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A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO E A FORMAÇÃO DOCENTE: possibilidades e contribuições para


uma prática emancipada e emancipadora1

O debate sobre a História da Educação e a formação docente enquanto possibilidades e


contribuições para uma prática emancipada e emancipadora suscita ponderar que se vive hoje um
momento histórico cujos paradigmas reportam à velocidade da informação e do conhecimento. A
organização política deste momento é chamada de Neoliberalismo e a organização econômica é, segundo
os norte-americanos, a globalização, ou segundo os franceses, a mundialização. Na atualidade, momento
do ápice do fenômeno da globalização, era do império e velocidade do conhecimento, em que as
informações já estão on line desde o momento exato de seu acontecimento, exige-se muito mais de
profissionais que queiram estar aptos a um mercado eclético e de transformações rápidas demais, devido
à demanda do consumo.

De acordo com Saviani (2002), é a própria dinâmica social que, no ápice de suas forças, cria
contradições cujas consequências são novas formas de produção humana. Diante do exposto suscita
questões há muito investigadas por pesquisadores de relevância e que merecem destaque nesse contexto,
tais como: quais as características dessa sociedade? Qual é o impacto das proposições sócio-políticas
neoliberais na organização das políticas públicas sociais? De que forma esse contexto se faz presente no
campo da educação? Que tipo de homem a universidade está a formar. Ou ainda: que tipo de homem
precisa ser formado para viver nessa sociedade?

Nesse contexto social, as relações econômicas são reguladas pelo mercado, em um mundo sem
limites e sem fronteiras, mundo de reestruturações tecnológicas que afetam as formas de produção e as
condições de ação e atuação do Estado, o qual perde suas forças e se apresenta sem condições de impor
autonomia diante das imposições da globalização e seu estado de dominação, o qual é certo que traz
avanços científicos, porém, também traz prejuízos nas áreas sociais, econômicas, educacionais e
humanas para as pessoas que pertencem às classes sociais que não têm real acesso às condições de luta. É
difícil identificar na história da humanidade uma época em que se tenha produzido tanto, e ao mesmo
tempo, é difícil identificar um momento histórico em que o desemprego tenha sido tão grande, com tanta
pobreza e tanta fome.

Há portanto, uma nova (dês)ordem tendo em vista que se abalaram as conotações como a de
tempo e espaço, da geografia e da história, do passado e do presente, da biografia e da memória,
da identidade e alteridade e de Ocidente e Oriente. Mas se o desafio perante os problemas
desconhecidos ou conhecidos, embora modificados, transfigurados, apresenta-se à razão humana,
importa mais uma vez a recomendação já citada de Anderson (1999) e também do próprio Lanni
(1997): o problema é como compreender a realidade agora desenhada, em nível micro, macro e
metateórico. (LOMBARDI, 2001, p.9).

À guisa da situação acima descrita, a trajetória histórico-educacional brasileira nos mostra que
sempre houve um grande “descaso” com a política pública da educação. Compreende-se que

1 Artigo apresentado ao V Congresso Internacional de Filosofia e Educação (CINFE) da Universidade de Caxias do Sul, no
período de 17 a 20 de Maio de 2010.
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historicamente, a educação sempre foi “usada” como instrumento de divulgação de ideais e interesses
dos movimentos históricos. Até o final do século XIX, o pensamento pedagógico brasileiro manteve-se
inspirado no teocentrismo medieval. A partir das influências iluministas deu-se inicio a uma prática
pedagógica laica com o objetivo de difundir o conhecimento científico e de construir uma sociedade
dita “menos desigual”. Com o advento da república, propunha-se com grande força a necessidade
da educação do povo para a “ordem e o progresso”. (Grifos nossos).

Entende-se também que em meio a uma trajetória política que alterna entre períodos ditatoriais e
democráticos, muitas reformas e movimentos importantes contribuíram para a construção da trajetória
histórica da prática pedagógica brasileira, e hoje, o cenário sociopolítico e econômico contemporâneo
que se delineia está a exigir novas ações, novas políticas e necessariamente, um novo olhar sobre a
educação. Consequentemente, identificar os desafios que esta realidade coloca-nos é uma tarefa que está
em aberto; principalmente se considerar que o ideal de uma educação crítica e emancipadora continua a
ser um grande desafio, desafio esse, procurado por uma minoria de professores pesquisadores que se
dedicam a investigar as tramas historicamente produzidas e vivenciadas pelas políticas educacionais.

