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F I B R I L A Ç Ã O E F L U T T E R AT R I A L

P R O F. J U A N D E M O L I N A R I

SETEMBRO DE 2021
CARDIOLOGIA Prof. Juan Demolinari | Fibrilação e Flutter Atrial 2

APRESENTAÇÃO:

PROF. JUAN
DEMOLINARI
Caro Estrategista,

Meu nome é Juan Demolinari Ferreira, sou médico


formado pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) em
2013. Fiz Residência de Clínica Médica e Cardiologia no Hospital
Therezinha de Jesus, vinculado à Faculdade de Ciências Médicas
e da Saúde de Juiz de Fora (SUPREMA). Posteriormente, cursei
Residência em Ecocardiografia no Hospital Universitário da UFJF.

Antes do término da Residência em Cardiologia, ingressei


no Hospital Universitário da UFJF, por meio de concurso público,
como preceptor da Residência de Clínica Médica (“o bom filho a
casa torna”). Em 2018, vivi uma experiência curiosa nesse hospital:
em alguns períodos, atuava como Residente de Ecocardiografia
e, em outros, como preceptor de Clínica Médica (quase um
transtorno dissociativo de dupla personalidade).

@profjuandemolinari
Estratégia
MED
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Logo que terminei a Residência de Ecocardiografia, fui Por meio deste material, desejo transmitir todo o
convidado a ingressar na equipe de Cardiologia do Hospital conhecimento adquirido em minha prática como Cardiologista
Therezinha de Jesus como preceptor e chefe do Ambulatório de e, principalmente, todas as informações necessárias para que
Insuficiência Cardíaca. você seja aprovado em seu tão sonhado concurso de Residência
Atualmente, trabalho diretamente na assistência a Médica.
pacientes. No entanto, a maior parte da minha rotina é voltada para Costumo dizer que os professores do Estratégia MED
o ensino médico, por meio da preceptoria direta dos Residentes não são apenas brilhantes especialistas em suas áreas, são
e do ensino dos alunos do internato da UFJF, ministrando curso também peritos em provas de Residência! Nos últimos meses,
intensivo de eletrocardiografia. Atuo ainda como preceptor da solucionamos milhares de questões e, dessa forma, podemos
pós-graduação de Ecocardiografia da SUPREMA. apontar com segurança que assuntos serão mais cobrados.
Além disso, tenho a imensa alegria de compor o time de Confie em nossa metodologia, dedique-se ao máximo e a
Cardiologia do melhor curso preparatório para Residência Médica vaga será sua!
no país: o Estratégia MED! Conte comigo!

Estratégia MED /estrategiamed

@estrategiamed t.me/estrategiamed
Estratégia
MED
CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
MED

SUMÁRIO

1.0 INTRODUÇÃO 5
2.0 DEFINIÇÃO E DIAGNÓSTICO 6
2 .1 ELETROCARDIOGRAMA 7

2 .2 HISTÓRIA CLÍNICA E EXAME FÍSICO 12

3.0 EPIDEMIOLOGIA 15
4.0 FATORES CLÍNICOS PREDISPONENTES 16
5.0 CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA 19
6.0 PREVENÇÃO DE EVENTOS TROMBOEMBÓLICOS 22
6 .1 ANTICOAGULANTES ORAIS 29

6.1.1 ANTICOAGULANTES ORAIS DE AÇÃO DIRETA (DOAC) 29

6 .1 .2 DICUMARÍNICOS (VARFARINA) 31

6 .2 MANEJO DO SANGRAMENTO POR ANTICOAGULANTES ORAIS 35

6 .3 OCLUSÃO PERCUTÂNEA DO APÊNDICE ATRIAL ESQUERDO 41

7.0 TRATAMENTO 43
7 .1 MEDICAÇÕES USADAS PARA CONTROLE DE RITMO (REVERTER A FIBRILAÇÃO ATRIAL) 51

7 .2 MEDICAÇÕES USADAS PARA CONTROLE DE FREQUÊNCIA CARDÍACA 56

7 .3 ABLAÇÃO DE FIBRILAÇÃO ATRIAL 61

7.3.1 TÓPICOS QUENTES DE FIBRILAÇÃO ATRIAL: 65

8.0 FLUTTER ATRIAL 67


8 .1 DEFINIÇÃO E DIAGNÓSTICO 67

8 .2 PREVENÇÃO DE EVENTOS TROMBOEMBÓLICOS 77

8 .3 TRATAMENTO 77

8.3.1 ABLAÇÃO DE FLUTTER ATRIAL 79

9.0 LISTA DE QUESTÕES 83


10.0 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 84
11.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS 85

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CAPÍTULO

1.0 INTRODUÇÃO

Futuro (a) Residente,


É com muita alegria que apresento a você dois temas muito Você pode observar que a abordagem da doença, incluindo
importantes: a Fibrilação (FA) e o Flutter Atrial! Dentro do bloco de a prevenção de fenômenos tromboembólicos e o tratamento
arritmias cardíacas, a fibrilação atrial é, facilmente, a mais cobrada específico da arritmia, corresponde a mais de 80% das questões.
em provas de Residência. Comparativamente, é 10 vezes mais Já o flutter atrial, muito menos frequente em provas, é
frequente em provas que o flutter. cobrado na seguinte proporção:
Juntos, esses dois temas correspondem a, aproximadamente,
6,5% das questões de Cardiologia. Não se engane! Pode parecer QUESTÕES DE FLUTTER ATRIAL
pouco em um primeiro momento, porém, após uma extensa
análise de questões, nós do Estratégia MED chegamos à conclusão
6%
de que, dentro do bloco de Clínica Médica, a Cardiologia figura
entre as disciplinas mais abordadas. Logo, 6,5% de uma disciplina
tão importante é, sim, muita coisa! 19%

Veremos que a abordagem entre ambas as arritmias é


bastante semelhante. Sendo assim, se você aprender como
conduzir a FA, automaticamente, conduzirá bem o flutter.
75%

O gráfico abaixo mostra como a fibrilação é cobrada em


provas:

QUESTÕES DE FIBRILAÇÃO ATRIAL Tratamento Classificação clínica Prevenção de tromboembolismo

Gráfico 2. Estatística das questões de flutter atrial em provas de Residência.


2%

De maneira semelhante ao que acontece com a FA, a maioria


12% 3% das questões de flutter aborda aspectos de seu tratamento.
Agora que você já conhece a frequência de aparições dessas
44% doenças em provas, vamos começar?

Prepare-se! Vem conteúdo importante aí!


39%

Tratamento Prevenção de tromboembolismo Fatores predisponentes

Classificação clínica Epidemiologia

Gráfico 1. Estatística das questões de fibrilação atrial em provas de Residência.

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CAPÍTULO

2.0 DEFINIÇÃO E DIAGNÓSTICO


A fibrilação atrial é a rainha das arritmias! Sua ocorrência é tão comum que é quase impossível dar um plantão de emergência sem
atender um paciente com essa doença!
O mecanismo fisiopatológico da fibrilação atrial é bastante complexo. O músculo atrial que apresenta fibrose ou inflamação causadas
por inúmeros fatores possui predisposição à formação de microcircuitos de reentrada, que ativarão uma atividade atrial anárquica. Uma área
especialmente ligada a essa atividade são os óstios das veias pulmonares localizados no átrio esquerdo. Dessa forma, nessa arritmia, os átrios
não se contraem de maneira organizada, eles “fibrilam”. A frequência de movimentos fibrilatórios atriais é extremamente alta, em torno de
400-600 por minuto.

Figura 1. Observe que, no sistema de condução cardíaco normal, o impulso nasce no nó sinusal e atinge o nó AV. Na fibrilação atrial, múltiplos estímulos anárquicos
surgem nos átrios e chegam ao nó AV para serem conduzidos aos ventrículos, por isso a frequência é irregular.

Você pode estar se perguntando: se os átrios estão com essa frequência tão elevada, por que os ventrículos também
não batem a 400-600 por minuto? A resposta é simples. Nosso sistema de condução cardíaco conta com uma estrutura
que funciona como um “quebra-molas”, trata-se do nó atrioventricular (nó AV). Graças a ele, quando apresentamos
qualquer arritmia atrial com frequências muito elevadas, nosso ventrículo é relativamente protegido. Sendo assim,
podemos dizer que o nó AV não deixa que todos os estímulos elétricos atriais cheguem aos ventrículos.

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2 .1 ELETROCARDIOGRAMA

É importante que você saiba que, por mais que a história clínica e o exame físico sejam sugestivos de FA, o diagnóstico dessa doença
é exclusivamente eletrocardiográfico. Esses critérios são muito cobrados em provas! Observe-os abaixo, mas, antes, atenção! Hora de tomar
um café forte e se concentrar totalmente!

Ritmo cardíaco irregular - intervalo RR irregular

Ausência de onda P bem definida

Ativação atrial muito irregular - padrão “serrilhado fino”,


multiplas ondas “f” irregulares e com frequência elevada

Figura 2. Critérios eletrocardiográficos para diagnóstico de fibrilação atrial.

Vamos então ver um exemplo clássico de um ECG com fibrilação atrial? Observe o traçado na sequência. Podemos verificar que o
intervalo RR é irregular, não há onda P bem definida e, na linha de base, há um padrão “serrilhado fino”, ou seja, é uma fibrilação atrial.

Figura 3. Os traços em verde mostram como o intervalo RR é irregular. A caixa azul evidencia que não há onda P definida e que a linha de base é irregular, no padrão
“serrilhado fino”. (Fonte: Adaptado de Shutterstock).

Dentro dos critérios, cabe aqui um comentário. Nos casos de fibrilação atrial de longa duração, pode ser difícil identificar o
padrão “serrilhado fino”, já que, com o passar do tempo, a atividade elétrica atrial perde amplitude por desgaste da musculatura.
Sendo assim, se houver apenas ritmo irregular sem onda P, é suficiente para que o diagnóstico continue sendo fibrilação atrial.
Observe o exemplo na sequência:

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Figura 4. Observe que o ritmo é irregular (as traves verdes mostram o intervalo irregular) e não há onda P, porém não verificamos o serrilhado fino na linha de base.
Mesmo assim, é um eletrocardiograma que permite o diagnóstico de fibrilação atrial. (Fonte: Adaptado de Shutterstock).

Talvez você já tenha estudado a fibrilação atrial como uma arritmia de QRS estreito. Essa maneira de ensinar é mais uma questão
didática que absoluta. A fibrilação atrial ocorre nos átrios e a largura do QRS é decorrente da condução intraventricular. Sendo assim, é
absolutamente possível, apesar de não ser o mais comum, que, na fibrilação atrial, tenhamos um complexo QRS alargado, como ocorre nas
seguintes situações:
• Presença de um bloqueio de ramo associado (bloqueio de ramo direito ou esquerdo);
• Condução aberrante (algumas taquiarritmias conduzem com QRS largo apenas na alta frequência — é como se as fibras de His-
Purkinje se cansassem durante a taquicardia); e
• Presença de uma pré-excitação (como na síndrome de Wolf-Parkinson-White, que veremos adiante).
Você tem dúvidas quanto ao diagnóstico diferencial da FA com outras taquiarritmias? Esse tema será abordado em nosso livro
“Taquiarritmias”.

Pense comigo, é possível uma fibrilação atrial se manifestar com um ritmo regular? A resposta é sim! O que
torna a fibrilação atrial irregular é o fato de o nó AV escolher alguns estímulos atriais para chegarem aos
ventrículos. Caso o batimento ventricular não tenha sua origem a partir de batimentos atriais, poderemos ter
uma FA regular. É o que acontece quando temos uma fibrilação atrial associada a um bloqueio atrioventricular
total (BAVT). Nesse caso, o átrio estará fibrilando, porém o ventrículo não “sente” essa atividade. Para que o
paciente não morra, o ventrículo assume um ritmo de automatismo próprio, que em geral é regular.

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Figura 5. Observe no eletrocardiograma que podemos verificar que a linha de base tem um padrão serrilhado fino, denotando que os átrios estão fibrilando. Enquanto
isso, o ritmo é regular e bradicárdico, algo não esperado na FA. Trata-se de uma FA + BAVT.

A fibrilação atrial pode ser regular quando houver um BAVT associado.

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Você lembra como contar a frequência cardíaca no eletrocardiograma?


Um ponto importante na interpretação do eletrocardiograma de adultos é a contagem da frequência cardíaca. Sendo assim, vamos
dividir esse cálculo em duas situações:
1. Ritmo regular: quando o ritmo for regular, basta dividirmos 300 pelo número de quadrados grandes entre dois batimentos cardíacos
(intervalo RR). Observe o exemplo abaixo:

Figura 6. Contagem de frequência cardíaca em ritmo regular. (Fonte: Adaptado de Shutterstock).

Como podemos verificar, o intervalo RR corresponde a 5 quadrados grandes. Sendo assim, a frequência cardíaca é: 300 ÷ 5 = 60 bpm.
Se você quiser ser mais preciso, pode dividir 1.500 pelo número de quadrados pequenos. No exemplo, seria 1.500 ÷ 25 = 60 bpm. Nos
casos em que o intervalo RR não corresponde a um valor exato de quadrados grandes, usar essa fórmula pode ser interessante.

1) Ritmo regular:
FC = 300 ÷ número de quadrados grandes no intervalo RR.

2. Ritmo irregular: quando o ritmo é irregular, como acontece na fibrilação atrial, escolher apenas um intervalo RR pode gerar valores
falsos de frequência cardíaca. Sendo assim, o indicado é fazermos uma média de um tempo maior. Uma forma fácil de fazer isso é pegar
um intervalo de 15 quadrados grandes no ECG e contar quantos complexos QRS estão nesse período. Para alcançar a frequência cardíaca,
basta multiplicar o número de QRS por 20. Observe no exemplo abaixo

Figura 7. Contagem de frequência cardíaca em ritmo irregular. (Fonte: Adaptado de Shutterstock).

Sendo assim, podemos contar 8 complexos QRS em 15 quadrados grandes. Basta aplicar a fórmula agora:

2) Ritmo irregular:
FC média = número de QRS no intervalo de 15 quadrados grandes x 20.

Em nosso exemplo: FC média = 8 x 20 = 160 bpm.

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Agora, vamos observar uma questão que exige o diagnóstico eletrocardiográfico da fibrilação atrial:

CAI NA PROVA
(UNB-DF 2019) Caso clínico: paciente sem doenças prévias; Idade: 19 anos; sexo: feminino; Sinais e sintomas: tremores nas extremidades,
nervosismo e palpitações taquicárdicas (FC = 150 bpm, PA 135 mmHg x 65 mmHg, pulsos radiais palpáveis e arrítmicos); Avaliação cardiovascular
evidenciou ictus cordis in situ, ritmo cardíaco irregular em 2 tempos, taquicárdico, bulhas normofonéticas, sem sopros ou ruídos adventícios.
Na palpação, percebeu-se glândula tireoide indolor, levemente aumentada e não nodular.

Resultado de dosagens séricas:


TSH (tirotrofina) = 0,05 mU/L (valores de referência = 0,4 - 4,2 mU/L);
• T4 livre (tiroxina livre) = 4,0 nanogramas/dL (valores de referência = 0,8 - 2,7 nanograma/dL);
• Anticorpos antirreceptor de TSH = 2 U/L (valor de referência < 10 U/L);
• Anticorpos antitireoglobulinas = positivo 1/6.400 (valores de referência não reagente < 1/100);
• Determinação de anticorpos antiperoxidase tireoidiana (anti-TPO) = 70 U/mL (valores de referência < 35 U/mL).
Ecodopplercardiograma = normal. Tira de ritmo eletrocardiográfico (ECG) mostrada na figura a seguir (derivação D2, velocidade do papel: 25
mm/s, calibração: 1 cm= 1 mV). A respeito das informações do caso clínico descrito anteriormente, julgue o item subsequente.

A arritmia cardíaca mostrada na tira de ECG é a fibrilação atrial.


A) Certo.
B) Errado.

COMENTÁRIO:
Estrategista, estamos diante de um quadro clínico extenso de tireotoxicose com repercussão cardiológica, uma vez que a paciente
apresenta taquiarritmia associada ao quadro tireotóxico. No entanto, para respondermos à questão, não era necessário nos debruçarmos
sobre o caso clínico, bastava reconhecer a arritmia mostrada na tira de ECG.
Observe que o exame mostra um ritmo irregular (intervalo RR irregular) e sem onda P definida. Sendo assim, o diagnóstico é fibrilação
atrial. Observe que, nesse caso, não verificamos claramente o padrão serrilhado fino na linha de base, isso pode acontecer em casos de
fibrilação atrial de longa duração, quando os vetores de despolarização atrial perdem amplitude.

Correta a alternativa A, pois trata-se de fibrilação atrial.

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2 .2 HISTÓRIA CLÍNICA E EXAME FÍSICO


Antes de iniciarmos a descrição dos achados esperados na história clínica e no exame físico da fibrilação atrial, é importante sabermos
que 25% dos pacientes são absolutamente assintomáticos.
Como vimos, nessa arritmia, os átrios não se contraem, eles “fibrilam”. Dessa forma, há estase sanguínea e isso predispõe ao surgimento
de eventos tromboembólicos. Sendo assim, a primeira manifestação dessa arritmia pode ser um acidente vascular tromboembólico, como
um acidente vascular encefálico (AVE), embolia mesentérica, embolia de membros etc.
Quando os pacientes com FA apresentam outras queixas, geralmente, são palpitações, dispneia, desconforto precordial, tonteira e
sudorese.
Já no exame físico, podemos observar algumas alterações que frequentemente são cobradas em provas. A tabela abaixo relata essas
alterações:

Exame físico na fibrilação atrial

Taquicardia.

Ritmo cardíaco muito irregular.

Pulso irregular.

Frequência cardíaca maior que a frequência de pulso (achado conhecido como dissociação pulso-precórdio ou
anisocardioesfigmia).

Ausência de onda “a” do pulso venoso jugular.

Pulso venoso variável.

B1 com fonese variável.

Ausência de B4.

Algumas dessas alterações aparecem com relativa frequência em provas. Devido à irregularidade do ritmo, teremos na FA batimentos
ventriculares com volume sistólico variável. Daí a explicação para termos diferença entre a frequência cardíaca e a frequência de pulso
(por vezes o coração bate quase vazio e isso não gera pulso). Pelo mesmo motivo, a fonese de B1 é variável. A primeira bulha representa o
fechamento das valvas atrioventriculares. Se o volume de sangue nos ventrículos a cada batimento varia, a força de fechamento das valvas
também variará.

