrategicamente aberto para o Oceano
Atlântico representaram fatores relevantes para as navegações portugueses.
Sua primeira aventura náutica foi a conquista de Ceuta, em 1415, um importante
entreposto comercial controlado pelos árabes, no norte da África. A partir de
então, a expansão portuguesa não mais cessou, conquistando ilhas do Atlântico,
como Madeira (1419) e Arquipélago dos Açores (1431), e iniciando a exploração
da costa ocidental da África, por intermédio de expedições como a de Gil Eanes,
que dobrou o Cabo Bojador em 1434.
Nas ilhas atlânticas, Portugal desenvolveu a produção de açúcar e vinhas,
enquanto na costa africana extraiu ouro, marfim, madeira de lei e pimenta-
malagueta. A produção agrícola das ilhas visava ao mercado externo e baseava-
se na exploração de grandes propriedades e da mão de obra de escravos
negros.
Em 1488, Bartolomeu Dias atingiu o Cabo da Boa Esperança, no extremo
sul da África, o que abriu caminho para que os navegadores portugueses se
aproximassem cada vez mais do caminho que os levaria ao Oriente e ao
comércio direto de suas especiarias. Finalmente, dez anos mais tarde, uma
expedição comandada por Vasco da Gama contornou o Cabo da Boa Esperança
e atingiu Calicute, na Índia.
Os lucros para os comerciantes lusos foram elevadíssimos, o que levou a
burguesia e o rei de Portugal a organizarem uma grande expedição, chefiada por
Pedro Álvares Cabral, para repetir o feito de Vasco da Gama. Com 13
embarcações e 1,5 mil homens, a expedição iniciou a viagem pela costa da
África e, na altura das Ilhas de Cabo Verde, desviou-se da rota para o Oriente e
dirigiu-se para as novas terras já descobertas pelos espanhóis (América),
tomando posse de uma parte dessas terras (Brasil), no dia 22 de abril de 1500.
Depois, a esquadra de Cabral seguiu viagem até a Índia.
As valiosas especiarias orientais (sedas, temperos, porcelanas, tapetes,
perfumes), que eram comercializadas na Europa desde meados do século XI,

5
eram levadas de seus locais de origem, por comerciantes árabes, até os portos
de Trípoli, Alexandria e, principalmente, Constantinopla e compradas pelos
comerciantes italianos, que as revendiam para o resto da Europa. O mar
Mediterrâneo havia se tornado o centro do comércio europeu e as cidades do
norte da Itália, principalmente Gênova e Veneza, controlavam esse comércio.
O monopólio das cidades italianas sobre o comércio das chamadas
especiarias tornava premente a necessidade de novos caminhos que levassem
ao Oriente, principalmente depois que, em 1453, os turcos-otomanos
conquistaram Constantinopla e passaram a cobrar pesadas taxas sobre os
produtos orientais que entravam pelo Mediterrâneo.
A exclusividade portuguesa sobre a nova rota para as especiarias
orientais não durou muito tempo. Já a partir de 1520, navegadores de outras
nações europeias passaram a seguir a rota marítima portuguesa para as Índias,
de onde voltavam carregados de mercadorias.

2.2 Navegações espanholas

A entrada da Espanha na expansão marítima sofreu um certo atraso em


virtude da falta de unidade política e da luta para a expulsão dos mouros da
Península Ibérica. Foi somente a partir de 1492 que os chamados reis católicos,
Isabel e Fernando, se voltaram para a expansão marítima e, sem muitos
recursos, patrocinaram a viagem do navegador genovês Cristóvão Colombo,
entregando-lhe uma pequena esquadra de apenas três galeões.

Figura 3 – Cristóvão Colombo

Crédito: Everett Historical/Shutterstock.

6
Colombo pretendia chegar ao Oriente navegando sempre em direção ao
Ocidente. Baseado na teoria da esfericidade da Terra, daria a volta em torno do
mundo. Sem ter noção das dimensões do nosso planeta e navegando para o
oeste, Colombo atingiu o continente americano, na altura das Bahamas, em 12
de outubro de 1492, acreditando ter chegado às Índias. Algum tempo depois, o
navegador, matemático e astrônomo Américo Vespúcio desfez o engano de
Colombo, afirmando a existência de um novo continente.
Somente em 1519 o navegador português a serviço da Espanha, Fernão
de Magalhães, realizou a primeira viagem de circum-navegação. Magalhães
cruzou o Atlântico, navegou pela costa sul da América até encontrar uma
passagem para o Oceano Pacífico (hoje Estreito de Magalhães), morreu nas
Filipinas e Sebastião del Cano concluiu a viagem, chegando de volta à Espanha
em 1522.

Figura 4 – Expansão marítima europeia

Crédito: Regina Bilan/Shutterstock.

2.3 Tratado de Tordesilhas

Apesar de usarem rotas diferentes, Portugal e Espanha navegavam pelo


mesmo oceano, o Atlântico. Para evitar maiores conflitos, estabeleceram-se
alguns tratados diplomáticos que deveriam definir a atuação de cada um, bem
como a exploração dos frutos advindos das conquistas marítimas.
Inicialmente, foi assinado o Tratado de Toledo (Portugal; Castela, 1479),
pelo qual Portugal garantia seu direito de exploração das terras ao sul das Ilhas
Canárias, o que assegurava aos portugueses a rota para a Ásia e a costa
africana.

7
No entanto, a América fez com que as nações ibéricas se voltassem a um
acordo mais adequado a seus interesses e que afastasse os demais países
europeus das riquezas das terras recém-encontradas. A princípio, o Papa
Alexandre VI (1493), que era espanhol, sugeriu a Bula Intercætera, pela qual
todas as terras existentes em um espaço de 100 léguas a oeste das Ilhas de
Cabo Verde seriam de Portugal, sendo o restante da Espanha. Porém, o governo
português recusou tal proposta, assinando no ano seguinte o Tratado de
Tordesilhas (Castela; Portugal, 1494), o qual aumentava para 370 léguas a
distância em relação ao ponto de partida, em Cabo Verde. Por esse tratado, a
América ficou dividida entre portugueses e espanhóis, o que, de forma alguma,
agradou outros governantes europeus, como os reis da França e da Inglaterra,
que não reconheciam apenas direitos ibéricos sobre as terras americanas.
Tanto a França quanto a Inglaterra tiveram um grande atraso para se
lançarem à expansão marítima, pois ambas demoraram a estabilizar um Estado
nacional. E, já que Portugal e Espanha dominavam as rotas do sul, tanto os
ingleses quanto os franceses se dedicaram à exploração do Atlântico Norte, em
busca de uma passagem para o Oriente, o que os levou à costa dos atuais
Estados Unidos e Canadá. No entanto, dali não conseguiram obter maiores
vantagens comerciais, o que os levou, principalmente a Inglaterra, à pirataria e
ao contrabando, atacando regiões e rotas dominadas pela Espanha.

2.4 Consequências da expansão marítima europeia

A expansão marítima permitiu a descoberta de uma nova rota comercial


para o Oriente, fazendo com que o eixo econômico se deslocasse do
Mediterrâneo para o Atlântico, o que provocou, por sua vez, a decadência
comercial das cidades italianas.
A ampliação das atividades comerciais possibilitou o enriquecimento da
burguesia, bem como o fortalecimento do poder do rei. Descobrindo novos
continentes, os Estados nacionais europeus fundaram impérios coloniais com os
quais se extraíam muitas riquezas, principalmente metais preciosos, permitindo
um significativo aumento da quantidade de moedas circulantes.
As populações dos continentes conquistados (Ásia, África e América)
foram subjugadas pelos europeus e até submetidas à escravidão, como os
negros africanos e os índios americanos. O mundo começou a sofrer um

8
processo de europeização, pois os valores cristãos da Europa Ocidental
passaram a ser impostos sobre os outros povos, até mesmo com o uso da força.

2.5 Conquista e colonização da América

A colonização da América se deu num contexto político e econômico em


que a política mercantilista predominava, a fim de fortalecer o poder das
monarquias nacionais. Por essa política, as colônias deveriam fornecer produtos
agrícolas tropicais, metais preciosos e matérias-primas às metrópoles (países
colonizadores) e delas consumir produtos manufaturados. Essa relação
comercial baseava-se no chamado pacto colonial, imposto pelas metrópoles às
suas colônias, pelo qual se estabelecia um monopólio de comércio: a colônia só
poderia comercializar com a sua metrópole. Hoje a historiografia tem
problematizado a estrutura engessada do pacto colonial encontrando evidências
de mercado interno nas colônias e pactos comerciais à revelia da metrópole.
Exemplo disso é o comércio de escravos que envolvia a costa brasileira e a costa
africana. Contudo, a interpretação de que o capital acumulado nas colônias
deveria escoar para as metrópoles, bem como da existência do protecionismo
metropolitano e de seu controle sobre as colônias, ainda permanece em sua
essência como um consenso historiográfico.

Figura 5 – Pacto colonial

A Espanha foi o primeiro Estado europeu a ocupar terras na América, logo


seguida por Portugal.

TEMA 3 – RENASCIMENTO CULTURAL

As transformações ocorridas na Europa, a partir do final da Idade Média,


como a reativação do comércio e da vida urbana, a substituição da economia
feudal pela capitalista e o fortalecimento da burguesia, foram responsáveis por

9
um intenso movimento de desenvolvimento cultural e científico denominado
Renascimento, no início da Idade Moderna.
No novo sistema econômico capitalista, cresceu e prosperou uma
numerosa camada de ricos comerciantes, a burguesia. Ávida de reconhecimento
e prestígio social, essa burguesia buscava mudanças culturais por meio de seu
crescente êxito material, criando uma mentalidade própria da nova sociedade
que se organizava. Fazia parte dessa nova mentalidade burguesa a negação do
modelo cultural anterior, atrelado à Igreja, à ideia de distinção social que
privilegiava a nobreza.
Os dogmas eclesiásticos começaram a ser abalados com a nova
mentalidade que começava a se estabelecer. O movimento da Renascença
voltou-se à valorização do homem (antropocentrismo) e da vida terrena, em
contraposição ao teocentrismo medieval, em que Deus era o centro de todas as
coisas. Sem abandonar por completo a sua religiosidade, o europeu ocidental
passou a ver o mundo de forma mais racional e crítica.
A mais importante característica do Renascimento foi o profundo
racionalismo, a convicção de que tudo poderia ser explicado pela razão e pela
ciência. Para o homem medieval, a fé tudo explicava e o que acontecia na
natureza era somente o resultado da vontade de Deus, sem que os homens
nisso pudessem interferir. Contrapondo-se a essa visão, o pensamento
renascentista defendeu a razão como fonte de todo conhecimento. Os
fenômenos da natureza tinham sua explicação na própria natureza e esta
poderia ser dominada pelo homem, mediante observação e experimentalismo.
Os renascentistas buscaram inspiração nos humanistas gregos e
romanos, o que levou à valorização da cultura clássica e provocou a rejeição a
tudo que estivesse relacionado à cultura medieval.