Salienta-se assim que, na medida em que o mundo se torna um só mercado, as relações pautam-se
pelo lucro e pelo excessivo consumo individual, daí ser pertinente a seguinte indagação: como educar, se
de acordo com o atual entendimento de sociedade, homem e mercado, a própria educação passa a ser
entendida apenas como uma mercadoria, oferecida como qualquer outro produto de consumo no mercado
global? A esse respeito ouvimos Libâneo e Oliveira quando estes afirmam que,

O capitalismo, para manter sua hegemonia, reorganiza suas formas de produção e consumo e
elimina fronteiras comerciais para integrar mundialmente a economia. Trata-se de mudanças para
fortalecer o capitalismo, o que é dizer: fortalecer as nações ricas e colocar os países mais pobres
na dependência, como consumidores. Essas alterações nos rumos do capitalismo, se dão, no
entanto, no momento em que o cenário mundial em todos os aspectos é bastante diversificado. A
onda da globalização e da Revolução Tecnológica encontra os países (centrais ou periféricos,
desenvolvidos ou subdesenvolvidos) em diferentes realidades e desafios, dentre os quais o de
implementar políticas econômicas e sociais que atendam aos interesses hegemônicos, industriais e
comerciais de conglomerados financeiros e de países ou regiões ricas, tais como a América do
Norte, Japão e União Européia. (LIBÂNEO e OLIVEIRA, 1998, p. 599-600, grifos dos autores).

Nesse sentido, esta reflexão está direcionada para a constatação de que a sociedade brasileira está
inserida em um tempo paradoxal, pois, de um lado ela está imersa em um acelerado ritmo de
transformação, e de outro, encontra-se paralisada diante do conhecimento como regulação, o que
significa que, na verdade, o que ela enfoca é o conhecimento como instrumento de emancipação.
Emancipação social e intelectual que pode promover uma mudança nas estruturas pedagógicas que há
muito foram cristalizadas e que dificultam um desenvolvimento real e eficaz do processo pedagógico.

Esse texto resulta de uma pesquisa em andamento cuja intenção é contribuir com os debates sobre
a temática da formação de professores para a Educação Básica, temática esta, presente na realidade
educacional e na pesquisa em História da Educação no Brasil. O tema aqui proposto é “A História da
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Educação e a Formação Docente: possibilidades e contribuições para uma prática emancipada e
emancipadora”. Esclarece-se que, entre as várias situações que provocaram a escolha deste tema de modo
a tornar-lo objeto de estudo, pode-se destacar a observação da ausência da mencionada disciplina na
grade curricular dos cursos de licenciatura na Unimontes. Tal realidade suscitou uma inquietação que se
refere em pensar o quanto o conteúdo de História da Educação é indispensável na formação de futuros
professores. Assim esclarece-se que o envolvimento no contexto do curso de formação de professores da
mencionada universidade detonou problematizações a respeito da importância do ensino da História da
Educação para a formação emancipada do professor. E assim, como sujeitos inseridos no contexto
acadêmico, delimita-se como objeto de estudo, as contribuições da História da Educação na Formação
emancipada dos acadêmicos e futuros docentes.
Nesse contexto indaga-se: “Até que ponto a ausência da disciplina de História da Educação nos
Cursos regulares de Licenciatura da Universidade Estadual de Montes Claros – Unimontes, no período
do 1º (primeiro) mandato do presidente Lula, a saber, 01/01/2003 a 31/12/2006, contribui para a
hegemonia da ideologia dominante vigente na sociedade contemporânea?”.

