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21º.

CONGRESSO BRASILEIRO DE SOCIOLOGIA

SOCIOLOGIAS PARA PENSAR O CONTEMPORÂNEO

CP12. SOCIOLOGIA DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA

A TECNOCIÊNCIA VISTA SOB A PERSPECTIVA DOS VALORES: CONTROLE E


AUTONOMIA NAS NEUROCIÊNCIAS

Lucas Buosi
Doutorando em Sociologia (UnB)
Bolsista CNPq

Brasília, Janeiro de 2023


RESUMO

Neste texto apresento algumas considerações extraídas da minha pesquisa de


doutorado, em curso, que trata das perspectivas que os (as) pesquisadores(as) atuantes no
tópico das Interfaces Cérebro-Computador compartilham e fazem circular. Elas tratam
especificamente de uma exposição da bibliografia mobilizada, fortemente amparada pelas
contribuições de Hugh Lacey nos dois volumes de “Valores e atividade científica” (2008;
2010), que são esquematizadas de modo a apresentar um modelo de referência. Com isso,
destaco para a importância de se considerar o papel constitutivo da interação entre valores
sociais e cognitivos na consecução das atividades científicas e a necessidade de noções e
conceitos mais abrangentes que explicitem essa relação. Também identificou-se a necessidade
de reconhecer, do ponto de vista da pesquisa empírica, o caráter ambivalente e contraditório
que a realização de um estudo de caso envolve. Frequentemente as perspectivas de valor que
são efetivamente sustentadas são conflituosas e os riscos são muitos. Buscando estimular o
debate, também levantei algumas abordagens dos Estudos CTS que tratam da problemática
dos valores, particularmente o idioma da coprodução de Sheila Jasanoff (2004),
incorporando-as como recursos epistemológicos valiosos para testar enquadramentos teóricos
de alcance estrutural ou macro. Por fim, concluo que a interação entre valores sociais e
cognitivos implica diferentes noções sobre aspectos chaves da sociabilidade, sobre o que é
bom e adequado fazer com o conhecimento científico disponível e imaginado, e por isso são
elementos importantes de serem considerados pela pesquisa sociológica, especialmente
quando a tecnociência subjacente se pretende de fronteira ou disruptiva. Objetivando ilustrar
os argumentos desenvolvidos, utilizo de alguns trabalhos empíricos e históricos que tratam da
emergência das neurociências e neurotecnologias, de modo a situar a importância da busca
pelo controle sobre a natureza e para a promoção da autonomia dos indivíduos, que pode
adquirir, a depender do contexto, diferentes significados e consequências.
Palavras-Chave: Valores; Neurociências; Hugh Lacey; Controle; Autonomia.

I. O VALOR SOCIAL DO CONTROLE

Não é possível caracterizar as ciências por elas mesmas, muito menos podemos
explicá-las sem tecer diferenciações, já que a dinâmica de formação e consolidação delas não
é unitária. Há diferenças entre as ciências, elas são históricas, formaram cânones,
aperfeiçoaram diferentes métodos, produziram uma multitude de teorias e tecnologias e se
relacionam com diferentes modos de vida. Entretanto, é importante lembrar que a

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diferenciação não é apenas consequência dos méritos cognitivos. Portanto, as narrativas que
os cientistas mobilizam para falar do mundo como ele é, bem como as teorias que subscrevem
enquanto cientistas, são equivocadamente analisadas na ausência de uma atenção para as
expectativas e valores sociais. As ciências sustentam visões de mundo, na forma de
conhecimentos sistemáticos, que constituem representações cosmológicas de maior alcance.
Os Estudos CTS têm apontado para o caráter construído, contingencial e situado das
ordens sociais, incluindo as ciências. Os valores sociais, no sentido de ideais fundamentais
sobre o que é “bom” ou “digno”, nunca estiveram de fora dos projetos científicos e nem
poderiam estar. Viver em coletivos humanos implica estar imbricado em determinadas
perspectivas de valor, fundamentais para formação e reprodução de laços sociais que
atravessam gerações e que dão o tom aos processos de identificação, tornando com isso a vida
humana uma experiência biográfica e histórica.
As ciências não compõem um âmbito excepcional ou independente. Mesmo quando
elas são cientificamente rigorosas também são fundamentalmente pessoais, no sentido que
não podemos compreendê-las na ausência da agência humana. Isso não significa, tal como
aponta Lacey (2008; 2010), que as ciências são determinadas pelos valores sociais ou que elas
sejam menos importantes ou legítimas pelo fato de não serem neutras. O ponto é que os
valores cognitivos das ciências estão dialeticamente relacionados com os valores sociais, mas
não diretamente e sim através de uma dinâmica mediada de interação.
Ou seja, essa dinâmica mediada de interação possibilita a formação de um
conhecimento sistemático distinto, a partir do qual os pressupostos sobre o que é uma “boa
sociedade” e um “bom conhecimento” são legitimados. Tal dinâmica varia segundo as
culturas e por isso leva a diferentes modos de conhecer sistematicamente o mundo (ciências,
no plural) que são, em alguma medida, incomensuráveis (não redutíveis). Nesse texto,
partindo do argumento de Lacey (Ibid.), esquematizamos um modelo teórico que vê na
multiplicidade de valores sociais uma saída para o problema da neutralidade, sem com isso
negligenciar a importância dos resultados práticos das ciências. Nosso foco é a manifestação
da tecnociência, hegemônica entre as formas de conhecimento sistemático (científico). Em
meio a isso, tecemos algumas considerações e especulações sobre um campo específico de
aplicação, as neurociências.
Lacey reconhece como contingente a relação entre “estratégias” e “possibilidades”. É
característico das ciências expressarem os valores cognitivos num alto grau, pois sem isso não
haveria condições para a formação de relações de confiança e comunalidade entre
especialistas. Também é característico delas coibir a determinação do conhecimento pelos