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Outro ponto marcante na fibrilação atrial é a falta de uma contração atrial efetiva. A ausência dessa fase do ciclo cardíaco explica não
observarmos a onda “a” do pulso venoso jugular. Pelo mesmo motivo, não podemos encontrar B4 na FA. A quarta bulha ocorre ao final da
diástole devido ao volume de sangue ejetado pelo átrio contra um ventrículo pouco complacente. Se não há contração atrial, não há B4!

Figura 8. Fases do pulso venoso jugular. Por não haver contração atrial, não teremos a presença de onda “a” na fibrilação atrial.

Pacientes com fibrilação atrial não apresentam B4!

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Agora, vamos responder a uma questão que exige o conhecimento do exame físico na FA:

CAI NA PROVA
(SCMSP 2017) Mulher, 35 anos, tem estenose mitral de origem reumática, veio a consulta e você a avaliou e descobriu que ela tem FA e trouxe
ECG de 1 ano, que já mostrava FA. Qual dos achados do exame físico não deveremos encontrar nessa paciente?
A) B1 hiperfonética.
B) B4.
C) Ruflar diastólico.
D) Estalido de abertura.

COMENTÁRIO:
Essa questão envolve conceitos sobre a estenose valvar mitral, que será tema de outro livro, porém para acertarmos a alternativa
correta, bastava conhecermos o exame físico da fibrilação atrial.
Diante de uma paciente com fibrilação atrial e estenose mitral, o que não esperamos encontrar?
Incorreta a alternativa A, pois a hiperfonese de B1 tem relação com o grau de espessamento valvar da estenose mitral reumática.

Correta a alternativa B, pois B4 é uma bulha diastólica acessória que está relacionada à contração atrial, portanto ausente no
paciente com fibrilação atrial.

Incorreta a alternativa C, pois o ruflar diastólico tem relação com a passagem do sangue do átrio esquerdo para o ventrículo esquerdo
em uma valva mitral estenosada.

Incorreta a alternativa D, pois o estalido de abertura tem relação com o acometimento reumático da valva mitral.

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CAPÍTULO
3.0 EPIDEMIOLOGIA
Você já se deparou com uma fibrilação atrial? Tenho certeza de que a resposta é sim! Essa é a arritmia cardíaca sustentada mais
comum! Estima-se que sua prevalência na população geral seja algo entre 0,5% e 2%. Essa prevalência aumenta de acordo com a idade. Em
indivíduos com mais de 80 anos, chega a 8%.

A prevalência de fibrilação atrial na população geral é muito alta, podendo atingir 2%, e aumenta de forma consistente com
o avançar da idade.

Devido ao envelhecimento populacional e à melhoria dos meios de investigação, nas últimas décadas, tem-se registrado um importante
aumento nos diagnósticos dessa doença.
Além da relação com a idade, a fibrilação atrial é ligeiramente mais comum em homens.
Um ponto importante estudado na medicina ultimamente é o impacto financeiro que determinadas doenças podem gerar. A fibrilação
atrial é um importante fator de gastos com saúde, já que pode desencadear doenças de elevada morbimortalidade, como insuficiência
cardíaca e AVE.
Agora, vamos estudar os fatores clínicos que predispõem os pacientes a desenvolverem FA.

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CAPÍTULO

4.0 FATORES CLÍNICOS PREDISPONENTES


Como dissemos anteriormente, a fibrilação atrial é uma doença comum na população geral, porém alguns pacientes estão mais
predispostos a apresentar essa arritmia.
A tabela abaixo ilustra as características que aumentam a chance de ocorrência da FA.

Fatores de risco associados à fibrilação atrial

Idade.

Sexo masculino.

Hipertensão.

Doença coronariana.

Orovalvopatias (principalmente estenose mitral reumática).

Insuficiência cardíaca / cardiomiopatia dilatada.

Cardiomiopatia hipertrófica.

Cardiopatias congênitas.

Diabetes mellitus.

Obesidade / síndrome metabólica.

Apneia/hipopneia obstrutiva do sono.

Tromboembolismo venoso.

Doença renal crônica.

Hipertireoidismo.

Uso excessivo de álcool.

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Devemos entender a FA como uma arritmia crônica que, ainda que seja revertida, apresenta altas taxas de recorrência. No entanto, em
alguns casos, pode haver uma causa reversível para a arritmia. Nessas situações, o tratamento da causa base pode impedir completamente a
recidiva. As causas de fibrilação atrial reversível são descritas abaixo. Atente-se a isso, algumas provas costumam exigir esse conhecimento:

Causas reversíveis da fibrilação atrial

Ingestão excessiva de álcool.

Drogas estimulantes: cocaína, crack, termogênicos, cafeína etc.

Teofilina e adenosina.

Cirurgias cardíacas e torácicas.

Choque elétrico.

Infarto do miocárdio.

Pericardite.

Miocardite.

Embolia pulmonar.

Doenças metabólicas.

Hipertireoidismo.

Flutter atrial e síndrome WPW: em alguns casos, o tratamento curativo desses transtornos, impede o retorno da FA.

Quanto à ingesta excessiva de álcool, existe uma síndrome descrita para essa situação, a “holiday heart syndrome”,
ou síndrome cardíaca do feriado. Essa síndrome foi descrita pelo aumento do número de casos dessa arritmia durante
os feriados e finais de semana, que são épocas relacionadas ao aumento do consumo dessa substância. É importante
ressaltar, no entanto, que, além da FA reversível, o uso abusivo e constante de álcool também é relacionado à fibrilação
atrial crônica como um fator que dificulta o controle da doença.
Agora, como forma de fixarmos o conhecimento, vamos observar uma questão que aborda os fatores
predisponentes à FA:

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CAI NA PROVA
(UFMA 2012) Entre as causas reversíveis de fibrilação atrial, encontram-se:
A) Hipotireoidismo e infarto agudo do miocárdio.
B) Uso de ácido acetilsalicílico e embolia pulmonar.
C) Miocardite e labirintite.
D) Choque elétrico e ingesta de álcool.
E) Pericardite e hipotireoidismo.

COMENTÁRIO:

Apesar de ser uma questão mais antiga, podemos verificar como as causas reversíveis de FA podem ser cobradas em provas. Como
dissemos, geralmente essa arritmia deve ser abordada como uma arritmia sustentada, porém, em alguns casos, identificaremos causas que,
se revertidas, podem impedir a recidiva da FA.

Incorreta a alternativa A, apesar de o infarto agudo do miocárdio ser uma resposta certa, a alternativa é incorreta, pois a alteração de
tireoide ligada à fibrilação atrial é o hipertireoidismo.

Incorreta a alternativa B, apesar de a embolia pulmonar ser uma resposta certa, a alternativa é incorreta pois o AAS não se relaciona à
fibrilação atrial reversível. As drogas que podem ser relacionadas ao surgimento de fibrilação atrial são a teofilina e a adenosina.

Incorreta a alternativa C, apesar de a miocardite ser uma resposta certa, a alternativa é incorreta, pois as labirintopatias não têm nenhuma
correlação com fibrilação atrial.

Correta a alternativa D, pois é a única com as duas respostas corretas, os choques elétricos relacionam-se com fibrilação atrial
reversível e o uso abusivo de álcool pode causar a “holiday heart syndrome”.

Incorreta a alternativa E, apesar de a pericardite ser uma resposta certa, a alternativa é incorreta pois a alteração de tireoide ligada à
fibrilação atrial é o hipertireoidismo. Os estados de hipermetabolismo, em geral, podem causar fibrilação atrial.

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CAPÍTULO

5.0 CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA


Agora, vamos falar de um tema que é "queridinho" das provas de Residência! A principal classificação clínica da fibrilação atrial
refere-se a sua forma de apresentação a partir de seu tempo de início, conforme ilustra a tabela abaixo:

Classificação da fibrilação atrial:

Paroxística Fibrilação atrial revertida espontaneamente ou com ajuda médica em menos de 7 dias.

Persistente Fibrilação atrial com duração superior a 7 dias e com perspectivas médicas de reversão.

Persistente de longa Termo utilizado por alguns autores para se referirem a uma fibrilação atrial com duração
duração superior a 1 ano, porém ainda com perspectiva médica de reversão.

Fibrilação atrial com duração superior a 7 dias e que tanto o médico quanto o paciente
Permanente
optaram por não tentarem mais a reversão do ritmo.

Observe que, por essa classificação, o que separa os pacientes Outra classificação importantíssima refere-se à etiologia
com FA persistente da permanente é a decisão de interromper os associada à arritmia. Dessa forma, podemos separar a fibrilação
esforços para reversão do ritmo. Essa decisão pode ser tomada atrial entre valvar e não valvar. Essa classificação tem sofrido com
por diversos fatores, como tentativas de reversão sucessivas e algumas críticas recentes, porém ainda é frequente em provas.
frustradas, vontade do paciente, tamanho do átrio, condições É denominada fibrilação atrial valvar quando está associada à
socioeconômicas etc. O tipo mais comum é a FA permanente, estenose mitral moderada a grave, ou à prótese metálica ou
correspondendo a 40-50% dos casos. biológica, ou à história de plastia valvar mitral. Essa classificação
é fundamental quanto à decisão terapêutica, como veremos em
tópicos adiante.

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ESTENOSE MITRAL
MODERADA A GRAVE

PRÓTESE VALVAR Fibrilação PRÓTESE VALVAR


METÁLICA atrial valvar BIOLÓGICA

PLASTIA
VALVAR MITRAL

Figura 4: Fibrilação atrial valvar.

Figura 5: Plastia mitral - o tecido valvar é mantido, apenas a imperfeição é corrigida Figura 6: Estenose valvar mitral (Fonte: Shutterstock).
(Fonte: Shutterstock).

Figura 7: Prótese valvar metálica ou mecânica (Fonte: Shutterstock). Figura 8: Prótese valvar biológica (Fonte: Shutterstock).

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Hora de nos exercitarmos! Vamos responder a uma questão sobre a classificação dessa arritmia

CAI NA PROVA
(UNICESUMAR-PR 2019) Fibrilação Atrial (FA) paroxística é definida pela:
A) duração menor do que 7 dias.
B) ausência de sintomas.
C) ausência de trombos intra-atriais.
D) baixa resposta ventricular.

COMENTÁRIO:
Questão bem direta que exige apenas o conhecimento da classificação clínica da fibrilação atrial.

Correta a alternativa A, pois a FA paroxística é definida como aquela que tem duração menor que 7 dias.

Incorreta a alternativa B, pois a FA que não tem sintomas pode ser chamada de subclínica.

Incorreta a alternativa C, pois a presença ou não de trombos não modifica a classificação da doença.

Incorreta a alternativa D, pois a baixa resposta ventricular corresponde à frequência cardíaca controlada.

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CAPÍTULO

6.0 PREVENÇÃO DE EVENTOS TROMBOEMBÓLICOS


Um dos aspectos mais fundamentais quanto à abordagem fibrilarem, faz com que haja estase sanguínea e, dessa forma,
e à avaliação da fibrilação atrial consiste em prevenirmos os ocorra a formação de trombos, mas, além disso, já foi estudado que
eventos tromboembólicos. Por isso, essa seção do nosso livro é pacientes com fibrilação atrial têm lesão endotelial na parede dos
fundamental! Ajeite-se na cadeira, porque vamos estudar um átrios e um estado próprio de hipercoagulabilidade, completando,
ponto muito frequente em provas! assim, os três pilares da tríade de Virchow. Essa tríade é um
Afinal de contas, por que a fibrilação atrial causa fenômenos modelo que demonstra os fatores precursores dos fenômenos
tromboembólicos e outras arritmias não? A resposta é simples. tromboembólicos.
Como já falamos, o fato de os átrios não se contraírem, apenas

Tríade de
Virchow

Estase sanguínea Lesão Estase sanguínea


endotelial

Átrios não • Aumento de citocinas pró-inflamatórias


contraem • Aumento da adesão plaquetária
• Aumento da atividade do fator von Willebrand

Figura 10. A FA e a tríade de Virchow.

Outro conceito importante é que mais de 90% dos trombos


formados na fibrilação atrial não valvar surgem em uma estrutura
dentro do átrio esquerdo, o apêndice atrial esquerdo.
Esses trombos formados na FA podem permanecer estáticos
ou embolizar. O destino deles, quando embolizam, pode variar,
mas, infelizmente, em 80% das vezes, atingem o tão nobre sistema
nervoso central, causando acidentes vasculares encefálicos (AVE).
A FA, inclusive, é uma das principais etiologias para o AVE, estando
relacionada a aproximadamente 20% dos casos.

Figura 11. Apêndice atrial esquerdo representado pelo asterisco na imagem.


(Fonte: Shutterstock).

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Em outras situações, o desprendimento desses trombos pode causar embolia mesentérica e/ou em membros e, mais raramente, na
coronária, causando um infarto agudo do miocárdio.

Agora, pense comigo: será que todos os pacientes com fibrilação atrial têm a mesma chance
de apresentar eventos tromboembólicos? Parece evidente considerarmos que não! Sendo
assim, foram desenvolvidos escores clínicos que nos permitem estimar o risco de eventos
tromboembólicos em pacientes com FA e, dessa forma, fazer um planejamento terapêutico.
O mais clássico é o escore CHADS2 e o mais usado, atualmente, é o CHA2DS2VASc.

No entanto, antes de verificarmos esses escores, é necessário saber se a FA não é valvar, pois em caso de FA valvar, o paciente deve
permanecer anticoagulado independentemente do cálculo encontrado nos escores!
Além desses casos, uma situação menos famosa e que também obriga a anticoagulação de pacientes com FA é a miocardiopatia
hipertrófica. Essa doença será estudada com mais detalhes em nosso livro “Cardiomiopatias”.

Pacientes com FA valvar e FA com miocardiopatia hipertrófica SEMPRE receberão anticoagulantes,


independentemente dos escores de risco tromboembólico, desde que não haja uma contraindicação.

As tabelas abaixo demonstram os parâmetros considerados nesses escores, bem como a pontuação cabível a cada item:

CHADS2

C: Insuficiência Cardíaca. 1 ponto

H: Hipertensão. 1 ponto

A: Age - Idade ≥ 75 anos.


1 ponto

D: Diabetes mellitus. 1 ponto

S: Stroke – AVE ou AIT. 2 pontos

Observe que o próprio acróstico CHADS2 já o ajuda a lembrar os parâmetros avaliados. Inclusive, o S2 indica que apenas o item S-stroke
conta dois pontos, os demais contam 1 ponto. Segundo esse escore, pacientes classificados com pontuação ≥ 2 devem receber terapia
anticoagulante por tempo indeterminado, ou seja, provavelmente para sempre.

Escore CHADS2 ≥ 2 pontos indica anticoagulação para sempre!

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Nos últimos anos, esse escore foi aperfeiçoado e incorporou outros parâmetros que melhoraram sua precisão. Dessa forma, foi criado
o escore CHA2DS2VASc, que é o mais utilizado atualmente. Semelhantemente ao que acontece com seu antecessor, o acróstico recorda os
parâmetros avaliados. Sendo que o A2 e o S2 demonstram que apenas os parâmetros “Age (idade) ≥ 75 anos” e “Stroke (AVE)” contam 2
pontos, os demais, apenas 1 ponto. Atenção! É fundamental saber esse escore na hora de prestar uma prova de Residência!

CHA2DS2VASc

C: Insuficiência Cardíaca. 1 ponto

H: Hipertensão. 1 ponto

A: Age - Idade ≥ 75 anos. 2 pontos

D: Diabetes mellitus. 1 ponto

S: Stroke – AVE ou AIT. 2 pontos

V: Vasculopatia – IAM prévio, doença arterial periférica e placas na aorta. 1 ponto

A: Age - Idade entre 65-74 anos. 1 ponto

Sc: Sex category - Sexo feminino. 1 ponto

A tomada de conduta, baseada nesse escore, quanto à anticoagulação crônica, seguirá o direcionamento apontado na tabela abaixo.
Essa decisão independe da estratégia de reverter ou não a arritmia.

Valor do escore CHA2DS2VASc: Decisão:

Escore: 0 Não anticoagular.

Escore: 1 ponto Considerar individualmente a possibilidade de anticoagular.

Escore ≥ 2 pontos Anticoagular.

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A referência acima é a indicada pela Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC). No entanto, a Sociedade
Europeia e a Associação Americana orientam que não devemos mais considerar o parâmetro “sexo feminino” para
a decisão de anticoagular. Eles defendem que esse parâmetro é encarado mais como um fator associado do que
propriamente um fator de risco para eventos tromboembólicos. Como em nossas provas, geralmente, as referências
estão de acordo com a SBC, não se preocupe com essa diferença.

Como você pode observar na tabela acima, quando o paciente tem escore de 1 ponto, a decisão por anticoagulação deve ser
individualizada. Sendo assim, devemos levar em consideração as condições socioeconômico-culturais do paciente. Por exemplo, se você
está diante de um paciente que mora em um sítio longe de qualquer assistência e, por esse motivo, visita o médico uma vez ao ano, seria
seguro mantê-lo usando um anticoagulante? Provavelmente, não! Imagine que esse paciente tenha um sangramento grave, até encontrar um
serviço de atendimento, poderia ser tarde demais!
Taxa de Eventos Tromboembólicos em 1 ano

Valor do escore Taxa de AVC ajustada


Sendo assim, o paciente CHA2DS2VASc: 1 é o “divisor de CHA2DS2VASc (em %/ano)
águas”!!! A decisão pela anticoagulação será conduzida por um
Escore: 0 0
conjunto de fatores que envolve a opinião do médico e do paciente,
a disponibilidade da assistência de saúde, o risco de sangramento e Escore: 1 ponto 1,3
as opções de medicações disponíveis.
Escore: 2 pontos 2,2
Esse ponto de corte que guia a decisão é baseado nas elevadas
taxas de eventos tromboembólicos a partir de valores maiores que Escore: 3 pontos 3,2
2 no escore CHA2DS2VASc, conforme podemos observar na tabela
ao lado. Essa porcentagem não cai em prova, foi colocada nesse Escore: 4 pontos 4,0
texto apenas para ilustrar.
Escore: 5 pontos 6,7
Pense comigo, qual é a principal complicação decorrente
do uso de anticoagulantes? Aposto que você pensou nos eventos Escore: 6 pontos 9,8
hemorrágicos, não é mesmo? Por isso, seria interessante se
Escore: 7 pontos 9,6
pudéssemos estimar o risco desses eventos também! Com esse
intuito, temos então outro escore, o HASBLED. Escore: 8 pontos 6,7

Escore: 9 pontos 15,2

Diferentemente do CHA2DS2VASc, que determina a conduta, o HASBLED serve apenas como um parâmetro a mais.
Ou seja, esse escore não tem poder para contraindicar a anticoagulação, é apenas mais um peso na balança e orienta
mudanças que diminuem o risco de sangramento. Serve então como uma ferramenta em momentos de dúvida quanto à
conduta.
Desse paradoxo gerado pelos anticoagulantes, diminuir eventos tromboembólicos e aumentar eventos hemorrágicos,
surge o conceito de “benefício líquido”, que é o número de eventos tromboembólicos evitados subtraído do número de
eventos hemorrágicos que foram acrescidos com o uso dos anticoagulantes.