Diante dessa questão central esclarece-se que a hipótese que fundamenta esta pesquisa está no
fato de que a ausência da disciplina de História da Educação nos supracitados cursos traz em si,
expressivos prejuízos na formação dos profissionais da educação, visto que esta disciplina subsidia o
professor no que se refere ao significado do conhecimento da educação em seu país, em seu espaço de
atuação, no contexto social externo à sala de aula, e também subsidia o entendimento de pertinência da
problematização que com certeza inspira e norteia o trabalho de ensino e pesquisa nessa área.
Problematização esta que se entende como o fato de não poder perder de vista que o projeto político no
qual se inclui o projeto pedagógico destes cursos está articulado com a teoria em termos históricos e
epistemológicos, uma vez que “o saber produzido não é indiferente à história e ao lugar social que
possibilita e mesmo demanda a sua produção, através dos ‘aparelhos’ sociais que oferecem condições
para que este saber seja construído” (Cardoso, citado por Gatti, 2005, p.56. Grifo do autor).

Dessa forma ressalta-se que o objetivo aqui consiste em problematizar a ausência da disciplina
História da Educação nos cursos de formação de professores da Unimontes, ausência esta que contribui
para a hegemonia da ideologia dominante vigente na sociedade contemporânea; discutir sobre a
importância dos conteúdos que compõem a disciplina de História da Educação nos cursos regulares de
licenciatura e investigar as consequências da ausência da disciplina de História da Educação na formação
docente.

Para realizar este estudo optou-se por uma metodologia que está fundamentada nos princípios dos
métodos quantitativo-qualitativo; metodologia esta que se fundamenta em uma lógica histórico-dialética
racional, que justifica o engajamento político do pesquisador em relação ao espaço investigado, bem
como, com o interesse de desvelar os elementos implícitos na constituição do objeto estudado, situação
que se encontra em consonância com o pensamento de Sánchez Gamboa (2007), quando este afirma que,
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As opções são mais complexas e dizem respeito às formas de abordar o objeto, aos objetivos com
relação a este, às maneiras de conceber o sujeito, ou os sujeitos, aos interesses que comandam o
processo cognitivo, às visões de mundo implícitas nesses interesses, às estratégias da pesquisa, ao
tipo de resultados esperados etc. Em outras palavras, fazem referências à complexidade das
alternativas epistemológicas. (GAMBOA, 2007, p. 9)
A metodologia quantitativo-qualitativa é aqui adequada porque proporciona o levantamento de
dados necessários para investigar fatos e fenômenos implícitos e explícitos no objeto estudado, em uma
visão de totalidade, sem ignorar o contexto histórico-político- econômico e social, de forma a conceber
que, a produção científica é inseparável da própria história do homem e de sua produção material. A
pesquisa científica está influenciada pelas condições históricas de sua produção (inter-relações materiais,
culturais, sociais e políticas). (GAMBOA, 2007, p.73), em forma de práxis que de acordo com Kosik,

(...) é na sua essência, a universalidade, é a revelação do segredo do homem como ser


ontocriativo, como ser que cria a realidade (humano-social) e que, portanto, compreende a
realidade (humana e não humana, a realidade na sua totalidade). A práxis do homem não é a
atividade prática contraposta à teoria; é a determinação da existência humana como elaboração da
realidade. A práxis é ativa, é atividade que se produz historicamente, - quer dizer, que se renova
continuamente e se constitui praticamente – unidade do homem e do mundo, da matéria e do
espírito, de sujeito e objeto, do produto e da produtividade. (KOSIK, 1995, p.22).

De acordo com os fundamentos encontrados no pensamento de Kosik (1995), trata-se de um


conjunto de ferramentas técnico-metodológico-críticas, cujo propósito é desenvolver o trabalho dentro de
uma perspectiva política, inserida na realidade pesquisada, de forma a problematizar o conhecimento,
buscando o conflito, a problematização e sua superação através de uma prática social que oportunize a
práxis.
A operacionalização deste trabalho implica um estudo bibliográfico e uma pesquisa de campo que
permitirão levantar dados empíricos que subsidiarão as análises a serem realizadas. A pesquisa de campo
se materializará por meio da indagação de sujeitos que serão entrevistados, sendo estes, todos os
coordenadores dos 14 (quatorze) cursos regulares de licenciatura da Unimontes e também 10% (dez por
cento) dos alunos destes cursos.
Após esta introdução apresenta-se aqui a organização do presente artigo. Primeiro foi realizada
uma breve abordagem sobre a História da Educação e problematizada a ausência desta disciplina nos
currículos dos cursos regulares de formação de professores na Unimontes. Em seguida, descreve-se o
espaço em que se realiza a pesquisa, e por fim, apresentam-se as considerações parciais do trabalho,
trabalho este que se encontra em desenvolvimento.

