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LIderes
TOMAM
˜
Decisoes
Ruins
Neurociência revela A TOMADA DE DECISÕES está no cer-
ne de nossa vida pessoal e profissional.
o que distorce o Todo dia tomamos decisões. Algumas
julgamento do líder. são pequenas, domésticas, inócuas. Ou-
tras são mais importantes e afetam a
Veja como manter vida, o meio de sustento e o bem-estar
um juízo claro. dos outros. Aqui e ali, inevitavelmente
erramos. O fato é que decisões de enor-
me importância tomadas por gente in-
Andrew Campbell, teligente e responsável com a melhor
informação disponível e a melhor das
Jo Whitehead e intenções são, às vezes, completamente
equivocadas.
Sydney Finkelstein
Vejamos o caso de Jürgen Schrempp,
presidente da Daimler-Benz — que pro-
moveu a fusão da Chrysler e da Daimler
apesar da oposição interna. Nove anos
depois, a Daimler foi obrigada a entre-
Shout
uma firma de private equity. Steve Rus- Nas páginas a seguir iremos descre-
sell, presidente da rede de farmácias EM RESUMO ver as condições que dão ensejo a erros
britânica Boots, lançou uma estratégia de julgamento e explorar maneiras de
» Decisões de um líder são fruto
de serviços de saúde para diferenciar as a organização embutir salvaguardas no
de dois processos basicamente
farmácias da Boots da concorrência e inconscientes — o que neurocien- processo decisório para reduzir o risco
crescer com novas atividades, incluindo tistas chamam de reconhecimento de erros. Para concluir, mostraremos co-
odontologia. Infelizmente, os gerentes de padrões e marcadores emo- mo duas empresas importantes aplica-
da Boots não estavam capacitados pa- cionais. Embora costumem produ- ram a abordagem descrita. Para contex-
ra triunfar na prestação de serviços de zir decisões rápidas e eficazes, tualizar isso tudo, no entanto, é preciso
saúde — e muitos desses mercados tra- esses processos podem ser dis- primeiro entender como, exatamente, o
ziam pouco potencial de lucro. A estra- torcidos pelo interesse próprio, cérebro humano formula um juízo.
tégia contribuiu para a saída prematura pelo apego emocional ou por
memórias enganadoras.
de Russell da presidência. O brigadeiro- Como o cérebro tropeça
general americano Matthew Broderick, » Todo gerente precisa achar ma- Para tomar decisões, dependemos basi-
chefe do Centro de Operações do De- neiras sistemáticas de identifi- camente de dois processos predetermi-
partamento de Segurança Interna dos car fontes de viés — o que os nados. Nosso cérebro avalia o que está
Estados Unidos e responsável por aler- autores chamam de “condições ocorrendo por meio do reconhecimento
de alerta” — e criar mecanismos
tar o presidente Bush e outras autorida- de padrões e reagimos a tal informação
de proteção para incluir mais análi-
des do governo caso o furacão Katrina — ou a ignoramos — devido a marca-
se, maior debate ou uma governan-
rompesse os diques em Nova Orleans, dores emocionais guardados em nossa
ça mais forte.
foi para casa na segunda-feira 29 de memória. Normalmente, esses dois pro-
agosto de 2005 depois de informar que » Ao usar a abordagem descrita cessos são confiáveis; são parte de nossa
no artigo, a empresa evitará muitas
as barragens pareciam estar resistindo, vantagem evolutiva. Mas, em certas cir-
decisões falhas causadas pela ma-
apesar de vários relatos de rompimento cunstâncias, podem atrapalhar.
neira como o cérebro opera.