Benefício líquido: eventos tromboembólicos evitados com a anticoagulação – eventos hemorrágicos


desencadeados pela anticoagulação.

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HASBLED

H: Hipertensão descontrolada (PAS ≥ 160 mmHg). 1 ponto

A: Alteração hepática ou renal. 1 ponto cada

S: Stroke – AVE. 1 ponto

B: Bleeding – sangramento prévio ou predisposição a sangramento. 1 ponto

L: Labilidade do RNI. 1 ponto

E: Elderly – Idade ≥ 65 anos. 1 ponto

D: Drogas que interfiram na varfarina ou uso de álcool. 1 ponto cada


Insuficiência renal: transplante renal, doença renal crônica dialítica, Cr > 2,3 mg/dl; Insuficiência hepática: cirrose hepática, elevação de bilirrubina acima de 2x, elevação
de TGO ou TGP acima de 3x; Labilidade do RNI: valor instável, alto ou com pouco tempo de nível terapêutico (< 60% do tempo); Drogas que interferem na Varfarina:
AINES e antiplaquetários.

É importante observarmos que alguns fatores do HASBLED são modificáveis, ou seja, esse escore é dinâmico e pode ser utilizado para
tornarmos o uso do anticoagulante mais seguro. Por exemplo, se a PAS do paciente estiver acima de 160 mmHg, podemos controlá-la e o
paciente perderá um ponto no escore. Da mesma forma, perderá 1 ponto se deixar de usar álcool ou medicações que interfiram na varfarina
ou se corrigir a insuficiência renal ou hepática, caso sejam transitórias etc.
Apenas como parâmetro, devemos considerar pacientes com escore HASBLED ≥ 3 pontos como sendo mais propícios a eventos
hemorrágicos.

O escore HASBLED isoladamente não contraindica a anticoagulação.

O conhecimento desses escores é importante nas provas para resolvermos diversos casos clínicos que solicitam a avaliação da
necessidade de anticoagulação de um paciente e, em alguns momentos, esses escores podem ser cobrados diretamente. Vamos responder
a algumas questões que demonstram isso:

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CAI NA PROVA
(UESPI 2020) Na avaliação de paciente de 78 anos, do sexo feminino, com diagnóstico prévio de acidente vascular cerebral isquêmico, diabética
e hipertensa com fibrilação atrial não valvar e insuficiência cardíaca (fração de ejeção do ventrículo esquerdo de 32%), qual o valor do escore
CHA2DS2-VASC e qual o significado da pontuação encontrada?
A) Escore de 07; elevado risco de sangramento.
B) Escore de 05; elevado risco tromboembólico.
C) Escore de 08; elevado risco tromboembólico.
D) Escore de 08; elevado risco de sangramento.
E) Escore de 07; elevado risco tromboembólico.

COMENTÁRIO:
Estrategista, estamos diante de uma questão bem direta, que cobra especificamente o valor do escore CHA2DS2VASC da paciente e a
conduta proposta a partir desse cálculo. Vamos então recordar os parâmetros cobrados nesse escore.

CHA2DS2VASc

C: Insuficiência Cardíaca 1 ponto

H: Hipertensão 1 ponto

A: Age - idade ≥ 75 anos 2 pontos

D: Diabetes mellitus 1 ponto

S: Stroke – AVE ou AIT 2 pontos

V: Vasculopatia – IAM prévio, doença arterial periférica e placas na aorta. 1 ponto

A: Age - idade entre 65-74 anos 1 ponto

Sc: Sex category - Sexo feminino 1 ponto

Como podemos observar, a paciente não apenas pontua na “vasculopatia” e na “idade entre 65-74 anos”. Sendo assim, tem escore de 8.

Correta a alternativa C, pois, de fato, o valor calculado é de 8 pontos no CHA2DS2VASC e valores ≥ 2 já significam alto risco de
eventos tromboembólicos. Esse escore prediz eventos tromboembólicos, e não risco de sangramento como as outras opções da questão
sugerem. O escore utilizado para predizer eventos hemorrágicos é o HASBLED.

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(FUBOG-GO 2017) Além de aspectos cardiológicos com importantes complicações, a Fibrilação Atrial causa enormes outras complicações à
distância, entre elas os fenômenos emboligênicos. Sobre isso, concluímos que:
A) O escore de risco para hemorragia não contraindica o uso de anticoagulante oral, mas orienta quanto à necessidade de cuidados especiais
para tornar o tratamento mais seguro.
B) Não ocorre risco de interação de anticoagulação e consumo de álcool.
C) Não há necessidade de avaliar, concomitantemente, risco emboligênico e de sangramento.
D) O conceito “benefício líquido” não leva em consideração os aspectos positivos da redução de risco de tromboembolismo bem como de
hemorragia.

COMENTÁRIO:
Querido (a) Estrategista, essa questão é bem conceitual e exige o conhecimento sobre a aplicação e as limitações dos escores utilizados na
fibrilação atrial. Vamos às alternativas:

Correta a alternativa A, pois o escore HASBLED não é um critério absoluto que contraindique a anticoagulação. Deve ser encarado
como um parâmetro para que fatores reversíveis que causam sangramentos sejam corrigidos.

Incorreta a alternativa B, pois, como podemos observar no escore HASBLED, o consumo vigente de álcool aumenta o risco de eventos
hemorrágicos.

Incorreta a alternativa C, pois a avaliação concomitante entre risco de eventos tromboembólicos e risco de sangramento permite uma
decisão compartilhada sobre a necessidade de anticoagulação.

Incorreta a alternativa D, pois o conceito de “benefício líquido” leva em consideração a redução de eventos tromboembólicos e o aumento
de sangramentos a partir do uso de anticoagulantes.

Agora que já estudamos os critérios necessários para indicarmos a anticoagulação, vamos nos aprofundar sobre o estudo das drogas
usadas com esse propósito.

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6 .1 ANTICOAGULANTES ORAIS
Após constatar que o paciente com fibrilação atrial deve permanecer anticoagulado, você precisa decidir qual é a melhor droga a ser
empregada.
Uma conduta comum nesse cenário era indicar um antiplaquetário como ácido acetil salicílico (AAS), clopidogrel, ticagrelor etc., em
substituição ao anticoagulante em pacientes com maior risco de sangramento, porém o uso de antiplaquetários não mostrou significativa
redução na taxa de eventos tromboembólicos na fibrilação atrial e, por outro lado, aumentou de forma considerável justamente as taxas
de sangramento. Sendo assim, a princípio, não devem ser indicados na fibrilação atrial.

O uso de antiplaquetários é desaconselhável em pacientes com fibrilação atrial em substituição à anticoagulação.

Já que não devemos usar essas drogas, a solução é empregar os anticoagulantes orais. Sendo assim, vamos estudar essas medicações.
Podemos separá-las em dois grandes grupos: o antagonista de vitamina K (varfarina) e os anticoagulantes de ação direta (DOACs).

6.1.1 ANTICOAGULANTES ORAIS DE AÇÃO DIRETA (DOAC)


As atuais diretrizes recomendam, preferencialmente, o uso dos anticoagulantes de ação direta (DOACs), conhecidos também como
novos anticoagulantes orais (NOACs), para prevenção de eventos tromboembólicos na fibrilação atrial. Como opções dessa classe, temos a
dabigatrana (inibidor direto da trombina) e os inibidores do fator Xa (rivaroxabana, edoxabana e apixabana).

Os anticoagulantes de ação direta (DOACs) são preferíveis em relação à varfarina.

Essas drogas têm como vantagem o fato de não necessitarem de controle laboratorial para ajuste de dose, porém têm custo elevado e,
muitas vezes, os pacientes não têm condições financeiras de dar continuidade ao tratamento.

Além disso, pacientes portadores de próteses metálicas cardíacas, estenose mitral moderada a grave, doença renal
crônica avançada (a maioria dos DOACs são contraindicados para clearence < 15 ml/min), algumas trombofilias, bem como
as gestantes não podem usar essas drogas. Nessas situações, caso não haja contraindicação formal, deve-se optar pela
varfarina.

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CICR < 15ml/min

Gestação Estenose mital moderada e grave

Contraindicações
aos anticoagulantes
diretos

Trombofilias Próteses cardíacas metálicas

Figura 12. Contraindicações aos anticoagulantes diretos. Fonte das imagens: Shutterstock.

Você pode se perguntar: mas e as próteses biológicas? São uma contraindicação ao uso dos
DOACs? Até bem pouco tempo, os pacientes portadores dessas próteses só poderiam receber
varfarina, porém, em 2020 foi publicado o estudo RIVER, que usou rivaroxabana nesses
pacientes e foi visto que era “não inferior” à varfarina. Sendo assim, podemos dizer que os
DOACs são uma opção nos pacientes com próteses biológicas.

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Medicamentos: Mecanismo de ação:

Dabigatrana Inibidor direto da trombina

Apixabana, rivaroxabana e edoxabana Inibidores diretos do fator Xa

O mecanismo de ação desses medicamentos já foi cobrado em provas, para que você se lembre
disso, basta observar a presença da sílaba XA. Os que tiverem essa sílaba são inibidores do fator Xa.
O que sobrar é inibidor direto da trombina. Sendo assim, apiXAbana, rivaroXAbana e edoXAbana
são inibidores do fator Xa. Já dabigatrana é um inibidor direto da trombina.

Apesar de não ser o mais frequente, já testemunhamos algumas questões que cobram o conhecimento da dose de uso dos DOACs. Por
isso, a tabela abaixo traz essa informação:

Medicação Dose usual

Apixabana (Eliquis ®) 5 mg 2x/dia

Edoxabana (Lixiana ®) 60 mg 1x/dia

Rivaroxabana (Xarelto ®) 15 mg 2x/dia por 21 dias, seguido por 20 mg 1x/dia

Dabigatrana (Pradaxa®) Dose habitual 150 mg 2x/dia; dose reduzida 110 mg 2x/dia

Agora, vamos estudar a famosa varfarina!

6.1.2 DICUMARÍNICOS (VARFARINA)


Os dicumarínicos, também chamados de varfarina, são varfarina pode ter um efeito pró-coagulante, que clinicamente só
anticoagulantes orais que agem inibindo a formação de fatores de será expressivo em pacientes que sejam portadores de trombofilias
coagulação dependentes de vitamina K, a saber, os fatores II, VII, causadas por deficiência das proteínas C e S, condição rara na
IX e X. Além desses fatores, há também fatores anticoagulantes população.
endógenos que são dependentes da vitamina K, como a proteína Devido a esse efeito pró-coagulante, existe a necessidade
C e S, que são inibidos. Por isso, durante os primeiros dias de uso, a de se fazer terapia “ponte” com heparina quando iniciar varfarina,
porém essa conduta não é consensual para pacientes ambulatoriais.

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Inibição de fatores da Efeito anticoagulante


coagulação dependentes (geralmente inicia-se
da vitamina K (II, VII, IX e X) após 48 horas)

Varfarina

Inibição de fatores Efeito pró-coagulante


anticoagulantes (geralmente dura
(proteínas C e S) apenas 48-72 horas)

Figura 13. Mecanismos de atuação da varfarina.

Essa droga tem absorção rápida pelo trato gastrointestinal, A absorção da varfarina é muito influenciada pela dieta.
com picos séricos em torno de 1 hora, e liga-se fortemente à Sendo assim, a medicação deve ser administrada longe das
albumina. Apesar de ser absorvida rapidamente, o efeito pleno da refeições. Por ser um antagonista da vitamina K, alimentos que
varfarina só é alcançado após alguns dias, já que a meia vida de contenham essa substância diminuirão seu efeito, como acontece
alguns fatores de coagulação é bastante longa, como o fator II (59 com as folhas verdes (taioba, agrião, brócolis, espinafre etc.).
horas).

A varfarina inibe a formação dos fatores de coagulação dependentes da vitamina K: fator II, VII, IX e X.
A regra para decorar é lembrar que são 4 fatores.
Sendo assim: 2 + 7 = 9, faltou 1? É só somar e temos o fator 10.

Essa droga é usada para diversas situações clínicas, sendo que terapêutico com essa droga seja de difícil execução. Alguns estudos
seu alvo terapêutico é definido pelo valor da relação normatizada recentes sugerem que aproximadamente 50% dos pacientes
internacional (RNI ou INR), que, para a maioria das situações, deve que usam varfarina habitualmente não estão com o RNI na faixa
estar entre 2- 3. Quando o RNI está acima de 3, deve-se reduzir a terapêutica.
dose da droga e, quando está abaixo de 2, deve-se aumentá-la. Dentre as dezenas de drogas que interagem fortemente
A exceção seria em pacientes com valvas metálicas mitrais, com o efeito desse anticoagulante, vale destacar: amiodarona,
quando a referência de RNI passa a ser entre 2,5 e 3,5. antibióticos, antidepressivos, alopurinol, anti-inflamatórios,
No início da terapia com a varfarina, deve-se dosar o RNI cetoconazol, uso de álcool etc.
a cada 3-5 dias e, conforme houver melhor controle, pode-se Uma situação não incomum na prática médica e que
espaçar as dosagens para semanalmente, quinzenalmente ou até demanda cautela é a troca de anticoagulantes. Por vezes, os
mensalmente. pacientes desejam deixar de usar a varfarina pelas exigências de
O uso concomitante com outras medicações e as um controle rigoroso ou precisam substituir os DOACs por seu alto
características intrínsecas dos pacientes também afetam o nível custo. Sendo assim, quando decidirmos migrar entre essas terapias,
sérico da varfarina. Sendo assim, não é incomum que o controle devemos seguir a regra abaixo:

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De DOAC para varfarina De varfarina para DOAC

Inicia-se a varfarina e, somente quando o RNI estiver acima de 2, deve-


RNI ≤ 2: suspende-se a varfarina e inicia-
se suspender o DOAC. Geralmente, isso ocorre após 3 dias, porém o
se o DOAC imediatamente.
guideline europeu orienta verificar o valor do RNI.

Se o DOAC for edoxabana, deve-se reduzir sua dose para 30 mg (dose RNI entre 2 e 2,5: suspende-se a
normal de 60 mg) enquanto a transição é feita. Os outros DOACs têm varfarina e inicia-se a DOAC no dia
sua dose mantida durante a transição. seguinte.

RNI > 2,5: suspende-se a varfarina e


Se o paciente tiver alto risco de sangramento, pode-se considerar fazer
dosa-se novo RNI após 3 dias. Só iniciar o
a transição com anticoagulante parenteral (heparina), não com DOAC.
DOAC se RNI < 2,5.

O racional por trás de toda transição é não deixar o paciente em momento algum sem anticoagulação plena e nem duplamente
anticoagulado. Para fazer esse raciocínio, lembre-se de que nem todo paciente usando varfarina é considerado anticoagulado, apenas aqueles
com RNI > 2.
Agora, vamos responder a uma questão sobre esse tema:

CAI NA PROVA
(CMC-SP 2019) Qual dos anticoagulantes abaixo é inibidor direto da trombina?
A) Rivaroxabana
B) Apixabana
C) Edoxabana
D) Dabigatrana

COMENTÁRIO:
Estrategista, estamos diante de uma questão direta, que pode ser facilmente respondida com nossa regra mnemônica. Os anticoagulantes
diretos que contenham a sílaba XA são inibidores do fator Xa, o que sobrar é um inibidor da trombina.
Dentre as alternativas, podemos observar rivaroXAbana, apiXAbana e edoXAbana, ou seja, três inibidores do fator Xa. O que sobrou é a
dabigatrana, portanto é um inibidor da trombina.

Correta a alternativa D, pois a dabigatrana é um inibidor da trombina.

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(SURCE-CE 2020) Paciente, 52 anos, sexo


masculino, previamente hígido, assintomático,
comparece à consulta de rotina no ambulatório.
Ao exame físico, chamam atenção sopro em
ruflar diastólico 3+/6+ no foco mitral e ritmo
cardíaco irregular com frequência cardíaca
em torno de 84 batimentos por minuto.
Realizado eletrocardiograma (figura ao lado) e
ecocardiograma transtorácico que evidenciou
estenose mitral moderada. Qual conduta deve
ser tomada nesse momento?
A) Iniciar uso de rivaroxaban sem necessidade
de monitoração do INR.
B) Iniciar varfarina e realizar a monitorização do
INR ambulatorialmente.
C) Internar o paciente para administrar
enoxaparina e iniciar uso de varfarina.
D) Manter conduta expectante, pois o paciente
apresenta baixo risco de complicações

COMENTÁRIO:
Futuro Residente, o autor da questão apresenta um caso clínico de um paciente com estenose valvar mitral moderada e deseja que
você reconheça a arritmia cardíaca no ECG e trace a conduta apropriada.
Quanto à arritmia da questão, observe que se trata de um ritmo irregular e sem onda P, sendo assim, é uma fibrilação atrial.
Feito o diagnóstico, devemos agora pensar sobre a conduta terapêutica. Precisamos ter atenção nesse momento! Provavelmente,
sua mão está coçando para calcular o CHA2DS2VASc, porém lembre-se de que é uma FA valvar (estenose mitral moderada) e, nesse caso,
a anticoagulação já está indicada!
Além disso, na fibrilação atrial por estenose mitral moderada-grave, o único anticoagulante oral que pode ser usado é a varfarina!

Incorreta a alternativa A, pois a rivaroxabana, assim como todos os anticoagulantes diretos, não pode ser usada em casos de fibrilação
atrial com estenose mitral moderada ou grave.

Correta a alternativa B, pois o único anticoagulante oral usado para a FA com estenose mitral moderada-grave é a varfarina.
Além disso, como o paciente se encontra assintomático, a anticoagulação pode ser iniciada de forma ambulatorial. Apenas faltou, nessa
alternativa, a sugestão de fazer terapia ponte com enoxaparina ambulatorial, mas, como não é uma medida consensual, a alternativa está
correta.

