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AULA 3

CURSO: Tecnologia de Alimentos


DURAÇÃO 90 horas
PROFESSOR: Ana Cristina Sousa Silva
DATA: 11/09/2020.

Tecnologia de Alimentos
Histórico
No início dos tempos os homens sobreviviam da caça, pesca e coleta de
alimentos, obtendo seu sustento diretamente da natureza. O domínio do fogo foi uma
revolução na forma de preparo dos alimentos, deixando-os mais macios, com melhor
sabor e digestibilidade, além de eliminar micro-organismos potencialmente perigosos e
aumentar seu período de conservação. Mais tarde, evoluiu-se ao emprego do calor e
provavelmente os habitantes pré-históricos da Europa foram os primeiros a conservar o
alimento com defumação. Posteriormente desenvolveu-se a agricultura e a colheita se
dava em períodos fixos. Entretanto, nos períodos entressafras a escassez de alimento era
muito grande e o homem precisou desenvolver formas de conservação desses alimentos
para que pudessem ser usados por longos períodos de tempo e, assim, garantir seu
sustento e sobrevivência. A secagem e a salga foram os primeiros métodos de
conservação desenvolvidos e a fermentação foi utilizada pela primeira vez no Egito na
fabricação de pães e bebidas alcoólicas. Com o surgimento das cidades e do comércio,
novos alimentos são introduzidos na dieta do homem e há um grande impulso nas
técnicas de prolongamento da vida útil de seus alimentos. Em 1810, o francês Nicolas
Appert recebeu um prêmio de Napoleão Bonaparte por desenvolver um processo de
conservação que empregava calor combinado com o fechamento hermético. Napoleão
sabia que a alimentação era fundamental para seus exércitos e, consequentemente, para
o sucesso de suas táticas de guerra. Então, uso do processamento desenvolvido por
Appert permitiu aos exércitos do imperador francês conservar seus alimentos por
períodos mais longos e melhor qualidade sanitária. Surgia então o processo de
apertização. Desde então, as guerras trouxeram grandes avanços no desenvolvimento de
tecnologia de alimentos. Exemplos são a premiação por Napoleão III, no século XIX, a
quem descobrisse um substituto para a manteiga, e a criação do leite condensado, por
Gail Borden, que só foi valorizada quatro anos depois, durante a guerra civil americana,
em que o leite condensado era usado como ração de campo, por seu alto valor
energético e volume reduzido. Borden, ao tentar desidratar o leite comum, descobriu
que antes que este se transformasse em pó, passaria por um estágio intermediário que
seria então o leite condensado. Em relação à margarina, Napoleão III recompensou o
químico Hippolyte Mège-Mouriés pela sua invenção que iria então substituir a manteiga
de forma satisfatória e mais barata para o exército do imperador e para as classes sociais
mais baixas. Em 1813, latas contendo alimentos foram testadas pela marinha e exército
britânicos e cinco anos depois grandes quantidades de sopas, carnes e legumes estavam
sendo utilizados pelas forças armadas britânicas. Entretanto, o crescimento do uso e
popularidade dos enlatados foi devido, principalmente, à Guerra de Secessão e à
Primeira Guerra Mundial.
No século XIX começaram a surgir fábricas que incrementaram a produção de
alimentos básicos como amido, açúcar, manteiga e produtos de panificação.
Desde este período até o momento atual, o incremento científico permitiu a
evolução do alimento artesanal para a indústria de alimentos que se conhece hoje.

Objetivos da Tecnologia de Alimentos

No início, o objetivo das indústrias de alimentos era conservar seus produtos


para deixá-los disponíveis por mais tempo. Hoje, o seu objetivo também é a
diversificação da dieta, com desenvolvimento e incrementação da qualidade de seus
produtos. Também são objetivos da tecnologia de alimentos:
 Garantir abastecimento de alimentos nutritivos e saudáveis através do controle
de agentes nocivos;
 Desenvolvimento e diversificação dos alimentos para atender as necessidades de
consumidores mais exigentes;
 Obter máximo aproveitamento dos recursos nutritivos da terra, buscando outras
opções a partir de fontes ainda não exploradas;
 Preparar produtos para indivíduos que necessitem de dietas especiais, como
diabéticos, idosos, crianças, pessoas com problemas metabólicos, etc;
 Prolongamento da “vida de prateleira” dos alimentos, mantendo ao máximo
possível suas características naturais específicas e seu valor nutritivo.
Crescimento Microbiano em Alimentos

Os micro-organismos de interesse em alimentos são os deteriorantes, os


indicadores, patogênicos e os produtores de alimentos.
 Micro-organismo deteriorante geralmente não é patogênico, e é aquele
que estraga o alimento, alterando uma ou mais de suas características
organolépticas.
 Micro-organismos patogênicos não estragam os alimentos e por isso
são considerados muito mais perigosos, pois o homem pode comer um
alimento sem perceber que está contaminado. Alguns exemplos são os
vírus e ainda algumas bactérias e fungos patogênicos.
 Micro-organismos produtores de alimentos como o próprio nome diz,
são aqueles responsáveis por alterações nos alimentos, conferindo-lhes
características desejáveis e distintas daquelas do alimento original.
 Micro-organismos indicadores são aqueles cuja quantidade ou apenas a
sua presença, indicam a segurança e a qualidade do alimento.

