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DESCRIÇÃO

Personalidade jurídica internacional e o Estado como sujeito de Direito Internacional.

PROPÓSITO
Compreender os aspectos-chave da personalidade jurídica internacional e seu conceito, os
quais são importantes para construção do conhecimento relativo à formação das relações
jurídicas no plano internacional, o que auxiliará na aplicação do direito internacional público à
realidade.

PREPARAÇÃO
Antes de iniciar o estudo deste conteúdo, tenha em mãos um Vade Mecum, que contém a
legislação de Direito Internacional e de direitos humanos.
OBJETIVOS

MÓDULO 1

Compreender a personalidade jurídica internacional e os elementos formadores do Estado

MÓDULO 2

Identificar as formas de reconhecimento de Estados e de governo

MÓDULO 3

Reconhecer os elementos da responsabilidade internacional do Estado

MÓDULO 4

Analisar o sistema internacional de proteção dos direitos humanos

INTRODUÇÃO
São perguntas de importância fundamental para o Direito Internacional:

Quem são os sujeitos do Direito Internacional público? É possível falar em personalidade


jurídica internacional?

Para responder a essas perguntas, é preciso estudar a formação e o reconhecimento dos


Estados, assim como os aspectos fundamentais de suas personalidades. Ademais, é preciso
verificar quando os Estados responderão por seus atos e quais os sistemas de proteção aos
direitos humanos.

MÓDULO 1

 Compreender a personalidade jurídica internacional e os elementos formadores do


Estado

PERSONALIDADE JURÍDICA
INTERNACIONAL
O que é personalidade jurídica internacional?

O conceito consta na jurisprudência da Corte Internacional de Justiça (CIJ), mais


especificamente no Parecer Consultivo de 1949, proferido no ilustre caso Bernadotte.

Primeiro, cabe frisar que é possível levar à CIJ tanto casos contenciosos (Disputas entre
Estados, por exemplo.) quanto consultivos. No caso Bernadotte, a CIJ entendeu que a
Organização das Nações Unidas (ONU) teria personalidade jurídica própria para tutelar direitos
de seus funcionários. Para chegar a tal conclusão, a CIJ precisou responder a uma pergunta
precedente:

A ONU tem personalidade jurídica internacional?

A ausência de posicionamento expresso sobre o tema provocava questionamentos se tais


entidades seriam sujeitos de Direito Internacional. Diante disso, a Assembleia Geral da ONU
acionou a CIJ para dirimir a questão. O caso concreto envolvia um diplomata sueco – Conde
Bernadotte, por isso o nome do precedente. Em 1948, a ONU envia, a seu serviço, o diplomata
sueco Conde Bernadotte como seu mediador na Palestina. Ele foi assassinado no exercício de
suas funções. Diante disso, a ONU, em defesa de seu funcionário, para buscar a reparação
devida, precisava ter claramente o limite de sua personalidade internacional.
Foto: Shutterstock.com

O parecer da CIJ resolve a discussão ao reconhecer a personalidade jurídica da ONU, na


qualidade de organização internacional, ao entender que esta não poderia cumprir suas
finalidades e sua missão caso fosse desprovida de personalidade jurídica. Com relação aos
Estados, são considerados pessoas jurídicas internacionais por excelência, pois representam a
coletividade no plano jurídico internacional.

No referido parecer que constitui a decisão da CIJ, conceitua-se a personalidade jurídica


internacional a partir de quem pode exercê-la. Para a CIJ, quem detém personalidade jurídica
internacional:

É A ENTIDADE QUE TEM CAPACIDADE DE SER


TITULAR DE DIREITOS E DEVERES INTERNACIONAIS,
E A CAPACIDADE DE FAZER PREVALECER ESTES
DIREITOS POR MEIO DE RECLAMAÇÃO
INTERNACIONAL.
(MELLO, 1993, p. 100)

Em Direito Internacional, a personalidade é um reflexo da capacidade de Direito acrescida da


capacidade de fato. A definição anterior demonstra exatamente esta ideia: é a capacidade de
ser titular de direitos e deveres (ser titular de direitos) e a capacidade de exercer esses
mesmos direitos por meio de reclamação internacional. O conceito de personalidade jurídica é
dinâmico e tem caráter histórico: os sujeitos de direito não são sempre os mesmos e
podem variar a depender do contexto considerado (MELLO, 1993).

ESTADO: FORMAÇÃO, EXTINÇÃO E SUCESSÃO

A principal entidade dotada de personalidade jurídica internacional é o Estado. É comum


também ser utilizada a expressão “coletividades estatais” porque existem casos em que todos
os elementos estão presentes, mas as entidades não são necessariamente Estados.

Tradicionalmente, entende-se que os elementos necessários para a constituição de um


Estado são:

TERRITÓRIO

POVO

GOVERNO

Algumas vezes se inclui um quarto elemento, a soberania, que aparece como um grau de
governo.

O conceito de Estado envolve os seguintes elementos (MAZZUOLI, 2019, p. 654):

é um ente jurídico, dotado de personalidade jurídica internacional;


é formado por indivíduos organizados em determinado território;

está sob autoridade de um governo independente;

sua finalidade de atuação é tutelar aqueles que o habitam.

O conceito, na prática, comporta exceções. Existem casos peculiares:

TAIWAN
Taiwan, por exemplo, detém todos os elementos — território, povo e governo —, porém não é
reconhecida internacionalmente como um Estado. À época da fuga de Mao Tse Tung para
Taiwan, esta se declarava a verdadeira representante da China. Tanto foi assim que, por
muito tempo, Taiwan representava a China no Conselho de Segurança da ONU.
Posteriormente, com o reconhecimento dos Estados Unidos da América (EUA) de que a China
continental seria a verdadeira representante da China, Taiwan passou a se autoafirmar um
Estado independente. Ficou estabelecido que os acordos que os EUA estabelecem com
Taiwan serão contratos, mas serão assemelhados a tratados, por uma legislação de
Direito interno. Por meio de legislação interna, EUA e Taiwan conseguiram assemelhar as
suas relações às relações internacionais, mas isso não é normatizado pelo Direito Internacional
e, portanto, não está inserido no seu âmbito. Porém, Taiwan não possui tal reconhecimento por
parte dos outros Estados.

PALESTINA
Outro exemplo é a “Autoridade Palestina”. Tem povo, território e governo, inclusive tem
direito de voto na assembleia geral da ONU, mas não é um Estado.

ELEMENTOS DO ESTADO

Basicamente, podemos distinguir três elementos do Estado:

• TERRITÓRIO
Trata-se do âmbito de validade espacial do exercício da soberania. As fronteiras (O início e o
fim do território.) são delimitadas pelo Direito Internacional, notadamente por meio de
tratados internacionais. É também o elemento material do conceito, sendo a base física do
Estado, em que ele exerce a sua soberania (MAZZUOLI, 2019).

Quanto ao âmbito de validade material, os Estados podem legislar, em seu território, sobre as
matérias de domínio reservado. Em outras palavras, os Estados podem legislar sobre temas
que não tenham sido tratados pelo Direito Internacional. Portanto, o domínio reservado é um
conceito dado por exclusão, abrangendo toda e qualquer matéria que não tenha sido objeto do
Direito Internacional. O domínio reservado encontra previsão no item 7 do art. 2º da Carta da
ONU.

Foto: Shutterstock.com

Sobre o âmbito de validade temporal, trata-se do princípio da efetividade, ou seja, existindo um


Estado de fato, há um Estado de Direito.

• POVO

Trata-se dos nacionais de um país. O Estado, no entanto, não possui ampla liberdade para
conceder nacionalidade a quem desejar, tendo em vista que o Direito Internacional apresenta
duas limitações:

uso de critérios jus solis e/ou jus sanguinis; e


necessidade de vínculo efetivo entre a pessoa e o Estado.

Definição importante é a do ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Francisco Rezek,


que vai tratar do povo como a dimensão pessoal do Estado, lembrando que povo e população
não são conceitos sinônimos. Por povo, entende o autor que este corresponde à:

JUS SOLIS

Direito de solo: indica um princípio pelo qual uma nacionalidade pode ser atribuída a um
indivíduo de acordo com seu lugar de nascimento.

JUS SANGUINIS

Direito de sangue: indica um princípio pelo qual uma nacionalidade pode ser atribuída a
um indivíduo de acordo com sua ascendência e origem étnica.

COMUNIDADE NACIONAL, OU SEJA, O CONJUNTO DE


SEUS NACIONAIS, INCLUINDO AQUELES,
MINORITÁRIOS, QUE SE TENHAM ESTABELECIDO NO
EXTERIOR. SOBRE OS ESTRANGEIROS RESIDENTES
O ESTADO EXERCE INÚMERAS COMPETÊNCIAS
INERENTES À SUA JURISDIÇÃO TERRITORIAL.
SOBRE SEUS NACIONAIS DISTANTES O ESTADO
EXERCE JURISDIÇÃO PESSOAL, FUNDADA NO
VÍNCULO DE NACIONALIDADE, E INDEPENDENTE DO
TERRITÓRIO ONDE SE ENCONTREM.

(REZEK, 2018, p. 138)

• GOVERNO

É o conjunto de pessoas encarregadas de conceder eficácia ao ordenamento jurídico nacional.


Trata-se das pessoas que conferem eficácia ao ordenamento jurídico interno. É quem é “capaz
de decidir de modo definitivo dentro do território estatal, não admitindo a ingerência de
nenhuma outra autoridade exterior” (REZEK, 2018, p. 661-662).

O exercício do governo pelo Estado tem dois planos:

Nacional

O governo do plano interno é a administração e gestão do país, traduzido na figura do Poder


Executivo.


Internacional

O Estado é quem representa o país perante outros Estados, participando das relações
internacionais e conduzindo a política externa.

Existe uma controvérsia acerca da inserção da soberania como elemento do Estado. Na


definição de Jean Bodin, a soberania é entendida como o poder supremo, inalienável,
perpétuo e indivisível que não reconhece qualquer outro superior a ele. Tal entendimento
encontra-se superado, de modo que o conceito de soberania, perante o Direito Internacional da
atualidade, é a não subordinação ao Direito interno de outro Estado (não significa a não
subordinação ao Direito Internacional).
ELEMENTOS DO ESTADO

O professor Guilherme France falará sobre os elementos do Estado.

PERSONALIDADE JURÍDICA DO ESTADO

A personalidade jurídica internacional do Estado é:

Originária

Porque não é necessário nenhum ato jurídico para afirmar a existência do Estado.


Plena

Pois não se submete a quaisquer limitações, salvo as impostas pelo Direito Internacional.

Por sua vez, a personalidade jurídica plena se exprime em três direitos:

JUS TRACTUM
Direito de celebrar tratados.

JUS LEGATIONEM
Direito de enviar e receber representação diplomática.

JUS AD BELLUM
Direito de fazer guerra.

Além do Estado, as entidades interestatais (Organizações internacionais.) possuem também


personalidade jurídica internacional, que, no entanto, tem algumas peculiaridades em relação
aos Estados.

A personalidade jurídica internacional das entidades interestatais é:

(i) derivada, pois depende da reunião de Estados para que sejam criadas; e

(ii) restrita, porque não possuem (ou possuem de forma restrita) os direitos jus tractum,
jus legationem e jus ad bellum.

 SAIBA MAIS

A única organização internacional que possui jus ad bellum é a ONU, por meio do Conselho de
Segurança. O jus tractum das organizações internacionais é altamente limitado às finalidades
para as quais a entidade foi criada. Ainda, as organizações internacionais não estabelecem
relações diplomáticas (e, por isso, não detêm jus legationem) — o máximo que realizam são os
chamados acordos de sede. Além disso, as organizações não governamentais são criadas por
instrumentos de direito público interno e não de direito internacional (como os tratados
internacionais, por exemplo).

Como regra, empresas e organizações não governamentais não possuem personalidade


jurídica internacional, mas existem casos excepcionais:
Imagem: Itaipu Binacional / Wikimedia Commons / Domínio Público

ITAIPU BINACIONAL

Como foi criada por um ato jurídico de Direito Internacional (in casu, Tratado de Itaipu de
1973), é uma coletividade interestatal que tem personalidade internacional, podendo celebrar
tratados de cessão de energia elétrica com o Brasil e com o Paraguai.

Imagem: SaMi / self drawn based on Emblem of the ICRC / Wikimedia Commons / Domínio
Público

CRUZ VERMELHA

Também criada por um ato jurídico internacional, manifesta sua personalidade como
observadora geral da ONU, com direito a voz (e não voto) nas reuniões, e como fiscalizadora
das Convenções de Genebra, que versam sobre direito humanitário.

