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RESPONSABILIDADE Letícia Pardo Rodrigues do Carmo

CIVIL NA MEDICINA Discente do PPGD-PUC-Campinas


“Há não muito tempo, a medicina era praticamente uma arte, a arte de
curar. Médicos de família acompanhavam os indivíduos por toda a vida e
também seus descendentes. Conseguindo diagnosticar uma doença
tocando o corpo do paciente, considerando o histórico da pessoa, suas
tendências e propensões. Curava-se valorizando o indivíduo. Todavia,
essa realidade cedeu lugar à medicina empresarial, na qual o
atendimento pessoal é substituído pelo atendimento em massa,
impessoal. Desse aresto emoldurado em julgado de erro médico declina-
se o entendimento do judiciário sobre a medicina, onde, a relação
médico-paciente é mitigada pelo lucro”
- Nancy Andrighi, Resp nº 908.359/2008
Deixar de realizar o devido
atendimento em uma
situação de urgência ou
emergência

Infração Ética Infração Penal Infração Civil Infração Administrativa

Art. 186, CC: Art. 186. Aquele


Art. 9º CEM: É vedado ao
Art. 129, §2, I, CP: Art. 129. que, por ação ou omissão Art. 117, I, L. 8112/90:
médico: Deixar de comparecer a
Ofender a integridade corporal voluntária, negligência ou Art. 117. Ao servidor é proibido:
plantão em horário
ou a saúde de outrem: §2º: Se imprudência, violar direito e I - ausentar-se do serviço durante
preestabelecido ou abandoná-lo
resulta: I – Incapacidade causar dano a outrem, ainda que o expediente, sem prévia
sem a presença de substituto,
permanente para o trabalho exclusivamente moral, comete autorização do chefe imediato;
salvo por justo impedimento
ato ilícito

UMA AÇÃO, DIVERSAS CONSEQUÊNCIAS


PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Espécies de responsabilidade Subjetiva


civil Objetiva

Obrigação de meio: a regra


O médico é obrigado a curar? Obrigação de resultado: a exceção
• Cirurgia plástica embelezadora
NEXO DE CAUSALIDADE E ÁLEA TERAPÊUTICA

• A Medicina não é ciência exata, existe o fenômeno da iatrogenia (terminologia médica)


cunhado na doutrina do direito da medicina como álea terapêutica, ou seja, pessoas
reagirão de formas diferentes a diversos tratamentos médicos.
• Álea terapêutica se refere a como o organismo reage ao medicamento/tratamento
– O dano que o paciente sofreu decorre mais dos fatores endógenos próprios do organismo do
paciente
– Em termos jurídicos, seria um fortuito do próprio organismo do paciente
• Logo, há rompimento do nexo de causalidade.
ERRO MÉDICO: • “Os advogados dos autores pintam com tintas carregadas as

A evidências de má prática médica, ao passo que os patronos dos


requeridos, respaldados em compêndios científicos e laudos
IMPORTÂNCIA periciais, demonstram que o profissional em momento nenhum
afastou-se dos cânones eu a ciência médica estabelece para o
DA CULPA E DO procedimento mencionado.
NEXO CAUSAL • Delineia-se, após, o problema: a existência do dano – lesão,
aleijão, morte etc. – é irrefutável; a intervenção médica realizou-
se, e isso também é induvidoso. A ocorrência da culpa e o
estabelecimento do nexo de causalidade, então, passam a
desafiar a argúcia do julgador, que se valerá, nessa etapa final,
de tudo quanto as partes trouxeram aos autos e das
informações que o próprio juízo determinou fossem prestadas
pelas partes e peritos”.

– Miguel Kfouri Neto, 2021, local. 5.2


QUAL É A
LEI Código de Defesa do Consumidor
APLICÁVEL? • Art. 14, §4º: A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais
será apurada mediante a verificação de culpa.

Código Civil

• Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência


ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito.
• Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a
outrem, fica obrigado a repará-lo.
• Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou
quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do
dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
ESPÉCIES DE Dano
DANO emergente
Material
Lucros
cessantes
Moral

Estético
RESPONSABILIDADE CIVIL DOS
ESTABELECIMENTOS DE SAÚDE
• Responsabilidade depende da natureza do serviço prestado:
– Atos essencialmente médicos: responsabilidade objetiva indireta
– Atos paramédicos: responsabilidade objetiva
– Atos extramédicos: responsabilidade objetiva

• Solidariedade entre médico e estabelecimento de saúde?