3.1 Renascimento italiano

No período, a Península Itálica era uma região dividida em diversas


repúblicas, que disputavam entre si territórios e domínios comerciais. As cidades
italianas monopolizaram por muito tempo o comércio no mar Mediterrâneo,
acumulando grandes fortunas e tornando-se as mais prósperas da Europa e polo
de grande desenvolvimento comercial e urbano.
As ricas cidades italianas, como Florença, Milão, Nápoles, Veneza e
Bolonha, eram, geralmente, governadas por poderosas famílias burguesas (os
10
Médicis, os Sforzas...), que, em busca de projeção social, financiavam artistas e
intelectuais. Esses patrocinadores da nova cultura, conhecidos como mecenas,
incentivaram e possibilitaram financeiramente o desenvolvimento artístico e
científico desse período, tendo sido também, o mecenato, praticado por nobres
e papas. O Renascimento italiano teve nomes importantes, como:

• Leonardo da Vinci (1452-1527): considerado o protótipo do homem


renascentista, pois se dedicou a diferentes áreas do conhecimento e das
artes: foi pintor, escultor, astrônomo, cientista, arquiteto, além de dedicar-
se aos estudos da anatomia humana. Na pintura, suas maiores obras
foram: Mona Lisa e A última ceia.

Figura 6 – A última ceia

Crédito: Prakichtreetasayuth/Shutterstock.

• Nicolau Maquiavel (1469-1527): considerado o pai da ciência política.


Em seu livro O príncipe, defendeu a centralização política e a postura
autoritária do governante. Foi um dos principais nomes na construção do
pensamento absolutista e na formação das monarquias nacionais;

• Michelangelo (1475-1564): escultor, pintor e arquiteto, destacou-se pelos


afrescos no teto da Capela Sistina (Vaticano), onde apresentou várias

11
Figura 7 – Capela Sistina

Crédito: Legacy1995/Shutterstock.

• Galileu Galilei (1564-1642): astrônomo e físico italiano, confirmou o


heliocentrismo. É considerado o fundador da física moderna.

A expansão marítima europeia levou ao deslocamento do eixo econômico


e ao florescimento do Renascimento em países favorecidos pelo comércio
através do Atlântico. Então, surgiram nomes como:

• Miguel de Cervantes (1547-1616): escritor espanhol, cuja obra mais


conhecida é Dom Quixote, uma sátira à cavalaria medieval;
• William Shakespeare (1564-1616): principal representante do
Renascimento inglês, produziu tragédias e comédias, tratando dos
conflitos humanos, que até hoje são encenadas, como: Romeu e Julieta,
Hamlet, Macbeth, Sonhos de uma noite de verão e muitas outras;
• Luis Vaz de Camões (1524-1580): poeta português, que, em sua obra
Os lusíadas, narrou a história das origens de Portugal e a epopeia das
grandes navegações durante a expansão marítima;
• Erasmo de Rotterdam (1466-1536): humanista holandês, em sua
principal obra, Elogio da loucura, criticou com vigor os abusos da Igreja.

12
TEMA 4 – REFORMA RELIGIOSA

No início do século XVI, o movimento reformista religioso fez parte do


conjunto de transformações que levaram a uma mudança de mentalidade da
sociedade europeia, fazendo com que a Igreja Católica passasse a ser
duramente criticada pelo poder, pela riqueza acumulada ao longo dos séculos e
pela corrupção em que vivia a maioria de seus membros, principalmente nos
cargos mais altos.
A Igreja vivia em contradição, pois condenava o progresso material,
enquanto grande parte das autoridades eclesiásticas vivia de forma luxuosa e
corrupta. Também se multiplicavam os escândalos amorosos de padres, de
monges bêbados e de bispos que vendiam sacramentos. Entre os abusos e a
corrupção do clero, estavam, ainda:

• Simonia: venda de relíquias sagradas e de cargos na Igreja;


• Indulgências: pagamentos pelo perdão dos pecados; compra da
salvação.

Na nova mentalidade que se estabelecia, racional e humanista, a Igreja


tornou-se vulnerável a críticas e questionamentos, principalmente por parte da
burguesia, que se via em pecado por buscar o lucro, praticar a usura
(empréstimo a juros) e a avareza (acumulação de capital).
Também os monarcas absolutistas, senhores dos novos Estados
modernos, passaram a desejar a criação de igrejas nacionais, que
possibilitassem libertar seus domínios do jugo da Igreja Católica, que limitava
seus poderes e tirava recursos de seus países. Monarcas, nobres e até
camponeses pobres cobiçavam as extensas posses da Igreja.
Foi nesse clima de críticas e divergências que aconteceu a reforma
religiosa que acabou dividindo os cristãos do Ocidente em católicos e
protestantes, depois de mais de 1 mil anos de unidade sob a autoridade papal.

4.1 Reforma Luterana

O monge alemão Martinho Lutero (1483-1546), profundamente


decepcionado com os abusos e a corrupção em que vivia o clero, foi o primeiro
reformista religioso. Lutero, que era professor de teologia da Universidade de
Wittenberg, recusou-se à venda de indulgências pela Igreja (perdão aos

13
pecados) e, em 1517, fixou na porta de sua igreja as chamadas 95 teses, em
que criticava ferozmente a Igreja e o papa. Em 1521, foi excomungado e
refugiou-se num castelo sob a proteção de nobres alemães, onde traduziu a
Bíblia para o alemão.

Figura 8 – Martinho Lutero

Crédito: Georgios Kollidas/Shutterstock.

A doutrina luterana expandiu-se pela Europa, atingindo Alemanha,


Dinamarca, Suécia e Noruega, e influenciou outros movimentos contra a Igreja
Católica.

4.2 Reforma Calvinista

João Calvino nasceu na França, onde estudou teologia e direito.


Influenciado pelas ideias de Lutero, aderiu ao protestantismo e iniciou suas
pregações. Para livrar-se das perseguições dos católicos franceses, fugiu para
Genebra, na Suíça.

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Figura 9 – João Calvino

Crédito: Georgios Kollidas/Shutterstock.

Suas ideias eram mais radicais e severas que as de Lutero e ele as expôs
no livro Instituição da religião cristã. Ele condenava o lazer; o jogo; o culto às
imagens; a dança; o uso de joias; e aplicava uma rígida censura para vigiar e
punir os cidadãos que não seguissem suas regras.
Enquanto Lutero defendia a fé e as obras como forma de salvação,
Calvino pregava predestinação, considerando que o que determina o destino dos
homens é a vontade de Deus e não a fé ou o merecimento.
Pregando uma doutrina que defendia o lucro e valorizava o trabalho, logo
conquistou o apoio da burguesia. Enriquecer por meio de uma vida correta,
dedicada ao trabalho e à poupança seria um sinal da salvação divina. Essa
rigidez religiosa, que condenava o lazer e abençoava o trabalho e o lucro, fez do
calvinismo a teologia do capitalismo e da burguesia.
O calvinismo expandiu-se rapidamente por diferentes regiões. Na França,
os calvinistas foram chamados de huguenotes; na Escócia, de presbiterianos; na
Inglaterra, de puritanos. Perseguidos na Inglaterra, fugiram para as colônias
inglesas na América do Norte, fundando a sociedade que viria a se tornar os
Estados Unidos.

15
4.3 Contrarreforma

Diante dos movimentos protestantes, a reação imediata da Igreja Católica


foi punir os rebeldes reformistas a partir do século XVI e iniciar um movimento
interno de moralização e de reorganização que ficou conhecido como
contrarreforma.
Em 1534, Inácio de Loyola criou a Ordem dos Jesuítas (Companhia de
Jesus), que tinha por missão combater a expansão do protestantismo por meio
da catequese e da conversão ao catolicismo. A ordem agiu principalmente na
África, Ásia e América, convertendo os nativos e colaborando com o processo
de colonização portuguesa e espanhola.
Mais tarde, em 1545, a Igreja convocou o Concílio de Trento, que negou
a livre interpretação da Bíblia; reafirmou os dogmas do catolicismo e a liderança
do papa sobre todos os cristãos; confirmou o culto aos santos, às imagens e às
relíquias sagradas; criou o chamado Index (relação de livros proibidos); criou
seminários para a formação dos sacerdotes; e confirmou o celibato. Também
fortaleceu a Inquisição com o propósito de julgar e punir as heresias (crimes
contra a fé católica). Apesar de já existirem desde a Idade Média, os Tribunais
da Santa Inquisição foram usuais principalmente nos países ibéricos e na
Península Itálica, regiões de grande influência católica, durante a Idade
Moderna. O temor às suas torturas e condenações à fogueira passou a fazer
parte do cotidiano da vida das pessoas.

Figura 10 – Inquisição

Crédito: Morphart Creation/Shutterstock.

16
TEMA 5 – ILUMINISMO E REVOLUÇÃO

O Iluminismo foi um movimento intelectual dos séculos XVII e XVIII, que


representou uma grande mudança de mentalidade, por meio do
desenvolvimento do racionalismo surgido no Renascimento. A razão seria a luz
que afastaria a humanidade das trevas da ignorância, daí terem denominado seu
movimento de Iluminismo e o século XVIII, de Século das Luzes.
Criticando toda a estrutura política, social e econômica do antigo regime
feudal-absolutista das monarquias nacionais, os iluministas pregavam a tese de
que todos os homens nascem iguais, livres e dotados de direitos inalienáveis
como a vida e a propriedade, buscavam limitar os poderes absolutistas dos reis
e combatiam a interferência do Estado na economia, pregando que a liberdade
comercial e industrial representaria a única forma de se atingir o
desenvolvimento. Tais ideias tornaram-se universais e ganharam o apoio das
massas desprivilegiadas, pois estas representavam um enorme contingente
oprimido pelo poder abusivo das monarquias absolutistas.
Entre os principais nomes de pensadores iluministas temos John Locke,
Voltaire, Montesquieu, Diderot, Rousseau e Adam Smith. Esses pensadores
tiveram um papel fundamental na formação do mundo ocidental, exercendo
influência no modelo político e econômico das atuais democracias, bem como
na organização das sociedades e na defesa dos direitos humanos. Seus ideais
deflagraram importantes processos revolucionários de seu tempo, como:

• A transformação, na sociedade, que ocorreria a partir da chamada


Revolução Industrial;
• A independência da treze colônias norte-americanas que formariam os
Estados Unidos;
• A derrubada da monarquia absolutista e dos privilégios da nobreza e do
clero, na Revolução Francesa;
• A luta pela libertação das colônias latino-americanas;
• Os movimentos de libertação do Brasil em relação a Portugal, como a
Inconfidência Mineira.