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valores sociais, já que um conhecimento socialmente determinado não pode ser científico. Em
suma, Lacey salva as ciências como um empreendimento específico sem como isso
fetichiza-las, como se tivessem características sobre-humanas.
Os valores sociais, entre os quais o controle sobre a natureza é central para as
sociedades modernas, atuam restringindo o universo das estratégias consideradas viáveis pelas
instituições; ao passo que, num outro nível, os valores cognitivos, entre os quais a
imparcialidade e a autonomia são fundamentais, atuam no sentido da avaliação rigorosa das
possibilidades pela comunidade de cientistas atuantes num dado campo, algo que podemos
observar no forte compromisso com as práticas de experimentação dos conhecimentos e todo
o aparato de desenvolvimento tecnológico que elas implicam.
Segundo Lacey, de maneira esquemática, a interação entre estratégias e possibilidades,
entre os valores sociais e cognitivos, pode ser assim caracterizada: (a) as melhores estratégias
são aquelas provadas como cientificamente fecundas, inspirando um conjunto diversificado e
coerente de teorias e tecnologias; (b) as melhores possibilidades são aquelas de maior
significância social, amparando com isso dadas perspectivas de valor. Essa interação é
marcada pelo reforço mútuo entre valores cognitivos e sociais, que viabiliza a própria
construção do conhecimento científico ao mesmo tempo que legitima também as “condições
de contorno”. Em outras palavras, a dialética entre estratégias e possibilidades, ao produzirem
um modo específico de conhecimento propriamente materialista e hiper tecnológico, também
se atrela à dadas relações de poder (capitalistas, colonialistas, militaristas), redundando em
“negatividades sistêmicas" que são, em linhas gerais, indicativos da crise do projeto
dominante (crise ecológica e social), uma espécie de revés da busca pelo controle da natureza.
Por consequência, as neurociências não podem ser entendidas como um modo
universal de conhecimento e sim contextual. Elas, tal como outras, estão fortemente
relacionadas com as estratégias de tipo materialista, herdeiras de um movimento iniciado na
Europa em meados do século XVIII com a emergência do experimentalismo e utilitarismo,
que juntos criaram uma nova forma de aquisição sistemática de conhecimento que derrotou a
tradição aristotélica e tornou-se hegemônica no mundo contemporâneo. Essa hegemonia se
expressa pela restrição, no nível das estratégias, dos valores sociais que entram em conflito
com o projeto hegemônico de modernidade, que têm no valor social do controle a sua razão
de ser (dimensão ontológica).

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Figura 1: Mapa conceitual da interação entre valores sociais e valores cognitivos na tecnociência.

Em síntese, fazer ciência moderna é estar situado por uma relação dialética, mediada e
situada entre valores cognitivos (adequação empírica; consistência; simplicidade;
fecundidade; poder explicativo; certeza) e valores sociais (controle; individualidade;
liberdade; progresso), que não pode ser quebrada e sim disputada mediante a constituição de
outras estratégias. Para Lacey (Idid.), estratégias e possibilidades para a investigação
sistemática se reforçam mutuamente. Ou seja, certas possibilidades tornam-se mais
significantes que outras, fortalecendo dadas escolas, métodos e tecnologias. Ao mesmo
tempo, as estratégias dão provas de fecundidade, expressando num alto nível os valores
cognitivos, promovendo com isso valores sociais particulares.
Em outras palavras, a fecundidade da estratégia e a significância das possibilidades
são fenômenos interdependentes, com efeito a ausência ou fraqueza de uma delas nessa
dinâmica põe em risco a legitimação das condições de contorno e da própria ciência
decorrente. Essa dinâmica nos ajuda a entender, sem ceder a argumentos deterministas, a
importância das ciências para a transformação social e a manutenção da ordem, relacionando

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o nível das interações com o das estruturas sociais. Ela também estimula a formulação de
caracterizações sociológicas capazes de articular a problemática das (des)continuidades nos
processos (Como elas ocorrem?) com as do conflito (A que valores as ciências servem? De
que maneira produzem sofrimento?) num mesmo enquadramento, que têm a análise das
relações das expectativas e valores como princípio metodológico. Nesse sentido, o modelo
teórico proposto por Lacey objetiva estimular a formulação de estratégias alternativas e
complementares ao materialismo dominante.
Tendo isso em vista, nos perguntamos: quais são as perspectivas de valor que
sustentam a legitimidade das neurociências? Nesse ponto, os trabalhos de Lacey (Ibid.) e
Rose & Abi-Rached (2013) podem ser aproximados, de modo a ilustrar o argumento. Apesar
das neurociências terem surgido no contexto pós-guerra, em meados dos anos 60 nos Estados
Unidos da América e depois no continente europeu, a “visão neuromolecular do cérebro" é
anterior, traço importante da psicologia e psiquiatria que se formaram na virada para o século
XX (Rose; Abi-Rached, 2013, p.9).
Com efeito, as perspectivas de valor que têm o controle como elo central e que
buscam governar o cérebro através de sua “plasticidade” (Ibid., p.13), bem como a própria
“ética somática” que a acompanha (Ibid., p.22), estão relacionadas com o modo de
conhecimento científico predominante nas sociedades “liberais e avançadas” (Ibid., p. 237;
nota 1). Plasticidade neural diz respeito a um cérebro suscetível ao ambiente, potencialmente
um objeto a ser controlado de maneira mais efetiva, tendo como fim a promoção de uma ética
particular, segundo a qual cuidar de si significa se atentar para as relações constituintes entre
as diferentes partes do corpo. A busca por um ideal de funcionalidade e utilidade que, por
tanto, permeia as formulações mais contemporâneas das ciências do cérebro.
Rose e Abi-Rached (Ibid.), apesar de mencionarem em alguns momentos a
importância das estratégias materialistas não fazem delas um problema central. Já Lacey
(2010) menciona apenas ocasionalmente as neurociências, entretanto os destaques que fez
sobre os porquês da quase exclusividade das estratégias materialistas (as ciências são
frequentemente reduzidas a elas) nos parecem válidos, de algum modo complementares.
Seguindo a sua caracterização, as neurociências estariam radicalizando os pressupostos
relacionados ao controle da natureza e no limite redundando ou endossando “... teorias
metafísicas materialistas da mente”. Elas, por sua vez, são caracterizadas pela extrapolação
dos resultados de estudos para além das condições reais da ciência em direção à uma
concepção unitária de mundo, na qual todos os objetos existentes são passíveis de controle.
(LACEY, 2008, p.176-178; 2010, p.187).

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Nas estratégias materialistas as possibilidades não podem ser reduzidas aos objetos em
si, pois elas compreendem primordialmente métodos experimentais que permitem a
manipulação do mundo através de extensões pensadas e feitas para controlá-lo e transformá-lo
de maneira intencional. Nesse sentido, as neurociências não são, simplesmente, todo o
conhecimento sistemático sobre o cérebro em si. Antes, elas são uma das expressões de uma
dinâmica pela qual as tecnologias são formuladas, testadas e levadas aos seus limites, fazendo
do cérebro algo significantemente maior do que um órgão. Na prática, a atenção materialista
reforça os ideais acerca do controle, favorecendo com isso a ordem social dominante, mas
sem ser por ela determinada, já que a viabilização de seus resultados continua a depender da
execução em alto nível dos valores cognitivos (não determinados).
As estratégias materialistas possuem como componente primordial a experimentação
tecnológica e a busca incessante por um grau superior de controle. Sendo assim, as
neurociências incorporam no nível da seleção e restrição das abordagens (estratégias) algumas
noções acerca da natureza da pessoa humana. É patente que tais desenvolvimentos levaram a
uma melhor entendimento dos mecanismos biológicos subjacentes, mas também abriram
caminho, pois não contrapostos por estratégias alternativas suficientemente fortes, para uma
concepção reducionista do cérebro. Uma na qual é irrelevante os modos intencionais de
conhecer mundo, como se fossem desnecessários para um conhecimento sistemático,
humanidades e sociologias incluídas.
Ao falarem de sistema nervoso, funções cognitivas, circuitos neurais,
neurotransmissores, sinapses, potenciais de ação e tantos outros elementos empíricos
derivados da experimentação, os efeitos não estão limitados à resolução de enigmas. Através
de uma representação mais detalhada do cérebro, de um entendimento superior do mundo
físico, as neurociências também materializam valores. Todo trabalho científico envolve
relações de legitimidade e hierarquias entre redes sociotécnicas e projetos disciplinares. A
defesa da autorregulação das ciências não funciona sob bases morais neutras, supostamente
protegidas da influência de valores sociais. A avaliação exercida e trocada pelos cientistas,
segundo os mais altos padrões cognitivos, de modo a garantir a produção de um
conhecimento sistemático eficaz e confiável, não é um processo que acontece de maneira
isolada. Na verdade, as “condições de contorno”, estando em relação de correspondência com
o valores sociais dominantes, atuam pelas estratégias no sentido da formação das agendas de
pesquisa, sendo fundamentais para a priorização de perguntas, temáticas e métodos, o que
significa apoio institucional e interesse social.

