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Compreensão • Interpretação

1. Tendo em conta a primeira quintilha, refira que tarefa está a ser


desempenhada pela lavadeira.
2. Considere o passo «Canta porque canta, e é triste / Porque canta
porque existe; / Por isso é alegre também.» (vv. 3 a 5).
2.1 Explicite o significado destes versos.
3. Explique o desejo que o sujeito poético manifesta nos versos 6 a 8,
relacionando-o com o seu apelo final: «Quem me lava o coração?» (v.
15).
3.1 Indique a razão por que o eu afirma que, caso este desejo se
concretizasse, «perderia talvez / Os [seus] destinos diversos» (vv.
9 e 10).
3.1.1 Tendo em conta as conclusões a que chegou na
questão anterior, explique a que «unidade» (v. 11) se refere o
eu na terceira estrofe, indicando o motivo por que é
associada à atividade da lavadeira.
Gramática
1. De entre as hipóteses apresentadas, selecione a opção que permite
obter uma resposta correta.
1.1 O constituinte «triste» (v. 3) desempenha a função
sintática de Ficha 6
(A) complemento direto.
(B) predicativo do sujeito.
(C) predicativo do complemento direto.
(D) complemento oblíquo.

1.2 A oração «Eu perderia talvez / Os meus destinos diversos» (vv. 9


e 10) classifica-se como Ficha 7
(A) subordinada adverbial condicional.
(B) subordinada adverbial consecutiva.
(C) subordinante.
(D) coordenada explicativa.

1.3 O constituinte «uma grande unidade» (v. 11) desempenha


a função sintática de
(A) sujeito simples.
(B) modificador do grupo verbal.
(C) complemento oblíquo.
(D) complemento direto.

1.4 O constituinte «me» (v. 15) desempenha a função sintática de


(A) complemento direto.
(B) complemento indireto.
(C) sujeito simples.
(D) predicativo do complemento direto.
Escrita
1. Numa exposição, de cento e trinta (130) a cento e setenta (170)
palavras, aborde a temática da dor de pensar na poesia de Fernando
Pessoa ortónimo, fazendo referências concretas aos poemas estudados.
Manuscrito ou redigido em computador, planifique o texto e, no
fim, proceda a uma cuidada revisão. Não se esqueça de identificar
todas as fontes consultadas, em rodapé ou numa bibliografia.
Ficha 16
Ficha 22
Ficha 23
Ficha 24
Ficha 25
RESPOSTAS
Educação literária
1.
A lavadeira está a lavar a roupa no tanque, batendo com ela na
pedra para que fique bem limpa.

2.
O sujeito poético afirma que a lavadeira «[c]anta porque canta» (v.
3), na medida em que entoa uma melodia sem ter, de facto, motivos
para o fazer: «canta porque existe» (v. 4). Com efeito, esta figura não
pensa sobre a própria vida nem nas razões por que canta, dado que é
inconsciente. É por esse motivo que, aos olhos do eu, é triste: na sua
perspetiva, aqueles que não pensam são seres inferiores, dignos de
compaixão. Além disso, dado que são inconscientes, não podem ter
consciência da sua suposta felicidade. Por essa razão, não são
verdadeiramente felizes. Contudo, paradoxalmente, o facto de a
lavadeira cantar torna-a, aos olhos do sujeito poético, não apenas triste,
mas também alegre — dado que a sua inconsciência lhe permite
libertar-se da dor de pensar que o atormenta.

3.
Nos versos 6 a 8, o sujeito poético manifesta o desejo de, à semelhança
do que a lavadeira faz com a roupa, «lavar» os seus versos, isto é,
libertá-los da dor de pensar e da angústia que lhe está associada. É
precisamente com esta aspiração que o poema termina. Através do
verso «Quem me lava o coração?», o eu mostra a sua ânsia de se
libertar de um processo reflexivo que é fonte de um
sofrimento permanente.
3.1 Caso este desejo se concretizasse, era possível que o eu perdesse
os seus «destinos diversos» (v. 10), uma vez que deixaria de
intelectualizar as suas emoções e de se fragmentar permanentemente.
3.1.1 A «unidade» a que o eu se refere na terceira estrofe diz respeito
à ausência de fragmentação da lavadeira, decorrente da sua
inconsciência. Com efeito, esta figura feminina, por realizar uma
atividade mecânica, que não implica qualquer tipo de reflexão, vive, de
facto, na realidade — isto é, não reflete sobre a existência em geral nem
tem consciência de si própria. Esta ausência de razão, apesar de a
tornar inferior aos olhos do sujeito poético, permite-lhe ser una: «Há
uma grande unidade / Em, sem pensar nem razão, / E até cantando a
metade, / Bater roupa em realidade…» (vv. 11-14). De facto, apesar de
o eu se considerar superior à lavadeira, pelo facto de ser consciente, a
verdade é que o exercício contínuo da razão o impede de ser uno.