17
5.1 Revolução Industrial

A partir de 1750, desenvolveu-se na Europa um processo de grandes


transformações desencadeado pela acumulação de riqueza (capital) e pelo
aumento de produção. Ele aconteceu inicialmente na Inglaterra, teve como
expoente tecnológico a energia a vapor vinda do carvão e encerrou a transição
entre feudalismo e capitalismo.
A Revolução Industrial marcou-se pelo chamado nascimento das fábricas
e por transformações que se relacionaram diretamente à substituição do trabalho
artesanal, que utilizava ferramentas, pelo trabalho assalariado, em que
predominava o uso das máquinas. Passou a imperar o produtivismo e, com base
nele, houve a necessidade cada vez maior de concentração de mão de obra sob
forte controle.

Figura 11 – Fábrica no século XIX

Crédito: Everett Historical/Shutterstock.

Durante o período moderno, a Inglaterra foi a nação que mais acumulou


capitais. Desde o século XVI, grande parte da burguesia inglesa lucrava com o
tráfico de escravos, com o comércio de lã e até mesmo com a pirataria. Havia
ainda atividades agrícolas e manufatureiras que também lhe geravam lucros e
grandes excedentes de mão de obra camponesa transformaram-se em um
imenso contingente de trabalhadores disponíveis para as indústrias.
Passo a passo, esse novo formato de produção fortaleceu as estruturas
de uma economia mais baseada na liberdade de mercado, preconizada por

18
Adam Smith, considerado o pai do liberalismo, o que contrariava a intervenção
do Estado ditada pelas políticas mercantilistas.
Podemos citar como consequências da Revolução Industrial iniciada no
século XVIII:

• O êxodo rural;
• O crescimento urbano desordenado;
• O surgimento da classe operária (proletariado) e de movimentos de
trabalhadores;
• O aparecimento de novas doutrinas antiburguesas, como o socialismo e
o anarquismo.

NA PRÁTICA

É necessário a um príncipe, para se manter, que aprenda a poder ser


mau e que se valha ou deixe de valer-se disso segundo a necessidade.
Deixando de parte, pois, as coisas ignoradas relativamente aos
príncipes e falando a respeito das que são reais, digo que todos os
homens, máxime os príncipes, por estarem mais no alto, se fazem
notar através das qualidades que lhes acarretam reprovação ou louvor.
Isto é, alguns são tidos como liberais, outros como miseráveis; alguns
são tidos como pródigos, outros como rapaces; alguns são cruéis e
outros piedosos; perjuros ou leais; efeminados e pusilânimes ou
truculentos e animosos; humanitários ou soberbos; lascivos ou castos;
estúpidos ou astutos; enérgicos ou indecisos; graves ou levianos;
religiosos ou incrédulos, e assim por diante. E eu sei que cada qual
reconhecerá que seria muito de louvar que um príncipe possuísse,
entre todas as qualidades referidas, as que são tidas como boas; mas
a condição humana é tal, que não consente a posse completa de todas
elas, nem ao menos a sua prática consistente; é necessário que o
príncipe seja tão prudente que saiba evitar os defeitos que lhe
arrebatariam o governo e praticar as qualidades próprias para lhe
assegurar a posse deste, se lhe é possível; mas, não podendo, com
menor preocupação, pode-se deixar que as coisas sigam seu curso
natural. (Maquiavel, 1983)

Identifique, exemplificando com passagens do texto, a concepção de


Maquiavel (1983) acerca da maneira como o governante deve se comportar.
Indique dois elementos, presentes ou não no texto, que permitam associar o
pensamento de Maquiavel (1983) à visão de mundo dos humanistas.

FINALIZANDO

Ao longo desta aula, estudamos a chamada Idade Moderna ou história


moderna e analisamos sua estruturação, a partir do final da Idade Média, e as
profundas transformações pelas quais esse tempo passou em termos de
mentalidade, política, sociedade e economia, como: do teocentrismo medieval
19
ao antropocentrismo renascentista; da unidade cristã ocidental ao surgimento de
novas doutrinas protestantes; do absolutismo monárquico aos ideias iluministas
de descentralização do poder e luta por direitos, bem como houve a consolidação
do capitalismo por meio da Revolução Industrial, que acabou por renegar as
políticas mercantilistas do Estado em prol de uma economia liberal.

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REFERÊNCIAS

ALEXANDRE VI, Papa. Bula inter cætera. Roma, 4 maio 1493.

CASTELA; PORTUGAL. Tratado de Tordesilhas. Tordesilhas, 7 junho 1494.

PORTUGAL; CASTELA. Tratado de Toledo. Alcáçovas, 4 set. 1479.

21
TÓPICOS DE HISTÓRIA GERAL
AULA 5

Prof. Osvaldo Luís Meza Siqueira


CONVERSA INICIAL

Nesta aula, estudaremos o que se denomina Idade Contemporânea,


período da História que se estende da Revolução Francesa, no século XVIII, até
os dias atuais. A Revolução Francesa, em 1789, é considerada um marco de
passagem entre a Idade Moderna e a Idade Contemporânea. Os ideais e as
ações dos revolucionários franceses auxiliaram a moldar a organização social,
política e econômica do mundo até hoje. Mesmo sendo um movimento
considerado hegemonicamente burguês, a participação da grande massa
popular foi de fundamental importância no processo de derrubada do chamado
Antigo Regime.
O historiador Eric Hobsbawm em sua obra clássica A Era das
Revoluções traz a noção de “dupla revolução”, recordando que, além da
Revolução Francesa, houve outro processo revolucionário fundamental para a
formação do mundo contemporâneo: a Revolução Industrial. Uma das suas
principais consequências foi a definitiva consolidação do capitalismo. Em
contrapartida, testemunhou-se também o surgimento de pensamentos de crítica
à sociedade burguesa, como o socialismo e o anarquismo.
Representa, ainda, um período de grandes inovações tecnológicas e
científicas, mudanças nos hábitos e no cotidiano, na própria percepção temporal
dos sujeitos, e no âmbito da cultura, que provocaram profundas transformações
nas sociedades humanas.

TEMA 1 – REVOLUÇÃO FRANCESA

No final do século XVIII, assim como a maioria dos países europeus, a


França era governada por uma monarquia absolutista, ainda considerada de
direito divino. O rei Luís XVI (1774-1792), pertencente à dinastia de Bourbon,
parecia governar sem grandes preocupações com a crise econômica em que o
país estava mergulhado. Desde o reinado de Luís XIV, as despesas do Estado
já eram muito superiores à arrecadação tributária.

2
Figura 1 – Palácio de Versalhes

Créditos: Mistervlad/Shutterstock.

A França era um país de economia predominantemente agrária, e 80% da


população morava no campo. Pequenos proprietários e camponeses ainda
viviam sob padrões do regime feudal, pagando impostos excessivos. Por sua
vez, a burguesia industrial e comercial não tolerava mais os entraves do governo
para o desenvolvimento de suas atividades, e os constantes aumentos de
impostos que eram destinados a eles e à massa trabalhadora, tanto do campo
quanto da cidade.
Ainda sob moldes feudais, a ordem social estamental estabelecida pelo
Antigo Regime dividia a sociedade francesa em três Estados (ou estamentos):

• O primeiro Estado, formado pelo clero, dividido em alto clero (de origem
nobre) e baixo clero (de origem popular), não pagava impostos.
• O segundo Estado, composto pela nobreza, correspondia a 4% da
população e gozava de privilégios políticos; também não pagavam
impostos.
• O terceiro Estado, o mais heterogêneo dos estados e formado por grupos
economicamente diferentes, pois era composto pelo restante da
população, como operários, camponeses, artesãos e toda a burguesia, os
quais pagavam os impostos, sustentando os privilégios do clero e da
nobreza.

Pressionado para buscar uma solução para a crise econômica, Luís XVI
decidiu convocar a Assembleia dos Estados Gerais, uma espécie de parlamento

3
com representantes dos três Estados. Em maio de 1789, os Estados Gerais
reuniram-se em Versalhes, e o rei abriu a assembleia anunciando que a votação
seria feita por estamento e não “por cabeça” (um voto por representante), o que
de certa forma anunciou o resultado: o primeiro e o segundo Estados votaram
juntos em favor da perpetuação de seus privilégios e pela sobrecarga de
impostos sobre o restante da população.
Os deputados do terceiro Estado não aceitaram, e, em seu apoio, a
população de Paris decidiu agir. Então, em 14 de julho de 1789, o povo invadiu
a Bastilha, uma prisão política que simbolizava o poder da monarquia francesa,
dando início à revolução. Em seguida, a rebelião espalhou-se pelo interior do
país, e os camponeses invadiram castelos e mosteiros, massacrando membros
da nobreza.

Figura 2 – Tomada da Bastilha, em 1789

Créditos: Everett Historical/Shutterstock.

Enquanto a revolução seguia, em agosto de 1789, a assembleia aprovou


um dos mais importantes documentos do período contemporâneo, a Declaração
dos Direitos do Homem e do Cidadão. Inspirada no ideário iluminista, essa
declaração garantia, principalmente, o direito de igualdade perante a lei e de luta
contra qualquer tipo de opressão, documento que serviria de base para
constituição de todo o país que no futuro se dissesse democrático. A Revolução
Francesa teve continuidade e foi marcada por diferentes fases, processos e
sujeitos históricos. De seu legado fica a intensa mobilização política e o
enfrentamento direto ao poder monárquico absolutista, abrindo o caminho para
outros modelos de regime político.

