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Hermenêutica Jurídica

Teoria Geral do Direito


Prof. Pablo Lima
Teoria Geral do Direito

“O texto não passa de um


piquenique em que o autor traz as
palavras e os leitores o sentido.”
(Umberto Eco)
Teoria Geral do Direito

Conceito
A hermenêutica é uma palavra de origem grega que significa arte ou técnica de interpretar. esclarecer, revelar
o sentido dos livros e textos sagrados. Derivada do verbo herméneuein, a hermenêutica está associada ao mito
de Hermes, o deus mensageiro no panteão grego.

Hermes foi encarregado por seu pai, Zeus, de traduzir, interpretar e fazer compreendida a linguagem dos
deuses do Olimpo para enviar mensagens aos homens na terra, uma vez que a língua dos deuses era diferente
em palavras e conceitos da língua dos homens, sendo, por isso, considerado o originador da linguagem e da
escrita e patrono da comunicação e do entendimento humano.

Assim nasce a hermenêutica como o exercício de interpretar uma mensagem e revelar seu sentido e alcance.
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Métodos
A hermenêutica jurídica engloba diversos métodos para interpretar normas legais. A saber:

1. Interpretação Literal: Busca compreender a norma conforme o significado literal das palavras,
considerando a gramática e a sintaxe.
2. Interpretação Histórica: Examina o contexto histórico em que a norma foi criada, analisando documentos,
debates e eventos relevantes da época.
3. Interpretação Sistemática: Considera a norma dentro do sistema jurídico como um todo, relacionando-a
com outras normas para garantir coerência e harmonia.
4. Interpretação Teleológica: Foca na finalidade ou objetivo da norma, buscando entender a razão pela qual
foi criada e como ela contribui para o sistema jurídico.
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Métodos
Interpretação literal
Consiste numa leitura inicial do texto onde se busca captar seu conteúdo e observar sua linguagem.

A interpretação literal não excede em muito essa atividade preliminar. Limita-se a fixar o sentido do texto
legal, inquinado de obscuridade, mediante a indagação do significado literal das palavras, tomadas não só
isoladamente, mas em sua recíproca conexão.

O método de interpretação literal tem sua importância, porém serve apenas como meio de se tomar um
primeiro contato com o texto interpretado e não para se extrair o sentido completo que a norma pode oferecer.
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Métodos
Interpretação literal
EMENTA Habeas corpus. Penal. Condenação. Prescrição. Incidência do art. 115 do Código Penal.
Impossibilidade. Paciente com idade inferior a 70 (setenta) anos na data da sentença condenatória.
Precedentes. Ordem denegada. 1. Segundo a jurisprudência majoritária da Corte, a regra do art. 115 do Código
Penal somente é aplicada ao agente com 70 (setenta) anos na data da sentença condenatória. 2. Entendimento
jurisprudencial proveniente da interpretação literal do art. 115 do Código Penal. 3. Ordem denegada.
(HC 129696, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 19-04-2016, PROCESSO ELETRÔNICO
DJe-109 DIVULG 27-05-2016 PUBLIC 30-05-2016)
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Métodos
Interpretação histórica
O reconhecimento dessa técnica de interpretação deixa transparecer que o direito é dinâmico e a norma não
deve ficar estática no tempo. É mutável e por isso sofre as influências das transformações da sociedade.

Deste modo, o intérprete deve adaptar o texto legal às novas condições sociais inexistentes ao tempo de sua
formação, embora tenha de afastar-se inteiramente da letra e da vontade do primitivo legislador ou de atribuir
à primeira um sentido forçado.