das estruturas. O reconhecimento de padrões é um
Cada executivo desses era altamen- processo complexo que integra infor-
te qualificado para o posto, mas ainda mações de até 30 áreas distintas do
assim tomou decisões que logo depois cérebro. Diante de uma nova situação,
soariam nitidamente equivocadas. Por formamos suposições com base na ex-
quê? E, mais importante, o que fazer para evitar um erro periência e no juízo anteriores. Daí um mestre do xadrez ser
similar? Esse é o tema que estudamos nos últimos quatro capaz de avaliar o tabuleiro e se decidir por um lance de alta
anos, em uma viagem que nos levou à exploração profunda qualidade em apenas seis segundos com base em padrões já
do campo da neurociência da decisão. Para começar, reuni- observados. Só que o reconhecimento de padrões também po-
mos dados sobre 83 decisões que, a nosso ver, eram falhas de nos enganar. Ao lidar com situações aparentemente conhe-
no momento em que foram tomadas. Da análise desses ca- cidas, o cérebro pode nos levar a pensar que as entendemos
sos concluímos que uma decisão equivocada começa com — ainda que não seja verdade.
erros de julgamento cometidos por indivíduos influentes. O ocorrido com Matthew Broderick durante o furacão Ka-
Logo, precisávamos entender como ocorre um erro de jul- trina é esclarecedor. Broderick atuara em centros de opera-
gamento desses. ções no Vietnã e em outras missões militares, e já chefiara
o Centro de Operações do
Departamento de Seguran-
ça Interna durante outros
furacões. Toda essa experi-
O fato é que decisões importantes ência lhe ensinara que os
primeiros informes sobre
tomadas por gente inteligente e responsável um evento importante
costumam ser falsos: antes
com a melhor informação disponível e a melhor de agir, é melhor aguardar
informações em campo de
das intenções podem estar totalmente erradas. uma fonte confiável. Infe-
lizmente, o brigadeiro não
tinha experiência com um
furacão atingindo uma ci-
Os dois processos ocorrem quase que instantaneamente. Aliás, A última condição de alerta é a existência de memórias en-
como mostram estudos do psicólogo Gary Klein, o cérebro ganadoras. São memórias que parecem pertinentes e compa-
chega correndo a uma conclusão e hesita em considerar alter- ráveis à situação atual, mas que fazem o raciocínio tomar o
nativas. Além disso, temos muita dificuldade para rever essa rumo errado. Podem levar a pessoa a ignorar ou menosprezar
primeira avaliação da situação — nossa base inicial. fatores importantes de diferenciação, como fez Matthew Bro-
Um exercício que volta e meia fazemos na Ashridge Busi- derick ao dar pouca atenção às implicações de um furacão
ness School mostra como é difícil questionar essa base. Damos atingindo uma cidade abaixo do nível do mar. A possibilidade
aos alunos um caso no qual uma nova tecnologia é apresen- de que a memória nos confunda é intensificada por qualquer
tada como uma boa oportunidade para a empresa. Em geral, marcador emocional vinculado à experiência prévia. Se nos-
uma equipe trabalha horas antes de questionar essa premissa sas decisões em situações similares no passado foram boas,
e começar, corretamente, a encarar a tecnologia como uma é mais provável ainda que passemos por cima de diferenças
grande ameaça à posição dominante da empresa no mercado. importantes.
Ainda que o modelo financeiro reiteradamente produza retor- Foi o que aconteceu com William Smithburg, ex-presidente
nos negativos com a adoção da nova tecnologia, certas equipes da Quaker Oats. Smithburg comprou a Snapple por causa da
nunca questionam sua impressão inicial e acabam propondo vívida lembrança da aquisição mais triunfal da empresa, a da
altos investimentos. Gatorade. Assim como esta, a Snapple parecia ser uma fabri-
cante de bebidas nova que a tarimba da Quaker no marketing
Acenda a luz vermelha e na gestão poderia melhorar. Infelizmente, a semelhança
Ao analisar o que levava um bom líder a cometer erros de entre a Snapple e a Gatorade se provou superficial, o que
julgamento, descobrimos que todos, em todos os casos, eram significou que a Quaker acabou destruindo valor, não gerando.
afetados por três fatores que distorcem os marcadores emocio- Aliás, a Snapple foi a pior aposta de Smithburg.
nais ou levam a pessoa a enxergar um falso padrão. Chamamos Naturalmente, parte daquilo que estamos dizendo é de co-
esses fatores de “condições de alerta”. nhecimento comum: todo mundo tem vieses e é importante
administrar decisões
de modo a equilibrar
tais vieses — algo que
detecte sinais
saberia. O que sabemos é que há um risco. O que a executiva
deveria fazer para se proteger — ou como seu chefe deveria
de alerta
protegê-la?