– Depende!
RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO DO SUS

• Enquanto prestar serviço no SUS, é considerado como agente público


• A responsabilidade do profissional é subjetiva e a do Estado é OBJETIVA (teoria do risco
administrativo)
• Diferença processual:
– Art. 37,§6º, CF: § 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de
serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a
terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
– Tema 940 STF: A teor do disposto no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, a ação por danos
causados por agente público deve ser ajuizada contra o Estado ou a pessoa jurídica de direito
privado prestadora de serviço público, sendo parte ilegítima para a ação o autor do ato, assegurado
o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL
• Art. 944 do CC: a indenização se mede pela extensão do dano
• Método bifásico:
– 1ª fase: “arbitra-se o valor básico ou inicial da indenização, considerando-se o interesse jurídico
lesado, em conformidade com os precedentes jurisprudenciais acerca da matéria (grupo de casos)”
– 2ª fase: “procede-se à fixação definitiva da indenização, ajustando-se o seu montante às
peculiaridades do caso com base nas suas circunstâncias. Partindo-se, assim, da indenização básica,
eleva-se ou reduz-se esse valor de acordo com as circunstâncias culpabilidade do agente, culpa
concorrente da vítima, condição econômica das partes) até se alcançar o montante definitivo.”
• STJ: REsp 959.780/ES (3ª Turma, j. 23.08.2011), AgInt no REsp 1.608.573/RJ (4ª Turma, j. 20.08.2019) e AgInt
no REsp 1.948.045/AC (2ª Turma, j. 28.03.2022).
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. MORTE DA FILHA
E DO NETO NASCITURO POR APONTADO ERRO MÉDICO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.

1. Conforme disposto no decisum agravado, o Tribunal de origem, ao reconhecer a responsabilidade estatal sobre os danos morais sofridos pela
recorrida em decorrência do óbito de sua filha e de seu neto nascituro, majorou o quantum indenizatório com base nos seguintes fundamentos:
"Em casos de danos morais decorrentes de negligência médica que resulta na morte do filho (encontrado nos precedentes desta Câmara Cível), a
indenização tem sido fixada em quantias que variam entre R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais), adotando-se este
último montante como valor básico inicial, considerando a gravidade e a extensão do abalo emocional.

Na segunda fase para a fixação definitiva da indenização, sem descuidar do valor básico anteriormente determinado, ajustando-se às
circunstâncias particulares do caso, devem ser considerados os seguintes fatores: a) a vítima era uma jovem de 18 (dezoito) anos, residia com a
sua genitora, a parte Autora, e não exercia ocupação laboral; b) a gestação tinha ultrapassada a 37ª (trigésima sétima) semana, ou seja, havia
alcançada a etapa final, aproximando-se da data do parto; c) o nascituro estava bem desenvolvido, ou seja, era plenamente viável o seu
nascimento com vida, de modo que ele também pode ser considerado vítima da negligência médica, nos termos do art. 2°, última parte, do
CC/2002. Desse modo, considerando especialmente o óbito do nascituro, entende- se por bem adotar como referência da indenização o valor de
R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), haja vista que a jurisprudência iterativa das Câmaras Cíveis estabelece que, em caso de morte do ser humano
já concebido, cujo nascimento é dado como certo. Por consequência, nesta segunda fase, soma-se o valor de referência da indenização com o
valor estabelecido na primeira fase (R$ 100.000,00 + R$ 50.000,00), totalizando a quantia de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais), a qual
reduzo para o montante R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais), adequando-a ao pedido formulado nas razões recursais e aos parâmetros do
método bifásico de liquidação das indenizações de danos morais" (fls. 310-311, e-STJ).

3. Dessa forma, aplicar posicionamento distinto do proferido pelo aresto confrontado implica reexame da matéria fático-probatória, o que é
obstado ao STJ, como determina a Súmula 7/STJ: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja Recurso Especial".

