Você está na página 1de 4

Glicopeptídios

Vancomicina e teicoplanina são os representantes. Juntamente com estreptograminas, oxazolidinonas e lipopeptídios,


constituem-se em antimicrobianos primariamente utilizados em infecções por Staphylococcus aureus e S.
epidermidis meticilinorresistente (MRSA). Vancomicina permanece como agente de escolha. Representantes de outros
grupos devem ter atividade no mínimo equivalente para constituírem alternativas. Vancomicina e teicoplanina são
antibióticos com estrutura glicopeptídica complexa de alto peso molecular. Vancomicina foi obtida do Streptomyces
orientalis em 1956, passando a ter emprego difundido para tratar infecções por estafilococos resistentes à penicilina G. À
época, era reconhecida como antimicrobiano de difícil emprego, pois produzia muitos efeitos adversos. Caiu em total
desuso com a descoberta das penicilinas do grupo meticilina, resistentes à penicilinase. Com o desenvolvimento de
resistência estafilocócica a meticilina e congêneres, verificou-se que somente vancomicina tinha atividade sobre muitas
dessas cepas. Purificação mais adequada determinou redução na incidência dos efeitos adversos. Teicoplanina, de
eficácia similar, mas com maior meia-vida, pode ser infundida de maneira mais rápida ou usada por via intramuscular,
alternativa para pacientes ambulatoriais com infecções por MRSA.

Quadro 17.24 ■ Principais interações medicamentosas de metronidazol.

Fármacos Mecanismo Efeito observado

Fenobarbital, Indução da biotransformação de Redução das concentrações séricas de


rifampicina, metronidazol metronidazol
prednisona

Fenitoína Inibição da biotransformação de fenitoína Aumento das concentrações séricas de


fenitoína

Anticoagulantes Inibição do metabolismo hepático Aumento do efeito de anticoagulantes


orais

Lítio Inibição da excreção renal Aumento das concentrações de lítio

Cimetidina Inibição do metabolismo de metronidazol Concentrações tóxicas de metronidazol

Álcool Inibição da metabolização completa do Efeito similar ao de dissulfiram


álcool

Amiodarona Inibição da biotransformação de Indução de torsade de pointes


amiodarona

Vancomicina e teicoplanina inibem a síntese de parede bacteriana, bloqueando a polimerização de peptidoglicanos


em sítio diverso daquele dos betalactâmicos. Postula-se que também influenciem a síntese proteica bacteriana e alterem o
protoplasma bacteriano. Têm ação bactericida. Entende-se que a multiplicidade de mecanismos de ação explique o baixo
desenvolvimento de resistência aos glicopeptídios.
■ Espectro antimicrobiano
Vancomicina e teicoplanina têm espectro que inclui a maior parte das bactérias gram-positivas. Não têm utilidade em
infecções causadas por bactérias gram-negativas ou anaeróbios. Pela eficácia ímpar, seu uso está restrito a infecções
por Staphylococcus aureus e S. epidermidis meticilinorresistente (MRSA) e enterocolite por Clostridium difficile.
Constituem segunda escolha em endocardite por Enterococcus faecalis e S. viridans (quando são usadas em associação
com aminoglicosídeo), endocardite em prótese valvar e infecção por bacilo diftérico em imunocomprometidos.
Dependendo da prevalência local de S. pneumoniae resistente à penicilina, glicopeptídios são associados a cefalosporinas
no tratamento empírico de meningites. Pacientes com história de anafilaxia a betalactâmicos e necessidade de tratamento
para infecções graves por S. aureus coagulase-positivo e endocardite por S. viridans e S. bovis podem receber
vancomicina.
A eficácia de vancomicina in vitro contra Staphylococcus aureus e S. epidermidis era constante e se dava em baixas
concentrações (1 a 5 mg/ℓ) até há alguns anos. A resistência ao tratamento era restrita ao desenvolvimento de biofilmes,
que necessitavam de remoção cirúrgica para haver eficácia clínica. No final dos anos 1980, desenvolveram-se cepas de
enterococos resistentes à vancomicina (vancomycin resistant enterococci – VRE) que, no correr da década seguinte, se
difundiram amplamente pelo mundo, chegando a 15% dos isolados clínicos. Isso gerou grande preocupação de que tais
cepas transferissem a resistência por plasmídeos ao estafilococo. Contudo, os primeiros isolados de resistência
intermediária à vancomicina (vancomycin intermediate Staphylococcus aureus – VISA), descritos no Japão em 1996,
surgiram em decorrência do espessamento da parede celular, cujos dipeptídios se ligavam à vancomicina e diminuíam sua
concentração no sítio de ação. Desde lá, diversos casos têm sido descritos, em geral em pacientes com histórico de diálise
recente, bacteriemia por MRSA relacionada a infecções por cateteres e exposições prolongadas à vancomicina nos
últimos 6 meses. Em 2002, surgiram os primeiros isolados de Staphylococcus resistentes à vancomicina, mediados pelo
gene vanA transferido por plasmídeos de Enterococci. Atualmente se definem como sensíveis os isolados responsivos a
MIC de vancomicina inferiores ou iguais a 2 µg/mℓ; são intermediários os que apresentam MIC entre 4 e 8 µg/mℓ, e
resistentes aqueles com MIC igual ou superior a 16 µg/mℓ.
E. faecium resistentes à vancomicina normalmente também o são a betalactâmicos e aminoglicosídeos. Já E.
faecalis resistentes à vancomicina são frequentemente sensíveis a betalactâmicos. Antibióticos como linezolida,
daptomicina e tigeciclina têm atividade para E. faecalis e E. faecium resistentes à vancomicina, enquanto quinupristina-
dalfopristina tem atividade apenas contra E. faecium. Todavia, a melhor alternativa para tratamento de VRE com
resistência a betalactâmicos ainda é incerta.
Rifampicina e gentamicina têm ação sinérgica com vancomicina. Há preferência pela associação com a primeira em
infecções por S. aureus e S. epidermidis que não respondem à vancomicina isoladamente. Gentamicina é em geral
associada à vancomicina no tratamento de infecções por enterococos em pacientes alérgicos a betalactâmicos. A
associação é bactericida, enquanto vancomicina é bacteriostática para enterococos.
Teicoplanina não supera vancomicina em eficácia, mas tem maior comodidade posológica e menor incidência de
efeitos adversos. Todavia, vancomicina permanece como agente padrão do grupo.