4
1.1 Independência das colônias espanholas

As transformações que ocorriam na Europa entre os séculos XVIII e XIX,


principalmente a Revolução Francesa, influenciaram as colônias na América e
permitiram o aparecimento de movimentos de independência, assim como a
Revolução Haitiana foi central no imaginário americano como exemplo de
sublevação popular e marcada por seus ideais de liberdade e anticoloniais,
questionando, inclusive, a suposta universalidade de direitos preconizada pelos
revolucionários franceses, pois a França mantinha o Haiti como uma de suas
colônias no continente americano.
Os líderes dessas lutas por emancipação na América Latina foram
representantes das elites coloniais, os chamados criollos, que ansiavam por
poder político, pois pretendiam libertar-se da opressão fiscal exercida pela
metrópole espanhola. Nesse contexto, os principais líderes libertadores foram
Simón Bolívar e San Martin. Bolívar liderou a independência de Venezuela,
Colômbia e Equador, enquanto San Martin participou da independência da
Argentina, auxiliando, ainda, o processo no Chile, no Peru e na Bolívia.

Figura 3 – América Latina

Créditos: Vectorfair.com/Shutterstock.

Porém, com as independências, houve uma grande fragmentação política


e territorial, em que as elites que tomaram o poder, compostas por ricos
latifundiários, criaram governos oligárquicos e ditatoriais comandados por
caudilhos.

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TEMA 2 – IMPERIALISMO OU NEOCOLONIALISMO

Como vimos anteriormente, a fase inicial da industrialização, no século


XVIII, conhecida como Primeira Revolução Industrial, foi mais restrita à Inglaterra
e teve como expoente tecnológico a energia a vapor. Porém, em meados do
século XIX, a industrialização passou a se expandir para outros países (Europa
Continental, Estados Unidos e Japão), e começaram a surgir novos tipos de
energia, como eletricidade e derivados do petróleo. A produção industrial
diversificou-se com a introdução da siderurgia (transformação do ferro em aço)
e a ampliação das ferrovias, seguidas das invenções do automóvel e do avião.
Essa fase é classificada como Segunda Revolução Industrial.
Nos séculos XVI e XVII, quando os países europeus, em função de sua
expansão comercial, conquistaram toda a América, essa prática de dominação
ficou conhecida como colonialismo. Já nos séculos XIX e XX, as disputas entre
as nações industrializadas geraram uma nova fase de dominação, voltada
principalmente para África, Ásia e para os países da América Latina, que, apesar
de já terem conquistado sua independência política, continuavam submetidos à
dependência econômica. Essa nova fase foi denominada de neocolonialismo
ou imperialismo.
Ainda que o colonialismo e o imperialismo sejam ambos processos de
dominação e opressão de outros povos – muitas vezes capitaneados pelos
europeus – é preciso diferenciá-los e compreender as suas especificidades. A
diferença mais óbvia e direta é exatamente a temporal. O colonialismo está
ligado a um contexto de Grandes Navegações e do mercantilismo, fenômenos
próprios dos séculos XVI e XVII e do período Moderno. Já o imperialismo é
produto da consolidação do modo de produção capitalista e auxilia, inclusive, em
sua expansão para termos globais.
As potências europeias e industriais – posteriormente, também com a
participação de EUA e Japão – dividiram, sobretudo, a Ásia e a África para
subjugá-las em seus domínios, inclusive os povos que já habitavam as regiões.
O objetivo era alcançar matérias-primas, mercados consumidores e mão de obra
barata (e altamente explorada). Além disso, o imperialismo está diretamente
conectado ao fenômeno do nacionalismo e do Estado-Nação, tão típicos do
século XIX, e que acirraram as disputas políticas e econômicas entre as nações.

6
Em sua obra Cultura e Imperialismo, Edward Said aponta a centralidade
do viés ideológico e cultural na dominação imperialista. Sendo tão importante
quanto a dominação política e econômica. Para ele:
“O imperialismo não é um ato de simples acumulação e aquisição. Ele é
sustentado e talvez impelido por potentes formações ideológicas que incluem a
noção de que certos territórios e povos precisam e imploram pela dominação”
(Said, 1995, p. 40)

Assim, a principal justificativa ideológica para o imperialismo do século


XIX foi a missão civilizadora das grandes potências que tinham por obrigação
difundir o progresso pelo mundo, defendendo a necessidade da submissão de
“povos considerados inferiores”. Criaram o mito da superioridade da civilização
industrial do Ocidente, com base em ideias racistas e de superioridade para
justificar a exploração brutal de diferentes povos.

TEMA 3 – GUERRAS MUNDIAIS

O período que vai de 1914 a 1945 correspondeu ao momento do século


XX que o historiador Eric Hobsbawm denominou de a era da guerra total,
caracterizado pela catástrofe das duas guerras mundiais, pela ascensão dos
regimes totalitários, pelos campos de concentração e extermínio da Alemanha
Nazista e pelo início da era nuclear.

3.1 Primeira Guerra Mundial

A Alemanha, que viveu um processo de unificação tardio (1870), entrou


atrasada na disputa imperialista pelas colônias africanas e asiáticas. Com o
rápido desenvolvimento de sua indústria após a unificação, o Estado germânico
passou a pressionar a comunidade internacional no sentido de aumentar sua
área de domínio.
As pretensões da Alemanha entravam em choque direto com os
interesses dos dois maiores impérios de colônias da época, Inglaterra e França,
e criou-se, então, um clima de tensão.
A disputa entre as potências levou a fortes rivalidades, que intensificaram
os sentimentos de nacionalismo e geraram uma corrida armamentista. O
nacionalismo revestiu-se de variados matizes e foi utilizado como meio de
legitimação do Estado e dos governos, fator de unidade social e forma de apoio
ao imperialismo e ao colonialismo. O clima político militar na Europa tornou-se
cada vez mais tenso. Todos preparavam-se para uma guerra eminente,
7
esperando apenas que alguém desse o primeiro tiro e rompesse a “paz armada”,
o que acabou por ocorrer em 1914, com o assassinato do herdeiro do trono
austro-húngaro, Francisco Ferdinando.
Considerado a primeira guerra moderna, o conflito durou de 1914 a 1918
e envolveu 35 países. De um lado, os aliados às chamadas potências centrais
(Alemanha e Áustria-Hungria) e, de outro, os aliados à Entente (Inglaterra,
França e Rússia).
A princípio, o confronto caracterizou-se por intenso movimento de tropas,
mas, pelo equilíbrio de forças, estabeleceu-se uma fase de profunda
imobilização, marcada pelas trincheiras.

Figura 4 – Trincheira da Primeira Guerra Mundial

Créditos: Susan Law Cain/Shutterstock.

Depois do final da guerra, em 1919, as potências vencedoras reuniram-


se na França e assinaram o Tratado de Versalhes. Por esse tratado, a
Alemanha derrotada foi responsabilizada pela guerra, sendo obrigada a
indenizar os países vencedores, limitar suas atividades industriais e militares,
além de ceder territórios e suas colônias.

Figura 5 – Avião da Primeira Guerra Mundial

Créditos: IanC66/Shutterstock.
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O tratado, na realidade, com suas penalidades pesadas, acabou por
semear as causas que levariam o mundo a uma Segunda Guerra Mundial.

3.2 Pensamento socialista

O pensamento socialista estabeleceu-se nas primeiras décadas do século


XIX e, como alternativa ao capitalismo, apresentou a preocupação por uma
sociedade que eliminasse as desigualdades entre os homens e rejeitasse o
capital e o mercado.
A teoria socialista ganhou força e consistência com Karl Marx e Friedrich
Engels. Segundo eles, a sociedade sempre evoluiu por meio do conflito entre
explorados e exploradores, chamado luta de classes. Propunham que os
operários se organizassem para, com uma revolução, derrubar a burguesia e a
sociedade capitalista, fazendo nascer a sociedade socialista, na qual não haveria
propriedade privada nem diferenças sociais.
Segundo Marx, só o trabalho gera riqueza, e justamente quem a produz a
ela não tem direito. O chamado marxismo (linha teórica que se estabeleceu a
partir do pensamento de Marx) buscou também configurar-se em uma prática
política revolucionária que pudesse destruir o capitalismo e instaurar o
socialismo. Este, porém, não seria o estágio final. Com a tomada do poder pela
classe operária, seria necessário um período para a consolidação do poder
dessa classe, por meio de um Estado forte e centralizador, a ditadura do
proletariado, para que se pudesse passar a uma sociedade completamente sem
classes e sem Estado, o comunismo.

Figura 6 – Capitalismo, socialismo e comunismo

3.3 Revolução Socialista Russa de 1917

Até o início do século XX, o Império Russo ainda mantinha estruturas do


Antigo-Regime. A base de sua economia era agrícola, sob instituições ainda
9
feudais. A maior parte das terras estavam em grandes latifúndios pertencentes
aos nobres, que exploravam a grande massa camponesa (cerca de 80% da
população) sob um regime de servidão. O governo monárquico absolutista
pertencia à dinastia Romanov desde o início do século XVII e estava nas mãos
do Czar Nicolau II desde 1894, apoiado pela nobreza e pela Igreja Ortodoxa
Russa.
Assim como os camponeses, os operários viviam em condições
miseráveis, com baixíssimos salários, devido a um processo de industrialização
tardio e realizado com capitais estrangeiros, que levava os lucros obtidos para o
exterior.
A situação de penúria dos operários e camponeses e o autoritarismo do
governo czarista tornaram o país vulnerável à divulgação das ideias
revolucionárias, propiciando a formação do primeiro partido socialista do país,
Partido Operário Social Democrata Russo (POSDR), em 1889. Já em 1903,
divergências entre os membros do partido originaram sua divisão em dois grupos
de tendências opostas:

• Mencheviques – (minoria) defendiam que os trabalhadores poderiam


conquistar o poder estabelecendo alianças com a burguesia liberal.
Acreditavam que era necessário o pleno desenvolvimento do capitalismo
para, então, iniciar a ação revolucionária dos trabalhadores.
• Bolcheviques – (maioria) defendiam que os trabalhadores deveriam
conquistar o poder de forma imediata pela luta revolucionária. Pregavam
a formação de uma ditadura do proletariado. Seu principal líder era Lênin.

Figura 7 – Lênin

Créditos: Everett Historical/Shutterstock.