Adentrar o século XXI é uma boa razão para se fazer uma discussão sobre práticas pedagógicas,
sobre a intenção dessas práticas, sobre Teorias educacionais e princípios epistemológicos que se impõem
nestes novos tempos. Discutir essa temática que se impõe nesse tempo contemporâneo é também discutir
valores e práticas que caracterizam os diferentes momentos da história educacional, história esta que
marca possibilidades e perspectivas para o presente, bem como para um tempo em prospecção.
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A crítica da ideologia educacional contém os germes da mudança. Seu papel não é aceitar por
verdadeiro o status quo. Faz ressurgir o sujeito dentro da educação, restabelecendo a sua
individualidade, e assumindo a sua responsabilidade social. Dessa maneira é possível livrar os
homens da rede de ensino para se reeducarem. Ressaltando a independência, acentua o
compromisso, uma vez que os homens trabalham para viver e o trabalho cada vez mais se acentua
como fortes laços sociais. A condição do filosofo da educação é a de trabalhador na educação.
Vivenciando as vicissitudes da realidade; enquanto tal deve assumir a sua condição para ocupar o
lugar que lhe compete na definição dos objetivos educacionais, unindo a teoria à prática,
contrariamente aos teóricos atuais, os quais legislam em função das classes dominantes. A tarefa
do filósofo da educação revela-se cheia de dificuldades na formação dos homens, dado que a
doutrinação da guerra total, rouba-os do respeito de si mesmos e dos outros, pois a segurança dos
senhores da propriedade inclui a insegurança dos servos na mesma propriedade, insegurança
tornada coletiva pelas dimensões que o trabalho assumiu na atualidade. (BERGO, 1979, P.197).

Ah História...! Ah História da Educação...! São tantas as indagações que permeiam o imaginário


dos pesquisadores! Para que? Por quê? Qual a sua importância? O que se exige hoje, de um historiador?
E da educação? E do historiador da educação? Por que repensar o ensino de/em História da Educação?

Na trajetória histórica de constituição das ciências, distinguem-se claramente os diferentes


momentos do apogeu de cada uma delas. Percebe-se também o momento em que cada uma constrói seu
campo de atuação, quando perdem o poder e a centralidade hegemônica de sua influência, e passam a co-
atuarem nos diferentes espaços sociais. Diante do exposto, que valor tem sido atribuído à História
enquanto ciência frente à hierarquia dada aos diferentes campos do conhecimento? Enquanto servia à
formação, afirmação e reafirmação dos heróis, dos grandes nomes, da acriticidade e da manutenção da
ordem social, a História também era uma ciência de “útil complemento pedagógico oficial” (RUGIU in:
Sanfelice; Saviani; Lombardi, 1999, p.45), mas a partir da perspectiva em que ela deixa de ser usada a
serviço da manutenção da ordem social, deixa de exaltar e priorizar fragmentadamente os tempos
históricos, os grupos de poder, os fatos isolados ou heróis, ela deixa de ser uma ciência socialmente útil.
Afinal, que interesses impulsiona a História a assumir um papel de menor relevância no que se refere ao
entendimento dos acontecimentos como processo de construção histórica do presente e também dos
tempos que virão?

Conforme supracitado, Bergo (1979, P.197), afirma que “a crítica da ideologia educacional
contém os germes da mudança”. O desvelar dos valores encobertos pelos interesses da ideologia
dominante requer a pesquisa histórica, e a pesquisa histórica requer uma fundamentação epistemológica
sólida, crítica, que denota o conhecimento da História e da educação dentro dos diferentes paradigmas
dos diferentes momentos históricos. A História e a História da Educação, se criticamente enfocadas,
podem se constituir instrumentos de superação na formação dos homens de modo a situá-los
significativamente na construção do conhecimento numa perspectiva histórica.