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Assim, as condições de contorno e os valores sociais condicionam as perspectivas de
valor sustentadas pelos agentes numa dinâmica semelhante à que Neves (2014; 2020)
conceitualiza como “estrutura de expectativas”. Assim, junto aos valores acerca do que é
“bom” para a sociedade, também importam os que classificam as ciências, distinguindo-as
segundo a “relevância” ou a “centralidade” dos resultados para os campos ou disciplinas. Dito
isso, seguindo as reflexões de Lacey (Ibid.), podemos dizer que tanto estratégias quanto
possibilidades são internamente segmentadas por processos auto-infligidos, que tem a
avaliação da ordem de relevância um componente central da estrutura de expectativas dos
sistemas científicos.
Portanto, junto à restrição no nível das estratégias pelos valores sociais e da avaliação
no nível das possibilidades pelos valores cognitivos, haveria a classificação tanto das
estratégias quanto das possibilidades por uma dinâmica de hierarquização que combina
valores sociais e cognitivos em “Regimes” (NEVES, 2020). Tais regimes de valores, internos
à ciência, são auto-atribuídos, o que significa que dentro de um mesmo registro (por exemplo,
as estratégias materialistas e por consequência as neurociências) há relações que atuam no
sentido da formação de hierarquias (posições assimétricas) capazes de influenciar a circulação
do conhecimento. Por consequência, as disputas entre grupos no âmbito das estratégias de um
mesmo tipo, que compartilham um entendimento comum, a exemplo do materialismo
dominante, leva à formação de nichos. Em síntese, as estratégias e as neurociências são
classificadas segundo o valor social do conhecimento que os cientistas atribuem para seu
trabalho.
As relações entre fecundidade e significância variam em intensidade, o que implica
que em certos contextos as ciências apresentam um certo descompasso no nexo entre as
possibilidades e estratégias, especificamente (a) estratégias pouco frutíferas, tendo em vista a
consecução dos mais altos valores cognitivos, (b) ou possibilidades pouco significantes,
considerando os valores sociais dominantes. Tal descompasso torna determinadas ciências
periféricas no sistema, supostamente porta-vozes de um tipo de conhecimento secundário que
pode ser ignorado sem grandes prejuízos pelas ciências centrais.
Como dito, a forte afinidade entre o valor social do controle e as estratégias
materialistas, cientificamente fecundas em seu propósito de criar novas tecnologias, é em
algum sentido avassaladora e global. Isso resulta que as ciências pautadas, por exemplo, em
valores sociais alternativos (como a harmonia com a natureza), tendem a ter suas
possibilidades ajuizadas como pouco significativas, por isso pouco amparadas e regionais. Em
razão da dominância do valor do controle e da centralidade do desenvolvimento tecnológico

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para a legitimação das estratégias materialistas, tanto a presença como a ausência da
tecnologia tornaram-se, em termos sistêmicos, um qualificativo suficiente. Ela precisa ser
sempre avançada, orientada para a disputa pelas fronteiras tecnológicas, sendo essa a missão
principal da tecnociência.
As ciências centrais precisam, em razão do próprio regime dominante, ter como
principal vocação a aplicação tecnológica, preferencialmente naqueles problemas mais
estruturais e difíceis, de modo a realizar junto ao valor do controle também o valor social do
conhecimento, isto é: a relevância desses saberes para dado modo de vida. Tais valores se
expressam mais intensamente quando juntos, tornando essa dinâmica muito mais forte. Nesse
sentido, as condições de contorno legitimam as ciências segundo uma lógica de estratificação
que é internalizada em consonância com expectativas mais gerais sobre o desenvolvimento
tecnológico. Cabe lembrar que a ausência das condições de aplicação tecnológica nas
fronteiras, mesmo quando o conhecimento é significativo e potencialmente frutífero, é um
elemento que distingue os centros das periferias. Isso tem servido de embasamento para
afirmar, por exemplo, que uma dada instituição científica é melhor do que outra numa dada
localidade e também se tornou um indicador fundamental para a avaliação da ciência: a
intensidade inovativa de suas atividades.
Aquelas que superam a escala regional, tornando-se líderes regionais, players globais,
são aquelas que fazem o quê? São, cada vez mais, aquelas que buscam por objetos nas
fronteiras da tecnologia, que respondem a grandes problemas de controle e que sustentam
como missão fazer a aplicação, tradução, translação das ciências em soluções
economicamente viáveis e lucrativas. A dinâmica acerca da relevância possui uma história
que nos obriga a reconhecer as diferenças situacionais e contingentes, que tornam a ciência
um empreendimento conflituoso, no qual a formação de redes é essencial para diferenciar os
“melhores” dos “piores”. Sem isso é impossível os cientistas sustentarem, para outras esferas
da vida social, os juízos acerca de quem pode falar pela maioria dos pares ou pela comunidade
considerada “relevante”.
Reforçando, os valores cognitivos não são suficientes, apesar de necessários, para
explicar as hierarquias científicas. Nem todas as ciências periféricas são menos meritórias. Na
realidade, frequentemente as ciências periféricas são também ciências de qualidade
(exemplares dos mais altos valores cognitivos), só que o juízo acerca da relevância delas é
menos favorável pelas razões ligadas às condições de contorno. Na Figura 2, seguindo o
modelo de Lacey, representamos a dinâmica de centralização e periferização destacada por
Neves, de modo a elucidar as assimetrias particulares aos regimes de valores que são próprios

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à atividade científica. Os processos de centralização são caracterizados, segundo a formulação
que desenvolvemos aqui, por um forte nexo ou reforço mútuo entre estratégias e
possibilidades, o que redunda numa apreciação positiva do conhecimento científico
produzido, como sendo mais relevante e por isso constituinte ou canônico. Já os processos de
periferização indicam para uma espécie de descompasso (estratégias pouco frutíferas, tendo
em vista a consecução dos mais altos valores cognitivos; ou possibilidades pouco
significantes, considerando os valores sociais dominantes), que tornam tais conhecimentos
secundários ou opcionais, de modo que não constituem o cerne do desenvolvimento dos
campos e disciplinas científicas.