Vemos, portanto, que nessa modalidade o intérprete busca descobrir a vontade atual da lei e não a vontade
pretérita do legislador, vontade que deve sempre corresponder às necessidades e condições sociais.
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Métodos
Interpretação histórica
INCONSTITUCIONALIDADE, LEI ESTADUAL, ATIVIDADE, LOTERIA, USURPAÇÃO, COMPETÊNCIA PRIVATIVA,
UNIÃO FEDERAL, LEGISLAÇÃO, DIREITO PENAL, EQUÍVOCO, INTERPRETAÇÃO HISTÓRICA, LEI DAS
CONTRAVENÇÕES PENAIS. - RESSALVA DE ENTENDIMENTO, MIN. DIAS TOFFOLI: COMPETÊNCIA
PRIVATIVA, UNIÃO FEDERAL, LEGISLAÇÃO, CONSÓRCIO.
ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO – CONTROLE ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE. Cabe à Advocacia-
Geral da União a defesa do ato normativo impugnado – artigo 103, § 3º, da Constituição Federal. ATRIBUIÇÃO
NORMATIVA – LOTERIA – ATO ESTADUAL – CONSTITUCIONALIDADE. Surge compatível, com a Carta da
República, disciplina estadual a versar serviço público de loteria.
(ADI 3050, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 04-11-2020, PROCESSO ELETRÔNICO
DJe-001 DIVULG 07-01-2021 PUBLIC 08-01-2021)
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Métodos
Interpretação sistemática
A interpretação sistemática considera que a norma não pode ser vista de forma isolada, pois o direito existe
como sistema, de forma ordenada e com certa sincronia.

Assim, consiste o Processo Sistemático em comparar o dispositivo sujeito a exegese com outros do mesmo
repositório ou de leis diversas, mas referentes ao mesmo objeto.

O preceito, assim submetido a exame, longe de perder a própria individualidade, adquire realce maior, talvez
inesperado. Com esse trabalho de síntese é mais bem compreendido.
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Métodos
Interpretação sistemática
PRISÃO PREVENTIVA – INTIMIDAÇÃO DE VÍTIMA – ENCERRAMENTO DA FASE PROCESSUAL DE INSTRUÇÃO
– INSUBSISTÊNCIA. Uma vez encerrada a fase de instrução e prolatada sentença, descabe, para embasar a
prisão preventiva, cogitar de intimidação da vítima. PRISÃO PREVENTIVA – AUSÊNCIA DO DISTRITO DA
CULPA. A ausência do distrito da culpa, considerada a interpretação sistemática do Código de Processo Penal –
artigos 366 e 312 –, não respalda a prisão preventiva.
(HC 101816, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 02-08-2011, DJe-195 DIVULG 10-10-2011
PUBLIC 11-10-2011 EMENT VOL-02605-01 PP-00044)
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Métodos
Interpretação teleológica
Diferentemente de todos os métodos de interpretação analisados até agora, a interpretação teleológica
concentra suas preocupações no fim a que a norma se dirige.

Nesta, o intérprete deve levar em consideração valores como a exigência do bem comum, o ideal de justiça, a
ética, a liberdade, a igualdade etc. Um exemplo desta interpretação é o artigo 5º da Lei de Introdução às
Normas do Direito Brasileiro:

Art. 5º Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
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Métodos
Interpretação teleológica
PRESO - SAÍDAS TEMPORÁRIAS - CRIVO. Uma vez observada a forma alusiva à saída temporária - gênero -,
manifestando-se os órgãos técnicos, o Ministério Público e o Juízo da Vara de Execuções, as subsequentes
mostram-se consectário legal, descabendo a burocratização a ponto de, a cada uma delas, no máximo de três
temporárias, ter-se que formalizar novo processo. A primeira decisão, não vindo o preso a cometer falta grave,
respalda as saídas posteriores. Interpretação teleológica da ordem jurídica em vigor consentânea com a
organicidade do Direito e, mais do que isso, com princípio básico da República, a direcionar à preservação da
dignidade do homem.
(HC 98067, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 06-04-2010, DJe-091 DIVULG 20-05-
2010 PUBLIC 21-05-2010 EMENT VOL-02402-04 PP-00767 RTJ VOL-00217-01 PP-00347)
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Judicialização
A judicialização é um fenômeno contemporâneo, oriundo da quantidade de demandas que têm sido levadas ao
judiciário para que seja dada uma sentença de mérito, resolvendo o caso concreto.

Trata-se de um aumento de demandas que buscam o judiciário para resolver questões que, primordialmente,
deveriam ser resolvidas no âmbito dos outros poderes (legislativo e executivo).

Em síntese, judicialização significa que uma parcela do Poder Político está sendo transferido das instâncias
políticas tradicionais para o Poder Judiciário. Significa dizer que a última palavra sobre questões econômicas,
sociais ou morais de largo alcance, estão tendo a sua instância final de decisão perante o Poder Judiciário.
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Ativismo Judicial
O ativismo judicial é uma consequência da judicialização – mas não somente dela.

O excesso de demandas de cunho político levadas ao judiciário é que faz com que os juízes atuem de maneira
expansiva, ultrapassando o limite da lei, tornando-se um juiz legislador.