A História da Educação surge nas escolas normais e nos cursos de formação de professores, como
disciplina, no final do século XIX. As primeiras publicações de obras nessa área datam de 1880. A
História da Educação no Brasil está associada à Escola Normal (1928) e somente a partir de 1940,
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quando passou a compor o currículo dos cursos de formação de professores no curso de Pedagogia nas
Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras, passou a ampliar seus estudos.
Segundo Manacorda (2006), estudar a História da Educação permite analisar o processo educativo
e escolar através do qual o homem elabora a si mesmo. A História da Educação oferece fundamentos que
permitem problematizar os objetivos da educação nos diferentes momentos históricos, e entender como
foi concebida a relação entre estes objetivos e a realidade educativa, bem como suas contradições.
Ainda que diante de criteriosas defesas em prol da História da Educação, percebe-se que ela está
sempre submetida a estratégias políticas com o objetivo de negar aos profissionais da educação em
formação, os elementos necessários a uma boa fundamentação crítica e política. Essa concepção ainda se
faz presente na prática dos profissionais que, consciente ou inconscientemente, fundamentam ou
alicerçam suas ações nos princípios do positivismo.
A História da Educação pode possibilitar ao educador uma visão mais ampla e mais crítica do
fenômeno educacional, pois permite que os problemas educativos sejam abordados de modo a tornar
mais transparente a distância entre o desenvolvimento da sociedade e o desenvolvimento da classe social
dominante. Possibilita também uma reflexão dos saberes educativos de modo que estes conhecimentos
fundamentem decisões que objetivam ultrapassar o estado acrítico imposto pela ideologia das classes
dominantes que estão à frente nesta organização política de cunho neoliberal.
Qual o valor que vem sendo atribuído à História da Educação enquanto ciência, frente à
hierarquia dada aos diferentes campos do conhecimento? Esta é mais uma inquietação que faz parte do
ideário do pesquisador da História da Educação.
Naturalmente, a história da educação não pode e não deve ser a declinação histórica da disciplina
pedagógica presente. No enfoque histórico, as temáticas se configuram diversamente em relação
ao objeto, as finalidades de conhecimento são diferentes bem como são diferentes os métodos de
pesquisa e os procedimentos. O ponto decisivo permanece aquele das categorias e das relações
com as quais a temática é descrita e interpretada. Assim, em cada pesquisa histórica, aquilo que é
relevante e explicativo não é a descrição de um campo ou de um tema, não é a enumeração dos
fatores históricos, mas, preferivelmente, as suas relações quantitativas, qualitativas e dinâmicas
com o objeto (que, justamente, é assim descrito e explicado na sua relevância e dinâmica).
(SANFELICE; SAVIANI; LOMBARDI, 1999, p.23-24).
(...)
Por isso (...) – a utilidade e importância da história da educação – entendida no seu sentido geral –
na formação de professores serão tanto maiores quanto mais ela for histórica e quanto menos ela
for intencionalmente pedagógica para fins de conformação ideológica. Se a idéia de ensino é uma
idéia elevada, que, ao lado de competências operativas de primeiro nível, prevê a presença de
segundo nível, de projeção e controle da própria atividade específica, não se pode não prever
também capacidades – de terceiro nível – de análise crítica e de orientação do próprio agir escolar
e do próprio papel social. Então, o conhecimento e a consciência histórica também dos processos
educativos vêm a ser um dos pressupostos da contextualização e problematização seja dos
fenômenos educativos, seja do papel e da condição profissional. Caso contrário, sem assumir uma
relação regulada pela práxis que, no interior das condições históricas e de contexto, identifique os
âmbitos e as possibilidades de intervenção do docente em relação aos processos fora do seu
alcance (os quais são poderosos e insinuantes e não devem ser ignorados e, de qualquer forma,
soa aqueles com respeito aos quais a sua atividade tem sentido), a fadiga de Sisifo do professor se
torna ou fonte de frustração ou motivo de sublimação ideológica. Mas, para isso, é necessário,
seja uma historiografia da problematicidade da educação, seja uma concepção de
profissionalização educativa igualmente problemática, seja, enfim, justamente, um uso da
historiografia que contribua tanto mais eficazmente para a formação de educadores, quanto menos
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voltados estiverem para a sua profissionalização. (SANFELICE; SAVIANI; LOMBARDI, 1999,
p.28).

