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Resumo:
O processo de ensino/aprendizagem de química tem-se tornado um grande desafio, pois
os estudantes sentem muita dificuldade em compreender determinados conteúdos,
como reações químicas e assuntos abstratos que mexem com sua imaginação. O projeto
extensionista “O Show de Química” foi idealizado na Universidade de Pernambuco (UPE)
– Campus Garanhuns com a apresentação lúdica e musical de alguns experimentos
químicos, com o objetivo de estimular o interesse dos estudantes do município de
Garanhuns pelo aprendizado da disciplina de Química. A metodologia adotada incluiu a
realização de reuniões semanais entre dez graduandos do curso de Licenciatura em
Ciências Biológicas e a professora de química da instituição para fundamentação teórica,
discussão e elaboração das atividades experimentais e lúdicas e posterior divulgação do
projeto com apresentações em escolas públicas e privadas do município. Os resultados
mostraram que, em geral, os estudantes sentem falta de atividades práticas para o
ensino de Ciências e que este tipo de metodologia poderia contribuir com a transferência
à comunidade do conhecimento gerado e instalado na UPE, bem como com ideias e
oportunidades para que os docentes melhorem a sua prática pedagógica.
Palavras-chave: Ensino de química. Experimentação. Extensão Universitária.
1
Abstract:
The process of teaching and learning chemistry has become very challenging, since
students have difficulty understanding certain content such as chemical reactions and
abstract subjects that play with their imagination. The extension project O Show de
Química ("The Chemistry Show") was devised at the Universidade de Pernambuco (UPE),
Campus Garanhuns, as a ludic and musical display of chemical experiments to arise
interest on the subject in students of the municipality. Ten graduation students in
Biological Sciences and the theoretical foundations professor met weekly for discussion
and design of the activities, and later promoted the project with performances in local
public and private schools. The results showed that schools are generally lacking in
practical activities as part as their scientific program, and that actions like this help share
the knowledge created within the UPE with the community, as well as provide ideas and
oportunities for improved faculty practice.
Keywords: Teaching of Chemistry. Experimentation. Academic Extention.
1. Introdução
O estudo da química enquanto ciência abrange diversos acontecimentos, oriundos
dos conhecimentos acerca da estrutura da matéria, seguindo por suas mudanças. O fato de
estar interligada ao dia-a-dia dos estudantes demonstra a sua grande relevância na área das
ciências. Por conseguinte, muitos discentes não são entusiastas quando se refere ao ensino
da química (SANTOS et al., 2013).
O fato de algumas escolas utilizarem apenas métodos teóricos talvez tenha
contribuído para a visão deturbada de muitos discentes em relação à química, o que os
levam apenas a “decorar”. (ZUB, 2012). Ademais, a química lida com um universo
microscópico dificultando a assimilação dos seus diversos conceitos por parte dos
estudantes, o que requer da imaginação para construir seus conhecimentos (JÚNIOR;
PARREIRA, 2016).
O uso da experimentação no ensino de química tem o objetivo de promover a
interligação de concepções entre os conteúdos teóricos e práticos, visando à construção do
conhecimento científico através do entendimento dos processos físicos e químicos que
podem ser vistos durante a aplicação experimental (GOUVEIA et al., 2018).
Além disso, é preciso considerar para a realização de uma aula prática as instalações
das escolas, materiais necessários, riscos de cada experimento para a segurança dos
estudantes e também procurar maneiras atrativas para despertar o interesse dos alunos
mais indiferentes, além da visualização atraente é necessária uma explicação teórica simples
(SANTOS; NAGASHIMA, 2017).
Ao usar a experimentação, o ensino passa por viés de dinamicidade, proporcionando
aos discentes a construção de problemas que poderão ser discutidos com a finalidade de
encontrar as resoluções que possam explicar os fenômenos observados (SILVA; MACHADO,
2008). Todos esses aspectos que envolvem o uso de experimentos em sala de aula reforçam
a necessidade dos docentes buscarem diferentes metodologias de ensino.