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Já completamente desgastada, após muitas manifestações e protestos, a
monarquia russa iniciou sua queda ao mergulhar o país na Primeira Guerra
Mundial. Sem estrutura militar para enfrentar potências como a Alemanha e o
Império Austro-Húngaro, as tropas russas sofreram sucessivas derrotas, o que
acabou por fazer explodir a revolução.
O processo revolucionário pode ser dividido nas seguintes etapas:

▪ Revolução Branca (menchevique), fevereiro de 1917: o czar foi forçado


a abdicar, e estabeleceu-se um governo provisório, cuja maioria dos
membros eram mencheviques. O novo governo adquiriu um caráter
burguês, cujas decisões não correspondiam aos anseios da população
nem aos interesses dos sovietes (comitês de operários, soldados e
camponeses rebeldes voltados a divulgar o pensamento socialista).
▪ Revolução Vermelha (bolchevique), outubro de 1917: Lênin deu início,
então, a uma nova revolução para a derrubada do governo provisório.
Para governar a Rússia, foi criado o Conselho de Comissários do Povo,
cujo comando coube a Lênin, auxiliado por Trotski e Stálin. O novo
governo retirou a Rússia da Primeira Guerra, e o Partido Bolchevique
transformou-se em Partido Comunista. Lênin distribuiu terras e
nacionalizou bancos, indústrias e estradas de ferro.
▪ Guerra Civil (1918-1921): os antigos colaboradores do czar, com o apoio
de nações estrangeiras, formaram o chamado Exército Branco, com
objetivo de derrubar o governo socialista-bolchevique, porém este reagiu
com o Exército Vermelho e, após quatro anos de guerra, venceu.

Figura 8 – Os bolcheviques

Créditos: Everett Historical/Shutterstock.

11
Em 1922, com a situação política definida, após a derrota do Exército
Branco, muitas províncias que haviam se separado da Rússia por ocasião da
guerra civil voltaram a reintegrar-se, formando a União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas (URSS).
Em 1924, Lênin morreu, e o governo passou a ser disputado por outros
dois líderes revolucionários: Trótski, que defendia a expansão imediata da
revolução socialista para outros países; e Stálin, que pretendia consolidar
primeiro o socialismo na Rússia e depois expandi-lo. Nessa disputa, Stálin saiu
vitorioso, estabelecendo um governo forte e centralizado. De acordo com seus
princípios, procurou exaltar o nacionalismo e o fortalecimento do socialismo
internamente.
A partir de então, Stálin instaurou um regime autoritário e passou a
perseguir os opositores ao seu governo. Milhares foram presos, torturados e
mortos pela repressão.

Figura 9 – Stalin

Créditos: bissig/Shutterstock.

A chamada Era Stalinista industrializou o país, mas priorizou a indústria


pesada, principalmente a produção bélica (após a Segunda Guerra), em
detrimento da produção de bens de consumo. Stalin governou até sua morte, em
1953, e, apesar de seus crimes terem sido denunciados por seus sucessores,
sua política econômica seguiu. Esta, aliada ao jogo de poder travado com os
Estados Unidos durante a Guerra Fria, provocou a falência do sistema socialista
soviético e a consequente desintegração política da URSS, a partir do final da
década de 1980.

12
3.4 Crise de 29

Ao final da Primeira Guerra Mundial, as antigas potências europeias


estavam com suas economias arruinadas. Até mesmo países vencedores, como
França e Inglaterra, já não tinham mais o poder de outrora. Em contrapartida, os
Estados Unidos despontavam como rico país industrializado e com potencial
para continuar fornecendo mercadorias às nações europeias arrasadas e para
os antigos mercados consumidores de produtos europeus, como os países da
América Latina.
Durante quase toda a década de 1920, os Estados Unidos viveram em
plena euforia econômica e passaram a divulgar para o mundo inteiro,
principalmente pelo cinema, o American way of life (estilo de vida americano),
cujo principal objetivo era incentivar o consumo dos produtos norte-americanos.
Porém, com a recuperação econômica da Europa a partir de 1925, as
exportações americanas diminuíram. Suas indústrias, no entanto, mantiveram o
ritmo crescente de produção, o que resultou em uma superprodução industrial e
agrícola que ultrapassou a necessidade de compra dos mercados interno e
externo, levando o país a uma grande crise. Por fim, em outubro de 1929,
ocorreu a queda vertiginosa de milhões de ações na Bolsa de Valores de Nova
York. As ações perderam praticamente todo o seu valor financeiro, e inúmeras
empresas e bancos foram à falência, desempregando milhões de trabalhadores.
A partir daí, instalou-se o completo caos nos Estados Unidos: 85 mil
empresas e 4 mil bancos faliram, deixando aproximadamente 12 milhões de
trabalhadores desempregados. A economia norte-americana mergulhou em uma
profunda depressão.
Como os Estados Unidos haviam se tornado o centro da economia
mundial, a crise acabou por irradiar-se para muitos países, tornando-se mundial.
Somente a partir de 1932, o presidente Franklin Roosevelt iniciou um programa
norte-americano de recuperação econômica do país, conhecido como New Deal.

3.5 Avanço dos regimes totalitários

A crise econômica gerada pela Primeira Guerra trouxe consequências


desastrosas para os países europeus: desemprego, queda na produção, inflação
e falências. Esses fatores provocaram o aumento dos conflitos entre as classes
sociais, o que deu espaço às crescentes manifestações socialistas inspiradas no

13
êxito da Revolução Russa de 1917. Foi nesse contexto que surgiram ideologias
políticas oportunistas, que criticavam as democracias de seus países e
defendiam o fortalecimento do Poder Executivo como única solução para o caos
que havia se instalado, levando as elites econômicas e a classe média a apoiar
a formação de governos fortes e autoritários (totalitários), capazes de restaurar
a ordem e conter as crescentes manifestações operárias (de inspiração
socialista).
Essas ideologias totalitárias baseavam-se em ideais de autoritarismo,
unipartidarismo, extremado nacionalismo e radical postura anticomunista. Dentre
os regimes totalitários surgidos na Europa, entre as décadas de 1920 e 1930,
destacaram-se, primordialmente, o fascismo de Mussolini, na Itália, e o
nazismo de Hitler, na Alemanha, que levou ao assassínio de milhões de
pessoas, principalmente judeus, nos campos de concentração e extermínio.
Figura 10 – Campo de concentração e extermínio de Auschwitz

Créditos: Juliano Galvao Gomes/Shutterstock.

3.6 Segunda Guerra Mundial (1939-1945)

As raízes do conflito podem ser identificadas nos tratados de paz


assinados no final da Primeira Guerra e na crise econômica do período pós-
guerra. O Tratado de Versalhes, elaborado pelos países vencedores (Estados
Unidos, Grã-Bretanha e França), estabelecia duras penas às nações derrotadas.
As cláusulas desse tratado eram humilhantes e feriram profundamente a
soberania dos países submetidos a ele, principalmente a Alemanha, que foi
considerada a grande responsável pelo primeiro conflito.

14
Foi nesse contexto que, com governos fortes e autoritários, Alemanha,
Itália e Japão começaram a desenvolver uma política externa agressiva,
dispostos a romper a ordem internacional invadindo territórios de outros países.
Com as suas políticas fortemente expansionistas, as nações totalitárias
prosseguiram em suas conquistas. Em 1939, após firmar um pacto de não-
agressão com a União Soviética, a Alemanha invadiu a Polônia. Dois dias
depois, sem outro caminho diplomático possível, Inglaterra e França declararam
guerra, iniciando o conflito na Europa.
Ao contrário da guerra de trincheiras de 1914, a Segunda Guerra foi
marcada pelo movimento. Com rápidos deslocamentos de tropas e veículos, os
alemães desenvolveram a chamada guerra-relâmpago (Blitzkrieg), tomando em
sequência vários países europeus.

Figura 11 – Emblema nazista

Créditos: Peter Lorimer/Shutterstock.

Em 1941, confiante de que conseguiria uma rápida vitória, Hitler quebrou


o pacto de não agressão e invadiu a União Soviética, colocando-a na guerra. Em
outra frente de batalha, também em 1941, os japoneses atacaram Pearl Harbor,
uma das maiores bases navais norte-americanas no sul do Pacífico, provocando,
por sua vez, a entrada dos Estados Unidos na guerra. Esses dois eventos
acabaram por proporcionar ao conflito contornos mundiais e envolveram povos
de várias regiões, em um total de 58 países.

15
Figura 12 – Ataque japonês a Pearl Harbor

Créditos: Everett Historical/Shutterstock.

Com supremacia, as chamadas Potências do Eixo (Alemanha, Itália e


Japão) dominaram o conflito até o início de 1942, quando, finalmente,
começaram a sofrer suas primeiras derrotas. Depois de acirrada luta contra os
soviéticos, os alemães foram violentamente derrotados pelas tropas de Stálin,
na épica Batalha de Stalingrado.
A guerra pode ser dividida em dois momentos:

Figura 13 – Períodos da Segunda Guerra Mundial

Então, a partir de 1942, iniciou-se a virada da guerra em favor das


Potências Aliadas, lideradas principalmente por Estados Unidos, Inglaterra e
União Soviética. Em julho de 1943, a Itália foi o primeiro dos países das
Potências do Eixo a ser derrotado.
A guerra ainda levou mais quase dois anos, com a derrota da Alemanha
em maio de 1945. Porém, a guerra só chegou ao fim em 19 de agosto de 1945,

16
após as explosões das bombas nucleares norte-americanas sobre as cidades de
Hiroshima e Nagasaki.

Figura 14 – Explosão da bomba atômica em Nagazaki

Créditos: Everett Historical/Shutterstock.

TEMA 4 – GUERRA FRIA

Ao seu término, a Segunda Guerra Mundial deixou um saldo devastador


para os países envolvidos: 55 milhões de mortos, 35 milhões de feridos, 20
milhões de órfãos, 190 milhões de refugiados e aproximadamente 6 milhões de
judeus barbaramente exterminados pelos nazistas.
A Europa ocidental perdeu sua posição de liderança internacional. Seu
lugar foi ocupado por Estados Unidos e União Soviética, que se tornaram os
grandes líderes mundiais do pós-guerra. Os norte-americanos lideraram o bloco
dos países capitalistas, e os soviéticos, o bloco dos países socialistas.
Iniciada em 1946, a Guerra Fria caracterizou-se pela extrema
competitividade entre EUA e URSS. O clima de rivalidade, somado aos
interesses das indústrias de armamentos, levou as grandes potências à
chamada corrida armamentista. Sem jamais terem chegado ao confronto direto
entre as duas superpotências, a Guerra Fria se constituiu em um conflito
ideológico. Contudo, devemos lembrar que mesmo sem um conflito direto entre
EUA e URSS, o mundo vivenciou, em diferentes regiões, confrontos, revoltas e
golpes ligados diretamente à Guerra Fria e conectados às duas superpotências.
Alguns exemplos: Guerra da Coreia, Guerra do Vietnã, os golpes ditatoriais na
América Latina etc.