Estudar e escrever a História da Educação significa atuar, investigar e instigar a potencialidade do


homem a partir do que se é enquanto homem, enquanto seres sociais; significa entender a História da
Educação como uma construção que tem em si a condição de incitar o exercício do pensamento, a
condição de optar, de tomar decisão sobre as diversas demandas do tempo presente. A História da
Educação como uma das ciências da educação, pode possibilitar uma atitude crítica e reflexiva em
condições de contribuir com a formação cultural e com o desvelamento da identidade social, e ao mesmo
tempo, ampliar as possibilidades, a intenção e consequentemente, as escolhas. A História da Educação
como uma das ciências da educação, revela que a educação é uma construção social, e esse fato renova o
sentido da ação cotidiana e da prática de cada educador.

Pressupõe-se que os cursos que contam em sua grade curricular com esta disciplina têm uma
fundamentação maior e mais sólida para discutir os diferentes momentos históricos e a organização e
intenção da educação em seu contexto. A partir daí, a percepção e o conhecimento dos desafios que a
realidade social nos impõe como profissional que questiona, problematiza, que procura possibilidades; e
que nessa procura, depara-se com as contradições postas pelas políticas que influenciam na vivência do
dia a dia.

Mediante a situação aqui descrita, parte-se do pressuposto de que a disciplina de História da


Educação presente na organização curricular dos cursos de licenciatura oferece suporte qualitativo-
reflexivo na formação docente, de forma a proporcionar uma real participação e interação a partir de um
caráter consciente e reflexivo, na elaboração, organização e atualização dos instrumentos de
democratização da escola, além de oportunizar uma prática pedagógica fundamentada na práxis. A
fundamentação desse pressuposto está no fato de que a contribuição da História da Educação “é uma
contribuição importante para dar carne e sangue às representações e às explicações históricas de eventos
e estruturas”, (Sanfelice; Saviani; Lombardi, 1999, p.35), de forma que este conhecimento embase
epistemologicamente as ações e proposições docentes de modo a construir uma escola e uma educação
escolar que prepare e forme o sujeito histórico, em condições de inferir, interferir e transformar a
realidade em que vive.

