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INDIVIDUAÇÃO

“O Eu e o Inconsciente” – parte II
C.J. Jung

 A função do inconsciente
 Anima e Animus
 A técnica da diferenciação entre o eu e as
figuras do inconsciente
 A personalidade-mana

Profa. Ma. Mariana Carvalho Carminati


INDIVIDUAÇÃO
“Todo ser tende a realizar o que existe nele em germe, a
crescer, a completar-se. Assim é para a semente do
vegetal e para o embrião do animal. Assim é para o
homem, quanto ao corpo e quanto à psique. Mas no
homem, embora o desenvolvimento de suas
potencialidades seja impulsionado por forças
instintivas inconscientes, adquire caráter peculiar: o
homem é capaz de tomar consciência desse
desenvolvimento e de influenciá-lo. Precisamente no
confronto do inconsciente pelo consciente, no conflito
como na colaboração entre ambos é que diversos
componentes da personalidade amadurecem e unem-se
numa síntese, na realização de um indivíduo específico
e inteiro” (Nise da Silveira, p. 87).
INDIVIDUAÇÃO
“Individuação significa tornar-se um ser único, na
medida em que por “individualidade” entendermos
nossa singularidade mais íntima, última e
incomparável, significando também que nos tornamos
o nosso próprio si-mesmo. Podemos pois traduzir
“individuação” como “tornar-se si-mesmo”
(Verselbstung) ou “o realizar-se do si-mesmo”
(Selbstverwirklichung)” (Jung, p. 51).
INDIVIDUAÇÃO
Nesse sentido, faz-se necessário compreendermos que
individuação não corresponde ao que conhecemos como
individualismo. Este último se aproxima mais daquilo
que chamamos de egoísmo, tratando-se de um
centramento nas peculiridades individuais de cada ser.
Também não se trata de uma busca pela perfeição, como
nos adverte Nise da Silveira. Individuação, de forma
diferente, é um processo de desenvolvimento psicológico
inclusivo, no qual a personalidade amadurece e se
expande a partir da ligação entre o eu e o si mesmo.
VAMOS REVISITAR ALGUNS CONCEITOS?

EU (ego): é o centro da consciência; parte do psiquismo que se


incumbe em perceber, pensar, sentir e lembrar; é a consciência que
temos sobre nós mesmos, sobre o que consideramos ser.
CONSCIÊNCIA: é o conjunto de conteúdos psíquicos dos quais temos
ou tomamos consciência.
INCONSCIENTE: são conteúdos psíquicos sobre os quais não temos
consciência, e que podem manifestar-se de forma involuntária.
SI MESMO (self): é a totalidade da vida psíquica humana, considerado
por Jung como um centro no qual se conjugam consciente e
inconsciente.
A FUNÇÃO DO INCONSCIENTE
A partir da observação de materiais resultantes de suas experiências
clínicas, Jung compreende que os processos inconscientes podem
manifestar-se parcialmente por meio de “sintomas, ações, opiniões,
afetos, fantasias e sonhos”. Porém, ele nos adverte: “Não devemos,
entretanto, iludir-nos, pensando ter descoberto a verdadeira natureza do
processo inconsciente. Jamais conseguiremos ultrapassar o hipotético
“como se” (p. 52).
O que sabemos, pela evidência dos sonhos e de toda atividade onírica, é
que o inconsciente demonstra estar em contínua atividade. Além disso,
no cotidiano erramos ao falar ou até mesmo fazemos gestos ou ações sem
percebermos ou termos consciência. Sua natureza ou dimensão não
podem ser confirmadas.
“os processos inconscientes se acham numa relação
compensatória em relação à consciência” (...)
“consciente e inconsciente não se acham
necessariamente em oposição, mas se complementam
mutuamente, para formar uma totalidade: o si-mesmo
(Selbst). (...) “Os processos inconscientes compensadores
do eu consciente contêm todos os elementos necessários
para a auto-regulação da psique como um todo” (p. 53).