17
4.1 Pós-guerra

Após o final da guerra, a Alemanha foi dividida em dois países: República


Democrática Alemã, de orientação socialista, sob o domínio da URSS, e
República Federal da Alemanha, com orientação capitalista, sob influência
norte-americana. Em junho de 1945, foi criada a Organização das Nações
Unidas (ONU), com representantes de 51 países.
Outro fator importante do período do pós-guerra foi a descolonização dos
países da África e da Ásia que integravam os impérios coloniais europeus. Estas
independências persistiram até as décadas de 1960 e 1970.

4.2 Guerra Fria (1946-1989)

Disputando áreas de influência em todo o mundo, Estados Unidos e União


Soviética viveram um período de graves tensões, inauguradas, principalmente,
pela chamada Doutrina Truman. Esta, em 1947, estabeleceu, com um discurso
do presidente norte-americano Harry Truman, em “defesa do mundo livre”, a
chamada ameaça soviética.
Durante a chamada Guerra Fria, alguns eventos merecem especial
destaque:

• Plano Marshall – por ele, os Estados Unidos destinaram recursos aos


países arrasados pela Segunda Guerra Mundial. A não aceitação da ajuda
por parte da URSS e dos governos sob sua influência acabou por polarizar
definitivamente o mundo entre as duas superpotências.
• OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) – em 1949, formou-
se como uma aliança militar entre os países da Europa Ocidental, que
pertenciam à área de influência dos Estados Unidos. Em contrapartida,
em 1955, revidando a criação da OTAN, os países do bloco socialista da
Europa Oriental firmaram uma aliança de ajuda militar mútua por meio do
Pacto de Varsóvia.
• República Popular da China – em 1949, após anos de dominação
imperialista estrangeira, principalmente inglesa, comunistas liderados por
Mao Tse-Tung tomaram o poder e instauraram um regime socialista no
país.

18
• Marcartismo – durante a década de 1950, o governo norte-americano,
em uma política conservadora e anticomunista, criou em seu Congresso
um comitê liderado pelo senador Joseph McCarthy contra atividades
denominadas por ele como antiamericanas ou subversivas, em uma
tentativa de justificar a perseguição.
• Muro de Berlin – em 1961, para garantir sua zona de influência na
Alemanha dividida, a URSS construiu o muro, que se tornou um símbolo
da divisão política ocorrida durante a Guerra Fria
• Guerra da Coreia e do Vietnã – durante o período da Guerra Fria, alguns
conflitos meramente regionais tomaram proporções mundiais a partir do
envolvimento de Estados Unidos e União Soviética.
• Revolução Cubana – em 1959, Fidel Castro e Che Guevara derrubaram
a ditadura de Fulgêncio Batista ligada aos interesses norte-americanos na
ilha de Cuba. Após a tomada do poder, Fidel Castro instaurou um regime
socialista ligado à União Soviética.

Após a Segunda Guerra Mundial, os capitais, o comércio e as empresas


norte-americanas tornaram-se dominantes em todos os países da América
Latina, demonstrando mais que em qualquer outra região do planeta que a
Guerra Fria se constituiu em um grande instrumento de controle dos Estados
Unidos sobre os governos, povos e economias locais. O uso político do discurso
antissoviético visava sobretudo legitimar a luta contra qualquer atitude
nacionalista que atrapalhasse os interesses dos Estados Unidos nesses países.
Apesar de “defensores dos princípios de liberdade”, os norte-americanos jamais
hesitaram em apoiar regimes ditatoriais ou conduzi-los ao poder quando lhes
fosse vantajoso, como foi o caso de países como Brasil, Argentina e Chile.

TEMA 5 – O FIM DA GUERRA FRIA E A NOVA ORDEM MUNDIAL

A partir da década de 1970, a economia da União Soviética entrou em um


irreversível processo de estagnação promovido pelo declínio da produção
industrial e agrícola que, entre outros problemas, gerou a escassez no
abastecimento de alimentos e a queda na qualidade dos serviços públicos.
Em 1985, Mikhail Gorbatchov tornou-se o novo dirigente do país e, ainda
buscando salvá-lo, começou a promover amplas reformas voltadas à criação de
uma URSS mais livre (glasnost) e economicamente mais moderna

19
(perestroika). Porém, depois de uma tentativa de golpe e do surgimento de
movimentos separatistas de diversas repúblicas pertencentes à URSS, houve o
inevitável desmembramento e a criação da Comunidade dos Estados
Independentes (CEI). Depois de 69 anos, o poderoso império soviético, que
teve um dos papéis centrais na história do século XX, desmoronou.

5.1 Nova ordem mundial

A queda do Muro de Berlim, em 1989, e o fim da União Soviética, em


1991, colocaram o mundo diante de uma nova configuração política. Ao final do
longo período da Guerra Fria, os Estados Unidos emergiram como a única
superpotência que iria impor sua hegemonia de forma unipolar. No entanto, o
poder militar já não era mais o critério principal a ser estabelecido para
determinar a potencialidade global de um país, mas sim o poderio econômico em
um mundo capitalista que se tornara multipolar. Nesse contexto, novas frentes
surgiram, como o Japão, a União Europeia e, mais recentemente, a China, desde
os anos iniciais do século XXI.
A partir da década de 1990, nasceram grandes mercados regionais, como
a União Europeia, que levaram à integração econômica e ao intercâmbio cultural
e social, que, aliados às novas tecnologias no campo da comunicação e dos
transportes, conduziram à consolidação de uma ordem globalizada e
“unimultipolar”, que descreve a ocorrência da existência de diversos polos de
poder econômico, mas ainda sob liderança militar dos Estados Unidos.
Em contrapartida ao poderio norte-americanos, tivemos as duas Guerras
do Golfo e o atentado ao World Trade Center, em 11 de setembro de 2001,
inaugurando um novo período de temor voltado ao terrorismo.

Figura 15 – Ataque ao World Trade Center

Créditos: Ken Tannenbaum/Shutterstock.

20
NA PRÁTICA

Em pronunciamento ao Congresso Americano, em 12 de março de 1947,


o Presidente Harry Truman afirmou: “a política deve apoiar povos livres que
estão resistindo à tentativa de submissão a minorias armadas ou a pressões
externas [...] devemos ajudar os povos livres a buscar eles mesmos seus
próprios destinos” (Hobsbawm, 1995). Esse discurso é considerado o fundador
da chamada doutrina Truman.
Em 5 de junho do mesmo ano, o secretário de estado norte-americano,
George Marshall, em discurso na Universidade de Harvard, apresentando o
Plano Marshall, disse: “É lógico que os Estados Unidos façam o possível para
ajudar a recuperação da saúde econômica do mundo, sem a qual não pode
haver estabilidade política nem paz assegurada. Nossa política não se dirige
contra nenhum país, mas contra a fome, a pobreza, o desespero e o caos.
Qualquer governo que esteja desejando se recuperar encontrará total
cooperação por parte dos Estados Unidos da América” (Hobsbawm, 1995).
Essas citações são indicadores das preocupações da política externa
dos EUA após a Segunda Grande Guerra. A partir dessas informações, explique
a relação entre a Doutrina Truman e o Plano Marshall com relação à política
externa norte-americana no pós-guerra.

FINALIZANDO

Ao longo desta aula, voltamo-nos à Idade Contemporânea. Como vimos


desde a Revolução Francesa, que significou seu marco inicial, o período
caracterizou-se por profundas transformações, que levaram à consolidação e à
expansão do capitalismo, mas também ao estabelecimento de pensamentos e
realidades antagônicas econômica, política e ideologicamente, como o foi o caso
do socialismo implantado na Rússia a partir de 1917.
Grandes inovações tecnológicas trouxeram um “novo mundo”, mas
repleto de velhas contradições e horrores, como fome, miséria, preconceitos e
guerras cada vez mais violentas e destruidoras, principalmente se pensarmos no
século XX, que o historiador Eric Hobsbawm nomeou de a Era dos Extremos.

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REFERÊNCIAS

HOBSBAWM, E. Era dos extremos. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

HOBSBAWM, E. J. A era das revoluções. 9.ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

SAID, E. Cultura e imperialismo. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

22
TÓPICOS DE HISTÓRIA GERAL
AULA 6

Prof. Osvaldo Luís Meza Siqueira


CONVERSA INICIAL

Ao longo desta disciplina, fizemos uma longa viagem pela História,


conversando sobre os diferentes temas, essenciais para o entendimento de
quem somos e de como compreendemos a realidade e a diversidade do mundo
atual.
Como vimos anteriormente, o objetivo da História é estudar o ser
humano no tempo, por intermédio dos vestígios disponíveis (fontes históricas).
Nesse sentido, o ofício do historiador se moldou ao longo dos anos a partir de
diferentes teorias e metodologias, que nortearam seu trabalho e os
procedimentos de pesquisa e análise de dados.
Nesta aula, vamos ampliar nossos conhecimentos sobre historiografia,
elucidando como o fazer História foi pensado ao longo do tempo e na atualidade.

TEMA 1 – PENSANDO A HISTÓRIA

Pensar a história nos faz olhar para trás e investigar os vestígios que
sobreviveram ao tempo, e que chegaram até nós como indícios do passado,
como já comentamos em aula anterior. Tais indícios são a matéria-prima do
historiador. É na compilação e na interpretação desses vestígios que o
historiador irá buscar o conhecimento e o entendimento do passado, o que
denominamos de “ofício do historiador”.
Por mais obtuso que isso possa ser, talvez o maior sonho de um
historiador seja a possibilidade de uma viagem no tempo – poder, como H. G.
Wells fez na literatura, fabricar uma máquina que possa levar ao mais distante
passado, a fim de que conhecimentos e vivências se unam numa só experiência.
Infinitas vezes poderíamos reviver um mesmo momento da história, um mesmo
sentimento, uma mesma dor, uma mesma alegria, uma mesma paixão. Como
quem aperta o botão do replay, inúmeras vezes poderíamos assassinar César
entre os senadores romanos, entregar o pincel para que Leonardo da Vinci desse
o último retoque no quadro da Monalisa, invadir a Bastilha com o povo francês,
e acompanhar o desembarque de Colombo. A história deixaria de ser "história",
para se tornar "reportagem no local, ao vivo". Será que encontraríamos o Olimpo
de Zeus, o rei dos deuses gregos? Será que encontraríamos Iavé, deus dos
judeus? Será que encontraríamos um Cristo pregado a uma cruz?