Imagem: vatican.va / Cronholm144 / Wikimedia Commons / Domínio Público

SANTA SÉ

Criada pelo Acordo de Latrão, celebrado entre Igreja Católica e o Estado da Itália, sua
personalidade jurídica internacional se manifesta pelo jus tractum e jus legationem irrestritos,
mas não conta com o jus ad bellum.

Imagem: orderofmalta.int / Zscout370 / Wikimedia Commons / Domínio Público

ORDEM DOS CAVALEIROS DE MALTA


O Grão-Mestre da ordem detém imunidade de jurisdição no mesmo formato dos diplomatas,
bem como o jus legationem. O jus tractum da Ordem é limitado aos acordos de sede que
realizam com os Estados, para pactuar o recebimento e a organização da Ordem no Estado.

Discute-se se o indivíduo deve ser considerado um sujeito de Direito Internacional:

Para internacionalistas do século XVII, a dificuldade era tratar um Estado como sujeito do
Direito Internacional, discussão esta que não atingia o indivíduo, o qual era pacificamente
tratado como sujeito de Direito Internacional.


Por outro lado, os internacionalistas do século XIX entendiam, sem divergências, que o
Estado é um sujeito do Direito Internacional, mas possuem dificuldade para afirmar que assim
também são os indivíduos.

A discussão relaciona-se ao fato de que os indivíduos não podem celebrar tratados, mas
podem recorrer diretamente a algumas cortes internacionais ou, até mesmo, serem julgados
por tribunais internacionais.

VERIFICANDO O APRENDIZADO

1. ACERCA DA PERSONALIDADE JURÍDICA INTERNACIONAL,


ESSENCIAL PARA O EXERCÍCIO DE DIREITOS E DEVERES NO ÂMBITO
DO DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO, ASSINALE A OPÇÃO CORRETA:

A) Organizações não governamentais, como a Anistia Internacional, são sujeitos de direito


internacional, com personalidade jurídica internacional equivalente à dos Estados e da ONU.

B) O MERCOSUL, ao contrário da União Europeia, não possui personalidade jurídica de Direito


Internacional.

C) A OIT não possui personalidade jurídica, pois é filiada à Organização das Nações Unidas e
é por ela representada.
D) A personalidade jurídica internacional das entidades interestatais é caracterizada por ser
derivada e restrita.

E) Como regra, empresas e organizações não governamentais não possuem personalidade


jurídica internacional, mas existem casos excepcionais, como Itaipu Binacional e Greenpeace.

2. (ADAPTADA - 2014 – CESPE/CEBRASPE – CÂMARA DOS DEPUTADOS


– ANALISTA LEGISLATIVO)
A REALIDADE INTERNACIONAL CONTEMPLA UMA SÉRIE DE ATORES,
NEM TODOS PORTADORES DE PERSONALIDADE JURÍDICA
INTERNACIONAL, COM DIREITOS E DEVERES PERANTE O DIREITO DAS
GENTES. COM RELAÇÃO A ESSE ASSUNTO:

A) Empresas multinacionais não dispõem de personalidade jurídica internacional equivalente à


dos Estados, mesmo que elas sejam empresas públicas transnacionais contraentes de
obrigações com Estados soberanos.

B) A personalidade jurídica internacional do Estado é originária porque é necessário algum ato


jurídico para afirmar a existência do Estado, sendo essa uma limitação.

C) A personalidade jurídica plena se exprime em três direitos: jus tractum – direito de celebrar
tratados; jus legationem – direito a conceder asilo; e jus ad bellum – direito de fazer guerra.

D) A Cruz Vermelha não é sujeito de Direito Internacional, porque não pode celebrar tratados.

E) A Santa Sé foi criada pelo Acordo de Latrão, celebrado entre Igreja Católica e o Estado da
Itália, mas não possui personalidade jurídica internacional.

GABARITO

1. Acerca da personalidade jurídica internacional, essencial para o exercício de direitos e


deveres no âmbito do Direito Internacional público, assinale a opção correta:

A alternativa "D " está correta.

A personalidade jurídica internacional das entidades interestatais é derivada, pois elas


dependem da reunião de Estados para serem criadas; e é restrita, porque não possuem (ou
possuem de forma restrita) os direitos jus tractum, jus legationem e jus ad bellum.
2. (ADAPTADA - 2014 – CESPE/CEBRASPE – Câmara dos Deputados – Analista
Legislativo)
A realidade internacional contempla uma série de atores, nem todos portadores de
personalidade jurídica internacional, com direitos e deveres perante o direito das gentes.
Com relação a esse assunto:

A alternativa "A " está correta.

A personalidade jurídica internacional do Estado é originária, porque não é necessário nenhum


ato jurídico para afirmar a existência do Estado, e plena, pois não se submete a quaisquer
limitações, salvo as impostas pelo Direito Internacional, invalidando a alternativa b. A
personalidade jurídica plena se exprime em três direitos: jus tractum – direito de celebrar
tratados; jus legationem – direito a enviar e receber representação diplomática; e jus ad bellum
– direito de fazer guerra, estando errada a alternativa c.

Quanto à alternativa d, a Cruz Vermelha é criada por um ato jurídico internacional e manifesta
sua personalidade como observadora geral da ONU, com direito a voz (e não a voto) nas
reuniões, e como fiscalizadora das Convenções de Genebra, que versam sobre direito
humanitário. Já a personalidade jurídica internacional da Santa Sé manifesta-se pelo jus
tractum e jus legationem irrestritos, mas não conta com o jus ad bellum, estando errada
também a letra e.

MÓDULO 2

 Identificar as formas de reconhecimento de Estados e de governo

RECONHECIMENTO DE ESTADO E DE
GOVERNO
Assim como o Direito interno de cada Estado define quem são os seus sujeitos e o respectivo
início de sua personalidade por meio de leis, que possuem efeito erga omnes (Para toda a
comunidade internacional.) , o Direito Internacional deve regular a partir de que momento
ocorre o reconhecimento de uma coletividade como Estado. Nesse sentido, não existe uma
grande autoridade internacional central com a atribuição de reconhecer Estados com efeitos
erga omnes. Dessa maneira, o reconhecimento dos Estados no Direito Internacional produz
apenas efeitos interpartes – parte que reconhece e parte reconhecida.

NÃO SE TEM UMA DEFINIÇÃO PRECISA PARA O


RECONHECIMENTO DE ESTADO. PARA OS FINS DO
DIREITO INTERNACIONAL, O RECONHECIMENTO DO
ESTADO É UM “ATO LIVRE PELO QUAL UM OU MAIS
ESTADOS RECONHECEM A EXISTÊNCIA, EM UM
TERRITÓRIO DETERMINADO, DE UMA SOCIEDADE
HUMANA POLITICAMENTE ORGANIZADA,
INDEPENDENTE DE QUALQUER OUTRO ESTADO
EXISTENTE E CAPAZ DE OBSERVAR AS
PRESCRIÇÕES DO DIREITO INTERNACIONAL”, TAL
COMO DEFINIDO PELO INSTITUT DE DROIT
INTERNATIONAL NA SUA REUNIÃO DE BRUXELAS DE
1936, DE QUE FOI RELATOR PHILIP MARSHALL
BROWN.

(MAZZUOLI, 2019, p. 669)

Até o século XIX, entendia-se que o reconhecimento de um Estado tinha natureza jurídica
constitutiva, ainda que somente produzisse efeitos interpartes. Tal posicionamento, no entanto,
derivava do colonialismo, permitindo que o instituto do reconhecimento fosse utilizado com
excessiva manipulação política.
Atualmente, o reconhecimento de um Estado possui natureza jurídica meramente declaratória,
conforme dispõe a Convenção de Montevidéu, de 1933. A ideia de reconhecimento como ato
declaratório tem fundamento no princípio da efetividade do Direito Internacional: se, na
realidade fática, determinada coletividade tem povo, território e governo independente, trata-se
de um Estado de fato e, por conseguinte, é um Estado de Direito (MAZZUOLI, 2019).

São formas de reconhecimento de um Estado:

EXPRESSO
TÁCITO
UNILATERAL
BILATERAL

EXPRESSO

Por meio de ato jurídico internacional que expressamente reconhece determinada coletividade
como Estado.

TÁCITO

Por meio de ato não formalmente expresso reconhecendo determinada coletividade como
Estado. Por exemplo, a forma como o Reino Unido reconheceu o Brasil, que ocorreu por meio
do Tratado de Comércio de Navegação e Amizade em 1810;

UNILATERAL

Por meio de ato unilateral do Estado que reconhece.

BILATERAL
Por meio de tratado entre o Estado que reconhece e o Estado reconhecido.

Tratados multilaterais não são instrumentos aptos a produzir o reconhecimento de Estados,


pois, neles, perde-se a reciprocidade.

A mesma sistemática do reconhecimento de Estado pode ser aplicada ao instituto do


reconhecimento de governo, que, no entanto, possui certas peculiaridades. O reconhecimento
de governo é utilizado apenas quando há transições revolucionárias da ordem constitucional do
país.

O título de reconhecimento de governo tem a sua importância no fato de que o governo é


formado pelo conjunto de pessoas que pode estabelecer relações jurídicas internacionais em
nome do Estado, chamados de plenipotenciários. Assim como o reconhecimento de Estado,
o reconhecimento de governo pode ser utilizado como meio de manipulação política.

Para torná-lo um instituto menos aberto a eventuais manipulações políticas, foram criadas
algumas doutrinas com o objetivo de estabelecer critérios objetivos para o reconhecimento de
governos. A maioria delas, na verdade, acabou falhando. Apenas duas tiveram maior sucesso,
ainda que parcial:

DOUTRINA TOBAR
Criada por Carlos Tobar, Ministro das Relações Exteriores do Equador em 1907, tem como
fundamento o Princípio da Busca da Paz. Segundo ele, todo e qualquer governo que tenha
usado da força para tomar o poder seria ilegítimo, mesmo que fosse ideologicamente alinhado
com o Equador (MAZZUOLI, 2019).

DOUTRINA ESTRADA
Oriunda de Genaro Estrada, Ministro das Relações Exteriores do México em 1930, entende
que o reconhecimento de governo é um instituto imperialista. Com fundamento no Princípio da
Não Intervenção, a doutrina Estrada define que todo e qualquer governo deve ser reconhecido,
ainda que tacitamente (MAZZUOLI, 2019).

SUCESSÃO DE ESTADOS

Quando um Estado deixa de existir (i.e., a personalidade jurídica internacional), as obrigações


que ele criou não se extinguem, mas sim passam para os Estados sucessores. Trata-se do
princípio da continuidade.
Para que um Estado deixe de existir, é necessária alguma mudança drástica em algum de seus
elementos: governo, território e povo, em especial estes dois últimos. A análise de que um
Estado deixou de existir e deu origem a outro passa pelo princípio da efetividade, ou seja, a
verificação se outras autoridades passam a exercer de modo efetivo os atributos da soberania
em determinado lugar.

A sucessão é uma matéria fruto de costume preexistente e, por isso, não há um nome
específico para suas formas. No entanto, podem ser identificadas as seguintes formas:

FUSÃO
Ocorre quando dois Estados se juntam para formar um terceiro. Por exemplo, a unificação
alemã de 1870.

INCORPORAÇÃO
Ocorre quando um Estado incorpora outro, este deixa de existir e aquele se torna um Estado
maior ainda. Por exemplo, a reunificação alemã de 1989.

SECESSÃO, DIVISÃO OU CISÃO


Ocorre quando um Estado deixa de existir e, em seu lugar, surgem vários outros. Por exemplo,
o fim da URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.) .

DESMEMBRAMENTO
Ocorre quando um Estado grande, por um processo qualquer de revolta interna, permanece,
mas dele surgem outros Estados.

Registre-se que a cessão não é o caso de sucessão de Estados.

Na sucessão, transfere-se o domínio eminente e as propriedades do bem público, enquanto


naquela há apenas a transferência territorial, ou seja, do domínio eminente. Conforme Rezek
(2018, p. 230), na transferência territorial: “temos uma situação em que nenhuma soberania
surge ou desaparece. Os Estados preexistentes subsistem com suas identidades. Apenas uma
área territorial integrante de um deles transfere-se para outro. Muda, pois, tão só a soberania
incidente sobre essa parcela de território”.
Em caso de ausência de regras para a sucessão em tratados, o Direito Internacional
costumeiro regerá a sucessão. Existem dois tipos de sucessão:

Em matéria de tratados

Em matéria de bens e dívidas

• EM MATÉRIA DE TRATADOS

Nesse caso, as regras decorrem exclusivamente do Direito Internacional geral (Estados não
podem definir quem fica obrigado a qual tratado).