Assim, com o intuito de divulgar de maneira informal a Química por meio de
experimentos, bem como utilizar outras estratégias didáticas para incentivar o interesse dos
alunos por esta nobre área, o “Show de Química” foi criado na Universidade de Pernambuco
2
– Campus Garanhuns com a apresentação lúdica e musical de alguns experimentos químicos,
com o objetivo de desmistificar essa ciência.
3. Metodologia
O projeto “Show da Química” foi implantado na Universidade de Pernambuco (UPE) a
partir da necessidade da curricularização da extensão nos cursos de graduação. Ele está
inserido no programa “A Ciência na expressão de outros saberes” aprovado no Edital do
Programa de Fortalecimento Acadêmico (PFA) Extensão da UPE - 01/2019 e contou com a
participação de dez estudantes de graduação do curso de Licenciatura em Ciências
Biológicas da UPE – Campus Garanhuns. A primeira fase do projeto foi dedicada ao
treinamento dos componentes do grupo quanto as boas práticas de laboratório e a seleção
dos experimentos. Posteriormente, foi idealizada a melhor maneira de apresentar os
experimentos ao público (alunos do ensino fundamental e médio), visando sempre uma
demonstração lúdica e descontraída da química. A segunda fase do projeto foi dedicada a
apresentação do “Show da Química”, de maneira itinerante, nas escolas públicas e privadas
da região. Foram realizadas quatro apresentações no ano 2019, duas em uma escola pública
do município de Garanhuns, ambas para turmas do 1º ano do ensino médio e duas em uma
escola privada do município, sendo uma turma do 9º ano do ensino fundamental e uma
turma do 1º ano do ensino médio.
Um total de quatorze experimentos demonstrativos foram utilizados nas
apresentações e são descritos em maior detalhe.
2H2O2 2H2O + O2
3
A explicação química para esse experimento é que o H2O2, também conhecido como
água oxigenada, é uma substância instável, que libera o oxigênio (O2) muito facilmente,
deixando de ser H2O2 e transformando-se em H2O. O IK, por meio do íon iodeto (I-), funciona
como um catalisador da reação e acelera a decomposição do H2O2, fazendo com que ele
libere o O2 de forma muito rápida.
2H2O2 + I- 2H2O + OI-
2H2O2 + OI- 2H2O + I- + O2
Garrafa azul
Esse experimento foi abordado conceitos de óxido-redução, ação de catalisadores e
dissolução do ar atmosférico em água. Para a sua realização utilizou-se um Erlenmeyer de
1 L, foram adicionados 250 mL de uma solução incolor, formada por NaOH (10 mg)
dissolvido sob agitação em 200 mL de água destilada e em seguida diluída a 250 mL e 250 mL
de uma segunda solução incolor, formada por glicose (C6H12O6) (10 mg) dissolvida sob
agitação em 200 mL de água destilada e em seguida diluída a 250 mL. Por fim, foi adicionado
30 gotas de azul de metileno 1%. O Erlenmeyer foi deixado em repouso até a solução
resultante tornar-se incolor, após agitação a solução volta a coloração azul e, após
permanecer em repouso, a coloração da solução volta para incolor. Esse ciclo de mudança
de coloração pode ser repetido até que o líquido se inutilize.
O azul de metileno catalisa a reação porque atua como agente de transferência de
oxigênio. Ao oxidar a C6H12O6 em meio alcalino, o azul de metileno (cor azul) reduz-se a
leuco-metileno (forma incolor). O leuco-metileno se re-oxida rapidamente enquanto houver
oxigênio no sistema. Ao agitar o Erlenmeyer o O2 do ar atmosférico é dissolvido na solução e
rapidamente ocorre a oxidação do leuco-metileno para azul de metileno e a solução volta a
ser da cor azul (JESUS, 2018).
(purpura) (incolor)
A trilha sonora do experimento foi “Nunca teve um amigo assim” (do filme Alladin).