Jung cita alguns exemplos do que chamou de


relação compensatória nas páginas 54 a 58.
“Não devemos porém concluir, à base de tais compensações, que quanto
mais a consciência se embrenha nos problemas universais, tanto maior
deve ser o alcance das compensações produzidas pelo inconsciente. Há,
por assim dizer, um interesse legítimo e outro ilegítimo com os
problemas impessoais. São legítimas as excursões que surgem de uma
profunda e autêntica necessidade individual e ilegítimas as que
representam apenas uma curiosidade intelectual, ou a tentativa de
evadir-se de uma realidade desagradável. Neste último caso, o
inconsciente produz compensações demasiado pessoais e humanas, cuja
meta é a de reconduzir a consciência à realidade imediata. As pessoas
que se entusiasmam ilegitimamente com o infinito têm muitas vezes
sonhos ridículos e banais, que procuram abrandar tal exaltação. Assim é
que pela natureza da compensação, podemos tirar conclusões acerca da
seriedade e da autenticidade das aspirações conscientes” (Jung, p. 58).
E porque existe essa relação de compensação entre
consciente e inconsciente?

Acredita Jung que, não o insconsciente não é, em todos os casos, apenas


reativo. Ele nota que há uma espontaneidade e criatividade no
inconsciente, assim como a sua possibilidade de apropriar-se da direção
do processo psíquico. Como diria Paulinho da Viola “não sou eu quem
me navega, quem me navega é o mar”, ou seja, nem sempre os processos
psíquicos são guiados pelo eu.
Ao que tudo indica, o “motivo propulsor” desta compensação é o
“instinto de realização do si-mesmo” (p. 60). Desse modo, temos um
inconsciente ativo e autônomo, produtor do seu próprio mundo.
ANIMA E ANIMUS
Alma é geralmente é relacionada a algo interno e que se refere a nós
mesmos. Espírito é algo exterior a nós, estranho, e que pode nos
possuir.
Em termos sintéticos, Jung utiliza os termos anima e animus para
dizer, no primeiro caso, do feminino que habita aqueles que
designam como sexo masculino e, ao contrário, animus representa o
masculino daquelas que se consideram do sexo feminino.
Novamente ele nos convida a visualizarmos a totalidade no ser
humano, de modo que não há homem que seja exclusivamente
masculino e mulher que seja exclusivamente feminina. Feminino e
masculino compõem todos os seres, porém, o que geralmente ocorre
nas culturas ocidentais?!?!
ANIMA E ANIMUS
Presenciamos comumente a realidade de feminino e masculino
serem relacionados a características pessoais, de personalidade,
comportamento, e até mesmo características físicas, de aparência
Porém, o que Jung nos traz enquanto feminino, é o arquétipo, é a
forma que dá base para a criação de uma imagem de mulher. Assim
também, ele considera masculino como o arquétipo que dá base para
a criação de uma imagem de homem.
Histórica e culturalmente, imagens de mulher e de homem têm sido
criadas, desse modo, cada homem tem em seu inconsciente uma
imagem coletiva (e virtual) de mulher, anima. Cada mulher, tem em
seu inconsciente uma imagem virtual de homem, animus.
ANIMA E ANIMUS
A partir dos conceitos de anima e animus, Jung nos apresenta o
complexo anímico. Em outras palavras, ele demonstra que anima e
animus são complexos autônomos e inconscientes que podem
tomar posse do eu, caso ocorra a identificação do homem com sua
anima ou da mulher com seu animus. Desta forma, tais figuras do
inconsciente podem tomar por completo o lugar da persona e, do
mesmo modo que alienar-se da alma em detrimento da persona
não nos leva para a individuação, a personificação da anima ou
animus idem. É necessário que exista uma relação entre persona e
alma para que o indivíduo se complete.
ANIMA E ANIMUS
Jung acrescenta que “ o homem moderno deve diferenciar-se não só
da persona, como da anima. Parece que nossa consciência se volta
principalmente para fora (em consonância com a alma ocidental),
deixando as coisas interiores mergulhadas na obscuridade. No
entanto, tal dificuldade pode ser facilmente superada, se
considerarmos com espírito crítico e com toda concentração o
material psíquico da nossa vida particular e não apenas
acontecimentos exteriores”. (p. 74).
ANIMA E ANIMUS
Jung acrescenta que “ o homem moderno deve diferenciar-se não só
da persona, como da anima. Parece que nossa consciência se volta
principalmente para fora (em consonância com a alma ocidental),
deixando as coisas interiores mergulhadas na obscuridade. No