Figura 2: Mapa conceitual da relação entre valores sociais e valores cognitivos, representando as dinâmicas de
centralização e periferização do conhecimento.

Nesse sentido, Neves (2014; 2020) aponta para a necessidade de empreender análises
que não tomem o sentido geográfico como determinante, tal como se “Ocidente” fosse
sinônimo de “Centro” e por consequência o “Resto” de “Periferia”. As práticas científicas e
suas redes não podem ser reduzidas a localidades que correspondem, perfeitamente, a
territórios demarcados. A presença de um endereço, num dado estado e cidade, não basta.
Mapear centros e periferias é um exercício sociológico que implica processos que

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transcendem tais fronteiras, isso porque a localização é efeito de dinâmicas mais amplas de
diferenciação, em interdependência com valores que circulam de outras maneiras, sendo a
internet hoje um canal de primeira ordem.1 Não basta dizer o nome dos atores, é necessário
formular interpretações que deem conta dos regimes e perspectivas de valor, condições
subjetivas fundamentais para o engajamento propriamente científico.
Agora, podemos formular uma hipótese mais conclusiva sobre as neurociências. Em
resumo, as estratégias materialistas encontram nas condições dominantes de contorno
(capitalistas, frequentemente militaristas) os valores sociais capazes de (in)formar redes que
compartilham de um certo senso do que é “bom” para a sociedade e “relevante” para as
ciências, com isso legitimando o conhecimento decorrente dessa dinâmica. Esse é o quadro
geral, em razão das forças sociais em jogo. Portanto, as condições de legitimação das
neurociências, por serem historicamente precedentes à sua emergência nos anos 60, não são
exclusivas delas. O mesmo vale para a importância delas para as ciências como um todo, já
que só podem ser compreendidas tendo em vista a configuração valorativa mais geral, que
tornam seus produtos inteligíveis, passíveis de integração num conhecimento mais
sistemático. Nesse sentido, as explicações oferecidas pelas neurociências tornaram-se bem
sucedidas não só por uma questão de competência, que é essencial, mas porque também:
[q]uanto mais completamente esse controle moderno manifesta-se nas
instituições sociais, tanto mais nossa vida prática e experiência vivida
tornam-se dominadas por objetos produzidos pela tecnologia, e assim,
explicáveis em seu funcionamento pelo entendimento materialista. O
desdobramento dessa dialética introduz mudanças práticas no mundo da
vida, de modo que, cada vez mais, tratá-lo com sucesso requer estar
informado pelo entendimento materialista, pois converte-se num mundo em
que o controle manifesta-se em alto grau. A ciência exerceu um papel na
produção do mundo da experiência vivida, que ela mesma deve explicar.
(Lacey., 2008, p.172)

A relação entre valores sociais (o controle) com determinados tipos de estratégias


(materialistas) e determinadas inclinações políticas (capitalismo democrático) formam um
tipo situado e histórico de conhecimento (tecnociência). Essa relação torna as neurociências,
tal como outros campos reconhecidos como de “fronteira”, ciências simultaneamente
rigorosas (em razão da amplitude dos desafios e limites tecnológicos) quanto significativas
(relevantes para os cientistas e importantes para a sociedade). Por isso, estão autorizadas a
conceber e governar determinados objetos e problemas, inclusive coisas que não estão sob o

1
As transformações mais recentes nas dinâmicas de circulação do conhecimento científico, possibilitadas por
ferramentas de pesquisa pela internet que burlam os chamados paywalls de grandes editoras, bem como o
compartilhamento em nuvem de obras para usuários que não podem pagar por elas, atuam no sentido da
formação de redes de autores e leitores muito mais extensa e diversificada.

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controle efetivo delas. Frequentemente elaboram promessas otimistas, às vezes triunfalistas,
de que os avanços tecnológicos irão dissipar incertezas, com isso fazendo avançar os esforços
por integração e explicação teórica para âmbitos conclusivos não só para as ciências, mas para
a vida humana no geral.
As neurociências vinculadas ao modo dominante de conhecimento estão subscritas a
uma concepção ideológica de modernidade que entende os efeitos da tecnociência como
uniformizadores, supostamente convergindo as culturas num mesmo telos. Assim, na medida
em que o mundo, o corpo e o cérebro humano são entendidos segundo uma linguagem hiper
realista; percebido segundo os elementos constituintes da matéria e das interações mais
basilares; tornadas passíveis de interferência pela condução da experiência vivida pelas
tecnologias de controle; passa-se a identificar como ciências centrais aquelas que expressam
intensamente os valores predominantes nessa estrutura social. Essa digressão sobre a
precedência dos valores sociais explicita os limites do argumento acerca da neutralidade das
ciências e aponta também para o caráter problemático das interpretações que negam a
importância das diferenças culturais.
Charles Taylor (1995) aponta como um equívoco a caracterização da modernidade,
dum ponto de vista teórico, como uma dinâmica de superação das visões espirituais. A
modernidade assim entendida implicaria uma teleologia da convergência entre os diferentes,
uma marcha em direção à uma “prisão etnocêntrica” onde os “outros” terminariam parecendo
com os “modernos”, também liberados das antigas crenças por “verdades centrais” [kernel
truths]. Quando, na prática, a modernidade está numa relação de simbiose com as direções
morais antecedentes, principalmente as situadas pelas relações de poder. Isso não significa
que a tecnociência seja compatível com os dogmas teístas, mas que ela não pode dispensar o
recurso à noções acerca da dignidade e do bem. Faz parte da própria condição humana ter de
sustentar valores, sem alguma continuidade na circulação deles o que veríamos seria rupturas
a todo momento.
Nesse sentido, a vida cultural dos povos humanos, os modos de vida e os valores que
sustentam, atravessam eras e ligam gerações. É claro que transformações ocorrem, mas não de
maneira abrupta, como se num único evento todos aqueles valores mais prezados por uma
dada coletividade, numa dada época, pudessem ser substituídos por uma composição
totalmente inédita. Uma negação absoluta desse tipo sequer é possível, pois ignora o fato de
que aprendemos a imaginar o mundo que efetivamente é e deveria ser através de relações
comunitárias, com outras pessoas que frequentemente possuem crenças, visões espirituais e
cosmológicas, que orientam a conduta delas. Nesse sentido, os conceitos de estrutura de