4. Agravo Interno não provido.

(AgInt no REsp n. 1.948.045/AC, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 28/3/2022, DJe de 12/4/2022.)
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. SÚMULA Nº 7/STJ.
INOCORRÊNCIA. QUANTUM IRRISÓRIO. DEMORA EM PROCEDIMENTO MÉDICO. NECESSIDADE DE PARTO POR
CESARIANA. RECONHECIMENTO TARDIO. MORTE DA CRIANÇA NO VENTRE MATERNO. QUANTUM INDENIZATÓRIO.
CRITÉRIOS DE ARBITRAMENTO EQUITATIVO PELO JUIZ. MÉTODO BIFÁSICO. VALORIZAÇÃO DO INTERESSE JURÍDICO
LESADO E CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO. DECISÃO MANTIDA.
1. Nos termos da jurisprudência pacífica do STJ, é possível a modificação do quantum indenizatório quando os danos morais
forem flagrantemente irrisórios ou exorbitantes, hipótese verificada na espécie à luz do método bifásico, inexistindo razão para
aplicar a Súmula nº 7/STJ. Precedentes do STJ.
2. O método bifásico, como parâmetro para a aferição da indenização por danos morais, atende às exigências de um
arbitramento equitativo, pois, além de minimizar eventuais arbitrariedades, evitando a adoção de critérios unicamente
subjetivos pelo julgador, afasta a tarifação do dano, trazendo um ponto de equilíbrio pelo qual se consegue alcançar razoável
correspondência entre o valor da indenização e o interesse jurídico lesado, bem como estabelecer montante que melhor
corresponda às peculiaridades do caso. 3. Na primeira fase, o valor básico ou inicial da indenização é arbitrado tendo-se em
conta o interesse jurídico lesado, em conformidade com os precedentes jurisprudenciais acerca da matéria (grupo de casos).
4. Na segunda fase, ajusta-se o valor às peculiaridades do caso com base nas suas circunstâncias (gravidade do fato em si,
culpabilidade do agente, culpa concorrente da vítima, condição econômica das partes), procedendo-se à fixação definitiva da
indenização, por meio de arbitramento equitativo pelo juiz.
5. Irrisório, no caso, os danos morais em R$ 10 mil, devendo ser elevados para R$ 90 mil, mantido o julgado de origem quanto
à correção monetária, juros de mora e honorários advocatícios. Recurso especial provido.
6. Agravo interno não provido.
(AgInt no REsp n. 1.608.573/RJ, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 20/8/2019, DJe de
23/8/2019.)
RESPONSABILIDADE • PROPOSIÇÃO LEGISLATIVA: ISENÇÃO DE
CIVIL DO MÉDICO E RESPONSABILIDADE POR SIMPLES NEGLIGÊNCIA
COVID-19
• Art. X Dadas as circunstâncias urgentes e dramáticas em que
médicos, profissionais de saúde e outros provedores do
setor médico precisam prestar serviços, o Estado deve
garantir que a partir de 20 de março de 2020 até o final da
declaração de emergência esses profissionais não sejam
responsabilizados por eventos adversos relacionados a
covid-19, exceto em casos de grave negligência.
• § 1º O mesmo se aplica a outros profissionais e titulares de
cargos públicos que tiveram que tomar decisões rápidas e
difíceis diretamente relacionadas à crise da covid-19.
Rosenvald, Nelson. Por uma isenção • § 2º Essas isenções não se aplicam ao Estado, que
de responsabilidade dos
profissionais de saúde por simples permanece responsável de acordo com o regime específico
negligência em tempos de de responsabilidade existente.
pandemia. Migalhas, 05 mai. 2020.
RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO E COVID-19
• Indenização se mede pela extensão do dano (art. 944 CC), não
pelo grau de culpa do agente
• Na pandemia da covid-19, a demanda por serviços de saúde
ultrapassa a oferta disponível. Prestadores de serviços de saúde
- principalmente médicos na linha de frente - tomam decisões
de vida ou morte sobre o racionamento de serviços de saúde.
• A responsabilidade pessoal do médico se mantém subjetiva
(arts. 951, CC c/c 14, § 4º, CDC), porém a avaliação casuística
do “cuidado razoavelmente exigível” será contextualizada ao
quadro de exceção. Rosenvald, Nelson; Pereira, André Dias;
Doménech, Javier Barceló. Proteção jurídica dos
profissionais de saúde envolvidos no atendimento
em contexto da pandemia da COVID-19.
Cadernos Ibero-Americanos de Direito Sanitário,
Brasília, 10 (2), abr./jun. 2021.
Obrigada!

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