Uma saída simples é envolver outra pessoa — alguém sem
apegos ou interesses próprios inadequados. Poderia ser o che-
fe da executiva, o diretor de recursos humanos, um headhun-
Um sinal de alerta só tem utilidade se puder ser detectado
ter ou um colega de confiança. Essa pessoa poderia questio-
antes de a decisão ser tomada. Como identificá-lo em
nar seu raciocínio, obrigá-la a rever sua lógica, incentivá-la a
situações complexas? Criamos o seguinte processo, com
considerar alternativas e, quem sabe, até apoiar uma solução
sete passos:
incômoda para ela. Nesse episódio, Chakra por sorte já detec-
tara certas condições de alerta, de modo que buscou um hea-
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dhunter para ajudá-la a avaliar o colega e candidatos externos. Defina o leque Verifique se há
No final, acabou promovendo o colega — mas só depois de ter de opções. memórias enga-
avaliado se seu julgamento não era parcial. Enumerar todas é impossí- nadoras. Que incertezas
Encontramos muitos líderes que intuitivamente entendem vel. Mas em geral é útil de- rodeiam a decisão? Para
que seu raciocínio ou o dos colegas pode ser distorcido. Mas marcar os extremos. Isso cada área de incerteza,
poucos o fazem de modo estruturado e, como consequência, impõe limites à decisão. considere se o responsável
muitos não estabelecem proteção suficiente contra decisões por decidir pode recorrer a
ruins. Vejamos agora um par de empresas que abordou de for-
ma sistemática o problema do viés das decisões ao reconhecer
2 Enumere os
principais
tomadores de decisão.
memórias potencialmente
enganadoras. Pense em
experiências passadas
e reduzir o risco imposto por condições de alerta.
Quem terá influência no capazes de enganá-lo,
processo decisório e na sobretudo as de forte as-
Proteção contra vieses escolha final? O processo sociação emocional. Pense
Uma multinacional europeia que chamaremos Global Chemi- pode envolver apenas uma também sobre decisões
cals tinha uma divisão de baixo desempenho. A equipe gestora ou duas pessoas — ou dez anteriores que seriam
da divisão prometera uma virada duas vezes — e em ambas ou mais. ruins atualmente devido à
fora malsucedida. O presidente da multinacional, Mark Thay- situação em pauta.
sen, estava pesando as opções.
A divisão era parte da estratégia de crescimento de Thaysen. 3 Escolha em que
tomador de
decisão se concentrar. 6 Repita análise
com segundo
Fora criada ao longo dos cinco anos anteriores com a compra
Em geral, o melhor é indivíduo mais influente.
de duas empresas grandes e de outras quatro menores. Thay-
começar com a pessoa Em um caso complexo,
sen comandara as duas aquisições maiores e indicara a dire-
mais influente. Identifique, talvez seja necessário con-
toria hoje com problemas de desempenho. O presidente do siderar muito mais gente,
em seguida, condições
conselho supervisor, Olaf Grunweld, resolveu considerar se o de alerta que possam em um processo que pode
julgamento de Thaysen sobre aquela divisão estaria distorcido distorcer o raciocínio dessa trazer à luz uma longa lista
e, caso estivesse, como poderia ajudá-lo. Grunweld não estava pessoa. de possíveis sinais de
questionando o raciocínio de Thaysen. Estava, simplesmente, alerta.