entanto, tal dificuldade pode ser facilmente superada, se
considerarmos com espírito crítico e com toda concentração o
material psíquico da nossa vida particular e não apenas
acontecimentos exteriores”. (p. 74).
ANIMA E ANIMUS
“A anima, sendo feminina é a figura que compensa a consciência
masculina. Na mulher, a figura compensatória é de caráter
masculino e pode ser designada pelo nome de animus”. (p. 81).
“ O animus não se apresenta como uma pessoa, mas como uma
pluralidade de pessoas” – exemplo da Court of Conscience, uma
assembleia de pais e outras autoridades que formula opiniões
incontestáveis e racionais (p. 83).
“Animus é uma espécie de sedimento de todas as experiências
ancestrais da mulher em relação ao homem, e mais ainda, é um ser
criativo e engendrador, (...), produz apalavra que engendra. (p. 85).
ANIMA E ANIMUS
“Anima e animus são complexos autônomos que constituem uma
função psicológica do homem e da mulher. Sua autonomia e falta de
desenvolvimento usurpa, ou melhor, retém o pleno desabrochar de uma
personalidade. Entretanto, já podemos antever a possibilidade de
destruir sua personificação, pois conscientizando-os podemos convertê-
los em pontes que nos conduzem ao inconsciente. Se não as utilizarmos
intencionalmente como funções, continuarão a ser complexos
personificados e nesse estado terão que ser reconhecidos como
personalidades relativamente dependentes. Por outro lado, não podem
ser integrados à consciência enquanto seus conteúdos permanecem
desconhecidos (...) só quando a consciência familiarizar-se
suficientemente com os processos inconscientes refletidos na anima, esta
última será percebida como uma simples função (p. 86).
ANIMA E ANIMUS
“A imagem da alma – anima no homem e animus na mulher – está
diretamente reportada com a compleição da persona de uma pessoa. ‘Se
a persona for intelectual, seguramente a imagem da alma será
sentimental’. Pois, como a persona corresponde à atitude habitual
exterior de uma pessoa, assim animus e anima correspondem à atitude
habitual interior. Podemos considerar a persona como uma função
intermediadora entre o eu e o mundo exterior e a imagem da alma como
a funçao correspondente intermediadora entre eu e o mundo interior.
(...) Persona e imagem da alma estão numa relação compensatória
mútua, e quanto mais arcaica, indiferenciada, violenta for e atuar a
imagem da alma, tanto mais firmemente a máscara, a persona separa o
ser humano da vida instintiva e natural. (Jacobi, 2013, p. 61).
PERSONA
“Para estabelecer contatos com o mundo exterior, para adaptar-
se às exigências do meio onde vive, o homem assume uma
aparência que geralmente não corresponde ao seu modo de ser
autêntico. Apresenta-se mais como os outros esperam que ele seja
ou ele desejaria ser, do que realmente como é. A esta aparência
artificial, Jung chama persona, designação muito adequada, pois
os antigos empregavam esse nome para denominar a máscara
que o ator usava segundo o papel que ia representar. O professor,
o médico, o militar, por exemplo, de ordinário mantém uma
fachada de acordo com as convenções coletivas, quer no vestir, no
falar ou nos gestos . Os moldes da persona são recortes tirados da
psique coletiva” (Nise da Silveira, p. 89-90).
SOMBRA
“A sombra (em sentido psicológico) faz parte da personalidade
total. As coisas que não aceitamos em nós, que nos repugnam, e
por isso as reprimimos, nós as projetamos sobre o outro, seja ele o
nosso vizinho, o nosso inimigo político, ou uma figura símbolo
como o demônio. E assim permanecemos inconscientes de que
abrigamos ele dentro de nós. Lançar luz sobre os recantos escuros
tem como resultado o alargamento da consciência. Já não é o outro
que está sempre errado. Descobrimos que frequentemente “a
trave” está em nosso próprio olho”. (Nise da Silveira, p. 91).
SOMBRA
“(...) a conscientização da sombra permite o conhecimento de
nosso outro lado, escuro, mas do mesmo sexo, a conscientização
da imagem da alma permite o conhecimento do sexo oposto em
nossa psique. Quando se reconheceu e descortinou a imagem, ela
para de atuar a partir do inconsciente e nos permite finalmente
diferenciar também essa parte do outro sexo de nossa psique,
incluindo-a na atitude consciente, por meio da qual se terá
alcançado um extraordinário enriquecimento dos conteúdos
pertinentes à nossa consciência, e com isso uma ampliação de
nossa personalidade”. (Jacobi, 2013, p. 63).
A TÉCNICA DA DIFERENCIAÇÃO ENTRE O
EU E AS FIGURAS DO INCONSCIENTE