Incorreta a alternativa C, pois o paciente é assintomático, logo não há necessidade de internação.

Incorreta a alternativa D, pois o paciente com fibrilação atrial, associada à estenose mitral, tem altas taxas de eventos tromboembólicos.

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6 .2 MANEJO DO SANGRAMENTO POR ANTICOAGULANTES ORAIS


Como podemos depreender, um dos riscos assumidos ao usarmos anticoagulantes é o de eventos hemorrágicos. Sendo assim, sempre
que prescrevermos essas medicações, devemos estar preparados para tratar essa complicação.
A análise dessas complicações deve começar pela definição da gravidade do sangramento. A tabela abaixo ilustra as situações em que
o sangramento é considerado grave. Todas as demais, que não foram citadas nessa tabela, são classificadas como “não graves”:

Sangramento grave (major)

Sistema nervoso central / intraocular

Tamponamento cardíaco

Hemotórax

Via aérea (inclusive epistaxe posterior)

Intra-abdominal (não inclui lúmen do trato gastrointestinal)

Intramuscular

Intra-articular

Com instabilidade hemodinâmica (PAM < 65 mmHg, PA sistólica < 90 mmHg, queda da PAS > 40 mmHg ou taquicardia
com hipotensão postural).

Queda da hemoglobina > 2 g/dl ou necessidade de transfusão de 2 concentrados de hemácias.

Agora, que já definimos a gravidade do sangramento, hemorrágico, se houver um. Essa droga é um inibidor da vitamina
precisamos avaliar a conduta que será tomada levando em conta o K e, obviamente, é antagonizada por essa substância. No entanto,
anticoagulante que está sendo usado. esse efeito antagonista da vitamina K demora a ocorrer. Em casos
Quando o paciente estiver em uso de varfarina e apresentar graves de sangramento, apenas a reposição dessa vitamina pode
um alargamento do RNI, chamaremos isso de intoxicação cumarínica. não ser o suficiente para conter a hemorragia. O fluxograma na
Esse quadro pode ser ou não acompanhado de sangramento e a sequência orienta a conduta nas intoxicações cumarínicas.
condução vai depender do valor de RNI e da gravidade do evento

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Intoxicação
cumarínica

Presença de
sangramento

sim não
Sangramento
Valor RNI
grave?

sim não
3 - 4,5 4,5 - 10 >10
risco Descontinuar
de morte a varfarina e
considerar
vitamina K oral
ou venosa em Suspender a
doses baixas Diminuir dose varfarina e Suspender
(<2,5mg); da varfarina ou
reiniciar varfarina reiniciar após varfarina e dar
sim não ou omitir 1 dose. controle em dose vitamina k 5-10 mg
com dose menor.
menor; considerar oral ou venosa;
Suspender o uso Suspender o uso dar vitamina K reiniciar verfarina
de varfarina, de varfarina, oral ou venosa quando RNI
administrar administrar
vitamina K 10mg EV; vitamina K 5-10mg em dose baixa terapêutico.
caso seja um venosa; considerar (<2,5 mg) se
sangramento administrar houver alto
com complicação complexo risco de
considerada uma protrombínico, se sangramento
emergência, fazer não houver à e baixo risco
transfusão de disposição,
complexo plasma fresco de fenômenos
protombínico, tromboembólicos.
se não houver à
disposição,
plasma fresco.

Figura 14. Conduta nas intoxicações cumarínicas.

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CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
MED

E, para os outros anticoagulantes orais, existe algum antídoto? A resposta é sim! Recentemente, tivemos a aprovação de drogas que
tem a capacidade de reverter o efeito dos anticoagulantes diretos, como mostra a tabela abaixo:

Vitamina K Idarucizumab Andexanet Plasma CPP

Varfarina x x x

Dabigatrana x x x

Rivaroxabana, apixabana e
x x x
edoxabana
Legenda: CPP - concentrado de complexo protrombínico.

A dabigatrana, antagonista da trombina, tem como reversor o anticorpo monoclonal Idarucizumab (Praxbind®), que está disponível em
grandes centros no Brasil, porém tem valores elevadíssimos.

Os inibidores do fator Xa também têm um agente reversor, o andaxanet alfa, porém essa droga ainda não está disponível
em nosso país.
Você pode usar o mesmo mnemônico do mecanismo de ação dos DOACs para lembrar o reversor. Aquele com a sílaba
XA é o reversor dos inibidores do fator Xa. Sendo assim, o andaXAnete é antídoto da rivaroXAbana, da apiXAbana e da
edoXAbana.

Na maioria dos serviços, o que temos disponível para abordar os sangramentos graves são os hemoderivados que contenham fatores
de coagulação.
O concentrado de complexo protrombínico (CCP) é extremamente rico nesses fatores, sendo, portanto, muito útil nos sangramentos
graves. Se não houver disponibilidade de CCP, o plasma fresco congelado pode ser usado, apesar de ser menos eficaz, já que apresenta
menores concentrações de fatores de coagulação.
O fluxograma na sequência ilustra como deve ser a avaliação e o tratamento dos sangramentos associados ao uso de anticoagulantes
orais.

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CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
MED

Evento hemorrágico
mediante uso de
anticoagulante oral
(ACO)

Sangramento Sangramento
maior não maior

Local crítico Sem risco Sangramento Sangramento


e/ou com de morte no que requer que não requer
risco de morte momento hospitalização hospitalização

Suspender ACO Descontinuar Suspender ACO - Verificar


a varfarina e risco x benefício,
- 10 mg vit. K IV, considerar - 2,5-5 mg vit. K VO havendo
se em uso de vitamina K oral ou IV, se em uso possibilidade
varfarina ou venosa em de varfarina de manter
doses baixas anticoagulação.
- Medidas de (<2,5mg); - Medidas de
contenção de reiniciar varfarina contenção de - Medidas de
sangramento com dose menor. sangramento contenção local
(cirurgico, correção (cirurgico, correção de sangramento
de faores de faores
clínicos, clínicos,
suporte suporte
hemodinâmico) hemodinâmico)

Se essas
medidas não
forem eficazes

Administrar
antídoto

Varfarina: Dabigatrana Rivaroxabana,


apixabana e
- Concentrado - Idarucizumb edoxabana:
de complexo
protrombínico - CCP (2º opção) - Andaxanete

- Plasma fresco - Plasma fresco - CCP (2º opção)


congelado (3º opção)
(segunda opção) - Plasma fresco
- Carvão ativado (3º opção)
se ingestão até 2-4h
- Carvão ativado
se ingestão até 2-4h

Figura 15. fluxograma de atendimento dos sangramentos mediante o uso de anticoagulantes orais.

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CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
MED

Como forma de sedimentarmos o conhecimento adquirido, agora é hora de respondermos a uma questão!

CAI NA PROVA
(UNIFESO-RJ 2016) Homem de 67 anos, portador de fibrilação atrial, em uso de warfarina retorna ao ambulatório de cardiologia trazendo
resultado de seu último INR, que foi de 6,0. Ele está assintomático e nega episódios de sangramento. Qual deve ser a conduta adotada nesse
caso?
A) Suspender a warfarina e aguardar o INR ficar menor que 3.
B) Transfundir plasma fresco devido ao risco de sangramento.
C) Transfundir plaquetas.
D) Prescrever complexo protrombínico
E) Prescrever vitamina K 10 mg intravenosa.

COMENTÁRIO:

A questão aborda um caso de intoxicação cumarínica sem sangramento. Como vimos, a varfarina é um anticoagulante oral que atua
como antagonista da vitamina K, inibindo, dessa forma, a produção dos fatores de coagulação II, VII, IX e X. Sua atividade terapêutica deve
ser monitorada por meio da dosagem do INR ou RNI, que é utilizado como guia para o ajuste da dose. Nos pacientes portadores de fibrilação
atrial, a faixa de INR considerada terapêutica é entre 2,0 e 3,0.
Para traçar a melhor conduta, devemos recordá-las por meio da tabela abaixo:

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CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
MED

RNI Sangramento Conduta

3 - 4,5 Não Diminuir dose da varfarina ou omitir 1 dose.

Suspender a varfarina e reiniciar após controle em dose menor; considerar


4,5 - 10 Não dar vitamina K oral ou venosa em dose baixa (≤ 2,5 mg) se houver alto risco
de sangramento e baixo risco de fenômenos tromboembólicos.

Suspender varfarina e dar vitamina K 5-10 mg oral ou venosa; reiniciar


> 10 Não
varfarina quando RNI terapêutico.

Descontinuar a varfarina e considerar vitamina K oral ou venosa em doses


> 4,5 Sim, mínimo
baixas (< 2,5 mg); reiniciar varfarina com dose menor.

Sim, com repercussão Suspender a varfarina e fazer vitamina K 5-10 mg venosa; considerar
4,5 - 10 clínica, porém sem risco administrar complexo protrombínico e, se não houver à disposição, plasma
à vida fresco.

Suspender o uso de varfarina, administrar vitamina K 10 mg EV; caso seja


um sangramento com complicação considerada uma urgência, considerar
≥ 1,5 Sangramento grave
transfusão de complexo protrombínico e, se não houver à disposição,
plasma fresco.

Vamos agora analisar as alternativas em busca da conduta correta para a situação apresentada:

Correta a alternativa A, para os pacientes em uso de varfarina que se apresentam com INR entre 4,5 e 10, sem sinais de sangramento
ativo, a conduta ideal a ser adotada é suspender a varfarina temporariamente e acompanhar os níveis de INR. Nesses casos, pode-se
considerar a administração de vitamina K oral em baixa dose (< 2,5 mg por via oral) nos pacientes com alto risco de sangramento (por
exemplo idosos e com história de sangramento prévio) e baixo risco de eventos tromboembólicos. Quando houver o retorno do INR aos
níveis terapêuticos (no caso, apresentando < 3,0), deve-se reiniciar a varfarina em dose de manutenção menor que a anteriormente usada.

Incorreta a alternativa B, pois o plasma fresco só deve ser usado em pacientes com sangramento maior.
Incorreta a alternativa C, pois a transfusão de plaquetas não é uma opção viável para intoxicações cumarínicas, dado que o risco de
sangramento não se relaciona à atividade plaquetária.
Incorreta a alternativa D, pois, assim como o plasma fresco, o CPP deve ser usado em pacientes com sangramento maior.
Incorreta a alternativa E, pois, conforme já discutimos na alternativa A, a vitamina K até poderia ser usada nessa situação, caso
considerássemos o paciente portador de alto risco hemorrágico, porém deveria ser usada por via oral em dose baixa (< 2,5 mg) e não em
altas doses por via venosa.

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CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
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6 .3 OCLUSÃO PERCUTÂNEA DO APÊNDICE ATRIAL ESQUERDO

Como foi falado anteriormente, mais de 90% dos trombos


formados na fibrilação atrial não valvar surgem no apêndice atrial
esquerdo. A principal forma de prevenção à formação desses
trombos é o uso de anticoagulantes, porém, como vimos, essas
medicações podem causar sangramentos. Sendo assim, seria
interessante se tivéssemos outro método de prevenir a formação
desses trombos, concorda?
Nesse sentido, os gênios da engenharia biomédica criaram
dispositivos que são capazes de ocluir o apêndice atrial esquerdo e,
dessa forma, prevenir a formação de trombos.
A inserção desses dispositivos pode ser feita de forma
percutânea, por meio de uma punção venosa com perfuração do
septo interatrial para acessar o átrio esquerdo.

Figura 16. Desenho esquemático de um oclusor do apêndice atrial esquerdo.


Note que a inserção ocorre por meio de uma cateterização venosa com punção
transseptal. (Fonte: Shutterstock).

As principais indicações para o implante dos oclusores de apêndice atrial esquerdo são:
1. Pacientes com alto risco de fenômenos tromboembólicos e contraindicação ao uso de anticoagulantes
orais.
2. Pacientes com AVE isquêmico de origem cardioembólica em vigência de uso de anticoagulantes orais.
3. Pacientes com alto risco de fenômenos tromboembólicos e com intenção expressa e manifesta de não
usarem anticoagulantes.

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CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
MED

PREVENÇÃO DE FENÔMENOS TROMBOEMBÓLICOS


NA FIBRILAÇÃO ATRIAL

FA com estenose mitral moderada a grave ou prótese metálica?

SIM NÃO

Estimar o
Varfarina
CHA2DS2VASc

0 1 ≥2

Não anticoagular Considerar Anticoagulação


individualmente mandatória,
a possibilidade preferir DOAC
de anticoagulação à varfarina
oral

Se ACO for
contraindicada,
considerar Oclusão
do apêndice atrial
esquerdo

Figura 17. Fluxograma sobre a decisão da estratégia de prevenção de fenômenos tromboembólicos. ACO: anticoagulante oral; DOAC: anticoagulante de ação direta; e
FA: fibrilação atrial.

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CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
MED

CAPÍTULO

7.0 TRATAMENTO
Existe uma grande dúvida que paira na mente de todos entre controle de ritmo ou controle de frequência cardíaca, o que
os médicos quando se deparam com uma fibrilação atrial: posso define se um paciente com história de FA ficará anticoagulado é
reverter o ritmo? Veremos adiante que existem situações em que o CHA2DS2VASC! Pacientes que são submetidos à cardioversão e
DEVO reverter o ritmo, situações em que POSSO reverter o ritmo e que tenham esse escore elevado apresentam a mesma chance de
situações em que NÃO POSSO reverter o ritmo. evoluir com um AVE que um paciente que tenha permanecido em
Sendo assim, podemos considerar que existem duas opções ritmo de fibrilação atrial.
para esses pacientes: fazer controle do ritmo (reverter a arritmia) A explicação para esse fato deve-se à constatação de que
ou fazer controle da frequência cardíaca (apenas controlar a os pacientes revertidos tendem a apresentar episódios subclínicos
resposta ventricular). de arritmia que são tão perigosos ou mais que uma fibrilação
Um ponto importante a que você deve ficar atento para permanente para causar um evento tromboembólico.
não confundir os conceitos é que, independentemente da opção

Devo!

FA / Flutter Reverter? Posso!

Não posso!

Figura 18. Diante de uma fibrilação atrial, temos três opções: devo reverter (obrigatório), posso reverter (facultativo) ou não posso reverter (proibitivo).

O que determina a anticoagulação de um paciente é o CHA2DS2VASc,


e não a opção entre controle do ritmo ou da frequência cardíaca!

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Seguindo com a avaliação entre DEVO, POSSO ou NÃO POSSO reverter a arritmia (controle de ritmo), devemos lembrar que toda
taquiarritmia instável DEVE ser revertida imediatamente! Você pode estudar sobre isso em nosso livro sobre taquiarritmias. Na fibrilação
atrial, essa reversão será feita por meio de uma cardioversão elétrica. A explicação para essa conduta é simples, a instabilidade hemodinâmica
significa que o paciente já apresenta sinais de comprometimento grave decorrentes da taquicardia. Ou seja, está faltando sangue em órgãos
vitais! Traduzindo: O PACIENTE ESTÁ MORRENDO! Você se lembra quais são os sinais de instabilidade hemodinâmica? A figura abaixo traz a
recordação dos 4 Ds da instabilidade:

Figura 19. Os 4 sinais da instabilidade hemodinâmica. Diminuição da pressão é definida como PA<90/60 mmHg ou PAM ≥ 65 mmHg.

Vimos que diante de um paciente com instabilidade hemodinâmica, a conduta é cardioversão elétrica! Mas será
que em todo paciente com instabilidade hemodinâmica a causa é fibrilação atrial? A resposta é não! Imagine
um paciente internado com choque séptico, que está em uso de noradrenalina e inicia um quadro de fibrilação
atrial. A dose da droga vasoativa não precisa ser aumentada. Você acha que a instabilidade hemodinâmica
vai ser corrigida com a reversão da arritmia? Claro que não! O paciente já se encontrava instável antes! Sendo
assim, a cardioversão elétrica na FA instável deverá ser feita somente quando considerarmos que a arritmia é
a causadora da instabilidade.

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CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
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O box abaixo mostra os cuidados que devemos tomar ao realizar uma cardioversão elétrica na fibrilação atrial:

CARDIOVERSÃO ELÉTRICA

1. Realizar sedação e analgesia, diversos esquemas podem ser usados com esse propósito, como:
• Propofol ou midazolam (hipnóticos e sedativos) + fentanil (analgésico).
• Midazolam (hipnótico e sedativo) + morfina (analgésico).
• Etomidato (hipnótico e sedativo) + fentanil (analgésico).
2. Garantir que ninguém esteja em contato com o paciente no momento do choque.
3. Fornecer oxigênio na preparação para o procedimento, mas não se esquecer de desligar a fonte do O² no momento da
aplicação do choque pelo risco de combustão.
4. Programar o desfibrilador no modo “sincronizado” — apertar o botão “sync”. Isso garante que o choque será dado em cima
do complexo QRS, evitando assim o temido fenômeno R sobre T. Nesse fenômeno, o choque incide no período refratário do VE,
causando taquicardia ou fibrilação ventricular.
5. Selecionar a carga inicial adequada para a fibrilação atrial: 120-200 J em aparelhos bifásicos e 200 J em aparelhos monofásicos.
Caso não haja sucesso, deve-se aumentar a carga progressivamente.

O segundo ponto que devemos considerar diante de uma fibrilação atrial, para avaliarmos se é possível reverter o ritmo ou não, é a
possibilidade de já haver um trombo dentro do coração. Essa preocupação decorre do fato que, ao realizarmos uma reversão inadvertida do
ritmo, possibilitamos que “o coração bata mais forte” e, dessa forma, desloque o trombo que estava lá “paradinho”.

Baseado no que falamos até agora, podemos depreender que é possível conduzir uma fibrilação atrial com
apenas duas perguntas:
1. O paciente está estável ou instável?
2. Há possibilidade de haver um trombo intracardíaco?

A segunda pergunta pode ser respondida de três maneiras:

Caso a fibrilação atrial tenha início há menos de 48 horas,


consideramos que ainda não houve tempo hábil para se formar
um trombo intracavitário. Porém, devemos ter atenção quanto
a esse ponto. Nem sempre é possível ter certeza do tempo de
início da arritmia. Para afirmarmos com precisão, ou o paciente
deve ter um eletrocardiograma / holter mostrando que ele estava
em ritmo sinusal há menos de 48 horas ou o início dos sintomas
deve ser muito claro e não deixar dúvidas. Sendo assim, a maioria
dos pacientes que se apresentam com FA tem o tempo de início
indeterminado.