Uma das formas pelas quais a universidade pode desenvolver bem o ensino e a pesquisa é através
da formação de profissionais aptos a exercerem papeis especializados em diferentes áreas do
conhecimento. Tal formação deve caracterizar-se como a preparação de sujeitos pensantes, que
buscam continuamente novos caminhos. Portanto, a universidade, alem de ser uma instância de
produção de conhecimento, de cultura e de tecnologia, é também a instituição onde se devem
formar pessoas, cidadãos e profissionais. No caso de uma universidade pública, mais que habilitar
estudantes para atuar como profissionais no mercado de trabalho, ela deve formá-los para influir
sobre a realidade onde vão atuar numa perspectiva de mudança, a partir de uma visão crítica da
realidade. (FÁVERO, 1999, p. 252)
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A teorização a respeito de Universidade nos faz entender que a Universidade Estadual de Montes
Claros – Unimontes tem como missão se constituir o locus adequado para se conceber idéias que
intencionam a construção de um futuro melhor, mais humano, de forma que, segundo Saviani (1991, p.
34), possa conduzir as pessoas a um raciocínio coerente, crítico, elevando “as camadas populares do
nível do senso comum à consciência filosófica”, uma vez que aqui, os profissionais universitários e o
conhecimento universitário estão a serviço da comunidade.
A Unimontes é a única Universidade Pública Estadual nesta imensa região do Norte de Minas.
Está localizada no município de Montes Claros, cidade-pólo da região. Considerando o seu grande
desenvolvimento e evolução, a Unimontes abrange hoje as regiões norte e noroeste do Estado, Vale do
Jequitinhonha e do Mucuri, com influência até no sul da Bahia. As condições socioeconômicas
preponderantes nas regiões de seu campo de atuação, levando em consideração o fato de ser uma
Instituição Pública, que pelas suas intenções, ações e princípios se propõe a ser um instrumento capaz de
interferir na transformação da realidade, justificam a importância e o significado do papel que esta
desempenha em seu contexto de atuação.
Tendo em vista o atendimento às diretrizes do Programa de Interiorização e Desenvolvimento do
Ensino Superior a Unimontes ministra cursos modulares nos campi que se localizam fora de seu
Campus-sede e também, solicitou credenciamento para oferta de Educação a Distância, concedido
através da Portaria MEC nº 1.065 de 25 de maio de 2006.
Obtido o credenciamento Ela implantou em 2008, em parceria com o Ministério da EducaçãoMEC,
através do Sistema Universidade Aberta do Brasil e do Programa Pró-Licenciatura, os cursos de Artes
Visuais, Artes Teatro, Ciências Biológicas, Ciências Sociais, Geografia, História, Letras-Espanhol,
Letras-Inglês, Letras-Português e Pedagogia. Nos cursos de graduação da Unimontes, na sede e nos
campi, nos núcleos e nos pólos, o contingente de discentes é hoje constituído por, aproximadamente,
11.200 alunos.
A Unimontes resultou da transformação da Fundação Norte Mineira de Ensino Superior – FUNM,
criada curiosamente em 1962, momento do auge da crise acadêmica de 1962 na Europa. Em 1990,
década do auge das políticas públicas de municipalização na Educação Básica, é instituída a
Universidade Estadual de Montes Claros – Unimontes. Em 1994 houve na Unimontes uma reorganização
do ponto de vista administrativo através da Lei Estadual nº. 11.517, de 13/07/94, onde foram extintas as
Faculdades e criados os Centros de Ensino (Centro de Ciências Humanas – CCH, Centro de Ciências
Biológicas e da Saúde – CCBS, Centro de Ciências Sociais Aplicadas – CCSA, Centro de Ciências
Exatas e Tecnológicas – CCET e Centro de Ensino Médio e Fundamental – CEMF). O locus do trabalho
que ora se apresenta, o campo de pesquisa, é este: os cursos regulares de licenciatura da Universidade
Estadual de Montes Claros – Unimontes, campus de Montes Claros.
A título de desfecho parcial uma vez que a pesquisa encontra-se em processo, e uma vez
apresentado o espaço em que a pesquisa vem sendo desenvolvida, é importante apresentar as
considerações parciais obtidas até então. Entre os 15 (quinze) cursos regulares de licenciatura
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ministrados pela Unimontes, a saber, Ciências Biológicas, Ciências da Religião, Educação Física,
Matemática, Artes Visuais, Artes Música e Teatro, Filosofia, Geografia, História, Letras Espanhol, Letras
Inglês, Letras Português, Química e Pedagogia, constatou-se que apenas 04 (quatro) deles, 26,66%,
trazem em seu quadro curricular a disciplina de História da Educação. Os cursos que contam com a
supracitada disciplina são: Artes Música e Artes Visuais com 36 (trinta e seis) h/a cada, História com 60
(sessenta) h/a já no 8º período e Pedagogia com 72 (setenta e duas) h/a já no 1º (primeiro) período.
Como os dados aqui apresentados ainda se constituem um resultado parcial, uma vez que a coleta
de dados ainda não foi concluída para que eles pudessem ser sistematicamente analisados, apresenta-se,
portanto, apenas as hipóteses e os pressupostos que embasam a pesquisa.

(...) o debate está instalado e tem consequências da maior importância para a pesquisa
educacional. (...) as dificuldades teóricas dos historiadores (...) manifestamse também, e até
mesmo poder-se-ia esperar que fosse em grau ainda maior, no caso de educadores. (SAVIANI;
LOMBARDI; SANFELICE, 1998, p. 11-12).