São naturais e constantes as interações existentes entre micro-organismos,


animais e plantas e, como as principais fontes de alimento do ser humano são
basicamente vegetais e animais (ou derivados deles), é justificavelmente aceitável que
nossos alimentos possam conter micro-organismos. O impedimento da deterioração
pode ser feito através da minimização do contato entre o alimento e os micro-
organismos, com a devida aplicação de processos higiênico-sanitários.
Os micro-organismos podem deteriorar os alimentos através de:
 Utilização dos nutrientes do alimento;
 Sua multiplicação;
 Mudanças produzidas por suas enzimas;
 Produção de novos compostos químicos;
 Alterações organolépticas resultantes da decomposição do alimento.
Mas por que alguns alimentos são muito estáveis à deterioração microbiana,
suportando o crescimento de micro-organismos mais prontamente do que outros?
A resposta está nas características de cada alimento, no tipo de micro-
organismo que o contaminou e nas condições ambientais que os dois se encontram.
Entretanto, o alimento pode ditar que tipo de micro-organismo pode ou não crescer, ou
seja, conhecendo-se as características do alimento, pode-se saber qual tipo de
microbiota poderá contaminá-lo.
A maioria dos micro-organismos utiliza-se dos nutrientes dos alimentos para
promover seu crescimento, e isso naturalmente pode resultar na deterioração desse
alimento. Portanto, alimentos ricos em nutrientes, como carne e leite, facilmente se
deterioram se não for utilizadas técnicas para prevenir/minimizar a contaminação e a
multiplicação microbiana.

Controle da Multiplicação Microbiana

O conhecimento dos fatores que inibem ou favorecem o crescimento de micro-


organismos é fundamental para o entendimento dos princípios da preservação e
deterioração dos alimentos. Alguns desses fatores são dependentes das condições
ambientais. São eles: umidade relativa do ar, temperatura e atmosfera.
Outros fatores são dependentes da composição do alimento, tais como os
nutrientes disponíveis, o pH, a atividade de água, o potencial de óxido-redução, as
barreiras biológicas, a concentração salina e a presença de substâncias inibitórias. Dessa
forma, conclui-se que o desenvolvimento de micro-organismos somente é possível
quando este se encontra em ambiente nutritivo, com temperatura, oxigênio, taxa de
umidade e condições favoráveis, de acordo com cada espécie microbiana.
Portanto, alimentos perecíveis são aqueles que possuem fatores intrínsecos
favoráveis ao crescimento microbiano e alimentos não perecíveis possuem uma ou mais
características desfavoráveis para a multiplicação de micro-organismos.

Curva de crescimento microbiano. Fonte: estudegratis.com.br


A fase 1, chamada de lag representa o período de adaptação fisiológica dos
micro-organismos ao meio em que eles agora se encontram, ou seja, a multiplicação
microbiana não ocorre nesta fase.
A fase 2, representa a fase exponencial de crescimento, momento em que a
multiplicação dos micro-organismos atinge o crescimento máximo.
A fase 3 é a fase estacionária máxima, em que o número de células que se
multiplica corresponde ao número de células que morrem. Portanto, nesta fase a
quantidade de células viáveis se mantém constante.
A fase 4 é a fase de morte, quando as condições do meio começam a se tornar
impróprias para a sobrevivência microbiológica. A conservação de alimentos, do ponto
de vista microbiológico, consiste em prolongar a fase lag ao máximo, ou seja, utilizar-se
de meios que retardem o início da fase de crescimento exponencial do micro-organismo.

1. Fatores Intrínsecos ao Alimento


1.1. Disponibilidade de Nutrientes
Como já dito anteriormente, a maioria dos micro-organismos utiliza-se dos
nutrientes dos alimentos para promover seu crescimento. Assim como para o homem,
para que um micro-organismo consiga sobreviver, se desenvolver e multiplicar-se, é
preciso que lhe estejam disponíveis água, fontes de energia, fonte de nitrogênio,
vitaminas e minerais. A ausência de um nutriente específico pode limitar o crescimento
de determinado grupo de micro-organismos nos alimentos.
1.2. Atividade de Água
Existem dois tipos de água nos alimentos:
 Água ligada (não disponível) está ligada por forças físicas às
macromoléculas (componentes não aquosos) dos alimentos;
 Água não ligada (disponível) água que está livre para ser aproveitada
pelos micro-organismos, podendo então participar de reações químicas ou agir como
solvente.
Atividade de água (Aa) é o parâmetro que mede a disponibilidade de água de um
determinado alimento e corresponde à umidade relativa de equilíbrio no qual o alimento
não perde nem ganha água para o ambiente. Atividade de água com valor igual a 1,00
significa água pura, ou seja, não existe a presença de nenhum nutriente. Considerando-
se que nenhum micro-organismo cresce em água pura (por causa da ausência de
nutrientes), o limite máximo de Aa para o crescimento microbiano é ligeiramente menor
que 1,00.
A adição de solutos provoca a diminuição do valor da Aa do alimento. Assim
sendo, a relação da Aa com o soluto depende tanto do tipo de soluto adicionado, quanto
da concentração deste. Quando a Aa da água atinge concentração abaixo de 0,86
significa que a multiplicação microbiana perigosa para os alimentos está controlada.