2
Quantos mitos cairiam ou se confirmariam ao longo de nossas viagens no
tempo! Mas será que o objetivo de um historiador é derrubar mitos, ou a partir
deles entender a mentalidade de um tempo, a maneira de pensar, sentir e agir
de uma época?

Figura 1 – H. G. Wells, escritor de ficção-científica

Crédito: Delcarmat/Shutterstock.

Que admirável seria se tudo isso fosse possível! Porém, se H. G. Wells


realmente inventou uma máquina do tempo, a levou com ele e não ensinou a
ninguém como fazer outra. Portanto, ainda estamos aqui, presos em nossa "cela"
de tempo, e sem chaves para sair. Assim, devemos continuar a analisar os
envelhecidos documentos e a escavar as antigas ruínas, em busca de
conhecimento e de uma aproximação com o passado.
De forma inescapável, todo o historiador é um homem de seu tempo, que
respira ares de outras épocas. Para ele, o passado é vivo e falante, tão presente
quanto o próprio presente.

TEMA 2 – O NASCIMENTO DA HISTÓRIA NA BUSCA PELO CONHECIMENTO

A história nasceu unida à filosofia. E em seu princípio, a filosofia abrangia


todas as áreas que mais tarde iriam se firmar sozinhas, como a matemática, a
biologia, a astronomia, a política, a psicologia e outras.
Foi a filosofia que nos apresentou a importância de buscar o
conhecimento. Para o grande filosofo grego Sócrates, a virtude se identificaria
com o saber: o homem só agiria mal por ignorância. De acordo com ele, quando
agimos erradamente, é porque não sabemos o que está em jogo. Sócrates
estava interessado em formular definições claras e universalmente válidas para
3
o certo e o errado. Salientando a importância da dúvida, e de não aceitar o
conhecimento considerado pronto e acabado, declarou: "Só sei que nada sei”.
Sócrates sentia a necessidade de estabelecer uma base sólida para o
conhecimento, um alicerce que, segundo ele, estaria na razão do homem.
Contam que, certa vez, um amigo de Sócrates perguntou ao oráculo de Delfos
quem era o homem mais sábio de Atenas. O oráculo respondeu que, dentre
todos os mortais, Sócrates era o mais sábio, já que apenas ele tinha plena
percepção de sua ignorância diante das coisas do mundo.
Muitos e muitos séculos depois, René Descartes (1596-1650) retomaria a
dúvida e a não aceitação do saber considerado pronto, afirmando que, para se
chegar ao conhecimento, deve-se usar a dúvida como método. Descartes
chegou à conclusão de que a dúvida é uma importante aliada intelectual, pois
ela garante a existência do pensamento. Foi considerado o precursor do
movimento Iluminista, que carregava o intuito de trazer as "luzes" da razão e do
conhecimento e as sobrepor às "trevas" da ignorância e do misticismo. Só o
conhecimento traz a verdadeira felicidade, acreditavam os filósofos iluministas.
Ainda na Grécia Antiga, Platão, discípulo de Sócrates, no livro VII da
República, elaborou uma importante metáfora, o chamado “Mito da Caverna”.
Para Platão, todos nós estaríamos presos desde a infância no fundo de uma
caverna, imobilizados, condenados pelas correntes que nos trancafiam a olhar
sempre a parede em frente, e a considerar as sombras que vemos do mundo
exterior da caverna como verdades. Somente rompendo os grilhões e saindo da
caverna, para a luz, para o conhecimento, veremos que as sombras
fantasmagóricas que nos aterrorizaram por muito tempo não passavam de
sombras.
Foram os gregos que descobriram, a partir de sua busca pelo
entendimento das coisas, a importância da explicação histórica. Foi Heródoto,
chamado de “pai da História”, o primeiro a fazer investigações nesse sentido e a
procurar a "verdade", propondo indagações entre seus contemporâneos, e
também aproveitando para escrever História, a partir de tradições orais e
registros escritos. Preocupados em conhecer a organização de suas
cidades-Estado, e as transformações sofridas por elas, os gregos buscaram
explicações para as situações que viviam, espelhando a preocupação do
historiador com as questões de seu tempo. Mais tarde, os romanos
acrescentaram a isso uma noção utilitária e pragmática, isto é, mais objetiva e

4
prática à história, passando então a exaltar o papel e a importância de Roma,
como centro do mundo e como medida de civilização, legando à condição de
rudes bárbaros todos que não fossem romanos.

Figura 2 – Heródoto, o primeiro historiador

Crédito: Naci Yavuz/Shutterstock.

TEMA 3 – O CONHECIMENTO NÃO É PERMITIDO

Voltando a Sócrates: em 399 a.C., ele foi acusado de corromper os jovens


com seu pensamento, considerado subversivo. Por conta disso, foi condenado
à morte. Ele poderia ter pedido clemência. Poderia ter salvado a própria vida se
tivesse concordado em deixar Atenas, aceitando a pena de ostracismo (exílio);
mas, se agisse dessa forma, não teria sido coerente consigo mesmo. Para ele,
a consciência e a verdade eram mais importantes que a vida. Assegurou ao júri
que agira apenas pelo melhor dos interesses do Estado, e preferiu cumprir a
sentença e tomar o veneno que lhe foi destinado. A morte de Sócrates significou
o fracasso para a propalada democracia ateniense, tão alicerçada em princípios
de cidadania e participação. Certamente, essa foi a intenção de Sócrates ao
evidenciar com sua execução os desvios da política em Atenas.
De forma geral, todos aqueles que detiveram poder ao longo da História
ocultaram ou proibiram o conhecimento e os questionamentos que poderiam
colocar em dúvida o status quo. No Egito Antigo, os escribas mantinham o
monopólio de um conhecimento específico, distante de toda a massa da
população, colocando-se como os únicos que sabiam ler os hieróglifos (que era
uma escrita sagrada). Também a Igreja Católica, durante a Idade Média,

5
concentrou toda a cultura. O clero falava o latim, língua em que eram redigidos
os documentos da época. O uso da escrita havia quase desaparecido. O ensino
era privilégio da Igreja, de modo que acontecia geralmente nas escolas dos
mosteiros, sendo destinado quase que exclusivamente aos seus membros.
Mais tarde, a Inquisição estabelecida a partir do século XIII teve como
objetivo defender a Igreja Católica, julgando e punindo as heresias, isto é, as
supostas faltas contra Deus e contra a Igreja, sua pretensa representante na
Terra. A Igreja se encarregava de perseguir e destruir toda sabedoria que
pudesse ameaçar seu domínio; para tanto, chegou a criar o index librorum
prohibitorum, uma relação de livros proibidos a todo cristão. Para buscar
conhecimento, era necessário desafiar, arriscar-se a condenações e punições.

Figura 3 – Inquisição

Crédito: Everett Historical/Shutterstock.

Durante o período colonial no Brasil, os portugueses tentaram impedir o


acesso à cultura, como forma de evitar rebeliões e revoltas contra o domínio
lusitano. Novos ideais de liberdade, igualdade e autodeterminação poderiam ser,
supostamente, prejudiciais ao bom andamento da colônia. Em seu livro Raízes
do Brasil, considerado um clássico da historiografia brasileira, Sergio Buarque
de Holanda nos mostra como os portugueses se voltaram ao propósito único de
exploração de sua colônia, como um grande empreendimento comercial.
Já no século XX, os membros do partido nazista na Alemanha queimaram
livros considerados perniciosos, em maio de 1933, menos de quatro meses
depois da chegada de Adolf Hitler ao poder. Em Berlim, estudantes nazistas
6
acompanharam, brandindo archotes, dois caminhões repletos de livros, da Porta
de Brandemburgo até a Praça da Ópera, onde obras de intelectuais como
Sigmund Freud, Heinrich Mann, Karl Marx e Kurt Tucholsky foram reduzidas a
cinzas em ato público, realizado ali e em mais 21 cidades do país. Pinturas de
artistas considerados “degenerados” pelos nazistas, como Van Gogh, Picasso,
Matisse, Cézanne e Chagall, foram banidas dos museus. Tudo o que fosse
crítico ou que significasse um desvio dos padrões impostos pelo regime foi
destruído.
De Sócrates até os iluministas, como Descartes, vimos a importância do
conhecimento como forma de entendimento do mundo e da realidade que nos
rodeia. Sem o conhecimento, continuaríamos numa caverna, como no mito de
Platão, sem consciência de nossa própria ignorância.
Ao tentar proibir o conhecimento, muitos também se voltaram ao passado,
pois o conhecimento sobre o que foi também pode se mostrar perigoso. Afinal,
o conhecimento histórico proporciona um alargamento da compreensão do ser
humano sobre si mesmo e sobre a sociedade, enquanto ser que constrói sua
trajetória no mundo. Dizem que o historiador tem o péssimo hábito de nos
lembrar daquilo que gostaríamos de esquecer. Como vimos com os gregos,
através do conhecimento e da compreensão do passado, podemos entender o
nosso presente, o que às vezes não é desejado.
O conhecimento é uma forma de estar no mundo, e o processo do
conhecimento mostra aos homens que eles não são seres prontos com
formulações absolutas sobre a realidade que os rodeia. Em verdade, a relação
com o conhecimento, seja do passado e/ou do presente, implica uma
transformação do sujeito mediante o novo saber. Pode-se dizer também que
implica uma transformação do que foi o objeto do conhecimento, já que ele passa
a ter sentido. Podemos dizer, assim, que conhecer é decifrar os códigos ocultos
no mundo ao nosso redor, códigos que às vezes nem conhecíamos.