■ Prescrição
Vancomicina é pobremente absorvida no intestino. Ao ser administrada por via oral, altas concentrações são encontradas
nas fezes, pelo que é utilizada no tratamento de enterocolite estafilocócica ou por Clostridium difficile. Em geral
administrada por via intravenosa, deve ser diluída em solução glicosada e infundida a velocidade que não exceda 500 mg
em 30 min. Isso evita risco de tromboflebite e reação sistêmica, caracterizada por prurido, ruborização, taquicardia e
hipotensão. Após administração intravenosa, níveis terapêuticos são alcançados em soro, líquidos sinovial, ascítico,
pericárdico e pleural, mas não em bile e tecido ocular. Penetra de forma variável a barreira hematoencefálica em casos de
meninge inflamada, mas se recomenda suplementação intratecal se não houver boa resposta clínica, porque as
concentrações liquóricas não podem ser garantidas. A via intramuscular não é recomendada por causar muita dor no sítio
da injeção. A transposição de vancomicina do soro para o líquido de diálise é variável e imprevisível. Recomenda-se a via
intraperitoneal para tratamento de peritonites causadas por MRSA em pacientes em diálise peritoneal crônica
intermitente. A meia-vida em indivíduos com função renal normal é de 5 a 11 h. Sua depuração é diretamente
proporcional à depuração da creatinina endógena, devendo-se aumentar intervalos entre doses em presença de
insuficiência renal (Quadro 17.25). Em pacientes com anúria, a meia-vida se prolonga por 7 a 12 dias. Não é dialisável.
Monitoramento de níveis séricos é controverso, e não está demonstrado que seu uso se correlacione com melhora de
desfechos relevantes. A eficácia de vancomicina é proporcional ao tempo em que a concentração do medicamento
permanece acima da concentração inibitória mínima da bactéria. Desta forma, quando monitoradas, as concentrações de
vale são mais importantes que as concentrações de pico. Pacientes com infecções invasivas, com alteração de
funçãorenal, em diálise, com instabilidade hemodinâmica ou em uso de outros medicamentos nefrotóxicos são os com
maior indicação de monitoramento da concentração. A concentração de vale almejada é de 15 a 20 µg/mℓ e, uma vez
alcançada, controles semanais são suficientes.

Quadro 17.25 ■ Nomograma para esquema de administração intravenosa de vancomicina em relação à função renal.

Depuração da creatinina endógena (mℓ/min) Intervalo de dose (h)

Superior a 80 A cada 12

65 a 80 A cada 12 a 18

50 a 64 A cada 24

35 a 49 A cada 24 a 36

21 a 34 A cada 48

Teiclopanina tem meia-vida longa (mais de 100 h), podendo ser administrada por vias intramuscular e intravenosa, 1
vez/dia. Não apresenta absorção oral adequada. Elimina-se primariamente pelo rim. Em pacientes funcionalmente
anéfricos, deve ser administrada semanalmente e ter sua dosagem monitorada. A dose de ataque recomendada é de 6
mg/kg, seguida de doses diárias de 3 mg/kg, eficazes no tratamento de infecções de média gravidade causadas por
MRSA. Doses maiores provavelmente sejam necessárias para tratar infecções graves.

■ Efeitos adversos e interações


Efeitos adversos mais comuns de vancomicina são febre, calafrio e flebite no sítio de infusão. Flebite pode ser
minimizada com a diluição do fármaco em 100 a 200 mℓ de solução glicosada 5% ou solução fisiológica. Administração
intravenosa rápida pode desencadear reação eritematosa, com prurido e hipotensão, acometendo face, pescoço e tronco,
denominada de síndrome do homem do pescoço vermelho, provavelmente intermediada por liberação de histamina.
Também pode causar dor e espasmos musculares em dorso e face anterior do tórax, assim como manifestações cutâneas
de hipersensibilidade (rash em 5% dos pacientes). Ototoxicidade e nefrotoxicidade são atualmente raras, pois dependiam
predominantemente de impurezas das preparações iniciais. Atualmente se associam a altos níveis plasmáticos ou
administração conjunta de aminoglicosídeos, sendo reversíveis as manifestações renais e menos reversível a
ototoxicidade. Alterações hematológicas (neutropenia, agranulocitose) reversíveis têm-se associado a uso prolongado.
Teiclopanina é bem tolerada, não produzindo a síndrome do homem do pescoço vermelho. Casos de ototoxicidade
têm sido descritos.
Interações de vancomicina se restringem a incompatibilidade com corticosteroides, cloranfenicol e heparina.

Você também pode gostar