Caso de fusão e incorporação

O Estado sucessor é membro de todos os tratados que os Estados anteriores faziam parte.
Somam-se todos os tratados, inclusive aqueles que possuem obrigações incompatíveis entre
si.


Caso da secessão e do desmembramento

A regra é que os Estados sucessores serão membros de todos os tratados que o Estado
anterior fazia parte.

• EM MATÉRIA DE BENS E DÍVIDAS

Nesse caso, as regras são oriundas de tratado e, na sua ausência, caberá ao Direito
Internacional costumeiro regular as situações.

Fusão e incorporação

Somam-se todos os bens e dívidas do Estado antecessor.



Casos de secessão e desmembramento

Deve haver uma repartição ponderada dos bens e das dívidas de acordo com o critério da
destinação da dívida (REZEK, 2018).

Veja o exemplo a seguir:

 EXEMPLO

Imagine-se que R tenha adquirido uma dívida com o Fundo Monetário Internacional (FMI) para
a construção de usina nuclear situada em BT, que consegue se tornar independente. BT,
mesmo sendo apenas 20% do antigo território de R, será responsável pela integralidade da
dívida com o FMI.

IMUNIDADES

IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO

Imunidade de jurisdição é a isenção, por força de normas internacionais, originalmente


costumeiras e principiológicas ultimamente convencionais, da jurisdição penal, civil e
administrativa do Estado Nacional. Existe, portanto, uma norma de Direito Internacional que
exclui a jurisdição nacional. A imunidade de jurisdição é uma decorrência da soberania.

Sobre o tema, vige o princípio par in parem non habet imperium/jurisdictionis (o par entre seus
pares não exerce império/jurisdição). Originalmente, tal brocardo utilizava a denominação
imperium, porém jurisdictionis é considerada uma versão mais moderna. Esse princípio é uma
decorrência direta da ideia de soberania.

O que é personalidade jurídica internacional?


Segundo a famosa sentença do árbitro Wilbur, no caso da ilha de Palmas, soberania seria a
independência jurídica em face de outro Direito nacional. Em outras palavras, o Brasil é
soberano porque a Constituição norte-americana não vigora no Brasil.

CASO DA ILHA DE PALMAS

O caso Ilha de Palmas (Scott, Relatórios do Tribunal de Haia 2d 83 (1932), (Perm. Ct.
Arb. 1928), 2 U.N. Rep. Intl. Arb. Prêmios 829) foi uma disputa territorial sobre a Ilha de
Palmas entre os Países Baixos e os Estados Unidos que foi ouvido pelo Tribunal
Permanente de Arbitragem. Palmas foi declarado como parte das Índias Orientais
Holandesas e agora faz parte da Indonésia.

É preciso entender que a imunidade de jurisdição não é do diplomata, mas sim do Estado
(REZEK, 2018).

Assim, o diplomata possui imunidade de jurisdição porque ele é um funcionário público


brasileiro que está no estrangeiro. Dessa maneira, quando esse diplomata realiza um ato
oficial, este ato oficial também não pode ser apreciado pelo Judiciário norte-americano.

Aprofundando o tema, o termo “imunidade” pode estar se referindo à imunidade de Estado ou à


imunidade de pessoas (diplomatas e cônsules, especificamente):

RATIONE MATERIAE
Imunidade em razão da matéria ou imunidade.

RATIONE PERSONAE
Imunidade em razão da pessoa ou imunidade.

De todo modo, é o Estado que é imune — seus atos são imunes. Distinguem-se, apenas para
efeitos didáticos, as imunidades em razão da matéria do ato e as imunidades em razão da
pessoa.
O brocardo par in parem non habet imperium tem uma limitação, que é a chamada doutrina dos
atos de Estado, oriunda do Direito norte-americano. A ideia é que um Estado é capaz de
promover dois tipos de atos:

ATOS DE JURE IMPERII

(atos de império)

ATOS DE JURE GESTIONES

(atos de gestão)

Os atos de império decorrem do exercício do direito da soberania estatal. Portanto, a


imunidade de jurisdição só poderia ser relativizada se o próprio Estado permitisse. Um ato de
guerra é, por exemplo, um ato de império.

Quanto à ação militar no contexto de uma guerra, há julgados no sentido de que ela constitui
ato típico de império que confere ao Estado estrangeiro imunidade à jurisdição brasileira, para
responder à ação de indenização por danos morais e materiais.

A título de ilustração. Veja o exemplo a seguir:

 EXEMPLO

O STF tratou do tema no julgamento do Recurso Extraordinário nº 953.656 – RJ. No caso,


debateu-se a responsabilidade civil por danos materiais e morais em ação indenizatória
proposta contra Estado estrangeiro em razão de afundamento de barco durante o período da
Segunda Guerra Mundial. Discutiu-se que se tratava de ato de império e ainda com relação à
imunidade de jurisdição.

Ainda, como segundo princípio importante para a matéria, o princípio da reciprocidade foi
fundamental para a criação das imunidades na forma como conhecidas atualmente. A sua ideia
é que o país A trate os representantes do país B da mesma forma que este trata os
representantes do país A.
Terceiro princípio, e novamente com a limitação par in parem non, é o primado do direito local.
A imunidade não significa extraterritorialidade, ou seja, o direito vigente no território é o
do próprio Estado. Sendo assim, a embaixada do país estrangeiro e seus representantes são
imunes, mas aplica-se o direito local a todo e qualquer contrato celebrado por eles no território.

A reclamação trabalhista é uma decorrência direta do primado do direito local. Em decorrência


de um costume internacional, passou-se a não mais se conceder imunidade em matéria
trabalhista pelo fato de ser uma relação entre desiguais: uma parte está buscando uma
prestação de natureza alimentar, enquanto a outra parte é uma embaixada, ou seja,
representante de um país estrangeiro.

 SAIBA MAIS

O Brasil demorou a aderir tal regra de direito costumeiro, para não conceder imunidade de
jurisdição em matéria trabalhista (caso Geny de Oliveira – STF, Apelação Cível 9.696.
Tribunal Pleno. Relator Min. Sydney Sanches, j. 31/05/1989, DJe 12/10/1990).

CASO GENY DE OLIVEIRA

Ementa - ESTADO ESTRANGEIRO. IMUNIDADE JUDICIÁRIA. CAUSA TRABALHISTA.


NÃO HÁ IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO PARA O ESTADO ESTRANGEIRO, EM CAUSA
DE NATUREZA TRABALHISTA. EM PRINCÍPIO, ESTA DEVE SER PROCESSADA E
JULGADA PELA JUSTIÇA DO TRABALHO, SE AJUIZADA DEPOIS DO ADVENTO DA
CONSTITUIÇÃO FEDERALDE 1988 (ART. 114). NA HIPÓTESE, PORÉM, PERMANECE
A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL, EM FACE DO DISPOSTO NO PARÁGRAFO
10 DO ART. 27 DO A.D.C.T. DA CONSTITUIÇÃO FEDERALDE 1988, C / C ART. 125, II,
DA E.C. N. 1/69. RECURSO ORDINÁRIO CONHECIDOE PROVIDO PELO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL PARA SE AFASTAR A IMUNIDADE JUDICIÁRIA RECONHECIDA
PELO JUÍZO FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU, QUE DEVE PROSSEGUIR NO
JULGAMENTO DA CAUSA, COMO DE DIREITO.
Quanto à imunidade de execução, a regra é que não se pode penhorar bens afetos à
oficialidade. Por exemplo, se o Estado estrangeiro possuir bens não afetos à oficialidade, como
seria o caso de um prédio comercial que utiliza para locação, é possível haver a penhora.

Relembre-se que A imunidade de jurisdição é a isenção da jurisdição nacional sobre agente de


direito público externo e não se confunde com extraterritorialidade, que é a aplicação da
jurisdição nacional em território estrangeiro. As hipóteses taxativas de extraterritorialidade no
Direito Internacional são:

CESSÃO ADMINISTRATIVA
Trata-se da cessão de território sem transferência de soberania. Não existe transferência de
soberania, pois a cessão é provisória. Um dia será revertida ao Estado que cedeu (ainda
que não tenha prazo fixado), como é o caso de Hong Kong.

OCUPAÇÃO MILITAR
Desde 1928, com o Pacto de Paris (ou Pacto Brien), a guerra foi proibida no Direito
Internacional, e não se aceita mais transferência de território pela conquista militar. Então,
quando há uma ocupação militar, essa ocupação também deverá ser provisória.

SERVIDÃO INTERNACIONAL
São os casos em que um Estado exerce prerrogativas soberanas sobre o território de outro
Estado, como é o caso da Áustria, que faz o papel de polícia marítima de Montenegro.

PROTETORADO
No protetorado, existe um Estado protetor e um Estado protegido. A ideia é que o Estado
protegido possui uma espécie de limitação da sua capacidade e precisa de outro Estado para
conduzi-lo. É um sistema mais leve de pacto colonial. Nele, o Estado protetor não exerce todas
as prerrogativas da metrópole, sendo responsável apenas pela:

representação internacional do Estado protegido;

administração financeira do Estado protegido;

segurança do Estado protegido; e

administração da justiça para estrangeiros dentro do Estado protegido.


O Estado protegido, portanto, tem as suas leis, seu sistema judiciário próprio para seu povo.
Contudo, no momento em que houver um conflito envolvendo estrangeiro, não serão mais as
leis nem o aparato Judiciário do Estado protegido que entrarão em ação, mas sim as leis do
Estado protetor.

MANDATO/TUTELA
Envolve a figura da metrópole e da colônia.

IMUNIDADES DIPLOMÁTICAS

A imunidade, em razão da pessoa do diplomata, é extensiva, em primeiro lugar, à família do


diplomata, abrangendo todos os que vivem sob a dependência econômica dele. Quando o
diplomata chega ao país, vai à chancelaria e presta informações sobre si mesmo, sua
identidade e a de seus familiares.

Tais familiares, ainda que recebam salário eventualmente por realizarem algum serviço à
família do diplomata (caso de doméstica que viajou para continuar seus serviços ao diplomata),
estão cobertos pela imunidade.

A residência pessoal de todo o corpo diplomático e dos adidos goza de inviolabilidade (REZEK,
2018).

Ainda, mala diplomática, correio, arquivos e quaisquer outros documentos são invioláveis onde
quer que se encontrem.

Nesse sentido, as imunidades diplomáticas abrangem:

• IMUNIDADES PENAIS

Convenção de Viena de Relações Diplomáticas, de 1961, que foi promulgada no Brasil pelo
Decreto 56.435, de 8 de junho de 1965 — “Artigo 31: 1. O agente diplomático gozará de
imunidade de jurisdição penal do Estado acreditado (...)”.

A imunidade penal é absoluta, sem exceções. A rigor, o diplomata não pode sequer ser tocado
pelo guarda, devido ao art. 29 do Decreto nº 56.435/1965.

A pessoa do agente diplomático é inviolável.


Não poderá ser objeto de nenhuma forma de detenção ou prisão. O Estado acreditado tratá-lo-
á com o devido respeito e adotará todas as medidas adequadas para impedir qualquer ofensa
à sua pessoa, liberdade ou dignidade.

 VOCÊ SABIA

O diplomata tem imunidade de jurisdição absoluta e a pessoa dele é inviolável. Ainda, o


diplomata não pode sequer ser testemunha. Isso evidencia que sua imunidade penal é tão
ampla que, mesmo em um crime do qual seja a única testemunha, ele não poderá ser intimado
a depor. É preciso autorização do Estado para depor como testemunha.

• IMUNIDADES CIVIS

Nas imunidades civis, o diplomata não tem tamanha extensão. Em regra, terá ampla imunidade
civil, salvo algumas exceções.