Experimento 9: Cristalização
A cristalização é um processo natural ou artificial da composição de cristais sólidos,
em geral a partir de uma solução homogênea. A quase totalidade dos sólidos naturais e
artificiais se encontra no estado cristalino, ou seja, seus átomos estão dispostos em arranjo
periódico e ordenado em três dimensões. Esse processo consiste em dois eventos principais,
a nucleação e o crescimento dos cristais, ocorrendo espontaneamente pela dissipação de
energia dos sistemas, em decorrência da otimização geométrica das ligações químicas entre
cátions e ânions, formando padrões tridimensionais altamente ordenados. A cristalização
está presente em muitos materiais conhecidos como nossos ossos e dentes. No entanto,
esse processo não faz parte de nossa observação cotidiana (COSTA; ANDRADE, 2014).
Esse experimento explora a formação de cristais utilizando a cristalização do acetato
de sódio numa solução supersaturada. Para a sua realização foi colocado 40 g de acetato de
sódio tri-hidratado (NaC2H3O2.3H2O) e 12 mL de água destilada fervente em um béquer
(50 mL) para a dissolução completa do sal tri-hidratado. Em seguida, essa solução
supersaturada foi deixada em repouso para resfriar até a temperatura ambiente. Ao resfriar
essa solução será supersaturada para o sal tri-hidratado, mas subsaturada para o sal anidro
(NaC2H3O2). Ao verter essa solução sobre cristais (gérmens de cristalização) dispostos numa
superfície propiciará a germinação e propagação do processo de cristalização do
NaC2H3O2.3H2O, em um processo exotérmico com a liberação de calor.
A nucleação e o crescimento ocorrem em soluções supersaturadas, seja pelo
aumento na concentração, por exemplo, evaporação do solvente, ou por variações na
temperatura; na maioria das soluções, a diminuição da temperatura favorece a cristalização
(COSTA; ANDRADE, 2014). 9
Esse experimento foi realizado ao som da Música: “Livre estou” (Let It go do filme
Frozen).
Varinha mágica
Esse experimento diz respeito a reação do ácido sulfúrico concentrado (H 2SO4) com o
KMnO4 com a formação do heptóxido de manganês (Mn 2O7), que se apresenta como um
líquido denso esverdeado e que é um forte agente oxidante, capaz de promover uma
violenta reação de combustão quando em contato com qualquer material orgânico.
Serpente negra
O experimento serpente negra ou serpente do Faraó é talvez uns dos experimentos
mais fascinantes da química. Ele foi primeiramente reportado em 1821 pelo químico Wohler,
demonstrando a notável propriedade do tiocianato de mercuroso, porém devido ao elevado
nível de toxicidade dessa reação, houve o desenvolvimento de variações desse experimento
(JESUS, 2018).
O “show da química” utilizou do recurso da carbonização da sacarose e produção de
gás carbônico para a formação da serpente. Para a produção dos “ovos da serpente” foi
utilizado 20 mg de NaHCO3, 40 mg de sacarose (C12H22O11) e quantidade suficiente de etanol
(70 °C) para tornar essa mistura uma massa modelável. Os “ovos da serpente” foram feitos 10
previamente. No momento do show, uma bacia de inox com areia foi umedecida com álcool
e os “ovos” foram distribuídos. Com o auxílio da “varinha mágica” do experimento anterior,
o álcool sofreu combustão e iniciou o processo de combustão da sacarose e decomposição
térmica do NaHCO3.
C12H22O11 + 12O2 11H2O + 12CO2 (combustão completa da sacarose)
2NaHCO3 Na2CO3 + H2O + CO2 (decomposição do bicarbonato de sódio)
Na2CO3 Na2O + CO2 (decomposição do carbonato de sódio)
C12H22O11 12C(grafite) + 11H2O (combustão incompleta da sacarose)
Sabendo que o CO2 é um gás não inflamável, ao acender uma chama próxima ao
balão inflado com esse gás ocorrerá apena um breve estouro.
Balão explosivo
O hidrogênio (H2) é gás incolor, inodoro, bastante inflamável e é bem mais leve que o
ar atmosférico. Esse gás é produto em laboratório por ação de ácidos não oxidantes e álcalis
sobre metais.