Gramática
1.
1.1 (B); 1.2 (C); 1.3 (D); 1.4 (B).

Escrita
1. Cenário de resposta:
A temática da dor de pensar é uma das questões centrais na poesia
de Fernando Pessoa ortónimo. O sofrimento inerente ao pensamento
tem origem na incapacidade, por parte do sujeito poético, de se libertar
de uma razão omnipresente que o impele sistematicamente a refletir
sobre a realidade e a intelectualizar as suas emoções. Desta forma, é-
lhe impossível desfrutar das suas vivências. A angústia provocada por
esta condição leva-o a tentar libertar-se da dor de pensar através da
aspiração à inconsciência — como sucede, por exemplo, nos poemas
«Ela canta, pobre ceifeira» e «A lavadeira no tanque».
No entanto, o eu tem plena consciência de que aqueles que são
inconscientes não podem ser verdadeiramente felizes, uma vez que
não têm consciência da sua suposta felicidade. Pelos motivos
apontados, a tentativa de libertação da dor de pensar acaba por
culminar no fracasso.
A criança que fui chora na estrada1
A criança que fui chora na estrada.
Deixei-a ali quando vim ser quem sou;
Mas hoje, vendo que o que sou é nada,
Quero ir buscar quem fui onde ficou.

Ah, como hei de encontrá-lo? Quem errou


A vinda tem a regressão errada.
Já não sei de onde vim nem onde estou.
De o não saber, minha alma está parada.

Se ao menos atingir neste lugar


Um alto monte, de onde possa enfim
O que esqueci, olhando-o, relembrar,

Na ausência, ao menos, saberei de mim,


E, ao ver-me tal qual fui ao longe, achar
Em mim um pouco de quando era assim.
Autógrafo de «A criança que fui chora na estrada» (BN Esp/E3 613-33).

Compreensão • Interpretação
1. Explique em que consiste o movimento de fragmentação do eu a
que assistimos na primeira estrofe.
1.1 Tendo em conta a resposta anterior, indique o motivo por
que a criança que o sujeito poético foi «chora na estrada» (v. 1).
2. Identifique o desejo que o eu exprime na primeira estrofe.
2.1 Indique o motivo por que manifesta esta aspiração.
3. Atente na segunda estrofe.
3.1 Aponte as duas razões por que não é possível ao sujeito
poético concretizar o desejo expresso na primeira estrofe.
4. Explicite a solução apresentada nas duas últimas estrofes para
resolver o impasse descrito na segunda estrofe.
RESPOSTAS
Educação literária
1.
O eu como que se fragmenta, porque se observa simultaneamente
na infância («A criança que fui chora na estrada.», v.1) e na idade
adulta («Deixei-a ali quando vim ser quem sou;», v.2).
1.1 O choro da criança transmite-nos simultaneamente a imagem do
seu desamparo, por ter sido abandonada, mas também da orfandade
do próprio eu adulto, que, tendo-se afastado de quem foi na infância,
foi reduzido a «nada».

2.
O desejo de voltar a ser quem fora na infância.
2.1 Porque no presente, ao contrário do que esperava quando
procurava construir a sua personalidade («vim ver quem sou»), se
apercebeu de que é nada».

3.
3.1 Porque considera que foi um erro ter-se afastado do seu eu-
criança e que agora não lhe é possível voltar a ser quem foi: «Ah,
como hei de encontrá-lo? Quem errou / A vinda tem a regressão
errada.» Além disso, o facto de no presente ter sido reduzido a
«nada» coloca-o num impasse («Já não sei de onde vim nem onde
estou»), que não lhe permite viver nem no passado, nem no presente:
«De o não saber, minha alma está parada.»

4.
A possibilidade de rememorar quem foi na infância e de, desta
forma, se afastar
do vazio que marca o seu eu-presente, recuperando alguns traços de
quando era criança: «E, ao ver-me tal qual fui ao longe, achar / Em
mim um pouco de quando era assim.» (vv. 13-14).
Apresente as suas respostas de forma bem estruturada.

Leia com atenção o poema de Fernando Pessoa ortónimo.

Não sei ser triste a valer

Não sei ser triste a valer


Nem ser alegre deveras.
Acreditem: não sei ser.
Serão as almas sinceras
Assim também, sem saber?

Ah, ante a ficção da alma


E a mentira da emoção
Com que prazer me dá calma
Ver uma flor sem razão
Florir sem ter coração!

Mas enfim não há diferença.