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expectativas ou regime/perspectivas de valores que falamos aqui está longe de ser uma
criação puramente racional ou desencantada do mundo.2
Nesse sentido, as neurociências não estiveram e não estão alheias aos modos
simbólicos de interação configurados no nível das práticas cotidianas, que são coletivamente
tomados como essenciais ou representativos de uma determinada cultura. As ciências
modernas são feitas por diferentes composições na dialética entre valores cognitivos e valores
sociais, porém são hegemonizadas, por razões históricas, pelas estratégias materialistas. Em
um sentido muito particular, a tecnociência é vítima de seu próprio sucesso. A consequência
imediata dessa hegemonia é que as estratégias enquadradas por outros valores, como a
harmonia ou o respeito à natureza, são geralmente tidas como inviáveis ou românticas, até
mesmo pré-científicas. Com efeito, o valor social do controle acaba forçando a multiplicidade
potencial de projetos de conhecimento numa mesma direção ontológica, uma percepção
unitária sobre o mundo.
O que chamamos de ontologia Taylor (Ibid.) chama de "entendimento de fundo”
[background understanting] ou, tomando de empréstimo o conceito de habitus de Pierre
Bourdieu, como “entendimento corporificado” [embodied understanding]; algo muito
próximo ao que Lacey conceitualiza, dando um maior detalhamento, como “perspectivas de
valor”, ou que Neves chama de “regimes”. Esses autores interpretam criticamente a noção de
modernidade, considerando as dinâmicas históricas, sociais e culturais que constituem essa
classificação, afastando-a de conotações fundacionistas, privilegiando uma compreensão dos
processos de identificação subjacentes. Essa linha de argumentação implica um esforço
teórico que dê conta das diferenças e não se guie pelo determinismo tecnológico que
caracteriza a modernidade dominante, também pode pode ser aproximada com a abordagem
de Aurora Fredriksen e colaboradores (2014), que formularam um protocolo de pesquisa para
o estudo dos valores numa perspectiva CTS.
Em síntese, Fredriksen et al. propõem uma agenda de pesquisa centrada nas formas de
circulação dos valores que, segundo sugerem, estão cada vez mais financeirizadas, inscritas
numa dinâmica ascendente de commodificação, para a qual tudo deve ter um valor monetário,
facilmente incorporável ao sistema capitalista. O objetivo é interpretar os processos de
2
Desenvolvendo o argumento de Lacey e Taylor, as perspectivas de valores sustentadas pelos agentes estão em
parte e casualmente ligadas, nunca em absoluto, como um todo indiferenciado. Não vivemos a cultura como uma
entidade unificada, fechada à novas inclusões, contradições e reconfigurações. As pessoas se relacionam com os
valores de diversas maneiras, o que redunda em biografias que refletem tais diferenças. As transformações
dessas perspectivas são flexíveis, mas também compreendem processos de longa duração nos quais regimes de
valores, muitas vezes antagônicos, inspiram lutas sociais, engajando pessoas na defesa e construção de uma
“boa” sociedade.

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produção de novas entidades de valor, através da identificação dos “dispositivos de cálculo”
[calculative devices], das “tecnologias de cálculo” [calculative technologies], “assemblages
institucionais” [institutional assemblages] e “enquadramentos discursivos” [discursive
framings]; considerando as diferenças no tocante às relações de poder (com seus diversos
recortes, como etnia, classe, gênero, escolaridade e etc.). Assim, o protocolo desses autores
pretende responder a dois tipos de questões. A primeira diz respeito à identificação dos
agentes, a segunda à contextualização das causas, conforme uma compreensão sociológica das
dinâmicas de continuidade e transformação das hierarquias sociais.
Michèle Lamont (2012), num sentido semelhante, mas objetivando a comparação
entre estudos de caso, aponta para a necessidade de diferenciar os processos globais dos
subprocessos, os quais seriam como as peças de um quebra-cabeças maior. Os processos
globais correspondem a macro-definições das comunidades simbólicas, já os subprocessos as
micro-dinâmicas de pertencimento e exclusão. Para estudá-los, Lamont propõe entender os
processos sociais mais básicos em termos de “avaliação e valoração" [evaluation/ valuation],
“trabalho de fronteira” [boundary work], “comensuração” [commensuration], “diferenciação”
[differentiation], “fechamento” [closure] e “exploração” [explotation]. Já os subprocessos são
abordados segundo um modelo dinâmico, no qual a categorização e a legitimação são tipos
analíticos fundamentais. Tal como Fredriksen e colaboradores (Ibid.) o objeto são os
processos de definição e circulação de valores, particularmente através de “tecnologias para
estabilização/ institucionalização” [technologies for stabilization/ institutionalization], que
fundamentam noções de pertencimento à determinadas “fronteiras simbólicas” ou “sistemas
classificatórios”. Lamont (Ibid., p.13), também aponta, corroborando com a hipótese da
commodificação apresentada por Fredriksen, que “[...] o fundamentalismo de mercado está
exercendo fortes pressões homogeneizantes nas identidades coletivas acerca de definições
compartilhadas sobre o que define uma vida digna”.
Apesar das abordagens propostas por Fredriksen e Lamont serem intelectualmente
estimulantes, iremos explorar mais a fundo o idioma da coprodução de Sheila Jasanoff (2004),
visando um exercício interpretativo e uma discussão da relação entre valores cognitivos e
sociais nas neurociências, em razão de sua coerência interna, simplicidade e ampla adesão por
diferentes pesquisadores dos Estudos CTS. Com isso, pretendemos detalhar, no nível dos
eventos e fenômenos históricos, a dialética valores sociais e cognitivos apresentada antes,
acrescida da dimensão do valor social do conhecimento (relevância e irrelevância).

13
II. O IDIOMA DA COPRODUÇÃO

Jasanoff começa “The co-production of science order” (2004) destacando que as


ciências possuem “assinaturas características", particularidades decorrentes da relação delas
com a cultura e a política. De modo geral, o que caracteriza as ciências é: (i) o alto nível de
incerteza, decorrente dos riscos ontológicos, como a crise ambiental e social; (ii)
unacontability, a desresponsabilização efetiva dos atores que deveriam ser consequentes; (iii)
velocidade, um mundo em constante transformação espacial e simbólica. Já os agentes
humanos, embebidos nessas ciências, compartilham de uma “experiência pessoal” [personal
experience] marcada pelo: (i) ceticismo, alienação, desconfiança para com o espaço público;
(ii) pela redução, padronização e classificação dos indivíduos segundo ideais de normalidade
e desviância; (iii) pela desestabilização decorrente da multiplicidade de visões opostas, de
progresso e ruína; (iv) pelo sentimento de estar “perpetuamente desequilibrado” [perpetually
off balance].
Entretanto, apesar dessa comunalidade, subjazem múltiplas narrativas e vozes, padrões
imprevisíveis e contraditórios, que tornam a representação de uma “homogeneidade global”
um recurso analítico equivocado. Assim, “modernidade” é um projeto que implica uma
fenomenologia particular do conflito, segundo Jasanoff (2004) uma forma de “engajamento
sistemático” [systematic engagement] no qual as dimensões da “legitimidade percebida” [felt
legitimacy] e das possibilidades práticas estão intimamente relacionadas com diferenças de
poder.
Tal engajamento têm na junção da ciência com a hiper tecnologia um mecanismo
central em ambas as dimensões, reunindo agentes políticos que ao ordenarem a natureza (num
sentido muito ao próximo de Lacey, ao falar do valor do controle), também fazem o mesmo
com a sociedade, reconfigurando-a, “co-produzindo novas formações sociotécnicas” ou
“estados particulares de conhecimento” [particular states of knowledge]. Nesse sentido,
Jasanoff (Ibid.) sugere uma agenda empírica de estudos de caso que levem em conta a
coprodução dessas novas formações, destacando a necessidade de explicitar as ambiguidades,
contradições e contingências.
Em síntese, a tecnociência, apesar de ter uma dinâmica dominante, não é um todo
uniforme. Podemos melhor compreendê-la pela ideia de interpenetração entre cultura e
autoridade. Para falar dessa interpenetração a autora (Ibid.) não sugere uma teoria, no sentido
de uma explicação mais ou menos global de como as coisas aconteceram a exemplo de Lacey,
mas um idioma para elaborar “biografias científicas” [scientific biographies], que podem estar