ciente da possibilidade de que a opinião do presidente pudes-
se estar distorcida. 4 Verifique se há
interesses
próprios inadequados 7 Analise lista de
sinais de alerta
Para começar, Grunweld foi procurar condições de alerta
(veja uma descrição do processo de identificação de sinais de ou apegos distorcivos. identificados e determine
Existe alguma opção se os processos de reco-
alerta no quadro “Detecte sinais de alerta”). Thaysen erguera
particularmente atraente ou nhecimento de padrões e
a divisão agora em apuros, e seu apego a ela podia muito bem
indesejável para o respon- marcadores emocionais
impedi-lo de abandonar a estratégia ou a equipe que monta- do cérebro, normalmente
sável pela decisão devido
ra. Para piorar, já que no passado tinha acertado ao apoiar a a interesses pessoais ou eficientes, podem estar
diretoria local durante a árdua recuperação de outra divisão, apego a pessoas, lugares distorcidos a favor ou
Thaysen corria o risco de enxergar o padrão errado e de defen- ou coisas? Algum desses contra certas opções. Se
der inconscientemente a tese de que manter o apoio também interesses ou apegos isso ocorrer, adote um ou
era necessário na presente situação. Ciente do possível apego está em conflito com os mais mecanismos para se
distorcivo de Thaysen e das memórias potencialmente enga- objetivos dos principais proteger.
nadoras do presidente, Grunweld considerou três mecanismos interessados?
de defesa para fortalecer o processo decisório:
■ Injetar experiência ou análise novas. Uma saída comum uma determinada solução, Grunweld e o diretor garantiriam
para combater o viés é expor o responsável pela decisão a que seu raciocínio fosse devidamente questionado e discutido.
novas informações e a outra interpretação do problema. Nes- Grunweld sugeriu ainda que Thaysen montasse uma pequena
se caso, Grunweld pediu a um banco de investimento que equipe, chefiada pelo diretor de estratégia, para analisar todas
informasse a Thaysen que valor a empresa poderia obter com as alternativas e apresentá-las ao comitê diretor.
a venda da divisão de desempenho insatisfatório. Grunweld ■ Impor governança mais forte. Uma última salvaguarda é
achava que isso levaria Thaysen a pelo menos considerar essa exigir que a decisão seja ratificada em uma instância superior.
saída radical — ideia que Thaysen talvez rejeitasse de cara se Uma governança forte não elimina o raciocínio distorcido,
tivesse apego demais à divisão ou à equipe em seu comando. mas pode impedir que a distorção produza resultados ruins.
■ Promover mais debate e questionamento. Essa salva- Na Global Chemicals, essa instância de governança era o con-
guarda pode garantir o confronto explícito de vieses. Funciona selho supervisor. Grunweld percebeu, contudo, que a objeti-
melhor quando a estrutura de poder do grupo que debate a vidade desse corpo poderia ser comprometida pelo fato de
questão é equilibrada. Embora o diretor financeiro de Thaysen ele, Grunweld, pertencer tanto ao conselho quanto ao comitê.
fosse um indivíduo forte, Grunweld achava que os demais Logo, pediu a dois colegas de conselho que se preparassem
integrantes da equipe executiva provavelmente seguiriam as para questionar a proposta apresentada pelo comitê diretor
ordens de Thaysen sem questioná-lo. Além disso, o cabeça da se esta os incomodasse.
divisão de baixo desempenho fazia parte da equipe executiva, No final, o comitê diretor propôs a venda da divisão, decisão
o que dificultava o debate aberto. O que Grunweld fez foi que o conselho aprovou. O valor recebido ficou bem acima das
propor um comitê diretor formado por ele, por Thaysen e pelo expectativas, convencendo todos de que aquela tinha sido a
diretor financeiro. Ainda que Thaysen defendesse com tudo melhor saída.
O presidente do conselho da Glo-
bal Chemicals assumiu a liderança na
configuração do processo decisório.
Foi o correto, dada a importância da
— Estou aqui para restaurar a confiança nas expectativas irreais que todos tínhamos.