ARTIGO 31: 1. (...) GOZARÁ TAMBÉM DA IMUNIDADE


DE JURISDIÇÃO CIVIL E ADMINISTRATIVA, A NÃO SER
QUE SE TRATE DE: A) UMA AÇÃO REAL SOBRE
IMÓVEL PRIVADO SITUADO NO TERRITÓRIO DO
ESTADO ACREDITADO, SALVO SE O AGENTE
DIPLOMÁTICO O POSSUIR POR CONTA DO ESTADO
ACREDITADO PARA OS FINS DA MISSÃO. B) UMA
AÇÃO SUCESSÓRIA NA QUAL O AGENTE
DIPLOMÁTICO FIGURE, A TÍTULO PRIVADO E NÃO EM
NOME DO ESTADO, COMO EXECUTOR
TESTAMENTÁRIO, ADMINISTRADOR, HERDEIRO OU
LEGATÁRIO. C) UMA AÇÃO REFERENTE A QUALQUER
PROFISSÃO LIBERAL OU ATIVIDADE COMERCIAL
EXERCIDA PELO AGENTE DIPLOMÁTICO NO ESTADO
ACREDITADO FORA DE SUAS FUNÇÕES OFICIAIS.

(Decreto nº 56.435/1965)

Um diplomata em Estado estrangeiro não pode trabalhar em qualquer outra função no Estado
acreditado, podendo ser somente diplomata. Há a possibilidade de se tornar sócio investidor
em eventuais sociedades existentes no Estado acreditado — podendo apenas comprar ações
preferenciais, que não proporcionam direito a voto. Tais vedações não se aplicam ao diplomata
no Estado acreditado.

Foto: Shutterstock.com

Além das situações excepcionadas mencionadas anteriormente para as imunidades civis, há a


exceção de imunidade em relações trabalhistas que, apesar de não prevista expressamente na
Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, é fruto de um costume internacional.

Sobre o tema, na lição de Francisco Rezek:


NO ÂMBITO DA MISSÃO DIPLOMÁTICA, OS MEMBROS
DO QUADRO DIPLOMÁTICO DE CARREIRA (DO
EMBAIXADOR AO TERCEIRO-SECRETÁRIO) GOZAM
DE AMPLA IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO PENAL E
CIVIL. OS MEMBROS DO QUADRO ADMINISTRATIVO E
TÉCNICO (TRADUTORES, CONTABILISTAS ETC.),
DESDE QUE ORIUNDOS DO ESTADO ACREDITANTE, E
NÃO RECRUTADOS IN LOCO, DISTINGUEM-SE DOS
DIPLOMATAS NO QUE CONCERNE À IMUNIDADE DE
JURISDIÇÃO CIVIL, AQUI LIMITADA AOS ATOS
PRATICADOS NO EXERCÍCIO DE SUAS FUNÇÕES.
TODOS SÃO, ADEMAIS, FISICAMENTE INVIOLÁVEIS, E
EM CASO ALGUM PODEM SER OBRIGADOS A DEPOR
COMO TESTEMUNHAS. REVESTE-OS, ALÉM DISSO, A
IMUNIDADE TRIBUTÁRIA.

(REZEK, 2018, p. 131)

• IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS

A relação tributária é caracterizada pela sujeição, de modo que, como regra, a imunidade
tributária do diplomata é bastante ampla. Sobre a matéria, cabe a análise do art. 34 da
Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas:
ARTIGO 34. O AGENTE DIPLOMÁTICO GOZARÁ DE
ISENÇÃO DE TODOS OS IMPOSTOS E TAXAS,
PESSOAIS OU REAIS, NACIONAIS, REGIONAIS OU
MUNICIPAIS, COM AS EXCEÇÕES SEGUINTES: A) OS
IMPOSTOS INDIRETOS QUE ESTEJAM
NORMALMENTE INCLUÍDOS NO PREÇO DAS
MERCADORIAS OU DOS SERVIÇOS; B) OS IMPOSTOS
E TAXAS SÔBRE BENS IMÓVEIS PRIVADOS SITUADOS
NO TERRITÓRIO DO ESTADO ACREDITADO, A NÃO
SER QUE O AGENTE DIPLOMÁTICO OS POSSUA EM
NOME DO ESTADO ACREDITANTE E PARA OS FINS DA
MISSÃO; C) OS DIREITOS DE SUCESSÃO
PERCEBIDOS PELO ESTADO ACREDITADO, SALVO O
DISPOSTO NO PARÁGRAFO 4 DO ARTIGO 39; D) OS
IMPOSTOS E TAXAS SOBRE RENDIMENTOS
PRIVADOS QUE TENHAM A SUA ORIGEM NO ESTADO
ACREDITADO E OS IMPOSTOS SOBRE O CAPITAL
REFERENTES A INVESTIMENTOS EM EMPRÊSAS
COMERCIAIS NO ESTADO ACREDITADO; E) OS
IMPOSTOS E TAXAS QUE INCIDEM SÔBRE A
REMUNERAÇÃO RELATIVA A SERVIÇOS
ESPECÍFICOS; F) OS DIREITOS DE REGISTRO, DE
HIPOTECA, CUSTAS JUDICIAIS E IMPÔSTO DE SELO
RELATIVOS A BENS IMÓVEIS, SALVO O DISPOSTO NO
ARTIGO 23.

(Decreto nº 61.078, 1967)


IMUNIDADES CONSULARES

Da mesma forma que as imunidades diplomáticas, as imunidades consulares são um instituto


composto pela imunidade de jurisdição, imunidade de execução (ou de inviolabilidade) e por
certas prerrogativas.

O cônsul possui menos imunidades que o diplomata (MAZZUOLI, 2019). Como regra, sua
imunidade abrange apenas atos do ofício do consulado. Isso porque o cônsul tem uma função
relativamente menos importante do que a do diplomata:

Diplomata

Leva adiante a política internacional do país.

Cônsul

Atua com o objetivo de zelar pelos interesses dos seus nacionais no Estado estrangeiro.

O cônsul não tem direito à sua própria imunidade.

Trata-se de uma prerrogativa do Estado, cabendo a renúncia apenas pelo chefe da missão
diplomática. Ainda, a imunidade do cônsul não se estende à família e, apesar de a repartição
consular ser inviolável, a sua residência pessoal não é.

As imunidades consulares abrangem:

• IMUNIDADES PENAIS

Sobre o tema, aplica-se o art. 41 da Convenção de Viena sobre Relações Consulares, que foi
promulgada no Brasil pelo Decreto nº 61.078, de 26 de Julho de 1967:
ARTIGO 41. INVIOLABILIDADE PESSOAL DOS
FUNCIONÁRIOS CONSULARES. 1. OS FUNCIONÁRIOS
CONSULARES NÃO PODERÃO SER DETIDOS OU
PRESOS PREVENTIVAMENTE, EXCETO EM CASO DE
CRIME GRAVE E EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO DE
AUTORIDADE, JUDICIÁRIA COMPETENTE.

(Decreto nº 61.078, 1967)

O dispositivo trata tanto da imunidade de jurisdição quanto da inviolabilidade. Nos dois casos, o
cônsul somente é imune a crimes que não sejam considerados graves, portanto, pode ser
preso, inclusive de forma cautelar, quanto à prática de crimes graves. A Convenção não fez
qualquer definição sobre o conceito de crime grave, ou seja, é uma norma internacional em
branco, e a sua definição cabe ao Direito interno de cada Estado. No Brasil, não há uma
definição legal ou sumulada de crimes graves, então se aplica a jurisprudência do STF, que
utilizou algumas definições para crime grave.

Na decisão mais antiga, o STF equiparou crimes graves aos crimes hediondos. Sem dúvida,
crimes hediondos são graves, mas existem poucos crimes hediondos previstos em lei. Ocorreu,
então, um caso de um cônsul israelense que cometeu o crime de pedofilia, mas sem conjunção
carnal, o que retirava a configuração como crime de estupro e, portanto, hediondo. Na
oportunidade, o STF (HC nº 81.158), em voto da relatora Ellen Gracie, equiparou crime grave
aos crimes que não estavam incluídos na Lei dos Juizados Especiais Criminais, que julga
crimes cuja pena máxima em abstrato não ultrapasse dois anos, considerados crimes de
menor potencial lesivo (art. 61 da Lei nº 9.099/1995). Desse modo, todos os crimes fora da
competência do Juizado Especial Criminal seriam considerados graves.
Foto: Shutterstock.com

A grande crítica é que o Brasil utilizou uma definição de Direito Processual para interpretar o
Direito Material, gerando distorções em relação ao princípio da reciprocidade, uma vez que, por
exemplo, Israel possui uma definição em lei — crimes graves são aqueles contra a vida. Nesse
sentido, o Brasil interpretou uma norma de Direito Internacional com base em seu Direito
interno, o que é considerado um erro em termos de interpretação do Direito Internacional. O
art. 31 da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados de 1969 (Decreto nº 7.030/2009)
prevê que os critérios de interpretação a serem utilizados são o literal, o contextual e o
teleológico.

De todo modo, a regra é que um cônsul, se cometer crime cuja pena máxima em abstrato
é de mais de dois anos, pode ser processado, condenado e até mesmo preso. O único
tipo de prisão cautelar — antes do trânsito em julgado — que se aplica ao cônsul é a prisão
preventiva, pois ele somente pode ser preso por meio de mandado judicial. Sendo assim, não
se aplica a prisão temporária nem a prisão em flagrante.

 VOCÊ SABIA

O cônsul pode depor desde que com hora marcada, para que não atrapalhe o ofício do serviço
consular. O depoimento é colhido no próprio consulado.
• IMUNIDADES CIVIS

No que se refere às imunidades civis, o cônsul possui menor proteção do que os diplomatas.
Não se aplica a imunidade para contratos realizados fora do ofício do cônsul nem para ação de
danos causados por acidente de veículo, navio ou transporte, na forma do art. 43 da
Convenção de Viena das Relações Consulares:

ARTIGO 43. IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO. 1. OS


FUNCIONÁRIOS CONSULARES E OS EMPREGADOS
CONSULARES NÃO ESTÃO SUJEITOS À JURISDIÇÃO
DAS AUTORIDADES JUDICIÁRIAS E
ADMINISTRATIVAS DO ESTADO RECEPTOR PELOS
ATOS REALIZADOS NO EXERCÍCIO DAS FUNÇÕES
CONSULARES. 2. AS DISPOSIÇÕES DO PARÁGRAFO
1º DO PRESENTE ARTIGO NÃO SE APLICARÃO,
ENTRETANTO, NO CASO DE AÇÃO CIVIL: A) QUE
RESULTE DE CONTRATO QUE O FUNCIONÁRIO OU
EMPREGADO CONSULAR NÃO TIVER REALIZADO
IMPLÍCITA OU EXPLICITAMENTE COMO AGENTE DO
ESTADO QUE ENVIA; OU B) QUE SEJA PROPOSTA
POR TERCEIRO COMO CONSEQUÊNCIA DE DANOS
CAUSADOS POR ACIDENTE DE VEÍCULO, NAVIO OU
AERONAVE, OCORRIDO NO ESTADO RECEPTOR.

(Decreto nº 61.078)
• IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS

O cônsul tem as mesmas imunidades tributárias que os diplomatas, ou seja, não está
submetido ao poder do Estado estrangeiro tanto quanto o diplomata. O cônsul possui, ainda,
determinadas prerrogativas. Nesse sentido, detém três grandes grupos de liberdade:

LIBERDADE DE MOVIMENTO
Encontra previsão no art. 34 da Convenção de Viena das Relações Consulares. O cônsul
somente pode ter a sua liberdade de movimento restringida se houver lei de segurança
nacional sobre o assunto. Nesse sentido, não pode ter seu acesso limitado para trânsito em
repartições públicas, a não ser que haja lei de segurança nacional estipulando a restrição.

LIBERDADE DE COMUNICAÇÃO
Encontra previsão no art. 35 a 38 da Convenção de Viena das Relações Consulares. Tal
liberdade se desdobra em dois direitos: direito do cônsul de falar com os seus nacionais e o
direito dos nacionais de serem assistidos pelo cônsul.

LIBERDADE DE COMUNICAÇÃO COM AS


AUTORIDADES DO ESTADO QUE O ENVIOU
Os cônsules honorários, que não são cônsules de carreira, são aqueles designados para
determinada localidade, que, em regra, possui menor contingente de pessoas, para atuar na
defesa dos direitos e na assistência, emergencial ou não, aos nacionais do Estado que o
enviou. O cônsul honorário não precisa ser nacional do país que o enviou, por exemplo, o
cônsul da França em Santa Catarina é brasileiro. Nesse caso, o cônsul terá apenas as
imunidades tributárias dos cônsules de carreira.

IMUNIDADES DIPLOMÁTICAS E CONSULARES

O professor Guilherme France abordará as imunidades diplomáticas e consulares.