Figura 20. Formas de descartar a presença de trombos intracavitários.

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MED

Já, em relação ao paciente que se encontra anticoagulado há pelo menos 3 semanas, devemos considerar que, se houvesse um
trombo intracavitário, esse já teria sido desfeito. O importante nesse grupo é avaliar se, de fato, o paciente não falhou o tratamento nesse
período. Se o paciente estiver em uso de um DOAC, devemos questionar se ele deixou de tomar a medicação em algum dia. Caso o paciente
esteja em uso de varfarina, devemos questionar se, nesse período, o RNI permaneceu na faixa terapêutica (geralmente entre 2-3).
A terceira maneira de descartar a presença de um trombo intracavitário é por meio da visualização direta mediante ecocardiograma,
porém o exame transtorácico, ou seja, o exame comum, realizado por um transdutor externo, não é capaz de excluir a possibilidade de haver
um trombo. Basta lembrarmos a anatomia cardíaca e sua relação com as estruturas torácicas para entendermos que o átrio esquerdo e,
consequentemente, o apêndice atrial esquerdo são estruturas de localização posterior e mantêm grande correlação com o esôfago. Sendo
assim, o ecocardiograma capaz de descartar a presença de trombos intracavitários é o transesofágico.

1 2

Figura 21. Exemplo de ecocardiograma transtorácico (figura 1) e ecocardiograma transesofágico (figura 2). Apenas o exame transesofágico é capaz de descartar a
presença de trombos na fibrilação atrial. (Fonte da imagem à esquerda: Shutterstock; Fonte da imagem à direita: Adaptado de Shutterstock).

Após essa avaliação inicial, se o paciente não preencher Sendo assim, a conduta diante de um paciente que se
nenhum dos três critérios acima, que nos permitem afirmar que apresenta no pronto atendimento com fibrilação atrial é resumida
não há trombo intracavitário, NÃO PODEMOS realizar a reversão pelo fluxograma abaixo. Atenção! As condutas elencadas nesse
da arritmia. fluxograma despencam em provas! Portanto, reforce o café, que
vem tema quente por aí!

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CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
MED

SIM
POSSO CARDIOVERTER!
Início dos sintomas
marcadamente < 48h
Realizar cardioversão química e/ou
ou elétrica e anticoagular
ou
Ecocardiograma Controlar a frequência cardíaca
Paciente transesofágico sem e anticoagular
estável evidências de trombos

ou

Paciente anticoagulado
há pelo menos NÃO POSSO
Fibrilação/Flutter atrial 3 semanas CARDIOVERTER!
NÃO
com FC > 100 BPM
na emergência Controlar a frequência
cardíaca e anticoagular

Paciente instável:
DEVO CARDIOVERTER!
• Diminuição da pressão:
PA< 90/60
• Dor torácica típica Cardioversão
• Diminuição da elétrica imediata
consciência e anticoagulação

• Dispneia

Alguns pontos desse fluxograma merecem destaque. Como dissemos, alguns estudos sugerem que não há diferenças entre o grupo
“controle de ritmo” e o grupo “controle de frequência cardíaca” em relação aos desfechos “mortalidade” e “taxas de AVE”. Sendo assim, deve-
se individualizar essa conduta. No grupo “POSSO CARDIOVERTER”, não necessariamente você irá cardioverter, é facultativo.

Baseado nisso, a tendência é que optemos pela reversão do ritmo nos seguintes pacientes:

1. Pacientes que apresentam sintomas relacionados à arritmia (palpitações, mal-estar, fadiga etc.) ou que
apresentem descompensação de insuficiência cardíaca relacionada ao surgimento da arritmia.
2. Pacientes jovens, ou em primeiro episódio de FA, ou se houver um fator desencadeante reversível para a
arritmia, ou átrio esquerdo normal, ou com aumento discreto.
3. Pacientes com insuficiência cardíaca cuja etiologia presumida seja taquicardiomiopatia secundária à fibrilação
atrial.
4. Pacientes em que o controle da frequência cardíaca tenha sido difícil.

O segundo ponto que devemos observar nos pacientes em caso não haja sucesso, procede-se a cardioversão elétrica. A
que decidirmos realizar a reversão do ritmo refere-se à modalidade modalidade elétrica é mais eficaz do que a química, porém
da cardioversão. Nos pacientes instáveis, como já falamos, demanda monitorização, sedação e todo um aparato que torna o
obrigatoriamente será feita uma cardioversão elétrica. procedimento mais trabalhoso e temido pelos pacientes. Nos casos
Já nos pacientes estáveis, é preferível tentar primeiro eletivos, o procedimento será bem semelhante ao descrito no
a cardioversão química, mediante o uso de antiarrítmicos, e, quadro que orienta a cardioversão elétrica de pacientes instáveis.

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É necessário anticoagular o paciente no período pericardioversão? A resposta é sim! No entanto, nos pacientes instáveis, essa não
deve ser nossa preocupação, uma vez que há um risco iminente de morte. Sendo assim, caso seja possível, deve-se realizar uma dose de
heparina em bolus antes do procedimento e manter a anticoagulação depois.
Quanto aos pacientes estáveis, devemos avaliar primeiro se a pessoa já fazia uso de algum anticoagulante. Caso esse uso seja contínuo
e confiável por pelo menos três semanas, não é necessário realizar a anticoagulação antes do procedimento, basta manter o anticoagulante.
Já no caso de o paciente não fazer uso prévio de terapia anticoagulante, é possível iniciar heparina não fracionada EV em infusão
contínua com controle de TTPa ou enoxaparina SC ou um DOAC logo antes do procedimento e manter essa droga por um período que será
definido logo adiante. A tabela a seguir orienta como deve ser a anticoagulação periprocedimento.

Características da FA Medicações e tempo de uso

Fazer uma dose de heparina não fracionada EV ou enoxaparina SC o mais


FA instável
rapidamente possível – não atrasar a cardioversão.

FA < 48 horas e baixo risco


de eventos tromboembólicos Não é necessário anticoagular antes da cardioversão.
(CHA2DS2VASc ≤ 1 etc.)

FA <48 horas e alto risco de Fazer heparina não fracionada EV ou enoxaparina SC.
eventos tromboembólicos (o tempo varia na literatura desde momentos antes da cardioversão até 6-12 horas
(CHA2DS2VASc >1 etc.) antes).

Varfarina: 3 semanas com RNI entre 2-3.


FA > 48 horas e sem ECO TE
DOAC: 3 semanas de início das drogas.

FA > 48 horas e ECO TE sem Varfarina: até pelo menos 1 RNI entre 2-3.
trombos DOAC, HNF ou enoxaparina: pelo menos 2 horas antes da cardioversão.

Você já ouviu falar do nocaute atrial? Após uma cardioversão elétrica, os átrios ficam atônicos e, decorrente disso, mesmo
que o paciente retome o ritmo sinusal, há grande predisposição à formação de trombos no período de até 10 dias após o choque.
Com o retorno da atividade atrial, a chance do trombo ser ejetado aumenta. Por isso, é fundamental que o paciente candidato à
reversão da arritmia permaneça anticoagulado no período pós-cardioversão.

E como será feita a anticoagulação dos pacientes após ser realizada a cardioversão? Após a reversão do ritmo, o que irá determinar o
tempo de anticoagulação é o escore CHA2DS2VASc. Observe a tabela abaixo que fala da anticoagulação após o procedimento:

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CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
MED

CHA2DS2VASc Tempo de anticoagulação após cardioversão

0 Anticoagular por apenas 4 semanas

1 Anticoagular por 4 semanas ou para sempre (ad aeternum)

≥2 Anticoagular para sempre (ad aeternum)

Atenção! Existe alguma exceção? Algum paciente que não precisa ficar anticoagulado após a cardioversão? Existe um
detalhe que é uma novidade da Diretriz Europeia de Fibrilação Atrial de 2020! Nos pacientes com CHA2DS2VASc 0 (homem)
ou 1 (mulher) em que a fibrilação atrial tenha durado menos de 24 horas, é possível não manter anticoagulação por tempo
nenhum após a cardioversão.

Antes de prosseguirmos com as condutas relativas ao tratamento da fibrilação atrial, vamos apenas relembrar a classificação das
drogas antiarrítmicas de Vaughan-Williams, que pode ser vista no livro de taquiarritmias e que será citada em alguns momentos deste livro:

Classe Mecanismo de ação Antiarrítmicos

Ia Bloqueio moderado aos canais de Na+ Procainamida, quinidina, disopiramida

Ib Bloqueio fraco aos canais de Na+ Lidocaína, fenitoína e mexiletina

Ic Bloqueio intenso aos canais de Na+ Propafenona e flecainida

II Betabloqueadores Metoprolol, propranolol, esmolol

III Bloqueadores dos canais de K+ Amiodarona, dronedarona, sotalol

IV Bloqueadores dos canais de cálcio Diltiazem e verapamil

Vamos responder a uma questão sobre o que aprendemos até agora.

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CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
MED

CAI NA PROVA
(Universidade de Vassouras -RJ 2018) Mulher de 72 anos, com antecedentes de HAS e cirurgia para correção de Valvulopatia mitral, procura
o pronto-socorro por quadro de tonteiras há uma hora. Ao exame físico apresenta extremidades frias, PA 60 x 40 mmHg e FC 160 bpm; ECG
evidencia Fibrilação atrial. Faz uso de anticoagulação oral. Qual é a conduta mais adequada para essa paciente?
A) Cardioversão elétrica após sedação.
B) Amiodarona em dose de 300 mg endovenosa em bolo.
C) Lidocaína em dose de 1 mg/ Kg endovenosa.
D) Propafenona em dose de 600 mg oral.

COMENTÁRIO:
Estrategista, o enunciado da questão já nos apresenta um paciente com FA valvar (estenose mitral) e pede que tracemos a conduta. Sendo
assim, vamos fazer as duas perguntas:

1. O paciente está estável ou instável? Vamos então pesquisar os 4 Ds (dispneia, diminuição de consciência, diminuição da
pressão e dor torácica). O paciente apresenta diminuição da pressão (< 90/60 mmHg), sendo assim, é uma FA instável!
Acabou a conversa! Não precisamos nem da segunda pergunta, a conduta é a CARDIOVERSÃO ELÉTRICA!

Correta a alternativa A, pois o paciente da questão apresentou hipotensão severa com choque, configurando critério de
instabilidade. Nesse caso, o tratamento preconizado é a cardioversão elétrica sincronizada com 120-200J em desfibrilador bifásico
(fibrilação atrial). A sedação é mandatória, uma vez que o paciente está consciente.

Incorreta a alternativa B, pois a amiodarona é uma opção em pacientes ESTÁVEIS.

Incorreta a alternativa C, pois a lidocaína não é uma opção em arritmias supraventriculares.

Incorreta a alternativa D, pois a propafenona é uma opção em pacientes ESTÁVEIS e SEM CARDIOPATIA ESTRUTURAL, como veremos
adiante.

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CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
MED

7 .1 MEDICAÇÕES USADAS PARA CONTROLE DE RITMO (REVERTER A FIBRILAÇÃO ATRIAL)

Agora que já estudamos os parâmetros que nos levam a tomar decisões diante de uma fibrilação atrial, vamos embarcar no estudo
mais aprofundado das medicações utilizadas nessa arritmia.
Existem diversos antiarrítmicos que têm a capacidade de realizar a cardioversão química, como propafenona, amiodarona, sotalol,
flecainamida, ibutilida, procainamida, quinidina etc. Destacaremos no quadro abaixo os três primeiros, pois são os mais disponíveis no Brasil.

Antiarrítmico Características

É a droga mais eficaz para a reversão do ritmo. Pode ser usada na abordagem “pill in the pocket”
– pílula no bolso, ou seja, quando orientado pelo médico, o paciente faz uso dessa droga em
casa ao identificar o início da arritmia. Uso exclusivo por via oral. Como limitação, não deve ser
Propafenona usada em pacientes com alterações estruturais cardíacas (sobrecarga do VE, coronariopatia e
disfunção sistólica), sob risco de induzir taquicardias ventriculares. Apesar de ser mais eficaz que a
amiodarona, não a vemos ser usada tão frequentemente, pois a maioria dos pacientes com FA tem
alterações estruturais cardíacas.

É o antiarrítmico mais usado para reversão da FA, sem, no entanto, ser uma droga muito eficaz para
esse propósito. Já com o intuito de manter o paciente em ritmo sinusal, após uma cardioversão,
a amiodarona é muito útil. Quando usada associada à cardioversão elétrica, garante mais sucesso
Amiodarona
ao procedimento. O uso prolongado dessa medicação tem como desafio seu alto perfil de
intolerabilidade, dada sua toxicidade para a tireoide, pulmão, fígado, sistema nervoso e olhos.
Sendo assim, sua taxa de descontinuação pode atingir 30% em 5 anos.

É um antiarrítmico com ação betabloqueadora capaz de reverter a fibrilação atrial e manter o ritmo
Sotalol
sinusal. Não deve ser usado em pacientes com insuficiência cardíaca.

A amiodarona, como falamos, não é tão eficaz em reverter Um dos temas “queridinhos” das provas de Residência
o ritmo, mas é excelente para manter o paciente em ritmo sinusal. refere-se aos efeitos colaterais da amiodarona. Para você não
No entanto, é uma droga muito tóxica e possui altas concentrações perder ponto nisso, fizemos um mnemônico. Quando os efeitos
de iodo (lembre-se amIODOarona). Sendo assim, se o paciente colaterais da amiodarona forem cobrados em provas, PPONHA
não apresentar contraindicações, a preferência é pelo uso da Tireoide.
propafenona para continuar em ritmo sinusal.

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Efeitos tóxicos da amiodarona

Pneumonite intersticial ou fibrose pulmonar, pleurite e bronquiolite. Fotossensibilidade e


Pulmão e Pele
coloração cinza-azulada da pele.

Olho Microdepósitos corneanos e visão turva (neuropatia óptica).

Neurológico Tremor extrapiramidal, distúrbios do sono e pesadelos.

Hepático Aumento de transaminases e hepatite medicamentosa.

Arritmias Bloqueios AV avançados, prolongamento do intervalo QT e torsades des pointes.

Tireoide Hiper ou hipotireoidismo.

Devido a esse perfil de toxicidade, quando usarmos amiodarona, alguns exames são necessários para o acompanhamento dos
pacientes:

Exames de rotina para pacientes que usam amiodarona:

TGO e TGO 6/6 meses.

Função de tireoide 3-6 meses.

Radiografia de tórax Anualmente.

Prova de função pulmonar No início do tratamento e repetir se houver sintomas.

Avaliação oftalmológica Se houver sintomas.

ECG Antes do início e em toda consulta.

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Outro ponto que devemos saber quanto à amiodarona, pois já foi cobrado em provas de Residência, refere-se à dose e ao meio de
administração para reversão e manutenção do ritmo. Com o intuito de simplificar essas informações, a tabela abaixo resume o que você
precisa saber:

Uso da amiodarona na fibrilação atrial

Dose de ataque: 1 ampola – 150 mg diluída em 100 ml de soro glicosado 5% em 10-30


minutos.
Uso endovenoso
Dose de manutenção: 1 mg/min nas primeiras 6 horas, seguido por 0,5 mg/min nas próximas
18 horas, totalizando 900 mg/dia (6 ampolas). A dose máxima diária é de 2,2 g.

Dose de ataque: 3-5 comprimidos de 200 mg por 7-10 dias.


Dose de manutenção: 100-400 mg/dia.
Uso oral
Dose de impregnação: 8-12 gramas (somente após essa dose acumulada, considera-se que a
droga atinge níveis séricos estáveis.

Vamos responder a algumas questões sobre os temas que acabamos de ver:

CAI NA PROVA
(UNICAMP-SP 2019) Homem, 72 anos, é admitido no pronto-socorro com história de palpitações de início súbito há 1 hora. Nega dispneia,
síncope ou queixas prévias de palpitações. Antecedentes pessoais: hipertensão arterial sistêmica em uso de hidroclorotiazida e amlodipina.
Exame físico: bom estado geral; FR = 24 irpm; PA = 112 x 68 mmHg, consciente, orientado; pulmões: ausculta: sem alterações; Coração: bulhas
rítmicas sem sopros, eletrocardiograma: A CONDUTA É:

A) Cardioversão elétrica.
B) Adenosina intravenosa.
C) Amiodarona intravenosa.
D) Heparina subcutânea

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COMENTÁRIO:
Como podemos observar na questão, estamos diante de um paciente que apresenta um quadro clínico e eletrocardiográfico de
fibrilação atrial, ou seja, ritmo irregular (R-R irregular) e ausência de onda P.
Para prosseguirmos com a conduta, vamos fazer as duas perguntas:
1. O paciente está estável ou instável? Como não encontramos nenhum dos 4 Ds (dispneia, diminuição de consciência,
diminuição da pressão e dor torácica), o paciente é considerado estável.
2. Há possibilidade de haver um trombo intracardíaco? Como a fibrilação atrial iniciou, marcadamente, há menos de 48 horas,
a resposta é não!
Diante disso, podemos considerar que, para uma FA com início tão recente, a melhor conduta é reverter o ritmo. Em pacientes estáveis,
a preferência é tentar uma cardioversão química e, se não houver sucesso, complementar com a elétrica.
Idealmente, pela maioria dos protocolos de manejo de FA de início recente (aguda), é indicada anticoagulação de 6 a 12h antes da
reversão se o paciente estiver estável.

Observação: a banca focou na conduta terapêutica da FA, que seria a reversão do ritmo com uso de medicações (cardioversão
química), uma vez que o paciente está estável. Entretanto, essa questão estaria mais completa se descrevesse que foi feita a
anticoagulação previamente ao procedimento de reversão.

Incorreta a alternativa A, pois, embora promova a reversão do ritmo cardíaco, a cardioversão elétrica corresponde a um procedimento
mais agressivo, sendo geralmente usada para a reversão do ritmo cardíaco nas situações de instabilidade clínica ou quando não houve
sucesso na tentativa com medicações.

Incorreta a alternativa B, pois a adenosina corresponde a uma medicação que promove um bloqueio transitório e fugaz do nó
atrioventricular. Ela está indicada nos casos de taquicardia supraventricular com QRS estreito e R-R REGULAR, como pode ser visto no livro
sobre taquiarritmias. Não tem efeito para reverter a FA.