TEMA 4 – HISTÓRIA E HISTORIOGRAFIA

A interpretação de algum fato está ligada diretamente a uma teoria e a um


método. Uma mesma história pode ser contada de formas diferentes,
dependendo de como a estamos analisando. O que está por trás das diferentes
formas de explicação é a teoria que aceitamos, e que se apresenta estreitamente
ligada à nossa forma de encarar o mundo e sua realidade.
7
Um historiador é um indivíduo em sociedade que faz parte da história que
está vivendo e das concepções de seu tempo. Portanto, escreve "historicamente
situado", ou seja, numa determinada época, dentro de condições concretas de
sua classe, da linha de sua instituição de ensino e pesquisa. Seu trabalho estará
condicionado ao nível de conhecimento existente e às suas concepções, ainda
que de forma inconsciente. De acordo com o historiador francês Fernand
Braudel, "a história é filha de seu tempo”.
A historiografia, isto é, a escrita da história, passou por um longo trajeto
desde os antigos gregos. Durante a Idade Média, a maior parte da história escrita
não apresentava um rigor crítico de investigação, pois era composta, sobretudo,
das chamadas crônicas ou anais, em que eram relatados fatos compilados por
cronistas contratados por alguma casa real, para contar sua história, enobrecer
seus feitos e exaltar seu poder.
Muitos desses cronistas eram homens da Igreja, religiosos que colocavam
em seus relatos uma visão providencialista, que propunha a história e os
acontecimentos como resultantes da ação divina. Foi o caso de Isidoro de
Sevilha, que viveu no século VI. Em sua obra de teor ufanista, acerca dos
visigodos na península Ibérica, idealizou-os como portadores de honradez e
bravura, herdeiros da dignidade da Roma cristã.

Figura 4 – Manuscritos medievais

Crédito: Mara Fribus/Shutterstock.

Foi apenas no século XVIII que os estudiosos humanistas, que se


voltavam ao homem, sua sociedade e sua produção cultural, fizeram reviver o
pensamento crítico dos filósofos e historiadores da antiguidade clássica. Surgiu
então a preocupação com a sociedade em seu sentido mais amplo, com uma

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"história da civilização", interessada em mostrar a história como sendo um
desenvolvimento linear, progressivo e ininterrupto. Os historiadores passaram a
se voltar à ação política e a seus grandes eventos e personagens.
Foi na Alemanha do século XIX que surgiu a preocupação em transformar
a história em uma ciência, de modo que o critério da prova documental passa a
ter um peso cada vez mais significativo na narrativa historiográfica. A máxima de
de Leopold von Ranke segundo o qual a história deveria narrar os fatos "como
eles realmente se passaram". Nessa perspectiva, a escrita da História deveria
estar condicionada especificamente aos olhares institucionais, cabendo ao
historiador compreender um leque de fontes documentais (pois estas teriam
validade para uma produção científica sobre o passado, de acordo com a visão
rankeana). A compreensão da História como uma ciência que junta retalhos que
se encaixam linearmente, como uma grande sucessão de acontecimentos, é
uma visão que possui expressividade no campo historiográfico e se faz muito
presente, principalmente nos moldes da disciplina na Educação Básica (ainda
que críticas sobre essa perspectiva sejam muito fortes em outras vertentes
teóricas).
Ainda no século XIX, Karl Marx e Friedrich Engels, ao fazerem a crítica da
sociedade em que viviam, e apresentarem propostas para sua transformação,
elaboraram uma nova concepção filosófica de mundo, que mudou
definitivamente a forma de pensar e produzir história. Os referidos pensadores
estudaram, por intermédio do materialismo histórico (categoria de análise
desenvolvida por ambos), as características políticas e econômicas do projeto
social dominante na modernidade: o capitalismo.

Figura 5 – Karl Marx e Friedrich Engels

Crédito: Maykova Galina/Shutterstock.

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Apesar da concepção marxista não ter sido adotada integralmente, aos
poucos foram aparecendo influências dessa teoria de história, sobretudo na
França, em trabalhos publicados na revista Annales, lançada em 1929 por Marc
Bloch e Lucien Febvre. Esses historiadores abriram um campo mais amplo de
análise e produção historiográfica. Sem desejar que suas teorias e hipóteses
fossem consideradas verdades absolutas, queriam, pelo contrário, a prática de
uma história questionadora e sem respostas prontas. Ao invés do estudo dos
fatos singulares, procuraram chamar a atenção para a análise das estruturas
sociais, estudando seu funcionamento e evolução, e considerando os grupos
humanos sob todos os seus aspectos, de modo que a História estivesse aberta
a outras áreas do conhecimento humano, como a geografia, a antropologia e a
sociologia. Foi sem dúvida a precursora dos campos de interesse da chamada
Nova História, com sua história das mentalidades, do cotidiano, da vida privada,
do cinema e outros. Os objetos de investigação da História se multiplicaram a
partir de então, fazendo surgir uma enorme variedade de temas e de
possibilidades de fontes.
Como se vê, a análise histórica oscilou constantemente ao longo do
tempo, interferindo e imprimindo diferentes ritmos sobre as formas de fazer sua
escrita até a atualidade.

TEMA 5 – NOVA HISTÓRIA

Como vimos, foi desde o século XIX que a história tomou novos
direcionamentos, encaminhando-se para se tornar uma ciência em busca de
método próprio. Nesse contexto, surgiu a chamada “escola metódica”, que
buscava fugir da subjetividade e do comprometimento de antigos cronistas.
O historiador deveria, assim, zelar pela objetividade, a fim de apresentar
seus escritos sem qualquer traço da estética literária. Seu discurso deveria ser
frio, duro e sem quaisquer resquícios de “paixões” pessoais. Deveria, tão
somente, descrever o que estava contido na fonte, buscando apenas pesquisar
os documentos, reuni-los, classificá-los, para a construção de sua narrativa,
agrupando e ordenando os fatos numa sequência de causa e efeito.
No entanto, como vimos, a virada do século trouxe à baila intensos
debates, que punham em evidência a maneira como tal “escola historiográfica”
pensava e produzia conhecimento, principalmente a partir de 1929, com Marc
Bloch e Lucien Febvre, na École des Annales. A Nova História que começava a
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dar seus primeiros passos se apresentava como uma reação contra o paradigma
tradicional.
Peter Burke salienta que a crítica à história tradicional pode ser resumida
em seis pontos principais:

1. Na visão de uma História relacionada essencialmente à política, sem


considerar outros campos de estudo da atividade humana.
2. Na produção de uma História tradicional, voltada apenas à narrativa nua
e crua de acontecimentos.
3. Na visão personalista, concentrada em feitos de grandes homens,
estadistas, generais, considerados os vultos da História.
4. No paradigma de que a história deveria ser baseada apenas em
documentos e registros oficiais preservados em arquivos do governo.
5. No paradigma tradicional de causa e efeito, sem considerar as inúmeras
varáveis através das quais um determinado acontecimento pode ser
elucidado e compreendido dentro de seu contexto histórico.
6. Na visão de uma História objetiva, que apresenta, supostamente, o fato
como ele efetivamente aconteceu.

Diferentemente da visão tradicional, a Nova História tem por premissa a


ideia de que a realidade é social e culturalmente construída, já que o homem é
um ser social e culturalmente localizado. Como disse o historiador da
contemporaneidade, Eric Hobsbawn, “não há povo sem história ou que possa
ser compreendido sem ela.” Portanto, todo o ser humano produz história
individualmente e em sociedade. Desde a Pré-História e das chamadas
comunidades primitivas, o homem vive em agrupamentos e produz sua história
em sociedade e a partir dela.
Neste sentido, sem dúvida, a aliança com a antropologia social e a cultural
ampliou o quadro de referências dos historiadores, contribuindo para a
construção de novos paradigmas e para a ampliação de objetos possíveis de
estudo em consonância com outras ciências sociais, assim como com outras
áreas do conhecimento.
Pode-se dizer que a Nova História é representada pela terceira geração
dos Annales, com historiadores como Jacques Le Goff, Pierre Nora, George
Duby e Jean Delumeau, que se centraram em pesquisas norteadas por uma
perspectiva interdisciplinar, buscando diversidade de abordagens históricas.
Mais tarde, surgiram nomes como Giovanni Levi e Carlo Ginzburg.
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NA PRÁTICA

Normalmente, a História é pensada como uma "narração das coisas que


aconteceram", ou seja, seria “o passado como tal”, como aconteceu “realmente”,
ou sua reconstrução ou narrativa por um especialista (o historiador). Porém, os
historiadores não narram ou reconstroem o passado, pela simples razão de que
o passado nos é inacessível, não existe mais e não pode ser reavivado ou
recuperado como realmente foi. O único acesso que temos ao passado é pelo
presente, por objetos, textos ou recordações de indivíduos vivos que existem, e
que os historiadores, com seu olhar treinado, identificam como restos de um
passado que não existe, como sobrevivências que podem ser tratadas como
documentos:
Com base no texto, explique a noção de fonte histórica subjacente às
reflexões do autor.

GUARINELLO, N. L. Uma morfologia da História. Politeia, Vitória da Conquista,


v. 3, n. 1, p. 41-61, 2003.

FINALIZANDO

Nesta, nosso objetivo foi encerrar o caminho que iniciamos há alguns


encontros. Buscamos compreender a História enquanto ciência, com a
importância da busca por conhecimento, e como a História foi feita ao longo do
tempo, de Heródoto, considerado o primeiro historiador, passando pelos
cronistas medievais e chegando à atualidade.
Como vimos em nossa primeira aula, o objetivo da História é estudar o
homem no tempo. Nesse sentido, viajamos, ao longo de nossa disciplina, através
de diferentes épocas, estudando os acontecimentos mais marcantes e
significativos da História humana.
Esta disciplina teve por função, como comentamos no início de nosso
caminho, ajudá-lo a aproveitar da melhor forma tudo o que o curso de História
tem para oferecer.

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REFERÊNCIAS

BLOCH, M. Introdução à Histórica. Lisboa: Europa-América, 1997.

BOUTIER, J.; JULIA, D. (Org.). Passados recompostos: campos e canteiros da


História. Rio de Janeiro: UFRJ/FGV, 1998.

BURKE, P. A escrita da História. São Paulo: UNESP, 1992.

CARR, E. H. O que é História? Lisboa: Gradiva, 1986.

COLLINGWOOD, R. G. A ideia de História. Lisboa: Presença,1981.

FONSECA, S. G. Caminhos da História ensinada. Campinas: Papirus, 2001.

VEYNE, P. Como se escreve a História. Brasília: UNB, 1995.

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