VERIFICANDO O APRENDIZADO

1. SOBRE AS FORMAS DE SUCESSÃO DE ESTADO E SEUS EFEITOS,


ASSINALE A ALTERNATIVA CORRETA:

A) Fusão é quando dois ou mais Estados se unem para formar um terceiro diferente. O novo
Estado não assume nenhuma obrigação dos Estados originários.

B) Na incorporação, o Estado que agrega permanece e o Estado agregado deixa de existir,


transferindo para o primeiro todas as obrigações anteriores.

C) Divisão ou cisão é quando um Estado se separa em outros dois ou mais, mas mantendo o
Estado originário.

D) Desmembramento é quando um Estado continua existindo, porém, sem perder seu território.

E) A cessão, outro caso de sucessão de Estados, ocorre quando se transfere o domínio


eminente e as propriedades do bem público.

2. (2009 – CESPE/CEBRASPE – INSTITUTO RIO BRANCO – DIPLOMATA)


EM 14/6/2008, O GOVERNO BRASILEIRO RESPONDEU À CARTA DO
MINISTRO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS DA REPÚBLICA DE
MONTENEGRO, ACUSANDO RECEBIMENTO DE NOTÍCIA ACERCA DO
RESULTADO DE REFERENDO FAVORÁVEL AO STATUS DAQUELE PAÍS
COMO ESTADO INDEPENDENTE, APÓS DESMEMBRAMENTO DA UNIÃO
DE ESTADOS DA SÉRVIA E MONTENEGRO.
NA CARTA, O BRASIL RECONHECE, A PARTIR DA DATA DE HOJE, A
INDEPENDÊNCIA DA REPÚBLICA DE MONTENEGRO, PAÍS COM O QUAL
O BRASIL TENCIONA, OPORTUNAMENTE, INICIAR PROCESSO COM
VISTAS AO ESTABELECIMENTO DE RELAÇÕES DIPLOMÁTICAS.
ACERCA DESSE TEMA, ASSINALE A OPÇÃO CORRETA:

A) A eventual recusa do reconhecimento por parte do Governo brasileiro impediria que


Montenegro se constituísse como verdadeiro Estado, sujeito de Direito Internacional, e que se
tornasse membro das Nações Unidas.

B) O Governo brasileiro poderia ter optado por não reconhecer formalmente a independência
de Montenegro e poderia ter simplesmente estabelecido relações diplomáticas com aquele
país, o que teria produzido o mesmo efeito jurídico do reconhecimento.

C) É costume do Governo brasileiro, além de reconhecer Estados, proceder igualmente ao


reconhecimento formal de novos governos, quando oriundos de revolução ou golpe de Estado,
exprimindo juízo de valor acerca da legitimidade do novo regime.

D) Antes do reconhecimento de Montenegro, o Governo brasileiro deveria ter considerado, em


sua avaliação das circunstâncias locais, se a nova entidade possuía território definido,
população permanente, governo soberano e efetivo, e se havia comprometimento de
Montenegro em estabelecer missão diplomática em Brasília.

E) Ao Governo brasileiro caberá a última palavra na destinação a ser dada aos bens
(embaixada, terrenos) que eram anteriormente pertencentes à União dos Estados da Sérvia e
Montenegro e que se encontram em território brasileiro.

GABARITO

1. Sobre as formas de sucessão de Estado e seus efeitos, assinale a alternativa correta:

A alternativa "B " está correta.

Na fusão, o novo Estado se obriga aos mesmos tratados que os dois ou mais anteriores que o
originaram, de modo cumulativo, estando errada a alternativa A. A alternativa C está incorreta
porque, quando há divisão, dois novos Estados se formam. No desmembramento, haverá
perda de território, portanto, a alternativa D está incorreta. A alternativa E também está
incorreta, pois, quando um Estado deixa de existir (a personalidade jurídica internacional), as
obrigações que ele criou não se extinguem, mas sim passam para os Estados sucessores, por
conta do princípio da continuidade.

2. (2009 – CESPE/CEBRASPE – Instituto Rio Branco – Diplomata) Em 14/6/2008, o


Governo brasileiro respondeu à carta do ministro dos Negócios Estrangeiros da
República de Montenegro, acusando recebimento de notícia acerca do resultado de
referendo favorável ao status daquele país como Estado independente, após
desmembramento da União de Estados da Sérvia e Montenegro.
Na carta, o Brasil reconhece, a partir da data de hoje, a independência da República de
Montenegro, país com o qual o Brasil tenciona, oportunamente, iniciar processo com
vistas ao estabelecimento de relações diplomáticas.
Acerca desse tema, assinale a opção correta:

A alternativa "B " está correta.

A constituição de determinado Estado não depende do reconhecimento de outros. Fora isso, o


direito de tornar-se membro das Nações Unidas cabe a todas as nações amantes da paz que
aceitarem os compromissos da Carta e que, a critério da Organização, estiverem aptas e
dispostas a cumprir tais obrigações. Por isso, a alternativa A está errada. O procedimento de
reconhecimento, em casos em que há revolução ou golpe de Estado, não se dá igualmente à
criação do Estado de maneira corriqueira. O Governo é elemento do Estado e este deve ser
legítimo, estando incorreta a letra C. A alternativa D está incorreta porque não há necessidade
de comprometimento em estabelecer missão diplomática para o reconhecimento de um
Estado. Quanto à alternativa E, os bens são pertencentes ao(s) Estado(s) estrangeiro(s), e não
ao Brasil, e, por conta disso, a cabe ao Estado estrangeiro a decisão. Assim, a alternativa B é a
correta.

MÓDULO 3

 Reconhecer os elementos da Responsabilidade Internacional do Estado


RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL
As regras de responsabilidade internacional são mais sofisticadas do que as regras de
responsabilidade civil. Trata-se de matéria inteiramente costumeira. Até existem alguns
sistemas codificados de responsabilidade, mas apenas para áreas temáticas específicas, por
meio de tratados.

 EXEMPLO

Em matéria de Direito do Comércio Internacional, os acordos constitutivos da Organização


Mundial do Comércio (OMC) criaram um sistema de responsabilidade próprio, envolvendo um
órgão de solução de controvérsias. Em matéria de direitos humanos, há dois tipos de sistemas
de proteção dos direitos humanos: o sistema universal e os sistemas regionais, com previsão
de responsabilidade nos tratados. No entanto, de modo geral, não há regras escritas para a
responsabilidade internacional do Estado, elas derivam, sobretudo, do costume.

A responsabilidade internacional do Estado é completamente independente da


responsabilidade civil. Desde 1950, a Comissão de Direito Internacional (CDI) da Assembleia
Geral da ONU trabalha em um projeto de tratado sobre a responsabilidade internacional dos
Estados. Para tanto, utiliza diversos costumes do Direito Internacional e sistematiza-os,
transformando-os em texto único. Trata-se de um projeto, não está em vigor, mas é um bom
reflexo para a compreensão dos costumes relacionados à matéria da responsabilidade
internacional do Estado (MAZZUOLI, 2019). Segundo o art. 2º do Projeto:
ART. 2º ELEMENTOS DE UM ATO
INTERNACIONALMENTE ILÍCITO DO ESTADO
HÁ UM ATO INTERNACIONALMENTE ILÍCITO DO
ESTADO QUANDO A CONDUTA, CONSISTINDO EM
UMA AÇÃO OU OMISSÃO:
A) É ATRIBUÍVEL AO ESTADO CONSOANTE O DIREITO
INTERNACIONAL; E
B) CONSTITUI UMA VIOLAÇÃO DE UMA OBRIGAÇÃO
INTERNACIONAL DO ESTADO. (PROJETO DA ONU
SOBRE RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL DOS
ESTADOS)

“Atribuível” significa a atributividade ou o nexo de imputação, que é o primeiro elemento da


responsabilidade civil, enquanto o segundo elemento é o ato ilícito. O dano não é considerado
um elemento caracterizador da responsabilidade (MAZZUOLI, 2019), mas apenas uma
consequência. Isso porque, em diversas oportunidades, não é possível medi-lo ou
predeterminá-lo, como no caso de danos ambientais.

• ATO ILÍCITO

Entende-se ato ilícito como uma violação de uma norma de Direito Internacional (e não de
Direito interno).

Outra observação importante é que existe uma distinção entre crime e delito internacional,
ainda que tal distinção tenha perdido sentido na atualidade:

Crime internacional seria todo ato ilícito cometido pelo Estado;


Delito internacional seria todo ato ilícito cometido por um particular nos casos clássicos
de responsabilização internacional do indivíduo.

Tal divisão perdeu sua valia diante da ideia de crime internacional, que são crimes no sentido
penal do termo, atraindo a responsabilização internacional do indivíduo.

• IMPUTABILIDADE

Trata-se da relação entre a conduta delituosa e a pessoa que é responsável por ela. Não vai
ser necessariamente quem fez aquela conduta.

ART. 4º CONDUTA DOS ÓRGÃOS DE UM ESTADO


1. CONSIDERAR-SE-Á COMO ATO DO ESTADO,
SEGUNDO O DIREITO PÚBLICO INTERNACIONAL, A
CONDUTA DE QUALQUER ÓRGÃO DO ESTADO QUE
EXERÇA FUNÇÃO LEGISLATIVA, EXECUTIVA,
JUDICIAL OU OUTRA, QUALQUER QUE SEJA SUA
POSIÇÃO NA ORGANIZAÇÃO DO ESTADO E
INDEPENDENTE DE SE TRATAR DE ÓRGÃOS DO
GOVERNO CENTRAL OU DE UNIDADE TERRITORIAL
DO ESTADO.
2. INCLUIR-SE-Á, COMO ÓRGÃO, QUALQUER PESSOA
OU ENTIDADE QUE TENHA TAL STATUS DE ACORDO
COM O DIREITO INTERNO DO ESTADO. (PROJETO DA
ONU SOBRE RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL
DOS ESTADOS)
• IMPUTABILIDADE DIRETA

Uma ação de qualquer agente público, no exercício da sua profissão, acarreta a


responsabilidade internacional do Estado. Trata-se do caso em que o próprio Estado comete o
ato ilícito — e não um terceiro —, sendo um caso de imputabilidade direta.

O Legislativo comete ato ilícito internacional toda vez que produz lei contrária a uma
norma internacional. No mesmo sentido, o Judiciário comete ato ilícito internacional quando
pratica a denegação de justiça, ou seja, dificulta a produção de provas, demora
desarrazoadamente no julgamento.

Como regra geral, a ação de particulares não acarreta responsabilidade internacional para o
seu Estado. No entanto, existem algumas exceções que, mesmo praticadas por particulares,
acarretam a responsabilidade internacional por imputação direta:

FUNCIONÁRIO DE FATO
MOVIMENTO INSURRECIONAL
AÇÃO DE PARTICULAR CONTRA PESSOA
INTERNACIONALMENTE PROTEGIDA

FUNCIONÁRIO DE FATO

Em determinada situação, o particular assume o exercício de uma função pública.

MOVIMENTO INSURRECIONAL

Caso em que os particulares estão lutando contra o governo estabelecido. Este entende que os
particulares estão cometendo crimes tipificados no Direito interno, enquanto os particulares
entendem que eventual prática de crime é o único meio para derrubar o governo. Se o
movimento insurrecional tomar o governo e houver praticado atos ilícitos do ponto de vista do
Direito Internacional, pode haver responsabilidade internacional do Estado. Se o movimento
insurrecional perde força e não consegue tomar o poder, sua eventual responsabilização será
pelo Direito interno.

AÇÃO DE PARTICULAR CONTRA PESSOA


INTERNACIONALMENTE PROTEGIDA

É o caso de um crime de sequestro de diplomata americano no Brasil. O criminoso será


responsabilizado pelo direito interno, e o Brasil será responsabilizado do ponto de vista do
Direito Internacional. Isso porque, no caso, o Brasil tem o dever de garantir a segurança do
diplomata e foi negligente no cumprimento de seu dever.

• IMPUTABILIDADE INDIRETA

Ocorre quando um indivíduo comete um ato internacionalmente ilícito e um terceiro Estado é


responsabilizado pela conduta. A responsabilidade por imputabilidade indireta não pode ser
presumida, deve estar expressa em norma internacional. Pode ocorrer nos casos de tutela,
comodato, protetorados, regime de associação entre Estados.

Existem três formas de reparação:

Restituição

Com previsão no art. 35 do Projeto da ONU sobre Responsabilidade Internacional dos Estados.
Toda vez que a restituição for impossível ou insuficiente, é possível requerer a indenização.