Seguem abaixo os valores de atividade de água dos alimentos mais comuns:


 0,98 Aa 0,99 leite, peixes, carne fresca, vegetais frescos, frutas em caldas
leves. Em temperatura ambiente, a grande maioria dos micro-organismos presentes
nesses alimentos consegue se proliferar com grande velocidade. Ainda que outros
fatores possam influir na multiplicação de micro-organismos patogênicos, estes crescem
facilmente nesta faixa de Aa.
 0,93 Aa 0,97 embutidos, carnes curadas, pão, massa de tomate, carnes e
peixes levemente salgados (máxima concentração de sal igual a 10%), leite evaporado,
queijo processado, linguiça cozida, fruta em calda forte.
 0,85 Aa 0,92 carne seca, queijos duros, leite condensado, linguiça
fermentada, presunto cru, bacon.
 0,60 Aa 0,84 frutas desidratadas, geleias, farinhas, cereais, leite e ovos,
vegetais secos, leite e ovos em pó, melaço, peixes salgados, alguns queijos maturados.
Esta faixa de atividade de água é considerada segura, do ponto de vista sanitário, pois
não há crescimento de bactérias patogênicas nos alimentos. Alimentos com Aa nesta
faixa são denominados alimentos com umidade intermediária (IMF).
 Aa < 0,60 mel, biscoitos, confeitos, chocolate, confeitos, macarrão seco,
batata chips. Em alimentos com atividade de água abaixo de 0,60 não há multiplicação
de bactérias, pois não existe mais água livre que favoreça seu metabolismo, ou seja,
esses alimentos são considerados microbiologicamente estáveis. Nesta faixa de
atividade de água, o alimento somente poderá se deteriorar por agentes físicos ou
químicos. Alimentos denominados LMF (Low Moisture Foods), traduzindo, alimentos
de baixa umidade, são todos aqueles alimentos secos, com baixa umidade ou
desidratados, que apresentam geralmente atividade de água inferior a 0,60 e teor de
umidade inferior a 25%. Incluem-se neste grupo os alimentos secos tradicionais e os
alimentos liofilizados (falaremos mais tarde sobre eles no capítulo sobre métodos de
conservação de alimentos).
Os alimentos que recebem a denominação IMF (Intermediate Moisture Foods),
ou seja, alimentos com teor de umidade intermediária, são aqueles cuja atividade de
água apresenta valores entre 0,60 e 0,85 e cujo conteúdo de umidade está entre 15% e
50%.

1.3. pH
Todo micro-organismo possui um valor de pH abaixo do qual ele não consegue
se multiplicar e outro valor acima do qual também não consegue crescer. Tal fato pode
ser facilmente visualizado através do gráfico da curva hipotética de crescimento
microbiano em função do pH.
As bactérias são mais exigentes em relação ao pH do que mofos e leveduras,
sendo as bactérias patogênicas ainda mais exigentes e a maioria dos micro-organismos
se multiplica com maior velocidade com valores de pH em torno de 7,0 (pH ótimo),
embora também possam crescer sem muitas dificuldades no intervalo de pH entre 5,0 e
8,0. Abaixo de 5,0 o crescimento microbiano é claramente inibido e raramente acontece
em pH 4,5.
O crescimento de micro-organismos fora de sua faixa ótima de pH de
crescimento culmina em uma fase lag maior, ou seja, esse micro-organismo necessita de
um tempo maior para se adaptar ao meio que não está lhe oferecendo condições ideais
para sua multiplicação. Alimentos classificados como pouco ácido são aqueles com pH
maior que 4,5 (carnes, pescados, leite, alguns vegetais). Alimentos com pH entre 4,0 e
4,5 são considerados alimentos ácidos e nesta classe incluem-se as frutas e hortaliças.
Alimentos muito ácidos são aqueles que apresentam pH inferior a 4,0, como é o caso
dos refrigerantes e dos sucos de frutas.
O Clostridium botulinum é um micro-organismo patógeno produtor de uma
toxina que pode ser letal para o ser humano. Algumas de suas características é ser
resistente aos tratamentos térmicos e ser o micro-organismo patogênico que suporta o
menor pH, no valor de 4,6. Portanto, abaixo de pH 4,5 nenhum patógeno de alimentos é
capaz de se desenvolver, e este valor de pH se tornou limitante para a classificação de
alimentos ácidos e de baixa acidez.

Bons estudos e até a próxima aula.

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