• Tendência à concretização das fantasias e superação da


mesma;
• Contínua conscientização das fantasiais;
• Função transcendente;
• Anima e animus enquanto função de relação entre
consciente e inconsciente;
• Porque é importante individuar-se?
A TÉCNICA DA DIFERENCIAÇÃO ENTRE O
EU E AS FIGURAS DO INCONSCIENTE
“A contínua conscientização das fantasias (sem o que,
permaneceriam inconscientes), com a participação ativa nos
acontecimentos que se desenrolam no plano fantástico, tem
várias consequências, como pude observar em grande número de
casos. Em primeiro lugar, há uma ampliação da consciência, pois
inúmeros conteúdos inconscientes são trazidos à consciência. Em
segundo lugar, há uma diminuição gradual da influência
dominante do inconsciente; em terceiro lugar, verifica-se uma
transformação da personalidade”. (Jung, 1982, p. 95).
A TÉCNICA DA DIFERENCIAÇÃO ENTRE O
EU E AS FIGURAS DO INCONSCIENTE
“É claro que a modificação da personalidade não corresponde a
uma alteração da predisposição hereditária do indivíduo, mas
representa uma transformação da atitude geral. As separações
drásticas e oposições entre consciente e inconsciente, tão evidentes
nas naturezas neuróticas e carregadas de conflitos, dependem
quase que sempre de uma unilateralidade acentuada da atitude
consciente, que prefere de um modo absoluto uma ou duas funções,
relegando as outras indevidamente para o segundo plano. A
conscientização e vivência das fantasias determinam a assimilação
das funções inferiores e inconscientes à consciência, causando
efeitos profundos sobre a atitude consciente”. (Jung, 1982, p. 95).
A TÉCNICA DA DIFERENCIAÇÃO ENTRE O
EU E AS FIGURAS DO INCONSCIENTE
“É claro que a modificação da personalidade não corresponde a
uma alteração da predisposição hereditária do indivíduo, mas
representa uma transformação da atitude geral. As separações
drásticas e oposições entre consciente e inconsciente, tão evidentes
nas naturezas neuróticas e carregadas de conflitos, dependem
quase que sempre de uma unilateralidade acentuada da atitude
consciente, que prefere de um modo absoluto uma ou duas funções,
relegando as outras indevidamente para o segundo plano. A
conscientização e vivência das fantasias determinam a assimilação
das funções inferiores e inconscientes à consciência, causando
efeitos profundos sobre a atitude consciente”. (Jung, 1982, p. 95).
Anima e animus enquanto função de relação
entre consciente e inconsciente

Jacobi, 2013, p. 61
Porque é importante individuar-se?
A PERSONALIDADE-MANA
• Personalidade-mana – que possui qualidades mágicas e ocultas;
• A figura do Mago e a Grande Mãe;
• Corresponde a uma dominante no inconsciente coletivo;
• Quando o eu sucumbe à personalidade-mana;
• A dissolução da personalidade-mana e o processo de
individuação.
“O si-mesmo pode ser caracterizado como uma espécie de
compensação do conflito entre o interior e o exterior. Esta
formulação não será má, dado que o si-mesmo tem o
caráter de algo que é um resultado, uma finalidade
atingida pouco a pouco e através de muitos esforços.
Assim, pois, representa a meta da vida, sendo a expressão
plena dessa combinação do destino a que damos o nome
indivíduo: não só do indivíduo singular, mas de um
grupo, em que um completa o outro, perfazendo a
imagem plena” (Jung, p. 114).
Jacobi, 2013, p. 66
Jacobi, 2013, p. 67
“Expressão por excelência da totalidade psíquica é a mandala.
Mandala, palavra sânscrita, significa círculo, ou círculo mágico.
Seu símbolismo inclui toda imagem concentricamente disposta,
toda circunferência ou quadrado tendo um centro e todos os
arranjos radiados ou esféricos. O centro da mandala
representa o núcleo central da psique (self), núcleo que é
fundamentalmente uma fonte de energia. “A energia do ponto
central manifesta-se na compulsão quase irresistível para levar
o indivíduo a tornar-se aquilo que ele é, do mesmo modo que
todo organismo é impulsionado a assumir a forma
característica de sua natureza, sejam quais forem as
circunstâncias” (Nise da Silveira, p. 100).
Referências Bibliográficas
JACOBI, J. A psicologia de C. G. Jung: uma introdução às obras
completas. Petrópolis: Vozes, 2013.

JUNG, C. G. O eu e o Inconsciente (parte II). Petrópolis: Vozes,


1982.

SILVEIRA, Nise. Jung: vida e obra. Rio de Janeiro: Paz e Terra,


1981.

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