Indenização

É estabelecida no art. 36.2: “a indenização deverá cobrir qualquer dano suscetível de


mensuração financeira, requerendo lucros cessantes na medida da sua comprovação”. A
natureza jurídica da responsabilidade internacional não é punitiva, mas sim restauradora. Por
conta disso, não existe indenização por danos indiretos no Direito Internacional, mas somente
pelos danos diretos, bem como eventuais lucros cessantes.

Satisfação

Trata-se de reparação de índole moral: “o Estado responsável por um ato internacionalmente


ilícito tem a obrigação de dar a satisfação pelo prejuízo causado por aquele ato, desde que ele
não possa ser reparado pela restituição, ou pela indenização” (art. 37.1, Projeto da ONU sobre
Responsabilidade Internacional dos Estados). “A satisfação pode constituir em um
reconhecimento da violação, uma expressão de arrependimento, uma desculpa formal ou outra
modalidade apropriada” (art. 37.2). Trata-se, portanto, de um pedido diplomático de desculpa.

• EXCLUDENTES DE ILICITUDE

São aspectos que podem excluir a ilicitude de um ato estatal: consentimento; legítima defesa;
contramedidas; força maior e perigo extremo; dever de cumprimento de jus cogens. Veja cada
um deles:

a) Consentimento
Possui como exemplo clássico a França de Vichy. Nesse caso, a França foi invadida pela
Alemanha, e uma parte do território francês ficou com a Alemanha e a outra parte com o
governo francês de Vichy. O Estado francês, vítima no caso, concordou com a divisão, ainda
que possa ser considerado um consentimento viciado. Nas palavras de Mazzuoli:

A FIM DE QUE NÃO SEJA O CONSENTIMENTO


UTILIZADO DE FORMA POLÍTICA A FAVOR DE
ESTADOS FORTES EM DETRIMENTO DE ESTADOS
FRACOS, É QUE A MELHOR DOUTRINA ELENCA
SEREM CONDIÇÕES PARA O CONSENTIMENTO QUE
ESTE SEJA (A) REAL, (B) VÁLIDO EM DIREITO DAS
GENTES, (C) ATRIBUÍVEL INTERNACIONALMENTE AO
ESTADO LESIONADO E (D) ANTERIOR À PRÁTICA DO
ATO CUJA ILICITUDE SE PRETENDE EXCLUIR.

(MAZZUOLI, 2019, p. 832)


b) Legítima defesa

Diante de uma injusta agressão, o Estado busca repelir por meio de agressão. No Direito
Internacional, para haver legítima defesa de terceiro, chamada de legítima defesa coletiva, não
se pode presumir nenhum ato, deve haver um liame entre os Estados, que será um tratado,
como é o caso da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).

Imagem: althistory.wikia.com / Wikimedia Commons / Domínio Público

OS ATOS DE LEGÍTIMA DEFESA AFASTAM A


RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL DO ESTADO,
MAS SÓ PODEM SER APLICADOS QUANDO EXISTIR
UM DANO ANTERIORMENTE VERIFICADO,
DECORRENTE DE ATAQUE ARMADO CONTRA UM
MEMBRO DAS NAÇÕES UNIDAS. OU SEJA, O
EXERCÍCIO DA LEGÍTIMA DEFESA PRESSUPÕE
SEMPRE UMA AGRESSÃO ARMADA INJUSTA (SEM
CAUSA) E UMA REAÇÃO ESTATAL IMEDIATA, LEVADA
A EFEITO PELA NECESSIDADE DE DEFESA,
NECESSÁRIA À PRESERVAÇÃO DE PESSOAS E DA
DIGNIDADE DO ESTADO. ESSA REAÇÃO DO ESTADO
DEVE DAR-SE POR MEIO DE UMA MEDIDA LÍCITA DE
DEFESA, MANIFESTADA DE MANEIRA ADEQUADA E
PROPORCIONAL AO ATAQUE OU AO PERIGO
IMINENTES.

(MAZZUOLI, 2019, p. 833)

c) Contramedidas

Não há, no Direito Internacional, um órgão central que aplique as sanções. Os Estados,
quando lesados, oportunizam ao Estado violador restituir, indenizar ou satisfazer aquele dano.
Caso não seja o caso, podem aplicar sanções, sobretudo pecuniárias, que são consideradas
contramedidas. Devem ser contramedidas proporcionais, limitadas no tempo enquanto durar a
violação.

d) Força maior e perigo extremo

No Direito Internacional, não se distinguem caso fortuito e força maior. Nos termos da minuta
de projeto da ONU, será excluída a ilicitude de um ato estatal em desacordo com uma
obrigação internacional se o autor do ato em questão não dispõe de nenhum outro modo
razoável, em uma situação de perigo extremo, de salvar a vida do autor ou vidas de outras
pessoas confiadas aos seus cuidados (art. 24, § 1º).
Imagem: Shutterstock.com

A ilicitude, porém, não será excluída se: (a) a situação de perigo extremo decorrer, unicamente
ou em combinação com outros fatores, da conduta do Estado que a invoque, ou (b) for
provável que o ato em questão crie um perigo comparável ou maior (art. 24,§ 2º) (MAZZUOLI,
2019).

e) Dever de cumprimento de jus cogens

Quando o ato internacionalmente ilícito é uma violação de jus cogens, existem consequências
especiais:

(i) há o dever de encerrar a violação, que, na verdade, é comum a todas as violações;


(ii) há o dever de não reconhecer como lícita nenhuma situação decorrente da violação de jus
cogens;
(iii) há uma pluralidade de legitimados para arguir a violação. Em outras situações, apenas o
Estado ofendido detém legitimidade para invocar a violação, podendo iniciar procedimento
perante cortes internacionais. No caso de violação de jus cogens, a comunidade internacional
como um todo é considerada legitimada.

Vale mencionar a proteção diplomática, que é um instituto distinto da responsabilidade


internacional, mas, ainda assim, muito próximos. A proteção diplomática tem por objetivo
proteger os nacionais do Estado que estão no estrangeiro e sofrem com duvidosas restrições
judiciais de direito interno do Estado estrangeiro.

Nesse caso, o Estado do nacional pode conceder o endosso, ou seja, a proteção diplomática,
de modo que a discussão migra do direito interno para o direito internacional, para ser julgada
por cortes internacionais. Tal instituto foi desenhado, sobretudo, para presos políticos. Existem
dois requisitos para a concessão do endosso:

O particular deve ser nacional do Estado para o qual requer a proteção diplomática; e

os recursos internos no Estado estrangeiro devem estar esgotados.

RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL DOS


ESTADOS

O professor Guilherme France faz um breve resumo sobre a responsabilidade internacional dos
Estados.

DOMÍNIO AÉREO

O espaço aéreo é dividido em dois regimes jurídicos:

Espaço aéreo atmosférico

Espaço aéreo extra-atmosférico, não atmosférico ou cósmico


A distinção entre espaço aéreo atmosférico e não atmosférico é bastante imprecisa.
Basicamente, a distinção entre os espaços aéreos é verificada a partir do veículo que ali
trafega. Se for um avião ou helicóptero, trata-se de espaço aéreo atmosférico. Se for um
satélite, espaçonave ou mesmo um balão atmosférico, trata-se do espaço aéreo cósmico.

Nas palavras de Mazzuoli:

A NATUREZA JURÍDICA DO ESPAÇO EXTRA-


ATMOSFÉRICO É DE RES COMMUNIS OMNIUM, QUE
PODE SER EXPLORADA PELOS DEMAIS MEMBROS
DA SOCIEDADE INTERNACIONAL PACIFICAMENTE E
PARA FINS LÍCITOS, SEM VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS
DO DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO.

(MAZZUOLI, 2019, p. 1.245)

O interessante é que, em voos intercontinentais, o avião pode estar acima do balão atmosférico
e, no entanto, será regido pelo espaço aéreo atmosférico, ao passo que o balão será regido
pelo espaço aéreo cósmico.

O espaço aéreo atmosférico se divide em:

ESPAÇO AÉREO SOBERANO


ESPAÇO AÉREO LIVRE

ESPAÇO AÉREO SOBERANO

Espaço aéreo acima do território terrestre e marítimo dos Estados. Nenhuma aeronave, salvo
as autorizadas pelo Estado, podem trafegar no espaço aéreo soberano. Inclusive, não há
direito de passagem inofensiva no espaço aéreo soberano.

ESPAÇO AÉREO LIVRE

Espaço aéreo acima do alto mar. Pode trafegar quem quiser.

Se não houver nenhuma norma jurídica regulando a situação e uma aeronave violar o espaço
aéreo de um Estado, a regra geral é o abate. As três convenções de Chicago de 1944
suavizam o direito de abate, ou seja, reduzem as suas possibilidades. Tais convenções
criaram o regime de navegação da aviação civil e estipularam o sistema das cinco liberdades,
justamente, com o objetivo de restringir as possibilidades de abate. Por meio desse sistema:

(...) O PARADIGMA DA SOBERANIA AÉREA (PELO


QUAL NADA PODE HAVER ACIMA DO ESTADO QUE
NÃO LHE DIGA RESPEITO) HAVERIA DE SUBSTITUIR-
SE PELO DA LIBERDADE MONITORADA OU VIGIADA
DO AR; A LIBERDADE, AINDA QUE SOB
FISCALIZAÇÃO, DEVERIA PREVALECER À IDEIA DE
SOBERANIA ABSOLUTA SOBRE O ESPAÇO AÉREO
CORRESPONDENTE À BASE FÍSICA DO ESTADO
(TERRITÓRIO E MAR TERRITORIAL). TAIS
LIBERDADES, PORTANTO, LIMITAM AS SOBERANIAS
COMPREENDIDAS DE PER SI, PARA O FIM DE
FACILITAR O TRÂNSITO DE PESSOAS E DE COISAS
AO REDOR DO MUNDO.

(MAZZUOLI, 2019, p. 1.240)

Trata-se de um sistema progressivo no sentido de que somente é possível ter a liberdade


subsequente se possuir a liberdade antecedente: só pode ter a segunda liberdade se detiver a
primeira, e assim sucessivamente. Portanto, aquele que possui a quinta liberdade possui todas
as demais antecedentes. As duas primeiras liberdades são de natureza técnica, e as três
últimas liberdades são comerciais:

Imagem: icao.int / Wikimedia Commons / Domínio Público

1. LIBERDADE DE SOBREVOO
Possível obter simplesmente sendo um membro das Convenções de Chicago de 1944. Por
meio dessa liberdade, os países permitem o sobrevoo de aeronaves estrangeiras sobre o seu
território soberano desde que respeitadas duas condicionantes: a) obedecer a determinadas
rotas pré-fixadas; e b) impossibilidade de sobrevoar determinadas áreas que são restritas por
razões de segurança nacional. Em 1984, foi assinado o Protocolo de Montreal. Todos os
Estados que forem membros da Organização da Aviação Civil Internacional (OACI) e do
Protocolo de Montreal de 1984 devem seguir a orientação de que, se uma aeronave se afastar
das rotas ou se inadvertidamente entrar em espaço aéreo restrito, ela não será derrubada, mas
terá o seu pouso forçado por meio de comunicação de rádio. No caso de ausência de resposta,
será possível o abate;

2. LIBERDADE DE ESCALA TÉCNICA

Todos os países membros da OACI podem, se assim quiserem, emitir uma declaração
unilateral dizendo que aceitam a liberdade de escala técnica. Tal liberdade permite que, se uma
aeronave tiver qualquer problema (como falta de combustível), ela poderá pousar nos países
que fizeram essa declaração. No entanto, nenhuma pessoa pode entrar ou sair do avião, a não
ser por autorização expressa da autoridade do país;

3. LIBERDADE DE DESEMBARQUE DE PASSAGEIROS


E BENS ORIUNDOS DO ESTADO PATRIAL;
4. LIBERDADE DE EMBARQUE DE PASSAGEIROS E
BENS DESTINADOS AO ESTADO PATRIAL;

Imagem: Shutterstock.com

5. EMBARQUE E DESEMBARQUE DE PASSAGEIROS E


BENS DENTRO DE UMA CONVENÇÃO DE TRÁFEGO

uma convenção de tráfego é um tratado multilateral celebrado entre todos os países que
possuem tratados bilaterais entre si. Por exemplo, o Brasil possui tratados bilaterais com a
França, a Alemanha e o Marrocos para permitir a terceira e quarta liberdades. Tais países
possuem, respectivamente, tratados entre si também para a terceira e quarta liberdades.
Nesse caso, os Estados poderão celebrar uma convenção de tráfego.

Para as liberdades três e quatro, é necessário um tratado bilateral entre os países que fizeram
a declaração de que aceitam escala técnica.