Correta a alternativa C, pois a amiodarona é um antiarrítmico de classe III que promove reversão do ritmo cardíaco na FA, ou seja,
tem o potencial de restabelecer o ritmo sinusal. Como a paciente está estável, a terapia medicamentosa tende a ser a prioridade.

Incorreta a alternativa D, pois essa alternativa é discutível. A heparina não fracionada, quando usada para anticoagular o paciente com
fibrilação atrial, deve ser administrada por via endovenosa em infusão contínua. Já a heparina de baixo peso molecular ou enoxaparina
pode ser dada por via subcutânea. Sendo assim, já haveria uma confusão pela maneira como foi escrita a alternativa. Por outro lado, na
FA aguda (< 48 horas), é possível reverter o ritmo e anticoagular instantes antes do procedimento ou até mesmo logo depois. Por essas
considerações, concordo que a alternativa C é mais adequada, apesar de achar que a questão poderia ser mais bem elaborada.

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(HOC-BA 2016) A Amiodarona apresenta potencialmente diversos efeitos colaterais, isso tanto em nível cardíaco, quanto fora do sistema
cardiovascular. Podemos apontar como potenciais efeitos colaterais da Amiodarona a:
A) Fibrose pulmonar.
B) Taquicardia.
C) Descompensação da glicemia.
D) Perversão visual tipo xantocromia.

COMENTÁRIO:
Estrategista, essa questão é clássica em provas de Residência: quais os efeitos colaterais da amiodarona? Lembre-se do mnemônico
quando cair em provas: PPONHA Tireoide!

Efeitos tóxicos da amiodarona

Pulmão e Pneumonite intersticial ou fibrose pulmonar, pleurite e bronquiolite. Fotossensibilidade e coloração


Pele cinza-azulada da pele.

Olho Microdepósitos corneanos e visão turva (neuropatia óptica).

Neurológico Tremor extrapiramidal, distúrbios do sono e pesadelos.

Hepático Aumento de transaminases e hepatite medicamentosa.

Arritmias Bloqueios AV avançados, prolongamento do intervalo QT e Torsades des pointes.

Tireoide Hiper ou hipotireoidismo.

Agora, vamos analisar as alternativas:

Correta a alternativa A, pois a fibrose pulmonar é um efeito colateral que acomete indivíduos que usam amiodarona por mais de
2 meses, é dose-dependente e apresenta-se com um quadro de tosse, dispneia e crepitações, sem haver, no entanto, sinais de congestão.
Incorreta a alternativa B, pois a amiodarona pode causar mais comumente bradicardias. A única taquicardia que deveríamos pensar,
nesse caso, seria a TV polimórfica do tipo torsades de pointes, já que a amiodarona prolonga o intervalo QT, por isso pode precipitar essa
arritmia. Como o autor colocou um termo genérico “taquicardia”, não considero essa alternativa adequada.

Incorreta a alternativa C, pois a amiodarona não interfere na glicemia.

Incorreta a alternativa D, pois as alterações visuais causadas pela amiodarona são microdepósitos corneanos. A xantocromia (visão
amarelada) é um efeito adverso dos digitálicos.

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7 .2 MEDICAÇÕES USADAS PARA CONTROLE DE FREQUÊNCIA CARDÍACA

Agora que já estudamos que drogas devemos usar quando optarmos pela reversão do ritmo, veremos as drogas que podem ser
empregadas para controlar a frequência cardíaca, sem, no entanto, reverter o ritmo cardíaco. Essas drogas são importantes, já que alguns
problemas gerados pela fibrilação atrial, como palpitações, cansaço, intolerância aos esforços e taquicardiomiopatia, decorrem da alta
frequência cardíaca causada pela arritmia.

E qual é a frequência cardíaca alvo em um paciente com fibrilação atrial? A resposta para essa pergunta é controversa. Alguns
estudos foram realizados e não houve diferença entre um controle de frequência com alvo de 80 ou 100 bpm.

Sendo assim, destacaremos 3 classes de drogas que podem ser usadas com esse propósito, por diminuírem a condução elétrica pelo
nó atrioventricular:

Antiarrítmico Características

São os mais comumente utilizados. Especialmente úteis em pacientes com


coronariopatia e insuficiência cardíaca de fração de ejeção reduzida associada à
arritmia. Nos casos de FA aguda, podem ser usados em apresentações intravenosas
Betabloqueadores
(esmolol, propranolol e metoprolol). Podem ser beta-1 seletivos (metoprolol,
atenolol, esmolol, bisoprolol, nebivolol etc.) ou não seletivos (propranolol, carvedilol,
nadolol etc.). Esses últimos causam, com mais frequência, broncoespasmos.

São representados pelo verapamil e pelo diltiazem. Bloqueiam os canais de cálcio do


Bloqueadores de canal de
sistema de condução cardíaco. Possuem apresentação venosa e oral. Contraindicados
cálcio não diidropiridínicos
em pacientes com disfunção sistólica, por possuírem efeito inotrópico negativo.

São representados pela digoxina (forma oral) e pelo deslanosídeo (forma venosa).
Não são drogas de primeira linha nessa doença por terem um tempo de ação lento
(próximo a 6 horas) e por seu efeito tóxico. São reservadas, principalmente, para
pacientes com disfunção sistólica associada à FA, por possuírem efeito inotrópico
Digitálicos
positivo (aumentam contratilidade cardíaca). Um ponto muito frequente em provas
de Residência quanto ao uso dessas medicações é a intoxicação digitálica. Você
pode estudar esse tema com mais detalhes em nosso livro sobre o tratamento da
insuficiência cardíaca.

Além das drogas acima citadas, também é possível controlar não desejada do ritmo quando se usa essas drogas para controle
a frequência cardíaca com amiodarona e sotalol, porém, como de frequência cardíaca. Por isso, essas drogas não são opções de
vimos anteriormente, essas drogas podem ser usadas também para primeira linha para controlar frequência cardíaca e só devem ser
reversão do ritmo cardíaco. Sendo assim, pode haver uma reversão usadas quando não houver outra opção viável.

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Lembra que falamos no início desse livro que, o que impede nosso coração de assumir uma frequência cardíaca de 400-600 bpm na
FA, é o nó AV? Pois bem, imagine agora uma situação em que haja uma via anômala entre o átrio e o ventrículo, como se fosse um “atalho”
fora do nó AV. Seria temeroso, não é? Pois é exatamente isso que ocorre na síndrome de Wolff-Parkinson-White (WPW). Sendo assim,
nessa doença, as altas frequências atriais da FA podem gerar altas frequências ventriculares, desencadeando inclusive paradas cardíacas por
taquicardia ventricular/fibrilação ventricular. A associação dessas doenças é chamada de fibrilação atrial pré-excitada. No ECG de base dessa
síndrome (fora da FA), veremos a presença de intervalo PR curto e onda delta, como mostrado na figura abaixo. Essa doença será abordada
com mais detalhes no livro de taquiarritmias.

Figura 23. ECG da síndrome de Wolff-Parkinson-White.

Agora, pense comigo, quando estamos diante de uma fibrilação atrial pré-excitada, o problema está no fato de a
condução atrial não estar passando pelo nó AV, mas sim pela via anômala, certo? Sendo assim, devemos evitar drogas
que piorem o problema, ou seja, drogas que inibam a condução pelo nó AV, como betabloqueadores, bloqueadores dos
canais de cálcio, adenosina, digoxina e amiodarona. Você pode se perguntar: vou usar o que então? Pela falta de opções
terapêuticas, o melhor tratamento no Brasil seria realizar a cardioversão elétrica sincronizada.

O tratamento definitivo dessa condição, que praticamente salva o paciente do risco de morte súbita, é fazer a ablação dessa via
anômala. Trocando em miúdos, queimar o atalho do coração!

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Figura 24. Exemplo de uma FA pré-excitada: ritmo irregular com presença de onda delta. Observe que a onda delta faz com que o QRS se alargue.

Vamos praticar? Separei algumas questões sobre o que vimos até agora para você responder!

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CAI NA PROVA
(SCMBH-MG 2020) São drogas que podem ser usadas para controle de frequência cardíaca em pacientes hemodinamicamente estáveis com
fibrilação atrial de alta resposta ventricular, exceto:
A) Verapamil.
B) Metoprolol.
C) Atropina.
D) Diltiazem.

COMENTÁRIO:
Estrategista, em pacientes com fibrilação atrial de alta resposta ventricular, podemos fazer uso das seguintes medicações com o intuito
de controlar a frequência cardíaca:
• Betabloqueadores;
• Bloqueadores dos canais de cálcio não diidropiridínicos (verapamil e diltiazem);
• Digitálicos (deslanosídeo);
• Amiodarona e sotalol.

Incorretas as alternativas A, B, e D, pois, como vimos, metoprolol (betabloqueador), verapamil e diltiazem (BCC) são medicações que
podem ser usadas para o controle de frequência cardíaca nos pacientes com FA.

Correta a alternativa C, pois a atropina é um alcaloide com ação antimuscarínica, ou seja, parassimpaticolítica. Dessa forma, tem
potencial de promover aumento da frequência cardíaca (efeito cronotrópico positivo) e é usada em casos de bradiarritmias sintomáticas
ou instáveis, como você pode observar no livro de bradiarritmias.

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(HSM - DF 2019) Uma paciente de 45 anos de idade sente tontura, pressão no peito e fadiga há três horas. Durante o exame, verifica-se que
ela apresenta níveis pressóricos de 80 mmHg x 50 mmHg e FC = 140 bpm, associada a má perfusão periférica. Ao ECG, nota-se que ela tem
fibrilação atrial, sendo que um ECG basal prévio mostrou ondas delta. A respeito desse caso clínico, assinale alternativa correta.

A) Essa paciente não possui risco de taquicardia ventricular, pois a respectiva fibrilação atrial possui complexo QRS estreito, assim o risco
maior seria evolução para taquicardia supraventricular.
B) A onda delta indica a presença de extrassístoles ventriculares (provável disfunção do nó sinusal); assim, o diagnóstico para esse caso é
fibrilação atrial com complexo de QRS alargado.
C) A terapia de escolha para essa paciente seria administração de betabloqueadores, com objetivo de redução da frequência cardíaca.
D) A terapia com verapamil é uma opção aceitável para ser realizada nessa paciente em caráter de emergência, em razão da rápida absorção
e objetivando a redução da frequência cardíaca e do inotropismo cardíaco.
E) O diagnóstico clínico dessa paciente é fibrilação atrial em uma paciente portadora de síndrome de Wolff-Parkinson-White, indicado pelas
ondas delta no ECG anterior, que mostram uma via acessória ao nó atrioventricular para a comunicação elétrica.

COMENTÁRIO:
Questões como essa, cobrando o conhecimento da FA pré-excitada, são raras. No entanto, cabe esse destaque, já que facilita o
entendimento de ambas as situações e, como não é um conhecimento banal, é definidor em uma prova.
Como falamos ao longo da teoria, na FA pré-excitada, o tratamento medicamentoso fica muito limitado, sendo assim, a melhor
opção é fazer a cardioversão elétrica. O autor da questão facilitou essa decisão, uma vez que nos apresenta um paciente com instabilidade
hemodinâmica. Sendo assim, mesmo que você não conhecesse a FA pré-excitada, provavelmente acertaria a questão ao fazer a primeira
pergunta diante de uma FA:
• O paciente está estável ou instável? Vamos então pesquisar os 4 Ds (dispneia, diminuição de consciência, diminuição da
pressão e dor torácica). O paciente apresenta diminuição da pressão (< 90/60 mmHg), sendo assim, é uma FA instável!
Acabou a conversa! Não precisa nem da segunda pergunta, a conduta é CARDIOVERSÃO ELÉTRICA!

Incorreta a alternativa A, pois o fato de o QRS estar estreito, nesse momento, indica apenas que, por enquanto, o estímulo está passando
pelo nó AV (a onda delta “alarga” o QRS), porém pode ser que, em breve, desencadeie uma taquicardia ventricular ao passar pela via
anômala.
Incorreta a alternativa B, pois a onda delta indica a presença de uma via anômala, que é uma característica da síndrome de Wolf-Parkinson-
White.
Incorreta a alternativa C, pois os betabloqueadores vão inibir a passagem do estímulo cardíaco pelo nó AV e, dessa forma, propiciar que
o estímulo se direcione para a via anômala, podendo precipitar, assim, a fibrilação ventricular.
Incorreta a alternativa D, pois o verapamil teria o mesmo efeito do betabloqueador e poderia aumentar a chance de haver uma fibrilação
ventricular.

Correta a alternativa E, pois, de fato, a onda delta significa que a paciente tem síndrome de WPW, que é causada pela presença de
uma via anômala ligando os átrios aos ventrículos. Essa associação é uma das possíveis causas de fibrilação atrial com QRS largo.

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7 .3 ABLAÇÃO DE FIBRILAÇÃO ATRIAL

Agora, estudaremos um tema que não é propriamente uma novidade, mas que tem sido muito estudado nos últimos anos. Por isso,
apesar de não ser um dos pontos mais cobrados historicamente em provas, é uma boa aposta para questões futuras!
A ablação da fibrilação atrial é um procedimento que serve para diminuir a ocorrência dessa arritmia. Nele, faz-se um isolamento por
ablação (algo semelhante a uma cauterização) dos óstios das veias pulmonares, já que se acredita que essas estruturas tenham relação com
o surgimento da FA.

Algumas evidências atuais sugerem que a ablação seja mais eficaz que as drogas antiarrítmicas para controle
de frequência e de sintomas na FA. Se um paciente perguntasse: após esse procedimento, ficarei curado?
Qual seria sua resposta? Devemos encarar a ablação de FA não como um procedimento curativo, já que a
arritmia é complexa e multifatorial. Para corroborar isso, as taxas de recidiva giram em torno de 50% em 3
anos. Essas taxas de recidiva são afetadas diretamente pelo tempo de duração da arritmia (FA paroxística e
persistente responde melhor que a persistente de longa duração), pela idade do paciente (quanto mais jovem,
maior o sucesso), pelo tamanho dos átrios (resposta ruim quanto maior forem os átrios) e pela presença de
cardiopatias estruturais (pacientes com coração estruturalmente normal têm maior sucesso).

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Pense na ablação de fibrilação atrial como o hábito de pintar cabelos brancos.


Pode até resolver na hora, mas, cedo ou tarde, a situação volta!

Baseado no fato de ser um procedimento com benefício mais claro, relacionado apenas a sintomas, de o uso de antiarrítmicos ser mais
profundamente estudado e de ter altas taxas de recidiva, a ablação de FA estará indicada, basicamente, nas situações abaixo:
• Pacientes sintomáticos;
• Pacientes intolerantes ao uso de antiarrítmicos;
• Pacientes que não desejam usar antiarrítmicos;
• Pacientes com insuficiência cardíaca cuja causa presumível seja taquicardiomiopatia.

Sendo assim, as indicações desse procedimento são:

Indicações de ablação de FA:

Pacientes sintomáticos com FA paroxística refratária ou intolerante a, pelo menos, uma droga antiarrítmica das classes
I ou III, quando a estratégia de controle do ritmo é desejada.

Pacientes sintomáticos selecionados com FA persistente refratária ou intolerante a, pelo menos, uma droga
antiarrítmica das classes I ou III.

Pacientes com FA paroxística sintomática recorrente como primeira terapia (antes de medicações antiarrítmicas),
desde que seja opção do paciente.

Considerar em pacientes com insuficiência cardíaca de fração de ejeção reduzida cuja causa presumível seja
taquicardiomiopatia.

As complicações da ablação são de aproximadamente 6% e, principalmente, representadas por: tamponamento cardíaco, estenose de
veias pulmonares, fístula átrio esofágica, lesão do nervo vago e AVE.

Atenção! Não confunda ablação de fibrilação atrial com ablação da junção atrioventricular na
fibrilação atrial. O segundo procedimento consiste em induzir um bloqueio atrioventricular total
no paciente portador de fibrilação atrial. Nesse caso, o procedimento causa uma dissociação
entre o átrio e o ventrículo, dessa forma é imperativo que, antes da ablação, se faça o implante
de um marcapasso. Esse tipo de ablação é reservado para pacientes refratários ou intolerantes
às medicações, quando não é possível controlar a frequência. É a opção mais extrema para
controle de frequência cardíaca. Nessa condição, o átrio continuará em fibrilação, porém,
agora, dissociado do ventrículo. 

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Figura 26. Ablação da junção AV. Observe que, enquanto a comunicação elétrica entre os átrios e ventrículos é rompida pela ablação da junção AV, já foi implantado um
marcapasso cardíaco.

Vamos, então, responder a uma questão sobre esse tema!

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CAI NA PROVA
(FUBOG-GO 2018 - modificada) Podemos obter o controle do ritmo na Fibrilação Atrial por diversas condutas, clínicas ou intervencionistas.
Indique a alternativa INADEQUADA em relação à ablação da fibrilação atrial:
A) Evidências sólidas indicam que a ablação da Fibrilação Atrial é mais eficaz do que as drogas antiarrítmicas para controle do ritmo.
B) A ablação está indicada como opção para a falência de uma droga antiarrítmica e também como primeira escolha em pacientes
selecionados com FA paroxística, sem doença estrutural.
C) Pacientes com cardiopatia estrutural e FA paroxística igualmente podem ser considerados para ablação como terapia inicial, desde que
se suspeite de taquicardiomiopatia e que o paciente deseje realizar ablação.
D) A eficácia da ablação da FA não varia conforme as características clínicas da arritmia e a extensão da cardiopatia de base.

COMENTÁRIO:
Essa questão traz algumas considerações sobre a ablação da fibrilação atrial. Esse procedimento serve para diminuir a ocorrência dessa
arritmia e para controlar sua frequência cardíaca.
Vamos relembrar as indicações desse procedimento:

Indicações de ablação de FA:

Pacientes sintomáticos com FA paroxística refratária ou intolerantes a, pelo menos, uma droga antiarrítmica das classes
I ou III, quando a estratégia de controle do ritmo é desejada.

Pacientes sintomáticos selecionados com FA persistente refratária ou intolerantes a, pelo menos, uma droga antiarrítmica
das classes I ou III.

Pacientes com FA paroxística sintomática recorrente como primeira terapia (antes de medicações antiarrítmicas), desde
que seja opção do paciente.

Considerar em pacientes com insuficiência cardíaca de fração de ejeção reduzida cuja causa presumível seja
taquicardiomiopatia.