14
inspiradas, por exemplo, pelas Teorias Feministas, pelos Estudos CTS ou pela Sociologia do
Conhecimento. O objetivo, com isso, é trabalhar com os fenômenos sociais de maneira mais
aberta, sem a imposição de um a priori e sem tratá-los como “caixas pretas”. Nesse sentido,
Jasanoff destaca 4 perguntas essenciais para os estudos de caso que mobilizam o idioma da
coprodução:
[...] que tipos de entidades científicas ou arranjos tecnológicos podem ser
considerados como coproduzidos e com quais elementos da ordem social;
quais são as principais vias pelas quais essa coprodução ocorre; como os
processos de coprodução se relacionam com relatos mais ortodoxos de
mudança técnica ou política em C&T e outras disciplinas; e quais métodos e
abordagens são mais adequados para investigar casos de coprodução? (Ibid.,
p.18)

No que se refere à inspiração teórica do idioma da coprodução há a articulação de duas


linhas de pensamento muito relevantes para os Estudos CTS. De um lado a linha
“constitutiva” [constitutive] que tem como objeto a formação de sistemas de pensamento e
significância, que reúne a filosofia da ciência (Taylor), a sociologia do conhecimento (Escola
de Edimburgo), a antropologia dos híbridos (Latour) e por fim as “teorias do Estado” [State
Theory]. Do outro, uma linha “interacional” [interactional], mais preocupada com a
problemática da autoridade e credibilidade, associada à tradição pragmatista norte-americana,
que remonta John Dewey. Jasanoff (Ibid.) tende a dar uma maior atenção para as
contribuições das teorias do Estado, especialmente o tratamento que Benedict Anderson e
James Scott dão aos processos macro de identificação social, como a nacionalidade, pelo
conceito de “comunidades imaginadas”. Com esse movimento, a autora propõe pensar as
redes sociotécnicas sob o prisma dos conflitos morais e políticos, das desigualdades e das
hierarquias, que estariam sendo negligenciadas por parte dos construtivistas, especialmente
Latour.
Entretanto, Jasanoff, diferentemente de Anderson e Scott, dá um maior abertura para
as “políticas ocultas da subversão” [shadow politics of subversion] que fazem parte da vida
cotidiana e do conhecimento tácito, e que em algum sentido resistem aos projetos de
dominação, inclusive por de dentro das ciências centrais. Com efeito, o idioma da coprodução
é pensado para capturar, no âmbito dos micro-processos, as nuances e ambiguidades, de modo
que a própria dialética entre valores sociais e cognitivos, hegemonizada pelo controle segundo
Lacey, pode ser tomada como hipótese, de modo a ser testada.
Podemos colocar o modelo que viemos construindo até aqui sob prova, acrescentando
nele as noções-chave do idioma da coprodução, objetivando com isso interpretar os discursos
científicos e leigos sobre a neurociência sem com isso determiná-los à um discurso unitário,

15
como se o controle da natureza fosse a única coisa de relevante que têm acontecido. Ao
mesmo tempo, a aproximação de Jasanoff (Ibid.) com o marco de uma análise dos valores
possibilita, tal como Lamont (Ibid.) e Fredriksen (Ibid.) fizeram, a sistematização da pesquisa
empírica através de uma atenção processual para a coprodução entre valores cognitivos e
sociais.3 Isso oferece uma formatação para a pesquisa empírica, possibilitando a comparação
de diferentes “relatos coproducionistas” que:
concebidos dessa forma, evitam as acusações de determinismo natural e
social que apareceram nos recentes debates acadêmicos em torno do campo
dos estudos de ciência e tecnologia, incluindo as infames “guerras
científicas” dos anos 1990 (Sokal e Bricmont 1998 ; Koertge 1998; Gross e
Levitt 1994). A ciência, no quadro coproducionista, não é entendida como
um simples reflexo da verdade sobre a natureza nem um epifenômeno de
interesses sociais e políticos. Em vez disso, a coprodução é simétrica na
medida em que chama a atenção para as dimensões sociais dos
compromissos e entendimentos cognitivos, ao mesmo tempo em que ressalta
os correlatos epistêmicos e materiais das formações sociais. (JASANOFF,
2004, p.3. Grifo nosso)

Nesse sentido, os relatos coproducionistas são uma forma de manter um idioma


comum aos estudos CTS. Por isso, pode nos ajudar a testar o argumento acerca do “valor
social do controle” e sua imbricação nas “estratégias materialistas”, já que é pensando para
relacionar-se com a dimensão empírica (estudos de caso), enquanto as teorias dinâmicas,
diferencialistas e centradas nos valores-expectativas oferecem um enquadramento de nível
epistemológico, macrossocial.4 A adoção do idioma da coprodução não se deve apenas a sua
ampla adesão pelos Estudos CTS. Talvez o mais importante seja a consistência de Jasanoff
numa agenda de pesquisa sobre o sistema biotecnológico, e as correspondências da
constituição desse sistema com um outro, consideravelmente menor e menos influente, o
“neurotecnológico”. Ou seja, a vantagem do idioma da coprodução, tal como articulado por
Jasanoff, é a proximidade entre esses objetos.5 A seguir, concluindo, tecemos algumas
considerações particulares sobre neurociências.

3
São instrumentos do idioma da coprodução: a “feitura” [making] de “identidades”, “instituições”, “discursos” e
“representações”; a descrição histórica e processual segundo os temas da “emergência/estabilização”,
“controvérsias/contestações”, “estandardização/padronização” e “enculturação/ajustamento”; a articulação dos
domínios “social”, “material”, “cognitivo” e “normativo”.
4
É claro que, a realização de estudos de caso podem seguir diferentes formatações, a exemplo de Lamont e
Fredriksen et al., e que tecer novos diálogos é essencial, no sentido de entender como podem ser incorporados.
5
A centralidade do valor social do controle pode ser a causa dessa união difusa entre diferentes pesquisadores
em torno de dadas agendas, possibilidades e critérios de avaliação. Entretanto, ao mesmo tempo, as
neurociências/tecnologias se fragmentam, especialmente em razão das dinâmicas centradas no valor social do
conhecimento (relevância) e das diferenças culturais, que redundam em perspectivas de valor que aproximam o
controle de outras esferas (a medicina) e valores (a autonomia).