VERIFICANDO O APRENDIZADO

1. (2011 – CESPE/CEBRASPE – TRF 1ª REGIÃO – JUIZ FEDERAL


SUBSTITUTO) NO QUE TANGE AO ESPAÇO AÉREO INTERNACIONAL, À
NACIONALIDADE DAS AERONAVES E AO TRIBUNAL PENAL
INTERNACIONAL (TPI), ASSINALE A OPÇÃO CORRETA:

A) O TPI poderá impor à pessoa condenada pelos crimes que afetem a humanidade no seu
conjunto a pena de prisão perpétua se o elevado grau de ilicitude e as condições pessoais do
condenado o justificarem. Entretanto, esse tribunal poderá reexaminar a pena com vistas à sua
redução quando o condenado já tiver cumprido vinte e cinco anos de prisão.

B) O Estado exerce, sobre os ares situados acima de seu território e de seu mar territorial,
soberania, que só não é absoluta porque sofre restrição ditada por velha norma internacional: o
direito, reconhecido em favor dos aviões civis, de passagem inocente, que deve ser contínua e
rápida, proibindo-se tudo quanto não seja estritamente relacionado com o ato de passar pelo
espaço aéreo.

C) Segundo as regras internacionais, todo avião utilizado em tráfego internacional deve possuir
pelo menos uma nacionalidade, determinada por seu registro ou matrícula. A aeronave poderá
ter mais de uma matrícula — as de complacência —, mas, no caso de a companhia aérea ser
controlada pelo Estado, e não por particulares, cada avião deverá possuir uma nacionalidade
singular.

D) O TPI, instituição permanente, com jurisdição sobre as pessoas responsáveis pelos crimes
de maior gravidade e funções complementares às jurisdições penais nacionais, constitui corte
internacional vinculada à ONU, não dispondo de personalidade jurídica própria.
E) Nos termos do Estatuto de Roma, o TPI só poderá exercer os seus poderes e funções no
território de qualquer Estado-parte, sendo-lhe defeso agir em relação a atos praticados no
território dos Estados que não tenham subscrito o Estatuto.

2. SOBRE AS CAUSAS EXCLUDENTES DE ILICITUDE NA


RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL, PODEMOS AFIRMAR QUE A
SEGUINTE ALTERNATIVA NÃO SE TRATA DE UMA EXCLUDENTE DE
ILICITUDE:

A) Consentimento.

B) Legítima defesa.

C) Contramedidas.

D) Força maior e perigo extremo.

E) Violação de direitos humanos em razão de guerra civil.

GABARITO

1. (2011 – CESPE/CEBRASPE – TRF 1ª Região – Juiz Federal Substituto) No que tange ao


espaço aéreo internacional, à nacionalidade das aeronaves e ao Tribunal Penal
Internacional (TPI), assinale a opção correta:

A alternativa "A " está correta.

O instituto da passagem inocente é inerente do Direito do Mar, e não se aplica a aeronaves


estrangeiras que sobrevoem o espaço aéreo de outros países. Para isso, é necessária a
autorização desses, o que invalida a alternativa b. O art. 18 da Convenção de Chicago proíbe a
dupla nacionalidade: “Nenhuma aeronave poderá registrar-se legalmente em mais de um
Estado, podendo entretanto o registro ser mudado de um Estado para outro”, de modo que a
alternativa c está errada. Quanto à alternativa d, o TPI tem personalidade jurídica internacional
própria. De acordo com o art. 4º, item 1 do Estatuto de Roma: “O Tribunal terá personalidade
jurídica internacional. Possuirá, igualmente, a capacidade jurídica necessária ao desempenho
das suas funções e à prossecução dos seus objetivos”. A regra no âmbito do TPI é a
possibilidade de atuação do tribunal somente em território de Estado parte, mas pode exercer
poder em território de Estado não membro mediante acordo, (art. 4º, item 2, Estatuto de
Roma), estando errada, portanto, a alternativa e. Dessa forma, a alternativa a está correta.

2. Sobre as causas excludentes de ilicitude na Responsabilidade Internacional, podemos


afirmar que a seguinte alternativa não se trata de uma excludente de ilicitude:

A alternativa "E " está correta.

A resposta correta é a letra E. Quando o ato internacionalmente ilícito é uma violação de jus
cogens (direitos humanos), temos a excludente de ilicitude do dever de cumprimento de jus
cogens, na qual a comunidade internacional como um todo é considerada legitimada.

MÓDULO 4

 Analisar o sistema internacional de proteção dos direitos humanos

SISTEMA INTERNACIONAL DE PROTEÇÃO


AOS DIREITOS HUMANOS
O sistema internacional de proteção aos direitos humanos é composto por dois subsistemas e
cada subsistema possui diversos institutos. Os subsistemas são o Direito Internacional dos
Direitos Humanos (DIDH) e o Direito Internacional Humanitário (DIH).

O DIDH tem origem em 1945 com a Carta da ONU e com a Declaração Universal de Direitos
Humanos. O DIH é mais antigo, originado em 1864, com a criação da Cruz Vermelha.

Existem três correntes sobre como se estabelece a relação entre os dois sistemas:

Primeira tese

Defendida principalmente por militantes do DIH, entende que os dois ramos devem ser distintos
e devem ter o mínimo de relações possível, justamente para garantir a maior autonomia do DIH
— o DIH é considerado mais eficaz e não pode ser contaminado pelos modos de solução de
controvérsia do DIDH
Segunda tese

Entende que os dois ramos são dependentes, pois ambos devem ser para proteção de direitos
humanos, além de defender que direitos humanos em tempos de guerra e em tempos de paz
possuem o mesmo tratamento.

Terceira tese

Do professor Celso de Albuquerque Melo, defende o integracionismo, ou seja, que os dois


ramos têm de se relacionar, porque ambos estão versando sobre direitos humanos, mas é bom
salvaguardar a autonomia de um e de outro em alguns aspectos.

ATOS PROCESSUAIS DO DIREITO


INTERNACIONAL E PROTEÇÃO DOS DIREITOS
HUMANOS

O Direito Internacional dos Direitos Humanos se origina depois da Segunda Guerra Mundial,
com a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948. Tal declaração foi emblemática,
pois é uma declaração da Assembleia Geral da ONU e, portanto, soft law, mas é uma soft law
que tem um valor histórico alto, tanto que Norberto Bobbio, no livro a Era dos Direitos, afirmou
que havia se tornado hard law.

Há uma ligação direta entre as atrocidades da Segunda Guerra Mundial e a reação que se fez
em relação à matéria de direitos humanos (PIOVESAN, 2019). A origem desse fenômeno é
jusnaturalista, pois o Direito positivo alemão autorizou o holocausto.

A declaração de direitos humanos possui uma estrutura pré-definida. Inicia-se sempre com
uma cláusula de não discriminação ou um non discrimini. Em seguida, são elencados os
direitos humanos de primeira geração. A formulação clássica de que “são os direitos que
exigem uma abstenção do Estado” pode induzir ao erro, pois, mesmo os direitos negativos
podem exigir uma prestação e não uma simples abstenção do Estado. Por exemplo, o direito à
vida, que é um direito negativo de primeira geração, propõe que o Estado não pode matar seus
súditos, mas deve também prover segurança.
SOFT LAW

O soft law é um quase-direito. No Direito Internacional, é referido também como droit


mou, o qual corresponde a regras cujo valor normativo é limitado e que não são
juridicamente obrigatórias.

HARD LAW

O hard law é o oposto do soft law: lei rígida e refere-se a instrumentos e legislações
vinculativas reais.

Portanto, direitos de primeira geração não são totalmente absenteístas. Desse modo, para
realizá-los, não há um esforço financeiro tão grande como nos direitos de segunda geração,
mas eles também não são absenteístas. Os direitos de primeira geração têm como foco o
homem em abstrato, enquanto os direitos de segunda geração analisam o homem em
concreto. Os direitos de terceira geração, chamados direitos difusos e coletivos no direito
interno, são titularizados pelas gerações futuras, ou seja, seu titular é totalmente abstrato.

1948

No próprio ano de 1948, surge o primeiro tratado, norma de hard law, de direitos humanos.
Trata-se da convenção para a repressão do crime de genocídio, tratando o crime de genocídio
como sujeito à jurisdição universal, ou seja, qualquer país pode ter competência para, em
querendo, processar e julgar um genocídio ocorrido em qualquer lugar do mundo e contra
qualquer povo.

1951

Em 1951, surge a Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados. Posteriormente, foi criado o
Protocolo do Estatuto dos Refugiados e a Convenção Internacional sobre a Eliminação de
Todas as Formas de Discriminação Racial (1965), com o objetivo de solucionar o apartheid,
que ocorria na África do Sul e na Namíbia. O apartheid é um crime de jus cogens, sendo
considerado mais grave que o racismo. O apartheid é uma política oficial do governo de
segregação, enquanto o racismo é um crime que pode ser cometido por qualquer ser humano,
independente de aparato estatal.


1966

No ano de 1966, surge o Pacto Internacional sobre Direito e Dever Político, bem como o Pacto
Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Pouco tempo depois, surgem as
convenções regionais de direitos humanos.

1979

Em 1979, surge a Convenção de Eliminação de Discriminação contra a Mulher.

1984

No ano de 1984, foi criada a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas
Cruéis, Desumanas ou Degradantes. Em 1989, surge a Convenção sobre os Direitos da
Criança.

2003 E 2007

Nos anos de 2003 e 2007, respectivamente, foram criadas a Convenção de Mérida: Convenção
das Nações Unidas Contra a Corrupção e a Convenção dos Direitos das Pessoas com
Deficiência. Todas essas convenções formam o Sistema Internacional de Direitos Humanos.
Trata-se de um sistema, pois é uma lógica: inicialmente, houve uma declaração universal —
declaração interpretativa da Carta da ONU, com força convencional mesmo sendo soft law.

DEPOIS DE 2007

Posteriormente, surgiram convenções mais prementes, como as que combatem o genocídio e


o apartheid. Em seguida, foram criadas as convenções universais propriamente ditas, sobre
todos os direitos humanos – civis, políticos, sociais e econômicos.

As características dos direitos humanos são as seguintes:

UNIVERSALIDADE

UNIDADE

EFICÁCIA ERGA OMNES


IRRETROATIVIDADE

PRINCÍPIO PRO HOMINE

PRO HOMINE

Assegura, no conflito de normas, aquela que mais amplia os direitos e garantias


fundamentais da pessoa humana.

Tal concepção ocidental e moderna de direitos humanos é universalizável, mas não universal,
ou seja, pode ser estendida para todas as culturas, mas tem seu nascimento atrelado a
pressupostos culturais específicos do ocidente. Por isso, outras culturas aderem aos direitos
humanos, porém tomando como base outros pressupostos.

 EXEMPLO

Os muçulmanos ratificaram a Convenção de Eliminação de Discriminação contra a Mulher,


porém interpretam-na tendo como pressuposto a Sharia.

Determinar a existência de um núcleo duro e intangível de direitos humanos é complicado e


está sujeito a exceções culturais.

Por fim, vale ressaltar que Direitos Humanos é uma matéria que perpassa outros ramos do
Direito. Então, há, por exemplo, direitos humanos em tratados de comércio e tributação. Por tal
razão, é dificultoso tentar criar artificialmente um ramo de Direito Internacional dos Direitos
Humanos, pois é estudado por diversas outras disciplinas.
SISTEMA DE PROTEÇÃO INTERNACIONAL AO
ESTRANGEIRO

O direito costumeiro impõe a um Estado estrangeiro dois sistemas de possibilidades:

o primeiro é a garantia de standards mínimos de proteção ao estrangeiro; e

o segundo é a edição de lei nacional no Estado para equiparar o estrangeiro ao nacional,


que é, inclusive, o sistema adotado no Brasil — existe uma isonomia de tratamento entre
os direitos dos nacionais e dos estrangeiros, salvo algumas exceções relacionadas a
condições específicas da nacionalidade.

De um modo geral, uma violação a um estrangeiro que não seja pessoa internacionalmente
protegida não gera responsabilidade internacional para o Estado. A eventual violação a um
estrangeiro será resolvida de acordo com o Direito interno.

 ATENÇÃO

A partir do estudo da proteção do estrangeiro, mais especificamente do instituto da proteção


diplomática, fixou-se, como pré-requisito para a responsabilização do Estado em matéria de
direitos humanos, a necessidade de esgotamento dos recursos internos. Trata-se de uma regra
estabelecida pelo costume, de modo que a competência do Direito Internacional em matéria de
direitos humanos será sempre subsidiária, ainda que em caso de violações graves.