Agora, vamos analisar as alternativas:


Correta a alternativa A, pois a ablação de FA é mais eficaz para controle de ritmo e sintomas se comparada às medicações.
Correta a alternativa B, pois, quando as medicações antiarrítmicas falham, tanto na FA paroxística quanto na persistente, a ablação é uma
boa escolha. Além disso, a vontade do paciente conta, pois os sintomas da arritmia podem causar grandes limitações no cotidiano.
Correta a alternativa C, pois, quando a causa da insuficiência cardíaca for a própria arritmia, faz sentido pensarmos em manter o paciente
em ritmo sinusal como forma de tratar a doença cardíaca. Esse grupo de indicação tem ganhado cada vez mais espaço nos últimos anos.
Incorreta a alternativa D, pois as taxas de sucesso são sensivelmente maiores quando a fibrilação atrial é paroxística/persistente
em relação à fibrilação atrial persistente de longa duração. Quando há menos alterações estruturais cardíacas, também há maior sucesso.
Além do mais, algumas condições determinam menor sucesso, como obesidade, etilismo, sedentarismo etc.

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Antes de encerrarmos o tema fibrilação atrial e iniciarmos o estudo do flutter atrial, vamos relembrar os tópicos mais importantes:

7.3.1 TÓPICOS QUENTES DE FIBRILAÇÃO ATRIAL:


• A fibrilação atrial é a arritmia sustentada mais comum.
• A classificação da FA pelo tempo segue os critérios abaixo:

Classificação da fibrilação atrial:

Paroxística Fibrilação atrial revertida espontaneamente ou com ajuda médica em menos de 7 dias.

Persistente Fibrilação atrial com duração superior a 7 dias e com perspectivas médicas de reversão.

Persistente de Termo utilizado por alguns autores para se referirem a uma fibrilação atrial com duração superior
longa duração a 1 ano, porém ainda com perspectiva médica de reversão.

Fibrilação atrial com duração superior a 7 dias e que tanto o médico quanto o paciente optaram
Permanente
por não tentarem mais a reversão do ritmo.

• Deve ser vista no eletrocardiograma como: • A FA instável deve ser prontamente revertida com
◦ Ritmo cardíaco irregular – intervalo RR irregular. cardioversão elétrica sincronizada com carga inicial de 120-200J.
◦ Ausência de onda P. • Pacientes estáveis devem ser avaliados quanto à
◦ Ativação atrial muito irregular – padrão “serrilhado fino”, possibilidade de já possuírem um trombo intracavitário.
múltiplas ondas “F” irregulares e com frequência elevada. • As situações que permitem descartar trombos
• É uma arritmia com potencial de desencadear eventos intracavitários são:
tromboembólicos, inclusive é a causa mais comum de AVE com ◦ Início da arritmia há menos de 48 horas.
origem cardioembólica. ◦ Paciente anticoagulado há mais de 3 semanas.
• A prevenção de eventos tromboembólicos será feita a ◦ Ecocardiograma transesofágico sem evidências de
partir do escore CHA2DS2VASc: trombos.
◦ Escore: 0 → não anticoagular. • Quando se descarta a presença de trombos, é POSSÍVEL usar
◦ Escore: 1 → considerar individualmente anticoagular. medicações para reverter o ritmo ou fazer cardioversão elétrica.
◦ Escore ≥ 2 → anticoagular. As medicações usadas com esse propósito são: amiodarona,
• Quando se opta pela anticoagulação, a preferência é pelos propafenona, sotalol, flecainamida etc.
anticoagulantes diretos (DOACs), ficando a varfarina como • Quando não se pode descartar trombos, deve-se apenas
segunda opção. As exceções são os pacientes com estenose mitral realizar controle de frequência cardíaca. As principais medicações
moderada-grave, prótese metálica, doença renal avançada e usadas com esse propósito são: betabloqueadores, BCC não
trombofilias, quando apenas a varfarina pode ser usada. diidropiridínicos e digitálicos.

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• Os principais efeitos colaterais da amiodarona podem ser lembrados com o mnemônico: PPONHA Tireoide.

Efeitos tóxicos da amiodarona

Pneumonite intersticial ou fibrose pulmonar, pleurite e bronquiolite. Fotossensibilidade e


Pulmão e Pele
coloração cinza-azulada da pele.

Olho Microdepósitos corneanos e visão turva (neuropatia óptica).

Neurológico Tremor extrapiramidal, distúrbios do sono e pesadelos.

Hepático Aumento de transaminases e hepatite medicamentosa.

Arritmias Bloqueios AV avançados, prolongamento do intervalo QT e torsades des pointes.

Tireoide Hiper ou hipotireoidismo.

• A ablação da fibrilação atrial não deve ser encarada como um procedimento definitivo, pois apresenta altas taxas de recidiva. No
entanto, é útil no controle de sintomas dos pacientes.

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CAPÍTULO

8.0 FLUTTER ATRIAL


Agora que terminamos o estudo da “rainha das arritmias”, a fibrilação atrial, vamos estudar seu “irmãozinho”, o flutter atrial! Veremos
que muitas características são semelhantes entre as duas arritmias. Sendo assim, sabendo bem sobre a fibrilação atrial, facilmente você
conhecerá o flutter.

8 .1 DEFINIÇÃO E DIAGNÓSTICO

O flutter atrial pode ter uma apresentação clínica muito semelhante à da fibrilação atrial, com dispneia, mal-estar, palpitações,
tonturas e síncope. Além disso, é também uma arritmia emboligênica, sendo assim, pode causar AVE, embolias de membros, IAM etc. Outra
complicação grave que pode acontecer, assim como em qualquer taquiarritmia sustentada, é a taquicardiomiopatia, que é uma das principais
causas de insuficiência cardíaca de fração de ejeção reduzida.
Uma das principais diferenças entre essas duas arritmias deve-se a seu mecanismo fisiopatológico. O flutter tem como principal
mecanismo um circuito de macrorreentrada (lembre-se de que a FA tem um mecanismo bem complexo e envolve vários circuitos de
microrreentrada). Em sua apresentação típica, esse circuito encontra-se localizado no istmo cavotricuspídeo, uma região no interior do átrio
direito entre a inserção das veias cavas e a valva tricúspide.
O impulso elétrico surgido no istmo cavotricuspídeo pode ter sentido horário ou anti-horário e essa orientação serve para classificarmos
essa arritmia. Veremos que cada volta nesse circuito produz uma deformidade no eletrocardiograma conhecida como onda “F”. No flutter
atrial típico anti-horário (mais comum), essas ondas “F” na parede inferior (DII, DIII e aVF) serão negativas. O contrário é esperado no flutter
típico horário, como mostra a imagem abaixo:

AD AD
AE AE

Istmo Cavotricuspídeo Istmo Cavotricuspídeo

Flutter atrial típico anti-horário Flutter atrial típico horário

II

III

V1

Ondas “F”

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Agora, preste bastante atenção, pois vou fornecer uma informação fundamental para o entendimento do flutter. Tome um café
caprichado aí!

No flutter atrial típico, as voltas no istmo cavotricuspídeo têm uma frequência de 300 rotações por minuto. A
cada volta, o estímulo elétrico chega ao nó AV e essa estrutura funciona como um porteiro, decidindo se “deixa” ou “não
deixa” o estímulo elétrico descer para os ventrículos. Pense comigo, se o nó AV deixasse todos os estímulos descerem,
quanto seria nossa frequência cardíaca no flutter? Se as voltas ocorrem na frequência de 300 rotações por minuto, nossa
frequência seria de 300 batimentos por minuto!

Agora, pense novamente, se o nó AV escolhesse deixar um Outro ponto importante quanto à nomenclatura do flutter
estímulo descer e outro não e assim sucessivamente, quanto seria refere-se a sua frequência de ativação ventricular. Sendo assim,
a frequência cardíaca? Como ele está deixando metade passar, se, a cada duas voltas no circuito, houver 1 batimento ventricular,
seria de 150 bpm! Seguindo o mesmo raciocínio, veremos que, se teremos um flutter 2:1 (FC ≅ 150 bpm). Se, a cada três voltas no
o nó AV deixasse 1 a cada 3 voltas descer, a frequência seria de 100 circuito, houver 1 batimento ventricular, teremos um flutter 3:1 (FC
bpm! 1 de 4, seria de 75 bpm! E é aí que vem o “pulo do gato” no ≅ 100 bpm). E assim por diante.
flutter atrial! Geralmente, a frequência cardíaca nessa arritmia é
um múltiplo de 300! Ou seja, 300, 150, 100, 75, 60, 50 etc.

No flutter atrial típico, a frequência cardíaca é um múltiplo de 300! Ou seja, 300, 150, 75, 60, 50 etc.

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Figura 28. Flutter atrial e a frequência cardíaca a partir da proporção de estímulos conduzidos pelo nó atrioventricular.

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Assim como acontece na fibrilação atrial, o diagnóstico do flutter é eletrocardiográfico! Atenção! Um dos pontos mais cobrados em
provas sobre essa arritmia é justamente seu diagnóstico no ECG, portanto observe os critérios abaixo:

Frequência atrial geralmente de 300bpm


(representada pelas ondas “F”)

Sequência de ondas “F” sem linhas isoelétricas


entre elas, em aspecto de “serrote”

Frequência cardíaca igual ou próxima dos múltiplos


de 300bpm (300, 150, 100, 75, 60, 50 etc)

Uma dica importante para a prova e para a prática de medicina é sempre procurar as ondas “F” na parede inferior
(DII, DIII e aVF) e em V1.

Observe, no ECG abaixo, como esses critérios aparecem nos eletrocardiogramas.

Figura 29. ECG com flutter atrial. Fonte: Adaptado de Shutterstock.

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Agora, gostaria de contar com sua atenção para desconstruir duas informações que comumente recebemos sobre o flutter. Então,
vamos ao primeiro ponto: assim como acontece com a fibrilação atrial, talvez você já tenha estudado o flutter como uma arritmia de QRS
estreito. No entanto, essa arritmia também ocorre nos átrios e a largura do QRS é decorrente da condução intraventricular. Sendo assim, é
absolutamente possível, apesar de não ser o mais comum, que tenhamos um complexo QRS alargado, nas seguintes situações:
• Presença de um bloqueio de ramo associado (BRD ou BRE);
• Condução aberrante (algumas taquiarritmias conduzem com QRS largo apenas na alta frequência — é como se as fibras de His-
Purkinje se cansassem durante a taquicardia);
• Presença de uma pré-excitação (como na síndrome de WPW).
O segundo ponto que quero chamar sua atenção é: nem sempre essa arritmia é regular! O que determina a
regularidade do ritmo é a atividade do nó AV. Em alguns casos, ao invés de conduzir os estímulos em uma proporção
fixa (2:1, 3:1, 4:1 etc.), o nó AV tem uma condução variável. Nesse caso, chamaremos a arritmia de flutter atrial com
condução AV variável.

Figura 30. Exemplo de um flutter atrial com condução AV variável. Fonte: Acervo pessoal.

Apesar de ter chamado sua atenção para essas situações diferentes, justamente para você não cair em pegadinhas de provas, o mais
comum é que o flutter se apresente com complexo QRS estreito e em ritmo regular.

O flutter atrial com condução AV variável tem frequência cardíaca irregular.

Para finalizarmos essa complexa rede de nomenclaturas que envolvem essa arritmia, podemos observar ainda um flutter atrial atípico.
Isso pode ocorrer quando o circuito de macrorreentrada não envolver o istmo cavotricuspídeo. Como consequência disso, veremos uma
frequência atrial (das ondas “F”) superior a 350 bpm.

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Eletrocardiograma
O quadro abaixo resume as informações sobre a nomenclatura do flutter atrial:

• Flutter atrial típico: ocorre no istmo cavotricuspídeo.


Esclarecendo o diagnóstico
• Flutter atrial típico anti-horário: ondas “F” negativas na parede inferior.
da taquicardia
• Flutter atrial típico horário supraventricular
(reverso): ondas “F” positivas na parede inferior.
• Flutter atrial atípico: circuito não dependente do istmo cavotricuspídeo (frequência atrial geralmente
maior queAmérico
Antonio 350 bpm).
FriedmannI
José Grindler
• Flutter
II
atrial com condução AV variável: ritmo irregular.
Carlos Alberto Rodrigues de OliveiraIII
Alfredo José da FonsecaIII
Você sabe qual é a apresentação mais comum do flutter? Na
Serviço de Eletrocardiologia da Clínica Geral do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
Você já viu um flutter 2:1? O eletrocardiograma dessa
prática médica, o mais observado é um flutter típico anti-horário arritmia pode ser de difícil interpretação, uma vez que as ondas
2:1. Existe um motivo para a proporção 2:1 ser a mais encontrada. “F” podem se “misturar” com a onda T e com o complexo QRS,
O nó AV
Umaapresenta
pacienteum
deperíodo
63 anos,refratário
portadoraintrínseco, que coincide
de valvopatia reumá- sendoaentão
Como de estava
paciente difícil visualização nessaossituação
muito dispneica, médicose, facilmente, o
decidiram
comtica,
umafoifrequência
atendida próxima de 150 bpm.doEssa
no Pronto-Socorro é a justificativa.
Hospital das Clínicas flutter 2:1 pode
administrar ser confundido
adenosina. comdo
Após a injeção uma taquicardia
fármaco, a FC paroxística
dimi-
com broncopneumonia e taquicardia. O eletrocardiograma nuiu muito e, assim, a diástole ventricular prolongada permitiu
supraventricular (uma taquiarritmia, regular, de complexo QRS
(ECG) (Figura 1) revelou taquicardia supraventricular (TSV) evidenciar ondas F de flutter atrial no ECG (Figura 2). Entre-
com frequência cardíaca (FC) de 150 bpm e onda P não vísivel. estreito
tanto, e sem
a FC ondaaP).
voltou Observeapós
aumentar no eletrocardiograma
alguns segundos. abaixo
Então,como
essas arritmias podem ser parecidas.

FiguraFigura Taquicardiafacilmente,
1.taquiarritmia,
31. Essa supraventricular (QRS estreito)
seria diagnosticada com frequência
como sendo cardíaca
uma taquicardia 150supraventricular
paroxística bpm e onda P(TPSV).
não visível.
Porém, Observe o
como a frequência cardíaca
é de empastamento
150 bpm, devemosinicial
lembrardoque
QRS
umaemdasD2, D3 e aVF. é que seja uma flutter atrial 2:1. Fonte: Friedmann AA et al. Esclarecendo o diagnóstico da taquicardia
possibilidades
supraventricular. Diagn. tratamento. 2009; 14(3)120-122.

Prof. Juan I
Demolinari
Livre-docente,
II
| Curso
diretor do Serviço Extensivo
de Eletrocardiologia | Setembro
do Hospital das Clínicas 2021
da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP). 72
Médico supervisor do Serviço de Eletrocardiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).
III
Médico assistente do Serviço de Eletrocardiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).

Diagn Tratamento. 2009;14(3):120-2.


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Veremos no livro de taquiarritmias que o tratamento da Sendo assim, quando aplicarmos uma manobra vagal ou
TPSV começa com manobras vagais (Valsalva, Valsalva modificada, adenosina em uma arritmia, como a do ECG acima, podemos ter
compressão do seio carotídeo etc.) e, caso não haja sucesso, dois resultados:
infusão de adenosina. Tanto as manobras vagais quanto a 1. Se for uma TPSV: ocorrerá um período de bradicardia ou
adenosina promovem uma diminuição ou até mesmo uma parada de assistolia (linha reta na linha de base) e provável reversão da
arritmia (retorno ao ritmo sinusal).
intermitente da condução elétrica pelo nó AV e, dessa forma,
2. Se for um flutter 2:1: o bloqueio do nó AV irá inibir os
rompem o mecanismo de reentrada na TPSV (o mecanismo de
batimentos ventriculares. Sendo assim, ocorrerá uma bradicardia
reentrada nessa arritmia envolve o nó AV).
ou assistolia, porém, na linha de base, ao invés de vermos uma
linha reta, veremos as ondas “F” de flutter aparecendo. Como
observado no ECG abaixo:

Figura 32. Observe que, após a aplicação da adenosina, ocorre uma importante bradicardia que evidencia claramente as ondas “F” de flutter que antes estavam ocultas.
Fonte: FRIEDMANN A.A., et al. Esclarecendo o diagnóstico da taquicardia supraventricular. Diagn Tratamento. 2009;14(3):120-122.

Agora que já estudamos os principais aspectos do diagnóstico dessa arritmia, vamos praticar com algumas questões!

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CAI NA PROVA
(EBSERH-BR 2021) Paciente masculino, 60 anos, foi admitido na urgência com quadro de taquiarritmia de início recente, sintomática. Foi
realizado o eletrocardiograma na admissão, que é apresentado em seguida. Analisando o eletrocardiograma e as alternativas a seguir, qual é
o ritmo predominante mais provável que se apresenta?

A) Taquicardia supraventricular de reentrada


B) Taquicardia ventricular
C) Flutter atrial
D) Fibrilação atrial
E) Ritmo juncional

COMENTÁRIO:
Estrategista, essa questão é daquele tipo: sem conversa fiada, o que você vê no eletrocardiograma? Como acabamos de ver sobre os
parâmetros para definirmos um flutter, fica fácil perceber que, na parede inferior (DII, DIII e aVF) e em V1, observamos ondas “F” em um
padrão de “serrote”. A frequência atrial (das ondas “F”) é de aproximadamente 300 bpm. Sendo assim, estamos diante de um flutter atrial!
Como ponto interessante no ECG, podemos verificar que a frequência cardíaca é irregular, portanto é um flutter de condução AV variável.
Incorreta a alternativa A, porque a taquicardia supraventricular por reentrada se configura como um tipo de taquiarritmia, geralmente,
com complexos QRS estreitos, ritmo regular (R-R regular) e sem onda P precedendo o QRS, podendo haver uma onda P retrógrada (após
o QRS). Você pode conferir as características dessa arritmia em nosso livro “Taquiarritmias”.
Incorreta a alternativa B, pois a taquicardia ventricular é uma taquicardia de complexo QRS largo, geralmente regular (TV monomórfica),
mas pode ser também irregular (TV polimórfica). Você pode conferir as características dessa arritmia em nosso livro “Taquiarritmias”.
Correta a alternativa C, pois, como vimos, o flutter é marcado pelas ondas “F” com formato em padrão de “serrote”, principalmente
na parede inferior, com frequência atrial de aproximadamente 300 bpm.
Incorreta a alternativa D, pois a fibrilação atrial, como vimos na primeira parte deste livro, é vista como um ritmo irregular, sem onda P e
com padrão “serrilhado fino” na linha de base.
Incorreta a alternativa E, o ritmo juncional é caracterizado por ter frequência cardíaca, geralmente, que varia de 40 a 60 bpm, com QRS
estreito. Nesse ritmo, o foco localizado junto ao nó AV assume o ritmo cardíaco. É caracterizado pela ocorrência de onda P negativa, que
fica próxima ao complexo QRS, por vezes sendo retrógrada (após complexo QRS).