16
III. APONTAMENTOS FINAIS

Tanto a emergência do sistema biotecnológico, quanto das neurociências ou sistema


neurotecnológico, foram influenciados por uma conjuntura social que situou as Políticas para
Ciência e Tecnologia (C&T) durante a Guerra Fria segundo uma visão linear de progresso da
humanidade, na qual o amplo apoio a ciência básica era entendido como primordial para o
desenvolvimento tecnológico, elemento-chave para o aumento do bem-estar social. Em outras
palavras, o projeto disciplinar, de formação de campos organizados segundo questões básicas
sobre a natureza das coisas, era reforçado mediante o argumento de que o avanço e
diversificação da ciência (a especialização) elucidaria problemas, assim tornando possível a
produção de soluções para questões e objetos que causam algum tipo de mal-estar coletivo e
individual em sociedades capitalistas, liberais e democráticas.
O controle sobre a natureza visado implica a constituição de conhecimentos
sistemáticos sobre aspectos fundamentais da existência material do mundo, em toda sua
complexidade e incerteza. Considerando que o objetivo mais importante é a aplicação
tecnológica sempre superior, a visão de ciências que predominava durante a Guerra Fria
tendia a estabilizar numa linguagem política, pretensamente neutra, incentivos para a
institucionalização e expansão das ciências sob justificativas que tinham no utilitarismo as
suas bases filosóficas e morais. Assim, as biotecnologias e as neurotecnologias, ao serem
concebidas pela narrativa hegemônica como mais desafiadoras, também produziram e fizeram
circular representações, especialmente expectativas e imaginários sobre novas possibilidades
de aperfeiçoamento social e individual, viabilizadas pelo controle do cérebro e do corpo.
Tecnologias que estão a serviço da utilidade. Seja as primeiras demonstrações no
âmbito das ciências básicas da estrutura do DNA nos anos 50, para o caso das biotecnologias;
ou da plasticidade do cérebro nos anos 60 e 70; ambas teriam como consequência o
desenvolvimento de novas aplicações tecnológicas capazes tornar a vida mais produtiva. A
questão seria, então, em quanto tempo e sob qual custo a utopia do controle tecnológico pode
ser alcançada. Entretanto, a ambivalência tem ganhado maiores espaços, de modo que não são
só as promessas que habitam o imaginário tecnocientífico. Juntamente ao uso “produtivo” das
ciências também multiplicavam-se os riscos existenciais, temores de que o avanço das
ciências sobre a vida redundariam em ameaças comparáveis ao domínio do átomo pela Física.
Qual foi a resposta para essa ambivalência, já nos anos 90, com o fim da Guerra Fria?
A busca mais intensificada pelas tecnologias que então façam o controle dos riscos
decorrentes e que preservem com isso o “progresso”, enquanto fazem multiplicar os temores.

17
As ciências da vida ocupam uma posição privilegiada em razão de seu objeto, entre elas as
neurociências são tidas geralmente como uma especialidade com implicações maiores,
importantes para as ciências como um todo. Seja nas promessas de se erradicar a fome, curar
pacientes com doenças hereditárias pela via da engenharia genética; as altas expectativas
acerca da criação de novas moléculas milagrosas, capazes de promover o equilíbrio emocional
e a condução racional de si, com o avanço da farmacologia; bio e neuro implicam mutações
que deslocam parcialmente as estratégias materialistas da busca pelo controle da natureza para
o controle dos riscos que incidem e ameaçam a própria vida humana.
As implicações dessa mutação para a sociabilidade são constitutivas, pois se tornam
em alguma medida inescapáveis. Em outras palavras, a tecnociência têm assumido para si
mesma os riscos como uma segunda natureza ou um âmbito a ser mitigado através de
inovações que tornem mais controladas as trocas pretendidas entre as diversas materialidades.
Um ideal de bricolagem no qual todas as arestas serão aparadas; uma obra em que, olhando de
perto, todos os elementos fundamentais foram identificados e efetivamente articulados numa
representação adequada. O corpo humano, seja no âmbito das biotecnologias ou das
neurotecnologias, é frequentemente o espaço em que a principal síntese é feita, onde o
conhecimento sobre benefícios e malefícios são avaliados e autorizados a coexistir. Edição e
terapia genética, psicotrópicos, dispositivos neuronais e tantas outras tecnologias se
aproximam nesse ponto, todas elas possuem poderes e riscos que são legitimados por valores
sociais.
A importância da intersecção entre a tecnociência e as problemáticas relativas à saúde
e a doença têm repercutido de maneira consistente na produção das ciências humanas e
sociais, especialmente sob a influência de Michel Foucault (2010). Segundo o autor, as formas
contemporâneas de se governar a vida seriam marcadas pela subjetivação de uma ética
pautada pelo cuidado de si. Os efeitos dela repercutem em práticas cotidianas que buscam
tirar o máximo proveito das potencialidades do corpo, de modo a promover um sujeito
socialmente desejável e produtivo, entre as quais as práticas de consumo são crescentes. A
dinâmica da produção capitalista desses bens (as terapias, os fármacos e dispositivos
médicos), tão essenciais para o alívio do sofrimento e o cuidado dos doentes, são também
centrais para a produção de corpos mais saudáveis, ou seja, está longe de ser unidimensional.
Isso porque ela subentende perspectivas mais amplas, fragmentadas e ambivalentes:
frequentemente idiossincráticas no nível das interações e ao mesmo tempo ordenadas em
aspectos centrais.

18
Um desses valores centrais em nosso tempo é a competição, intensamente promovida
pelas instituições governamentais, escolares e empresariais, apregoada como justa e benéfica
pelos ideólogos do neoliberalismo (ROSE; ROSE, 2016; STEVENS; MAASEN; SUTTER,
2007; JASANOFF, 2019). Seguindo essa linha, muitos estudos têm dedicado atenção para o
estudo das práticas de biopoder sob uma perspectiva crítica da responsabilização do indivíduo
e da utopia de uma “saúde perfeita” (ORTEGA, ZORZANELLI, 2010, p.73-74;
ZORZANELLI et al., 2014). Por outro lado, fármacos e dispositivos médicos são de suma
importância para pacientes que demandam cronogramas intensos de cuidados. Eles passam
muitas vezes a reconhecer na biomedicina certas garantias intersubjetivas de que sua
autonomia será zelada quando for, eventualmente ou cronicamente, prejudicada por uma
doença ou lesão. Essa expectativa, de que haverá algo a ser feito, de que alguma recuperação
é possível, de que talvez seja possível viver normalmente, mesmo que não exista uma cura
definitiva, cria muitas vezes as condições intersubjetivas necessárias para que a pessoa lide
com um contexto particular de ruptura, ligando-a com outras pessoas através de relações de
solidariedade. Com isso produzindo nelas uma projeção reconfortante de que há alguma
continuidade possível em suas biografias; de que elas não podem ser reduzidas à doença ou
condição física; de que a sociedade lhes deve cuidado.
Nesse sentido, as tecnologias médicas são incorporadas pelos sujeitos enquanto
artefatos dotados de agência. Ao confiar ou ter confiado seu corpo às instituições científicas e
médicas, sob a expectativa de uma melhora palpável de suas condições de viver com alguma
“autonomia”, emerge historicamente alguém com interesses próprios e inalienáveis, que se
percebe como uma “soma” (NOVAS; ROSE, 2000). Essa autonomia, enquanto um valor, nos
parece estar em disputa. Pensemos, por um lado, o caso de pessoas com a síndrome de
Parkinson que são beneficiadas pela estimulação elétrica do cérebro (Deep Brain Stimulation
- DBS), reduzindo com isso a frequência dos tremores. Por outro lado, nas situações em que o
sujeito utiliza uma dada substância ou dispositivo para se sentir “mais que bem”, visando
desempenhar um conjunto de funções num patamar “ótimo” de performance a exemplo dos
universitários estudados por Margit Anne Petersen e colaboradoras (2015a; 2015b) que
utilizam Adderall, Ritalina e Modafinil para “salvar tempo” e “afastar a preguiça”, com o
intuito de superar a performance de seus colegas e tirar boas notas. O que está em jogo, nesse
último caso, são vantagens competitivas. A autonomia, no primeiro caso, envolve uma
dimensão coletiva que parece evocar um ideal de solidariedade. No segundo, a autonomia
envolve tornar-se mais útil, superar a performance de terceiros.