Não obstante, o Poder Legislativo não é capaz de produzir consensos e, portanto, normatização perante temas
controvertidos na sociedade. E aí cabe ao Poder Judiciário resolver esses problemas.

Os problemas surgem na vida e o judiciário precisa resolvê-los independentemente da existência ou não de


normas.

O juiz não pode invocar a lacuna no ordenamento jurídico para não resolver um problema; ele precisa decidir
essas matérias mesmo que o legislativo não tenha atuado.
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Ativismo Judicial
A ideia do ativismo judicial está associada a uma atuação mais intensa do Poder judiciário, na concretização dos
valores e fins constitucionais, com maior interferência no espaço dos dois poderes. O ativismo judicial é
caracterizado:

I - pela aplicação direta da Constituição a situações não expressamente contempladas em seu texto, e
independentemente da manifestação do legislador ordinário;

II - pela declaração de inconstitucionalidade dos atos normativos emanados do legislador, com base em
critérios que apresentem violação à Constituição;

III - a imposição de condutas e abstenções ao Poder público, notadamente em matéria de políticas públicas.
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Ativismo Judicial
Críticas x Oposição às críticas
Riscos para a legitimidade democrática

Os Membros do Poder Judiciário não são eleitos pelo povo, como é o caso do Presidente da República e os
Membros do Congresso Legislativo, entretanto os tribunais desempenham certo poder político, podendo até
mesmo invalidar atos dos outros dois poderes.

Entretanto, a possibilidade de um órgão não eletivo como o Supremo Tribunal Federal sobrepor-se a uma
decisão do Presidente ou do Congresso, encontra respaldo na teoria constitucional como dificuldade
contramajoritária, a qual apresenta duas justificativas, sendo elas: (i) de natureza normativa - que decorre do
fato de que a Constituição brasileira atribui expressamente esse poder ao judiciário e, especialmente, ao
Supremo Tribunal Federal, cuja atuação se dá de forma técnica e imparcial. Enquanto a outra seria a (ii)
justificativa filosófica - que decorre de que cabe ao Supremo Tribunal Federal velar pelas regras do jogo
democrático instituídos na Constituição - os quais são garantia a participação politica ampla, o governo da
maioria, alternância no poder, proteção de valores e direitos fundamentais.
Teoria Geral do Direito

Ativismo Judicial
Críticas x Oposição às críticas
Risco de Politização da Justiça

Em muito se confunde a instituição de Direito e a instituição de Política, e apesar de o Direito advir de uma
necessidade politica, Direito não é Política, ainda mais no sentido de admitir escolhas livres, tendenciosas ou
partidarizadas.

Devendo assim, o juiz agir sempre de modo a conservar e a promover os direitos fundamentais, mesmo que vá
contra a vontade das maiorias políticas, afinal essa é uma das condições para o devido funcionamento do
constitucionalismo democrático. Logo, a intervenção do judiciário, nesses casos, reparando uma omissão
legislativa ou invalidando uma lei considerada inconstitucional, é estar em favor e não contra a democracia.
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Ativismo Judicial
Críticas x Oposição às críticas
A capacidade institucional do Judiciário e seus limites

Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, são órgãos distintos, especializados e independentes. Porém,
exercem controle reciproco sobre as atividades de cada um, de modo a evitar que um se sobreponha ao outro, o
que seria um risco á democracia e direitos fundamentais.

Vale ressaltar também, que todos os três poderes cumprem o papel de se interpretar a Constituição, e sua
atuação deve respeitar os valores e executar os fins nela previstos.

Entretanto, de acordo com as leis vigentes, cabe ao Judiciário a palavra final em caso de discordância quanto à
interpretação das normas constitucionais ou legais. O que não significa dizer que qualquer matéria deve ser
apreciada em um tribunal.
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Ativismo Judicial
O ativismo judicial, até aqui, tem sido parte da solução, e não do problema.
Mas ele é um antibiótico poderoso, cujo uso deve ser eventual e
controlado. Em dose excessiva, há risco de se morrer da cura. A expansão
do Judiciário não deve desviar a atenção da real disfunção que aflige a
democracia brasileira: a crise de representatividade, legitimidade e
funcionalidade do Poder Legislativo. Precisamos de reforma política. E
essa não pode ser feita por juízes.
(Luís Roberto Barroso)

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