Esse experimento é bem curioso e explora a formação de H 2. Foi utilizado um
kitassato (1 L) com uma mangueira plástica acoplada na sua saída. Nele foi adicionado
200 mL de solução de NaOH (4 M). Um balão de festa foi acoplado a mangueira e em
seguida foi adicionado à solução alcalina pedaços (bolinhas) de papel alumínio. Por fim, o
kitassato foi tampado com uma rolha de borracha. A produção de H2 leva ao aumento
progressivo da pressão no interior do kitassato e subsequente expansão do balão.
O alumínio (Al) reage tanto em meio ácido como em meio básico. Ao iniciar a reação
ocorre a formação de um precipitado hidróxido de alumínio (Al(OH)3), esse se dissolve em
excesso de hidroxila formando o hidroxicomposto aluminato (Al(OH)4-) e a liberação de H2.
Figura 12. Reação de óxido-redução do alumínio em meio básico com formação do gás
hidrogênio.
Fonte: Autor, 2020.
Ao acender uma chama próximo do balão com H2 ocorre uma explosão. A queima do
H2 é tão rápida que não causa expressiva transferência de calor para as mãos do operador.
Figura 13. Equação de formação do complexo de coordenação do íon tiocianato com o íon
ferro (III).
Fonte: Autor, 2020.
4. Considerações Finais
O “Show da Química” na Universidade de Pernambuco (UPE) Campus Garanhuns foi
criado no ano de 2019. No entanto, o pioneirismo em apresentar a química de forma lúdica
e experimental veio do Prof. José Atílio Vanin durante a comemoração do cinquentenário da
Universidade de São Paulo (USP) em 1984, onde o professor pôde realizar seu antigo sonho
de infância, de bruxo e alquimista através do show do grupo Química em Ação, essa
proposta inovadora atingiu um público estimado em 50 mil pessoas através de três centenas
de apresentações, com um papel muito importante em divulgar a química para a
comunidade (TOMA; SANTOS, 2001). Essa ideia inovadora logo tomou conta do Brasil e hoje
muitas Universidades e Institutos de Ensino utilizam essa prática pedagógica.
Mas o desafio em realizar o show da química vai muito além do conhecimento de
algumas reações químicas. Ao implantar essa proposta na UPE os componentes do grupo
tiveram que vencer algumas barreiras e paradigmas, pois para a apresentação se tornar
atraente e o show verdadeiramente acontecer todos os componentes do grupo tiveram que
desenvolver habilidades artísticas para idealizar uma maneira lúdica, através de recursos
visuais e sonoros da linguagem audiovisual e primordialmente que a química estivesse
presente. Após essa etapa, de maneira itinerante, o show da química da UPE Campus
Garanhuns pôde acontecer nas escolas no município.
A cada show da química realizado pudemos perceber a importância que as atividades
de extensão da Universidade possuem. Os shows foram muito elogiados pelos estudantes
que assistiram, vários chegaram a dizer...“ venham mais vezes”, “a aula de química dessa
maneira é muito mais divertida”. Essa força motriz proporcionada pelo show pode 13
demonstrar que mesmo sem, muitas vezes, possuir laboratórios de química na escola é
possível realizar aulas práticas utilizando materiais e reagentes de baixo custo para ensinar
alguns conceitos, como por exemplo, os de ácido – base utilizando o chá de repolho roxo
como indicador pH (SILVA C.; CLEMENTE; PIRES, 2015).
Segundo Gouveia et al. (2018), a falta de aulas experimentais no ensino de química é
um fator que contribui para as dificuldades apresentadas por muitos estudantes, sendo que
67% dos estudantes afirmaram possuir problemas com o aprendizado da disciplina. Vieira e
Silva (2016) corroboram esta hipótese a partir da análise de alguns pesquisadores e
docentes sobre o uso de experimentação ser fundamental na construção do ensino.
Assim, podemos concluir que o projeto extensionista show da química proporcionou
aos estudantes uma vivência com aulas experimentais tendo o lúdico como base.
Demonstrou que a disciplina de química vai além de cálculos e do imaginário ao utilizar
metodologias mais ativas no processo de ensino – aprendizagem, sendo a experimentação
um eixo fundamental para que os estudantes compreendam alguns conceitos teóricos,
através de sua associação com a prática.
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