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Mas, o que situações tão díspares no que concerne aos usos possuem em comum?
Seguindo a caracterização de Carlos Novas e Nikolas Rose (2000), subjacente a esses
exemplos está uma ética que constrói nossa percepção e entendimento do corpo no nível
somático, para o qual a caracterização materialista, no sentido proposto por Lacey, é
fundamental. Soma, tal como entendido por eles, é um processo de identificação no qual o
sujeito ativamente reconhece em si potencialidades materiais que juntas compõem um sistema
biológico complexo, um organismo, que torna a vida humana possível. Nesse sentido, um
organismo não é a adição de diferentes partes ou componentes, mas sua complexa
combinação em sistemas que estão funcionalmente inter-relacionados. Assim, o conhecimento
sobre as bases genéticas e epigenéticas da vida, a formação de diferentes tecidos e órgãos, a
interação do organismo com seu meio ecológico e social, juntos informam a produção de uma
identidade somática que estaria se tornando mais comum no Ocidente, para a qual a ideia de
controle dos riscos, produzidos pelo projeto dominante de modernidade, é essencial.
Essa ética tem como correspondente, no nível das interações, a produção de um
“indivíduo” geralmente preocupado com o registro e monitoramento de seus indicadores
vitais; atento para os processos mais fundamentais do corpo e suas implicações sistêmicas no
organismo; e algumas vezes confiante de sua capacidade de agir de maneira preventiva e
precisa nesses processos. Somatizar significa, então, conectar as diferentes escalas, do
molecular ao organismo como um todo; entender as suas relações intrínsecas e extrínsecas
com o meio ecológico e social; administrar as circunstâncias que decorrem da própria
vulnerabilidade de se estar vivo.
Os sentidos particulares atribuídos a identidade somática dizem respeito, fortemente,
ao peso das estratégias materialistas para a constituição das ciências da vida e o impacto delas
na medicina. Elas oferecem um enquadramento de representações e práticas que permite
responder a questões ontológicas, interagindo com concepções sobre o que uma pessoa
humana é, permitindo com isso padronizar subjetividades. Ao mesmo tempo, articulam um
contexto produtor de sentido, dinâmicas nas quais intencionalidades circulam, ajustando
coletividades, redes de humanos e não humanos, em torno de valores sociais compartilhados.
Assim, somatizar, sendo um modo de viver e se conduzir no mundo, implica instituições
capazes de legitimar as possibilidades que derivam dessa forma particular de controle, de
torná-las sob alguns aspectos mandatórias. Frequentemente elas se confundem com
concepções mais gerais do que é bom, de modo que a disponibilidade de uma tecnologia
médica pode ser vista, em algumas situações, como um direito, compondo uma espécie de
mínimo social acerca do que é essencial para a dignidade humana; em outros como uma

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vantagem, um privilégio de alguns poucos que possuem os recursos materiais e simbólicos
para acessá-la.
Se “[...] a orientação para o bem não é um elemento extra-opcional, algo que podemos
aceitar ou não a vontade, mas um requisito de nossa condição de self como uma identidade.”
(TAYLOR, 2013, p.96), isso significa que a identidade somática não é feita apenas de
argumentos objetivos e materiais, puramente cognitivos. Os conselhos de cuidado que são
dados pelas ciências da vida possuem uma história, implicam relações que acontecem em
espaços compartilhados de narração e interlocução. Quando se fala sobre os corpos,
localizando-os materialmente no mundo, também se constrói relações práticas de
compromisso simbólico, moral e político entre diversos atores e instituições, inclusive as
ciências.
Estando o cérebro no centro das atenções, talvez o órgão mais valorizado pela
medicina contemporânea, ele muitas vezes ocupa o lugar de fim último de outras intervenções
e sugestões de cuidado. Práticas como o exercício físico regular, a alimentação orgânica, a
prática de meditação e etc. são sugeridas pelo apelo à saúde cerebral. Algumas vezes com o
intuito de potencializá-lo num dado aspecto, de torná-lo uma vantagem monetizável. Assim, o
controle da capacidade de foco e de gestão das emoções em direções positivas, o
aperfeiçoamento de habilidades relacionadas com a memória, o domínio na criação de boas
abstrações ou de regras formais (como as presentes na matemática e lógica) e entre outras
competências que o cérebro possibilita, tornam-se um biocapital a ser entendido e
instrumentalizado. (MELONI, 2019)
Em suma, o argumento aqui defendido, inspirado pelo debate em curso nas
humanidades sobre o lugar da neurociência e de seus artefatos no mundo contemporâneo, a
exemplo das ICCs, é o de que o valor social da autonomia é disputado pelos cientistas,
desenvolvedores e usuários, significado de diferentes maneiras, e que ao se combinar com o
valor do controle sobre a natureza forma perspectivas nas quais a ciência serve a diferentes
fins. No seu significado mais hegemônico, a autonomia vem acompanhada com a
mercantilização da vida, a promoção da produtividade pelo investimento num corpo ótimo, a
construção de um sujeito de alta performance, somático. No seu significado mais antigo, ao se
ligar com a prática do cuidado, vem acompanhada de um ideal de solidariedade, de dever para
com as pessoas em situação de vulnerabilidade. Tal dinâmica, na qual diferentes perspectivas
de valor são formadas e através das quais os agentes humanos se engajam em discussões
sobre o que é “bom” ou “digno” para a sociedade evidencia para a necessidade de análises e

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estudos de caso mais detalhados sobre a coprodução de novas formações sociotécnicas que a
tecnociência (no geral) e as neurociências e neurotecnologias (no particular) envolvem.

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