Até a presente data, ainda em conversa informal com alguns professores da Instituição e destes
cursos regulares de licenciatura, pode-se perceber dificuldades na prática dos professores que ministram
as disciplinas de História da Educação, Didática, Estrutura e Funcionamento da Educação Básica,
Organização Escolar e Educação e Sociedade. Disciplinas estas de cunho político, que requerem do aluno
uma maior condição de reflexão e análise de contexto sócio-histórico à luz dos paradigmas sociais
contemporâneos. Pode-se perceber também, ainda que informalmente, que o aluno cujo curso de
formação tem a disciplina de História da Educação, apresenta um maior entendimento das relações que
se estabelecem entre a escola e a sociedade, a partir dos paradigmas sociais atuais.
Também em caráter ainda informal, percebe-se no exercício profissional de pedagogo, nas escolas
de Educação Básica, que os professores cujos cursos apresentam a disciplina de História da Educação em
sua grade curricular, têm maior interesse e maior facilidade em participar das reuniões pedagógicas.
Também se evolvem com mais prazer, espontaneidade e atuação na discussão e/ou atualização dos
instrumentos de democratização da escola, como por exemplo, o Projeto Político Pedagógico e o
Regimento Escolar.
Em síntese, a ausência da disciplina de História da Educação dos currículos dos cursos regulares
de Licenciatura na Unimontes acarreta uma lacuna na formação dos professores. Esta possibilidade vem
sendo até então apontada no levantamento de dados do trabalho que ainda está no início de seu
desenvolvimento formal.

Estas considerações parciais ainda estão fundamentadas no senso comum, ou seja, nos
conhecimentos anteriores à constatação que só advirá com a conclusão do trabalho de pesquisa.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
10
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SCHAFF, Adam. História e verdade. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1995.

SILVEIRA RODRIGUES, R Teoria Critica da Didática: contraposições epistemológicas


possibilidades políticas e tendências atuais. Tese de doutorado – Campinas: UNICAMP, 2006.

i
ISLEI GONÇALVES RABELO (isleirabelo@ig.com.br ou isleirabelo@hotmail.com) é pedagoga pela Universidade
Estadual de Montes Claros – Unimontes (www.unimontes.br). É Especialista em Metodologia do Ensino Superior e
Metodologia Científica e Epistemologia da Pesquisa pela Unimontes. Atualmente é Professora de Ensino Superior do
Departamento de Educação do Centro de Ciências Humanas da Universidade Estadual de Montes Claros Unimontes,
membro do Comitê Departamental de Pesquisa, pesquisadora do GEPEDS na linha de pesquisa “Políticas públicas e
inclusão social” e Coordenadora do Campus Avançado da Unimontes em Brasília de Minas. Já atuou como Professora de
Língua Estrangeira (Francês) para o Ensino Fundamental e Médio; Professora das Matérias Pedagógicas do Magistério de
11
1º grau no Ensino Médio; Diretora D3A; Supervisora Pedagógica; Secretária Municipal de Educação; Coordenadora do
Programa Um salto para o futuro e professora e Articuladora da Prática no Curso de Complementação para Obtenção de
Novo Título em Pedagogia pelo Instituto Superior de Educação – Unimontes.

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ROSÂNGELA SILVEIRA RODRIGUES (rosangesr@gmail.com). Doutorado em Educação, área História e
Filosofia da Educação pela UNICAMP (2006) e Mestrado em Educação: Docência do Ensino Superior pela
PUC-CAMPINAS (1998). Graduada em Pedagogia pela UNIMONTES. Professora adjunta UNIMONTES
(www.unimontes.br) e pesquisadora do GEHS – Grupo de Estudo e Pesquisa em História, Educação e Sociedade com pesquisa
em andamento financiada pela FAPEMIG e CNPQ na área da História da Educação no Brasil, cujo titulo é Cultura e
propagação dos modelos de professor entre a Europa e Brasil: a influência das teorias pedagógicas de Pestalozzi, Froebel e
Herbat na segunda metade do século XIX. Autora do livro: A Didática na formação dos educadores: uma articulação dialética.

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