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(FMP-RJ 2018) Você é chamado pela enfermagem para avaliar um paciente de 33 anos na clínica cirúrgica do Hospital Alcides Carneiro,
internado para investigação de nódulo tireoidiano e que iniciou subitamente palpitações. PA: 110 x 60 mmHg, FC: 151 bpm. É realizado um
eletrocardiograma de 12 derivações (ECG 1), repetido após manobra vagal e administração de adenosina 6mg IV em bolus (ECG 2). Qual o
diagnóstico eletrocardiográfico?

A) Flutter atrial.
B) Fibrilação atrial.
C) Taquicardia supraventricular por reentrada nodal.
D) Taquicardia atrial multifocal.

COMENTÁRIO:
Estamos diante de uma questão muito interessante sobre o diagnóstico diferencial das taquiarritmias. No primeiro eletrocardiograma,
podemos ficar na dúvida quanto ao diagnóstico. Observamos uma taquiarritmia com complexo QRS estreito, aparentemente sem onda P
antes do QRS e com frequência cardíaca de 150 bpm. Sendo assim, 2 diagnósticos são possíveis: taquicardia supraventricular ou flutter atrial.
Quando for assim, olhe para as derivações inferiores (DII, DIII e aVF). Se você identificar as ondas “F”, temos o flutter atrial.
No caso do flutter atrial 2:1 (FC 150 bpm), o diagnóstico pode ser bem difícil, pois a arritmia é muito parecida com a taquicardia
supraventricular. Nesse caso, a conduta é a realização de manobra vagal. Caso o paciente não reverta ou não promova pausa na condução
atrioventricular, devemos administrar adenosina. A adenosina promove um breve bloqueio da condução atrioventricular. Se for uma
taquicardia supraventricular por reentrada nodal, a adenosina reverterá o quadro (encerra o mecanismo de reentrada no nodo AV). Se for
flutter atrial, as ondas “F” ficarão evidentes. Foi exatamente isso que aconteceu nesse caso! Observe, na figura abaixo, as ondas “F” no ECG
com adenosina:

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Correta a alternativa A, pois, após um período de dúvida inicial, a aplicação da adenosina revelou as ondas “F” de flutter.

Incorreta a alternativa B, pois a fibrilação atrial, como vimos na primeira parte deste livro, é vista como um ritmo irregular, sem onda P e
com padrão “serrilhado fino” na linha de base.

Incorreta a alternativa C, pois não houve reversão com adenosina. Nessa arritmia, quando é feita adenosina, esperamos um período de
assistolia (linha reta) e depois a retomada de um ritmo sinusal. Você pode conferir essa informação em nosso livro de taquiarritmias.

Incorreta a alternativa D, pois a taquicardia atrial multifocal é irregular. Várias regiões diferentes do átrio despolarizam, gerando onda P
com morfologia diferente a cada batimento. Como o estímulo atrial vem de locais distintos, a despolarização ventricular é irregular. Você
pode conferir essa arritmia em nosso livro de taquiarritmias.

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8 .2 PREVENÇÃO DE EVENTOS TROMBOEMBÓLICOS


Assim como a fibrilação atrial, o flutter possui a terrível característica de predispor o paciente à formação de trombos intracavitários.
Sendo assim, podemos fazer uma avaliação idêntica à da FA para decidirmos sobre a necessidade de anticoagulação.
Dessa forma, devemos avaliar o CHA2DS2VASc para tomarmos essa decisão e pesar o HASBLED para predizermos a chance de eventos
hemorrágicos.

Decisão pela anticoagulação

Valor do escore CHA2DS2VASc: Decisão:

Escore: 0 Não anticoagular.

Escore: 1 ponto Considerar individualmente a possibilidade de anticoagular.

Escore ≥ 2 pontos Anticoagular.

8 .3 TRATAMENTO

O tratamento do flutter atrial também tem um paralelo muito semelhante ao da fibrilação atrial. Podemos avaliar essa arritmia com as
mesmas duas perguntas que usamos na fibrilação atrial:

Abordagem do flutter atrial:


1. O paciente está estável ou instável?
2. Há possibilidade de haver um trombo intracardíaco?

A maneira de descartar trombos intracavitários é a mesma também:


• Arritmia com início marcadamente há menos de 48 horas.
• Paciente com anticoagulação plena há mais de 3 semanas.
• Ecocardiograma transesofágico que não demonstra a presença de trombos.

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Sendo assim, podemos utilizar o fluxograma abaixo, exatamente igual ao da FA, para abordarmos o flutter atrial:

SIM
POSSO CARDIOVERTER!
Início dos sintomas
marcadamente < 48h
Realizar cardioversão química e/ou
ou elétrica e anticoagular
ou
Ecocardiograma Controlar a frequência cardíaca
Paciente transesofágico sem e anticoagular
estável evidências de trombos

ou

Paciente anticoagulado
há pelo menos NÃO POSSO
Fibrilação/Flutter atrial 3 semanas CARDIOVERTER!
NÃO
com FC > 100 BPM
na emergência Controlar a frequência
cardíaca e anticoagular

Paciente instável:
DEVO CARDIOVERTER!
• Diminuição da pressão:
PA< 90/60
• Dor torácica típica Cardioversão
• Diminuição da elétrica imediata
consciência e anticoagulação

• Dispneia

Até este momento, você pode se perguntar: então é tudo igual? É aí que você se engana, pequena Coruja! Agora, vou apresentar-lhe
algumas características típicas apenas do tratamento do flutter.

A primeira característica é que, como o flutter é uma arritmia de macrorreentrada, é mais fácil interromper seu
mecanismo com um choque! Sendo assim, guarde a seguinte regra, o flutter responde muito bem à cardioversão
elétrica.
Sendo assim, nessa arritmia, a carga inicial aplicada em uma cardioversão elétrica sincronizada é de apenas
50 J! Se não houver reversão, o que não é comum, deve-se aumentá-la para 100J.
Outro ponto divergente entre as duas arritmias é que o flutter tem uma resposta ruim às medicações. Dessa
forma, quando se deseja controlar a frequência cardíaca, por vezes, é necessário empregar doses mais altas de
betabloqueadores, BCC não diidropiridínicos ou digitálicos.

De maneira semelhante, todas as drogas usadas para cardioversão química no flutter, porém, na maioria das vezes, o
reverter a fibrilação atrial, podem ser usadas no flutter, porém problema só será resolvido com uma cardioversão elétrica!
com resultados inferiores. Por tudo isso, é possível tentar uma O último ponto que gostaria de destacar é que o flutter atrial
pode ser curado! Veremos isso no próximo item.

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8.3.1 ABLAÇÃO DE FLUTTER ATRIAL


Lembra-se de que brincamos que a ablação de FA é como
pintar os cabelos brancos? Pois é, com o flutter, a história é diferente!
Como o mecanismo da arritmia é um circuito de macrorreentrada,
fica fácil, por meio de uma ablação por cateter, interromper
definitivamente esse circuito e curar o paciente!
Esse procedimento é indicado com mais evidência para os
casos recorrentes e sintomáticos, que, especificamente nessa
arritmia, são muito frequentes.
Se o flutter for típico, basta ablacionar o istmo atrial,
localizado entre o anel tricúspide e o óstio da veia cava inferior, e,
dessa forma, interrompe-se o circuito que predispõe à formação da
arritmia.
A recorrência após o procedimento é algo próximo de 10% e
pode ser resolvida com uma nova ablação seriada.

Figura 34. Ablação do flutter atrial. A interrupção do circuito no istmo


cavotricuspideo pode curar o paciente da arritmia.

Antes de encerrarmos o estudo do flutter, vamos dar uma olhadinha no box abaixo, que resume os temas mais quentes deste assunto:

Tópicos quentes de flutter atrial:

• O flutter atrial deve ser visto no eletrocardiograma como:


◦ Frequência atrial geralmente de 300 bpm (representada pelas ondas "F").
◦ Sequência de ondas "F" sem linhas isoelétricas entre elas, em aspecto de "serrote".
◦ Frequência cardíaca igual ou próxima dos múltiplos de 300 bpm (300, 150, 100, 75, 60, 50 etc.).
• É uma arritmia com potencial de desencadear eventos tromboembólicos.
• A prevenção de eventos tromboembólicos será feita a partir do escore CHA2DS2VASc:
◦ Escore: 0 → não anticoagular.
◦ Escore: 1 → considerar individualmente anticoagular.
◦ Escore ≥ 2 → anticoagular.
• Tem má resposta à terapia medicamentosa e boa resposta à cardioversão elétrica sincronizada.
• A carga inicial do choque é de 50J.
• É uma arritmia com potencial de cura a partir de uma ablação.

Agora, vamos responder a algumas questões que abordam o tratamento do flutter atrial!

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CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
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CAI NA PROVA
(UFGD-MS 2017) Homem de 56 anos comparece a ambulatório de clínica médica com relato de palpitações que se iniciaram há 5 dias. Refere
diagnóstico de hipertensão arterial, mas não aderente ao tratamento. Ao exame físico, está em bom estado geral, eupneico, com pressão
arterial de 130 x 90 mmHg, frequência cardíaca de 130 bpm, bulhas arrítmicas, sem sopros. Após submeter-se ao eletrocardiograma, é
constatado flutter atrial 2:1. Nesse caso, a conduta indicada é:
A) Anticoagulação plena e desfibrilação.
B) Cardioversão química com amiodarona.
C) Adenosina.
D) Inibidores do nódulo AV, considerando que paciente está estável.
E) A cardioversão elétrica com 100 J.

COMENTÁRIO:
Estrategista, essa questão nos apresenta um caso clínico de um paciente com flutter atrial na emergência. Sendo assim, devemos
abordá-lo com as duas perguntas:
1. O paciente está estável ou instável? Como não encontramos nenhum dos 4 Ds (dispneia, diminuição de consciência,
diminuição da pressão e dor torácica), o paciente é considerado estável.
2. Há possibilidade de haver um trombo intracardíaco? Nesse caso, devemos avaliar três parâmetros: o flutter teve início há
menos de 48 horas? NÃO. O paciente está anticoagulado há 3 semanas? NÃO. Tenho um ecocardiograma transesofágico
que não mostra trombo? NÃO. Sendo assim, não podemos cardioverter a arritmia, como é mostrado no fluxograma
abaixo.
SIM
POSSO CARDIOVERTER!
Início dos sintomas
marcadamente < 48h
Realizar cardioversão química e/ou
ou elétrica e anticoagular
ou
Ecocardiograma Controlar a frequência cardíaca
Paciente transesofágico sem e anticoagular
estável evidências de trombos

ou

Paciente anticoagulado
há pelo menos NÃO POSSO
Fibrilação/Flutter atrial 3 semanas CARDIOVERTER!
NÃO
com FC > 100 BPM
na emergência Controlar a frequência
cardíaca e anticoagular

Paciente instável:
DEVO CARDIOVERTER!
• Diminuição da pressão:
PA< 90/60
• Dor torácica típica Cardioversão
• Diminuição da elétrica imediata
consciência e anticoagulação

• Dispneia

Após essa análise, só nos resta controlar a frequência cardíaca da arritmia e avaliar anticoagular o paciente. Como o paciente só tem 1
ponto no CHA2DS2VASC, a anticoagulação deve ser individualizada. Vamos analisar as alternativas:

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Incorreta a alternativa A, pois o paciente não se enquadra nas situações em que é permitido realizar cardioversão elétrica. Além disso, o
procedimento a ser realizado, caso houvesse indicação de reversão do ritmo, seria a cardioversão elétrica sincronizada, não a desfibrilação.

Incorreta a alternativa B, pois o paciente não apresenta critérios que permitam a cardioversão no momento e no flutter. Apesar de não
ser obrigatória, a preferência seria por cardioversão elétrica, não química.

Incorreta a alternativa C, pois a adenosina é uma droga que bloqueia o nó AV de maneira rápida e fugaz. Como, no flutter atrial, o circuito
que forma a arritmia não envolve o nó AV, a adenosina não consegue reverter essa arritmia. Essa droga é muito útil para reversão de
taquicardias paroxísticas supraventriculares, como podemos verificar no livro “Taquiarritmias”.

Correta a alternativa D, pois, como o paciente se apresenta estável, a conduta a ser tomada nesse momento é controlar a frequência
cardíaca por meio de drogas que inibam o nó AV, como betabloqueadores e bloqueadores de canal de cálcio não diidropiridínicos (diltiazem
e verapamil). Para a alternativa ficar perfeita, deveria incluir a avaliação da anticoagulação.

Incorreta a alternativa E, pois, como já dissemos, o paciente não se enquadra nas situações em que é permitido realizar cardioversão
elétrica. Além disso, quando for optado por esse procedimento, podemos iniciar com cargas mais baixas, 50J.

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CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
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(UFRGS-RS 2016) Paciente de 65 anos, com história de hipertensão arterial sistêmica, chegou à emergência referindo palpitações há 12 horas.
A pressão arterial era de 120 x 80 mmHg. O eletrocardiograma realizado por ocasião da admissão está reproduzido abaixo. Considere as
assertivas propostas sobre a condução do caso.

I – O uso de betabloqueadores está indicado, já que, na maioria dos casos, obtém-se controle da frequência cardíaca em longo prazo com
essa classe de medicamentos;
II – O tratamento inicial deve ser feito com cardioversão sincronizada utilizando-se 50 Joules;
III – A reversão da arritmia pode ser tentada com o uso intravenoso de verapamil (até 10 mg).

Qual (ais) é (são) CORRETA (S)?


A) Apenas I.
B) Apenas II.
C) Apenas III.
D) Apenas I e II.
E) I, II e III.

COMENTÁRIO:
Querido (a) aluno (a), para respondermos a essa questão, é necessário que analisemos primeiramente qual é a arritmia evidenciada no
eletrocardiograma. Após a leitura deste livro, aposto que você já está craque em perceber as ondas “F” em serrote, sendo assim, é um flutter
atrial!
Observemos então as assertivas:
I. O uso de betabloqueadores está indicado, já que, na maioria dos casos, obtém-se controle da frequência cardíaca em longo
prazo com essa classe de medicamentos: falso! Pois o flutter atrial responde mal à terapia medicamentosa, sendo uma
arritmia que deve, preferencialmente, ser tratada com cardioversão elétrica e/ou ablação por cateter. É possível considerar
os betabloqueadores para controle de frequência cardíaca, porém, sabidamente, o controle da doença não será bom.
II. O tratamento inicial deve ser feito com cardioversão sincronizada utilizando-se 50 Joules: verdadeiro! O paciente apresenta
a arritmia há menos de 48 horas, portanto eztá autorizado a realizar cardioversão elétrica, que é uma boa terapia para essa
arritmia. A carga empregada inicialmente é de apenas 50J uma vez que a arritmia tem boa resposta a descargas elétricas.
III. A reversão da arritmia pode ser tentada com o uso intravenoso de verapamil (até 10 mg): falso! O verapamil é um bloqueador
de canal de cálcio não diidropiridínico e pode ser utilizado no flutter para controle de frequência cardíaca, não para reverter
a arritmia em ritmo sinusal.

Sendo assim, apenas a alternativa II está correta.

Gabarito: Correta a alternativa B.

Prof. Juan Demolinari | Curso Extensivo | Setembro 2021 82


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Preparei uma lista exclusiva de questões com os temas dessa aula!


Acesse nosso banco de questões e resolva uma lista elaborada por mim, pensada para a sua aprovação.
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Prof. Juan Demolinari | Curso Extensivo | Setembro 2021 83


CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
MED

CAPÍTULO

10.0 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


1. II Diretrizes Brasileiras de Fibrilação Atrial. Arq Bras Cardiol. 2016; 106(4Supl.2):1-22.
2. 2020 ESC Guidelines for the diagnosis and management of atrial fibrillation developed in collaboration with the European Association for
Cardio-Thoracic Surgery (EACTS). European Heart Journal. 2020; 42: 373-498.
3. 2019 AHA/ACC/HRS Focused Update of the 2014 AHA/ACC/HRS Guideline for the Management of Patients With Atrial Fibrillation.
Circulation. 2019;140:e125–e151.
4. 2017 ACC Expert Consensus Decision Pathway on Management of Bleeding in Patients on Oral Anticoagulants. Journal Of The American
College Of Cardiology. 2017; 70 (24).
5. Friedmann AA et al. Esclarecendo o diagnóstico da taquicardia supraventricular. Diagn Tratamento. 2009; 14(3):120-122. Disponível em:
<http://files.bvs.br/upload/S/1413-9979/2009/v14n3/a010.pdf>. Acesso em: 7 mar. 2021.
6. Veronese P et al. Fibrilação atrial e Flutter atrial. In: Santos ECL, Mastrocolo F Ed (s). Cardiologia CardioPapers. São Paulo, Rio de Janeiro:
Atheneu. 2019; p.03-17.

Prof. Juan Demolinari | Curso Extensivo | Setembro 2021 84


CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
MED

CAPÍTULO

11.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS


A fibrilação atrial é um dos assuntos mais importantes da Cardiologia em provas de Residência e que tem se tornado um importante
problema de saúde pública, associado ao envelhecimento, devido principalmente a sua complicação embólica mais temida: o AVE.
Entre os subtópicos mais importantes e que vale a pena revisitar algumas vezes, devemos destacar os critérios de decisão pela
anticoagulação e para tratamento da arritmia.
Quanto ao flutter, o mais importante é saber reconhecer essa arritmia e suas sutis diferenças quanto à abordagem comparada à da
fibrilação atrial.
Creio que, com o estudo deste livro, você será capaz de responder praticamente a todas as questões desse tema em provas de
Residência. Não deixe de usar nossa lista de questões para aplicar o conhecimento aprendido!
Em caso de dúvida, conte comigo! Utilize o fórum do aluno ou entre em contato pelo meu Instagram (@profjuandemolinari), terei o
maior prazer em respondê-lo!

Até a próxima e bons estudos! A Residência Médica é logo ali!


Juan Demolinari Ferreira.

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CARDIOLOGIA Fibrilação e Flutter Atrial Estratégia
MED

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