Existe uma discussão se a obrigação do esgotamento dos recursos internos seria um elemento
da própria ideia de responsabilização internacional em matéria de direitos humanos e, portanto,
teria natureza substantiva, ou se seria uma questão meramente processual.

As fontes regionais dos direitos humanos têm entendido que o esgotamento dos recursos
internos é uma pré-exigência meramente processual, e não substantiva. A Corte
Interamericana de Diretos Humanos, por exemplo, tem jurisprudência consolidada nesse
assunto. A ideia, para o sistema interamericano, é que devem ser esgotados os recursos
internos, se eles existirem, evidentemente, e se eles forem justos.
O sistema de proteção universal dos direitos humanos divide-se em sistema universal e
sistemas regionais. O sistema universal é caracterizado, basicamente, pelo monitoramento e
pela conciliação, não sendo um sistema judicial, ou seja, de solução de conflitos.

 VOCÊ SABIA

O sistema onusiano (da Carta da ONU) é considerado o primeiro sistema universal. A


Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 é considerada, por força de costume
internacional, interpretação autêntica da Carta da ONU e, por isso, teria força convencional.
Um dos principais órgãos da ONU, o Conselho Econômico Social, criou, em 1967, uma
Comissão de Direitos Humanos.

A Comissão de Direitos Humanos passou a receber dois gêneros de petições individuais


relacionadas a violações de direitos humanos, como se explica a seguir.

Imagem: Shutterstock.com

O Conselho Econômico Social (ECOSOC) editou a Resolução nº 1.235/1967, que condenou


veementemente as violações de discriminação racional, como o apartheid. Com base nessa
resolução, os Estados começaram a apresentar petições que denunciavam o apartheid.
Instaurava-se, no entanto, apenas um processo de apuração. O procedimento da Resolução nº
1.235/1967 não era confidencial.
Foto: Shutterstock.com

O ECOSOC editou também a Resolução nº 1.503/1970, um mecanismo permanente e


confidencial de recebimento de queixas. Nesse caso, a Comissão de Direitos Humanos
começou a receber petições de particulares, que denunciavam alguma violação a direitos
humanos, sem qualquer objetivo de reparação, mas buscando a constatação de violação
maciça e continuada desses direitos. Não era um sistema de solução de controvérsia, mas sim
de monitoramento e apuração.

Em 2006, a Comissão de Direitos Humanos foi transformada no Conselho de Direitos


Humanos. A antiga comissão era composta por 53 membros eleitos no ECOSOC para um
mandato de quatro anos, permitindo a reeleição. Na prática, os países que mais violavam
direitos humanos controlavam a Comissão. Com a criação do Conselho, passou a ser formada
por 47 de membros, sendo vedada a reeleição.

O Conselho de Direitos Humanos instituiu um sistema de relatórios periódicos público.


Na análise dos protocolos, o Conselho pode requisitar novas informações, inclusive para outros
organismos internacionais. Além do novo sistema de relatórios periódicos, manteve-se tanto o
sistema da Resolução nº 1.235/1967 quanto o da Resolução nº 1.503/1970.

Ao todo, oito convenções instituíram o sistema de relatórios periódicos, a ser realizado pelo
Conselho de Direitos Humanos, a saber:

A Convenção contra toda Forma de Discriminação Racial

O Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos


O Pacto Internacional de Direitos Econômicos e Sociais

A Convenção contra o Apartheid

A Convenção contra o Apartheid nos Desportos

A Convenção contra a Discriminação contra a Mulher

A Convenção contra a Tortura

A Convenção de Direitos da Criança

Tais tratados criaram comitês no Conselho de Direitos Humanos. Cada um deles é formado por
18 especialistas do assunto, eleitos para mandatos de quatro anos. São especialistas
independentes de seus Estados e contam com diversas garantias, como de inamovibilidade e
irredutibilidade de vencimentos, para garantir a independência. O comitê elabora um parecer
inicial e requisita novas informações, inclusive de outros organismos internacionais.

 ATENÇÃO

O Estado, assim que ratifica uma dessas convenções, tem o prazo de até um ano para criar um
relatório da situação dos direitos humanos em seu país relacionado ao tema da convenção
especificamente ratificada. Posteriormente, o relatório é entregue aos comitês do Conselho de
Direitos Humanos. O Estado, a partir desse momento, tem quatro anos para demonstrar a
evolução em matéria de direitos humanos. Esgotado tal prazo, deve apresentar um relatório de
dois em dois anos ao comitê respectivo.

Especificamente para a Convenção contra a Discriminação Racial, Pacto Internacional dos


Direitos Civis e Políticos e Convenção para Repressão da Tortura, existe um mecanismo
especial, chamado quasi-judicial, que funciona de duas maneiras:

petição de Estados contra outros Estados perante um dos três comitês para as
convenções referidas. Desenvolve-se um processo de conciliação;

petição de indivíduos contra Estados, desenvolvendo um processo de conciliação em


segredo. Para o uso de tal sistema, o Estado deve ser membro do referido pacto e deve
ter editado uma declaração unilateral aceitando a possibilidade de ser acionado por uma
petição individual.
SISTEMA DE PROTEÇÃO INTERNACIONAL AO
ESTRANGEIRO

O professor Guilherme France fala sobre o sistema de proteção internacional ao estrangeiro.

SISTEMAS REGIONAIS DE DIREITOS HUMANOS

Há os sistemas europeu, o norte-americano e o africano.

O sistema europeu e o sistema norte-americano surgiram na mesma época, sendo que o


sistema africano possui algumas peculiaridades em relação aos outros dois. Todos eles foram
pensados para ter uma estrutura idêntica:

UMA COMISSÃO
DE INQUÉRITO
UMA COMISSÃO
DE CONCILIAÇÃO

UMA COMISSÃO
DE MONITORAMENTO

Portanto, os sistemas teriam comissões para o recebimento de relatórios periódicos dos


Estados, podendo produzir pareceres a serem levados para outras instâncias do sistema, a fim
de apurar eventual dolo do Estado. Ainda, as comissões realizariam um filtro para os litígios a
serem levados à Corte envolvendo indivíduos — Estados poderiam levar seus casos
diretamente para a Corte Regional.

 COMENTÁRIO

Paralelo a esse desenvolvimento que estava ocorrendo em matéria de direitos humanos, um


movimento na Europa estava experimentando o processo da união das comunidades
europeias. Por conta do esforço integracionista, por meio do Protocolo 11, foi extinta a
Comissão Europeia, de modo que qualquer cidadão europeu pode levar seu caso diretamente
para a Corte Europeia de Direitos Humanos. No mesmo sentido, a Corte Africana permite o
acesso direto do indivíduo à Corte, de modo que apenas a Corte Interamericana permanece
com o requisito da admissibilidade pela comissão.

• SISTEMA NORTE-AMERICANO

O sistema norte-americano também tem duas instâncias de proteção de direitos humanos.

A carta da Organização dos Estados Americanos (OEA) não só estipula a obrigatoriedade de


defesa dos direitos humanos, como também cria a Comissão Interamericana de Direitos
Humanos. Portanto, a Comissão não foi criada pela Convenção Americana de Direitos
Humanos, que surgiu posteriormente à Corte.
A instauração de processo perante a Comissão é simples, podendo ser por meio de petição
individual ou, até mesmo, por telefonema. A Comissão, além de analisar os requisitos de
admissibilidade do caso para julgamento eventualmente pela Corte Interamericana de Direitos
Humanos, possui um sistema quase judicial, ou seja, buscará solucionar a lide antes de levar à
Corte.

O Estado pode litigar diretamente na Corte Interamericana, mas não os indivíduos, que se
submetem às seguintes condições de admissibilidades (PIOVESAN, 2019):

necessidade de esgotamento dos recursos internos. Tal requisito tem natureza


processual, portanto, não é analisado de forma rígida. Analisa-se se os recursos internos
são considerados justos;

necessidade de exame de admissibilidade temporal, verificando (i) se o ato do Estado


prescreveu, (ii) se foi realizado após o Estado aderir à comissão, (iii) se a matéria é
passível de julgamento pela Corte e (iv) se há litispendência internacional ou coisa
julgada.

VERIFICANDO O APRENDIZADO

1. ASSINALE A ALTERNATIVA QUE NÃO CORRESPONDE A UMA DAS


CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS HUMANOS:

A) Universalidade.

B) Unidade.

C) Eficácia erga omnes.

D) Irretroatividade.

E) Territorialidade.

2. SOBRE A CARTA DAS NAÇÕES UNIDAS, É CORRETO AFIRMAR:


A) Assinada em São Francisco, em 26 de junho de 1945, criou o Conselho de Direitos
Humanos, endossando a visão de que os direitos fundamentais são essenciais para a paz e o
desenvolvimento das nações.

B) O Conselho de Segurança é composto de 15 membros das Nações Unidas. São membros


permanentes: China, Alemanha, Rússia, Reino Unido e Estados Unidos. Os demais são eleitos
pela Assembleia Geral.

C) A admissão de qualquer Estado como Membro das Nações Unidas será efetuada por
decisão da Assembleia Geral, sem qualquer interferência do Conselho de Segurança;

D) A Corte Internacional de Justiça foi criada como o principal órgão judicial das Nações
Unidas, sendo composto por nove juízes.

E) Seus propósitos centrais são: (i) manter a paz e a segurança internacional; (ii) fomentar a
cooperação internacional nos campos social e econômico; (iii) promover os direitos humanos
no âmbito universal.

GABARITO

1. Assinale a alternativa que não corresponde a uma das características dos direitos
humanos:

A alternativa "E " está correta.

A resposta correta é a alternativa E. Justifica-se, portanto, a sua “correção” por não apresentar
um elemento caracterizador dos direitos humanos, eis que a territorialidade é justamente o
oposto. A principal característica dos direitos humanos: universalidade.

2. Sobre a Carta das Nações Unidas, é correto afirmar:

A alternativa "E " está correta.

A alternativa E é a única que está de acordo com o art. 1º da Carta das Nações Unidas:.
Quanto às demais alternativas: (a) O Conselho de Direitos Humanos foi criado em 2006; (b):
Alemanha não é um membro permanente; (c): Deve haver a Recomendação do Conselho de
Segurança, na forma do art. 4º da Carta; (d) A Corte Internacional de Justiça é composta por
15 juízes.
CONCLUSÃO

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste conteúdo, traçamos o panorama geral do tema do Sujeito de Direito Internacional, o qual
perpassa por diversos institutos tradicionais do Direito Internacional público. O conteúdo parte
do cerne para o desenvolvimento da disciplina: o Estado e seu desenvolvimento a partir da
personalidade jurídica internacional.

A partir dela, outras discussões foram suscitadas e esclarecidas: a personalidade dos


organismos internacionais e do próprio indivíduo são pautas relevantes ao tema. O
reconhecimento de Estado e governo é papel importante no contexto geopolítico e jurídico da
matéria. A existência do Estado leva também a outras duas discussões aqui tratadas:
imunidades e responsabilidade internacional; temas clássicos, mas que sempre estão na pauta
do cotidiano.

AVALIAÇÃO DO TEMA:

REFERÊNCIAS
ACCIOLY, H.; CASELLA, P. B.; NASCIMENTO, G. E. Manual de Direito Internacional
Público. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2019.

MAZZUOLI, V. O. Curso de Direito Internacional Público. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2019.

MELLO, C. D. A. Direito Internacional Econômico, Rio de Janeiro: Renovar, 1993.

PIOVESAN, F. Direitos Humanos e Justiça Internacional: um estudo comparativo dos


sistemas regionais europeu, interamericano e africano. 9. ed. São Paulo: Saraiva Educação,
2019.

REZEK, F. Direito Internacional Público – Curso elementar. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2018.

EXPLORE+
No filme O Terminal (Diretor Steven Spielberg, 2004), a questão da nacionalidade é explorada
com foco no personagem de Viktor Navorski (Tom Hanks). O filme conta a história do
desembarque de Viktor, cidadão de um pequeno país europeu, nos Estados Unidos. A viagem
é interrompida na alfândega, em virtude de um golpe de Estado que o país de origem do
personagem sofreu. O passaporte e visto do rapaz, portanto, não eram mais válidos, e ele não
poderia voltar ao seu país, pois as fronteiras haviam sido fechadas.

CONTEUDISTA
Ana Luíza Fernandes Calil

 CURRÍCULO LATTES

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