Se a flor flore sem querer,
Sem querer a gente pensa.
O que nela é florescer
Em nós é ter consciência.

Depois, a nós como a ela,


Quando o Fado os faz passar,
Surgem as patas dos deuses
E a ambos nos vêm calcar.

‘Stá bem, enquanto não vêm


Vamos florir ou pensar.

FERNANDO PESSOA, Poesia do eu,


edição de Richard Zenith, Lisboa, Assírio & Alvim, 2006.

1. Considere os versos 1 a 3 «Não sei ser triste a valer / Nem ser


alegre deveras. / Acreditem: não sei ser.»
1.1 Tendo em conta a globalidade do poema, explicite o
significado destes versos.
Fundamente a resposta através de transcrições textuais.
2. Indique o motivo por que o eu aprecia a possibilidade de assistir
ao desabrochar de uma flor. Ilustre a resposta através de transcrições
do texto.
3. Explicite as semelhanças entre o eu e a flor que são apresentadas
no poema, apontando o motivo por que são destacadas. Fundamente a
resposta através de citações textuais.

RESPOSTAS
Educação literária
GRUPO I — A
1.
1.1 O sujeito poético dirige-se aos seus interlocutores, afirmando que
«não s[abe] ser» (v. 3), pois não consegue ser «triste a valer» (v. 1), nem
«alegre deveras» (v. 2). Não é capaz de experienciar verdadeiramente
as suas emoções, uma vez que as sujeita constantemente a um processo
de intelectualização. É por este motivo que, nos versos seguintes —
«Serão as almas sinceras / Assim também, sem saber?» (vv. 4-5) —,
apresenta uma interrogação retórica em que se questiona sobre se as
almas sinceras, aquelas que não procedem à intelectualização das suas
emoções, também não saberão «ser» (v. 3). No entanto, existe uma
diferença de base entre ele e estas almas: enquanto o eu tem
consciência de que não tem acesso às suas verdadeiras emoções, estas,
ainda que padeçam do mesmo mal, não terão consciência disso, uma
vez que são inconscientes: «sem saber» (v. 5). A alusão à sinceridade
das almas inconscientes vem associar o processo de intelectualização
das emoções ao fingimento poético: ao serem intelectualizados, os
sentimentos são também transfigurados, acabando por se converter em
algo ficcional.
Assim, o eu tem consciência de que vive entre a «ficção da alma» (v.
6) e a «mentira da emoção» (v. 7), num processo de permanente
transformação dos sentimentos perpetrados pela razão.

2.
Ao ver uma flor desabrochar, o eu é invadido por uma sensação de
tranquilidade profundamente agradável: «Com que prazer me dá
calma / Ver uma flor sem razão / Florir sem ter coração!» (vv. 8-10).
Esta serenidade decorre não só do facto de a flor, ao contrário dele, ser
privada de emoções («sem ter coração», v. 10), mas também — e
sobretudo — do facto de esta não ter capacidade de pensar («sem
razão», v. 9). Com efeito, enquanto ser vivo inconsciente, a flor
transmite-lhe serenidade, na medida em que é um elemento que não é
acometido pela dor de pensar decorrente da permanente
intelectualização dos sentimentos. Assim, o eu, ao contemplar o
desabrochar
da flor, como que se liberta pontualmente da angústia que lhe provoca
o facto de a intelectualização permanente das emoções o impedir de
viver de forma plena.

3.
Apesar de, no poema, ser estabelecida uma clara oposição entre
o eu e a flor, são também apontadas semelhanças entre estes dois seres:
«Mas enfim não há diferença.» (v. 11).
Com efeito, tal como é inerente à condição da flor desabrochar,
também a capacidade de pensar faz parte da própria natureza
humana: «Se a flor flore sem querer, / Sem querer a gente pensa. / O
que nela é florescer / Em nós é ter consciência.» (vv. 12-15). Além disso,
ambos os seres, independentemente do facto de o Homem ser racional
e, portanto, em princípio, superior à flor, estão condenados à anulação,
que é dada no poema em termos profundamente violentos: «Depois, a
nós como a ela/ Quando o Fado os faz passar, / Surgem as patas dos
deuses / E a ambos nos vêm calcar.» (vv. 16-19). A animalização dos
deuses como que vem mostrar a dimensão cega destas entidades, bem
como do destino, que destrói cegamente todos os seres.
Deste modo, num primeiro momento, o poema parece apontar para
a inutilidade do pensamento, uma vez que seres pensantes e não
pensantes acabam por ser destruídos pela morte. No entanto, na
última estrofe, a conclusão vem reverter, em parte, a negatividade da
morte, na medida em que se aponta o pensamento como o processo
através do qual o Homem segue a sua natureza (tal como sucede à flor
quando desabrocha).

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